Language of document : ECLI:EU:C:2020:131

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MACIEJ SZPUNAR

apresentadas em 27 de fevereiro de 2020 (1)

Processo C754/18

Ryanair Designated Activity Company

contra

Országos Rendőrfőkapitányság

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Fővárosi Közigazgatási és Munkaügyi Bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Budapeste, Hungria)]

«Reenvio prejudicial — Cidadania da União — Diretiva 2004/38/CE — Artigos 5.o, 10.o e 20.o — Direito de entrada de um nacional de um Estado terceiro membro da família de um cidadão da União no território de um Estado‑Membro — Dispensa de visto — Cartão de residência de membro da família — Cartão de residência permanente — Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen — Artigo 26.o — Obrigação imposta aos transportadores de se assegurarem de que os seus passageiros estão na posse dos documentos de viagem exigidos para entrar no Estado‑Membro de destino»






I.      Introdução

1.        O Tribunal de Justiça é novamente chamado a pronunciar‑se sobre a interpretação do artigo 5.o da Diretiva 2004/38/CE (2). A especificidade deste processo reside no facto de o pedido de decisão prejudicial ter sido apresentado, não no contexto de uma recusa de entrada em território nacional pelas autoridades nacionais, mas no de um litígio que opõe um transportador aéreo às autoridades nacionais devido a uma coima que lhe foi aplicada.

2.        O processo principal oferece ao Tribunal de Justiça a oportunidade de se pronunciar, por um lado, sobre o direito de entrada no território de um Estado‑Membro de um nacional de um Estado terceiro membro da família de um cidadão da União na posse de um cartão de residência permanente a título do artigo 20.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38, e, por outro, sobre as obrigações do transportador aéreo de velar para que as pessoas cujo transporte assegura estão na posse dos documentos de viagem exigidos para entrar Estado‑Membro de destino na aceção do artigo 26.o, n.o 2, alínea b), da Convenção de aplicação do Acordo de Schengen (3).

A.      Quadro jurídico

1.      O direito da União

a)      A Diretiva 2004/38

3.        O artigo 5.o da Diretiva 2004/38, sob a epígrafe «Direito de entrada», estabelece, nos n.os 1 e 2:

«1.      Sem prejuízo das disposições em matéria de documentos de viagem aplicáveis aos controlos nas fronteiras nacionais, os Estados‑Membros devem admitir no seu território os cidadãos da União, munidos de um bilhete de identidade ou passaporte válido, e os membros das suas famílias que, não tendo a nacionalidade de um Estado‑Membro, estejam munidos de um passaporte válido.

Não pode ser exigido ao cidadão da União um visto de entrada ou formalidade equivalente.

2.      Os membros da família que não tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro só estão sujeitos à obrigação de visto de entrada nos termos do Regulamento (CE) n.o 539/2001 [(4)] ou, se for caso disso, da legislação nacional. Para efeitos da presente diretiva, a posse do cartão de residência válido a que se refere o artigo 10.o isenta esses membros da família da obrigação de visto.

[…]»

4.        O artigo 10.o dessa diretiva, sob a epígrafe «Emissão do cartão de residência», determina, nos n.os 1 e 2, alíneas a) e b):

«1.      O direito de residência dos membros da família de um cidadão da União que não tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro é comprovado pela emissão de um documento denominado “cartão de residência de membro da família de um cidadão da União”, no prazo de seis meses a contar da apresentação do pedido. […]

2.      Para a emissão do cartão de residência, os Estados‑Membros exigem a apresentação dos seguintes documentos:

a)      Um passaporte válido;

b)      Um documento comprovativo do elo de parentesco ou de uma parceria registada;

[…]»

5.        O artigo 11.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Validade do cartão de residência», estabelece, no n.o 1:

«O cartão de residência a que se refere o n.o 1 do artigo 10.o é válido por cinco anos a contar da data da sua emissão, ou para o período previsto de residência do cidadão da União, se este período for inferior a cinco anos.»

6.        O artigo 16.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Regra geral para os cidadãos da União e membros das suas famílias», determina, nos n.os 1 e 2:

«1.      Os cidadãos da União que tenham residido legalmente por um período de cinco anos consecutivos no território do Estado‑Membro de acolhimento, têm direito de residência permanente no mesmo. Este direito não está sujeito às condições previstas no capítulo III.

2.      O n.o 1 aplica‑se igualmente aos membros da família que não tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro e que tenham residido legalmente com o cidadão da União no Estado‑Membro de acolhimento por um período de cinco anos consecutivos.»

7.        Nos termos do artigo 18.o da Diretiva 2004/38, sob a epígrafe «Aquisição do direito de residência permanente por certos membros da família que não tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro»:

«[…] os membros da família de um cidadão da União a quem se aplica o n.o 2 do artigo 12.o e o n.o 2 do artigo 13.o, que preencham as condições estabelecidas nessas disposições, adquirem o direito de residência permanente após terem residido legalmente por um período de cinco anos consecutivos no Estado‑Membro de acolhimento.»

8.        O artigo 20.o dessa diretiva, sob a epígrafe «Cartão de residência permanente para membros da família que não tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro», prevê, nos n.os 1 e 2:

«1.      Os Estados‑Membros emitem um cartão de residência permanente aos membros da família que não sejam nacionais de um Estado‑Membro e tenham direito de residência permanente, no prazo de seis meses a contar da apresentação do pedido. O cartão de residência permanente é renovável automaticamente de 10 em 10 anos.

2.      O pedido de cartão de residência permanente deve ser apresentado antes de caducar o cartão de residência. O incumprimento da obrigação de requerer o cartão de residência permanente pode ser passível de sanções proporcionadas e não discriminatórias.»

b)      A CAAS

9.        O título II da CAAS, sob a epígrafe «Supressão dos controlos nas fronteiras internas e circulação das pessoas», compreende, designadamente, um capítulo 6, consagrado às medidas de acompanhamento do sistema que consagra. Esse capítulo contém um único artigo, o artigo 26.o, que prevê, nos seus n.os 1, alínea b), e 2:

«1.      Sem prejuízo dos compromissos decorrentes da sua adesão à Convenção de Genebra de 28 de julho de 1951 relativa ao estatuto dos refugiados [(5)], tal como alterada pelo Protocolo de Nova Iorque de 31 de janeiro de 1967 [a seguir “Convenção de Genebra”], as partes contratantes comprometem‑se a introduzir na sua legislação nacional as seguintes regras:

[…]

b)      O transportador deve tomar as medidas necessárias para se assegurar de que o estrangeiro transportado por via aérea ou marítima se encontra na posse dos documentos de viagem exigidos para a entrada nos territórios das partes contratantes.

2.      As partes contratantes comprometem‑se, sem prejuízo dos compromissos decorrentes da sua adesão à [Convenção de Genebra], e em conformidade com o seu direito constitucional, a prever sanções contra os transportadores que conduzam por via aérea ou marítima, de um Estado terceiro para o seu território, estrangeiros que não possuam os documentos de viagem exigidos.»

2.      O direito húngaro

10.      O artigo 3.o, n.os 2 a 4, da szabad mozgás és tartózkodás jogával rendelkezö személyek beutazásáról és tartózkodásáról szólo 2007. évi I. törvény (Lei n.o I de 2007, que regula a entrada e a residência das pessoas com direito de livre circulação e residência) (6), de 18 de dezembro de 2006, na sua versão aplicável aos factos, estabelece:

«2.      Os membros da família nacionais de um país terceiro que acompanham um nacional do [Espaço Económico Europeu (EEE)] ou um cidadão húngaro, ou que venham juntar‑se a um nacional do EEE ou a um cidadão húngaro residente no território da Hungria, estão autorizados a entrar no território húngaro se possuírem um documento de viagem válido emitido há menos de dez anos e cuja validade exceda em pelo menos três meses a data de partida prevista, bem como, salvo disposição em contrário de um ato de direito [da União] diretamente aplicável ou de uma convenção internacional, um visto válido que confira direito a uma estadia prevista de duração não superior a noventa dias num período de cento e oitenta dias (a seguir “estadia prevista com uma duração não superior a noventa dias”).

3.      Os nacionais de países terceiros também estão autorizados a entrar no território húngaro enquanto membros da família se possuírem um documento de viagem válido emitido há menos de dez anos e cuja validade exceda em pelo menos três meses a data de partida prevista, bem como, salvo disposição em contrário de um ato de direito [da União] diretamente aplicável ou de uma convenção internacional, um visto válido que confira direito a uma estadia prevista com uma duração não superior a noventa dias.

