Language of document : ECLI:EU:T:2016:449

Processo T‑472/13

H. Lundbeck A/S

e

Lundbeck Ltd

contra

Comissão Europeia

«Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercado dos medicamentos antidepressivos que contêm o ingrediente farmacêutico ativo citalopram — Conceito de restrição da concorrência por objetivo — Concorrência potencial — Medicamentos genéricos — Barreiras à entrada no mercado resultantes da existência de patentes — Acordos celebrados entre o titular de patentes e das empresas de medicamentos genéricos — Artigo 101.°, n.os 1 e 3, TFUE — Erros de direito e de apreciação — Dever de fundamentação — Direitos de defesa — Segurança jurídica — Coimas»

Sumário — Acórdão do Tribunal Geral (Nona Secção) de 8 de setembro de 2016

1.      Acordos, decisões e práticas concertadas — Infração à concorrência — Concorrência potencial — Possibilidade real e concreta de uma empresa de medicamentos genéricos entrar com risco no mercado em presença de medicamentos protegidos por patentes — Acordo entre o titular das patentes e empresas de medicamentos genéricos suscetível de impedir essa entrada — Restrição da concorrência potencial

(Artigo 101.°, n.° 1, TFUE)

2.      Concorrência — Procedimento administrativo — Decisão da Comissão que declara a existência de uma infração — Prova da infração e da respetiva duração a cargo da Comissão — Alcance do ónus da prova — Grau de precisão exigido para os elementos de prova tidos em conta pela Comissão — Conjunto de indícios — Presunção de inocência — Aplicabilidade — Ónus da prova das empresas que contestam a realidade da infração — Fiscalização jurisdicional — Alcance

(Artigos 101.°, n.° 1, TFUE e 263.° TFUE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 2.°)

3.      Acordos, decisões e práticas concertadas — Proibição — Infrações — Transação em matéria de patentes — Transação celebrada entre um laboratório de medicamentos originais e uma empresa de medicamentos genéricos — Pagamentos inversos com caráter desproporcionado e associados a uma exclusão de concorrentes do mercado — Inadmissibilidade

(Artigo 101.°, n.° 1, TFUE)

4.      Recurso de anulação — Competência do juiz da União — Interpretação do direito nacional de um Estado‑Membro — Questão de facto — Inclusão

(Artigo 263.° TFUE)

5.      Acordos, decisões e práticas concertadas — Infração à concorrência — Critérios de apreciação — Teor e objetivo de um cartel e contexto económico e jurídico do seu desenvolvimento — Distinção entre infrações pelo objetivo e pelo efeito — Intenção das partes num acordo de restringirem a concorrência — Critério não necessário — Infração pelo objetivo — Suficiente grau de nocividade — Critérios de apreciação

(Artigo 101.°, n.° 1, TFUE)

6.      Acordos, decisões e práticas concertadas — Infração à concorrência — Transações em matéria de patentes — Transação celebrada entre um laboratório de medicamentos originais e uma empresa de medicamentos genéricos — Solução mais rentável ou de menor risco para as empresas em causa — Objetivo de atenuar os efeitos de normas jurídicas demasiado desfavoráveis — Irrelevância para a ilicitude desses acordos

(Artigo 101.°, n.° 1, TFUE)

7.      Acordos, decisões e práticas concertadas — Infração à concorrência — Restrição acessória — Conceito — Caráter objetivo e proporcionado — Restrição que torna mais difícil ou menos lucrativa a operação principal — Transações em matéria de patentes — Transação celebrada entre um laboratório de medicamentos originais e uma empresa de medicamentos genéricos — Cláusulas restritivas da concorrência acessórias à proteção de um direito de propriedade intelectual — Inexistência de uma restrição objetivamente necessária

(Artigo 101.°, n.° 1, TFUE)

8.      Concorrência — Regras da União — Âmbito de aplicação material — Transações em matéria de patentes — Inclusão — Transação celebrada entre um laboratório de medicamentos originais e uma empresa de medicamentos genéricos — Aplicação d critério do âmbito de aplicação da patente — Teste irrelevante — Infração pelo objetivo

