Language of document : ECLI:EU:T:2021:608

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção alargada)

22 de setembro de 2021 (*)

«Função pública — Funcionários — Recrutamento — Concurso interno COM/03/AD/18 (AD 6) — Decisão de não inscrever o nome do recorrente na lista de reserva do concurso — Dever de fundamentação — Segredo dos trabalhos do júri — Ponderação dos elementos que compõem uma prova previstos no anúncio de concurso»

No processo T‑435/20,

JR, representada por L. Levi e A. Champetier, advogadas,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por D. Milanowska e I. Melo Sampaio, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido apresentado ao abrigo do artigo 270.o TFUE por meio do qual é pedida a anulação da decisão do júri do concurso interno COM/03/AD/18 (AD 6) — Administradores, de 15 de abril de 2020, que indeferiu o pedido de reexame da recorrente relativo à decisão deste júri de 16 de dezembro de 2019 de não inscrever o seu nome na lista de reserva do referido concurso e, na medida do necessário, a anulação desta decisão,

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção alargada),

composto por: R. da Silva Passos, presidente, V. Valančius, I. Reine, L. Truchot (relator) e M. Sampol Pucurull, juízes,

secretário: E. Coulon,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 16 de dezembro de 2018, a recorrente, JR, apresentou a sua candidatura ao concurso interno COM/03/AD/18 (AD 6) — Administradores (a seguir «concurso controvertido»).

2        O anúncio de concurso controvertido especificava que este visava a constituição de uma lista de reserva de aprovados para cada um dos três seguintes domínios: primeiro, administração pública europeia, segundo, cooperação para o desenvolvimento e política de vizinhança e, terceiro, investigação.

3        A recorrente escolheu o domínio da administração pública europeia, no qual o número de aprovados pretendido era de 30.

4        Nos termos do título III do anúncio de concurso controvertido, os candidatos tinham de apresentar, num primeiro momento, um ato de candidatura e confirmar, no momento da apresentação deste, que preenchiam os requisitos de admissão ao concurso previstos. Num segundo momento, os candidatos admissíveis ao concurso seriam convidados a realizar uma série de testes que revestiam a forma de questionários de escolha múltipla. Num terceiro momento, os candidatos aprovados nestes testes seriam convocados para a realização de uma prova oral.

5        A secção 4 do título III do anúncio de concurso controvertido indica que a prova oral para o grupo de funções AD é composta por duas partes, descritas nos seguintes termos:

«1.      Uma entrevista […] para avaliar:

—        as principais missões exercidas e as competências adquiridas durante a carreira profissional [do candidato] e

—        [a] capacidade e [a] motivação [do candidato] para exercer as funções necessárias para os lugares aos quais o concurso dá acesso;

2.      uma apresentação estruturada [que] consistirá num briefing sobre um assunto relacionado com uma política da União Europeia […]»

6        A secção 4 do título III do anúncio de concurso controvertido acrescenta que a classificação global para as duas partes acima mencionadas consiste numa nota compreendida entre zero e 20 pontos, sendo 10 pontos o mínimo exigido.

7        A secção 5 deste mesmo título especifica que o júri inscreve na lista de reserva os nomes dos candidatos que obtiverem as melhores notas na prova oral bem como os pontos mínimos exigidos nesta prova, até ser atingido o número máximo de candidatos aprovados pretendido.

8        Depois de ter sido aprovada, em 23 de setembro de 2019, na fase escrita do concurso controvertido, a recorrente realizou a prova oral.

9        Por carta de 16 de dezembro de 2019, o júri do concurso controvertido informou a recorrente da sua decisão (a seguir «Decisão de 16 de dezembro de 2019») de não inscrever o seu nome na lista de reserva deste concurso. O júri indicou que, relativamente à prova oral, tinha sido atribuída à recorrente uma nota de 13/20, a qual, embora fosse superior ao mínimo de 10/20 fixado no anúncio de concurso controvertido, era, no entanto, inferior ao limiar de 14/20 que tinha de ser alcançado para que a recorrente figurasse entre os melhores candidatos cujos nomes seriam inscritos na lista de reserva. O júri indicou também que a prestação global da recorrente durante a prova oral tinha recebido a menção qualitativa de «bom» (bonne). Mais concretamente, o júri expôs que a recorrente tinha obtido a menção qualitativa «bom mais» («forte») tanto no que se referia à «relação entre a sua anterior experiência e as competências exigidas» como à «demonstração das suas competências gerais e à sua motivação para exercer as funções a desempenhar», tendo obtido a menção qualitativa «bom» (bonne) no que se referia à sua capacidade de efetuar uma apresentação sobre um assunto relativo ao domínio do concurso controvertido.

10      Por correio eletrónico de 20 de dezembro de 2019 (a seguir «pedido de reexame»), a recorrente apresentou ao Serviço Europeu de Seleção de Pessoal (EPSO) um pedido de reexame da Decisão de 16 de dezembro de 2019, em conformidade com o disposto no ponto 6.3 do anexo III do anúncio de concurso controvertido. Invocou a existência de uma «incoerência manifesta» entre, por um lado, a menção qualitativa que tinha sido atribuída à sua prestação global na prova oral e, por outro, as menções qualitativas que tinha obtido para as três componentes da mesma prova avaliadas pelo júri. Com efeito, segundo a recorrente, o júri subestimou de forma arbitrária a sua prestação global, visto que a qualificou com a menção «bom» (bonne), embora a duas destas componentes tenha sido atribuída a menção qualitativa «bom mais» («forte»). A recorrente acrescentou que a Decisão de 16 de dezembro de 2019 não lhe permitia compreender a forma como a apreciação global «bom» (bonne) tinha sido convertida numa pontuação de 13/20. No mesmo correio eletrónico foi apresentado um «pedido de informações e de acesso aos documentos», através do qual a recorrente solicitava que lhe fossem comunicados os seguintes elementos:

—        explicações detalhadas sobre a forma como as menções qualitativas tinham sido convertidas em notas numéricas, com as grelhas de classificação que permitissem associar cada menção qualitativa a uma nota expressa em números;

—        as apreciações detalhadas sobre a sua prestação em cada um dos três elementos avaliados e classificados, bem como a respetiva grelha de classificação;

—        todas as informações úteis relativas às notas que lhe tinham sido atribuídas;

—        o método de ponderação eventualmente utilizado;

—        o método de arredondamento eventualmente utilizado;

—        a ata e as grelhas de avaliação relativas à sua prova oral, o bloco de papel para cavalete que tinha utilizado no decurso desta (a seguir «bloco de papel»), bem como quaisquer outros documentos pertinentes relativos à sua prestação durante esta prova.

11      Em 28 de fevereiro de 2020, depois de várias trocas de correios eletrónicos com a Direção‑Geral dos Recursos Humanos e da Segurança da Comissão Europeia, esta última comunicou à recorrente uma grelha que continha a correspondência entre, por um lado, notas numéricas compreendidas entre um e dez, por outro, as menções qualitativas «insuficiente» (insuffisante), «suficiente» (satisfaisante), «bom» (bonne), «bom mais» (forte), «muito bom» (très forte), «excelente» (excellente) e «excecional» (exemplaire) (a seguir «primeira grelha de conversão»), sendo indicado que todas as notas numéricas compreendidas entre um e quatro correspondiam à menção «insuficiente» (insuffisante). Convidou igualmente a recorrente a consultar o bloco de papel nas instalações da Comissão e a reunir‑se com a presidente do júri do concurso controvertido para obter um resumo oral da sua prestação. O correio eletrónico da Comissão de 28 de fevereiro de 2020 não continha referências aos métodos de ponderação e de arredondamento indicados no pedido de reexame.

12      Por correio eletrónico de 9 de abril de 2020, a Comissão informou a recorrente de que os métodos acima indicados estavam abrangidos pelo segredo dos trabalhos do júri previsto no artigo 6.o do anexo III do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto»).

13      Por Decisão de 15 de abril de 2020 (a seguir «Decisão de 15 de abril de 2020»), o júri do concurso controvertido indeferiu o pedido de reexame.

14      Para este efeito, em primeiro lugar, o júri recordou que, antes de ouvir os candidatos admitidos à prova oral, tinha definido o conteúdo desta, as questões a colocar, os critérios de avaliação, o procedimento de classificação e a ponderação de cada elemento mencionado no anúncio deste concurso a respeito desta prova.

15      Em segundo lugar, o júri precisou que tinha feito, em relação a cada um dos candidatos, comentários sobre os elementos específicos indicados no referido anúncio (v. n.o 5, supra) e que os seus comentários também incluíam uma apreciação global da prestação dos candidatos, «que resumia a avaliação de cada elemento».

16      Em terceiro lugar, o júri salientou que as suas apreciações da experiência e das capacidades dos candidatos eram de natureza comparativa.

17      Em quarto lugar, o júri constatou que o reexame da Decisão de 16 de dezembro de 2019 não tinha identificado a existência de um erro que afetasse o tratamento dos dados relativos à prova oral da recorrente, pelo que havia que confirmar a decisão de não incluir o seu nome na lista de reserva do concurso controvertido.

18      Por petição apresentada em 4 de maio de 2020 na Secretaria do Tribunal Geral, a recorrente interpôs um recurso de anulação das Decisões da Comissão, contidas nos correios eletrónicos de 28 de fevereiro e de 9 de abril de 2020 (v. n.os 11 e 12, supra), que recusaram conceder‑lhe acesso a certos dados que pretensamente revestem caráter pessoal. Este recurso foi registado sob o número T‑265/20.

 Factos posteriores à interposição do recurso

19      Em 16 de julho de 2020, a Comissão comunicou à recorrente uma cópia do bloco de papel, acompanhada das notas redigidas por esta última para efeitos da apresentação que efetuou durante a prova oral.

20      Em 22 de julho de 2020, por ocasião de uma reunião telefónica com a presidente do júri do concurso controvertido, a recorrente obteve informações sobre a sua prestação no âmbito da prova oral e foi‑lhe indicado que as notas numéricas foram arredondas a 0,25.

 Tramitação processual e pedidos das partes

21      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de julho de 2020, a recorrente interpôs o presente recurso.

22      Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral na mesma data, em aplicação do artigo 66.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a recorrente pediu para beneficiar de anonimato. Por Decisão de 21 de setembro de 2020, o Tribunal Geral (Sétima Secção) deferiu este pedido.

23      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 22 de julho de 2020, no processo T‑265/20, JR/Comissão, a recorrente pediu a apensação deste último processo e do presente processo, ao abrigo do artigo 68.o do Regulamento de Processo. Nas suas observações respeitantes a este pedido, apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 31 de agosto de 2020, a Comissão concluiu pedindo que este pedido fosse indeferido. Por Decisão de 30 de setembro de 2020, o presidente da Sétima Secção do Tribunal Geral indeferiu o pedido de apensação.

24      A fase escrita do processo foi encerrada em 13 de janeiro de 2021.

25      Em 20 de abril de 2021, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral (Sétima Secção) decidiu convidar a Comissão a indicar que instrumento tinha permitido ao júri do concurso associar, na Decisão de 16 de dezembro de 2019, a menção qualitativa «bom» (bonne) à nota global numérica de 13/20 atribuída à recorrente, uma vez que a primeira grelha de conversão continha notas numéricas compreendidas entre um e dez.