[…]

4.      As pessoas a que se referem os n.os 2 e 3 podem entrar no território húngaro sem visto se dispuserem de um documento comprovativo do direito de residência previsto na presente lei ou de um cartão de residência emitido por um Estado parte no Acordo sobre o [EEE] a favor de um nacional de um país terceiro membro da família do nacional do EEE.»

11.      O artigo 69.o, n.os 1 e 5, da harmadik országbeli állampolgárok beutazásáról és tartózkodásáról szóló 2007. évi II. törvény (Lei n.o II de 2007, que regula a entrada e a residência de nacionais de países terceiros) (7), de 18 de dezembro de 2006, na sua versão aplicável aos factos, estabelece:

«1.      Qualquer transportador que transporte um nacional de um país terceiro para o território da Hungria por via aérea ou navegável, ou numa linha regular de transporte rodoviário, ou que o conduza através do território húngaro para outro país de destino, deve assegurar‑se antes do transporte de que esse nacional de um país terceiro dispõe, para efeitos da sua entrada ou trânsito, de um documento de viagem válido e, sendo esse o caso, de um visto válido que lhe confira direito a uma estadia de duração não superior a noventa dias.

[…]

5.      Os transportadores que não cumpram a obrigação que lhes é imposta no n.o 1 serão objeto de uma coima, cujo valor será determinado em regulamentação específica.

[…]»

II.    Matéria de facto na origem do processo principal, questões prejudiciais e tramitação processual no Tribunal de Justiça

12.      Os factos pertinentes do litígio no processo principal, conforme resultam da decisão de reenvio, podem ser descritos nos seguintes termos.

13.      Em 9 de outubro de 2017, a polícia do aeroporto Liszt Ferenc (Budapeste, Hungria) efetuou um controlo dos passageiros de um voo proveniente de Londres (Reino Unido) e operado pela Ryanair DAC. Nessa ocasião, verificou que um passageiro de nacionalidade ucraniana não possuía visto, embora dispusesse de um passaporte não biométrico no qual se encontrava um cartão de residência de membro da família de um cidadão da União, emitido pelo Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte ao abrigo do artigo 10.o da Diretiva 2004/38, mas ulteriormente invalidado, e um cartão de residência permanente válido, também emitido pelo Reino Unido ao abrigo do artigo 20.o dessa diretiva.

14.      Como esse nacional ucraniano não tinha na sua posse todos os documentos necessários para poder entrar no território húngaro, a polícia não o autorizou a entrar na Hungria e reencaminhou‑o para Londres. Além disso, considerou que a Ryanair, na sua qualidade de transportador aéreo, não tinha tomado as medidas necessárias para se assegurar de que o interessado estava na posse dos documentos de viagem exigidos, e, por essa razão, decidiu aplicar à Ryanair uma coima no valor de 3 000 euros por violação do artigo 26.o da CAAS.

15.      A Ryanair interpôs recurso dessa decisão no Fővárosi Közigazgatási és Munkaügyi Biróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Budapeste, Hungria).

16.      No âmbito desse recurso, a Ryanair afirma que a pessoa em causa no processo principal estava autorizada, ao abrigo do artigo 5.o da Diretiva 2004/38, a entrar no território húngaro sem necessidade de visto, pois dispunha de um cartão de residência permanente emitido pelo Reino Unido ao abrigo do artigo 20.o dessa diretiva. A Ryanair sustenta, antes do mais, que, embora o artigo 5.o da referida diretiva subordine a dispensa da obrigação de visto à posse, por um nacional de um Estado terceiro, de um cartão de residência de membro da família de um cidadão da União nos termos do artigo 10.o da mesma diretiva, só uma pessoa que tenha previamente obtido esse cartão poderá vir a obter um cartão de residência permanente. Daí a Ryanair infere que uma análise contextual das disposições em causa leva a que se considere que também existe dispensa de visto quando um nacional de um Estado terceiro possui um cartão de residência permanente emitido ao abrigo do artigo 20.o da Diretiva 2004/38. Em seguida, a Ryanair considera que a posse desse cartão deve, por si só, ser considerada suficiente para comprovar que essa pessoa goza da qualidade de membro da família de um cidadão da União. Por último, a Ryanair considera que, de qualquer modo, um transportador aéreo não tem legitimidade para proceder a verificações complementares no que respeita aos laços familiares que ligam o interessado a um cidadão da União, e, por conseguinte, não pode ser punida por não o ter feito.

17.      O Országos Rendőr‑főkapitányság (Estado‑Maior da Polícia Nacional húngara) sustenta, em contrapartida, que o artigo 5.o da Diretiva 2004/38 deve ser interpretado literalmente, o que implica considerar que a simples posse de um cartão de residência de membro da família de um cidadão da União, cujo próprio título impõe a existência de um laço familiar com um cidadão da União, dispensa os nacionais de Estados terceiros da obrigação de estarem na posse de um visto para poder entrar no território dos Estados‑Membros. Consequentemente, não se pode considerar que a posse de um cartão de residência permanente, que não é mencionado no artigo 10.o dessa diretiva e cujo título não é tão preciso, dispensa o seu titular dessa obrigação, nem, por maioria de razão, se esse cartão tiver sido emitido por um Estado‑Membro que, à semelhança do Reino Unido, não faz parte do Espaço Schengen.

18.      Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio justifica o presente pedido de decisão prejudicial com as dúvidas que nutre relativamente, em primeiro lugar, à questão de saber se o artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38 deve ser objeto de uma interpretação literal ou se o seu teor deve ser compreendido à luz do contexto em que se inscreve. Observa designadamente, a este respeito, que essa diretiva concebe o direito de residência permanente como um direito «reforçado» concedido aos nacionais de Estados terceiros membros da família de um cidadão da União que já beneficiaram de um direito de residência no território de um Estado‑Membro durante um período ininterrupto de cinco anos.

19.      O órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em segundo lugar, qual é o alcance da dispensa de visto prevista no artigo 5.o da Diretiva 2004/38. Mais exatamente, interroga‑se sobre se essa dispensa deve ser entendida no sentido de que beneficia os cidadãos da União e os membros das suas famílias independentemente da questão de saber qual o Estado‑Membro que lhes concedeu o cartão de residência ou se, pelo contrário, deve ser entendida no sentido de estar reservada apenas àqueles que possuem um cartão de residência emitido por um Estado‑Membro que faça parte do Espaço Schengen. A este respeito, sublinha que, no presente caso, a questão da articulação entre a Diretiva 2004/38 e as regras aplicáveis ao Espaço Schengen é decisiva, pois foi o Reino Unido que emitiu os documentos na posse da pessoa em causa e que estão na origem da condenação da Ryanair no pagamento de uma coima.

20.      Em terceiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio sublinha que, caso o artigo 5.o da Diretiva 2004/38 seja interpretado no sentido de que o benefício da dispensa de visto que prevê abrange os nacionais de Estados terceiros titulares de um cartão de residência permanente emitido por um Estado‑Membro que não faça parte do Espaço Schengen, importa determinar se a posse desse cartão basta para fazer prova de que o seu possuidor é titular de um direito de entrada sem visto no território de outro Estado‑Membro, ou se é necessário que o interessado apresente documentos complementares que demonstrem os laços familiares que mantém com um cidadão da União (designadamente, uma certidão do registo civil). O órgão jurisdicional de reenvio acrescenta que a resposta a essa questão obriga a precisar a articulação entre os direitos de entrada e de residência regulados pela Diretiva 2004/38, tendo em atenção a circunstância de o direito de residência, uma vez que adquiriu caráter permanente, poder continuar a existir após o desaparecimento do laço familiar que existiu entre um nacional de um Estado terceiro e um cidadão da União.

21.      Em quarto e último lugar, o órgão jurisdicional de reenvio manifesta dúvidas quanto à obrigação de controlo dos transportadores aéreos no âmbito da verificação dos documentos de viagem dos nacionais de Estados terceiros membros da família de um cidadão da União que se deslocam de um Estado‑Membro para outro. Neste contexto, interroga‑se, por um lado, sobre se os «documentos de viagem» que o artigo 26.o da CAAS os obriga a verificar são apenas os documentos comprovativos do direito de entrada dos interessados (passaporte, cartão de residência e, sendo esse o caso, visto) ou se também incluem os documentos comprovativos da existência de laços familiares com um cidadão da União. Por outro lado, interroga‑se sobre as consequências do incumprimento, por um transportador aéreo, das obrigações que lhe são impostas por esta disposição.