(Artigo 101.°, n.° 1, TFUE)

9.      Ato das instituições — Fundamentação — Dever — Alcance — Decisão de aplicação das normas de concorrência — Fiscalização jurisdicional — Alcance

(Artigos 101.° TFUE, 261.° TFUE e 296.°, n.° 2, TFUE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 31.°)

10.    Recurso de anulação — Fundamentos — Falta de fundamentação ou fundamentação insuficiente — Fundamento distinto daquele que tem por objeto a legalidade quanto ao mérito

(Artigos 263.° TFUE e 296.° TFUE)

11.    Acordos, decisões e práticas concertadas — Proibição — Isenção — Requisitos — Ónus da prova — Alcance

(Artigo 101.°, n.° 3, TFUE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 2.°)

12.    Concorrência — Procedimento administrativo — Comunicação de acusações — Caráter provisório — Conteúdo necessário — Limites

[Artigo 101.° TFUE; Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigo 41.°, n.° 2, alínea a); Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 27.°, n.° 1]

13.    Concorrência — Procedimento administrativo — Comunicação de acusações — Não divulgação de certos dados às empresas — Decisão final da Comissão parcialmente baseada nesses dados — Violação dos direitos de defesa — Validade da decisão final no seu conjunto — Conhecimento do mérito da decisão pelo Tribunal Geral — Consideração dos dados controvertidos — Exclusão

(Artigo 101.° TFUE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 27.°, n.° 1)

14.    Concorrência — Regras da União — Infrações — Prática dolosa ou por negligência — Conceito — Empresa que não podia ignorar o caráter anticoncorrencial do seu comportamento — Transação celebrada entre um laboratório de medicamentos originais e uma empresa de medicamentos genéricos — Pagamentos inversos com caráter desproporcionado e associados a uma exclusão dos concorrentes do mercado — Inclusão

(Artigo 101.° TFUE; Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigo 47.°; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigos 5.° e 23.°, n.° 2)

15.    Concorrência — Coimas — Montante — Determinação — Obrigação de a Comissão seguir a sua prática decisória anterior — Inexistência — Aumento do nível geral das coimas — Admissibilidade

(Artigo 101.° TFUE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2)

16.    Concorrência — Coimas — Montante — Determinação — Fixação do montante de base — Gravidade da infração — Critérios de apreciação — Determinação do valor das vendas — Respeito do princípio da proporcionalidade

(Artigo 101.° TFUE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigos 23.°, n.os 2 e 3; Comunicação 2006/C 210/02 da Comissão, pontos 21 e 22)

17.    Concorrência — Coimas — Montante — Determinação — Caráter dissuasivo

(Artigo 101.° TFUE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigos 23.°, n.os 2 e 3; Comunicação 2006/C 210/02 da Comissão, ponto 25)

18.    Concorrência — Coimas — Montante — Determinação — Ajustamento do montante de base — Circunstâncias atenuantes — Caráter indicativo das circunstâncias previstas nas orientações — Primeiro caso de aplicação das normas da concorrência num determinado setor — Inexistência de circunstância atenuante

(Artigo 101.° TFUE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2; Comunicação 2006/C 210/02 da Comissão, ponto 29)

19.    Concorrência — Coimas — Montante — Determinação — Ajustamento do montante de base — Circunstâncias atenuantes — Infração cometida por negligência — Necessidade de ter separadamente em conta cada uma das circunstâncias atenuantes previstas nas orientações — Inexistência — Apreciação global

(Artigo 101.° TFUE; Regulamento n.° 1/2003 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2; Comunicação 2006/C 210/02 da Comissão, ponto 29)

1.      O artigo 101.°, n.° 1, TFUE é apenas aplicável aos setores abertos à concorrência. A esse respeito, a análise das condições de concorrência num determinado mercado assenta não só na concorrência atual das empresas já presentes no mercado em causa, mas também na concorrência potencial, a fim de saber se, tendo em conta a estrutura do mercado e o contexto económico e jurídico em que se enquadra o seu funcionamento, existem possibilidades reais e concretas de as empresas envolvidas competirem entre si, ou de um novo concorrente entrar no mercado em causa e fazer concorrência às empresas já estabelecidas. A esse respeito, o próprio facto de uma empresa já presente num mercado ter tentado celebrar acordos ou instituir mecanismos de trocas de informações com outras empresas que não estavam presentes nesse mercado constitui um indício sério de que este não é impenetrável.

