Language of document : ECLI:EU:T:2002:21

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

(Primeira Secção Alargada)

30 de Janeiro de 2002 (1)

«Auxílios de Estado - Decisão que declara um auxílio compatível com o mercado comum - Recurso de anulação - Empresa beneficiária - Interesse em agir - Inadmissibilidade»

No processo T-212/00,

Nuove Industrie Molisane Srl, com sede em Sesto Campano (Itália), representada por I. Van Bael e F. Di Gianni, advogados,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por V. Di Bucci, na qualidade de agente, assistido por A. Abate e G. B. Conte, advogados, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

que tem por objecto um pedido de anulação parcial da Decisão SG(2000)D/103923 da Comissão, de 30 de Maio de 2000, relativa à autorização de um auxílio de Estado no montante de 29 176,69 milhões de liras italianas a favor da sociedade Nuove Industrie Molisane, com vista à realização de um investimento em Sesto Campano (Molise, Itália),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Primeira Secção Alargada),

composto por: B. Vesterdorf, presidente, M. Vilaras, J. Pirrung, A. W. H. Meij e N. J. Forwood, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 25 de Setembro de 2001,

profere o presente

Acórdão

1.
    O enquadramento multissectorial dos auxílios com finalidade regional para grandes projectos de investimento (JO 1998, C 107, p. 7, a seguir «enquadramento multissectorial») define as regras de avaliação dos auxílios concedidos a este título, que se incluem no seu âmbito de aplicação.

2.
    O ponto 3.10 do enquadramento multissectorial descreve a fórmula de cálculo pela qual a Comissão determina a intensidade máxima admissível de um auxílio notificado.

3.
    Esta fórmula assenta, em primeiro lugar, na determinação da intensidade máxima admissível aplicável aos auxílios às grandes empresas na região em causa, o chamado «limite máximo regional» (factor R), ao qual é, de seguida, aplicado o factor de actualização relativo, respectivamente, à concorrência no sector em causa (factor T), ao capital/trabalho (factor I) e ao impacto regional do auxílio em causa (factor M). A intensidade máxima do auxílio autorizado é, assim, a seguinte: R x T x I x M.

4.
    No que respeita ao factor «de concorrência», é aplicável um factor de actualização de 0,25, 0,5, 0,75 ou 1, em função dos seguintes critérios:

«i)    Projecto que implica um aumento de capacidade num sector caracterizado por uma sobrecapacidade estrutural grave e/ou em total declínio da procura

0,25

ii)    Projecto que implica um aumento de capacidade num sector caracterizado por uma sobrecapacidade estrutural grave e/ou em declínio e susceptível de reforçar uma parte elevada de mercado

0,50

iii)    Projecto que implica um aumento de capacidade num sector caracterizado por uma sobrecapacidade estrutural grave e/ou em declínio

0,75

iv)    Nenhum efeito negativo provável em termos de i) e iii)

1,00»

Factos na origem do litígio

5.
    Por carta de 20 de Dezembro de 1999, registada pelo Secretariado-Geral da Comissão em 21 de Dezembro do mesmo ano, as autoridades italianas notificaram, nos termos do artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.°] CE (JO L 83, p. 1), um projecto de auxílio a favor da recorrente, no âmbito do enquadramento multissectorial. O projecto notificado previa concessão à recorrente de um auxílio no valor de 46 312,2 milhões de liras italianas (ITL), com vista à realização de um novo local de produção de «clinker», no valor total de 127 532 milhões de ITL.

6.
    Por carta de 21 de Janeiro de 2000, a Comissão informou as autoridades italianas de que se afigurava necessário dar início a um procedimento formal de investigação, na acepção do artigo 6.° do Regulamento n.° 659/1999. A Comissão indicou que o factor de actualização relativo à concorrência a aplicar era de 0,25 e que o número de criação de empregos previsto não estava suficientemente provado, considerando, consequentemente, que o projecto de auxílio provocaria uma ultrapassagem da intensidade máxima admissível. A Comissão convidava, assim, as autoridades italianas a fornecer elementos complementares.