22.      Foi nestas condições que o Fővárosi Közigazgatási és Munkaügyi Bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Budapeste), por Decisão de 21 de novembro de 2018, que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 3 de dezembro de 2018, decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve o artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38/CE […] ser interpretado no sentido de que, para efeitos da referida Diretiva, tanto a posse do cartão de residência válido, previsto no artigo 10.o, como a posse do cartão de residência permanente, previsto no artigo 20.o, isentam o membro da família da obrigação de dispor de visto no momento de entrada no território de um Estado‑Membro?

2)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão prejudicial, deve o artigo 5.o[, n.o 2, da Diretiva 2004/38/CE] ser interpretado[…] da mesma forma nos casos em que a pessoa que é membro da família de um cidadão da União e que não tem a nacionalidade de outro Estado‑Membro tenha adquirido o direito de residência permanente no Reino Unido e este for o Estado que lhe emitiu o cartão de residência permanente? Por outras palavras, a posse do cartão de residência permanente, previst[o] no artigo 20.o dessa diretiva, emitido pelo Reino Unido, isenta os seus titulares da obrigação de visto, independentemente de não serem aplicáveis ao referido Estado nem o [Regulamento n.o 539/2001], referido no artigo 5.o, n.o 2, da referida diretiva, nem o Regulamento (UE) 2016/399 [(8)][…]?

3)      Em caso de resposta afirmativa à […] primeira e segunda questões prejudiciais, a posse do cartão de residência, emitido ao abrigo do artigo 20.o da Diretiva 2004/38/CE, deve ser considerada, por si só, prova suficiente de que o titular do cartão é membro da família de um cidadão da União, e, sem precisar de comprovar ou apresentar qualquer certificado adicional, [de que] está autorizado — na qualidade de membro da família — a entrar no território de outro Estado‑Membro e está isento da obrigação de visto, ao abrigo do disposto no artigo 5.o, n.o 2, da referida diretiva?

4)      Caso o Tribunal de Justiça responda negativamente à terceira questão prejudicial, deve o artigo 26.o, n.os 1, alínea b), e 2, da [CAAS] ser interpretado no sentido de que o transportador aéreo deve [verificar], além [dos] documentos [de] viagem, [se] o [passageiro que] pretende viajar com o cartão de residência permanente previsto no artigo 20.o da Diretiva 2004/38/CE é efetiva e realmente membro da família de um cidadão da União no momento da entrada?

5)      Caso o Tribunal de Justiça responda afirmativamente à quarta questão prejudicial:

i)      se o transportador aéreo não puder determinar que o [passageiro] que pretende viajar com o cartão de residência permanente, previsto no artigo 20.o da Diretiva 2004/38/CE, é efetivamente membro da família de um cidadão da União no momento da entrada, [está] obrigado a recusar o embarque no avião e a recusar o transporte dessa pessoa para outro Estado‑Membro?

ii)      se o transportador aéreo não efetuar o controlo dessa circunstância ou não se recusar a transportar o [passageiro] que [, embora disponha de um cartão de residência permanente,] não pode comprovar a sua condição de membro da família […], pode ser[‑lhe] aplicada uma coima […] por esse motivo, por força do disposto no artigo 26.o, n.o 2, da CAAS?»

23.      Foram apresentadas observações escritas pelos Governos checo, húngaro e helénico, bem como pela Comissão Europeia. Foram apresentadas observações orais em nome da Ryanair, do Governo húngaro e da Comissão na audiência que teve lugar em 3 de dezembro de 2019.

III. Análise

24.      Na situação em causa no processo principal, um transportador aéreo foi punido por alegadamente ter desrespeitado as obrigações previstas no artigo 26.o da CAAS e pela regulamentação nacional aplicável relativamente ao transporte de um nacional de um Estado terceiro membro da família de um cidadão da União para o Estado‑Membro de destino. Esse passageiro estava na posse do seu passaporte e de um cartão de residência permanente válido emitido, ao abrigo do artigo 20.o da Diretiva 2004/38, pelas autoridades de um Estado‑Membro que não faz parte do Espaço Schengen.

25.      O problema jurídico que o presente processo suscita diz essencialmente respeito ao alcance da obrigação, imposta ao transportador aéreo que transporta cidadãos estrangeiros no território dos Estados‑Membros, de se assegurar que essas pessoas estão na posse dos documentos de viagem exigidos para a entrada nos territórios do Estado‑Membro de destino. A questão fundamental que, neste contexto, se coloca à luz dessa obrigação do transportador é saber quais são os documentos concretos exigidos que permitem aos nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União entrar no território dos Estados‑Membros.

26.      Para bem apreender o contexto do direito da União em que as problemáticas do presente processo se inscrevem é necessário, antes de mais, recordar a articulação entre a cidadania da União e o acervo Schengen. Para esse efeito, apresentarei, a título preliminar, algumas observações sobre a articulação entre, por um lado, o regime aplicável à passagem das fronteiras pelas pessoas, e, por outro, os direitos em matéria de livre circulação de que gozam os cidadãos da União e os membros das suas famílias. Em seguida, examinarei se um nacional de um Estado terceiro na posse de um cartão de residência permanente emitido por um Estado‑Membro, na aceção do artigo 20.o da Diretiva 2004/38, pode beneficiar da isenção da obrigação de obter um visto de entrada no Estado‑Membro de destino enquanto membro da família de um cidadão da União. Por último, debruçar‑me‑ei sobre o alcance das obrigações do transportador na aceção do artigo 26.o, n.o 2, da CAAS.

A.      Observações preliminares sobre a articulação entre cidadania da União e acervo de Schengen

27.      No presente processo, relativo a um litígio entre um transportador aéreo e uma autoridade nacional, as questões submetidas ao Tribunal de Justiça de modo algum dizem respeito a um passageiro nacional de um Estado terceiro em situação irregular, mas sim a um passageiro nacional de um Estado terceiro membro da família de um cidadão da União que se deslocava entre dois Estados‑Membros, embora passando uma fronteira externa do Espaço Schengen.

28.      Importa recordar que o Acordo Schengen foi assinado em 1985 para suprimir os controlos nas fronteiras comuns e que o acervo Schengen diz respeito à regulamentação dos aspetos ligados à existência de um espaço sem fronteiras internas reforçado por fronteiras externas (9). Em contrapartida, a criação da cidadania da União em 1992, que é atualmente o estatuto fundamental dos nacionais dos Estados‑Membros (10), permitiu o surgimento de direitos materiais mais amplos para os nacionais dos Estados‑Membros e os membros das suas famílias. Assim, as regras relativas à cidadania da União vinculam todos os Estados‑Membros, independentemente da respetiva participação no Espaço Schengen. Voltarei a debruçar‑me sobre este aspeto mais adiante (11).

29.      Consequentemente, as verificações relativas a pessoas que gozam do direito à livre circulação ao abrigo do direito da União devem ser efetuadas em conformidade com a Diretiva 2004/38. Assim, por força desta diretiva, algumas medidas de aplicação do acervo Schengen, como é o caso da obrigação de visto, não se aplicam aos nacionais de Estados terceiros membros da família de um cidadão da União.

30.      Dito isto, para ser exaustivo e para responder às dúvidas expostas pelo órgão jurisdicional de reenvio, vou todavia examinar de forma circunstanciada a articulação entre a cidadania da União e o acervo Schengen.

31.      Nesse contexto, importa começar por recordar sucintamente que é importante distinguir a regulamentação aplicável no quadro da política comum em matéria de imigração da relativa à cidadania da União e à livre circulação das pessoas.

1.      Cidadania da União versus política comum em matéria de direito da imigração: estatutos jurídicos diferentes fundados em lógicas jurídicas distintas

32.      Importa de imediato sublinhar que, em conformidade com o previsto no artigo 4.o, n.o 2, alínea j), TFUE, a União dispõe de uma competência partilhada com os Estados‑Membros no domínio do espaço de liberdade, segurança e justiça. Os objetivos e regras de exercício dessa competência estão especificados no título V da terceira parte do Tratado FUE. O artigo 67.o, n.o 2, TFUE determina que a União assegura a ausência de controlos de pessoas nas fronteiras internas e desenvolve uma política comum em matéria, nomeadamente, de imigração e de controlo das fronteiras externas, que se baseia na solidariedade entre Estados‑Membros e que é equitativa em relação aos nacionais de países terceiros.

