Language of document : ECLI:EU:T:1998:101

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção Alargada)

14 de Maio de 1998 (1)

«Concorrência — Artigo 85.°, n.° 1, do Tratado CE — Conceito de acordo — Intercâmbio de informações — Intimação — Coima — Determinação do montante — Fundamentação — Circunstâncias atenuantes — Direitos de defesa — Cooperação no procedimento administrativo — Princípio da igualdade de tratamento»

No processo T-347/94,

Mayr-Melnhof Kartongesellschaft mbH, sociedade de direito austríaco, com sede em Viena, representada inicialmente por Otfried Lieberknecht, Burkhard Richter, Klaus Benner, advogados no foro de Düsselforf, e Michel Waelbroeck, advogado no foro de Bruxelas, posteriormente por Michel Waelbroeck e Denis Waelbroeck, advogados no foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do advogado Alex Bonn, 7, Val Sainte-Croix,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Bernd Langeheine e Richard Lyal, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, assistidos por Dirk Schroeder, advogado em Colónia, com domicílio escolhido no Luxemburgo no

gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão 94/601/CE da Comissão, de 13 de Julho de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE (IV/C/33.833 — Cartão) (JO L 243, p. 1),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção Alargada),

composto por: B. Vesterdorf, presidente, C. P. Briët, P. Lindh, A. Potocki e J. D. Cooke, juízes,

secretário: H. Jung

vistos os autos e após a audiência que teve lugar entre 25 de Junho de 1997 e 8 de Julho de 1997,

profere o presente

Acórdão

Factos na origem do litígio

1.
    O presente processo tem por objecto a Decisão 94/601/CE da Comissão, de 13 de Julho de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE (IV/C/33.833 — Cartão) (JO L 243, p. 1), rectificada, antes da sua publicação, por uma decisão da Comissão de 26 de Julho de 1994 [C(94) 2135 final] (a seguir «decisão»). A decisão aplicou coimas a dezanove produtores fornecedores de cartão na Comunidade, com fundamento em violações do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

2.
    O produto objecto da decisão é o cartão. Três tipos de cartão, designados como pertencendo às qualidades «GC», «GD» e «SBS», são mencionados na decisão.

3.
    O cartão da qualidade GD (a seguir «cartão GD») é um cartão de interior cinzento (papéis reciclados) que serve habitualmente para a embalagem de produtos não alimentares.

4.
    O cartão da qualidade GC (a seguir «cartão GC») apresenta uma superfície exterior branca e serve habitualmente para a embalagem de produtos alimentares. O cartão GC é de qualidade superior ao cartão GD. No período abrangido pela decisão, verificou-se geralmente entre estes dois produtos uma diferença de preço de cerca de 30%. Em menor escala, o cartão GC de alta qualidade tem igualmente utilizações gráficas.

5.
    A sigla SBS designa o cartão inteiramente branco (a seguir «cartão SBS»), produto cujo preço é cerca de 20% superior ao do cartão GC. Serve para embalar alimentos, cosméticos, medicamentos e cigarros, mas destina-se principalmente a utilizações gráficas.

6.
    Por carta de 22 de Novembro de 1990, a British Printing Industries Federation, organização profissional que representa a maioria dos impressores de cartão do Reino Unido (a seguir «BPIF»), apresentou uma denúncia informal à Comissão. Alegou que os produtores de cartão que fornecem o Reino Unido haviam introduzido uma série de aumentos de preços simultâneos e uniformes e solicitou que a Comissão investigasse a eventual existência de uma infracção às regras comunitárias da concorrência. Por forma a garantir que seria dada publicidade à sua iniciativa, a BPIF emitiu um comunicado de imprensa. O conteúdo desse comunicado foi apresentado pela imprensa profissional especializada no decurso do mês de Dezembro de 1990.

7.
    Em 12 de Dezembro de 1990, a Fédération française du cartonnage apresentou igualmente uma denúncia informal à Comissão, na qual apresentou alegações, relativamente ao mercado francês do cartão, em termos semelhantes aos utilizados na denúncia da BPIF.

8.
    Em 23 e 24 de Abril de 1991, agentes da Comissão, actuando ao abrigo do n.° 3 do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de aplicação dos artigos 85.° e 86.° do Tratado (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22, a seguir «Regulamento n.° 17»), efectuaram investigações simultâneas sem aviso prévio nas instalações de diversas empresas e associações comerciais do sector do cartão.

9.
    Na sequência dessas investigações, a Comissão pediu informações e documentos a todos os destinatários da decisão, em aplicação do artigo 11.° do Regulamento n.° 17.

10.
    Os elementos obtidos no âmbito destas investigações e pedidos de informações e de documentos levaram a Comissão a concluir que as empresas em causa tinham participado, entre meados de 1986 e Abril de 1991, pelo menos (na maior parte dos casos), numa infracção ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

11.
    Em consequência, decidiu dar início a um procedimento em aplicação desta última disposição. Por carta de 21 de Dezembro de 1992, enviou uma comunicação de acusações a cada uma das empresas em causa. Todas as empresas destinatárias responderam por escrito. Nove das empresas pediram para ser ouvidas. A sua audição teve lugar entre 7 e 9 de Junho de 1993.

12.
    No termo do procedimento, a Comissão adoptou a decisão, que inclui as seguintes disposições:

«Artigo 1.°

As empresas Buchmann GmbH, Cascades SA, Enso-Gutzeit Oy, Europa Carton AG, Finnboard-the Finnish Board Mills Association, Fiskeby Board AB, Gruber & Weber GmbH & Co KG, Kartonfabriek 'de Eendracht‘ NV (com denominação comercial 'BPB de Eendracht‘), NV Koninklijke KNP BT NV (anteriormente Koninklijke Nederlandse Papierfabrieken NV), Laakmann Karton GmbH & Co KG, Mo Och Domsjö AB (MoDo), Mayr-Melnhof Gesellschaft mbH, Papeteries de Lancey SA, Rena Kartonfabrik A/S, Sarrió SpA, SCA Holding Ltd [anteriormente Reed Paper & Board (UK) Ltd], Stora Kopparbergs Bergslags AB, Enso Española SA (anteriormente Tampella Española SA) e Moritz J. Weig GmbH & Co KG infringiram o disposto no n.° 1 do artigo 85.° do Tratado CE ao participarem,

—    no caso da Buchmann e da Rena desde, aproximadamente, Março de 1988 até, pelo menos, final de 1990,

—    no caso da Enso Española desde, pelo menos, Março de 1988 até, pelo menos, final de Abril de 1991,

—    no caso da Gruber & Weber desde, pelos menos, 1988 até finais de 1990,

—    noutros casos, a partir de meados de 1986 até, pelo menos, Abril de 1991,

num acordo e prática concertada com início em meados de 1986, através do qual os fornecedores de cartão na Comunidade:

—    se reuniram regularmente numa série de reuniões secretas e institucionalizadas para debater e acordar um plano comum do sector destinado a restringir a concorrência,

—    acordaram aumentos de preços regulares para cada qualidade do produto em cada moeda nacional,

—    planearam e aplicaram aumentos de preços simultâneos e uniformes em toda a Comunidade,

—    chegaram a um acordo quanto à manutenção das quotas de mercado dos principais produtores a níveis constantes, sujeitas a modificações ocasionais,

—    adoptaram, principalmente a partir do início de 1990, medidas concertadas por forma a controlar o fornecimento do produto na Comunidade e a assegurar a aplicação dos referidos aumentos concertados de preços,

—    procederam ao intercâmbio de informações comerciais sobre os fornecimentos, preços, suspensões de actividade, cadernos de encomendas e taxas de utilização das máquinas em apoio às medidas supracitadas.

...

Artigo 3.°

São aplicadas as seguintes coimas às empresas a seguir designadas relativamente à infracção referida no artigo 1.°:

...

xi)    Mayr-Melnhof Karton Gesellschaft mbH, coima de 21 000 000 ecus;

...»

13.
    Nos termos da decisão, a infracção foi praticada no âmbito de um organismo denominado «Product Group Paperboard» (Grupo de estudos do produto cartão, a seguir «PG Paperboard»), composto por diversos grupos ou comités.

14.
    Em meados de 1986, foi criado, no âmbito deste organismo, um «Presidents Working Group» (grupo de trabalho dos presidentes, a seguir «PWG»), de que fazem parte representantes de alto nível dos principais produtores de cartão da Comunidade (cerca de oito).

15.
    O PWG tinha nomeadamente como actividades a discussão e a concertação sobre os mercados, as quotas de mercado, os preços e a utilização das capacidades. Em especial, adoptou decisões gerais relativamente ao calendário e ao nível dos aumentos de preços a pôr em prática pelos fabricantes.

16.
    O PWG apresentava relatórios à «President Conference» (a seguir «PC» ou «conferência de presidentes»), na qual participava (mais ou menos regularmente) a quase totalidade dos directores executivos das empresas envolvidas. A PC reuniu-se duas vezes por ano durante o período em causa.

17.
    No fim do ano de 1987, foi criado o «Joint Marketing Committee» (comité conjunto de marketing, a seguir «JMC»). A sua principal atribuição consistia, por

um lado, em determinar se os aumentos de preços podiam entrar em vigor e, em caso afirmativo, de que modo e, por outro, em fixar as modalidades de aplicação das iniciativas em matéria de preços decididas pelo PWG relativamente a cada país e aos principais clientes, com o objectivo de atingir um sistema de preços equivalente na Europa.

18.
    Finalmente, o Comité Económico (a seguir «COE») debatia sobre matérias como as flutuações de preços nos mercados nacionais e os cadernos de encomendas e apresentava as suas conclusões ao JMC ou, até finais de 1987, ao predecessor do JMC, o Marketing Committee. O COE era composto pelos directores comerciais da maior parte das empresas em causa e reunia-se várias vezes por ano.

19.
    Além disso, resulta da decisão que a Comissão considerou que as actividades do PG Paperboard eram apoiadas por um intercâmbio de informações por intermédio da sociedade de auditores Fides, com sede em Zurique (Suíça). Segundo a decisão, a maior parte dos membros do PG Paperboard fornecia à Fides relatórios periódicos sobre as encomendas, a produção, as vendas e a utilização das capacidades. Estes relatórios eram tratados no quadro do sistema Fides e os dados resultantes eram enviados aos participantes.

20.
    A recorrente Mayr-Melnhof Kartongesellschaft mbH (a seguir «Mayr-Melnhof») participou, segundo a decisão, nas reuniões dos quatro órgãos do PG Paperboard acima referidos, isto é, o PWG, a PC, o JMC e o COE.

21.
    Durante todo o período abrangido pela decisão, as actividades de gestão e de comercialização da Mayr-Melnhof e da FS-Karton, produtor de cartão na Alemanha adquirido pela primeira em 1984, foram completamente integradas. Poreste motivo, a Mayr-Melnhof foi considerada responsável pela participação da FS-Karton no cartel (n.° 150 dos considerandos da decisão).

22.
    A Mayr-Melnhof foi também considerada responsável pela participação na infracção da, Deisswil, com sede Suiça, sua filial a 66 %, relativamente a todo o período da infracção (mesmo ponto dos considerandos). Por fim, foi considerada responsável pela participação na infracção da Mayr-Melnhof Eerbeek BV (a seguir «Eerbeek»), com sede nos Países Baixos, que adquiriu em Setembro de 1990. Foi considerada responsável pelo comportamento da Eerbeek desde 1 de Janeiro de 1990, data a partir da qual a aquisição produziu efeitos.

Tramitação processual

23.
    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 18 de Outubro de 1994, a recorrente interpôs o presente recurso.

24.
    Dezasseis das outras dezoito empresas consideradas responsáveis pela infracção recorreram igualmente da decisão (processos T-295/94, T-301/94, T-304/94,

T-308/94, T-309/94, T-310/94, T-311/94, T-317/94, T-319/94, T-327/94, T-334/94, T-337/94, T-338/94, T-348/94, T-352/94 e T-354/94).

25.
    A recorrente no processo T-301/94, Laakmann Karton GmbH, desistiu da instância por carta entregue na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 10 de Junho de 1996, tendo o processo sido cancelado no registo do Tribunal por despacho de 18 de Julho de 1996, Laakmann Karton/Comissão (T-301/94, não publicado na Colectânea).

26.
    Quatro empresas finlandesas, membros do grupo profissional Finnboard e, por esse facto, consideradas solidariamente responsáveis pelo pagamento da coima aplicada ao grupo, recorreram igualmente da decisão (processos apensos T-339/94, T-340/94, T-341/94 e T-342/94).

27.
    Finalmente, foi interposto um recurso pela associação CEPI-Cartonboard, não destinatária da decisão. No entanto, esta desistiu da instância por carta apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 8 de Janeiro de 1997, tendo o processo sido cancelado no registo do Tribunal por despacho de 6 de Março de 1997, CEPI-Cartonboard/Comissão (T-312/94, não publicado na Colectânea).

28.
    Por carta de 5 de Fevereiro de 1997, o Tribunal de Primeira Instância convidou as partes a participarem numa reunião informal, na qual se deveriam pronunciar, designadamente, sobre a eventual apensação dos processos T-295/94, T-304/94, T-308/94, T-309/94, T-310/94, T-311/94, T-317/94, T-319/94, T-327/94, T-334/94, T-337/94, T-338/94, T-347/94, T-348/94, T-352/94 e T-354/94, para efeitos da fase oral. Nessa reunião, que teve lugar em 29 de Abril de 1997, as partes aceitaram a apensação.

29.
    Por despacho de 4 de Junho de 1997, por razões de conexão, o presidente da Terceira Secção Alargada do Tribunal de Primeira Instância ordenou a apensação dos referidos processos para efeitos da fase oral, nos termos do artigo 50.° do Regulamento de Processo, tendo deferido um pedido de tratamento confidencial apresentado pela recorrente no processo T-334/94.

30.
    Por despacho de 20 de Junho de 1997, deferiu um pedido de tratamento confidencial apresentado pela recorrente no processo T-337/94, relativamente a um documento apresentado em resposta a uma pergunta escrita do Tribunal.

31.
    Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção Alargada) decidiu iniciar a fase oral e adoptou medidas de organização do processo, tendo pedido às partes para responderem a certas perguntas escritas e para apresentarem certos documentos. As partes deram satisfação a estes pedidos.

32.
    Foram ouvidas as alegações das partes nos processos mencionados no n.° 28 e as suas respostas às perguntas colocadas pelo Tribunal na audiência que teve lugar entre 25 de Junho e 8 de Julho de 1997.

Pedidos das partes

33.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    anular o artigo 1.° da decisão;

—    anular o artigo 2.° da decisão;

—    anular o artigo 3.° da decisão ou reduzir o montante da coima fixado por esta disposição;

—    condenar a Comissão nas despesas.

34.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

—    negar provimento ao recurso;

—    condenar a recorrente nas despesas.

Pedido de anulação do artigo 1.° da decisão

A — Fundamentos baseados na violação de formalidades essenciais

Fundamento baseado na violação do artigo 190.° do Tratado

Argumentos das partes

35.
    A recorrente recorda que a obrigação de fundamentação tem por objectivo proteger os particulares e permitir que o juiz comunitário exerça a sua fiscalização jurisdicional (acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Março de 1959, Nold/Alta Autoridade, 18/57, Recueil, p. 89, Colect. 1954-1961, p. 315). A Comissão é obrigada a mencionar, em especial, os elementos de facto e de direito que a levaram a adoptar a decisão e de que depende a respectiva justificação legal.

36.
    Além disto, não pode abster-se de responder aos argumentos dos destinatários da decisão que lhe parecerem desprovidos de fundamento (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Março de 1992, Chemie Linz/Comissão, T-15/89, Colect., p. II-1275, n.° 328). No caso em apreço, infringiu este princípio, uma vez que não respondeu a vários dos principais argumentos da recorrente.

37.
    Ignorou, no essencial, a argumentação segundo a qual os alegados acordos e práticas concertadas não tiveram repercussões sensíveis na situação do mercado.

Esta argumentação baseou-se num estudo aprofundado, o relatório da London Economics (a seguir «relatório LE»). A decisão (n.° 115 dos considerandos) não dá qualquer resposta às teses apresentadas neste relatório.

38.
    Além disto, a Comissão não examinou as especificidades do mercado tal como apresentadas pela recorrente tanto na resposta à comunicação de acusações como na audição na Comissão. Os aumentos regulares dos preços, habituais no sector, só são mencionados na decisão como um elemento que contribuiu para provar a existência do pretenso cartel (n.os 18 a 20 dos considerandos). Através deste modo de proceder, a Comissão, em violação do artigo 190.° do Tratado, não tomou posição sobre as explicações da recorrente.

39.
    Por fim, a Comissão optou por uma definição incorrecta de lucro.

40.
    A recorrida recorda que uma decisão está suficientemente fundamentada quando menciona os elementos de facto e de direito de que depende a justificação legal da medida e as considerações que a levaram a adoptar a sua decisão (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Outubro de 1991, Atochem/Comissão, T-3/89, Colect., p. II-1177, n.° 222). Estas exigências estão totalmente preenchidas no caso concreto.

41.
    Sustenta ter tomado posição sobre o relatório LE não apenas no n.° 115 dos considerandos da decisão, mas também nos n.os 16, 21 e 101. A decisão contém também uma descrição aprofundada do mercado do cartão (n.os 6 a 21 dos considerandos). Em especial, a Comissão examinou tanto as necessidades em investimentos do mercado (n.° 13 dos considerandos) como a prática do sector que consiste em proceder a aumentos simultâneos de preços em determinados momentos do ano (n.° 18 dos considerandos).

Apreciação do Tribunal

42.
    Segundo jurisprudência constante, o dever de fundamentar uma decisão individual tem por finalidade permitir ao juiz comunitário exercer a fiscalização da legalidade da decisão e fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber se a decisão é fundada ou se está eventualmente afectada por um vício que permita contestar a sua validade, esclarecendo-se que o alcance dessa obrigação depende da natureza do acto em causa e do contexto em que o mesmo foi adoptado (v., nomeadamente, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Dezembro de 1996, Van Megen Sports/Comissão, T-49/95, Colect., p. II-1799, n.° 51). Embora, por força do artigo 190.° do Tratado, a Comissão seja obrigada a mencionar os elementos de facto e de direito de que depende a justificação legal da decisão e as considerações que a levaram a adoptá-la, não se exige que discuta todos os pontos de facto e de direito suscitados no procedimento administrativo (v., nomeadamente, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Outubro de 1980, Van Landewyck e o./Comissão, 209/78 a 215/78 e 218/78, Recueil, p. 3125, n.° 66).

43.
    No caso em apreço, a decisão contém uma fundamentação pormenorizada das razões pelas quais a Comissão considerou que não era de acolher a argumentação de algumas empresas, entre as quais a recorrente, de que a infracção dada como assente não teve efeitos no mercado (v., em especial, os n.os 101, 102 e 115 dos considerandos da decisão). De igual modo, foram examinadas na decisão todas as particularidades do mercado invocadas pela recorrente (v., nomeadamente, n.° 13 e 18 dos considerandos).

44.
    Por fim, na medida em que a argumentação da recorrente que contesta a exactidão da apreciação efectuada pela Comissão relativamente aos lucros realizados pelos produtores do sector (v., supra, n.° 39) aborda questões que fazem parte da análise da fundamentação da decisão, no presente contexto, tal argumentação é desprovida de pertinência.

45.
    O presente fundamento deve portanto ser julgado improcedente.

Fundamento baseado na violação das exigências de prova do direito comunitário

46.
    A recorrente alega que a Comissão desrespeitou as exigências de prova do direito comunitário, na medida em que se baseou em simples presunções e suposições e em teorias empíricas imaginárias. Em especial, a Comissão sobrestimou o valor probatório das declarações da Stora, tendo em conta que esta empresa assumia, segundo a própria Comissão, a responsabilidade principal das alegadas infracções (n.° 46 dos considerandos da decisão).

47.
    Esta argumentação da recorrente visa, na realidade, contestar a apreciação que a Comissão fez dos elementos de prova invocados na decisão. Uma vez que esta argumentação aborda questões que fazem parte da fundamentação da decisão, o presente fundamento deve ser rejeitado.

B — Fundamentos baseados na violação de normas substantivas

Fundamento baseado na inexistência de acordos em matéria de preços

Argumentos das partes

48.
    A recorrente apresenta, antes de mais, certas especificidades do mercado do cartão que são essenciais para compreender o modo como são elaboradas as listas e fixados os preços de transacção. Para poder repercutir eventuais aumentos de preços do cartão nos respectivos clientes, os transformadores exigiram sempre que os produtores de cartão fixassem os seus preços relativamente a cada semestre e que as intenções dos produtores, sobre os aumentos de preços, lhes fossem comunicadas com pelo menos dois meses de antecedência. Os transformadores exigiram que os eventuais aumentos de preço do cartão fossem de cerca de 5%, pelo menos.

49.
    As reuniões entre os produtores de cartão não tiveram portanto o significado quea Comissão lhes atribui. Com efeito, as ideias dos produtores quanto ao montante de cada aumento de preços foram influenciadas pelos aumentos dos custos que os afectaram de forma mais ou menos idêntica. Todos os aumentos de preços foram portanto absolutamente necessários devido aos aumentos dos custos de produção.

50.
    Além disto, os produtores não foram obrigados a submeter-se à decisão de um único produtor de aumentar os preços em determinado montante. No entanto, é habitual neste tipo de mercados de bens de produção em massa vender a tarifas uniformes, o que implica que a concorrência efectiva se joga nas negociações individuais com os clientes.

51.
    A transparência das iniciativas em matéria de preços foi assegurada pelo mercado, dado que, uma vez enviadas as cartas de anúncio dos aumentos de preços, os produtores podiam ter conhecimento das iniciativas previstas pelos outros produtores durante o período prévio suficiente exigido pelos transformadores, bem como da reacção dos compradores antes mesmo de adoptarem a decisão de se associarem ou não. Acrescenta que a Comissão não afirmou que existissem restrições de concorrência susceptíveis de afectar as negociações individuais em matéria de preços com os compradores.

52.
    A Comissão não teve em conta o facto de a procura de cartão ser exclusivamente determinada pela procura de bens a embalar. Deste modo, determinado produtor não ganha necessariamente quotas de mercado através de uma diminuição dos seus preços, dado que os transformadores se adaptaram muitas vezes às qualidades de cartão dos seus fornecedores habituais, podendo também levá-los, sem grandes dificuldades, a diminuir os preços.

53.
    Por fim, a Comissão não teve adequadamente em conta os grandes investimentos necessários no sector do cartão.

54.
    A recorrente alega em seguida que, segundo a jurisprudência, só há acordo na acepção do artigo 85.° do Tratado quando as empresas manifestaram a sua vontade comum de se comportar no mercado de um modo determinado (acórdão Chemie Linz/Comissão, já referido, n.° 301). Consequentemente, a noção de acordo pressupõe intrinsecamente a existência de uma obrigação que consiste na vontade efectiva dos participantes de se vincularem, obrigação que não tem forçosamente que ser juridicamente obrigatória. Para verificar a existência de um acordo, é preciso pelo menos exigir que os interessados assumam uma obrigação moral de se comportarem em conformidade com o que foi acordado. No entanto, na decisão, a Comissão nem sequer afirmou que as empresas se tinham comprometido de facto a adoptar determinado comportamento para restringir a concorrência.

55.
    A recorrente admite que participou em intercâmbios de informações relativamente aos aumentos de preços previstos e que esse intercâmbio de informações pode ser

considerado uma prática concertada que restringe a concorrência. No entanto, os elementos de prova invocados pela Comissão nos n.os 74 e segs. dos considerandos da decisão não demonstram a existência de acordos. Em especial, a segunda declaração do grupo Stora (anexo 39 à comunicação de acusações), na qual a Comissão se baseia, não contém qualquer indício da existência desse acordo. De resto, as declarações do grupo Stora não têm valor probatório.