No mercado dos medicamentos, as patentes de processos de laboratório de medicamentos originais não constituem necessariamente barreiras intransponíveis para as empresas de medicamentos genéricos se, de forma geral, existirem várias vias que constituam possibilidades concretas e realistas de estas entrarem no mercado. Entre essas possibilidades figura, nomeadamente, o lançamento do produto genérico «com risco», com a possibilidade de enfrentar o laboratório de medicamentos originais no âmbito de eventuais litígios. Tal possibilidade representa efetivamente a expressão de uma concorrência potencial, numa situação em que as patentes originais do laboratório expiraram e em que e em que existam outros processos que permitam produzir genéricos que não se tenha provado violarem outras patentes desse laboratório. Além disso, as diligências e os investimentos efetuados pelas empresas de genéricos para entrarem no mercado do medicamento original antes de celebrarem acordos restritivos dessa entrada com esse laboratório demonstram que, no momento desses acordos, estavam prontas a entrar no mercado e a correr os riscos inerentes a tal entrada.

Além disso, a presunção de validade das patentes não pode equivaler a uma presunção de ilegalidade dos produtos genéricos validamente introduzidos no mercado que o titular da patente entenda ser por eles violada. Com efeito, cabe ao titular da patente demonstrar nos tribunais nacionais, no caso de entrada de genéricos no mercado, que estes violam alguma das suas patentes de processo, uma vez que uma entrada com risco não é ilegal em si mesma. Por outo lado, no caso de uma ação por contrafação intentada pelo titular da patente contras as empresas de genéricos, é possível estas impugnarem a validade da patente invocada pelo titular através de um pedido reconvencional. Com efeito, esses pedidos são frequentes em matéria de patentes e levam frequentemente à declaração de invalidade da patente de processo invocada pelo titular. Para demonstrar o exercício legítimo de uma concorrência real e potencial, é necessário demonstrar unicamente que as empresas de genéricos dispõem de possibilidades reais e concretas e da capacidade de entrar no mercado, o que certamente sucede quando tiverem efetuado investimentos significativos para entrar no mercado, já tinham obtido as autorizações de introdução no mercado ou desenvolvido as diligências necessárias para as obter num prazo razoável.

No que respeita à entrada das empresas de genéricos no mercado, para poder considerar que representam une concorrência potencial, basta unicamente demonstrar que essa entrada no mercado ocorre num prazo razoável, ainda mais quando, no setor farmacêutico em particular, a concorrência potencial pode ser feita ainda antes de expirar uma patente.

Por último, a concorrência potencial inclui, nomeadamente, as atividades das empresas de genéricos que visam obter as autorizações de introdução no mercado necessárias e a realização de todas as diligências administrativas e comerciais indispensáveis para preparar a entrada no mercado. Esta concorrência potencial está protegida no artigo 101.° TFUE. Com efeito, no caso de ser possível, sem violar o direito da concorrência, pagar às empresas que estão a efetuar as diligências indispensáveis para preparar o lançamento de um medicamento genérico e que fizeram investimentos significativos para o efeito, para que cessem ou simplesmente abrandem esse processo, nunca haverá concorrência efetiva ou esta sofrerá atrasos significativos, à custa dos consumidores, ou seja, dos pacientes ou das caixas de previdência.

(cf. n.os 98 a 104, 121 a 124, 128 a 132, 144, 157, 160, 163, 164, 171, 180, 181, 202, 203, 317, 426, 471 a 474)

2.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 105 a 113, 138, 139, 141, 165, 166)

3.      A aplicação do artigo 101.°, n.° 1, TFUE às transações que podem ser celebradas em matéria de patentes de modo nenhum está excluída. A este respeito, embora não caiba à Comissão definir a extensão de uma patente, essa instituição não se pode abster de qualquer iniciativa quando a extensão de uma patente seja relevante para a apreciação de uma violação dos artigos 101.° e 102.° TFUE.