33.      Assim, para efeitos da adoção de qualquer medida abrangida pelo artigo 79.o, n.o 2, TFUE, que inclui tanto a imigração regular como a irregular, aplica‑se o processo legislativo ordinário. O exercício da competência da União, após o controlo da subsidiariedade, tem preferência ou prioridade sobre a competência dos Estados‑Membros. Estes são, portanto, desapossados da sua própria competência devido à intervenção legislativa da União. Como a competência da União em matéria migratória é uma competência de harmonização, o efeito de preferência varia em função do alcance exato e do grau de intervenção da União (12). Assim, adotam‑se regras comuns por meio de diretivas que os Estados‑Membros têm obrigação de transpor (13), mas estes podem legislar sobre as questões não abrangidas pelo direito da União e têm também a possibilidade de derrogar as regras comuns quando esse direito o permita (14). Nestas condições, os Estados‑Membros conservam, em princípio, as suas competências no domínio do direito da imigração.

34.      Em contrapartida, quando se trate, como no caso em apreço, de uma situação em que estão em causa os direitos de circular e de permanecer livremente ao abrigo do direito da União, a margem de apreciação de que dispõem os Estados‑Membros em matéria de imigração não pode pôr em causa a aplicação das disposições relativas à cidadania da União ou à liberdade de circulação (15), mesmo que essas disposições digam respeito não apenas à situação dos cidadãos da União, mas também à dos nacionais de Estados terceiros membros das suas famílias. A este propósito, é importante, em minha opinião, recordar que o estatuto jurídico conferido aos nacionais de Estados terceiros no contexto das diretivas que resultam da política comum em matéria de direito da imigração e o estatuto dos cidadãos da União e dos nacionais de Estados terceiros membros das suas famílias são diferentes e se baseiam em lógicas jurídicas distintas.

2.      As regras relativas à passagem das fronteiras pelas pessoas e à emissão de vistos aplicamse sem prejuízo do direito à livre circulação de que beneficiam os cidadãos da União e os membros das suas famílias

35.      No que respeita, nomeadamente, ao controlo de fronteiras, à política comum de vistos e outros títulos de residência de curta duração, bem como à liberdade de viajar dos nacionais de Estados terceiros, aplica‑se o processo legislativo ordinário para efeitos da adoção de qualquer medida visada no artigo 77.o, n.o 2, TFUE (16).

36.      Todavia, o artigo 77.o, n.o 3, TFUE determina que «[s]e, para facilitar o exercício do direito [dos cidadãos da União de circular e permanecer livremente no território dos Estados‑Membros] referido na alínea a) do n.o 2 do artigo 20.o», for necessária uma ação da União, será utilizado um processo legislativo especial para adotar disposições relativas «aos passaportes, bilhetes de identidade, títulos de residência ou qualquer outro documento equiparado». Assim, o artigo 77.o, n.o 3, TFUE e as medidas adotadas ao abrigo desta disposição para facilitar o exercício do direito de circular e permanecer livremente devem ser interpretados à luz, não dos objetivos da União em sede de imigração, mas da cidadania da União, conforme resulta da remissão que a referida disposição faz para o artigo 20.o, n.o 2, alínea a), TFUE (17).

37.      Por conseguinte, resulta tanto dos considerandos do acervo Schengen como das suas disposições pertinentes que as medidas relativas à passagem das fronteiras externas e internas dos Estados‑Membros se aplicam sem prejuízo dos direitos de quem beneficia de um direito de livre circulação ao abrigo do direito da União.

38.      Antes do mais, relativamente ao regime jurídico aplicável à passagem das fronteiras internas e externas da União, o considerando 5 do Código das Fronteiras Schengen estabelece que um «regime comum em matéria de passagem de pessoas nas fronteiras não põe em causa nem afeta os direitos em matéria de livre circulação de que beneficiam os cidadãos da União e os membros das suas famílias» (18). Assim, por um lado, o artigo 3.o desse código, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», estabelece que o referido código se aplica «a todas as pessoas que atravessem as fronteiras internas ou externas de um Estado‑Membro, sem prejuízo [nomeadamente] dos direitos dos beneficiários do direito à livre circulação ao abrigo do direito da União» (19), e, por outro, o artigo 8.o, n.o 6, desse mesmo código, sob a epígrafe «Controlos de fronteira sobre as pessoas», prevê que «o controlo dos beneficiários do direito à livre circulação ao abrigo do direito da União é efetuado nos termos da Diretiva [2004/38]» (20).

39.      Importa em seguida referir que, no que respeita às regras relativas aos procedimentos e condições de emissão de vistos para as estadas previstas de duração não superior a três meses por cada período de seis meses, o Regulamento (CE) n.o 810/2009 (21) estabelece, no seu artigo 1.o, n.o 2, alínea a), que esse diploma se aplica «a todos os nacionais de países terceiros que devam possuir um visto quando atravessam as fronteiras externas dos Estados‑Membros, nos termos do Regulamento [n.o 539/2001], sem prejuízo [designadamente] dos direitos de livre circulação de que beneficiam os nacionais de países terceiros que são familiares de cidadãos da União» (22).

40.      Por último, no que respeita ao Regulamento n.o 539/2001 (23), o seu artigo 1.o, n.o 1, estabelece que os nacionais dos países terceiros enumerados no anexo I (24) devem ser detentores de um visto para transpor as fronteiras externas dos Estados‑Membros. Todavia, embora, por força do artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38, os membros da família que não possuam a nacionalidade de um Estado‑Membro «só estão sujeitos à obrigação de visto de entrada» nos termos desse regulamento ou, se for caso disso, da legislação nacional (25), essa mesma disposição prevê que «a posse do cartão de residência válido a que se refere o artigo 10.o [dessa diretiva] isenta esses membros da família da obrigação de visto».

41.      O Governo húngaro considera que se deve começar pelo exame da quarta e quinta questões. Porém, atentas as considerações anteriores, parece‑me pertinente analisar as questões prejudiciais pela ordem em que o órgão jurisdicional de reenvio as colocou.

B.      Interpretação do artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38 (primeira e segunda questões)

42.      Com a sua primeira e segunda questões, que devem ser apreciadas conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se o artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38 deve ser interpretado no sentido de que a dispensa de visto de entrada que prevê em benefício dos nacionais de Estados terceiros que possuam um cartão de residência nos termos do artigo 10.o dessa diretiva (26) também se aplica aos nacionais de Estados terceiros que possuem um cartão de residência permanente nos termos do artigo 20.o da referida diretiva, emitido por um Estado‑Membro que não faz parte do Espaço Schengen.

43.      Cabe de imediato referir que os Governos checo e helénico e também a Comissão, à semelhança da Ryanair, sustentam que o artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38 deve ser interpretado à luz do contexto em que essa disposição se inscreve e dos objetivos prosseguidos por essa diretiva. O Governo húngaro não é dessa opinião. Segundo a sua interpretação, da letra dessa disposição resulta que só a posse de um cartão de residência por mais de três meses, e não a de um cartão de residência permanente nos termos do artigo 20.o dessa diretiva, dispensa os nacionais de um Estado terceiro da obrigação de possuir um visto para exercer o direito de entrada no território de um Estado‑Membro diferente do Estado‑Membro de acolhimento que emitiu esse cartão.

44.      Importa recordar, antes de mais, que, para efeitos da interpretação de uma disposição de direito da União, há que ter em consideração não apenas os seus termos, mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação em que se insere (27), designadamente a génese dessa regulamentação (28). A este propósito, é jurisprudência constante que o dispositivo de uma diretiva não pode ser dissociada da sua fundamentação e deve ser interpretado, se necessário, tendo em conta os motivos que levaram à sua adoção (29). Do mesmo modo, o Tribunal de Justiça considerou que, tendo em conta o contexto e os objetivos da Diretiva 2004/38, as disposições dessa diretiva não podem ser interpretadas de modo restritivo e não devem, de qualquer modo, ficar privadas do seu efeito útil (30).

45.      Ora, parece‑me que uma interpretação como a proposta pelo Governo húngaro contraria o efeito útil e a finalidade da Diretiva 2004/38, bem como a economia e o espírito do seu artigo 5.o, n.o 2. Por conseguinte, essa disposição deve ser interpretada em função do contexto em que se insere, da sua génese e também da finalidade da Diretiva 2004/38.