7.
    Em memorando endereçado à Comissão no início do mês de Fevereiro de 2000, as autoridades italianas forneceram as informações complementares requeridas.

8.
    Na sequência de uma reunião entre a Comissão e as autoridades italianas, em 23 de Fevereiro de 2000, estas informaram a Comissão, por carta de 6 de Março seguinte, de que davam o «seu consentimento a um factor de actualização relativo à concorrência de 0,75, de modo a evitar o início de um procedimento formal de investigação».

9.
    Por carta de 9 de Março de 2000, as autoridades italianas comunicaram à Comissão as novas modalidades de cálculo da intensidade máxima do auxílio, considerandoum factor de actualização de 0,75 relativo à concorrência, tendo, por consequência, fixado o montante do auxílio projectado em 29 176,69 milhões de ITL.

10.
    Em 30 de Maio de 2000, a Comissão adoptou, em aplicação do artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 659/1999, uma decisão na qual não levanta objecções ao projecto de auxílio notificado (a seguir «decisão»).

11.
    A Comissão sublinha que, por cartas datadas de 6 e de 9 de Março de 2000, o Governo italiano completou a sua notificação e que o montante do auxílio previsto a favor da recorrente é de 29 176,69 milhões de ITL, para um custo total de investimento avaliado em 127 532 milhões de ITL, ou seja, 15,56% em equivalente subvenção líquido (ESL).

12.
    Com base numa avaliação do auxílio notificado em relação aos critérios estabelecidos pelo enquadramento multissectorial, a Comissão expõe as razões pelas quais os factores aplicáveis no caso em apreço devem ser fixados em:

-    25%, respeitante à intensidade máxima autorizada na região de Molise;

-    0,75, para o factor T tendo em conta a concorrência no mercado em causa;

-    0,7, para o factor I (capital/trabalho);

-    1,2, para o factor M em relação ao impacto regional do auxílio em vista,

ou seja, um total de 15,75% em ESL (25% x 0,75 x 0,7 x 1,2).

13.
    Tendo-se verificado que o montante do auxílio que a República Italiana pretende conceder à recorrente é, assim, conforme ao auxílio máximo autorizado, a Comissão declara o auxílio notificado compatível com o mercado comum, nos termos do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE.

Tramitação procesual e pedidos das partes

14.
    Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 11 de Agosto de 2000, a recorrente interpôs o presente recurso.

15.
    Por requerimento separado, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 6 de Novembro de 2000, a Comissão suscitou uma questão prévia de inadmissibilidade, tendo a recorrente apresentado as suas observações sobre a mesma em 2 de Fevereiro de 2001.

16.
    Em aplicação do artigo 114.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal, a fase oral teve início, a pedido da Comissão, para que se decida pela inadmissibilidade.

17.
    As partes foram ouvidas em alegações e nas suas respostas às perguntas do Tribunal na audiência que decorreu em 25 de Setembro de 2001.

18.
    Na sua petição, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão unicamente na parte em que a Comissão utilizou o factor de actualização, relativo ao critério de apreciação da concorrência, 0,75, em vez de 1, tendo, portanto, apenas declarado compatível o auxílio no montante de «29 179,69» milhões de ITL;

-    anular os pressupostos de direito e de facto relacionados com a parte da decisão objecto do pedido de anulação;

-    condenar a Comissão nas despesas do processo;

-    adoptar qualquer medida conforme com a lei e a equidade.

19.
    No âmbito da sua questão prévia de inadmissibilidade, a Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar o recurso inadmissível;

-    condenar a recorrente nas despesas.

20.
    Nas observações apresentadas sobre a questão prévia de inadmissibilidade, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    rejeitar a questão prévia de inadmissibilidade e examinar o mérito da causa;

-    a título subsidiário, reservar para final a decisão sobre a referida questão prévia;

-    condenar a Comissão nas despesas ocasionadas pelo incidente de instância.