Neste contexto, o facto de as restrições contidas nos acordos controvertidos terem sido obtidas através de pagamentos inversos significativos constitui um elemento decisivo para a apreciação jurídica desses acordos. A existência de um pagamento inverso no âmbito de uma transação em matéria de patentes nem sempre é problemática, nomeadamente quando esse pagamento esteja ligado à força da patente, tal como entendida por cada uma das partes, quando seja necessário para encontrar uma solução aceitável e legítima aos olhos de ambas as partes e não seja acompanhado de restrições que visem adiar a entrada de genéricos no mercado. Em contrapartida, quando um pagamento inverso é conjugado com uma exclusão do mercado de concorrente ou com uma limitação dos elementos incentivadores para que tal entrada ocorra, pode‑se considerar que essa limitação não decorre exclusivamente da apreciação da força das patentes pelas partes, mas que é obtida através de tal pagamento, que, por isso, se assemelha à compra da concorrência.

O caráter desproporcionado de tais pagamentos, conjugado com vários outros fatores, como o facto de os montantes desses pagamentos parecerem, pelo menos, corresponder aos lucros esperados pelas empresas de genéricos em caso de entrada no mercado, a inexistência de cláusulas que permitissem às empresas de genéricos lançar os seus produtos no mercado quando os acordos expirassem sem terem de temer ações por contrafação por parte dos titulares das patentes, ou ainda a presença, nesses acordos, de restrições que excedam o alcance das patentes desse titular, permitem concluir que, no caso em apreço, esses acordos têm por objetivo restringir a concorrência, na aceção do artigo 101.°, n.° 1, TFUE.

Com efeito, quando se demonstre que as empresas de genéricos têm possibilidades reais de obter ganho de causa em caso de litígio com os titulares das patentes, ao celebrarem acordos restritivos da concorrência, esses titulares trocam essa incerteza pela certeza de que as empresas de genéricos não entrarão no mercado, através de pagamentos compensatórios significativos, eliminando assim qualquer concorrência, mesmo potencial, no mercado, durante a vigência desses acordos.

(cf. n.os 117 a 119, 140, 349, 350, 352‑354, 363, 369, 379, 399, 401, 414, 427, 429, 431, 460, 486 a 489, 500, 526 e 573)

4.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 258 e 625)

5.      Em matéria de comportamentos anticoncorrenciais abrangidos pelo artigo 101.° TFUE, determinadas formas de coordenação entre empresas revelam, pela sua própria natureza, um grau suficiente de nocividade relativamente ao bom funcionamento do jogo normal da concorrência para que se possa considerar que não há que examinar os seus efeitos.

A esse respeito, a exclusão de concorrentes do mercado constitui uma forma extrema de repartição de mercado e de limitação da produção. Não é necessário que o mesmo tipo de acordos já tenha sido condenado pela Comissão para que possa ser considerado uma restrição da concorrência por objetivo. O facto de a Comissão não ter considerado, no passado, que um acordo de um determinado tipo era, pelo seu próprio objetivo, restritivo da concorrência não é, em si mesmo, suscetível de a impedir de o fazer no futuro, na sequência de uma análise individual e circunstanciada das medidas controvertidas, atendendo ao seu conteúdo, à sua finalidade e ao seu contexto.

Por último, para poder ser qualificado de restrição da concorrência por objetivo na aceção dessa disposição, não se exige que um acordo tenha que ser considerado suficientemente nocivo para a concorrência à primeira vista ou indubitavelmente, sem a realização de um exame aprofundado do seu conteúdo, da sua finalidade, e do contexto económico e jurídico em que se insere.