1.      Interpretação sistemática

46.      Cabe sublinhar que o objeto da Diretiva 2004/38, conforme resulta do seu artigo 1.o, alínea a), diz respeito às condições que regem o exercício do direito de livre circulação e residência no território dos Estados‑Membros pelos cidadãos da União (31). Para esse efeito, os direitos de saída e de entrada previstos nos artigos 4.o e 5.o (32) da referida diretiva constituem as condições ou as formalidades necessárias ao exercício de outros direitos, designadamente o direito de permanência, a que se refere a mesma diretiva (33). O artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 2004/38 precisa que «os Estados‑Membros devem admitir no seu território os cidadãos da União […] e os membros das suas famílias que, não tendo a nacionalidade de um Estado‑Membro, estejam munidos de um passaporte válido». Além disso, o artigo 5.o, n.o 2, primeiro parágrafo, dessa diretiva estabelece que «[p]ara efeitos da presente diretiva, a posse do cartão de residência válido a que se refere o artigo 10.o isenta esses membros da família da obrigação de visto» (34).

47.      A interpretação do artigo 5.o da Diretiva 2004/38, efetuada no contexto global dessa diretiva, revela que o mecanismo do sistema gradual que rege o direito de residência no Estado‑Membro de acolhimento e que conduz ao direito de residência permanente é espoletado quando as condições de entrada num Estado‑Membro de acolhimento previstas nessa disposição se encontram satisfeitas (35). Esse sistema contém diversos tipos de direito de residência que implicam diferentes graus de integração do cidadão da União e dos membros da sua família. Trata‑se, em primeiro lugar, do direito de residência até três meses, previsto no artigo 6.o da Diretiva 2004/38, que não está sujeito a outra obrigação ou outra formalidade que não seja possuir um bilhete de identidade ou passaporte válido (36); em segundo lugar, do direito de residência por mais de três meses, que está subordinado às condições enunciadas no artigo 7.o, n.o 1, dessa diretiva (37), e, em terceiro lugar, do direito de residência permanente, a que se refere o artigo 16.o da referida diretiva para os cidadãos da União e os membros da sua família que tenham residido legalmente por um período de cinco anos consecutivos no território do Estado‑Membro de acolhimento.

48.      No que toca às formalidades administrativas, é entregue aos nacionais do Estado terceiro membros da família de um cidadão da União um documento comprovativo do tipo de residência de que beneficiam no Estado‑Membro de acolhimento. A este propósito, por força do artigo 10.o da Diretiva 2004/38, o direito de residência por mais de três meses é comprovado pela emissão do cartão de residência por mais de três meses. Esse cartão de residência é emitido após verificação dos documentos elencados no artigo 10.o, n.o 2, dessa diretiva e é válido, no máximo, por cinco anos a contar da data da sua emissão (38). Uma vez decorrido esse período, para demonstrar a continuidade da residência, o artigo 20.o, n.o 1, da referida diretiva estabelece que «os Estados‑Membros emitem um cartão de residência permanente aos membros da família que não sejam nacionais de um Estado‑Membro […]», que é renovável automaticamente de dez em dez anos.

49.      Resumindo, por força do artigo 16.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38, os nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União não podem adquirir um direito de residência permanente sem ter residido legalmente no Estado‑Membro de acolhimento durante um período ininterrupto de cinco anos (39). Paralelamente, do artigo 20.o, n.o 1, dessa diretiva decorre que os cartões de residência permanente só podem ser concedidos a nacionais de Estados terceiros membros da família de um cidadão da União que, previamente, tenham sido titulares de um cartão de residência por mais de três meses.

50.      Conclui‑se, conforme a Comissão referiu na audiência em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça, que o cartão de residência por mais de três meses e o cartão de residência permanente não podem ser concedidos em paralelo pois cada um desses cartões comprova, de facto, um tipo de direito de residência dos membros da família dos cidadãos da União no território do Estado‑Membro de acolhimento, a saber, respetivamente, o direito de residência por mais de três meses (capítulo III) e o direito de residência permanente (capítulo IV). Mais concretamente, o único cartão de residência que as autoridades do Estado‑Membro de acolhimento podem conceder a um nacional de um Estado terceiro membro da família de um cidadão da União que já preencha há cinco anos ininterruptos as condições do capítulo III da Diretiva 2004/38 é o cartão de residência permanente. Esta asserção é corroborada pelo artigo 20.o, n.o 2, dessa diretiva, que estabelece que o pedido de cartão de residência permanente deve ser apresentado antes de caducar o cartão de residência e que o incumprimento dessa obrigação pode ser passível de sanções não discriminatórias e proporcionadas.

51.      Além disso, o direito de residência permanente confere mais direitos que o direito de residência que o antecedeu. Com efeito, não apenas o cartão de residência permanente que comprova esse direito tem uma validade de dez anos (artigo 20.o, n.o 1, da Diretiva 2004/38), como os nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União não ficam sujeitos às condições constantes do capítulo III da Diretiva 2004/38. Assim, essas pessoas podem constituir um encargo para o sistema de assistência social do Estado‑Membro de acolhimento sem poderem ser afastadas do território desse Estado‑Membro (artigo 16.o, n.o 1, da referida diretiva). Com efeito, conforme resulta do considerando 18 da mesma diretiva, o direito de residência permanente, uma vez adquirido, não deve estar sujeito a outras condições, e isto para que possa constituir um verdadeiro instrumento de integração na sociedade do Estado‑Membro de acolhimento (40). Além disso, uma vez adquirido, o direito de residência permanente só se perde devido a ausência do Estado‑Membro de acolhimento por um período que exceda dois anos consecutivos (artigo 16.o, n.o 4, da Diretiva 2004/38). A isto acresce que os nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União que tenham obtido um direito de residência permanente beneficiam «de igualdade de tratamento em relação aos nacionais desse Estado‑Membro, no âmbito de aplicação do Tratado» (artigo 24.o desta diretiva) (41).

52.      Por conseguinte, seria paradoxal que a aquisição de um direito de residência permanente, que confere aos seus beneficiários direitos mais importantes do que o direito de residência por mais de três meses e, portanto, é revelador de uma maior integração no Estado‑Membro de acolhimento, possa conduzir a um endurecimento das condições de entrada noutros Estados‑Membros.

53.      Por conseguinte, apreciado no seu contexto, o artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38 deve ser interpretado no sentido de que a dispensa de visto prevista nesta disposição se aplica não apenas ao titular do cartão de residência por mais de três meses a que se refere o artigo 10.o dessa diretiva, mas também ao titular do cartão de residência permanente a que se refere o artigo 20.o do mesmo diploma.

2.      Interpretação teleológica e histórica

54.      A análise anterior encontra apoio na finalidade da Diretiva 2004/38, em especial do seu artigo 5.o, bem como na análise dos trabalhos preparatórios dessa disposição.

55.      Resulta dos seus considerandos 1 a 4 que a Diretiva 2004/38 pretende facilitar o exercício do direito fundamental e individual de circular e de residir livremente no território dos Estados‑Membros que é diretamente conferido aos cidadãos da União pelo artigo 21.o, n.o 1, TFUE, e tem por objeto, nomeadamente, reforçar esse direito (42). Esse objetivo inscreve‑se no sistema gradual (43) previsto por esta diretiva, que rege o direito de residência no Estado‑Membro de acolhimento (44).

56.      Quanto ao histórico dessa disposição, o artigo 6.o, n.o 2, da proposta inicial da Comissão (45) não distinguia entre os tipos de documentos comprovativos do direito de residência por mais de três meses ou permanente e referia‑se genericamente à «posse de um documento de residência válido emitido por um Estado‑Membro», estabelecendo que esse documento de residência «[equivalia] a um visto». A Comissão explicou na audiência que durante o processo legislativo se obtivera um consenso no sentido de se considerar que o documento de residência não tinha o mesmo valor que um visto e que o primeiro dispensava os nacionais de Estados terceiros membros da família de um cidadão da União da obrigação de obter o segundo. O artigo 8.o, n.o 2, da Resolução legislativa do Parlamento refletia essa alteração e dispunha que a «posse de um documento de residência válido emitido por um Estado‑Membro [dispensava] da obrigação de dispor de um visto» (46).

57.      Mais tarde, a proposta modificada da Comissão (47) utilizou os termos «título de residência» e continuou a não distinguir entre os cartões de residência consoante certifiquem uma residência superior a três meses ou uma residência permanente. Todavia, o teor desta disposição não estava em conformidade com a redação proposta do artigo 10.o, que todavia se referia ao «cartão de residência de membros da família de um cidadão da União». A este propósito, a Comissão indicou que foi apenas com uma preocupação de coerência terminológica que o legislador substituiu em seguida a expressão «cartão de residência» por «cartão de residência previsto no […] artigo 10.o» (48). O legislador da União pretendeu assim esclarecer que a isenção da obrigação de visto se funda no direito da União, em especial no cartão de residência emitido pelos Estados‑Membros com base na Diretiva 2004/38, e não em outros documentos que os Estados‑Membros facultem aos estrangeiros com base no direito nacional (49).