56.
    Além disto, o facto de os produtores terem procedido a aumentos de preços sensivelmente uniformes, que entraram em vigor mais ou menos simultaneamente, não constitui prova da existência de acordos obrigatórios em matéria de preços. Estes elementos reflectem apenas as condições especiais do mercado em causa.

57.
    Por fim, a recorrente contesta a existência de um nexo de causalidade entre as discussões sobre os aumentos das tarifas e os aumentos dos preços de transacção verificados no mercado e contesta, por conseguinte, que se considere que os aumentos efectivos de preços demonstram a existência de acordos em matéria de preços.

58.
    A Comissão alega que, segundo a jurisprudência, para que exista acordo na acepção do artigo 85.° basta que as empresas em causa tenham expresso a sua vontade comum de se comportarem no mercado de uma forma determinada (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Dezembro de 1991, Hercules Chemicals/Comissão, T-7/89, Colect., p. II-1711, n.° 256).

59.
    A Comissão sublinha que expôs em pormenor, nos n.os 72 a 90 dos considerandos da decisão, as provas que demonstram a natureza da infracção em causa. Segundo essas provas, os produtores de cartão concertaram-se previamente, no âmbito do PWG, sobre o nível de cada aumento de preços e acordaram qual deles iria anunciar em primeiro lugar cada um dos aumentos, sobre a data desse anúncio bem como sobre as datas em que cada um dos restantes produtores «acompanharia» enviando as respectivas cartas de anúncio dos aumentos de preços (n.° 73 dos considerandos da decisão).

60.
    Nestas condições, a argumentação da recorrente de que a periodicidade e a natureza dos anúncios dos aumentos de preços se explicava pelos desejos dos clientes, não contradiz a existência de acordos. A sua argumentação relativa à transparência do mercado criada pelas cartas de anúncio dos aumentos de preços e às características do mercado também não é pertinente, pois ficou provado que as empresas acordaram previamente os aumentos de preços.

61.
    Além disto, a Comissão salienta que a colusão sobre os preços fazia parte de um plano global. Com efeito, num sistema de acordos tão complexo, as diferentes medidas devem ser julgados no seu conjunto, em função do objectivo global do cartel (n.° 128 dos considerandos da decisão). Tendo em conta a concretização crescente das convenções, o planeamento e a realização comum das iniciativas em matéria de preços e o acordo sobre as quotas de mercado e o controlo dos

volumes, a Comissão mantém as suas conclusões, expostas nos n.os 131 e 132 dos considerandos, segundo as quais a infracção deve ser qualificada de prática concertada a partir do segundo semestre de 1986 apresentando, a partir do final do ano de 1987, todas as características de um verdadeiro acordo na acepção do artigo 85.° do Tratado.

62.
    Por fim, defende que os aumentos de preços tiveram efeitos sobre os preços efectivamente praticados.

Apreciação do Tribunal

63.
    A recorrente admite a sua participação numa concertação sobre os aumentos de preços previstos.

64.
    Segundo a decisão, as empresas mencionadas no seu artigo 1.° fixaram, «através de acordo... aumentos de preços regulares a aplicar em cada mercado nacional» (n.° 130, segundo parágrafo, terceiro travessão, dos considerandos). Como recordou a Comissão (supra, n.° 61), considerou-se que existiu um acordo a partir do final do ano de 1987.

65.
    Segundo jurisprudência constante, para que haja acordo, na acepção do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, basta que as empresas em causa tenham expresso a sua vontade comum de se comportarem no mercado de uma forma determinada (v., nomeadamente, acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Julho de 1970, ACF Chemiefarma/Comissão, 41/69, Colect., p. 661, n.° 112 e Van Landewyck e o./Comissão, já referido, n.° 86, e acórdão Hercules Chemicals/Comissão, já referido, n.° 256). Nestas condições, não é pertinente analisar, contrariamente ao que defende a recorrente, se as empresas em causa se consideraram obrigadas — jurídica, factual ou moralmente — a adoptar o comportamento acordado.

66.
    Há portanto que verificar se a Comissão provou que as empresas destinatárias da decisão manifestaram a sua vontade comum de adoptar, em matéria de preços, determinado comportamento no mercado.

67.
    Quanto às iniciativas em matéria de preços, o grupo Stora declara nomeadamente (anexo 39 à comunicação de acusações, n.os 27, 28 e 30):

«... em 1987, a capacidade e o consumo estavam quase em equilíbrio. Nesse ano, a capacidade foi 5% superior ao consumo. Esta diferença (que era de longe inferior ao que a própria indústria tinha realizado até então) deu ao PWG a oportunidade de conseguir um acordo sobre os aumentos de preços a partir de 1987 praticamente com a certeza de que esses aumentos seriam aplicados com êxito. Quando essa oportunidade se apresentou, a preocupação dos produtores foi recuperar os prejuízos sofridos nos anos precedentes.

O PWG considerou que era conveniente efectuar um primeiro aumento de 10% em 1988. Isso representava, por exemplo, um aumento de 50 FF por 100 Kg para as qualidades GC e de 35 FF por 100 Kg para as qualidades GD no mercado francês. Aumentos semelhantes foram aplicados noutros países. Em seguida, foram aceites aumentos a taxas semelhantes em termos absolutos, o que reduziu portanto a proporção do aumento.

...

O PWG debatia e chegava a acordo sobre a identidade do fabricante que anunciaria, em primeiro lugar, cada aumento de preços e as datas em que os outros produtores principais anunciariam os respectivos aumentos. O esquema não era sempre o mesmo.»

68.
    Acrescenta (anexo 39 à comunicação de acusações, n.os 13 e 14):

«... o JMC tinha nomeadamente por objectivo elaborar listas de preços comparadas para certos grandes clientes e estabelecer as modalidades de execução por país das decisões em matéria de preços adoptadas pelo PWG tanto para as qualidades GC como para as qualidades GD.

O JMC debatia, mercado a mercado, a execução pormenorizada das decisões em matéria de preços adoptadas pelo PWG, apresentando a este as conclusões.»

69.
    Deste modo, segundo o grupo Stora, as empresas reunidas no PWG e no JMC exprimiam a sua vontade comum de efectuar aumentos de preços idênticos e simultâneos nos diferentes mercados nacionais.

70.
    As declarações do grupo Stora são, neste ponto, confirmadas por várias provas documentais invocadas pela Comissão nos n.os 74 e segs. dos considerandos da decisão.

71.
    A este respeito, basta a referência às três listas de preços mencionadas nos n.os 79, 80 e 83 dos considerandos da decisão. As listas, obtidas pela Comissão junto da Rena (anexos 110 e 11 à comunicação de acusações) e da Finnboard (UK) Ltd., contêm indicações, relativamente a vários tipos de cartões e a vários países comunitários, sobre as datas e os montantes precisos dos aumentos de preços aplicados pelas empresas em causa respectivamente em Abril de 1989, Setembro/Outubro de 1989 e Abril de 1990. As indicações incluídas nas três listas de preços correspondem, quanto aos montantes dos aumentos de preços e às datas da respectiva aplicação, aos comportamentos efectivos das empresas em questão no mercado (v. quadros D, E e F anexos à decisão).

72.
    Além disto, a Comissão obteve junto da Rena notas manuscritas relativas a uma reunião do JMC de 6 de Setembro de 1990 (anexo 118 à comunicação de acusações) que inclui nomeadamente a seguinte passagem:

«O aumento de preços será anunciado na próxima semana, em Setembro.

França        40 FF

Países Baixos    14

Alemanha        12 DM

Itália            80 LIT

Bélgica        2,50 BFR

Suíça            9 FS

Reino Unido    40 UKL

Irlanda        45 IRL

Todas as qualidades deveriam ser objecto do mesmo aumento, GD, UD, GT, GC, etc.

Um único aumento de preços por ano.

Para os fornecimentos a partir de 7 de Janeiro.

O mais tardar em 31 de Janeiro.

Carta de 14 de Setembro com aumento de preços (Mayr-Melnhof).

19 de Setembro, envio pela Feldmühle da sua carta.

Cascades antes do fim de Setembro.

Todos devem enviar as respectivas cartas antes de 8 de Outubro.»

73.
    A recorrente não contesta que as três listas de preços referidas se referem a uma concertação em matéria de preços, nem que o anexo 118 à comunicação de acusações se refere à reunião do JMC de 6 de Setembro de 1990.

74.
    Consequentemente, sem que seja necessário examinar outros elementos de prova, o Tribunal considera que a Comissão provou que as empresas que participaram nas reuniões do PWG e do JMC manifestaram a sua vontade comum de efectuar aumentos de preços uniformes e simultâneos. A Comissão podia, portanto, qualificar de acordo o concurso de vontades verificado entre a recorrente e outros produtores de cartão sobre as iniciativas em matéria de preços a partir do final do ano de 1987.

75.
    Nessas condições, os argumentos da recorrente baseados em alegadas especificidades do mercado do cartão, por um lado, e na inexistência de nexo de causalidade entre os aumentos das tarifas e os aumentos dos preços de transacção, por outro, não têm pertinência. Com efeito, mesmo admitindo que as afirmações de facto avançadas pela recorrente no âmbito desses argumentos são fundadas, isso não seria susceptível de pôr em causa a qualificação de acordo da infracção cometida pela recorrente em matéria de preços a partir do final do ano de 1987.

76.
    O presente fundamento deve portanto ser julgado improcedente.

Fundamento baseado na inexistência de acordo e de prática concertada relativos à alegada política do «preço em detrimento da tonelagem»

Argumentos das partes

77.
    Os argumentos da recorrente agrupam-se em três categorias.

78.
    Em primeiro lugar, a recorrente desenvolve uma argumentação sobre a inexistência de acordo e de prática concertada relativos à manutenção das quotas de mercado a um nível constante.

79.
    Defende que as afirmações da Comissão relativas à pretensa concertação sobre o «congelamento» das quotas de mercado dos principais produtores de cartão se baseiam apenas nas declarações do grupo Stora e na nota confidencial, de 28 de Dezembro de 1988, encontrada na FS-Karton (anexo 73 à comunicação de acusações). No entanto, estes documentos não contém qualquer informação susceptível de provar a existência de um acordo ou de uma prática concertada que tenha por objecto o «congelamento» das quotas de mercado.

80.
    O anexo 73 à comunicação de acusações mais não é do que uma descrição da situação geral, redigida pelo director comercial da FS-Karton e destinada a justificar, junto da direcção do grupo, a estagnação do volume de negócios da FS-Karton. Quanto a isto, conclui-se dessa nota que o director comercial formulara reservas à nova política de vendas do grupo, que consistiu em impor às filiais uma disciplina de preços absoluta, ainda que tal implicasse uma diminuição dos volumes vendidos. A nota prova que esta decisão foi adoptada pela direcção do grupo e que não foi imposta ao director comercial da FS-Karton. Este último não tinha aliás conhecimento do conteúdo das discussões levadas a cabo no PG Paperboard.

81.
    As declarações do grupo Stora não contêm nenhum elemento susceptível de provar a existência do alegado acordo de base sobre uma política dita do «preço em detrimento da tonelagem». Com efeito, a segunda declaração do Stora só se refere a «discussões» relativas às quotas de mercado (anexo 39 à comunicação de acusações, pp. 4 e 11). De igual modo, a terceira declaração do Stora (anexo 43 à comunicação de acusações) refere-se a «discussões» e a «entendimentos» (pp. 1 e 2). Além disto, estaria em causa não um acordo de base mas vários acordos isolados baseados nos números do ano precedente, acordos aliás não confirmados por outros documentos. O Stora não utilizou o termo «acordo» na acepção especial do artigo 85.° do Tratado (v. supra n.os 54 e segs.), uma vez que declarou que os «acordos» celebrados entre os produtores não eram obrigatórios e só eram respeitados se satisfizessem os respectivos interesses (anexo 39 à comunicação de acusações, p. 4 e n.° 59 dos considerandos da decisão).

82.
    Além disto, a credibilidade das declarações do Stora é duvidosa, pois a cooperação desta empresa com a Comissão pode explicar-se pelas discussões sobre o montante da redução da coima aplicada como contrapartida.

83.
    Por fim, a nota manuscrita de 11 de Janeiro de 1990 encontrada no gabinete do director de vendas da FS-Karton (anexo 113 à comunicação de acusações, n.os 84

a 86 dos considerandos da decisão) foi redigida para preparar um relatório interno destinado à direcção da Mayr-Melnhof e as informações que contém baseiam-se em suposições pessoais do director e em informações obtidas em discussões com colegas e clientes. Os outros documentos referidos pela Comissão não sustentam as suas alegações.

84.
    Em segundo lugar, a recorrente invoca a evolução das suas quotas de mercado. Salienta, a este propósito, que o aumento das capacidades da FS-Karton em 200 000 toneladas/ano em 1990 prova que pretendia aumentar a sua quota de mercado no território que constituía o seu principal mercado, isto é, o mercado comunitário. O facto de ter exportado para mercados não comunitários nada tem a ver com um controlo efectivo da oferta, correspondendo antes às regras elementares de um comportamento em conformidade com os dados do mercado. Com efeito, a política do «preço em detrimento da tonelagem» que tinha desenvolvido baseou-se numa decisão autónoma que visava não provocar um desmoronamento geral dos preços no mercado comunitário.

85.
    Além disto, as quotas de mercado dos diferentes produtores, incluindo as suas, também evoluíram. Contesta a análise da Comissão de que as flutuações das quotas de mercado se explicam pelo facto de estas não serem rígidas mas periodicamente adaptadas e renegociadas e de as discussões sobre as quotas de mercado serem retomadas anualmente sobre bases novas. Com efeito, não existe qualquer prova dessas afirmações nem da afirmação da Comissão de que os produtores que aumentaram as suas quotas de mercado foram censurados.

86.
    Em terceiro lugar, a recorrente desenvolve uma argumentação relativa aos períodos de suspensão do funcionamento e à evolução dos volumes de produção.

87.
    Antes de mais, a Comissão não teve devidamente em conta o facto de o mercado europeu do cartão ser um mercado de compradores. Evoca, neste contexto, as características das relações entre os produtores e os respectivos clientes.

88.
    Em seguida, alega que a Comissão não apresentou a mínima prova de um acordo entre os grandes fabricantes sobre os períodos de suspensão de funcionamento. Estas alegações baseiam-se em algumas insinuações vagas contidas na segunda declaração do Stora. Além disto, a Comissão nunca respondeu ao argumento de que tinha sempre utilizado ao máximo as suas capacidades de produção, argumento corroborado por um quadro relativo à utilização das suas capacidades, anexo à petição. Os períodos de suspensão efectiva do funcionamento das máquinas, verificados em 1990 nas fábricas do grupo Mayr-Melnhof, ficaram a dever-se à entrada em serviço de uma nova máquina, a trabalhos de manutenção, testes e trabalhos de transformação.

89.
    Em resposta à argumentação da recorrente, a Comissão remete, no essencial, para as conclusões da decisão a propósito da política do «preço em detrimento da

tonelagem» (n.os 51 a 60 dos considerandos). Remete também para a segunda declaração do Stora (anexo 39 à comunicação de acusações, em especial pp. 3, 12, 14 e 15).

90.
    No que se refere mais especialmente ao «congelamento» das quotas de mercado existentes dos principais produtores, alega que se tratava de um elemento necessário da política do «preço em detrimento da tonelagem» que visava controlar a política efectivamente desenvolvida pelos membros do cartel em matéria de quantidades. A prova da existência de uma concertação relativa ao «congelamento» das quotas de mercado é dada nomeadamente pela nota confidencial encontrada na FS-Karton (anexo 73 à comunicação de acusações). Além disto, recorda que a decisão indica outros elementos de prova que a Mayr-Melnhof não menciona e que corroboram exactamente as indicações incluídas na segunda declaração do Stora e na nota confidencial da FS-Karton (v. n.os 84, 87, 94 e 95 dos considerandos da decisão bem como os documentos aí discutidos).

91.
    No que respeita às declarações do Stora, a Comissão repete que um concurso de vontades com vista à adopção de um comportamento futuro no mercado constitui uma infracção ao artigo 85.° do Tratado. Estas declarações são corroboradas em todos os pontos importantes por outros documentos e não há, consequentemente, que duvidar da sua credibilidade. Além disto, contesta ter feito um acordo com o Stora relativamente ao montante da coima e à redução a atribuir graças à cooperação.

92.
    Quanto ao aumento das capacidades da recorrente, a Comissão sublinha que o consumo de cartão na Europa Ocidental aumentou 18,6% entre 1987 e 1990, sendo portanto indispensável um aumento das capacidades do sector para satisfazer o aumento da procura. No entanto, a este desenvolvimento das capacidades, nomeadamente devido à entrada em serviço de uma nova máquina na FS-Karton, não correspondeu necessariamente um desvio das quotas de mercado.

93.
    Nada permite provar que a produção resultante das capacidades recém criadas na FS-Karton tenha sido escoada no mercado comunitário. Segundo documentos apresentados pela recorrente, por um lado, a sua quota de mercado só aumentou, entre 1987 e 1991, 0,6% para as qualidades GD e 0,3% para as qualidades GC e, por outro lado, as novas capacidades criadas na FS-Karton não provocaram um aumento das suas quotas de mercado. A Comissão afirma que a própria recorrente admitiu ter efectuado exportações para países terceiros para evitar uma quebra dos preços no mercado comunitário, o que corresponde exactamente aos objectivos da política do «preço em detrimento da tonelagem».

94.
    Além disto, mesmo um aumento das quotas de mercado da recorrente não desculparia a sua participação nas conversações durante as quais foram determinadas, para cada ano, as quotas de mercado dos principais produtores de cartão. (n.° 60 dos considerandos da decisão).

95.
    Por fim, no que se refere à suspensão da produção, a Comissão sustenta que os documentos apresentados pela recorrente no processo contencioso provam que, nomeadamente em 1990, a taxa de utilização de certas fábricas diminuiu bastante relativamente à dos anos precedentes e que, em 1991, a taxa de utilização da fábrica de Hirschwang também diminuiu bastante relativamente aos anos anteriores.

96.
    De qualquer modo, não é pertinente saber se a recorrente produziu efectivamente no máximo da sua capacidade. Dado que, por um lado, se está perante um complexo sistema de acordos que visava nomeadamente o controlo da oferta e a repartição dos mercados na Comunidade e, por outro, que a recorrente participou nas reuniões do PWG em que a política em causa foi determinante, a recorrente é responsável pela globalidade da infracção cometida pelos produtores (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Março de 1992, ICI/Comissão, T-13/89, Colect., p. II-1021, n.os 256 a 261 e 305, e Hercules Chemicals/Comissão, já referido, n.° 272).

Apreciação do Tribunal

1. Quanto à existência de uma concertação destinada a congelar as quotas de mercado e de uma concertação destinada a controlar a oferta

97.
    Nos termos do artigo 1.° da decisão, as empresas visadas por esta disposição violaram o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, ao participarem, durante o período de referência, num acordo e prática concertada através do qual os fornecedores de cartão da Comunidade «chegaram a um acordo quanto à manutenção das quotas de mercado dos principais produtores a níveis constantes, sujeitas a modificações ocasionais» e «adoptaram, principalmente a partir do início de 1990, medidas concertadas por forma a controlar o fornecimento do produto na Comunidade e a assegurar a aplicação dos referidos aumentos concertados de preços».

98.
    Segundo a Comissão, estas duas categorias de práticas de colusão, tratadas na decisão sob o título «Regulação dos volumes», tiveram início durante o período de referência por iniciativa dos participantes nas reuniões do PWG. Efectivamente, resulta do n.° 37, terceiro parágrafo, dos considerandos da decisão que o verdadeiro objectivo do PWG, tal como descrito pelo grupo Stora, «incluía 'discussões e concertação sobre os mercados, quotas de mercado, preços, aumentos de preços e capacidades‘».

99.
    Quanto ao papel do PWG no que respeita à colusão sobre as quotas de mercado, a decisão (n.° 37, quinto parágrafo, dos considerandos) sublinha: «No âmbito das iniciativas no sentido de aumentar os preços, o PWG efectuou discussões pormenorizadas relativamente às quotas de mercado na Europa Ocidental das associações nacionais e dos grupos de produtores individuais. Assim, foram alcançados alguns 'entendimentos‘ entre os participantes quanto às respectivas

quotas de mercado, sendo o objectivo garantir que as iniciativas concertadas em matéria de preços não fossem prejudicadas por um excesso da oferta relativamente à procura. Com efeito, os grandes grupos de produtores concordaram em manter as suas quotas de mercado nos níveis apresentados, anualmente, nas estatísticas relativas à produção e às vendas anuais, que a Fides divulgava, na sua forma definitiva, em Março do ano subsequente. A evolução das quotas de mercado foi analisada em todas as reuniões do PWG com base nos mapas mensais da Fides e quando surgiam flutuações significativas eram solicitadas justificações às empresas consideradas responsáveis.»

100.
    Nos termos do n.° 52 dos considerandos, «O acordo alcançado no âmbito do PWG durante 1987 incluía o 'congelamento‘ das quotas de mercado da Europa Ocidental dos principais produtores nos níveis já existentes, não devendo ser feita qualquer tentativa no sentido de adquirir novos clientes ou alargar as actividades existentes através de uma política de preços agressiva.»

101.
    O n.° 56, primeiro parágrafo, dos considerandos sublinha: «O acordo de base entre os principais produtores para a manutenção das respectivas quotas de mercado manteve-se ao longo do período abrangido pela presente decisão.» Segundo o n.° 57, «'A evolução das quotas de mercado‘ foi analisada em todas as reuniões do PWG com base em estatísticas previsionais.» Finalmente, segundo o n.° 56, último parágrafo «As empresas que participaram nestas discussões relativas às quotas de mercado foram as empresas representadas no PWG, nomeadamente: Cascades, Finnboard, KNP (até 1988), (Mayr-Melnhof), MoDo, Sarrió, os dois produtores do grupo Stora, CBC e Feldmühle e (a partir de 1988) a Weig.»

102.
    Deve considerar-se que a Comissão concluiu correctamente pela existência de uma colusão sobre as quotas de mercado entre os participantes nas reuniões do PWG.

103.
    Efectivamente, a análise da Comissão assenta essencialmente nas declarações do grupo Stora (anexos 39 e 43 à comunicação de acusações) e é corroborada pelo anexo 73 à comunicação de acusações.

104.
    No anexo 39 à comunicação de acusações, o grupo Stora explica: «o PWG reuniu-se a partir de 1986, com o objectivo de contribuir para disciplinar o mercado... Entre outras actividades (lícitas), o seu verdadeiro objectivo incluía discussões e concertação sobre os mercados, quotas de mercado, preços, aumentos de preços, procura e capacidades. As suas atribuições incluíam avaliar e apresentar à conferência de presidentes a situação precisa da oferta e da procura no mercado e as medidas a serem adoptadas por forma a regular o mercado».

105.
    No que respeita mais concretamente à colusão sobre as quotas de mercado, o grupo Stora indica que «as quotas adquiridas pelos grupos nacionais da Comunidade Europeia, da EFTA e de outros países abastecidos pelos membros do PG Paperboard eram analisadas no PWG» e que o PWG «discutia da possibilidade de manter as quotas de mercado ao nível do ano anterior» (anexo 39 à

comunicação de acusações, n.° 19). Assinala também (mesmo documento, n.° 6) que «discussões relativas às quotas de mercado dos fabricantes na Europa tiveram igualmente lugar nesse período, sendo o primeiro período de referência os níveis de 1987».