26      Em 28 de abril de 2021, sob proposta da Sétima Secção, o Tribunal Geral decidiu, em aplicação do artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter o processo a uma formação de julgamento alargada.

27      Por carta de 6 de maio de 2021, a Comissão respondeu à questão do Tribunal Geral referida no n.o 25 através da apresentação de uma grelha que indica a correspondência entre, por um lado, as notas numéricas ou os intervalos das notas numéricas «até 9,5», «10 a 11,5», «12 a 13», «13,5», «14 a 15,5», «16 a 17», «17,5 a 19» e «19,5 a 20», por outro, as menções qualitativas «insuficiente» (insuffisante), «suficiente» (satisfaisante), «bom» (bonne), «de bom a bom mais» (bonne à forte), «bom mais» (forte), «muito bom» (très forte), «excelente» (excellent) e «excecional» (exemplaire) (a seguir «segunda grelha de conversão»).

28      Por carta de 26 de maio de 2021, a recorrente apresentou observações sobre a resposta da Comissão à questão acima mencionada colocada pelo Tribunal Geral.

29      Por força do artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, na falta de um pedido de marcação de uma audiência de alegações apresentado pelas partes no prazo de três semanas a contar da notificação do encerramento da fase escrita do processo, o Tribunal Geral pode decidir julgar o recurso sem fase oral do processo. No presente caso, o Tribunal Geral (Sétima Secção Alargada), considerando‑se suficientemente esclarecido pelas peças dos autos, decidiu, na falta de tal pedido, julgar o recurso sem fase oral do processo.

30      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        anular a Decisão de 15 de abril de 2020 e, na medida do necessário, a Decisão de 16 de dezembro de 2019;

—        condenar a Comissão nas despesas.

31      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        negar provimento ao recurso;

—        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto ao objeto do litígio

32      A recorrente pede a anulação da Decisão de 15 de abril de 2020 e, na medida do necessário, da Decisão de 16 de dezembro de 2019.

33      Na contestação, a Comissão suscita uma exceção de inadmissibilidade contra o pedido de anulação da Decisão de 16 de dezembro de 2019, que foi substituída pela Decisão de 15 de abril de 2020.

34      Há que recordar que, segundo jurisprudência constante, quando um candidato a um concurso solicita o reexame de uma decisão adotada por um júri, é a decisão adotada por este último após o reexame da situação do candidato que constitui o ato lesivo na aceção do artigo 90.o, n.o 2, ou, eventualmente, do artigo 91.o, n.o 1, do Estatuto. A decisão tomada após o reexame substitui, desta forma, a decisão inicial do júri (v. Acórdão de 5 de setembro de 2018, Villeneuve/Comissão, T‑671/16, EU:T:2018:519, n.o 24 e jurisprudência referida; v. igualmente, neste sentido, Acórdão de 11 de março de 1986, Sorani e o./Comissão, 293/84, EU:C:1986:111, n.o 12).

35      Por conseguinte, há que considerar que, no presente caso, o único ato lesivo é a Decisão de 15 de abril de 2020.

36      Por conseguinte, na medida em que foi «na medida do necessário» que a recorrente pediu a anulação da Decisão de 16 de dezembro de 2019, há que começar por examinar o pedido de anulação da Decisão de 15 de abril de 2020.

 Quanto ao mérito

37      Em apoio do recurso, a recorrente invoca dois fundamentos, relativos, o primeiro, a um erro manifesto de apreciação e à violação das regras aplicáveis aos trabalhos do júri e, o segundo, à violação do dever de fundamentação e do princípio da boa administração visado no artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»).

38      Há que começar por examinar o segundo fundamento, uma vez que este se refere à questão, prévia, da fundamentação da Decisão de 15 de abril de 2020.

39      A recorrente alega que, mesmo depois de ter recebido a primeira grelha de conversão (v. n.o 11, supra) e as explicações relativas ao método de arredondamento utilizado pelo júri (v. n.o 20, supra), a fundamentação da Decisão de 15 de abril de 2020 não é suficiente para lhe permitir compreender a maneira como as três menções qualitativas «bom mais» (forte), «bom mais» (forte) e «bom» (bonne) obtidas nas três diferentes componentes da prova oral permitiram ao júri do concurso controvertido atribuir à sua prestação global na referida prova a menção qualitativa «bom» (bonne) e traduzir essa menção na nota numérica de 13/20.

40      A recorrente acrescenta que o júri aplicou necessariamente um método de ponderação e sustenta que a definição desse método não é abrangida pelos trabalhos dos júris de concurso que, por terem natureza comparativa, devem permanecer secretos, em conformidade com a jurisprudência relativa ao artigo 6.o do anexo III do Estatuto. Em sua opinião, elementos objetivos como a ponderação das notas, que são fixados pelo júri antes do início das provas para orientar os seus trabalhos e assegurar, em princípio, que estes decorrem de forma regular e objetiva, não incidem sobre a apreciação dos méritos dos candidatos nem sobre a comparação dos méritos respetivos destes.

41      Nas suas observações sobre a resposta da Comissão à questão do Tribunal Geral (v. n.os 27 e 28, supra), a recorrente alega que, mesmo depois de ter tomado conhecimento da segunda grelha de conversão, não consegue compreender por que razão lhe foi atribuída a nota numérica de 13/20. Em sua opinião, esta grelha mais não faz do que sublinhar a importância de saber precisamente em que momento o júri arredondou as notas e qual foi o método de ponderação utilizado.