(cf. n.os 338 a 344, 428, 434 a 438, 472, 523, 539, 752, 774 e 775)

6.      No âmbito de transações no mercado dos medicamentos, o facto de a adoção de um comportamento anticoncorrencial poder revelar‑se como a solução mais rentável ou menos arriscada para uma empresa não exclui de forma alguma a aplicação do artigo 101.° TFUE, em particular quando se trata de pagar aos concorrentes reais ou potenciais para que permaneçam fora do mercado e de partilhar com estes os lucros ganhos da inexistência de medicamentos genéricos nesse mercado, em detrimento dos consumidores.

Com efeito, não se pode admitir que, ao celebrar acordos com empresas titulares de patentes de medicamentos originais e empresas de medicamentos genéricos, que estipulam uma transferência de valor, pelos titulares das patentes, ligada à aceitação de limitações por empresas de medicamentos genéricos à sua entrada no mercado e, em particular a um compromisso de não vender o medicamento genérico que durante a vigência desses acordos, as empresas titulares das patentes podem precaver‑se contra uma descida irreversível dos preços, que, segundo as suas próprias afirmações, não poderia ter sido evitada mesmo que tivessem obtido ganho de causa nas ações por contrafação nos tribunais nacionais. Assim, ao celebrarem tais acordos, poderiam manter preços superiores para os seus produtos, em detrimento dos consumidores e dos orçamentos dos cuidados de saúde dos Estados, quando tal resultado não poderia ter sido obtido se os órgãos tribunais nacionais tivessem confirmado a validade das suas patentes e os produtos das empresas de genéricos tivessem sido considerados contrafeitos. Tal resultado seria manifestamente contrário aos objetivos das disposições do Tratado sobre a concorrência, que visam, nomeadamente, proteger os consumidores dos aumentos de preços injustificados resultantes de uma colusão entre concorrentes. Não existe qualquer razão para admitir que tal colusão é lícita sob o pretexto de estarem em causa patentes de processo, quando a defesa dessas patentes nos órgãos jurisdicionais nacionais, mesmo no cenário mais favorável para as recorrentes, não poderia ter conduzido aos mesmos resultados negativos para a concorrência e, em particular, para os consumidores. Com efeito, não se pode aceitar que as empresas tentem atenuar os efeitos de normas jurídicas que consideram excessivamente desfavoráveis através da celebração de acordos que têm por objeto corrigir essas desvantagens sob pretexto de as mesmas criarem um desequilíbrio em seu detrimento.

(cf. n.os 380, 386, 387, 427 e 459)

7.      Tratando‑se de determinar se uma restrição anticoncorrencial pode escapar à proibição prevista no artigo 101.°, n.° 1, TFUE, por constituir o acessório de uma operação principal desprovida de tal caráter anticoncorrencial, há que apurar se a realização dessa operação seria impossível na falta dessa restrição.

O caráter necessário de uma restrição exige um duplo exame. Com efeito, há que apurar, por um lado, se a restrição é objetivamente necessária à realização da operação principal e, por outro, se é proporcionada em relação a esta.

No que respeita ao exame do caráter objetivamente necessário de uma restrição, na medida em que a existência de uma regra de razoabilidade de direito da União da concorrência não pode ser admitida, seria errado interpretar, no âmbito da qualificação das restrições acessórias, a condição da necessidade objetiva como implicando uma ponderação dos efeitos pró‑concorrenciais e anticoncorrenciais de um acordo.

No caso de um acordo celebrado no setor farmacêutico entre um laboratório de medicamentos originais e uma empresa de medicamentos genéricos, as restrições da concorrência convencionadas nesse acordo não são objetivamente necessárias para proteger os direitos de propriedade intelectual do titular de patentes se houver outros meios para proteger esses direitos ou para transigir num litígio em matéria de patentes, sem estipular restrições relativas à entrada dos genéricos no mercado.

(cf. n.os 453 a 455 e 458)

8.      Embora a Comissão não possa inibir‑se de qualquer iniciativa quando a extensão de uma patente seja relevante para a apreciação de uma violação dos artigos 101.° e 102.° TFUE, não lhe cabe definir a extensão de uma patente. À luz desta consideração e dos objetivos inerentes ao artigo 101.° TFUE, que exigem, nomeadamente, que cada operador económico determine de maneira autónoma a política que pretende seguir no mercado a fim de proteger os consumidores dos aumentos de preços injustificados resultantes de uma colusão entre concorrentes, não se pode aplicar o critério do âmbito de aplicação da patente para avaliar os acordos controvertidos à luz do artigo 101.°, n.° 3, TFUE.