58.      Por conseguinte, parece que a vontade do legislador não foi excluir o cartão de residência permanente dos documentos que comprovam o direito de residência e permitem a dispensa da obrigação de visto. A leitura do considerando 8 da Diretiva 2004/38, que não distingue entre o cartão de residência por mais de três meses e o cartão de residência permanente, permite confirmar esta interpretação. Com efeito, nesse considerando declara‑se que «[t]endo em vista facilitar a livre circulação dos membros da família que não sejam nacionais de um Estado‑Membro, aqueles que já tiverem obtido um cartão de residência deverão ser isentos da obrigação de obter visto de entrada, na aceção do [Regulamento n.o 539/2001] ou, se for caso disso, da legislação nacional aplicável» (50).

59.      Além disso, cabe recordar que tanto os nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União que beneficiam de um direito de residência por mais de três meses como os que beneficiam de um direito de residência permanente podem, mediante certas condições, conservar os seus direitos de entrada e de residência apenas a título pessoal (51), mais concretamente, podem conservar o direito de entrada nos Estados‑Membros, sem visto, mediante a apresentação do respetivo cartão de residência por mais de três meses ou do cartão de residência permanente.

60.      Nestas condições, pouco importa que os nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União sejam titulares de um cartão de residência por mais de três meses ou que sejam titulares de um cartão de residência permanente, para beneficiar da dispensa de visto. Sustentar o contrário seria contrariar a interpretação sistemática, teleológica e histórica da Diretiva 2004/38 e do seu artigo 5.o, n.o 2.

3.      A não participação de um EstadoMembro no Espaço Schengen

61.      Importa recordar que a Diretiva 2004/38 foi adotada pelo legislador da União com base nos artigos 18.o, 21.o, 46.o, 50.o e 59.o TFUE. Estas disposições vinculam todos os Estados‑Membros, independentemente da respetiva participação no Espaço Schengen. Por conseguinte, os direitos nelas reconhecidos são garantidos a todos os cidadãos da União e aos membros das suas famílias.

62.      No presente caso, o facto de o acervo Schengen não se aplicar ao Estado‑Membro que emitiu o cartão de residência permanente, isto é, o Reino Unido, em nada afeta as condições de entrada nos Estados‑Membros definidas no artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38. De facto, por força desta disposição, os nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União só estão sujeitos à obrigação de visto de entrada, em conformidade com o disposto no Regulamento n.o 539/2001 ou, eventualmente, à legislação nacional. Conforme sublinhado pela Comissão nas observações que apresentou, essa referência à legislação nacional foi prevista para os Estados‑Membros que não fazem parte do Espaço Schengen. Contudo, para efeitos da Diretiva 2004/38, os nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União estão dispensados dessa obrigação se possuírem um cartão de residência por mais de três meses ou um cartão de residência permanente válido.

63.      Conforme referi no n.o 38 das presentes conclusões, o regime comum em matéria de passagem de pessoas nas fronteiras não põe em causa nem afeta os direitos em matéria de livre circulação de que beneficiam os cidadãos da União e os membros das suas famílias, incluindo os cidadãos dos Estados‑Membros que não fazem parte do Espaço Schengen.

C.      Quanto ao valor probatório do cartão de residência permanente (terceira questão)

64.      Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a posse de um cartão de residência permanente, a que se refere o artigo 20.o da Diretiva 2004/38, faz, por si só, prova de que o seu titular dispõe de um direito de entrada num Estado‑Membro enquanto membro da família de um cidadão da União.

65.      No presente caso, um Estado‑Membro não autorizou um nacional de um Estado terceiro membro da família de um cidadão da União a entrar no seu território por não estar na posse de todos os documentos de viagem exigidos para poder entrar no seu território sem visto, em conformidade com o disposto no artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38, embora essa pessoa estivesse na posse de um cartão de residência permanente válido, emitido ao abrigo do artigo 20.o dessa diretiva pelo Estado‑Membro de residência.

66.      Parece‑me importante recordar que o direito dos nacionais de um Estado‑Membro de entrar no território de outro Estado‑Membro, para as finalidades prosseguidas pelo Tratado, constitui um direito diretamente conferido por esse Tratado ou, conforme o caso, pelas disposições adotadas para sua execução. Assim, deve considerar‑se que a emissão de um cartão de residência, em conformidade com o disposto na Diretiva 2004/38, a um nacional de um Estado‑Membro ou a um membro da sua família não é um ato constitutivo de direitos, mas um ato desse Estado‑Membro destinado a certificar a situação individual dessas pessoas à luz do direito da União (52).

67.      Por conseguinte, a apresentação de um cartão de residência por mais de três meses ou permanente válido, para efeitos da justificação da qualidade de «membro da família de um cidadão da União» (53), constitui uma formalidade administrativa cujo objetivo é a constatação pelas autoridades nacionais de um direito que decorre diretamente da qualidade da pessoa em causa (54).

68.      Pode, portanto, afirmar‑se que, uma vez preenchidas as condições que permitem a um nacional de um Estado terceiro membro da família do cidadão da União beneficiar do direito de residência permanente previsto na Diretiva 2004/38, o cartão de residência emitido ao abrigo dessa diretiva permite comprovar a legalidade da residência dessa pessoa no Estado‑Membro de acolhimento e deve, portanto, ser aceite pelos Estados‑Membros. Ora, importa referir que nem da decisão de reenvio nem dos autos resulta de algum modo que o cartão de residência apresentado pela pessoa em causa não era conforme ao artigo 20.o da referida diretiva. Com efeito, a questão colocada pelo órgão jurisdicional de reenvio apenas diz respeito à força probatória do cartão de residência permanente para entrar no território de um Estado‑Membro.

69.      Importa notar, conforme a Comissão corretamente sublinhou, que esses dois cartões são atos autênticos por meio dos quais a autoridade de um Estado‑Membro certifica o direito de residência do membro da família de um cidadão da União em conformidade com o disposto na Diretiva 2004/38. Assim, permitir que um Estado‑Membro recuse o cartão de residência permanente, pondo em causa a sua força probatória, é contrário ao objetivo prosseguido pela dispensa de visto, que consiste, conforme resulta do considerando 8 dessa diretiva, em facilitar a livre circulação.

70.      Além disso, o facto de o artigo 5.o da Diretiva 2004/38 definir exaustivamente os documentos que os Estados‑Membros podem exigir aos cidadãos da União e aos membros das suas famílias para lhes permitir entrar sem visto no seu território (bilhete de identidade ou passaporte e cartão de residência) implica que os Estados‑Membros não possam solicitar documentos suplementares. A este propósito, aceitar que as autoridades húngaras recusem um cartão de residência emitido ao abrigo da Diretiva 2004/38 equivaleria a permitir que um Estado‑Membro contornasse o direito à livre circulação e poderia levar outros Estados‑Membros a atuar da mesma forma e a infringir assim, de facto e unilateralmente, essa diretiva (55). Os Estados‑Membros são, portanto, obrigados a reconhecer tanto o cartão de residência por mais de três meses como o cartão de residência permanente para efeitos da entrada sem visto no seu território, a menos que a autenticidade desses cartões e a exatidão dos dados que neles figuram sejam postos em causa por indícios concretos relativos ao caso individual em questão e que permitam concluir pela existência de um abuso ou de uma fraude (56).

71.      Por último, a força probatória do cartão de residência permanente não deve ser posta em causa pelo facto de o estado civil de um nacional de um Estado terceiro membro da família de um cidadão da União que beneficia de um direito de residência poder sofrer alterações em caso de falecimento ou de partida do cidadão da União ou ainda em caso de divórcio, anulação do casamento ou cessação da parceria registada. Sublinhe‑se que se essa modificação de estado civil ocorrer após a aquisição do direito de residência permanente, a conservação desse direito exclusivamente a título pessoal deixa de estar sujeita às condições definidas no capítulo III da Diretiva 2004/38, nomeadamente as constantes dos seus artigos 12.o, n.o 2, e 13.o, n.o 2 (57).

72.      Atentas as considerações anteriores, é evidente que a posse de um cartão de residência permanente, a que se refere o artigo 20.o da Diretiva 2004/38, faz, por si só, prova de que o seu titular dispõe de um direito de entrada num Estado‑Membro enquanto membro da família de um cidadão da União.