42      A Comissão responde que, atendendo ao segredo dos trabalhos dos júris a respeito da expressão de um juízo de valor e ao amplo poder de apreciação de que estes gozam, a comunicação das notas obtidas nas diferentes provas constitui uma fundamentação suficiente das suas decisões. Tendo a recorrente sido informada de que, relativamente à sua prova oral, lhe tinha sido atribuída a nota de 13/20 e que só os nomes dos candidatos que tinham obtido uma nota de pelo menos 14/20 poderiam ser inscritos na lista de reserva, a Decisão de 15 de abril de 2020 está suficientemente fundamentada. Segundo a Comissão, só a título superabundante é que, em aplicação do princípio da boa administração, o júri comunicou à recorrente as menções qualitativas que lhe tinham sido atribuídas em cada um dos componentes da prova oral e a menção qualitativa global recebida a este título e, em seguida, lhe transmitiu a grelha de conversão e o bloco de papel, antes de aceitar fazer uma reunião por telefone com a sua presidente, que lhe indicou nomeadamente qual o método de arredondamento que tinha sido utilizado.

43      Além disso, embora a Comissão reconheça que a nota global numérica que o júri atribuiu à recorrente pela prova oral resulte de uma ponderação das três componentes desta prova, alega que a definição do método de ponderação estava no âmago do amplo poder de apreciação que o anúncio deste concurso, por não conter precisões a este respeito, conferiu ao júri, em conformidade com a jurisprudência. A divulgação deste método afetaria gravemente o segredo dos trabalhos do júri e a sua independência, uma vez que os candidatos não aprovados poderiam alegar que o método escolhido favoreceu uma certa categoria de candidatos.

44      Há que recordar, em primeiro lugar, que, por força do artigo 25.o, segundo parágrafo, segundo período, do Estatuto, qualquer decisão que afete interesses do funcionário deve ser fundamentada. Esta obrigação corresponde à que se encontra prevista, mais genericamente, no artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE, e no artigo 41.o da Carta, relativo ao princípio da boa administração, em especial no seu n.o 2, alínea c).

45      Em segundo lugar, o artigo 6.o do anexo III do Estatuto enuncia que «os trabalhos do júri são secretos».

46      Segundo jurisprudência constante, o dever de fundamentação tem por objeto, por um lado, fornecer ao interessado indicações suficientes para apreciar o bem‑fundado do ato lesivo e a oportunidade de interpor um recurso perante o juiz da União Europeia e, por outro, permitir a este último exercer a sua fiscalização sobre a legalidade do ato (v. Acórdão de 13 de setembro de 2016, Pohjanmäki/Conselho, T‑410/15 P, não publicado, EU:T:2016:465, n.o 77 e jurisprudência referida; v. igualmente, neste sentido, Acórdão de 11 de junho de 2020, Comissão/Di Bernardo, C‑114/19 P, EU:C:2020:457, n.o 51).

47      Há igualmente que salientar que o direito a uma boa administração previsto no artigo 41.o da Carta implica para a administração a obrigação de fundamentar as suas decisões, não constituindo esta fundamentação apenas, de forma geral, a expressão da transparência da atuação da administração, devendo igualmente permitir ao particular decidir, com pleno conhecimento de causa, se interpor um recurso jurisdicional terá para si alguma utilidade. Existe assim uma relação estreita entre o dever de fundamentação e o direito fundamental à proteção jurisdicional efetiva bem como ao direito à ação garantido pelo artigo 47.o da Carta (Acórdão de 10 de outubro de 2012, Sviluppo Globale/Comissão, T‑183/10, não publicado, EU:T:2012:534, n.o 40; v. igualmente, neste sentido, Acórdão de 8 de setembro de 2009, ETF/Landgren, T‑404/06 P, EU:T:2009:313, n.o 148 e jurisprudência referida).

48      A fundamentação deve, em princípio, ser comunicada ao interessado em simultâneo com a decisão que lhe é lesiva. A inexistência de fundamentação não pode ser regularizada pelo facto de o interessado tomar conhecimento dos fundamentos da decisão no decurso do processo que corre perante as jurisdições da União. No entanto, quando não esteja em causa a falta de fundamentação, mas a insuficiência de fundamentação, as explicações dadas no decurso do processo podem, em casos excecionais, sanar essa insuficiência, pelo que o fundamento relativo a esta última deixa de justificar a anulação da decisão em causa (v. Acórdão de 11 de junho de 2020, Comissão/Di Bernardo, C‑114/19 P, EU:C:2020:457, n.os 51 e 52 e jurisprudência referida).

49      Segundo o Tribunal de Justiça, não existe um direito de as instituições da União regularizarem perante o juiz da União as suas decisões insuficientemente fundamentadas, nem uma obrigação de este último tomar em consideração as explicações complementares fornecidas apenas no decurso da instância pelo autor do ato em causa para apreciar o respeito do dever de fundamentação. Com efeito, semelhante estado do direito poderia desvirtuar a repartição de competências entre a administração e o juiz da União, enfraquecer a fiscalização da legalidade e comprometer o exercício do direito de recurso. Só em casos excecionais, em que se constate que a instituição da União em causa estava na prática impossibilitada de fundamentar suficientemente a decisão impugnada, é que a fundamentação pode ser completada por explicações fornecidas pelo autor do ato no decurso da instância (v., neste sentido, Acórdão de 11 de junho de 2020, Comissão/Di Bernardo, C‑114/19 P, EU:C:2020:457, n.os 58 e 59).