106.
    Na resposta que enviou, em 14 de Fevereiro de 1992, a um pedido da Comissão de 23 de Dezembro de 1991 (anexo 43 à comunicação de acusações), o grupo Stora precisa ainda: «Os acordos sobre os níveis de quotas de mercado celebrados pelos membros do PWG aplicavam-se a toda a Europa. Esses acordos baseavam-se nos valores totais anuais do ano anterior, habitualmente disponíveis de forma definitiva a partir de Março do ano seguinte» (n.° 1.1).

107.
    Esta afirmação é confirmada no mesmo documento nos seguintes termos: «... as discussões terminavam com a celebração de acordos, geralmente em Março de cada ano, entre os membros do PWG, que tinham por objectivo a manutenção das respectivas quotas de mercado ao nível do ano anterior» (n.° 1.4). O grupo Stora sublinha que «não era tomada nenhuma medida para assegurar o respeito pelos acordos» e que os participantes nas reuniões do PWG «estavam conscientes de que, se tomassem posições excepcionais em relação a certos mercados abastecidos por outros concorrentes, estes últimos fariam o mesmo noutros mercados» (mesmo número).

108.
    Finalmente, declara que a Mayr-Melnhof participou nas discussões relativas às quotas de mercado (n.° 1.2).

109.
    As afirmações do grupo Stora sobre a colusão em matéria de quotas de mercado são confirmadas pelo anexo 73 à comunicação de acusações. Este documento, encontrado nas instalações da FS-Karton, é uma nota confidencial de 28 de Dezembro de 1988, enviada pelo director comercial responsável pelas vendas do grupo Mayr-Melnhof/FS-Karton na Alemanha (Sr. Katzner) ao director executivo da Mayr-Melnhof na Áustria (Sr. Gröller), tendo por objecto a situação do mercado.

110.
    Segundo este documento, referido nos n.os 53 a 55 dos considerandos da decisão, a cooperação mais estreita no «círculo dos presidentes» («Präsidentenkreis»), decidida em 1987, fez «vencedores» e «vencidos». O autor da nota classifica a recorrente na categoria dos vencidos por diversas razões, entre as quais as seguintes:

«2)    Um acordo só foi possível impondo-nos uma 'sanção‘ — foram-nos exigidos 'sacrifícios‘.

3)    As quotas de mercado de 1987 deviam ser 'congeladas‘, os contactos existentes deviam ser mantidos e nenhuma actividade ou qualidade novas deviam ser conquistadas praticando preços promocionais (o resultado será

visível em Janeiro de 1989 — se todas as partes que assinaram o acordo forem leais).»

111.
    Estas afirmações devem ser lidas no contexto mais geral da nota.

112.
    A este propósito, o seu autor evoca, em jeito de introdução, a cooperação mais estreita a nível europeu no «círculo dos presidentes». Esta expressão foi interpretada pela recorrente como visando simultaneamente o PWG e a PC num contexto geral, ou seja, sem referência a um acontecimento ou a uma reunião especial (anexo 75 à comunicação de acusações, n.° 2.a).

113.
    O autor indica em seguida que esta cooperação conduziu à «disciplina em matéria de preços», a qual fez «vencedores» e «vencidos».

114.
    É, portanto, no contexto desta disciplina decidida pelo «círculo dos presidentes» que há que entender a expressão relativa ao congelamento das quotas de mercado aos níveis de 1987.

115.
    Além disso, a indicação de 1987 como ano de referência é conforme à segunda declaração do grupo Stora (anexo 39 à comunicação de acusações; v., supra, n.° 105).

116.
    Quanto ao papel do PWG na colusão sobre o controlo do abastecimento, que caracterizava a análise dos períodos de suspensões de funcionamento, a decisão afirma que o PWG desempenhou um papel determinante na instituição de tais períodos quando, a partir de 1990, se verificou um aumento das capacidades de produção e uma diminuição da procura: «... a partir do início de 1990, os líderes da indústria... consideraram oportuno concertarem-se, no âmbito do PWG, sobre a necessidade de procederem a suspensões de funcionamento. Os principais produtores concluíram que não poderiam aumentar a procura através de uma diminuição dos preços e que o prosseguimento da produção a 100% iria simplesmente originar uma descida dos preços. Em teoria, o período de suspensão necessário para reequilibrar a oferta e a procura podia ser calculado através dos relatórios relativos às capacidades...» (n.° 70 dos considerandos da decisão).

117.
    A decisão sublinha também: «Todavia, o PWG não definiu formalmente o período de 'suspensão‘ a ser praticado por cada produtor. Segundo o grupo Stora, existiam dificuldades práticas para estabelecer um plano coordenado relativo aos períodos de suspensão que abrangesse todos os produtores. O Stora afirma que por estas razões apenas 'existia um sistema de incentivo flexível‘» (n.° 71 dos considerandos da decisão).

118.
    Deve considerar-se que a Comissão concluiu correctamente pela existência de uma colusão sobre as suspensões de funcionamento entre os participantes nas reuniões do PWG.

119.
    Os documentos que apresentou confortam a sua análise.

120.
    Na sua segunda declaração (anexo 39 à comunicação de acusações, n.° 24), o grupo Stora explica: «Com a adopção pelo PWG da política do preço em detrimento da tonelagem e a instituição de um sistema de preços equivalentes a partir de 1988, os membros do PWG reconheceram que era necessário respeitar períodos de suspensão de funcionamento a fim de manter os preços face a uma crescente diminuição da procura. Se os fabricantes não tivessem recorrido às suspensões de funcionamento, ter-lhes-ia sido impossível manter os níveis de preços acordados face a um crescente aumento dos excedentes de produção.»

121.
    No número seguinte da sua declaração, acrescenta: «Em 1988 e 1989, a indústria podia funcionar praticamente a 100% das suas capacidades. Os períodos de suspensão de funcionamento além dos períodos normais de encerramento para reparações e férias tornaram-se necessários a partir de 1990... Mais tarde, afigurou-se necessário proceder a suspensões de funcionamento quando o fluxo de encomendas estagnava, a fim de manter a política do preço em detrimento da tonelagem. Os períodos de suspensão a respeitar pelos produtores (para garantira manutenção do equilíbrio entre a produção e o consumo) podiam ser calculados com base nos relatórios sobre as capacidades. O PWG não indicava formalmente o período de suspensão a respeitar, embora existisse um sistema de incentivo flexível...»

122.
    Quanto ao anexo 73 à comunicação de acusações, as razões fornecidas pelo autor para explicar que considera a recorrente um «vencido» na época da sua redacção constituem elementos de prova importantes da existência de uma colusão entre os participantes nas reuniões do PWG sobre os períodos de suspensão de funcionamento.

123.
    Efectivamente, o autor afirma:

«4)    É quanto a este ponto que a concepção das partes interessadas sobre o objectivo prosseguido começa a divergir.

    ...

    c) Todos os departamentos de vendas e agentes europeus foram isentos do seu orçamento em termos de volume, tendo sido seguida, quase sem excepções, uma política de preços rígida (os nossos colaboradores nem sempre compreenderam a mudança da nossa atitude em relação ao mercado — anteriormente, a única exigência era a tonelagem; daí em diante, passou a contar unicamente a disciplina em matéria de preços, com o risco de uma suspensão do funcionamento das máquinas).»

124.
    A recorrente defende no anexo 75 à comunicação de acusações e nos textos que apresentou ao Tribunal de Primeira Instância (n.° 80 supra), que a nota e, consequentemente, a passagem acima reproduzida, visa uma situação interna da

empresa. No entanto, analisado à luz do contexto mais geral da nota, este excerto comprova a instituição, ao nível das equipas comerciais, de uma política rigorosa decidida no «círculo dos presidentes». Assim, o documento deve ser interpretado no sentido de que significa que os participantes no acordo de 1987, ou seja, pelo menos os participantes nas reuniões do PWG, mediram indiscutivelmente as consequências da política adoptada, na hipótese de esta ser aplicada com rigor.

125.
    O facto de as discussões relativas à apreciação dos períodos de suspensão de funcionamento terem tido lugar entre os fabricantes no momento em que foram preparados os aumentos de preços é corroborado, nomeadamente, por uma nota da Rena, datada de 6 de Setembro de 1990 (anexo 118 à comunicação de acusações), que menciona os montantes dos aumentos de preços em vários países, as datas dos anúncios futuros desses aumentos, bem como a situação dos cadernos de encomendas, expressa em dias de trabalho para diversos fabricantes.

126.
    O autor do documento assinala que certos fabricantes previam períodos de suspensão de funcionamento, o que exprime, por exemplo, da seguinte maneira:

«Kopparfors    5 — 15 dias

            5/9 suspenderá o seu funcionamento durante cinco dias.»

127.
    A recorrente, que participou na reunião do JMC a que se refere a nota (quadro 4 anexo à decisão), é mencionada nesse documento várias vezes. Nomeadamente, indica-se a data em que devia enviar as cartas de anúncio dos aumentos de preços. Além disto, está indicado o seguinte:

«Deiswill    5 dias (GC)

        2.5 semanas para GD

        planeia parar dentro de duas semanas (?)»

128.
    Com base no que precede, deve concluir-se que a Comissão fez prova suficiente da existência de uma colusão sobre as quotas de mercado entre os participantes nas reuniões do PWG e de uma colusão sobre as suspensões de funcionamento entre as mesmas empresas. Na medida em que não foi contestado que a recorrente participou nas reuniões do PWG e em que esta empresa é expressamente mencionada nas principais provas que demonstram a infracção (declarações do grupo Stora e anexo 73 à comunicação de acusações), a Comissão considerou acertadamente que a recorrente era responsável pela sua participação nestas duas colusões.

129.
    As críticas da recorrente às declarações do grupo Stora, que têm como objectivo contestar o seu valor probatório, não desvalorizam esta conclusão.

130.
    Com efeito, é ponto assente que as declarações do grupo Stora provêem de uma das empresas que supostamente participaram na infracção alegada e comportam uma descrição pormenorizada da natureza das discussões no âmbito do PG

Paperboard, do objectivo prosseguido pelas empresas que dele fazem parte, bem como da participação das referidas empresas nas reuniões dos seus diferentes órgãos. Ora, na medida em que é corroborado por outras peças dos autos, este elemento de prova central constitui o suporte pertinente das afirmações da Comissão.

131.
    Dado que a Comissão demonstrou a existência das duas colusões em causa, não é necessário analisar as críticas formuladas pela recorrente em relação ao anexo 113 da comunicação de acusações.

2. Quanto ao comportamento efectivo da recorrente

132.
    Os argumentos da recorrente segundo os quais o seu comportamento efectivo no mercado não é conciliável com as afirmações da Comissão relativas à existência das duas colusões controvertidas, tão-pouco podem ser acolhidas.

133.
    Em primeiro lugar, a existência de colusões entre os membros do PWG sobre os dois aspectos da «política do preço em detrimento da tonelagem» não pode ser confundida com a execução destas. Efectivamente, as provas fornecidas pela Comissão têm tal valor probatório que informações relativas ao comportamento efectivo da recorrente no mercado não podem afectar as conclusões da Comissão relativas à própria existência de colusões em relação aos dois aspectos da política controvertida. Quando muito, as alegações da recorrente poderiam demonstrar que o seu comportamento não seguiu o acordado entre as empresas reunidas no quadro do PWG.

134.
    Em segundo lugar, as conclusões da Comissão não são desmentidas pelas informações fornecidas pela recorrente. Deve sublinhar-se que a Comissão admite expressamente que a colusão sobre as quotas de mercado não implicava «um mecanismo formal de sanções ou compensações para executar os acordos relativos às quotas de mercado» e que a quota de mercado de alguns produtores importantes foi aumentando ao longo dos anos (v., nomeadamente, os n.os 59 e 60 dos considerandos da decisão). Além disso, a Comissão concorda que, tendo a indústria funcionado a 100% das suas capacidades até ao início 1990, não foi necessária praticamente qualquer suspensão até essa data (n.° 70 dos considerandos da decisão).

135.
    Em terceiro lugar, é jurisprudência assente que o facto de uma empresa não respeitar os resultados de reuniões de carácter manifestamente anticoncorrencial não a isenta de culpa, decorrente da sua participação no cartel, uma vez que não se distanciou publicamente do respectivo conteúdo (v., por exemplo, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Tréfileurope/Comissão, T-141/89, Colect., p. II-791, n.° 85). Mesmo admitindo que o comportamento da recorrente no mercado não tenha sido conforme ao comportamento acordado, nomeadamente se, como alega, utilizou plenamente as suas capacidades de

produção em 1990, isso em nada afecta a sua responsabilidade na violação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

3.    Quanto à qualificação jurídica da concertação que visa congelar as quotas de mercado e da concertação que visa controlar a oferta

136.
    Importa responder à questão da qualificação jurídica da concertação que visa congelar as quotas de mercado e da concertação que visa controlar a oferta no âmbito do fundamento baseado na inexistência de um plano comum do sector para restringir a concorrência (infra, n.os 137 e segs.).

Fundamento baseado na existência de um plano comum do sector para restringir a concorrência

Argumentos das partes

137.
    A recorrente contesta que a Comissão tenha feito prova da existência de um acordo sobre um plano comum do sector para restringir a concorrência. Baseia-se, quanto a isto, em substância, nos argumentos que desenvolveu no âmbito dos dois fundamentos precedentes.

138.
    Além disto, a acusação baseada na existência desse plano não permite determinar em que consiste a acusação relativa ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado. Segundo a recorrente, não existiu um acordo vinculando os participantes e obrigando-os a seguir um plano comum do sector para restringir a concorrência (v., quanto ao conceito de acordo, n.os 54 e segs., supra).

139.
    A Comissão responde ao presente fundamento no âmbito da sua argumentação relativa ao fundamento baseado na inexistência de acordo em matéria de preços (v., supra, n.os 58 e segs.).

Apreciação do Tribunal

140.
    Verificou-se acima que as empresas reunidas no âmbito do PWG participaram numa colusão sobre as quotas de mercado, numa colusão sobre os períodos de suspensão do funcionamento e numa colusão sobre os preços.

141.
    O artigo 1.° da decisão afirma que as empresas destinatárias da decisão infringiram o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado CE ao participarem, durante o período em causa, num acordo e numa prática concertada com início em meados de 1986, através dos quais, nomeadamente, os fornecedores de cartão na Comunidade Europeia «se reuniram regularmente numa série de reuniões secretas e institucionalizadas para debater e acordar um plano comum do sector destinado a restringir a concorrência».

142.
    Segundo os fundamentos da decisão «a partir do final de 1987, com a concretização da colusão progressiva dos produtores no denominado sistema do 'preço em detrimento da tonelagem‘, a infracção apresenta todas as características de um verdadeiro 'acordo‘, na acepção do artigo 85.°» (n.° 131, primeiro parágrafo, dos considerandos).

143.
    Há que considerar que a Comissão qualificou correctamente de acordo, na acepção do artigo 85.° do Tratado, a cooperação reforçada entre os participantes nas reuniões do PWG a partir do fim do ano de 1987. Com efeito, estas empresas exprimiram a sua vontade comum de se comportarem no mercado de um modo determinado (v., nomeadamente, os acórdãos referidos no n.° 65). Quanto a isto, com base no que precede, deve concluir-se que essas empresas manifestaram a sua vontade comum de proceder a aumentos de preços uniformes e simultâneos, de controlar a oferta procedendo à análise dos períodos de suspensão do funcionamento da produção e de manter as suas quotas de mercado a níveis constantes, com alterações ocasionais.

144.
    No que se refere ao período entre meados de 1986 e o final do ano de 1987, a Comissão indica na decisão (n.° 132 dos considerandos): «mesmo que antes de, aproximadamente, finais de 1987 a colusão entre os produtores não tenha provavelmente resultado num acordo completo relativo ao 'preço em detrimento da tonelagem‘, tal não significa que o seu comportamento durante os 18 meses anteriores não seja abrangido pelo artigo 85.°» Na medida em que o início da colusão sobre os períodos de suspensão do funcionamento e o da colusão sobre as quotas de mercado deve ser fixado em finais do ano de 1987, esta afirmação da Comissão só pode visar a colusão sobre os preços.

145.
    Ora, uma vez que a recorrente não contesta ter participado numa prática concertada em matéria de preços (n.° 55 supra), não há que analisar a justeza desta qualificação.

146.
    Não tendo sido acolhido nenhum dos argumentos da recorrente, o fundamento deve ser julgado improcedente.

Fundamento baseado na legalidade dos sistema de intercâmbio de informações da Fides

Argumentos das partes

147.
    A recorrente alega que a Comissão considerou incorrectamente que o sistema de intercâmbio de informações da Fides constituía um elemento essencial da execução dos pretensos acordos sobre quotas e quantidades. Com efeito, os dados comunicados à Fides no âmbito do sistema de intercâmbio de informações foram agregados ao nível de cada país e não são portanto susceptíveis de permitir o controlo de um qualquer acordo ou um comportamento concertado.

148.
    Os dados trocados sobre os cadernos de encomendas, do modo como foram tratados pela Fides, limitaram-se a dar aos produtores uma visão geral da situação do conjunto do mercado. Quanto aos dados globais, que apenas se referem às encomendas já feitas, o seu intercâmbio não pode ter afectado a concorrência. Ao invés, serviu de base para as disposições individuais dos produtores (suspensão de actividade, venda nos mercados dos países terceiros, etc.).

149.
    Tratando-se dos relatórios relativos às capacidades, os distribuídos pela Fides só continham, no essencial, dados já conhecidos no mercado e retomados em manuais disponíveis e acessíveis a todos.

150.
    A Comissão salienta que as informações trocadas foram utilizadas para programar um comportamento concertado de todo o sector em matéria de preços e de quantidades (n.° 134 dos considerandos da decisão).

151.
    Além disto, as informações sobre as capacidades conjugadas com as informações relativas aos cadernos de encomendas permitiram aos produtores de cartão conhecer a taxa de utilização do sector. Ora, as informações relativas aos cadernos de encomendas não eram acessíveis aos clientes, pelo que não existia uma transparência geral do mercado. Além disso, para apreciar a importância dos relatórios sobre as capacidades, é preciso atender a todos os dados trocados.

152.
    A Comissão afirma que um intercâmbio de informações instituído para efeitos de concertação é abrangido, enquanto tal, pelo artigo 85.° do Tratado. Deste modo, não é pertinente a questão de saber se as estatísticas sobre as encomendas continham dados individualizáveis.

Apreciação do Tribunal

153.
    Segundo o artigo 1.° da decisão, as empresas visadas por esta disposição infringiram o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, ao participarem num acordo e prática concertada, através do qual as empresas, designadamente, «procederam ao intercâmbio de informações comerciais sobre os fornecimentos, preços, suspensões de actividade, cadernos de encomendas e taxas de utilização das máquinas em apoio às medidas supracitadas» isto é, uma colusão sobre os preços, uma colusão sobre as quotas de mercado e uma colusão sobre o período de suspensão de funcionamento.

154.
    No que se refere ao sistema de intercâmbio de informações da Fides, a decisão deve, à luz do seu dispositivo e do n.° 134, terceiro parágrafo, dos considerandos, ser interpretada no sentido de que a Comissão considerou esse sistema contrário ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, enquanto suporte do cartel detectado.

155.
    O n.° 134, terceiro parágrafo, dos considerandos da decisão precisa que o sistema de intercâmbio de informações da Fides «constituía um contributo essencial para:

—    controlar a evolução das quotas de mercado,

—    controlar as condições da oferta e da procura por forma a manter a plena utilização das capacidades,

—    decidir se podiam ser introduzidos aumentos de preços concertados,

—    determinar os períodos de suspensão necessários».

156.
    Além disto, conclui-se da decisão que as estatísticas da Fides foram examinadas e discutidas no âmbito do PWG. Com efeito, o n.° 57, primeiro parágrafo, dos considerandos, que remete também para o n.° 63, enuncia: «'A evolução das quotas de mercado‘ foi analisada em todas as reuniões do PWG com base em estatísticas provisórias». Além disto, o n.° 69, primeiro parágrafo, dos considerandos, precisa: «Era possível efectuar uma comparação entre a situação semanal das encomendas em carteira e a capacidade disponível, a partir da qual o PWG avaliava a situação geral da procura de cartão».

157.
    Há que considerar que estas alegações da Comissão estão provadas.

158.
    Em primeiro lugar, a recorrente não contesta que as estatísticas da Fides foram discutidas no âmbito do PWG.

159.
    Em segundo lugar, a Comissão considerou correctamente que as estatísticas da Fides foram utilizadas, por este órgão, para «controlar a evolução das quotas de mercado» (n.° 134, terceiro parágrafo, primeiro travessão) e para «controlar as condições da oferta e da procura por forma a manter a plena utilização das capacidades» e «determinar os períodos de suspensão necessários» (n.° 134, terceiro parágrafo, segundo e quarto travessões).

160.
    Com efeito, quanto à utilização das estatísticas da Fides para «controlar a evolução das quotas de mercado», o Stora reconheceu que «não obstante resultar da análise das estatísticas que o nível das vendas dos grupos nacionais conhecia desvios muito importantes, os membros do PWG... encorajavam-se reciprocamente e comprometiam-se a limitar as flutuações dos mercados nacionais» (anexo 39 à comunicação de acusações, n.° 19).

161.
    De igual modo, segundo o anexo 43 à comunicação de acusações (n.° 1.1):

«As flutuações da oferta nos mercados nacionais eram examinadas e discutidas em cada PWG (isto é, de 2 em 2 ou de 3 em 3 meses) com base em estatísticas provisórias da Fides (...) Estas estatísticas eram produzidas mensalmente, sendo o total calculado com base no ano civil e não com base no total do ano de exploração. As flutuações que as estatísticas apresentavam não reflectiam necessariamente de forma exacta a situação definitiva do fim do ano; daí a impossibilidade de se basear nestas flutuações com absoluta certeza. Seria absurdo que os principais produtores representados no PWG discutissem em pormenor as

quotas de mercado numa base nacional, dado que os produtores não estão em condições de determinar o destino final dos seus fornecimentos.

...

Os acordos sobre os níveis das quotas de mercado celebrados pelos membros do PWG referiam-se à Europa na sua totalidade. Esses acordos baseavam-se nos números anuais totais do ano anterior, que estavam habitualmente disponíveis de modo definitivo a partir de Março do ano seguinte.»

162.
    Quanto à utilização das estatísticas da Fides para «controlar as condições da oferta e da procura por forma a manter a plena utilização das capacidades» e «determinar os períodos de suspensão necessários», há que remeter para a declaração do Stora (anexo 39 à comunicação de acusações, n.° 5), segundo a qual:

«Relacionada com a iniciativa em matéria de preços de 1987 estava a necessidade de manter um estreito equilíbrio entre a produção e o consumo (política do preço em detrimento da tonelagem). Em 1988 e 1989, os produtores funcionaram em plena capacidade, ou quase. Em 1990, a associação de uma capacidade acrescida e de um crescimento reduzido da procura levou os produtores a procederem a períodos de suspensão do funcionamento, com o objectivo de preservar o equilíbrio entre a produção e o consumo (...) Os produtores podiam deduzir a partir dos relatórios anuais de capacidade a duração dos períodos de suspensão necessários e encorajavam-se reciprocamente a respeitar um período de suspensão suficiente para manter o equilíbrio entre a produção e a procura (...) Esses períodos de suspensão de funcionamento não eram praticados pela totalidade dos produtores, com a consequência de alguns deles, geralmente os mais importantes, sofrerem proporcionalmente mais perdas em termos de tonelagem na sua tentativa de manter os níveis de preços» (no mesmo sentido, n.° 25 do mesmo documento).