Com efeito, este critério é problemático do ponto de vista do direito da concorrência em vários aspetos. Em primeiro lugar, conduz à presunção de que um medicamento genérico viola a patente da empresa de medicamentos originais e permite, assim, excluir o medicamento genérico com esse fundamento, quando o caráter ilícito, ou não, do medicamento genérico é uma questão não resolvida. Em segundo lugar, baseia‑se na presunção de que qualquer patente invocada no âmbito de uma transação é considerada válida em caso de impugnação da sua validade, embora não exista fundamento para tal no direito ou na prática. Com efeito, a questão de saber se uma restrição entra ou não no âmbito de aplicação de uma patente é uma conclusão resultante de um exame do alcance e da validade desta e não o seu ponto de partida.

(cf. n.os 489 a 493, 499, 512 e 515)

9.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 507, 509, 791 a 794)

10.    V. texto da decisão.

(cf. n.° 508)

11.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 708 a 711)

12.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 726 a 729, 732 e 741)

13.    V. texto da decisão.

(n.os 745, 746, 748, 752 e 834)

14.    Quanto à questão de saber se uma infração foi cometida dolosamente ou por negligência e se, por isso, é punível com coima nos termos do artigo 23.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 1/2003, esse pressuposto está preenchido quando a empresa em causa não possa ignorar o caráter anticoncorrencial do seu comportamento, tenha ou não consciência de violar as regras de concorrência do Tratado.

Acresce que os princípios da segurança jurídica e da legalidade das penas, previstos no artigo 7.° da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950, e no artigo 49.° da Carta dos Direitos Fundamentais, não podem ser interpretados no sentido de impedir a clarificação gradual das regras da responsabilidade penal, mas podem opor‑se à aplicação retroativa de uma nova interpretação de uma norma que cria uma infração.

Neste contexto, não é imprevisível que os acordos através dos quais a empresa de medicamentos originais conseguiu afastar os concorrentes potenciais do mercado durante um período determinado, mediante pagamentos compensatórios significativos, possam ser contrários ao artigo 101.°, n.° 1, TFUE, quer excedam, ou não, o âmbito de aplicação das suas patentes. A esse respeito, uma leitura literal do artigo 101.°, n.° 1, TFUE permite compreender que os acordos entre concorrentes que visam excluir alguns deles do mercado são ilegais. Com efeito, os acordos de repartição ou de exclusão do mercado figuram entre as restrições mais graves da concorrência expressamente referidas no artigo 101.°, n.° 1, TFUE.

(cf. n.os 761 a 767 e 832)

15.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 773 e 810)

16.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 799, 800, 804, 808, 809 e 811)

17.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 820, 822 a 824)

18.     O facto de a existência de uma dúvida razoável sobre a existência de uma infração também não figurar expressamente entre as circunstâncias atenuantes referidas nas orientações para o cálculo das coimas aplicadas nos termos do artigo 23.° n.° 2, alínea a), do Regulamento (CE) n.° 1/2003 não basta para que a Comissão exclua automaticamente a sua aplicação enquanto circunstância atenuante. Com efeito, na falta de uma indicação de natureza imperativa nas orientações em relação às circunstâncias atenuantes que podem ser tidas em conta, a Comissão conservou uma certa margem de apreciação para analisar de forma global a importância de uma eventual redução do montante das coimas a título de circunstâncias atenuantes.

Todavia, a circunstância de uma decisão da Comissão constituir o primeiro caso de aplicação das regras da concorrência num determinado setor da economia não pode ser qualificada de atenuante se o autor da infração sabia ou não podia ignorar que o seu comportamento era suscetível de causar uma restrição da concorrência no mercado e de colocar problemas sob a perspetiva do direito da concorrência.

(cf. n.os 830 e 831)

19.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 838, 841 e 842)