D.      Quanto ao alcance da obrigação do transportador aéreo na aceção do artigo 26.o da CAAS (quarta e quinta questões)

73.      Com a sua quarta e quinta questões, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, no essencial, se o artigo 26.o, n.os 1, alínea b), e 2, da CAAS deve ser interpretado no sentido de que a obrigação do transportador aéreo de se assegurar que os seus passageiros nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União, que se deslocam de um Estado‑Membro para outro, estão na posse dos documentos de viagem exigidos diz respeito aos documentos que comprovam o direito de entrada dessas pessoas, isto é, o passaporte e o cartão de residência válido, ou se essa obrigação implicar assegurar‑se de que esses passageiros dispõem de um visto ou de outros documentos comprovativos da existência de laços de família com um cidadão da União.

74.      Para responder a estas questões, parece‑me importante precisar o alcance geral da obrigação do transportador na aceção dessa disposição.

75.      A este respeito, é fundamental distinguir, por um lado, entre as obrigações dos transportadores aéreos nos termos do artigo 26.o, n.os 1, alínea b), e 2, da CAAS e os «controlos de fronteira» na aceção do artigo 2.o, ponto 11, do Código das Fronteiras Schengen (58), e, por outro, entre os trabalhadores, representantes ou agentes desses transportadores e o «guarda de fronteira» na aceção do artigo 2.o, ponto 14, desse Código (59).

76.      Com efeito, resulta do artigo 26.o, n.o 1, alínea b), da CAAS (60) que o transportador aéreo é obrigado a controlar, no aeroporto de partida, a adequação dos documentos de viagem exigidos e que, se não o fizer, se encontra exposto a sanções. Porém, como recentemente referiu o advogado‑geral G. Pitruzzella nas suas Conclusões no processo D. Z. (61), «a previsão, pelo direito da União e/ou pelo direito nacional, das referidas obrigações e sanções não implica que as transportadoras aéreas que procedem ao controlo dos documentos de viagem dos passageiros antes do seu embarque no aeroporto do Estado‑Membro de partida, para se certificarem de que estes últimos possuem os documentos exigidos para a entrada no Estado‑Membro de destino, devam ser consideradas emanações desse Estado‑Membro, nem que esses controlos possam ser qualificados de “controlos de fronteira” na aceção do Código das Fronteiras Schengen, nem mesmo que os trabalhadores, representantes ou agentes dessas transportadoras sejam equiparáveis a “guardas de fronteira” na aceção do mesmo código» (62).

77.      Assim, nem os transportadores aéreos nem os trabalhadores, representantes ou agentes desses transportadores, que controlam a adequação dos documentos de viagem exigidos no aeroporto do Estado‑Membro de partida, «podem ser considerados responsáveis pelo exercício das funções de controlo na fronteira». Daqui resulta que «esses sujeitos não têm nenhum poder para recusar ou autorizar a entrada de um nacional de um país terceiro no território do Estado‑Membro de destino» (63).

78.      Além disso, parece‑me pertinente esclarecer que a obrigação do transportador aéreo na aceção do artigo 26.o, n.o 1, alínea b), da CAAS é uma obrigação formal. Por conseguinte, não lhe compete, por exemplo, controlar a autenticidade desses documentos, salvo em caso de deteção de documentos inválidos ou claramente falsificados.

79.      Dito isto, resulta dos n.os 27 a 41 das presentes conclusões que as regras relativas à passagem das fronteiras pelas pessoas e à concessão de vistos se aplicam sem prejuízo do direito de livre circulação e residência, no território dos Estados‑Membros, dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias nacionais de um Estado terceiro. Por conseguinte, não restam dúvidas, em meu entender, de que o artigo 26.o da CAAS deve ser interpretado em consonância com a Diretiva 2004/38. Portanto, conforme resulta da análise que fiz das três primeiras questões prejudiciais, o transportador aéreo está obrigado a velar para que o nacional de um Estado terceiro membro da família de um cidadão da União cujo transporte assegura, tem na sua posse, para além de um passaporte válido, o cartão de residência por mais de três meses a que se refere o artigo 10.o da Diretiva 2004/38 ou o cartão de residência permanente a que se refere o artigo 20.o dessa diretiva para poder entrar no território de um Estado‑Membro.

80.      Por conseguinte, considero que há que responder à quarta e quinta questões prejudiciais que o artigo 26.o, n.os 1, alínea b), e 2, da CAAS deve ser interpretado no sentido de que a obrigação de o transportador aéreo se assegurar de que os seus passageiros, nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União que se deslocam de um Estado‑Membro para outro estão na posse dos documentos exigidos apenas diz respeito aos documentos que comprovam o direito de entrada dessas pessoas, isto é, o passaporte e o cartão de residência por mais de três meses, a que se refere o artigo 10.o da Diretiva 2004/38, ou o cartão de residência permanente, a que se refere o seu artigo 20.o, válidos, e essa obrigação não implica assegurar‑se de que esses passageiros possuem um visto ou outros documentos que comprovem a existência de vínculos familiares com um cidadão da União.

IV.    Conclusão

81.      Atentas as considerações anteriores, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões prejudiciais colocadas pelo Fővárosi Közigazgatási és Munkaügyi Bíróság (Tribunal Administrativo e do Trabalho de Budapest, Hungria) nos seguintes termos:

1)      O artigo 5.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE, deve ser interpretado no sentido de que a dispensa de visto de entrada que esta disposição prevê em benefício dos nacionais de Estados terceiros na posse de um cartão de residência ao abrigo do artigo 10.o dessa diretiva também se aplica aos nacionais de Estados terceiros na posse de um cartão de residência permanente ao abrigo do artigo 20.o do mesmo diploma, mesmo quando o cartão de residência permanente tenha sido emitido por um Estado‑Membro que não faz parte do Espaço Schengen.

2)      A posse de um cartão de residência permanente a que se refere o artigo 20.o da Diretiva 2004/38 faz, por si só, prova de que o seu titular dispõe de um direito de entrada noutro Estado‑Membro enquanto membro da família de um cidadão da União.

3)      O artigo 26.o, n.os 1, alínea b), e 2, da Convenção de aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de junho de 1985, entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns, assinada em Schengen em 19 de junho de 1990 e entrada em vigor em 26 de março de 1995, deve ser interpretado no sentido de que a obrigação do transportador aéreo de se assegurar que os seus passageiros nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União que se deslocam de um Estado‑Membro para outro estão na posse dos documentos exigidos apenas diz respeito aos documentos que comprovam o direito de entrada dessas pessoas, isto é, o passaporte e o cartão de residência por mais de três meses, a que se refere o artigo 10.o da Diretiva 2004/38, ou o cartão de residência permanente, a que se refere o seu artigo 20.o, válidos, e essa obrigação não implica assegurar‑se de que esses passageiros possuem um visto ou outros documentos que comprovem a existência de vínculos familiares com um cidadão da União.


1      Língua original: francês.


2      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, L 158, p. 77, e retificação JO 2005, L 197, p. 34).


3      Convenção de aplicação do Acordo de Schengen, de 14 de junho de 1985, entre os Governos dos Estados da União Económica Benelux, da República Federal da Alemanha e da República Francesa relativo à supressão gradual dos controlos nas fronteiras comuns, assinada em Schengen em 19 de junho de 1990 e que entrou em vigor em 26 de março de 1995 (JO 2000, L 239, p. 19, a seguir «CAAS»).


4      Regulamento do Conselho, de 15 de março de 2001, que fixa a lista dos países terceiros cujos nacionais estão sujeitos à obrigação de visto para transporem as fronteiras externas e a lista dos países terceiros cujos nacionais estão isentos dessa obrigação (JO 2001, L 81, p. 1).


5      Recueil des traités des Nations unies, vol. 189, p. 137, n.o 2545 (1954).


6      Magyar Közlöny 2007/1, de 5 de janeiro de 2007.


7      Magyar Közlöny 2007/1, de 5 de janeiro de 2007.


8      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016, que estabelece o código da União relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen) (JO 2016, L 77, p. 1, a seguir «Código das Fronteiras Schengen»).


9      Devido à sua situação geográfica, a encantadora localidade luxemburguesa de Schengen foi escolhida para a assinatura do acordo com o seu nome. Com efeito, Schengen situa‑se na fronteira com os dois outros Estados‑Membros signatários, a Alemanha e a França.