163.
    As declarações do Stora são indirectamente confortadas pelos anexos 73 e 75 à comunicação de acusações. Com efeito, conclui-se do anexo 73 (v., supra, n.os 109 e segs) que o director comercial responsável pelas vendas do grupo Mayr-Melnhof/FF-Karton na Alemanha (Sr. Katzner) propôs ao director-geral da recorrente na Áustria uma alteração dos sistemas de intercâmbio de informações da Fides então em vigor (p. 5, n.° 5, sob o título «Kontrolle»). Como se conclui do anexo 75 (p. 11), resposta da recorrente a um pedido de informações, as «regras da Fides foram ulteriormente alteradas mais ou menos no sentido das propostas» mencionadas no anexo 73 (v. também n.° 63, segundo parágrafo, dos considerandos da decisão). Tendo em conta o tom geral do anexo 73, o pedido de alteração do sistema de intercâmbio de informações da Fides formulado pelo Sr. Katzner deve ser entendido como significando que este sistema não permite um controlo suficiente da evolução das quotas de mercado e/ou do exame dos períodos de suspensão de funcionamento e que devia, por conseguinte, ser melhorado para garantir um melhor controlo.

164.
    Tendo em conta estas provas, e atendendo ao facto de que a Comissão considerou correctamente que a recorrente participou numa colusão sobre os períodos de suspensão do funcionamento e numa colusão sobre as quotas de mercado no âmbito do PWG, há que julgar o presente fundamento improcedente.

Pedido de anulação do artigo 2.° da decisão

Argumentos das partes

165.
    A recorrente alega, a título principal, que, no que se refere à proibição relativa ao intercâmbio de informações para o futuro, o artigo 2.° da decisão está formulado em termos demasiado imprecisos e gerais para que se possa apreciar o tipo de dados que no futuro pode ser legalmente objecto de intercâmbio. Com efeito, parece que quase todos os sistemas de intercâmbio de informações podem ser considerados abrangidos por essa proibição.

166.
    Além disto, o artigo 2.° da decisão não tem objecto, dado que se refere a medidas que foram abandonadas antes da reorganização do sistema de intercâmbio de informações e da criação da associação CEPI-Cartonboard (v. n.° 106 dos considerandos da decisão).

167.
    A título subsidiário, a recorrente alega que o artigo 2.° da decisão deve ser anulado na medida em que proíbe o intercâmbio de todos os dados, mesmos agregados, relativos à situação das entradas de encomendas e dos cadernos de encomendas, isto é, dados puramente estatísticos [v. a comunicação da Comissão relativa aos acordos, decisões e práticas concertadas sobre a cooperação entre empresas (JO 1968 C 75, p. 3, rectificação no JO 1968 C 84, p. 14) e o Sétimo Relatório sobre Política da Concorrência, n.° 7].

168.
    O intercâmbio destas informações não infringe o princípio segundo o qual qualquer operador económico deve determinar de maneira autónoma a política que pretende seguir no mercado (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Dezembro de 1991, BASF/Comissão, T-4/89, Colect., p. II-1523, n.° 240). Com efeito, o intercâmbio de dados puramente históricos e não individualizáveis só é contrário ao Tratado quando é acompanhado por uma cooperação maisaprofundada entre as empresas.

169.
    Por fim, a recorrente alega que o artigo 2.° da decisão antecipa o resultado da notificação dos sistema de intercâmbio de informações feito pela associação CEPI-Cartonboard à Comissão. Face a essa notificação, a Comissão é obrigada a verificar se estão reunidas as condições de uma isenção. Ora, o sistema de intercâmbio de informações notificado pela CEPI-Cartonboard refere-se precisamente ao intercâmbio de dados históricos relativos à situação das entradas de encomendas e dos cadernos de encomendas.

170.
    A Comissão contesta que a proibição relativa a um intercâmbio de informações no futuro seja demasiado imprecisa. Com efeito, basta que o dispositivo e os fundamentos da decisão indiquem o comportamento anticoncorrencial a que há que pôr termo (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 1975, Suiker Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73, 55/73, 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, Colect., p. 563, n.os 122 a 124). No caso em apreço, o artigo 2.°, primeiro parágrafo, alínea a) a alínea c), da decisão, inclui já uma descrição pormenorizada da natureza do intercâmbio de informações inadmissível. Acresce que as conclusões de facto relativas às informações trocadas foram expostas detalhadamente nos n.os 61 a 68, 105 e 106 dos considerandos da decisão. Além disto, a decisão inclui uma descrição precisa dos efeitos restritivos que o intercâmbio de informações produziu nas condições de concorrência (n.os 134 e 166 dos considerandos). Assim, o alcance da proibição decorre claramente de uma leitura conjugada do artigo 2.° da decisão e dos seus fundamentos.

171.
    Os segundo e terceiro parágrafos do artigo 2.° da decisão só contêm explicações relativas à forma que pode assumir um intercâmbio de informações admissível.

172.
    A Comissão contesta também que a proibição tenha um alcance demasiado vasto. Com efeito, o sistema de intercâmbio de informações foi incompatível com o artigo 85.° do Tratado mesmo após as alterações adoptadas pelo PWG em 27 de Novembro de 1991 (n.os 105 e 106 dos considerandos da decisão). Para analisar o intercâmbio de informações, é preciso ter em conta o elevado grau de concentração do sector, bem como o excelente conhecimento da estrutura e da política das diferentes empresas resultante da antiga cooperação no âmbito do PG Paperboard. Em mercados concentrados, a reserva de concorrência reside principalmente na incerteza e no segredo existentes entre os principais operadores quanto às condições do mercado. Ora, o intercâmbio de informações, a intervalos curtos, sobre os cadernos de encomendas torna o mercado artificialmente tão transparente que a reserva de concorrência que subsiste deixa, no fim de contas, de poder ser mobilizada.

173.
    Além disto, o intercâmbio semanal de estatísticas relativas à entrada de encomendas, conjugado com os relatórios sobre as capacidades, permite conhecer a utilização das capacidades no sector e programar os períodos de suspensões de produção ao nível do sector. Os produtores podem assim manter com equilíbrio entre a oferta e a procura e fazer face a uma diminuição dos preços em caso de diminuição da procura. Para observar a existência desses efeitos, a individualização dos dados não é relevante, tal como não é o facto de os dados se referirem a encomendas já efectuadas. Por conseguinte, a Comissão considerou acertadamente que o intercâmbio de informações sobre o estado do fluxo das encomendas bem como sobre os cadernos de encomendas, mesmo agregadas, era contrário ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, correspondendo esta conclusão às informações obtidas durante a instrução do processo.

174.
    Por fim, no que se refere ao sistema de intercâmbio de informações notificado pela associação CEPI-Cartonboard, a Comissão recorda que é diferente do intercâmbio de informações que foi objecto da decisão, tendo a CEPI-Cartonboard introduzido nomeadamente algumas alterações no seu sistema para ter em conta as reservas formuladas pela Comissão. Assim, nem sequer se lhe colocou a questão de uma eventual isenção no âmbito do presente processo.

Apreciação do Tribunal

175.
    Recorde-se o que dispõe o artigo 2.° da decisão:

«As empresas designadas no artigo 1.° porão termo imediatamente à referida infracção, se o não fizeram já. Renunciarão no futuro, no que se refere às suas actividades no sector do cartão, a quaisquer acordos ou práticas concertadas susceptíveis de terem um objecto ou efeito idêntico ou semelhante, incluindo o intercâmbio de qualquer informação comercial

a)    através da qual os participantes sejam directa ou indirectamente informados da produção, vendas, cadernos de encomendas, taxas de utilização das máquinas, preços de venda, custos ou planos de marketing de outros produtores;

    ou

b)    através da qual, mesmo que não sejam divulgadas quaisquer informações individuais, possa ser promovida, facilitada ou incentivada uma resposta comum do sector às condições económicas no que se refere aos preços ou ao controlo de produção;

    ou

c)    através da qual possam controlar a adesão a qualquer acordo expresso ou tácito relativo a preços ou à repartição de mercados na Comunidade, bem como o respectivo cumprimento.

Qualquer sistema de intercâmbio de informações gerais que subscrevam, tal como o sistema Fides ou o que o substituir, será explorado por forma a excluir não só quaisquer informações a partir das quais se possa identificar o comportamento de cada produtor, mas também quaisquer dados relativos ao estado actual do fluxo de encomendas e cadernos de encomendas, à taxa prevista de utilização das capacidades de produção (em ambos os casos, mesmo global) ou à capacidade de produção de cada máquina.

Qualquer sistema de intercâmbio de informações limitar-se-á à recolha e divulgação global de estatísticas de produção e vendas que não podem ser utilizadas para promover ou facilitar um comportamento comum do sector.

As empresas renunciarão também a qualquer intercâmbio de informações relevante em termos de concorrência, para além do intercâmbio de informações permitido, bem como a quaisquer reuniões ou qualquer outro tipo de contacto destinado a discutir a importância das informações trocadas ou a reacção possível ou plausível do sector ou de produtores individuais a essas informações.

Será concedido um período de três meses a partir da data de comunicação da presente decisão para que possam ser introduzidas as necessárias alterações ao sistema de intercâmbio de informações.»

176.
    Como resulta do n.° 165 dos considerandos, o artigo 2.° da decisão foi adoptado em aplicação do artigo 3.° do Regulamento n.° 17. Nos termos desta disposição, se a Comissão verificar uma infracção ao disposto no artigo 85.° pode, através de decisão, obrigar as empresas em causa a pôr termo a essa infracção.

177.
    É jurisprudência assente que a aplicação do artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento n.° 17 pode compreender a proibição de continuar determinadas actividades, práticas ou situações cuja ilegalidade tenha sido declarada (acórdãos do Tribunal de Justiça de 6 de Março de 1974, Istituto Chemioterapico Italiano e Commercial Solvents/Comissão, 6/73 e 7/73, Colect., p. 119, n.° 45, e de 6 de Abril de 1995, RTE e ITP/Comissão, C-242/91 P e C-242/91 P, Colect., p. I-743, n.° 90), mas também de adoptar um comportamento futuro semelhante (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Outubro de 1994, Tetra Pak/Comissão, T-83/91, Colect., p. II-755, n.° 220).

178.
    Além disso, na medida em que a aplicação do artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento n.° 17 se deve fazer em função da infracção detectada, a Comissão tem o poder de especificar o alcance das obrigações que incumbem às empresas em causa para porem termo à referida infracção. Estas obrigações impostas às empresas não devem, porém, ir além dos limites do que é adequado e necessário para atingir a finalidade prosseguida, isto é, a reposição da legalidade em relação às regras que foram infringidas (acórdão RTE e ITP/Comissão, já referido, n.° 93; no mesmo sentido, v. acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Junho de 1995, Langnese-Iglo/Comissão, T-7/93, Colect., p. II-1533, n.° 209, e Schöller/Comissão, T-9/93, Colect., p. II-1611, n.° 163).

179.
    No que respeita, em primeiro lugar, ao argumento da recorrente de que a Comissão cometeu um erro de direito ao adoptar o artigo 2.° da decisão sem ter tomado posição sobre a compatibilidade com o artigo 85.° do sistema de intercâmbio de informações notificado pela associação CEPI-Cartonboard, importa salientar que a notificação feita por aquela associação em 6 de Dezembro de 1993 se referia a um novo sistema de intercâmbio de informações, diferente do

examinado pela Comissão na decisão. A Comissão, ao adoptar o artigo 2.° da decisão impugnada, não pôde consequentemente apreciar a legalidade do novo sistema no âmbito dessa decisão. Podia portanto legitimamente limitar-se a examinar o antigo sistema de intercâmbio de informações e a tomar posição sobre este ao adoptar o artigo 2.° da decisão.

180.
    Além disto, há que rejeitar o argumento da recorrente de que a Comissão não podia utilizar o poder de dirigir intimações às empresas nos termos do artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento n.° 17, na medida em que essas intimações incidem sobre aspectos do sistema de intercâmbio de informações que foram abandonados antes da adopção da decisão. Quanto a isto, basta notar que a recorrente contesta o alcance material das intimações contidas no artigo 2.° da decisão, o que demonstra o interesse legítimo que tinha a Comissão em precisar o alcance das obrigações que incumbem às empresas, entre as quais a recorrente (v., no mesmo sentido, o acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Março de 1983, GVL/Comissão, 7/82, Recueil, p. 483, n.os 26 a 28).

181.
    A fim de verificar, em seguida, se, como afirma a recorrente, a intimação contida no artigo 2.° da decisão tem um alcance demasiado amplo, importa analisar a extensão das diversas proibições que impõe às empresas.

182.
    A proibição constante do artigo 2.°, primeiro parágrafo, segunda frase, que consiste em as empresas renunciarem no futuro a quaisquer acordos ou práticas concertadas susceptíveis de terem um objecto ou um efeito idêntico ou semelhante ao das infracções constatadas no artigo 1.° da decisão, tem como única finalidade que as empresas sejam impedidas de repetir os comportamentos cuja ilegalidade foi declarada. Consequentemente, a Comissão, ao adoptar tal proibição, não ultrapassou os poderes que lhe são conferidos pelo artigo 3.° do Regulamento n.° 17.

183.
    As disposições constantes do artigo 2.°, primeiro parágrafo, alínea a), alínea b) e alínea c), contêm, mais especificamente, proibições de futuros intercâmbios de informações comerciais.

184.
    A intimação contida no artigo 2.°, primeiro parágrafo, alínea a), que proíbe para o futuro o intercâmbio de qualquer informação comercial através da qual os participantes sejam directa ou indirectamente informados sobre empresas concorrentes, pressupõe que a ilegalidade de um intercâmbio de informações dessa natureza, por força do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, tenha sido declarada pela Comissão na decisão.

185.
    A este propósito, importa reconhecer que o artigo 1.° da decisão não indica queo intercâmbio de informações comerciais individuais constitua, em si mesmo, uma violação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

186.
    De forma mais geral, dispõe que as empresas infringiram este artigo do Tratado, ao participarem num acordo e prática concertada, através do qual as empresas, designadamente, «procederam ao intercâmbio de informações comerciais sobre os fornecimentos, preços, suspensões de actividade, cadernos de encomendas e taxas de utilização das máquinas em apoio às medidas supracitadas».

187.
    No entanto, uma vez que o dispositivo da decisão deve ser interpretado à luz da sua exposição de motivos (acórdão Suiker Unie e o./Comissão, já referido, n.° 122), importa sublinhar que o n.° 134, segundo parágrafo, dos considerandos da decisão indica:

«O intercâmbio entre produtores, nas reuniões do PG Paperboard (principalmente do JMC), de informações comerciais normalmente confidenciais e delicadas quanto aos cadernos de encomendas, suspensões de actividade e taxas de produção era manifestamente contrário às regras de concorrência, destinando-se a garantir que as condições de aplicação das iniciativas concertadas em matéria de preços seriam tão propícias quanto possível...»

188.
    Consequentemente, tendo a Comissão devidamente considerado na decisão que o intercâmbio de informações comerciais individuais constituía, por si só, uma violação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, a proibição futura dos intercâmbios de informações preenche as condições requeridas para a aplicação do artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento n.° 17.

189.
    Por seu turno, as proibições relativas aos intercâmbios de informações comerciais constantes do artigo 2.°, primeiro parágrafo, alínea b) e alínea c), da decisão devem ser analisadas à luz dos segundo, terceiro e quarto parágrafos deste mesmo artigo, que reforçam o seu conteúdo. Efectivamente, é neste contexto que importa determinar se, e, em caso afirmativo, em que medida, a Comissão considerou ilegais os intercâmbios em causa, uma vez que a extensão das obrigações que são impostas às empresas deve ser limitada àquilo que for necessário para restabelecer a legalidade dos seus comportamentos à luz do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

190.
    A decisão deve ser interpretada no sentido de que a Comissão considerou o sistema Fides contrário ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, enquanto suporte do cartel detectado (n.° 134, terceiro parágrafo, dos considerandos da decisão). Esta interpretação é corroborada pela redacção do artigo 1.° da decisão, da qual resulta que as informações comerciais foram trocadas entre as empresas, «em apoio às medidas» consideradas contrárias ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.

191.
    É à luz desta interpretação pela Comissão, da compatibilidade, nesta situação, do sistema Fides com o artigo 85.° do Tratado, que deve ser apreciada a extensão das proibições futuras contidas no artigo 2.°, primeiro parágrafo, alínea b) e alínea c), da decisão.

192.
    A este propósito, por um lado, as proibições em causa não se limitam aos intercâmbios de informações comerciais individuais, aplicando-se também ao intercâmbio de certos dados estatísticos globais [artigo 2.°, primeiro parágrafo, alínea b), e segundo parágrafo, da decisão]. Por outro lado, o artigo 2.°, primeiro parágrafo, alínea b) e alínea c), da decisão proíbe o intercâmbio de certas informações estatísticas, com vista a evitar a constituição de um possível suporte da adopção de potenciais comportamentos anticoncorrenciais.

193.
    Esta proibição, na medida em que se destina a impedir o intercâmbio de informações puramente estatísticas sem a natureza de informações individuais ou individualizáveis, com o fundamento de que as informações trocadas poderiam ser utilizadas para fins anticoncorrenciais, excede aquilo que é necessário para restabelecer a legalidade dos comportamentos detectados. Efectivamente, por um lado, não resulta da decisão que a Comissão tenha considerado o intercâmbio de dados estatísticos, por si só, uma infracção ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado. Por outro lado, o simples facto de um sistema de intercâmbio de informações estatísticas poder ser utilizado para fins anticoncorrenciais não significa que seja contrário ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, uma vez que, em tais circunstâncias, há que verificar, em concreto, os efeitos anticoncorrenciais.

194.
    Consequentemente, devem ser anulados os primeiro a quarto parágrafos do artigo 2.° da decisão, com excepção das seguintes passagens:

«As empresas designadas no artigo 1.° porão termo imediatamente à referida infracção, se o não fizeram já. Renunciarão no futuro, no que se refere às suas actividades no sector do cartão, a quaisquer acordos ou práticas concertadas susceptíveis de terem um objecto ou efeito idêntico ou semelhante, incluindo o intercâmbio de qualquer informação comercial

a)    através da qual os participantes sejam directa ou indirectamente informados da produção, vendas, cadernos de encomendas, taxas de utilização das máquinas, preços de venda, custos ou planos de marketing de outros produtores.

Qualquer sistema de intercâmbio de informações gerais que subscrevam, tal como o sistema Fides ou o que o substituir, será explorado por forma a excluir quaisquer informações a partir das quais se possa identificar o comportamento de cada produtor.»

Pedido de anulação da coima ou de redução do seu montante

A — Fundamento baseado na existência de erros manifestos de direito ou de facto na fixação do montante geral das coimas

195.
    Este fundamento inclui cinco partes. Cada uma será objecto de uma análise distinta.

Primeira parte, baseada em erros cometidos pela Comissão na determinação do alcance das infracções

196.
    Referindo-se aos fundamentos que invoca em apoio do pedido de anulação do artigo 1.° da decisão, a recorrente alega que o nível geral das coimas devia ser consideravelmente reduzido. Com efeito, a Comissão não provou a existência de acordos ou de práticas concertadas destinadas a proceder à repartição do mercado e ao controlo da oferta, nem a existência de acordos em matéria de preços.

197.
    Há que recordar que o conjunto dos fundamentos invocados pela recorrente em apoio do pedido de anulação do artigo 1.° da decisão foi julgado improcedente.

198.
    Por conseguinte, não pode ser acolhida a primeira parte do presente fundamento.

Segunda parte, baseada na inexistência de regulação em pormenor do mercado do cartão na Comunidade

Argumentos das partes

199.
    A recorrente afirma que, mesmo admitindo que as infracções alegadas tenham sido cometidas, não se tratava de regulamentar «em pormenor o mercado do cartão na Comunidade» (n.° 168, quinto travessão, dos considerandos da decisão). Pelo contrário, as pretensas infracções só poderão ter tido uma incidência muito geral sobre a concorrência.

200.
    Neste contexto, a decisão contém indicações contraditórias sobre o carácter das medidas anticoncorrenciais pretensamente postas em prática. Por exemplo, a alegada colusão quanto à repartição do mercado é descrita, no n.° 52 dos considerandos, como um consentimento geral de não aumentar as respectivas quotas de mercado, enquanto no n.° 60 se mencionam as negociações anuais sobre as quotas de mercado. Em qualquer caso, não se tratou de uma regulação pormenorizada do mercado do cartão, tanto mais que a Comissão nem sequer afirmou que existia uma concertação para determinar quotas relativamente a cada qualidade de cartão.

201.
    A Comissão mantém, com base nas conclusões a que chegou na decisão, que os produtores regularam em pormenor o mercado do cartão.

Apreciação do Tribunal

202.
    Já se verificou que a Comissão provou a existência, na esfera da recorrente, de elementos constitutivos da infracção declarada no artigo 1.° da decisão, isto é, uma colusão sobre os preços, uma colusão sobre os períodos de suspensão do

funcionamento e uma colusão sobre as quotas de mercado. Verificou-se também que os participantes nas reuniões do PWG, entre os quais a recorrente, celebraram um acordo em finais de 1987. Além disto, a recorrente não contesta que as datas e a ordem do envio das cartas de anúncio dos aumentos de preços eram orquestradas pelo PWG e que o JMC era informado (v., nomeadamente, o n.° 73 dos considerandos da decisão), nem que o JMC tinha por objectivo definir as modalidades das iniciativas em matéria de preços decididas pelo PWG, relativamente a cada país e aos principais clientes (n.° 44, segundo parágrafo, segundo travessão, dos considerandos).

203.
    Por fim, a recorrente não contesta a conclusão da Comissão de que «o cartel abrangia praticamente todo o território da Comunidade», nem que «as empresas que participaram na infracção (abrangiam) praticamente a totalidade do mercado» (n.° 168, segundo e quarto travessões, dos considerandos da decisão).

204.
    Nestas condições, não se pode validamente contestar a afirmação da Comissão de que as empresas que participaram na infracção tinham regulado «em pormenor o mercado do cartão na Comunidade» (n.° 168, quinto parágrafo, dos considerandos).

205.
    A segunda parte do fundamento não pode portanto ser acolhida.

Terceira parte, baseada no facto de o carácter secreto e a dissimulação não deverem ser considerados elementos agravantes da infracção

Argumentos das partes

206.
    A recorrente alega que a Comissão considerou que o facto de terem sido adoptadas medidas complexas para dissimular a natureza e o alcance da colusão constituía um elemento agravante (n.os 167 e 168 dos considerandos da decisão).

207.
    A inexistência de actas oficiais ou de documentos relativos às reuniões do PWG e do JMC não podem de modo algum constituir uma medida complexa. A afirmação da Comissão de que foram adoptadas medidas para evitar que os participantes nas reuniões tomassem notas não foi provada. Admitindo-as provadas, essas medidas também não constituem medidas complexas. De qualquer modo, tendo a Comissão considerado, aliás erradamente, que as infracções foram cometidas deliberadamente, não podia ter igualmente em consideração as pretensas medidas destinadas a dissimular o cartel.

208.
    Quanto à alegada orquestração prévia das datas de entrada em vigor dos aumentos de preços, a recorrente sublinha que a concertação em matéria de preços implicou necessariamente uma concertação relativa à execução dos aumentos de preços, pelo menos no que se refere aos «líderes». Tendo a Comissão considerado que as infracções haviam sido cometidas deliberadamente, não podia ter igualmente em

consideração os elementos que apresentam um nexo necessário com a violação intencional.

209.
    A Comissão alega que podia considerar que a prática do segredo devia ser tomada em consideração para apreciar a gravidade da infracção. Com efeito, as infracções intencionais às regras de concorrência não são necessariamente acompanhadas demedidas de dissimulação. No caso em apreço, os participantes no cartel não só acordaram em não conservar notas das discussões (acta da audição na Comissão, p. 46), mas também programaram minuciosamente o desenrolar das diferentes iniciativas em matéria de preços (n.os 73 dos considerandos da decisão). Assim, a Comissão considerou acertadamente que a prática do segredo constituía um aspecto agravante da infracção a ter em conta para o cálculo das coimas.