50      No que se refere às decisões tomadas por um júri de concurso, como o Tribunal de Justiça declarou no Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati (C‑254/95 P, EU:C:1996:276), o dever de fundamentação deve ser conciliado com o respeito pelo segredo dos trabalhos do júri previsto no artigo 6.o do anexo III do Estatuto. Este sigilo foi instituído para garantir a independência dos júris de concurso e a objetividade dos seus trabalhos, protegendo‑os de quaisquer ingerências e pressões externas, independentemente de provirem da própria administração da União, dos candidatos interessados ou de terceiros. Assim, o respeito por este segredo opõe‑se tanto à divulgação das atitudes tomadas pelos membros individuais do júri como à revelação de todos os elementos relacionados com apreciações de caráter pessoal ou comparativo respeitantes aos candidatos (Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati, C‑254/95 P, EU:C:1996:276, n.o 24).

51      A exigência de fundamentação das decisões de um júri de concurso deve, nestas condições, tomar em consideração a natureza dos trabalhos em causa (Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati, C‑254/95 P, EU:C:1996:276, n.o 25).

52      Os trabalhos de um júri de concurso comportam, em regra, pelo menos duas fases distintas, a saber, em primeiro lugar, o exame das candidaturas para selecionar os candidatos admitidos a concurso e, em segundo lugar, o exame das aptidões dos candidatos ao lugar a prover, para elaborar uma lista de reserva (Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati, C‑254/95 P, EU:C:1996:276, n.o 26).

53      A primeira fase consiste, nomeadamente no âmbito de um concurso documental, na confrontação dos documentos apresentados pelos candidatos com as qualificações exigidas pelo anúncio de concurso. Sendo esta comparação efetuada com base em dados objetivos e, aliás, conhecidos de cada um dos candidatos no que se lhes refere, o respeito pelo segredo que envolve os trabalhos do júri não se opõe à comunicação destes dados objetivos, designadamente dos critérios de apreciação que estão na base da seleção efetuada, na fase das operações preliminares do concurso, para que as pessoas cujas candidaturas foram rejeitadas antes da prestação de qualquer prova pessoal possam conhecer os possíveis fundamentos da sua eliminação (Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati, C‑254/95 P, EU:C:1996:276, n.o 27).

54      Em contrapartida, a segunda fase dos trabalhos do júri de concurso é essencialmente de natureza comparativa e está, por este motivo, coberta pelo segredo inerente a estes trabalhos (Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati, C‑254/95 P, EU:C:1996:276, n.o 28).

55      Os critérios de correção adotados pelo júri antes da realização das provas fazem parte integrante das apreciações de natureza comparativa levadas a cabo pelo júri relativamente aos méritos respetivos dos candidatos. Com efeito, destinam‑se a assegurar, no interesse destes últimos, uma certa homogeneidade das apreciações do júri, designadamente quando o número de candidatos é elevado. Estes critérios estão assim abrangidos pelo segredo das deliberações ao mesmo título que as apreciações do júri (Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati, C‑254/95 P, EU:C:1996:276, n.o 29).

56      As apreciações de natureza comparativa efetuadas pelo júri refletem‑se nas notas que este último atribui aos candidatos. Estas constituem a expressão dos juízos de valor levados a cabo relativamente a cada um deles (Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati, C‑254/95 P, EU:C:1996:276, n.o 30).

57      Baseando‑se nestes princípios, o Tribunal de Justiça considerou, nos n.os 31 e 32 do Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati (C‑254/95 P, EU:C:1996:276), que, atendendo ao segredo dos trabalhos do júri, a comunicação das notas obtidas nas diferentes provas constituía uma fundamentação suficiente das decisões do júri e que tal fundamentação não lesava os direitos dos candidatos, uma vez que lhes permitia conhecer o juízo de valor que tinha sido efetuado relativamente às suas prestações e verificar, sendo caso disso, que não tinham efetivamente obtido o número de pontos exigido pelo anúncio de concurso.

58      É à luz destes princípios que há que verificar se a Decisão de 15 de abril de 2020 está suficientemente fundamentada.

59      Em primeiro lugar, há que constatar que a Decisão de 15 de abril de 2020 não é abrangida pela primeira fase referida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça, relativa à admissão dos candidatos a concurso, depois de verificado que os candidatos preenchem os requisitos previstos para este efeito no anúncio de concurso. Esta decisão enquadra‑se na segunda fase, uma vez que o júri do concurso controvertido teve de proceder a uma apreciação da prestação da recorrente durante a prova oral não apenas com o objetivo de examinar se lhe podia ser atribuída a nota mínima de 10/20 fixada pelo anúncio de concurso, mas também de avaliar esta prestação face às dos outros candidatos. Com efeito, o anúncio de concurso previa que, no domínio escolhido pela recorrente, só os 30 candidatos que tivessem obtido as melhores notas na prova oral poderiam ver os seus nomes inscritos na lista de reserva (v. n.os 3, 6 e 7, supra).

60      Em segundo lugar, há que recordar as informações já dadas à recorrente na Decisão de 16 de dezembro de 2019, confirmada pela Decisão de 15 de abril de 2020. Nesta decisão, conforme foi acima exposto no n.o 9, o júri começou por indicar que tinha sido atribuída à prestação da recorrente na prova oral do concurso controvertido a nota global de 13/20, sendo que a comparação entre as prestações dos candidatos admitidos a esta prova tinha conduzido o júri a inscrever na lista de reserva apenas os nomes daqueles que tinham obtido uma nota global mínima de 14/20.

61      Em seguida, o júri especificou que a prestação global da recorrente na prova oral podia ser qualificada com «bom» (bonne).

62      Por último, o júri comunicou as menções qualitativas que tinha atribuído à recorrente para cada uma das três componentes da prova oral resultante da secção 4 do título III do anúncio de concurso controvertido (v. n.o 5, supra), segundo a qual esta prova compreendia duas partes, contendo a primeira duas subpartes.