Quanto à admissibilidade do recurso

Argumentos das partes

21.
    A Comissão defende a inadmissibilidade do presente recurso.

22.
    Em primeiro lugar, a recorrente não tem interesse em agir. Com efeito, o recurso visa, na realidade, submeter ao controlo do Tribunal uma medida que é da exclusiva competência do Estado-Membro em causa, no caso concreto a notificação, pelas autoridades italianas, de um auxílio no montante de 29 176,69 milhões de ITL.

23.
    Além disso, a eventual anulação da decisão não obrigaria as autoridades italianas, e muito menos a Comissão, a aumentar o montante de auxílio autorizado. A este respeito, a Comissão precisa que, tendo, no quadro de um procedimento formal de investigação, o poder de obrigar um Estado-Membro a reduzir o montante de um auxílio que pretende conceder, não tem, pelo contrário, qualquer poder para obrigar a aumentar o montante do auxílio notificado, e muito menos no âmbito da fase de investigação preliminar. A notificação de um auxílio seria, assim, uma proposta vinculativa do Estado-Membro em causa sobre a qual a Comissão, a não ser que iniciasse o procedimento formal de investigação, apenas teria o poder de tomar uma decisão de não levantar objecções.

24.
    Ora, no caso em apreço, a escolha do factor de actualização de 0,75, relativo à concorrência, foi directamente efectuada pelas autoridades italianas. Ao adoptar este factor de actualização e ao reduzir, por conseguinte, o montante do auxílio previsto, as autoridades italianas alteraram e substituíram o projecto de auxílio inicialmente notificado. A decisão foi, assim, condicionada pela decisão das autoridades italianas de alterar a notificação neste sentido. Em última análise, segundo a Comissão, a recorrente atribui-lhe erradamente a escolha de um elemento de facto e de direito (o factor de actualização de 0,75) que emana exclusivamente do Estado-Membro em questão.

25.
    O facto de, por ocasião da alteração do projecto notificado, as autoridades italianas terem respeitado as indicações dos serviços da Comissão não é de todo pertinente, pois esta alteração resultou da livre escolha deste Estado-Membro. Este poderia manter inalterado o projecto inicial e defender os seus interesses com o apoio da recorrente, no âmbito de um procedimento formal de investigação. Além disso, em caso de decisão parcialmente negativa, tanto a República Italiana como a empresa beneficiária do auxílio em causa poderiam ter manifestado interesse em interpor um recurso de anulação.

26.
    Em segundo lugar, a Comissão considera que, na qualidade de beneficiária do auxílio, a recorrente não tem legitimidade, uma vez que se trata de uma decisão positiva que não lhe traz qualquer prejuízo directo. Referindo-se ao acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Setembro de 1992, NBV e NVB/Comissão (T-138/89, Colect., p. II-2181), a Comissão salienta que o dispositivo da decisão não foi impugnado pela recorrente. Além disso, as apreciações contidas na decisão, relativas à determinação do factor de actualização de 0,75, em todo o caso não constituem o suporte necessário do dispositivo, uma vez que a Comissão não poderia, em caso algum, autorizar auxílios de montante superior ao notificado pelas autoridades italianas.

27.
    Por fim, a Comissão alega que só o órgão jurisdicional nacional tem competência no caso em apreço, visto que só este pode fiscalizar, segundo o direito nacional, a legalidade da medida pela qual as autoridades administrativas notificaram a atribuição do auxílio (v., por analogia, o acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Março de 1978, UNICME e o./Comissão, 123/77, Recueil, p. 845, Colect., p. 317).

28.
    A recorrente responde, em primeiro lugar, que tem interesse em agir contra a decisão, uma vez que se trata de uma decisão ilegal, baseada numa apreciação errada da fórmula de cálculo destinada a estabelecer a intensidade máxima de auxílio admissível.