210.
    Nos termos do n.° 167, terceiro parágrafo, dos considerandos da decisão, «Um aspecto particularmente grave da infracção consiste no facto de, na sua tentativa de dissimular a existência do cartel, as empresas terem chegado a orquestrar antecipadamente a data e a sequência dos anúncios dos novos aumentos de preços a serem feitos por cada grande produtor.» A decisão salienta também que «... os produtores poderiam, através deste elaborado esquema de fraude, atribuir a série de aumentos de preços uniformes, regulares e a nível de todo o sector do cartão, ao fenómeno do 'comportamento em oligopólio‘ (n.° 73, terceiro parágrafo, dos considerandos). Finalmente, segundo o n.° 168, sexto travessão, dos considerandos, na determinação do nível geral das coimas, a Comissão tomou em consideração o facto de «[terem sido] adoptadas medidas complexas no sentido de dissimular a verdadeira natureza e extensão da colusão (ausência de quaisquer actas oficiais ou documentação do PWG e do JMC; os participantes eram dissuadidos de tomar notas; encenação das datas e ordenação do anúncio dos aumentos de preços por forma a que pudesse ser alegado que tais aumentos 'seguiam‘ o primeiro, etc.)».

211.
    A recorrente não contesta a afirmação da Comissão de que as empresas programaram as datas e a ordem de envio das cartas que anunciavam os aumentos de preços. Além disto, quanto à conclusão da Comissão de que esta orquestração das datas e da ordem das cartas de anúncio dos aumentos de preços tinha por objectivo tentar dissimular a existência da concertação sobre os preços, a recorrente não dá qualquer explicação susceptível de provar que a concertação sobre as datas e a ordem das cartas de anúncio dos aumentos de preço tinha um objectivo diferente do indicado pela Comissão.

212.
    A inexistência de actas oficiais e a inexistência quase total de notas internas sobre as reuniões do PWG e do JMC constituem, atendendo ao seu número, à sua duração e à natureza das discussões em causa, uma prova suficiente da alegação da Comissão segundo a qual os participantes eram dissuadidos de tomar notas.

213.
    Resulta de quanto precede que as empresas que participaram nas reuniões destes órgãos não só estavam bem conscientes da ilegalidade do seu comportamento como adoptaram medidas de dissimulação da colusão. Por conseguinte, ao apreciar a

gravidade da infracção, a Comissão considerou com razão que estas medidas constituíam circunstâncias agravantes.

214.
    A terceira parte do fundamento deve portanto ser julgada improcedente.

Quarta parte do fundamento, baseada no facto de a Comissão ter incorrectamente considerado que o cartel «alcançou com êxito os seus objectivos»

Argumentos das partes

215.
    A recorrente contesta que o cartel «alcançou com êxito os seus objectivos» (n.° 168, sétimo travessão, dos considerandos da decisão). Baseando-se na sua descrição das especificidades do mercado do cartão (supra, n.os 48 e segs.) e no relatório LE, alega que nada permite afirmar que a evolução em matéria de preços não teria sido totalmente idêntica se não existisse concertação entre os produtores.

216.
    Afirma que as conclusões da Comissão relativas à evolução dos custos e do produto das vendas no sector do cartão não são válidas no que lhe diz respeito. Além disto, as indicações sobre a margem de exploração que constam da decisão (n.° 16 dos considerandos) são enganadoras. Com efeito, a amortização dos custos de investimento representa cerca de 27% do preço médio do cartão. Ora, a Comissão não teve em conta este elemento quando calculou a margem de exploração média dos produtores. Por conseguinte, quando indica que essa margem de exploração média se eleva a cerca de 20% para o período entre 1986 e 1991, isto significa, na realidade, uma perda real de cerca de 7%.

217.
    Em apoio das afirmações segundo as quais a concertação em matéria de preços não teve repercussões no mercado, a recorrente apresenta quadros que reproduzem a evolução das suas tarifas relativamente à evolução dos preços brutos que obteve de facto no mercado. Estes quadros, que reproduzem a evolução dos preços relativos a clientes e a qualidades de cartão representativos nos principais mercados nacionais, provam, em sua opinião, a diferença considerável que existe entre as tarifas e os preços de transacção.

218.
    A Comissão salienta, a título preliminar, que há que distinguir dois tipos de efeitos das iniciativas de preços no mercado. No que se refere ao primeiro tipo de efeitos, isto é, o facto de os preços acordados no PG Paperboard terem servido de base para as negociações com os clientes, a recorrente não contesta a sua existência. Deste modo, é inconcebível que não se tenham também verificado os efeitos do segundo tipo, isto é, as repercussões das iniciativas de aumento dos preços sobre os preços efectivos do mercado, uma vez que a base de negociação dos preços fixada pelo vendedor tem sempre incidência sobre o preço de transacção. Isto é tanto mais verdade quanto todos os vendedores adoptaram a mesma base de negociação.

219.
    Além disto, os produtores de cartão esforçaram-se, nas suas negociações com os clientes, por impor os aumentos de preços acordados (v. anexo 73 à comunicação de acusações, p. 2).

220.
    É certo que nem sempre foi possível impor os aumentos de preços nas mesmas proporções a todos os clientes e em todos os mercados (n.os 100 a 102 dos considerandos da decisão). Mas, como se conclui de vários documentos internos redigidos pelos próprios produtores (documentos C-4-1 e C-11-11), estas dificuldades na aplicação dos aumentos de preços não significam que não tenham tido êxito.

221.
    Os quadros invocados pela recorrente também não são susceptíveis de infirmar as constatações da Comissão. O valor probatório desses quadros não pode ser reconhecido, nomeadamente porque mostram aumentos de preços «bruscos». Além disto, apesar de a recorrente afirmar que os quadros mostram a evolução dos preços facturados referentes a clientes e a critérios representativos, a verdade é que não indica os critérios utilizados para escolher essas facturas.

222.
    O relatório LE não prova que não tenha havido uma correlação entre os preços anunciados e os preços de transacção. Ao invés, os quadros 10 e 11 desse relatório mostram claramente que a evolução dos preços de transacção seguiu em média os preços anunciados. Para o período 1988/89, o estudo demonstra mesmo uma correlação linear entre esses preços, o que foi, aliás, admitido pelo autor do estudo na audição realizada pela Comissão (acta, pp. 21 e 28). Consequentemente, os aumentos de tarifas uniformes permitiram que os produtores de cartão obtivessem um aumento notório dos preços de transacção.

223.
    Por fim, não é pertinente saber se os aumentos de tarifas uniformes foram efectivamente decididos, como afirma a recorrente, em função da evolução dos custos. Por outro lado, as indicações contidas na decisão relativas à evolução dos custos bem como à definição da margem de exploração foram retiradas do relatório LE.

Apreciação do Tribunal

224.
    Nos termos do n.° 168, sétimo travessão, dos considerandos da decisão, a Comissão determinou o montante geral das coimas tomando nomeadamente em consideração que «o cartel alcançou com êxito os seus objectivos». É ponto assente que esta consideração se refere aos efeitos no mercado da infracção declarada no artigo 1.° da decisão.

225.
    Para efeitos de fiscalização da apreciação feita pela Comissão sobre os efeitos da infracção, o Tribunal considera que basta analisar a apreciação dos efeitos da colusão sobre os preços. De facto, a análise dos efeitos da colusão sobre os preços, únicos efeitos contestados pela recorrente, permite apreciar, de modo geral, o êxito do cartel, uma vez que as colusões sobre os períodos de suspensão do

funcionamento e sobre as quotas de mercado tiveram por objectivo garantir o êxito das iniciativas concertadas em matéria de preços.

226.
    No que respeita à colusão sobre os preços, a Comissão apreciou os respectivos efeitos gerais. Por conseguinte, mesmo admitindo que os dados individuais fornecidos pela recorrente demonstram, como ela própria afirma, que a colusão sobre os preços teve para ela efeitos menos importantes do que os verificados no mercado europeu do cartão, encarado globalmente, esses dados individuais não são, por si só, suficientes para pôr em causa a apreciação da Comissão. Além disto, a afirmação da recorrente de que, no n.° 16 dos considerandos da decisão, a Comissão se baseou numa definição errada de margem de exploração média realizada pelos produtores de cartão, é também desprovida de pertinência. Com efeito, nada permite considerar que a Comissão tenha tido em conta a margem de exploração assim definida na sua apreciação dos efeitos sobre o mercado da colusão sobre os preços, nem sequer que a margem de exploração realizada devesse ter sido tida em conta para efeitos desta apreciação.

227.
    Resulta da decisão, como a Comissão confirmou na audiência, que foi estabelecida uma distinção entre três tipos de efeitos. Além disso, a Comissão baseou-se no facto de as iniciativas em matéria de preços terem sido globalmente consideradas um êxito pelos próprios produtores.

228.
    O primeiro tipo de efeitos tomado em conta pela Comissão, e não contestado pela recorrente, consistiu no facto de os aumentos de preços acordados terem sido efectivamente anunciados aos clientes. Os novos preços serviram assim de referência nas negociações individuais dos preços de transacção com os clientes (v., designadamente, n.os 100 e 101, quinto e sexto parágrafos, dos considerandos da decisão).

229.
    O segundo tipo de efeitos consistiu no facto de a evolução dos preços de transacção ter seguido a dos preços anunciados. A este propósito, a Comissão considera que «os produtores não só anunciavam os aumentos de preços acordados como também (salvo raras excepções) tomavam medidas firmes no sentido de os impor aos clientes» (n.° 101, primeiro parágrafo, dos considerandos da decisão). Admite que, por vezes, os clientes obtiveram concessões sobre a data de entrada em vigor dos aumentos, descontos ou reduções individuais, designadamente em caso de grandes encomendas, e que «a média líquida de aumento alcançada após todos os descontos, reduções e outras concessões era sempre inferior ao montante total do aumento anunciado» (n.° 102, último parágrafo, dos considerandos). No entanto, referindo-se aos gráficos contidos no relatório LE, estudo económico realizado, para efeitos do procedimento instruído pela Comissão, por conta de diversas empresas destinatárias da decisão, afirma que existiu, ao longo do período que é objecto da decisão, «uma estreita relação linear» entre a evolução dospreços anunciados e a evolução dos preços de transacção expressos em moedas nacionais ou convertidos em ecus. E conclui: «... Os aumentos de preços líquidos

alcançados seguem de perto os anúncios de preços embora com algum atraso. O próprio autor do relatório reconheceu durante a audição oral que tal acontecia relativamente a 1988 e 1989» (n.° 115, segundo parágrafo, dos considerandos).

230.
    Deve admitir-se que, na apreciação deste segundo tipo de efeitos, a Comissão teve razão em considerar que a existência de uma relação linear entre a evolução dos preços anunciados e a evolução dos preços de transacção constituía a prova de um efeito produzido sobre estes últimos pelas iniciativas em matéria de preços, em conformidade com o objectivo prosseguido pelos produtores. De facto, é ponto assente que, no mercado em causa, a prática de negociações individuais com os clientes implica que os preços de transacção não são, regra geral, idênticos aos preços anunciados. Consequentemente, não se pode esperar que os aumentos dos preços de transacção sejam idênticos aos aumentos de preços anunciados.

231.
    No que respeita à própria existência de uma correlação entre os aumentos de preços anunciados e os aumentos dos preços de transacção, a Comissão fez acertadamente referência ao relatório LE, uma vez que este constitui uma análise da evolução dos preços do cartão ao longo do período abrangido pela decisão, baseada em dados fornecidos por diversos produtores, entre os quais a própria recorrente.

232.
    No entanto, este relatório só parcialmente confirma, no tempo, a existência de uma «estreita relação linear». Efectivamente, a análise do período compreendido entre 1987 e 1991 revela três subperíodos distintos. A este propósito, na audição levada a efeito pela Comissão, o autor do relatório LE resumiu as suas conclusões do seguinte modo: «Não há correlação estreita, mesmo com um desfazamento, entre o aumento de preços anunciado e os preços do mercado, durante o período considerado, entre 1987 e 1988. Em contrapartida, tal correlação existe em 1988/1989, deteriorando-se posteriormente para assumir um carácter singular [oddly] no período de 1990/1991» (acta da audição, p. 28). Sublinhou igualmente que essas variações no tempo estavam intimamente relacionadas com as variações da procura (v., nomeadamente, a acta da audição, p. 20).

233.
    Estas conclusões orais do autor do relatório estão em conformidade com a análise desenvolvida no seu documento, designadamente com os gráficos que comparam a evolução dos preços anunciados e a evolução dos preços de transacção (relatório LE, gráficos 10 e 11, p. 29). Há que reconhecer que a Comissão só parcialmente provou a existência da «estreita relação linear» que invoca.

234.
    Na audiência, a Comissão indicou ter igualmente tomado em conta um terceiro tipo de efeitos da colusão sobre os preços e que consistiu no facto de o nível dos preços de transacção ter sido superior ao nível que teriam alcançado se não se tivesse verificado a colusão. A este respeito, a Comissão, sublinhando que as datas e a ordem dos anúncios dos aumentos de preços tinham sido programadas pelo PWG, considera, na decisão, que «é inconcebível em tais circunstâncias que os anúncios concertados de aumentos de preços não produzissem quaisquer efeitos

sobre os níveis de preços efectivamente registados» (n.° 136, terceiro parágrafo, dos considerandos da decisão). Todavia, o relatório LE (secção 3) estabeleceu um modelo que permite prever o nível de preços resultante das condições objectivas do mercado. Segundo este relatório, o nível dos preços, conforme determinados por factores económicos objectivos durante o período compreendido entre 1975 e 1991, terá evoluído, com pequenas variações, de modo idêntico ao dos preços de transacção praticados, incluindo durante o período que é objecto da decisão.

235.
    Apesar destas conclusões, a análise feita no relatório não permite concluir que as iniciativas concertadas em matéria de preços não permitiram aos produtores alcançar um nível de preços de transacção superior ao que teria resultado do livre jogo da concorrência. A este respeito, como sublinhou a Comissão na audiência, é possível que os factores tomados em conta na referida análise tenham sido influenciados pela existência da colusão. Assim, a Comissão alegou com razão que o comportamento de colusão poderá, por exemplo, ter limitado a iniciativa de as empresas reduzirem os custos. Ora, a Comissão não invocou a existência de nenhum erro directo na análise contida no relatório LE e também não apresentou as suas próprias análises económicas sobre a hipotética evolução dos preços de transacção na falta de concertação. Nestas condições, a sua afirmação de que o nível dos preços de transacção teria sido inferior se não se tivesse verificado uma colusão entre os produtores não pode ser confirmada.

236.
    Daqui resulta que a existência deste terceiro tipo de efeitos da colusão sobre os preços não foi provada.

237.
    As afirmações que precedem não são alteradas pela apreciação subjectiva dos produtores em que a Comissão se baseou para considerar que o cartel alcançou com êxito os seus objectivos. Quanto a este ponto, a Comissão baseou-se numa lista de documentos que forneceu na audiência. Ora, mesmo supondo que tenha podido basear a sua apreciação do eventual êxito das iniciativas em matéria de preços em documentos que dão conta de sentimentos subjectivos de certos produtores, há que reconhecer que diversas empresas, entre as quais a recorrente, evocaram na audiência, com razão, numerosos outros documentos dos autos que descrevem os problemas com que os produtores se debateram para a aplicação dos aumentos de preços acordados. Nestas condições, a referência feita pela Comissão às declarações dos próprios produtores não é suficiente para concluir que o cartel alcançou com êxito os seus objectivos.

238.
    Tendo em conta as considerações que precedem, os efeitos da infracção descritos pela Comissão só foram provados parcialmente. O Tribunal analisará o alcance desta conclusão, no âmbito da sua competência de plena jurisdição em matéria de coimas, quando proceder à análise da gravidade da infracção declarada no presente processo (v., infra, n.° 262).

Quinta parte do fundamento, baseada na tomada em consideração de uma margem de exploração errada

Argumentos das partes

239.
    A recorrente repete que a Comissão considerou erradamente que as empresas do sector do cartão realizaram uma margem de exploração de 20% no período de 1986 a 1991. Com efeito, baseando-se neste número, a Comissão não teve em conta os consideráveis custos de investimento no sector (v., supra, n.° 216). Ainda que não decorra expressamente da decisão que este elemento foi tido em conta na fixação do nível geral das coimas, importa considerar que este erro desempenhou um papel essencial, uma vez que esta margem de exploração é várias vezes referida na decisão. Além disto, a tomada em consideração do benefício financeiro que as sociedades retiraram do seu comportamento anticoncorrencial é, segundo a própria Comissão, um elemento determinante na fixação das coimas (Vigésimo Primeiro Relatório sobre a Política da Concorrência, n.° 139). Este erro deveria implicar uma redução considerável da coima.

240.
    A Comissão defende que a margem de exploração média dos fabricantes do cartão não foi tida em consideração no cálculo da coima. Além disto, no seu Vigésimo Primeiro Relatório sobre a Política da Concorrência, limitou-se a mencionar os critérios gerais admissíveis para o cálculo de uma coima. Por fim, as indicações sobre a margem de exploração contidas no n.° 16 dos considerandos da decisão estão correctas, dado que foram retiradas do relatório LE.

Apreciação do Tribunal

241.
    Verifica-se que a margem de exploração média realizada pelos fabricantes de cartão não faz parte dos elementos tidos em conta pela Comissão para determinar o nível geral das coimas e o montante das coimas individuais (v. n.os 167 a 169 dos considerandos da decisão).

242.
    De qualquer modo, conclui-se do n.° 16, último parágrafo, dos considerandos da decisão que as indicações relativas à margem de exploração média dos produtores de cartão foram retiradas do relatório LE. Conclui-se também (nota de pé de página n.° 1) que a Comissão não ignorou que essa margem de exploração média tinha sido calculada sem atender às amortizações dos custos de investimento.

243.
    Daqui resulta que o argumento da recorrente de que a Comissão se baseou numa definição errada do lucro realizado pelos produtores de cartão não tem fundamento.

244.
    Deste modo, não pode ser acolhida a quinta parte do fundamento.

245.
    Consequentemente, todo o fundamento deve ser julgado improcedente.

B — Fundamentos baseados na violação do artigo 190.° do Tratado e na violação do princípio da igualdade de tratamento quanto ao nível geral das coimas

Argumentos das partes

246.
    A recorrente reconhece que a Comissão pode aumentar o nível geral das coimas numa decisão relativamente à sua prática anterior quando considere necessário reforçar o seu efeito dissuasivo (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 1983, Music Diffusion française e o./Comissão, 100/80, 101/80, 102/80 e 103/80, Recueil, p. 1825, n.° 108, e acórdão ICI/Comissão, já referido). No entanto, a Comissão violou o artigo 190.° do Tratado e o princípio da igualdade de tratamento ao efectuar, como aconteceu no caso em apreço, um aumento arbitrário do nível das coimas sem dar qualquer justificação para isso.

247.
    A recorrente compara, em seguida, a taxa de base das coimas (7,5% do volume de negócios realizado no mercado comunitário do cartão em 1990 para os «membros normais» e 9% para os alegados «líderes») bem como o montante global das coimas aplicadas pelas decisões da Comissão em processos anteriores [v., por exemplo, Decisão 86/398/CEE da Comissão, de 23 de Abril de 1986, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CEE (IV/31.149 — Polipropileno, JO L 230, p. 1, a seguir «decisão polipropileno») e Decisão 89/191/CEE da Comissão, de 21 de Dezembro de 1988, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CEE (IV/31.866 — PEBD, JO 1989 L 74, p. 21). Daqui deduz que a taxa de base das coimas aplicadas no caso em apreço é consideravelmente superior às taxas anteriormente aplicadas e que, no que se refere aos alegados «líderes», a taxa praticamente duplicou. Além disto, o montante global das coimas é de longe superior às coimas anteriormente aplicadas.

248.
    Remetendo para a decisão que foi objecto do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Fevereiro de 1995, SPO e o./Comissão (T-29/92, Colect., p. II-289), contesta, além disto, que o comportamento em causa no presente processo possa ser considerado particularmente grave face aos processos sobre os quais se pronunciou anteriormente a Comissão.

249.
    O erro de apreciação da gravidade da infracção é ainda confirmado por uma comparação com o nível das coimas aplicado na Decisão 94/815/CE da Comissão,de 30 de Novembro de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE (Processo IV/33.126 e 33.322 — Cimento, JO L 343, p. 1).

250.
    A recorrente conclui que o nível das coimas aplicadas no presente processo sofreu um aumento considerável, mesmo exorbitante, relativamente ao aplicado em processos semelhantes. Sublinha que o membro da Comissão responsável pelas questões da concorrência indicou, num discurso proferido em 16 de Setembro de 1994, que, no caso em apreço, a Comissão tinha aumentado as coimas de modo considerável relativamente à sua prática anterior.

251.
    Mesmo admitindo mesmo que a Comissão não seja, em geral, obrigada a fundamentar em pormenor as suas decisões que aplicam coimas, seria necessário que explicasse as razões pelas quais se afastou de modo flagrante da prática seguida até então em matéria de coimas (v., no mesmo sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Novembro de 1975, Groupement des fabricants de papiers peints de Belgique e o./Comissão, 73/74, Colect., p. 503, n.os 30 a 33, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Outubro de 1994, Fiatagri e New Holland Ford/Comissão, T-34/92, Colect., p. II-905, n.° 35).

252.
    Por fim, a recorrente alega uma violação do artigo 6.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, de 4 de Novembro de 1950 (a seguir «CEDH»), que institui um direito à fiscalização jurisdicional, uma vez que só uma maior transparência permite verificar se a Comissão respeitou, em determinada situação, o princípio da igualdade de tratamento.

253.
    A Comissão recorda que está habilitada, nos termos do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, a aplicar coimas até 10% do volume de negócios anual global das empresas em causa. A taxa aplicada no caso em apreço situa-se largamente dentro dos limites previstos por esse regulamento, uma vez que apenas foi tido em conta o volume de negócios relativo às vendas de cartão na Comunidade.

254.
    Além disto, a Comissão pode aumentar em qualquer altura o nível das coimas nos limites fixados pelo Regulamento n.° 17, quando isso for necessário para realizar a política comunitária da concorrência, nomeadamente para garantir o efeito dissuasivo das coimas (acórdão Music Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.os 106 a 109). Ao proceder deste modo, não está vinculada pelas suas decisões anteriores (acórdão ICI/Comissão, já referido, n.os 382 e 385), sendo portanto pouco importante saber se o caso em apreço é comparável a processos anteriores ou se aumentou sensivelmente o nível geral das coimas. De qualquer modo, o nível das coimas não foi aumentado de forma arbitrária nem sensível em comparação com processos anteriores.

255.
    Por fim, a Comissão considerou correctamente que a infracção dada como assente era particularmente grave.

Apreciação do Tribunal

256.
    Nos termos do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17, a Comissão pode, mediante decisão, aplicar às empresas coimas de mil ecus, no mínimo, a um milhão de ecus, podendo este montante ser superior desde que não exceda dez por cento do volume de negócios realizado, durante o exercício anterior, por cada uma das empresas que tenha participado na infracção, sempre que, deliberada ou negligentemente, cometam uma infracção ao n.° 1 do artigo 85.° do Tratado. Para determinar o montante da coima, deve tomar-se em consideração, além da gravidade da infracção, a duração da mesma. Como resulta da jurisprudência do

Tribunal de Justiça, a gravidade das infracções deve ser determinada em função de um grande número de elementos, tais como, nomeadamente, as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas, e isto sem que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomados em consideração (despacho de 25 de Março de 1996, SPO e o./Comissão, C-137/95 P, Colect., p. I-1611, n.° 54).