63      Em terceiro lugar, conforme foi acima recordado no n.o 11, a Comissão comunicou posteriormente à recorrente a primeira grelha de conversão, na qual foi indicada a correspondência entre as menções qualitativas utilizadas pelo júri e as notas numéricas compreendidas entre um e dez. Desta grelha resulta que as menções qualitativas «bom» (bonne) e «bom mais» (forte) equivalem respetivamente às notas numéricas de 6/10 e de 7/10.

64      Em quarto lugar, a Comissão apresentou ao Tribunal Geral a segunda grelha de conversão, acima mencionada no n.o 27, na qual figura a correspondência entre, por um lado, as notas numéricas compreendidas entre um e vinte e, por outro, as menções qualitativas comunicadas aos candidatos após a prova oral.

65      Em quinto lugar, há que salientar que, conforme resulta da Decisão de 15 de abril de 2020, o júri adotou um método de ponderação aplicável às três componentes da prova oral previstas no anúncio do concurso controvertido. Na contestação, a Comissão confirma que a nota global de 13/20 obtida pela recorrente não é uma média aritmética das avaliações relativas a estas três componentes, antes resultando de uma média ponderada destas.

66      Por conseguinte, há que constatar que o júri do concurso controvertido adotou um coeficiente de ponderação para cada componente da prova oral resultante do anúncio deste concurso (a seguir «coeficientes de ponderação em causa»). Os coeficientes de ponderação em causa foram aplicados às avaliações efetuadas pelo júri relativamente às prestações dos candidatos a estas componentes, para obter uma média ponderada destas três avaliações. Assim, estes coeficientes de ponderação contribuem de forma substancial para a compreensão que a recorrente pode ter da forma como a sua prestação, depois de ter sido avaliada nestas três componentes, foi convertida numa nota global numérica numa escala de vinte valores, em conformidade com o anúncio do concurso controvertido (v. n.o 6, supra). A recorrente passou assim a dispor da primeira e da segunda grelha de conversão. No entanto, sem conhecer os coeficientes de ponderação em causa, a recorrente não está em condições de compreender de que modo as menções qualitativas «bom mais» (forte), «bom mais» (forte), «bom» (bonne), que lhe foram atribuídas nas três componentes da prova oral e que, segundo a primeira grelha de conversão, correspondem às notas numéricas 7, 7 e 6, puderam dar origem a uma nota global numérica de 13/20 que corresponde, de acordo com a segunda grelha de conversão, à menção qualitativa «bom» (bonne). Há que salientar que, consoante a importância de cada um destes coeficientes, não é de excluir que a média ponderada das referidas notas numéricas conduza a uma nota global numérica, arredondada e convertida para uma escala de vinte valores e atinja o limiar de 14/20 exigido para que um candidato figure entre os aprovados do concurso controvertido (v. n.o 9, supra).

67      No entanto, há que determinar se a comunicação dos coeficientes de ponderação em causa é compatível com o segredo dos trabalhos do júri previsto no artigo 6.o do anexo III do Estatuto, conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça.

68      É certo que, como acima se recordou no n.o 57, no Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati (C‑254/95 P, EU:C:1996:276, n.os 31 e 32), o Tribunal de Justiça, depois de ter ponderado as exigências resultantes, por um lado, do dever de fundamentação, e, por outro, do segredo dos trabalhos do júri, declarou que a comunicação das notas obtidas nas diferentes provas constituía uma fundamentação suficiente das decisões do júri e que tal fundamentação não lesava os direitos dos candidatos.

69      Contudo, no processo que deu origem ao Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati (C‑254/95 P, EU:C:1996:276), o recorrente não tinha sido admitido às provas de um concurso que tinham lugar após a prova escrita na qual tinha obtido uma nota inferior ao mínimo exigido pelo anúncio de concurso. Este último não previa que esta prova escrita seria composta por vários elementos. Por conseguinte, a referência feita pelo Tribunal de Justiça às «classificações obtidas nas diferentes provas» não pode ser interpretada no sentido de que visa unicamente as notas individuais eliminatórias, por oposição às avaliações intermediárias relativas às diferentes componentes de uma prova previstas no anúncio de concurso. Não resulta assim desta jurisprudência que a comunicação a um candidato de uma única nota individual eliminatória constitua, em todas as circunstâncias, uma fundamentação suficiente, independentemente das especificidades de cada concurso.

70      Além disso, não se pode deduzir do Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati (C‑254/95 P, EU:C:1996:276), que o conceito de «critérios de correção», que o Tribunal de Justiça considerou estarem protegidos pelo segredo dos trabalhos do júri, compreende elementos como os coeficientes de ponderação em causa.

71      Há que salientar que os «critérios de correção» visados no Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati (C‑254/95 P, EU:C:1996:276), guiam o júri na avaliação das prestações dos candidatos durante as provas de um concurso e as eventuais componentes de cada prova. Constituem um instrumento ao qual o júri recorre quando efetua um juízo de valor sobre estas prestações, para assegurar a homogeneidade das suas avaliações. Neste sentido, como o Tribunal de Justiça declarou no referido acórdão, estes critérios fazem parte integrante das apreciações de natureza comparativa que o júri tem de efetuar relativamente aos méritos respetivos dos candidatos e devem, por conseguinte, permanecer secretos (v. n.o 55, supra). Com efeito, para avaliar com total objetividade e liberdade os candidatos, um júri de concurso deve poder estruturar o seu trabalho, estabelecendo para si próprio critérios e subcritérios, se necessário ponderados entre si.