29.
    O facto de se tratar de uma decisão de aprovação do auxílio não tem, no caso em apreço, qualquer importância. Por um lado, a alteração da notificação pelas autoridades italianas não é um elemento susceptível de justificar que a decisão seja excluída da fiscalização da legalidade (v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 25 de Março de 1999, Gencor/Comissão, T-102/96, Colect., p. II-753, n.° 45). Em particular, resulta da jurisprudência que compete ao Tribunal verificar se a Comissão respeita as regras indicativas que impôs a si mesma numa comunicação (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1996, AIUFASS e AKT/Comissão, T-380/94, Colect., p. II-2169, n.° 57). Por outro lado, em caso de anulação, a recorrente teria os meios de obter, junto das autoridades italianas, um aumento do auxílio no nível correspondente ao montante inicialmente previsto, após uma decisão da Comissão conforme ao acórdão do Tribunal. Assim, no âmbito da alteração do contrato de plano celebrado com as autoridades competentes, na sequência da decisão, foi inserida uma cláusula que prevê expressamente que a redução do montante de auxílio inicialmente previsto seria meramente temporária, enquanto não se decidisse o presente recurso.

30.
    No que respeita ao argumento de que as autoridades italianas decidiram, por si próprias, alterar o montante do auxílio, de modo a evitar o início do procedimento formal de investigação, este não é pertinente. Tendo em conta o carácter objectivo da apreciação relativa ao factor de actualização aplicável, uma análise profunda não teria qualquer utilidade, de modo que não havia razão para iniciar o procedimento formal de investigação.

31.
    Em segundo lugar, a recorrente considera que tem qualidade para agir e contesta o argumento de que não foi directamente afectada pela decisão. Na medida em que apenas declara o auxílio compatível com o mercado comum num montante inferior ao inicialmente previsto, esta dá origem a um prejuízo substancial. A situação é completamente diferente da que prevaleceu no acórdão NBV e NVB/Comissão, já referido, no qual o fundamento contestado não constituía o suporte necessário do dispositivo.

32.
    Por fim, a recorrente sustenta que o recurso ao juiz nacional é inteiramente inadequado, dado que, segundo jurisprudência constante, este está vinculado pela decisão da Comissão, de modo que o beneficiário do auxílio não pode pôr em causa a validade da decisão (acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Março de 1994, TWD Textilwerke Deggendorf, C-188/92, Colect., p. I-833).

Apreciação do Tribunal

33.
    Importa recordar que a admissibilidade de um recurso de anulação interposto por uma pessoa singular ou colectiva está sujeita à existência de um interesse em pedir a anulação do acto impugnado (v., designadamente, acórdãos NBV e NVB/Comissão, já referido, n.° 33, e Gencor/Comissão, já referido, n.° 40).

34.
    No caso em apreciação, importa observar que a recorrente não põe em causa o dispositivo da decisão pela qual a Comissão, com base na notificação apresentada pelas autoridades italianas relativa ao projecto de auxílio individual em seu benefício, após análise preliminar e em aplicação do artigo 4.°, n.° 3, do Regulamento n.° 659/1999, declarou essa medida compatível com o mercado comum, nos termos do artigo 87.°, n.° 3, alínea c), CE. A recorrente pede, pelo contrário, a anulação da decisão unicamente por a Comissão ter utilizado, para o factor «de concorrência», o factor de actualização 0,75, em vez de 1, tendo, portanto, apenas declarado compatível o auxílio no montante de 29 176,69 milhões de ITL.

35.
    Importa, como tal, determinar se a recorrente, beneficiária do auxílio individual em questão e notificada, em tempo útil, pelo Estado-Membro em causa, em aplicação do artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999, pode impugnar os fundamentos da decisão em que a Comissão, no termo da sua análise preliminar, declara, sem pôr em causa o seu dispositivo, não levantar objecções ao auxílio projectado.