257.
    No caso vertente, a Comissão determinou o nível geral das coimas tomando em conta a duração da infracção (n.° 167 dos considerandos da decisão) bem como as seguintes considerações (n.° 168 dos considerandos):

«—    a colusão em matéria de preços e a repartição de mercados constitui, por si só, uma grave restrição à concorrência,

—    o cartel abrangia praticamente todo o território da Comunidade,

—    o mercado do cartão da Comunidade é um importante sector industrial que representa anualmente cerca de 2 500 milhões de ecus,

—    as empresas que participaram na infracção abrangem praticamente a totalidade do mercado,

—    o cartel funcionou sob a forma de um sistema de reuniões regulares institucionalizadas com o objectivo de regular expressamente e em pormenor o mercado do cartão na Comunidade,

—    foram adoptadas medidas complexas no sentido de dissimular a verdadeira natureza e extensão da colusão (ausência de quaisquer actas oficiais ou documentação do PWG e do JMC; os participantes eram dissuadidos de tomar notas; encenação das datas e ordenação do anúncio dos aumentos de preços por forma a que pudesse ser alegado que tais aumentos 'seguiam‘ o primeiro, etc.),

—    o cartel alcançou com êxito os seus objectivos».

258.
    Além disso, o Tribunal recorda que é ponto assente que foram aplicadas coimas de um nível de base de 9 ou de 7,5% do volume de negócios realizado por cada uma das empresas destinatárias da decisão no mercado comunitário do cartão em 1990, respectivamente, às empresas consideradas «líderes» do cartel e às outras empresas.

259.
    Importa sublinhar, em primeiro lugar, que, na sua apreciação do nível geral das coimas, a Comissão tem o direito de tomar em conta o facto de as infracções manifestas às regras comunitárias da concorrência serem ainda relativamente frequentes e, portanto, tem perfeitamente legitimidade para aumentar o nível das

coimas a fim de reforçar o seu efeito dissuasivo. Consequentemente, o facto de a Comissão ter aplicado, no passado, coimas de certo nível a determinados tipos de infracções, não a priva da possibilidade de aumentar esse nível, nos limites indicados no Regulamento n.° 17, se isso for necessário para assegurar a execução da política comunitária da concorrência (v., nomeadamente, acórdãos Musique Diffusion française e o./Comissão, já referido, n.os 105 a 108, e ICI/Comissão, n.° 385).

260.
    Em segundo lugar, a Comissão considerou com razão que, dadas as circunstâncias próprias do caso em discussão, não se pode fazer uma comparação entre o nível geral das coimas adoptado na presente decisão e os adoptados na prática decisória anterior da Comissão, em especial, na decisão polipropileno, considerada pela própria Comissão como a mais comparável ao presente caso. De facto, contrariamente à situação que deu origem à decisão polipropileno, nenhuma circunstância atenuante geral foi tomada em conta neste caso para determinar o nível geral das coimas. Por outro lado, como o Tribunal já declarou, as medidas complexas adoptadas pelas empresas para dissimular a existência da infracção constituem um aspecto particularmente grave da própria infracção, que a caracteriza em relação às infracções anteriormente detectadas pela Comissão.

261.
    Em terceiro lugar, importa sublinhar a longa duração e o carácter manifesto da infracção ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, que foi cometida apesar da advertência que deveria ter constituído a prática decisória anterior da Comissão, designadamente, a decisão polipropileno.

262.
    Com base nestes elementos, deve considerar-se que os critérios descritos no n.° 168 dos considerandos da decisão indicam de modo suficiente as razões que levaram a Comissão a optar pelo nível geral das coimas aplicado e bastam para justificar esse nível. É certo que o Tribunal já declarou que os efeitos da colusão sobre os preços, considerados pela Comissão para a determinação do nível geral das coimas, só foram provados parcialmente. Todavia, à luz das considerações que precedem, esta conclusão não afecta de forma sensível a apreciação da gravidade da infracção constatada. A este propósito, o facto de as empresas terem efectivamente anunciado os aumentos de preços acordados e de os preços assim anunciados terem servido de base à fixação dos preços de transacção individuais basta, por si só, para concluir que a colusão sobre os preços teve como objectivo e como efeito uma grave restrição da concorrência. Assim, no quadro da sua competência de plena jurisdição, o Tribunal considera que as conclusões a que chegou no que respeita aos efeitos da infracção não justificam a redução do nível geral das coimas fixado pela Comissão.

263.
    Finalmente, ao fixar o nível geral das coimas, a Comissão não se afastou da sua prática decisória anterior de um modo tal que justificasse uma obrigação de fundamentar de forma mais circunstanciada a sua apreciação da gravidade da infracção (v., nomeadamente, o acórdão Groupement des fabricants de papiers peints de Belgique e o./Comissão, já referido, n.° 31).

264.
    O fundamento deve, por conseguinte, ser julgado improcedente.

C — Fundamento baseado na violação do artigo 190.° do Tratado na fixação do montante das coimas individuais

Argumentos das partes

265.
    A recorrente alega que a simples enumeração, no n.° 169 dos considerandos da decisão, dos critérios escolhidos para fixar as coimas individuais não constitui uma fundamentação suficiente. Com efeito, a decisão não contém indicações que permitam determinar o modo como foram calculadas as diferentes coimas, nem verificar se se justifica a distinção efectuada entre as diferentes empresas no que se refere às coimas. Impunha-se uma fundamentação mais pormenorizada, em especial quando, como no caso em apreço, se efectua uma diferenciação acentuada entre as empresas. Entre outros aspectos, na medida em que não se verificaram certas circunstâncias em que a Comissão se baseou, uma fiscalização jurisdicional do montante das coimas individuais pressupõe que o Tribunal conheça a importância que a Comissão atribuiu a cada circunstância considerada agravante. Isto é tanto mais necessário quanto, como no caso em apreço, existem indícios que provam que foram aplicadas coimas muito agravadas às empresas que não renunciaram aos seus direitos de defesa contra as acusações da Comissão.

266.
    Por outro lado, a Comissão reconheceu a necessidade de fundamentar mais detalhadamente o seu método de distinção entre as diferentes empresas, dado que, numa conferência de imprensa de 13 de Julho de 1994, deu indicações sobre esta questão, divulgando mesmo a fórmula matemática que alegadamente não utilizou. A fundamentação deveria, no entanto, ser parte integrante da própria decisão.

267.
    Por fim, a decisão não explica por que motivo a Comissão considerou que a recorrente não devia beneficiar de uma redução da coima, apesar de esta não ter contestado, na resposta à comunicação de acusações, as principais alegações de facto da Comissão. A Comissão devia ter indicado, na decisão, os elementos de facto reconhecidos ou não contestados durante o procedimento administrativo pelas empresas que beneficiaram de uma redução do montante das suas coimas.

268.
    A Comissão considera que a decisão contém uma exposição suficiente dos fundamentos determinantes para a fixação da coima de cada empresa. Com efeito,os critérios enumerados no n.° 169 dos considerandos da decisão devem ser lidos à luz do conjunto dos fundamentos da decisão (acórdão ICI/Comissão, já referido, n.° 355). Ora, precisamente, a decisão contém muitas indicações sobre a apreciação individual da recorrente (nomeadamente nos n.os 8, 9, 36 e segs., e 170, 173 dos considerandos).

269.
    A Comissão contesta que a fundamentação constante da decisão não permita uma fiscalização jurisdicional do respeito do princípio da proporcionalidade. Em seu

entender, a recorrente parte obviamente da ideia errada de que as coimas foram fixadas com base numa fórmula matemática, o que no entanto não foi o caso. Com efeito, a taxa de base escolhida foi alterada em função da situação específica de cada uma das empresas em causa. Além disto, os volumes de negócios, que são segredos de negócios, devem ser protegidos pela Comissão.

270.
    No que se refere às reduções concedidas por cooperação com a Comissão, esta observa que a decisão contém indicações sintéticas sobre os meios de defesa das diferentes empresas (n.os 107 a 110 dos considerandos) bem como sobre as apreciações que deles fez a Comissão (n.os 111 a 115 dos considerandos). Quanto à recorrente, conclui-se dos n.os 108 e 114 dos considerandos que a Comissão entendeu as suas observações eram materialmente incorrectas quando a pontos essenciais e não pode portanto considerar-se que confessou (v. também n.° 172 dos considerandos). A recorrente pôde portanto apreciar se foi penalizada de modo pertinente e sem discriminação relativamente às outras empresas.

271.
    Finalmente, a Comissão recorda que a fundamentação relativa ao cálculo das coimas individuais é comparável à da decisão polipropileno, cuja fundamentação foi considerada suficiente (acórdão ICI/Comissão, já referido, n.os 353 e 354).

Apreciação do Tribunal

272.
    O Tribunal já recordou o objectivo da obrigação de fundamentar uma decisão individual (v. supra n.° 42).

273.
    No que respeita a uma decisão que, como no presente caso, aplica coimas a diversas empresas por uma infracção às regras comunitárias da concorrência, há que determinar o alcance da obrigação de fundamentação, tendo em conta, designadamente, que a gravidade das infracções deve ser apreciada em função de um grande número de elementos (v., supra, n.° 256).

274.
    Além disso, ao fixar o montante de cada coima, a Comissão dispõe de um poder de apreciação e não pode ser obrigada a aplicar, para esse efeito, uma fórmula matemática precisa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 1995, Martinelli/Comissão, T-150/89, Colect., p. II-1165, n.° 59).

275.
    Na decisão, os critérios tomados em conta para determinar o nível geral das coimas e o montante das coimas individuais figuram, respectivamente, nos n.os 168 e 169 dos considerandos. Além disso, no que respeita às coimas individuais, a Comissão explica, no n.° 170 dos considerandos, que as empresas que participaram nas reuniões do PWG foram, em princípio, consideradas «líderes», ao passo que as outras empresas foram consideradas «membros normais» deste. Finalmente, nos n.os 171 e 172 dos considerandos, indica que os montantes das coimas aplicadas à Rena e ao grupo Stora devem ser substancialmente reduzidos, a fim de ter em conta a sua cooperação activa com a Comissão, e que oito outras empresas podem igualmente beneficiar de uma redução, numa proporção inferior, pelo facto de, na

resposta que apresentaram à comunicação de acusações, não terem negado as principais alegações de facto em que a Comissão baseava as suas acusações.

276.
    Nas peças processuais apresentadas ao Tribunal e na resposta que deu a uma pergunta escrita deste, a Comissão explicou que as coimas foram calculadas com base no volume de negócios realizado por cada uma das empresas destinatárias da decisão, no mercado comunitário do cartão, em 1990. Coimas de um nível de base de 9 ou de 7,5% deste volume de negócios individual foram assim aplicadas, respectivamente, às empresas consideradas «líderes» do cartel e às outras empresas. Finalmente, a Comissão tomou em consideração a eventual atitude cooperante de certas empresas ao longo do procedimento administrativo. Duas empresas beneficiaram, por esse facto, de uma redução de dois terços do montante das suas coimas, enquanto outras empresas beneficiaram de uma redução de um terço.

277.
    De resto, resulta de um quadro fornecido pela Comissão, e que contém indicações quanto à fixação do montante de cada uma das coimas individuais, que, embora não tenham sido determinadas aplicando de forma estritamente matemática apenas os dados numéricos acima mencionados, os referidos dados foram sistematicamente tomados em conta para efeitos do cálculo das coimas.

278.
    Ora, a decisão não precisa que as coimas foram calculadas com base no volume de negócios realizado por cada uma das empresas, no mercado comunitário do cartão, em 1990. Além disso, as taxas de base de 9 e de 7,5% aplicadas para calcular as coimas a pagar, respectivamente, pelas empresas consideradas «líderes» e pelos «membros normais», não figuram na decisão. Também não constam da decisão as taxas das reduções concedidas à Rena e ao grupo Stora, por um lado, e a oito outras empresas, por outro.

279.
    No caso vertente, importa considerar, em primeiro lugar, que, interpretados à luz da exposição pormenorizada que é feita, na decisão, das alegações de facto formuladas em relação a cada destinatário da decisão, os n.os 169 a 172 dos considerandos desta contêm uma indicação suficiente e pertinente dos elementos de apreciação tomados em consideração para determinar a gravidade e a duração da infracção cometida por cada uma das empresas em causa (v., neste sentido, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Outubro de 1991, Petrofina/Comissão, T-2/89, Colect., p. II-1087, n.° 264). Além disto, a descrição dos critérios que justificaram as reduções do montante das coimas e a enumeração das empresas que beneficiaram dessas reduções (n.os 171 e 172 dos considerandos) permitem compreender o raciocínio da Comissão. Consequentemente, esta não era obrigada a explicar mais pormenorizadamente a aplicação individual desses critérios.

280.
    Em segundo lugar, quando o montante de cada coima é, como no presente caso, determinado com base na tomada em consideração sistemática de certos dados

precisos, a indicação, na decisão, de cada um desses factores permite às empresas apreciar mais correctamente se a Comissão cometeu algum erro ao fixar o montante da coima individual e se o montante de cada coima individual se justifica relativamente aos critérios gerais aplicados. No caso vertente, a indicação, na decisão, dos factores em causa, isto é, o volume de negócios de referência, o ano de referência, as taxas de base consideradas e a taxa de redução do montante das coimas, não incluiu a divulgação implícita do volume de negócios preciso das empresas destinatárias da decisão, divulgação que poderia ter constituído uma violação do artigo 214.° do Tratado. Efectivamente, o montante final de cada coima individual não resulta, como a própria Comissão sublinhou, de uma aplicação estritamente matemática dos referidos factores.

281.
    Aliás, a Comissão reconheceu, na audiência, que nada a impediu de indicar, na decisão, os factores tomados sistematicamente em conta e que tinham sido divulgados numa conferência de imprensa que teve lugar no dia em que a decisão foi adoptada. A este propósito, deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante, a fundamentação de uma decisão deve figurar no próprio corpo dessa decisão e que explicações posteriores fornecidas pela Comissão não podem, salvo circunstâncias excepcionais, ser tomadas em consideração (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 2 de Julho de 1992, Dansk Pelsdyravlerforening/Comissão, T-61/89, Colect., p. II-1931, n.° 131, e, no mesmo sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1991, Hilti/Comissão, T-30/89, Colect., p. II-1439, n.° 136).

282.
    Não obstante o que acaba de se afirmar, deve sublinhar-se que a fundamentação relativa à fixação do montante das coimas, contida nos n.os 167 a 172 dos considerandos da decisão, é, pelo menos, tão pormenorizada como as constantes das decisões anteriores da Comissão sobre infracções semelhantes. Ora, embora o fundamento baseado num vício de fundamentação seja de ordem pública, no momento da adopção da decisão, nenhuma crítica tinha ainda sido feita pelo juiz comunitário quanto à prática seguida pela Comissão em matéria de fundamentação das coimas aplicadas. Só no acórdão de 6 de Abril de 1995, Tréfilunion/Comissão (T-148/89, Colect., p. II-1063, n.° 142), e em dois outros acórdãos proferidos no mesmo dia, Société métallurgique de Normandie/Comissão (T-147/89, Colect., p. II-1057, publicação sumária) e Société des treillis et panneaux soudés/Comissão (T-151/89, Colect., p. II-1191, publicação sumária), é que o Tribunal de Primeira Instância sublinhou, pela primeira vez, ser desejável que as empresas pudessem conhecer em pormenor o modo de cálculo da coima que lhes foi aplicada, sem serem obrigadas, para tal, a interpor um recurso jurisdicional contra a decisão da Comissão.

283.
    Daqui resulta que, quando uma decisão conclui pela existência de uma infracção às regras da concorrência e aplica coimas às empresas que nela participaram, a Comissão deve, se tiver sistematicamente tomado em conta certos elementos de base para fixar o montante das coimas, indicar esses elementos no corpo da

decisão, a fim de permitir aos destinatários desta verificar as razões que levaram à fixação do nível da coima e apreciar a existência de uma eventual discriminação.

284.
    Nas circunstâncias excepcionais salientadas no n.° 282, supra, e tendo em conta que a Comissão se mostrou disposta a fornecer, na fase contenciosa do processo, qualquer informação pertinente relativa ao modo de cálculo das coimas, a falta de fundamentação específica, na decisão, quanto ao modo de cálculo das coimas, não deve, neste caso, ser considerada uma violação da obrigação de fundamentação, susceptível de justificar a anulação total ou parcial das coimas aplicadas.

285.
    Consequentemente, o presente fundamento não pode ser acolhido.

D — Fundamento baseado no facto de a recorrente ter sido erradamente qualificada como líder do cartel

Argumentos das partes

286.
    A recorrente alega que a Comissão a considerou erradamente como um dos líderes do cartel. Recorda que a Comissão apenas invocou um único elemento em apoio desta afirmação, isto é, o facto de estar representada no seio do PWG (n.° 170 dos considerandos da decisão). este elemento não pode no entanto ser considerado suficiente, tanto mais que a Comissão não explicou o motivo porque as empresas Weig e KNP — igualmente representadas no PWG — não foram consideradas líderes.

287.
    Também não é justificado considerar a recorrente líder por ter garantido a presidência do PWG durante menos de um semestre.

288.
    A recorrente contesta que os participantes nas reuniões do PWG tenham incentivado o cartel. Todos os participantes nas reuniões dos diferentes órgãos do PG Paperboard participaram em todas as discussões que se pode considerar que violaram o artigo 85.° do Tratado. Além disto, a própria Comissão afirma que oconjunto dos órgãos do PG Paperboard exercia funções que faziam parte de um plano global comum que visava restringir a concorrência e que cada uma das empresas participou nesse sistema global.

289.
    A Comissão alega que a recorrente deve ser considerada um dos líderes do cartel devido à sua participação nas reuniões do PWG, órgão no qual foram adoptadas as principais decisões relativas às iniciativas em matéria de preços bem como as relativas à política do «preço em detrimento da tonelagem» (n.os 36 a 40 dos considerandos da decisão). Além disto, tendo em conta o facto de a recorrente ter presidido muito tempo o PWG, há que considerar que desempenhou um papel particularmente activo.

Apreciação do Tribunal

290.
    Conclui-se das afirmações relativas aos fundamentos invocados pela recorrente em apoio do pedido de anulação do artigo 1.° da decisão que a natureza das funções do PWG, tal como descritas na decisão, foi correctamente estabelecida pela Comissão. Foi também provado o papel desempenhado, em especial no final de 1987, pelas empresas reunidas nesse órgão.

291.
    Nestas condições, a Comissão concluiu acertadamente que as empresas, entre as quais a recorrente, que participaram nas reuniões deste órgão deviam ser consideradas «líderes» da infracção constatada e, por esse facto, especialmente responsáveis (v. n.° 170, primeiro parágrafo, dos considerandos da decisão). Quanto a isto, sublinhe-se que o critério escolhido pela Comissão para qualificar as empresas como «líderes» não foi a presidência do PWG mas a participação nas reuniões desse órgão.

292.
    No caso em apreço, é ponto assente que a recorrente não participou nas reuniões do PWG desde a criação deste órgão. Além disto, não demonstrou que teve um papel essencialmente passivo nos órgãos do PG Paperboard.

293.
    A alegação de que todas as empresas que participaram nas reuniões dos diversos órgãos do PG Paperboard devem ser consideradas responsáveis da infracção, mesmo admitindo que se venha a revelar infundada, não afecta a conclusão de que as empresas reunidas no PWG desempenharam um papel crucial na concepção e na execução das actuações ilícitas.

294.
    Por fim, o Tribunal considera que a decisão contém explicações suficientes que permitem apreciar o papel desempenhado pela KNP e pela Weig. Assim, segundo o n.° 170, segundo parágrafo, dos considerandos, a KNP só foi considerada líder do cartel durante o período da sua participação nas reuniões do PWG, isto é, durante um período menor do que o da sua participação no cartel. Além disto, a Comissão declara ter tido em conta o facto de a Weig, apesar de ser membro do PWG, não ter aparentemente desempenhado um papel importante na determinação da política do cartel (n.° 170, terceiro parágrafo, dos considerandos). A afirmação da recorrente de que foi objecto de um tratamento discriminatório relativamente a essas empresas é portanto desprovida de fundamento.

295.
    Por conseguinte, o presente fundamento deve ser julgado improcedente.

E — Fundamento baseado na violação dos direitos de defesa

Argumentos das partes

296.
    A recorrente alega que foram violados os seus direitos de defesa. O montante da coima que lhe foi aplicada foi, com efeito, majorado de 50% por ter contestado certas acusações da Comissão. Foi, assim, penalizada de modo mais grave por não ter renunciado a exercer os seus direitos de defesa.

297.
    Invoca a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem segundo a qual qualquer pressão sobre as empresas para que renunciem a contestar as acusações de que são objecto, com a finalidade de obter uma redução do montante da coima, está em contradição com o artigo 6.° da CEDH (acórdãos do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de 27 de Fevereiro de 1980, Deweer, série A n.° 35, n.os 41 a 47, e de 25 de Fevereiro de 1993, Funke, série A n.° 256-1, n.° 44). Além disto, segundo o mesmo órgão jurisdicional, as autoridades responsáveis pela instrução são obrigadas a respeitar, mesmo nos processos de concorrência contra as empresas, as garantias processuais enunciadas no artigo 6.° da CEDH, nomeadamente a presunção de inocência (acórdãos do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem de 8 de Junho de 1976, Engel e o., série A, n.° 22, de 21 de Fevereiro de 1984, Öztürk, série A n.° 73, acórdão Deweer, já referido, e parecer da Comissão Europeia dos Direitos do Homem no processo Stenuit/Estado francês, n.° 11598/85, relatório de 30 de Maio de 1991, série A, n.° 232-A).

298.
    A recorrente recorda que os direitos de defesa são reconhecidos como um princípio geral do direito comunitário, que implica que as empresas não devem ser submetidas a nenhuma obrigação com o objectivo de as levar a reconhecer a realidade das acusações feitas contra si (acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Outubro de 1989, Orkem/Comissão, 374/87, Colect., p. 3283, n.° 35). Mais concretamente, foi reconhecido que o artigo 6.° da CEDH se aplica ao procedimento administrativo na Comissão (mesmo acórdão, n.° 30).

299.
    Quanto ao desenrolar do procedimento administrativo na Comissão, a recorrente afirma que foram proferidas ameaças contra as empresas para as obrigar a não contestar as alegações da Comissão. Recorda que a Comissão admite ter informado as empresas, durante o procedimento administrativo, de que uma cooperação da sua parte seria tida em conta na fixação da coima.

300.
    Além disto, os direitos de defesa da recorrente foram violados pelo facto de não ter podido consultar as peças processuais das empresas que beneficiaram de uma redução da coima por não terem contestado as principais alegações de facto da Comissão. Nestas condições, não teve a possibilidade de verificar se, de facto, as referidas empresas não contestaram as principais alegações e, consequentemente, se foi objecto de uma discriminação relativamente a essas empresas.

301.
    A Comissão considera que pode reduzir as coimas para atender à cooperação activa das empresas (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 10 de Março de 1992, Solvay/Comissão, T-12/89, Colect., p. II-907, n.os 341 e 342, e ICI/Comissão, já referido, n.° 393). Não se pode considerar que esta redução da coima viola os direitos de defesa das empresas em causa, a menos que a Comissão tenha ameaçado aplicar coimas mais pesadas às empresas que não confessaram as infracções.

302.
    Ora, a Comissão nunca exerceu a mais pequena pressão sobre a recorrente para a obrigar a não contestar a exactidão da comunicação de acusações. Com efeito, ofereceu à recorrente a possibilidade de obter uma redução da coima nas mesmas condições que as propostas a todas as outras empresas em causa.

303.
    Contesta a pertinência dos argumentos baseados na jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem bem como do acórdão Orkem/Comissão, já referido. De resto, resulta expressamente deste último acórdão (n.° 30) que a CEDH não tem qualquer relevância na presente questão.

304.
    Por fim, a Comissão sublinha que não é obrigada a revelar, na fase do procedimento administrativo, os critérios previstos para o cálculo da coima (acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Novembro de 1983, Michelin/Comissão, 322/81, Recueil, p. 3461, n.os 17 e segs.), bastando-lhe indicar esses critérios na própria decisão. É, portanto, suficiente expor na decisão o grau de cooperação de que fizeram prova as diferentes empresas.