72      Em contrapartida, os coeficientes estabelecidos por um júri para ponderar os elementos que compõem uma prova previstos no anúncio de concurso não desempenham a mesma função que os critérios de correção visados no Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati (C‑254/95 P, EU:C:1996:276). Com efeito, estes coeficientes não se destinam a contribuir para a avaliação comparativa das prestações dos candidatos na prova em questão. São fixados pelo júri, no exercício do seu poder de apreciação, para exprimir a importância relativa que atribui às diferentes componentes da prova, visadas no anúncio de concurso, na nota global atribuída a um candidato a título desta prova. A fixação prévia do valor relativo das diferentes componentes de uma prova previstas no anúncio de concurso deve assim ser distinguida da apreciação das prestações dos candidatos em cada uma destas componentes.

73      Deste modo, o Acórdão de 4 de julho de 1996, Parlamento/Innamorati (C‑254/95 P, EU:C:1996:276), não pode ser interpretado no sentido de que a ponderação entre as exigências acima visadas no n.o 68 impõe que, quando um anúncio de concurso preveja que uma prova é constituída por várias componentes, os coeficientes previamente atribuídos pelo júri a cada uma destas componentes para efeitos da sua ponderação estão cobertos pelo segredo dos trabalhos do júri. Do referido acórdão não decorre assim que estes coeficientes estão excluídos dos elementos que, em aplicação do dever de fundamentação, devem ser comunicados aos candidatos eliminados do concurso.

74      Além disso, há que recordar que o Tribunal Geral já declarou, a respeito de uma prova oral que visava avaliar os conhecimentos linguísticos dos candidatos a um concurso em francês e em inglês bem como em todas as outras línguas da União que estes candidatos tinham declarado conhecer nos respetivos atos de candidatura, que, quando um júri tinha procedido a uma classificação intermédia dos conhecimentos dos candidatos em cada uma destas línguas, o dever de fundamentação exigia que, a pedido do candidato, lhe fossem comunicadas as notas intermédias que lhe tinham sido atribuídas em relação às diferentes línguas que foram objeto da prova e o método seguido pelo júri para determinar a nota final. Com efeito, o Tribunal Geral salientou que a comunicação destes elementos não implicava a divulgação das atitudes tomadas pelos membros individuais do júri nem a revelação de elementos relativos a apreciações de natureza pessoal ou comparativa respeitantes aos candidatos. Não era assim incompatível com o respeito pelo segredo dos trabalhos do júri (Acórdão de 28 de abril de 2004, Pascall/Conselho, T‑277/02, EU:T:2004:117, n.os 2 e 28).

75      Por outro lado, resulta da jurisprudência do Tribunal da Função Pública da União Europeia que, atendendo ao segredo dos trabalhos de um júri de concurso e ao amplo poder de apreciação de que este júri dispõe para avaliar os resultados das provas de um concurso, este não pode ser obrigado, quando fundamenta o insucesso de um candidato numa prova, a especificar as respostas do candidato que foram consideradas insuficientes ou a explicar por que motivo estas respostas foram consideradas insuficientes. Contudo, este segredo e este amplo poder de apreciação não implicam que as notas obtidas em cada uma das componentes da prova oral mencionadas no anúncio de concurso não possam ser eventualmente comunicadas aos candidatos a um concurso que apresentem um pedido nesse sentido (v., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 2010, Wybranowski/Comissão, F‑17/08, EU:F:2010:83, n.os 98 e 99 e jurisprudência referida). Segundo o Tribunal da Função Pública da União Europeia, para respeitar o dever de fundamentação, esta comunicação, quando um candidato a tenha solicitado, deve, em princípio, ser realizada antes de expirar o prazo previsto nos artigos 90.o e 91.o do Estatuto (v., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 2010, Wybranowski/Comissão, F‑17/08, EU:F:2010:83, n.o 100). Há que acrescentar que, para afastar uma alegação relativa à violação do dever de fundamentação, o Tribunal da Função Pública constatou que a recorrente tinha podido obter a comunicação nomeadamente da ponderação dos quatro «critérios de avaliação» mencionados no anúncio de concurso a respeito da prova oral (v., neste sentido, Acórdão de 8 de julho de 2010, Wybranowski/Comissão, F‑17/08, EU:F:2010:83, n.os 8, 50, 104 e 106).

76      Esta jurisprudência do Tribunal Geral e do Tribunal da Função Pública é conforme com a relação estreita que existe, como foi acima recordado no n.o 47, entre o dever de fundamentação e a proteção jurisdicional efetiva, bem como com a limitação a casos excecionais, conforme resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça acima recordada no n.o 49, do direito de completar uma fundamentação insuficiente com elementos apresentados no decurso da instância. Com efeito, se o método seguido pelo júri para fixar a nota global eliminatória atribuída a um candidato em relação a uma prova não for conhecido em tempo útil, a partir das avaliações feitas pelo júri das prestações do referido candidato nas diferentes componentes desta prova previstas no anúncio de concurso, este candidato não está em condições de compreender se o júri cometeu um erro, não na elaboração destas avaliações, que está protegida pelo segredo dos trabalhos do júri, mas na fixação da nota global eliminatória. Este candidato não está assim em condições de avaliar se é oportuno interpor um recurso no Tribunal Geral.

77      Além disso, o dever de fundamentação e o direito a uma proteção jurisdicional efetiva são princípios gerais do direito da União que estão agora consagrados na Carta, enquanto o segredo dos trabalhos do júri foi fixado num ato de direito derivado. Por conseguinte, o artigo 6.o do anexo III do Estatuto deve ser interpretado à luz da Carta.