36.
    Deve lembrar-se a este respeito que, segundo jurisprudência constante, apenas os actos que produzam efeitos jurídicos vinculativos que afectem os interesses do recorrente, alterando de forma caracterizada a situação jurídica deste, podem ser objecto de um recurso de anulação (acórdão do Tribunal de Justiça de 31 de Março de 1998, França e o./Comissão, C-68/94 e C-30/95, Colect., p. I-1375, n.° 62; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Março de 2000, Coca-Cola/Comissão, T-125/97 e T-127/97, Colect., p. II-1733, n.° 77).

37.
    Para determinar se um acto ou uma decisão produz tais efeitos, deve atender-se à sua substância (acórdão França e o./Comissão, já referido, n.° 63, e acórdão Coca-Cola/Comissão, já referido, n.° 78).

38.
    Daí resulta, nomeadamente, que o simples facto de a decisão declarar o auxílio notificado compatível com o mercado comum e não causar, portanto, em princípio, qualquer prejuízo à recorrente não dispensa o Tribunal de examinar se a apreciação da Comissão segundo a qual o mercado em causa está em declínio relativo, o que determina o factor 0,75 para o factor «de concorrência», produz efeitos jurídicos vinculativos que possam afectar os interesses da recorrente (v., por analogia, acórdão Coca-Cola/Comissão, já referido, n.° 79).

39.
    Para este efeito, cumpre, em primeiro lugar, salientar que, no âmbito da apreciação da compatibilidade com o mercado comum de um auxílio no domínio do enquadramento multissectorial, a determinação do factor de actualização aplicável em sede de concorrência resulta de uma análise estrutural e conjuntural domercado, que compete à Comissão realizar, no momento da adopção da sua decisão, com base nos critérios objectivos expostos no enquadramento multissectorial (v., supra, n.° 4).

40.
    Por outro lado, na medida em que a intensidade máxima de auxílio admissível é determinada com base na fórmula de cálculo que inclui, designadamente, um factor de actualização para a concorrência, a apreciação da Comissão relativa ao factor específico aplicável, na medida em que condiciona o montante do auxílio que pode ser declarado compatível com o mercado comum, é susceptível de produzir efeitos jurídicos vinculativos.

41.
    No entanto, não se pode considerar que os efeitos de tal apreciação afectam os interesses da empresa beneficiária do auxílio se, no termo da análise preliminar efectuada pela Comissão, a intensidade máxima de auxílio admissível permanecer superior ou igual ao montante do auxílio notificado pelo Estado-Membro em causa. Com efeito, neste caso, o auxílio que o Estado-Membro pretendia conceder à empresa beneficiária é, desde que cumpra as condições de aplicação do enquadramento multissectorial, necessariamente declarado compatível com o mercado comum.

42.
    É forçoso constatar que a apreciação efectuada na decisão pela Comissão relativamente aos factores de actualização aplicáveis, nomeadamente, à concorrência levou-a a determinar uma intensidade máxima de auxílio admissível (15,75% em ESL) superior à intensidade do auxílio notificado (15,56% em ESL). Tendo a Comissão, por conseguinte, declarado o auxílio notificado compatível com o mercado comum, a apreciação de que o factor de actualização aplicável à concorrência é de 0,75 não afecta, por si, os interesses da recorrente.

43.
    Esta conclusão não é contrariada pelo facto de, ao longo da análise preliminar, as autoridades italianas terem alterado a notificação inicial, prevendo a concessão, à recorrente, de um auxílio de 29 176,69 milhões de ITL, em vez de 46 312,2 milhões de ITL, para afastar as dúvidas da Comissão quanto à compatibilidade do projecto notificado com o mercado comum.