Apreciação do Tribunal

305.
    A Comissão determinou o nível geral das coimas baseando-se nas considerações enunciadas nos n.° 167 e 168 dos considerandos. Além disto, é ponto assente que foram aplicadas coimas de um nível de base de 9 ou de 7,5% do volume de negócios realizado por cada uma das empresas destinatárias da decisão no mercado comunitário do cartão em 1990, respectivamente, às empresas consideradas «líderes» do cartel e às outras empresas.

306.
    Deve considerar-se que os critérios indicados no n.° 168 dos considerandos da decisão justificam o nível geral das coimas fixado pela Comissão (v. supra n.° 262).

307.
    Os n.os 169 a 172 dos considerandos mencionam os elementos que a Comissão tomou em conta para determinar a coima a aplicar a cada empresa. Em especial, nos n.os 171 e 172, a Comissão indica que os montantes das coimas aplicadas à Rena e ao grupo Stora devem ser consideravelmente reduzidos, a fim de ter em conta a sua cooperação activa com a Comissão, e que oito outras empresas podem igualmente beneficiar de uma redução, numa proporção inferior, pelo facto de, na resposta que apresentaram à comunicação de acusações, não terem negado as principais alegações de facto em que a Comissão baseava as suas acusações. No processo perante o Tribunal, a Comissão explicou nomeadamente ter tido em consideração a eventual atitude cooperante de certas empresas ao longo do procedimento administrativo, reduzindo de dois terços o montante das coimas aplicadas a duas empresas, enquanto outras empresas beneficiaram de uma redução de um terço.

308.
    Devendo o nível geral das coimas adoptado pela Comissão ser considerado justificado face aos critérios enunciados na decisão, o Tribunal verifica que a Comissão, como se indica na decisão, reduziu de facto o montante das coimas

aplicadas às empresas que adoptaram uma atitude de cooperação no procedimento administrativo. O argumento da recorrente de que a Comissão aumentou os montantes das coimas aplicadas às empresas que exerceram os seus direitos de defesa não deve portanto ser acolhido.

309.
    A este propósito, saliente-se que a ausência de resposta à comunicação de acusações, o facto de não tomarem posição sobre as alegações de facto na resposta à comunicação de acusações, a contestação nessa resposta do essencial ou da totalidade das alegações de facto contidas na comunicação de acusações, que constituem modalidades de exercício dos direitos de defesa durante o procedimento administrativo na Comissão, não podem justificar uma redução da coima a título de cooperação no procedimento administrativo. Com efeito, uma redução a este título só se justifica se o comportamento tiver permitido à Comissão detectar uma infracção com menos dificuldade e, eventualmente, pôr-lhe termo (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância, ICI/Comissão, já referido, n.° 393). Nestas circunstâncias, pode considerar-se que uma empresa que declara expressamente que não contesta as alegações de facto em que a Comissão baseia as suas acusações contribui para facilitar a tarefa da Comissão que consiste em detectar e reprimir as infracções às regras comunitárias da concorrência.

310.
    Por fim, no que se refere ao artigo 6.° da CEDH, importa recordar que o Tribunal de Justiça, ao contrário do que defende a recorrente, não considerou no acórdão Orkem/Comissão que esta disposição se aplica ao procedimento administrativo na Comissão, tendo admitido apenas a hipótese de tal aplicação no caso então em discussão, como resulta da redacção do acórdão (n.° 30).

311.
    A este respeito, sublinhe-se que o Tribunal de Primeira Instância não tem competência para apreciar a legalidade de um inquérito em matéria de direito da concorrência à luz das disposições da CEDH, na medida em que estas não fazemparte, enquanto tais, do direito comunitário.

312.
    No entanto, segundo jurisprudência constante, os direitos fundamentais fazem parte integrante dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo juiz comunitário (v., nomeadamente, parecer do Tribunal de Justiça, de 28 de Março de 1996, parecer 2/94, Colect., p. I-1759, n.° 33, e acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Maio de 1997, Kremzow, C-299/95, Colect., p. I-2629, n.° 14). Para este efeito, o Tribunal de Justiça e o Tribunal de Primeira Instância inspiram-se nas tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, bem como nas indicações fornecidas pelos instrumentos internacionais para a protecção dos direitos do homem em que os Estados-Membros cooperaram ou a que aderiram. A CEDH reveste, a este propósito, um significado especial (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Maio de 1986, Johnston, 222/84, Colect., p. 1651, n.° 18, e Kremzow, já referido, n.° 14). Por outro lado, nos termos do artigo F, n.° 2, do Tratado da União Europeia, «A União respeitará os direitos fundamentais tal como os garante

a [CEDH] e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados-Membros, enquanto princípios gerais do direito comunitário.»

313.
    Assim, há que examinar se, à luz destas considerações, a Comissão violou o princípio fundamental da ordem jurídica comunitária de respeito dos direitos de defesa (acórdão Michelin/Comissão, já referido, n.° 7) ao exercer alegadas pressões ilícitas sobre a recorrente, durante o procedimento administrativo, para que reconhecesse as alagações de facto contidas na comunicação de acusações.

314.
    Quanto a isto, o simples facto de indicar a uma empresa parte no inquérito, durante o procedimento administrativo, que seria possível uma redução da coima em caso de reconhecimento do essencial ou da totalidade das alegações de facto, sem precisar a dimensão dessa redução, não constitui uma pressão exercida sobre essa empresa.

315.
    De qualquer modo, a recorrente não explicou de que forma a possibilidade oferecida pela Comissão durante o procedimento administrativo de conceder uma redução do montante da coima a aplicar constituiu uma pressão tal que a obrigou a reconhecer o essencial das alegações de facto constantes da comunicação de acusações. Neste contexto, deve aliás sublinhar-se que a recorrente exerceu os seus direitos de defesa durante o procedimento administrativo, uma vez que contestou efectivamente o essencial das alegações de facto em que a Comissão baseou as suas acusações. Daqui resulta que o seu argumento não deve ser acolhido.

316.
    Por fim, a recorrente não explicou de que modo foi desrespeitado o princípio da presunção de inocência.

317.
    O seu argumento de que não pôde verificar se tinha sido tratada de modo diferente das outras empresas abrangidas pelo inquérito, será analisado no âmbito do fundamento baseado na violação do princípio da igualdade de tratamento (v., infra, n.os 334 e 335).

318.
    Tendo em conta o que precede, o fundamento deve ser julgado improcedente.

F — Fundamento baseado na violação do princípio da igualdade de tratamento pelo facto de a recorrente não ter beneficiado de uma redução da coima

Argumentos das partes

319.
    A recorrente alega que foi discriminada relativamente às empresas cuja coima foi reduzida por não terem contestado as principais alegações de facto apresentadas pela Comissão (n.° 172 dos considerandos da decisão).

320.
    Conclui-se de uma carta da Comissão de 27 de Abril de 1994 que esta lhe pedia, para beneficiar de uma redução, que reconhecesse a exactidão material das

acusações, enquanto às outras empresas apenas solicitou a não contestação da substância das alegações de facto.

321.
    Ora, a recorrente não contestou a substância das alegações de facto da Comissão, pelo que deveria ter beneficiado de uma redução da coima. Admitiu sempre a sua participação nas discussões sobre os preços e sobre os aumentos de preços e declarou mesmo que essas discussões constituíam, segundo a jurisprudência, práticas concertadas contrárias ao artigo 85.° do Tratado. Além disto, a Comissão reconheceu expressamente, nas informações individuais anexas à comunicação de causações, esta cooperação da recorrente.

322.
    A recorrente não pôde aceitar a exactidão da apreciação feita pela Comissão sobre os factos, nomeadamente no que se refere às suas alegações relativas à existência de acordos sobre os preços e de um cartel perfeitamente organizado, porque isso poderia determinar a sua responsabilidade perante o juiz nacional.

323.
    A recorrente afirma ter cooperado de modo activo com a Comissão, em especial na medida em que propôs, juntamente com outras empresas, uma solução processual que consistia em renunciar às vias de recurso como contrapartida de uma redução do montante da coima. Esta proposta deveria, por si só, justificar uma redução da coima.

324.
    Por fim, na medida em que pôde verificar o conteúdo das observações feitas por empresas que beneficiaram da redução da coima em causa, a recorrente conclui que foi indiscutivelmente objecto de discriminação. Baseia-se, neste ponto, nos principais fundamentos, tal como publicados no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, dos recursos interpostos pela Sarrió e pela Enso Española (JO 1994, C 380, p. 20 e p. 22). Daqui resulta que, no Tribunal de Primeira Instância, estas duas empresas contestam as alagações da Comissão pelo menos na mesma medida que a recorrente. No entanto, estas duas empresas obtiveram reduções de coimas por uma pretensa inexistência de contestação. Além disto, a recorrente cita excertos das declarações feitas pelo representante da sociedade Weig na audiência na Comissão e remete para os fundamentos invocados por esta empresa no Tribunal de Primeira Instância (tal como descritos no JO 1994, C 380, pp. 16 e segs.). Daqui deduz que a Weig, apesar de ter obtido uma redução da coima, contesta as alegações da Comissão na mesma proporção que a recorrente.

325.
    A Comissão recorda que não só tem o direito de reduzir as coimas para ter em conta uma cooperação activa, mas que esta redução, por vezes, se impõe (acórdão ICI/Comissão, já referido, n.° 393). Por conseguinte, a tomada em consideração da não contestação dos factos como circunstância atenuante para o cálculo das coimas justifica-se, dado que essa cooperação contribui para esclarecer os factos e acelerar o processo.

326.
    A recorrente não fez prova de uma cooperação activa desta natureza. Por um lado, só admitiu a existência de uma prática concertada, o que não constitui o reconhecimento dos factos. Por outro, contestou sempre não apenas a adopção de acordos em matéria de preços mas também qualquer concertação relativa às quantidades de produção, às quotas de mercado e à execução planificada das iniciativas em matéria de preços.

327.
    A Comissão contesta que a solução proposta pela recorrente para pôr termo ao processo possa ser considerada uma cooperação activa que justifique uma redução do montante da coima. O facto de renunciar a um recurso não é susceptível de esclarecer os factos. Também não permite acelerar o processo, não tendo a Comissão qualquer interesse na celebração de tais «acordos» com as empresas.

328.
    No que se refere à pretensa desigualdade de tratamento relativamente às sociedades Sarrió e Enso Española, a Comissão sustenta que essas duas empresas não contestaram a substância das conclusões de facto da Comissão antes da publicação da decisão. Deste modo, a redução das suas coimas foi justificada. O comportamento da sociedade Weig não é comparável com o da recorrente. Por um lado, desde a comunicação de acusações, a Weig deixou praticamente de contestar as afirmações da Comissão. Por outro, contribuiu para esclarecer os factos, ao obter uma declaração de um membro do conselho de direcção da Feldmühle que participou nas reuniões de vários órgãos do PG Paperboard.

Apreciação do Tribunal

329.
    A recorrente admitiu apenas, na sua resposta à comunicação de acusações, que as discussões no âmbito dos órgãos do PG Paperboard incidiram sobre os preços e os aumentos de preços.

330.
    A Comissão considerou correctamente que, ao responder desta forma, a recorrente não se comportou de um modo que justificasse uma redução da coima a título de cooperação durante o procedimento administrativo. Com efeito, uma redução a este título só se justifica se o comportamento tiver permitido à Comissão detectar uma infracção com menos dificuldade e, eventualmente, pôr-lhe termo (v. acórdão ICI/Comissão, já referido, n.° 393).

331.
    Como já se afirmou (v. supra n.° 309), pode considerar-se que uma empresa que declara expressamente que não contesta as alegações de facto em que a Comissão baseia as suas acusações contribui para facilitar a tarefa da Comissão que consiste em detectar e reprimir as infracções às regras comunitárias da concorrência. Nas decisões em que declara uma infracção a estas regras, a Comissão pode considerar um comportamento desse tipo constitutivo de um reconhecimento das alegações de facto e portanto como um elemento de prova da exactidão das alegações em causa. Deste modo, tal comportamento pode justificar uma redução da coima.

332.
    O mesmo não se passa quando uma empresa se abstém de responder à comunicação de acusações, declara unicamente não tomar posição sobre as alegações de facto da Comissão naquela comunicação contesta, na sua resposta, como a recorrente, o essencial dessas alegações. Com efeito, ao adoptar tal atitude no procedimento administrativo, a empresa não contribui para facilitar a tarefa da Comissão que consiste em detectar e reprimir as infracções às regras comunitárias da concorrência. É também evidente que a proposta feita pela recorrente à Comissão durante o procedimento administrativo, que consistia em renunciar à interposição de um recurso para o Tribunal contra a decisão a elaborar, também não contribuiu para facilitar esta tarefa.

333.
    Consequentemente, quando a Comissão declara no n.° 172, primeiro parágrafo, dos considerandos da decisão que concedeu reduções de coimas às empresas que, nas suas respostas à comunicação de acusações, não negaram as principais alegações de facto invocadas pela Comissão, há que reconhecer que essas reduções de coimas não podem ser consideradas lícitas, a não ser na medida em que as empresas em causa declararam expressamente que não contestavam as referidas alegações.

334.
    Mesmo admitindo que a Comissão tenha aplicado um critério ilegal ao reduzir as coimas aplicadas às empresas que não declararam expressamente que não contestavam as alegações de facto, importa recordar que o respeito pelo princípio da igualdade de tratamento deve conciliar-se com o respeito do princípio da legalidade segundo o qual ninguém pode invocar, em seu benefício, uma ilegalidade cometida a favor de terceiro (v., por exemplo, acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Junho de 1985, Williams/Tribunal de Contas, 134/84, Recueil, p. 2225, n.° 14). Na medida em que a argumentação da recorrente pretende precisamente que lhe seja reconhecido o direito a uma redução ilegal da coima, esta argumentação não pode, por conseguinte ser acolhida.

335.
    Dado que o facto de a Comissão ter eventualmente concedido reduções ilegais do montante de certas coimas não pode implicar uma redução do montante da coima aplicada à recorrente, esta não pode alegar que os seus direitos de defesa foram violados pelo facto de não ter podido verificar se, neste ponto, foi objecto de um tratamento diferente do reservado às outras empresas.

336.
    Por fim, o argumento da recorrente de que as empresas Sarrió e Enso Española e, em certa medida, Weig, beneficiaram de uma redução de um terço do montante das suas coimas, apesar de terem contestado, nos seus recursos contra a decisão interpostos no Tribunal de Primeira Instância, as alegações contidas naquela decisão, é inoperante. Com efeito, a Comissão só teve em conta o comportamento das empresas no procedimento administrativo para a concessão das reduções do montante das coimas.

337.
    Daqui resulta que o fundamento deve ser julgado improcedente.

G — Fundamento baseado na violação do princípio da igualdade de tratamento na medida em que a coima aplicada à recorrente é demasiado elevada relativamente à aplicada ao grupo Stora

Argumentos das partes

338.
    A recorrente alega que se conclui da jurisprudência que as coimas devem ser fixadas individualmente, sem discriminação, tendo em conta a participação de cada uma das empresas na infracção, a respectiva situação no mercado e a sua situação económica geral (v. acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Julho de 1970, Buchler/Comissão, 44/69, Recueil, p. 733, Colect. 1969-1970, p. 501, Suiker Unie e o./Comissão, já referido, e de 12 de Julho de 1979, BMW Belgium e o./Comissão, 32/78 e 36/78 a 82/78, Recueil, p. 2435). O Tribunal de Justiça e o Tribunal de Primeira Instância sublinharam várias vezes a importância do princípio da igualdade de tratamento (acórdãos do Tribunal de Justiça de 30 de Janeiro de 1985, BAT/Comissão, 35/83, Recueil, p. 363, n.os 43 a 47, de 8 de Fevereiro de 1990, TippEx/Comissão, C-279/87, Colect., p. I-261, publicação sumária, n.os 40 e 41, e acórdãos Dansk Pelsdyravlerforening/Comissão, já referido, n.° 52, e ICI/Comissão, já referido).

339.
    Tendo em conta esta jurisprudência, a recorrente considera que não colhe o argumento da Comissão de que a recorrente não poderia invocar um tratamento eventualmente favorável concedido ao grupo Stora.

340.
    O fundamento articula-se em duas partes.

341.
    Na primeira parte, a recorrente alega que a coima que lhe foi aplicada é desproporcional relativamente à aplicada ao grupo Stora.

342.
    Sublinha que a Feldmühle tomou a iniciativa das subcotações sistemáticas que obrigaram a recorrente e outros produtores não comunitários a pôr fim à respectiva política de expansão no mercado comunitário. Os representantes da Stora/Feldmühle desempenharam um papel particularmente activo no seio do JMC e do PWG. Por fim, o Stora foi, durante o período em questão, o líder do mercado europeu do cartão, com uma quota de mercado de cerca de 14%.

343.
    Deste modo, a coima do Stora, antes das eventuais reduções, deveria ter sido sensivelmente superior à da recorrente. A Comissão violou portanto o princípio da igualdade na fixação das coimas (acórdão ICI/Comissão, já referido, n.os 352 e 354 e segs.).

344.
    Na segunda parte do fundamento, a recorrente sustenta que a redução da coima concedida ao grupo Stora viola também o princípio da igualdade de tratamento. Em primeiro lugar, a Comissão considerou incorrectamente que o grupo Stora cooperou de modo voluntário e espontâneo. O Stora só «confessou», com efeito, nove meses após a apresentação da denúncia pela associação BPIF, denúncia de

que o sector rapidamente teve conhecimento, isto é, quatro meses após as verificações efectuadas pela Comissão e apenas depois de ter recebido os pedidos de informações enviados por esta instituição.

345.
    Em segundo lugar, a recorrente contesta que a «confissão» do Stora tenha verdadeiramente contribuído, de forma decisiva, para a determinação da infracção alegada. Chama a atenção, quanto a isto, para as indicações da Comissão de que as declarações do Stora são corroboradas em todos os pontos importantes por outros documentos.

346.
    Em terceiro lugar, a redução concedida ao grupo Stora é, de qualquer modo, desproporcionada. Comparando as conclusões do Tribunal no acórdão ICI/Comissão, já referido (n.° 393), e os factos do caso em apreço, a recorrente defende que o grupo Stora não deveria, em nenhuma circunstância, ser tratado de modo mais favorável do que a ICI no Tribunal de Primeira Instância.

347.
    Em quarto lugar, afirma na réplica, baseando-se nomeadamente no acórdão Solvay/Comissão, já referido (n.os 341 e segs.), que é duvidoso que o simples facto de confessar possa ser recompensado através de uma redução a título de cooperação, uma vez que as empresas são, de qualquer modo, obrigadas a responder aos pedidos de informação da Comissão.

348.
    Por fim, em quinto lugar, na réplica, afirma que a Comissão aplicou coimas elevadas a algumas empresas pelo simples facto de não terem subscrito completamente a apreciação dos factos feita pelo grupo Stora. Esta prática é inaceitável, tanto mais que a Stora foi uma das empresas mais gravemente implicadas e teria portanto um interesse evidente em desvalorizar o seu próprio papel no cartel relativamente às outras empresas.

349.
    Segundo a Comissão, a recorrente não contesta a legalidade da sua própria coima mas a da coima aplicada ao grupo Stora. Ora, a recorrente não pode invocar a eventual ilegalidade da coima aplicada ao grupo Stora, uma vez que o princípio da igualdade de tratamento não significa que a recorrente possa reclamar, no caso de a coima aplicada ao grupo Stora ser ilegal, um tratamento também ilegal.

350.
    De qualquer modo, a coima aplicada ao grupo Stora é adequada. Além disso, uma violação do princípio da igualdade de tratamento pressuporia um tratamento diferente em casos comparáveis. Ora, a situação da recorrente não é comparável com a do grupo Stora. Não obstante as duas empresas deverem ser consideradas «líderes», o que implica uma responsabilidade especial, o grupo Stora cooperou rápida e amplamente com a Comissão, o que não foi o caso da recorrente.

351.
    Por fim, a Comissão observa que as declarações feitas pelo grupo Stora ultrapassavam os pedidos de informação da Comissão e que o grupo Stora não se

retractou, como afirma a recorrente, relativamente à maior parte das suas confissões.

Apreciação do Tribunal

352.
    Segundo jurisprudência constante, o princípio da igualdade de tratamento, que faz parte dos princípios fundamentais de direito comunitário, só é violado quando situações comparáveis são tratadas de modo diferente ou quando situações diferentes são tratadas de igual maneira, salvo se esse tratamento se justificar por razões objectivas (acórdãos do Tribunal de Justiça de 13 de Dezembro de 1984, Sermide, 106/83, Recueil, p. 4209, n.° 28, e de 28 de Junho de 1990, Hoche, C-174/89, Colect., p. I-2681, n.° 25 e, no mesmo sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 15 de Março de 1994, La Pietra/Comissão, T-100/92, ColectFP, p. II-275, n.° 50).

353.
    No caso em apreço, a recorrente invoca uma violação deste princípio. Alega que a coima que lhe foi aplicada foi calculada a partir de uma taxa de base idêntica à adoptada para calcular a coima aplicada ao grupo Stora, isto é, 9% do volume de negócios realizado em 1990 no mercado comunitário do cartão, não obstante o seu papel no cartel ter sido diferente do do grupo Stora.

354.
    A este respeito, basta verificar que se conclui da decisão que o grupo Stora e a recorrente participaram nos diferentes elementos constitutivos do cartel enquanto participantes nas reuniões do PWG e que as duas empresas foram qualificadas de «líderes» do cartel devido à sua participação nas reuniões deste órgão do PG Paperboard. Daqui resulta que as situações destas empresas no cartel não são diferentes, justificando-se idêntico tratamento no cálculo do montante da coima. Com efeito, mesmo admitindo que estejam provados os elementos invocados pela recorrente para demonstrar que desempenhou um papel menos activo do que o grupo Stora no seio do PWG, esses elementos não seriam susceptíveis de infirmar a conclusão da Comissão relativa aos papéis respectivos da recorrente e do grupo Stora. Nestas condições, não deve ser acolhida a primeira parte do fundamento.

355.
    A segunda parte do fundamento também não pode ser acolhida.

356.
    Com efeito, o grupo Stora forneceu à Comissão declarações contendo uma descrição muito pormenorizada da natureza e do objecto da infracção, do funcionamento dos diversos órgãos do PG Paperboard, e da participação na infracção dos diferentes produtores. Através destas declarações, o grupo Stora forneceu informações que ultrapassaram aquelas cuja apresentação pode ser exigida pela Comissão nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17. Embora a Comissão declare, na decisão, que obteve elementos de prova que corroboram as informações constantes das declarações do grupo Stora (n.os 112 e 113 dos considerandos), é patente que as declarações do grupo Stora constituíram o principal elemento de prova da existência da infracção. Sem essas declarações, teria

sido, no mínimo, muito mais difícil para a Comissão verificar e, eventualmente, pôr termo à infracção objecto da decisão.

357.
    Nestas condições, a Comissão não ultrapassou, ao reduzir de dois terços o montante da coima aplicada ao Stora, a margem de apreciação de que dispõe para a determinação do montante das coimas. A recorrente não pode portanto validamente alegar que a redução concedida ao Stora é desproporcionada.

358.
    Além disto, não se verificou, no caso em apreço, uma violação do princípio da igualdade de tratamento, uma vez que, ao contrário do Stora, que cooperou de modo activo com a Comissão, a recorrente contestou o essencial das alegações de facto em que a Comissão baseava as suas acusações. A Comissão tinha portanto perfeitamente o direito de tratar as duas empresas de modo diferente quando decidiu da concessão e do montante das reduções das coimas, uma vez que as respectivas situações não eram comparáveis.