78      À luz das considerações que precedem, há que concluir que, na medida em que os coeficientes de ponderação em causa não são instrumentos utilizados pelo júri do concurso para efetuar um juízo de valor sobre as prestações dos candidatos nas três componentes da prova oral visadas no anúncio de concurso, estes coeficientes não estão cobertos pelo segredo previsto no artigo 6.o do anexo III do Estatuto.

79      Esta conclusão não é posta em causa pelos argumentos da Comissão que se baseiam no amplo poder de apreciação de que o júri de concurso dispõe (v. n.o 43, supra).

80      Segundo a jurisprudência, o júri do concurso dispõe de um amplo poder de apreciação para conduzir os seus trabalhos. Por conseguinte, quando o anúncio de concurso não preveja critérios de classificação, o júri pode fixar esses critérios ou, quando o anúncio os preveja mas não indique a respetiva ponderação, pode determinar esta última (v. Acórdão de 11 de dezembro de 2012, Mata Blanco/Comissão, F‑65/10, EU:F:2012:178, n.o 55 e jurisprudência referida; v. igualmente, neste sentido, Acórdãos de 24 de março de 1988, Goossens e o./Comissão, 228/86, EU:C:1988:172, n.os 11, 13 e 14, e de 19 de abril de 1988, Santarelli/Comissão, 149/86, EU:C:1988:179, n.o 10).

81      Daqui decorre que, quando um anúncio de concurso não especifica a ponderação de cada critério de avaliação mencionado no anúncio de concurso para uma determinada prova, o júri pode determinar a forma como o número total de pontos que esse anúncio prevê para essa prova deve ser repartido entre os diferentes elementos que compõem esta, atendendo à importância que atribui a esses elementos à luz dos lugares a prover (v., neste sentido, Acórdão de 11 de dezembro de 2012, Mata Blanco/Comissão, F‑65/10, EU:F:2012:178, n.o 56 e jurisprudência referida).

82      No presente caso, o anúncio do concurso controvertido descreveu os elementos que compunham a prova oral (v. n.o 5, supra), sem, no entanto, especificar a ponderação que seria atribuída a cada um destes elementos para efeitos da determinação da nota global.

83      Deste modo, foi com razão que o júri do concurso controvertido fixou os três coeficientes de ponderação em causa.

84      No entanto, não resulta do que precede que os coeficientes de ponderação em causa estejam excluídos dos elementos que devem ser comunicados aos candidatos eliminados, para assegurar o respeito pelo dever de fundamentação.

85      Com efeito, segundo a jurisprudência, nos casos em que uma instituição dispõe de um amplo poder de apreciação, a fiscalização do respeito pelas garantias conferidas pela ordem jurídica da União nos procedimentos administrativos reveste uma importância fundamental. Entre estas garantias figura nomeadamente a obrigação de a instituição competente examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos pertinentes do caso concreto e de fundamentar a sua decisão de forma suficiente (Acórdãos de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, EU:C:1991:438, n.o 14, e de 8 de setembro de 2009, ETF/Landgren, T‑404/06 P, EU:T:2009:313, n.o 163).

86      Além disso, segundo a jurisprudência acima mencionada nos n.os 46 e 47, o dever de fundamentação tem precisamente por objetivo permitir aos interessados exercerem o seu direito à ação e ao juiz da União exercer a fiscalização da legalidade das decisões da administração.

87      Há que salientar que, uma vez que os júris de concurso dispõem de um amplo poder de apreciação, a fiscalização da legalidade das suas decisões consiste, para o juiz, em verificar se este poder de apreciação foi exercido com base em critérios objetivos e se esse exercício não padece de um erro manifesto ou de desvio de poder ou se os limites do poder de apreciação não foram manifestamente ultrapassados (v., neste sentido, Acórdão de 11 de fevereiro de 1999, Jiménez/IHMI, T‑200/97, EU:T:1999:26, n.o 40 e jurisprudência referida). Desta forma, no presente caso, embora não possa substituir a apreciação do júri pela sua própria apreciação, o Tribunal Geral deve, no entanto, ter condições para fiscalizar, à luz do dever de fundamentação, que este avaliou a prestação oral da recorrente com base nas três componentes desta prova previstas no anúncio do concurso controvertido e que não foi cometido um erro no cálculo da nota global efetuado ao abrigo da apreciação efetuada pelo júri relativamente a cada uma destas três componentes.

88      À luz de todas as considerações que precedem, há que concluir que, na medida em que a recorrente não teve conhecimento dos coeficientes de ponderação em causa, a Decisão de 15 de abril de 2020 não está suficientemente fundamentada, e isto não obstante os elementos que a Comissão forneceu à recorrente após a adoção da referida decisão, admitindo que pudessem ser tomados em consideração ao abrigo da jurisprudência acima recordada nos n.os 48 e 49.

89      Por conseguinte, há que julgar procedente o segundo pedido e anular a Decisão de 15 de abril de 2020, sem que seja necessário examinar o primeiro fundamento (v. n.o 38, supra) nem pronunciar‑se sobre a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão relativamente ao pedido de anulação, formulada na medida em que fosse necessária, da Decisão de 16 de dezembro de 2019 (v. n.os 30 e 33, supra).

 Quanto às despesas

90      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com os pedidos da recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sétima Secção alargada)

decide:

1)      A Decisão do júri do concurso interno COM/03/AD/18 (AD 6) — Administradores, de 15 de abril de 2020, de não inscrever o nome de JR na lista de reserva para o recrutamento de administradores de grau AD 6 no domínio da administração pública europeia é anulada.

2)      A Comissão Europeia é condenada nas despesas.

da Silva Passos

Valančius

Reine

Truchot

 

      Sampol Pucurull

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 22 de setembro de 2021.

Assinaturas


*      Língua do processo: francês.