44.
    Com efeito, uma vez que a alteração da notificação das autoridades italianas visava responder a dúvidas da Comissão que justificassem o início do procedimento formal de investigação, na acepção do artigo 4.°, do Regulamento n.° 659/1999 (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Março de 1984, Alemanha/Comissão, 84/82, Recueil, p. 1451, n.os 14 e 17), basta salientar que, no caso em apreço, a recorrente não pede a anulação da decisão com o objectivo de obter o respeito das garantias procedimentais, previstas a favor das partes interessadas pelo artigo 6.° do Regulamento n.° 659/1999 em caso de início deste procedimento formal. Nas suas observações sobre a questão prévia de inadmissibilidade suscitada pela Comissão, a recorrente alega, pelo contrário, que não existia qualquer motivo para iniciar esteprocedimento relativamente ao projecto inicialmente notificado pelo Governo italiano.

45.
    Por conseguinte, na medida em que a recorrente não alega que a não abertura do procedimento formal de investigação lhe causou prejuízo, não se pode presumir que a recorrente tem um interesse em agir contra a decisão devido ao facto de, enquanto empresa beneficiária do auxílio, ser uma interessada (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Novembro de 1984, Intermills/Comissão, 323/82, Recueil, p. 3809, n.° 16) que tinha, portanto, vocação para, em caso de abertura do procedimento, apresentar as suas observações à Comissão, designadamente no que respeita à concorrência no mercado.

46.
    Por último, ao contrário ao que afirma a recorrente, a anulação da determinação contestada relativa ao factor de actualização aplicável à concorrência não levaria, por si, ao pagamento de um auxílio de montante superior ao do auxílio objecto da decisão. Com efeito, um aumento do montante do auxílio concedido supunha, por um lado, que as autoridades italianas tinham decidido projectar um novo auxílio e notificar a Comissão nesses termos e, por outro, que esta, de seguida, declarasse este projecto compatível com o mercado comum. Uma anulação da decisão não seria, portanto, uma garantia do pagamento de somas suplementares pelas autoridades italianas à recorrente.

47.
    Além disso, independentemente do resultado do presente recurso, a decisão não prejudica a possibilidade de as autoridades italianas notificarem um projecto com vista a instituir um novo auxílio a favor da recorrente, ou a alterar o auxílio já concedido. Tal como resulta da jurisprudência, caso a Comissão adopte uma decisão total ou parcialmente negativa em relação a um determinado projecto, a recorrente terá então o direito de, na qualidade de empresa beneficiária do auxílio individual projectado, interpor um recurso de anulação (v. acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de Setembro de 1980, Philip Morris Holland/Comissão, 730/79, Recueil, p. 2671, n.° 5, Intermills/Comissão, já referido, n.° 5, e TWD Textilwerke Deggendorf, já referido, n.° 24).

48.
    No que se refere ao argumento baseado na inexistência de via de recurso nacional efectiva, basta recordar que tal situação, mesmo admitindo que esteja provada, não pode justificar uma alteração, por via de interpretação jurisdicional, do sistema das vias de recurso e de acção estabelecido pelo Tratado (despacho do Tribunal de Justiça de 23 de Novembro de 1995, Asocarne/Conselho, C-10/95 P, Colect., p. I-4149, n.° 26, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 22 de Fevereiro de 2000, ACAV e o./Conselho, T-138/98, Colect., p. II-341, n.° 68). Além disso, mesmo admitindo que a República Italiana não cumpriu as obrigações contratuais para com a recorrente, designadamente no que respeita ao montante do auxílio notificado, o desfecho do presente litígio não impede que se recorra ao órgão jurisdicional nacional para controlar, em relação ao direito interno, a legalidade do comportamento das autoridades administrativas nacionais.

49.
    Do conjunto destes elementos resulta que, na falta de interesse em agir, o recurso deve ser julgado inadmissível.

Quanto às despesas

50.
    Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas, de acordo com o requerimento da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Primeira Secção Alargada)

decide:

1)    O recurso é julgado inadmissível.

2)    A recorrente é condenada nas despesas.

Vesterdorf
Vilaras
Pirrung

            Meij                            Forwood

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 30 de Janeiro de 2002.

O secretário

O presidente

H. Jung

B. Vesterdorf


1: Língua do processo: italiano.