359.
    Tendo em conta o que precede, o presente fundamento deve ser julgado improcedente.

H — Fundamento baseado na existência de certas circunstâncias atenuantes

Argumentos das partes

360.
    A recorrente sustenta que certos elementos de facto deveriam ter sido tidos em conta pela Comissão como circunstâncias atenuantes na fixação do montante da coima.

361.
    Em primeiro lugar, a recorrente não tentou dissimular os documentos comprometedores, apesar de ter sido avisada previamente das investigações efectuadas pelos agentes da Comissão.

362.
    Em segundo lugar, era uma empresa de média dimensão até meados do ano de 1990. Só nesse ano instalou a nova máquina na sua fábrica de Neuss (Alemanha) e passou a controlar as empresas Deisswil e Eerbeek, respectivamente em Abril e em Setembro (com efeitos retroactivos a 1 de Janeiro de 1990).

363.
    Em terceiro lugar, trata-se da primeira infracção no sector do cartão.

364.
    Em quarto lugar, os aumentos de preços do cartão GD, principal cartão fabricado pela recorrente, foram mais pequenos do que os do cartão GC. A recorrente não obteve, portanto, a margem de exploração imputada às outras empresas.

365.
    Por fim, em quinto lugar, a recorrente defende na réplica que a Comissão era obrigada a ter em conta, em conformidade com a sua prática decisória anterior, as difíceis condições existentes no sector do cartão até finais dos anos oitenta e que

excluíam a possibilidade de obter um rendimento adequado para o capital investido. Deve ter-se também em conta o facto de o sector em causa se caracterizar por volumes de negócios elevados mas por lucros normalmente reduzidos. Deste modo, as coimas calculadas unicamente com base no volume de negócios dos produtores de cartão afectam os produtores de um modo particularmente grave.

366.
    A Comissão responde que não era obrigada a considerar os elementos em causa como circunstâncias atenuantes.

Apreciação do Tribunal

367.
    Como já se afirmou (supra, n.° 256), a gravidade das infracções deve ser determinada em função de um grande número de elementos, tais como, nomeadamente, as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas, e isto sem que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomadas em consideração (despacho SPO e o./Comissão, já referido, n.° 54).

368.
    Consequentemente, o simples facto de a Comissão ter considerado, na sua prática decisória anterior, que certos elementos constituíam circunstâncias atenuantes para efeitos da determinação do montante da coima não implica que seja obrigada a fazer a mesma apreciação numa decisão ulterior. A Comissão não estava portanto obrigada a ter em conta, admitindo que tivesse sido provada, a situação deficitária do sector.

369.
    Além disto, a Comissão atendeu, para determinar o montante da coima, ao volume de negócios realizado pela recorrente no mercado comunitário do cartão em 1990. A posição da recorrente no sector, bem como a dimensão da infracção que cometeu, foram portanto tidos em conta pela Comissão.

370.
    Finalmente, o facto de a infracção ser, segundo a recorrente, a primeira infracção no sector em causa não pode constituir uma circunstância atenuante. Deve considerar-se que o facto de a Comissão ter declarado, no passado, que uma empresa infringira as regras da concorrência e de lhe ter, eventualmente, aplicado sanções a esse título, pode constituir uma circunstância agravante contra essa empresa, mas que a inexistência de infracção anterior constitui uma circunstância normal que a Comissão não deve considerar como circunstância atenuante, tanto mais que no caso em apreço se está perante uma infracção particularmente grave ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Dezembro de 1991, DSM/Comissão, T-8/89, Colect., p. II-1833, n.° 317).

371.
    Nestas condições, a Comissão tinha o direito de não considerar circunstâncias atenuantes os elementos invocados pela recorrente.

372.
    Daqui resulta que o fundamento deve ser julgado improcedente.

I — Fundamento baseado em ausência de violação intencional

373.
    A recorrente alega que não tinha, na época, conhecimento da ilegalidade do intercâmbio de informações em que participava. Há que ter em conta o facto de que era uma empresa de média dimensão, sem juristas ao seu serviço e situada fora da Comunidade. Além disso, a regulamentação austríaca da concorrência só contém disposições prevendo sanções em caso de acordos vinculativos, enquanto, no caso em apreço, apenas existiam práticas concertadas.

374.
    Este fundamento não pode ser acolhido.

375.
    Com efeito, resulta de jurisprudência constante que, para que uma infracção possa ser considerada como tendo sido cometida deliberadamente, não é necessário que a empresa tenha tido consciência de violar a proibição do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado. Basta que não pudesse ignorar que a conduta imputada tinha por objectivo ou efeito restringir a concorrência no mercado comum (v., acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 1989, Belasco e o./Comissão, 246/86, Colect., p. 2117, n.° 41, e acórdão Dansk Pelsdyravlerforening/Comissão, já referido, n.° 157).

376.
    No caso em apreço, a Comissão provou a participação da recorrente nos elementos constitutivos da infracção declarada no artigo 1.° da decisão. Tendo em conta a natureza dos comportamentos verificados, a recorrente não podia ignorar que tinham por objectivo restringir a concorrência.

J — Fundamento baseado na tomada em consideração de um volume de negócios errado

377.
    Este fundamento articula-se em duas partes, que devem ser analisadas separadamente.

Primeira parte, baseada no facto de o volume de negócios constituído pelas vendas de cartão cinzento ter sido incorrectamente tido em conta para efeitos do cálculo da coima

Argumentos das partes

378.
    A recorrente salienta que a Comissão calculou a coima com base no seu volume de negócios de 1990, relativo a todas as vendas de produtos em cartão. Este volume incluía, portanto, as vendas de cartão cinzento. No entanto, a Comissão declarou, num comunicado de imprensa de 13 de Julho de 1994, que as coimas haviam sido calculadas com base no volume de negócios de cada uma das empresas destinatárias da decisão relativo às vendas das qualidades de cartão abrangidas por esta.

379.
    Não fazendo o cartão cinzento parte das qualidades de cartão abrangidas pela decisão, o volume de negócios adoptado como base para o cálculo da coima deve ser reduzido de 13,1 milhões de ecus, montante das vendas de cartão cinzento. A coima deve, portanto, ser proporcionalmente reduzida.

380.
    A Comissão alega que não se pode utilizar uma fórmula estritamente matemática para o cálculo da coima. No caso em apreço, a coima é adequada tendo em conta o volume de negócios global da recorrente, não podendo as empresas exigir que se tenha unicamente em conta o volume de negócios relativo aos produtos directamente abrangidos pela infracção. A Comissão sublinha a existência de circunstâncias agravantes, a inexistência de circunstâncias atenuantes, e recorda que tomou como base de cálculo da coima o volume de negócios realizado em 1990 (em vez de 1993) e que só teve em conta o volume de negócios realizado com as vendas de cartão na Comunidade.

381.
    Na tréplica, alega que pediu à recorrente, por carta de 8 de Outubro de 1993, que lhe comunicasse, nomeadamente, o volume de negócios relativo ao cartão. Na resposta de 3 de Novembro de 1993, a recorrente forneceu esse número precedido da designação «mercadorias de cartão (GC, GD)». Uma vez que fora expressamente indicado na comunicação de acusações que o cartão cinzento não estava abrangido pelo processo, a Comissão não tinha portanto qualquer razão para verificar a exactidão do volume de negócios fornecido.

Apreciação do Tribunal

382.
    Conclui-se do n.° 4, segundo parágrafo, dos considerandos da decisão que o cartão cinzento não era objecto da infracção visada pela decisão.

383.
    É ponto assente que a Comissão calculou o montante da coima aplicada à recorrente com base no volume de negócios que esta realizou no mercado comunitário em 1990 graças às suas vendas de cartão GC, de cartão GD e de cartão cinzento. Como a Comissão admitiu na audiência, conclui-se expressamente das informações prestadas pela recorrente à Comissão, antes da comunicação de acusações, que o volume de negócios que apresentou incluía o volume de negócios relativo às vendas de cartão cinzento.

384.
    Importa acrescentar que, ainda que a Comissão não pudesse ignorar que o volume de negócios em que a recorrente se baseava incluía o volume de negócios do cartão cinzento, aquela nunca pediu à recorrente que lhe comunicasse o volume de negócios realizado em 1990 apenas relativamente aos produtos que são objecto do processo, isto é, os cartões GC e GD e, eventualmente, o cartão SBS.

385.
    No entanto, como também se admitiu na audiência, a Comissão baseou-se unicamente, em relação às outras empresas destinatárias da decisão, no volume de negócios relativo aos produtos abrangidos pela infracção declarada na decisão.

386.
    Tendo em conta esta conclusão, e dado que a tomada em consideração do volume de negócios constituído pelas vendas de cartão cinzento teve um efeito bastante importante no montante da coima, este montante deve ser reduzido para eliminar o tratamento discriminatório de que a recorrente foi objecto relativamente aos outros destinatários da decisão.

387.
    O Tribunal terá em conta esta conclusão no âmbito da sua competência de plena jurisdição em matéria de coimas, quando apreciar o montante da coima que deve ser aplicada em função da infracção verificada relativamente à recorrente (v. infra n.° 405).

Segunda parte, baseada no facto de os volumes de negócios da Deisswil e da Eerbeek terem sido incorrectamente tidos em conta para efeitos do cálculo da coima

Argumentos das partes

388.
    A recorrente defende que os volumes de negócio realizados em 1990 pelas empresas Deisswil e Eerbeek não deveriam ter sido tidos em conta para efeitos do cálculo da coima.

389.
    No que se refere à Deisswil, recorda que adquiriu uma participação de 66% nessa sociedade em Abril de 1990, com efeitos a 1 de Janeiro de 1990, passando portanto a controlá-la. Os anteriores proprietários desta sociedade, que foram responsáveis pelo seu comportamento durante mais de três quartos do período relevante, detêm ainda uma participação de 34% na sociedade. Assim, não é justo imputar a totalidade do volume de negócios da Deisswil à recorrente, enquanto os antigos proprietários, que beneficiam ainda de um terço dos lucros, não são afectados pela coima. Nestas condições, deveria ser aplicada uma coima directamente à Deisswil — como se fez com a sociedade Laakmann (n.° 150, terceiro parágrafo, dos considerandos da decisão) —, ou imputar o volume de negócios da Deisswil à recorrente unicamente prorata temporis (numa base de 13/60, correspondendo o denominador da fracção ao período total da infracção, expresso em meses, a que se referiu a Comissão para o cálculo do montante das coimas individuais).

390.
    No que se refere à Eerbeek, a recorrente só é responsável pelo comportamento desta sociedade a partir de 1 de Janeiro de 1990, devendo antes dessa data ser responsável a sociedade KNP (n.° 150 dos considerandos da decisão). No entanto, ao ter em conta a integralidade do volume de negócios da Eerbeek em 1990 para o cálculo da coima da Mayr-Melnhof, a Comissão não respeitou a sua própria apreciação, uma vez que teve também em conta este número para calcular a coima aplicada à KNP.

391.
    Além disto, a recorrente só adquiriu totalmente o controlo da sociedade Eerbeek em Setembro de 1990. Não pode, portanto, ter exercido uma influênciadeterminante no seu comportamento no mercado, a não ser a partir dessa data.

Em conformidade com a prática em matéria de coimas bem como com os princípios jurisprudenciais, só a partir dessa data é que o volume de negócios da Eerbeek pode ser imputado à recorrente. Só podem ser imputados à recorrente 8/60 do volume de negócios realizado pela Eerbeek em 1990 (ano de referência), isto é, em relação ao período compreendido entre Setembro de 1990 e Abril de 1991.

392.
    Na réplica, a recorrente acrescenta que o tratamento dos casos da Eerbeek e da Deisswil é contraditório, uma vez que, no que se refere à sociedade Eerbeek, a Comissão defende que o critério determinante é a identidade da pessoa que recebe os lucros durante o período relevante, enquanto, no que se refere à sociedade Deisswil, rejeita a pertinência deste critério, defendendo que o critério determinante é o controlo efectivo.

393.
    A Comissão alega ter tido correctamente em conta os volumes de negócios realizados em 1990 pelas empresas Deisswil e Eerbeek para o cálculo do montante da coima. Com efeito, para esse cálculo, foi necessário fixar um ano de referência, no caso em apreço, o ano de 1990. As empresas que realizaram nesse ano um volume de negócios mais elevado do que nos outros anos terão sido mais severamente penalizadas. No entanto, tendo o ano de referência sido correctamente escolhido, isto não justifica qualquer distinção em função das razões de uma tal progressão do volume de negócios.

394.
    No que se refere à Deisswil, a Comissão teve devidamente em conta o facto de a recorrente exercer em 1990 o pleno controlo desta empresa tendo portanto podido orientar o respectivo comportamento comercial. Nestas condições, o facto de a recorrente não ter recebido todos os lucros desta sociedade é irrelevante.

395.
    No que se refere à Eerbeek, a Comissão alega que o factor decisivo foi o facto de a recorrente ter recebido os lucros a partir de 1 de Janeiro de 1990 e de ter, portanto, beneficiado economicamente da infracção a partir dessa data.

396.
    Por fim, a Comissão salienta que o volume de negócios da Eerbeek não foi ilegalmente tido em conta duas vezes.

Apreciação do Tribunal

397.
    A recorrente não contesta que, na data em que assumiu a controlo da Deisswil, tanto esta última sociedade como ela própria participavam na infracção que é objecto da decisão. Por consequência, conhecia necessariamente o comportamento anticoncorrencial da Deisswil.

398.
    Nestas condições, a Comissão podia imputar-lhe o comportamento da Deisswil relativamente ao período precedente e ao período posterior à sua aquisição desta empresa. Incumbia à recorrente, na sua qualidade de sociedade-mãe, adoptar, face à sua filial, as medidas destinadas a impedir a prossecução da infracção, cuja

existência não ignorava. Ora, a recorrente não contesta que o comportamento ilícito da Deisswil se manteve após a data em que assumiu o seu controlo.

399.
    Daqui resulta que a Comissão podia incluir, para efeitos do cálculo da coima aplicada à recorrente, o volume de negócios realizado pela Deisswil no mercado comunitário do cartão em 1990, ano de referência cuja tomada em conta não é criticada pela recorrente. Daqui resulta também que não é pertinente saber se a Comissão podia ter aplicado a coima, ou uma parte dela, à própria sociedade Deisswil ou aos antigos proprietários desta sociedade.

400.
    No que se refere à Eerbeek, o n.° 150, segundo parágrafo, dos considerandos da decisão enuncia:

«O grupo (Mayr-Melnhof) é também responsável pela participação na infracção da... Mayr-Melnhof Eerbeek BV (nova designação da KNP Vouwkarton), a partir da data da sua aquisição em 1 de Janeiro de 1990. A responsabilidade no que se refere à participação da KNP Vouwkarton antes da aquisição incumbe à KNP, não sendo atribuída relativamente a este período qualquer responsabilidade à [Mayr-Melnhof]».

401.
    Apesar destas indicações, a Comissão teve em conta, para efeitos do cálculo da coima aplicada à recorrente, a totalidade do volume de negócios realizado pela Eerbeek no mercado comunitário do cartão em 1990 (ano de referência), sem o imputar prorata temporis unicamente no período durante o qual esta empresa esteve sob o controlo da recorrente. Ao fazer isto, não teve em conta a sua própria conclusão de que a recorrente só passou a ser responsável pela participação na infracção da sociedade KNP Vouwkarton/Eerbeek a partir de 1 de Janeiro de 1990.

402.
    Tendo a Comissão admitido expressamente, na audiência, ter cometido um erro neste ponto, há que efectuar uma redução do montante da coima.

403.
    Importa acrescentar que ainda que a Eerbeek tenha sido adquirida integralmente pela recorrente em Setembro de 1990, esta não contesta que a sua aquisição produziu efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1990. Nestas condições, não tendo a recorrente podido ignorar o comportamento ilícito da sociedade que adquiria (no mesmo sentido v., supra, n.° 397), a Comissão podia considerar que a recorrente devia assumir a responsabilidade de tal comportamento da referida empresa a partir de 1 de Janeiro de 1990.

404.
    Conclui-se de tudo o que precede que os fundamentos invocados pela recorrente em apoio do pedido de anulação do artigo 1.° da decisão devem ser julgados improcedentes, devendo ser parcialmente acolhido o fundamento invocado em apoio do pedido de anulação do artigo 2.° da decisão.

405.
    Deve ser concedida uma redução do montante da coima, a fim de ter em conta, por um lado, o facto de o volume de negócios da recorrente realizado com as vendas de cartão cinzento ter sido incorrectamente considerado para efeitos da fixação do montante da coima e, por outro, o facto de a recorrente só ser responsável pelo comportamento da Eerbeek a partir de 1 de Janeiro de 1990.

406.
    Dado que nenhum dos outros fundamentos invocados pela recorrente justifica uma redução da coima, o Tribunal de Primeira Instância, no exercício da sua competência de plena jurisdição, fixa o montante da coima em 17 000 000 ecus.

Quanto às despesas

407.
    Por força do disposto no n.° 3 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas. Dado que o recurso foi acolhido parcialmente, o Tribunal, fazendo uma justa apreciação das circunstâncias da causa, decide que a Comissão deve suportar as suas próprias despesas e um quarto das despesas da recorrente e que esta deve suportar os outros três quartos das suas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção Alargada),

decide:

1)    O artigo 2.°, primeiro a quarto parágrafos, da Decisão 94/601/CE da Comissão, de 13 de Julho de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE (IV/C/33.833 — Cartão), é anulado em relação à recorrente, com excepção das seguintes passagens:

    «As empresas designadas no artigo 1.° porão termo imediatamente à referida infracção, se o não fizeram já. Renunciarão no futuro, no que se refere às suas actividades no sector do cartão, a quaisquer acordos ou práticas concertadas susceptíveis de terem um objecto ou efeito idêntico ou semelhante, incluindo o intercâmbio de qualquer informação comercial

    a)    através da qual os participantes sejam directa ou indirectamente informados da produção, vendas, cadernos de encomendas, taxas de utilização das máquinas, preços de venda, custos ou planos de marketing de outros produtores.

    Qualquer sistema de intercâmbio de informações gerais que subscrevam, tal como o sistema Fides ou o que o substituir, será explorado por forma

a excluir quaisquer informações a partir das quais se possa identificar o comportamento de cada produtor.»

2)    O montante da coima aplicada à recorrente pelo artigo 3.° da Decisão 94/601 é fixado em 17 000 000 ecus.

3)    Quanto ao restante, é negado provimento ao recurso.

4)    A Comissão suportará as suas despesas e um quarto das despesas da recorrente.

5)    A recorrente suportará três quartos das suas despesas.

Vesterdorf
Briët
Lindh

Potocki

Cooke

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de Maio de 1998.

O secretário

O presidente

H. Jung

B. Vesterdorf

Índice

     Factos na origem do litígio

II - 2

     Tramitação processual

II - 6

     Pedidos das partes

II - 8

     Pedido de anulação do artigo 1.° da decisão

II - 8

         A — Fundamentos baseados na violação de formalidades essenciais

II - 8

             Fundamento baseado na violação do artigo 190.° do Tratado

II - 8

                 Argumentos das partes

II - 8

                 Apreciação do Tribunal

II - 9

             Fundamento baseado na violação das exigências de prova do direito comunitário

II - 10

         B — Fundamentos baseados na violação de normas substantivas

II - 10

             Fundamento baseado na inexistência de acordos em matéria de preços

II - 10

                 Argumentos das partes

II - 10

                 Apreciação do Tribunal

II - 13

             Fundamento baseado na inexistência de acordo e de prática concertada relativos à alegada política do «preço em detrimento da tonelagem»

II - 15

                 Argumentos das partes

II - 16

                 Apreciação do Tribunal

II - 19

                     1. Quanto à existência de uma concertação destinada a congelar as quotas de mercado e de uma concertação destinada a controlar a oferta

II - 19

                     2. Quanto ao comportamento efectivo da recorrente

II - 25

                    3.    Quanto à qualificação jurídica da concertação que visa congelar as quotas de mercado e da concertação que visa controlar a oferta

II - 26

             Fundamento baseado na existência de um plano comum do sector para restringir a concorrência

II - 26

                 Argumentos das partes

II - 26

                 Apreciação do Tribunal

II - 26

             Fundamento baseado na legalidade dos sistema de intercâmbio de informações da Fides

II - 27

                 Argumentos das partes

II - 27

                 Apreciação do Tribunal

II - 28

     Pedido de anulação do artigo 2.° da decisão

II - 31

         Argumentos das partes

II - 31

         Apreciação do Tribunal

II - 33

     Pedido de anulação da coima ou de redução do seu montante

II - 37

         A — Fundamento baseado na existência de erros manifestos de direito ou de facto na fixação do montante geral das coimas

II - 37

             Primeira parte, baseada em erros cometidos pela Comissão na determinação do alcance das infracções

II - 38

             Segunda parte, baseada na inexistência de regulação em pormenor do mercado do cartão na Comunidade

II - 38

                 Argumentos das partes

II - 38

                 Apreciação do Tribunal

II - 38

             Terceira parte, baseada no facto de o carácter secreto e a dissimulação não deverem ser considerados elementos agravantes da infracção

II - 39

                 Argumentos das partes

II - 39

             Quarta parte do fundamento, baseada no facto de a Comissão ter incorrectamente considerado que o cartel «alcançou com êxito os seus objectivos»

II - 41

                 Argumentos das partes

II - 41

                 Apreciação do Tribunal

II - 42

             Quinta parte do fundamento, baseada na tomada em consideração de uma margem de exploração errada

II - 46

                 Argumentos das partes

II - 46

                 Apreciação do Tribunal

II - 46

         B — Fundamentos baseados na violação do artigo 190.° do Tratado e na violação do princípio da igualdade de tratamento quanto ao nível geral das coimas

II - 47

             Argumentos das partes

II - 47

             Apreciação do Tribunal

II - 48

         C — Fundamento baseado na violação do artigo 190.° do Tratado na fixação do montante das coimas individuais

II - 51

             Argumentos das partes

II - 51

             Apreciação do Tribunal

II - 52

         D — Fundamento baseado no facto de a recorrente ter sido erradamente qualificada como líder do cartel

II - 55

             Argumentos das partes

II - 55

             Apreciação do Tribunal

II - 55

         E — Fundamento baseado na violação dos direitos de defesa

II - 56

             Argumentos das partes

II - 56

             Apreciação do Tribunal

II - 58

         F — Fundamento baseado na violação do princípio da igualdade de tratamento pelo facto de a recorrente não ter beneficiado de uma redução da coima

II - 60

             Argumentos das partes

II - 60

             Apreciação do Tribunal

II - 62

         G — Fundamento baseado na violação do princípio da igualdade de tratamento na medida em que a coima aplicada à recorrente é demasiado elevada relativamente à aplicada ao grupo Stora

II - 64

             Argumentos das partes

II - 64

             Apreciação do Tribunal

II - 66

         H — Fundamento baseado na existência de certas circunstâncias atenuantes

II - 67

             Argumentos das partes

II - 67

             Apreciação do Tribunal

II - 68

         I — Fundamento baseado em ausência de violação intencional

II - 69

         J — Fundamento baseado na tomada em consideração de um volume de negócios errado

II - 69

             Primeira parte, baseada no facto de o volume de negócios constituído pelas vendas de cartão cinzento ter sido incorrectamente tido em conta para efeitos do cálculo da coima

II - 69

                 Argumentos das partes

II - 69

                 Apreciação do Tribunal

II - 70

             Segunda parte, baseada no facto de os volumes de negócios da Deisswil e da Eerbeek terem sido incorrectamente tidos em conta para efeitos do cálculo da coima

II - 71

                 Argumentos das partes

II - 71

                 Apreciação do Tribunal

II - 72


1: Língua do processo: alemão.