10      V., designadamente, Acórdão de 10 de dezembro de 2018, Wightman e o. (C‑621/18, EU:C:2018:999, n.o 64 e jurisprudência referida).


11      V. n.os 61 a 63 das presentes conclusões.


12      O Protocolo n.o 25 relativo ao exercício das competências partilhadas (JO 2012, C 326, p. 307), anexo aos Tratados UE e FUE, enuncia que «quando a União toma medidas num determinado domínio, o âmbito desse exercício de competências apenas abrange os elementos regidos pelo ato da União em causa e, por conseguinte, não abrange o domínio na sua totalidade».


13      V., designadamente, Diretiva 2003/86/CE do Conselho, de 22 de setembro de 2003, relativa ao direito ao reagrupamento familiar (JO 2003, L 251, p. 12); Diretiva 2003/109/CE do Conselho, de 25 de novembro de 2003, relativa ao estatuto dos nacionais de países terceiros residentes de longa duração (JO 2004, L 16, p. 44); Diretiva 2009/50/CE do Conselho, de 25 de maio de 2009, relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeitos de emprego altamente qualificado (JO 2009, L 155, p. 17); e Diretiva (UE) 2016/801 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de maio de 2016, relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros para efeitos de investigação, de estudos, de formação, de voluntariado, de programas de intercâmbio de estudantes, de projetos educativos e de colocação au pair (JO 2016, L 132, p. 21).


14      É o caso, designadamente, dos critérios para a reintrodução temporária do controlo nas fronteiras internas por um Estado‑Membro. V. artigo 26.o do Código das Fronteiras Schengen.


15      No caso contrário, essa situação seria, obviamente, incompatível com a criação de um mercado interno que «implica que as condições de entrada e residência de um cidadão da União num Estado‑Membro de que não possui a nacionalidade sejam as mesmas em todos os Estados‑Membros». V., neste sentido, Acórdão de 25 de julho de 2008, Metock e o. (C‑127/08, EU:C:2008:449, n.o 68).


16      Designadamente, no que toca à competência da União relativamente à liberdade de viajar dos nacionais de Estados terceiros (que não são membros da família de um cidadão da União), o artigo 77.o, n.o 2, alínea c), TFUE determina que a União desenvolve uma política que visa as «condições aplicáveis à livre circulação de nacionais de países terceiros na União durante um curto período». Essas condições encontram‑se definidas em disposições do acervo Schengen.


17      O artigo 77.o, n.o 4, TFUE estabelece que esse artigo «não afeta a competência dos Estados‑Membros no que respeita à definição geográfica das respetivas fronteiras, de acordo com o direito internacional».


18      O artigo 2.o, n.o 5, alínea a), do Código das Fronteiras Schengen define os beneficiários do direito à livre circulação ao abrigo do direito da União como sendo «os cidadãos da União, na aceção do artigo 20.o, n.o 1, [TFUE], bem como os nacionais de países terceiros membros da família de um cidadão da União que exerça o seu direito à livre circulação, aos quais é aplicável a Diretiva [2004/38]».


19      O sublinhado é meu.


20      Por força do artigo 8.o, n.o 1, do Código das Fronteiras Schengen, «a passagem das fronteiras externas é submetida a controlos por guardas de fronteira». O sublinhado é meu.


21      Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece o Código Comunitário de Vistos (Código de Vistos) (JO 2009, L 243, p. 1).


22      O sublinhado é meu. Além disso, resulta do artigo 3.o, n.o 5, alínea d), do Código de Vistos, sob a epígrafe «Nacionais de países terceiros sujeitos à obrigação de visto de escala aeroportuária», que os membros da família de cidadãos da União, referidos na alínea a) do n.o 2 do artigo 1.o desse código, estão isentos da obrigação de visto de escala aeroportuária prevista nos n.os 1 e 2 do artigo 1.o do referido código. V., igualmente, artigo 24.o, n.o 2, e anexo XI, artigo 4.o, do mesmo código.


23      Este regulamento foi codificado pelo Regulamento (UE) 2018/1806 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de novembro de 2018 (JO 2018, L 303, p. 39).


24      A Ucrânia faz parte da lista comum constante do anexo I do Regulamento n.o 539/2001 a que se refere o artigo 1.o, n.o 1, deste mesmo diploma. Importa sublinhar que, no contexto do novo Regulamento 2018/1806, a Ucrânia deixou de estar incluída no anexo I, que se refere à lista de países terceiros cujos nacionais estão sujeitos à obrigação de visto para transpor as fronteiras externas dos Estados‑Membros. Em contrapartida, a Ucrânia passou a estar incluída no anexo II desse regulamento, que elenca a lista de países terceiros cujos nacionais estão isentos da obrigação de visto para transpor as fronteiras externas dos Estados‑Membros para estadas de duração total não superior a 90 dias num período de 180 dias. A dispensa da obrigação de visto apenas se aplica aos titulares de passaportes biométricos emitidos pela Ucrânia em conformidade com as normas da Organização da Aviação Civil Internacional (ICAO).


25      V. n.o 36 das presentes conclusões.


26      A seguir «cartão de residência por mais de três meses».


27      V., designadamente, Acórdãos de 7 de outubro de 2010, Lassal (C‑162/09, EU:C:2010:592, n.o 49); e de 26 de março de 2019, SM (menor sob kafala argelina) (C‑129/18, EU:C:2019:248, n.o 51).


28      V., neste sentido, Acórdão de 11 de abril de 2019, Tarola (C‑483/17, EU:C:2019:309, n.o 37 e jurisprudência referida).


29      V., neste sentido, Acórdão de 7 de outubro de 2010, Lassal (C‑162/09, EU:C:2010:592, n.o 50 e jurisprudência referida).


30      V., designadamente, Acórdãos de 28 de outubro de 1975, Rutili (36/75, EU:C:1975:137, n.o 28); de 25 de julho de 2008, Metock e o. (C‑127/08, EU:C:2008:449, n.o 84); de 13 de setembro de 2016, CS (C‑304/14, EU:C:2016:674, n.o 38); e de 5 de junho de 2018, Coman e o. (C‑673/16, EU:C:2018:385, n.o 39).


31      V., designadamente, Acórdãos de 5 de maio de 2011, McCarthy (C‑434/09, EU:C:2011:277, n.o 33).


32      O direito de entrada previsto no artigo 5.o da Diretiva 2004/38 mais não é do que a consequência do direito de saída previsto no artigo 4.o dessa diretiva.


33      Com efeito, os artigos 4.o e 5.o da Diretiva 2004/38 são a porta de entrada para os outros direitos consagrados nessa diretiva, pois os direitos de livre circulação não podem ser exercidos se o cidadão da União ou os membros da sua família não puderem deixar um Estado ou entrar noutro. A este propósito, recorde‑se que os eventuais direitos que a mencionada diretiva confere aos nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União derivam dos direitos que o cidadão da União em causa goza devido ao exercício da sua liberdade de circulação. Acórdão de 14 de novembro de 2017, Lounes (C‑165/16, EU:C:2017:862, n.o 32 e jurisprudência referida).


34      Do Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a aplicação da Diretiva 2004/38, de 10 de dezembro de 2008 [COM(2008) 840 final, p. 5], resulta que «a transposição do n.o 2 do artigo 5.o é frequentemente incorreta e/ou incompleta, traduzindo‑se as deficiências legislativas em violações frequentes dos direitos dos membros da família, nomeadamente no caso de nacionais de países terceiros».


35      O direito de entrada está intimamente ligado ao direito de residência até três meses previsto no artigo 6.o da Diretiva 2004/38.


36      Segundo o artigo 14.o, n.o 1, da Diretiva 2004/38, esse direito conserva‑se enquanto os cidadãos da União ou os membros da sua família não forem uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado‑Membro de acolhimento. V., designadamente, Acórdãos de 21 de dezembro de 2011, Ziolkowski e Szeja (C‑424/10 e C‑425/10, EU:C:2011:866, n.o 39); e de 17 de abril de 2018, B e Vomero (C‑316/16 e C‑424/16, EU:C:2018:256, n.o 52).


37      Se o cidadão cumprir as condições enunciadas no artigo 7.o da Diretiva 2004/38, o benefício do direito de residência por mais de três meses abrange (sem prejuízo das limitações constantes do artigo 7.o, n.o 4, dessa diretiva) igualmente os membros da sua família que não possuem a nacionalidade de um Estado‑Membro (artigo 7.o, n.o 2, da referida diretiva). Em conformidade com o disposto no artigo 14.o, n.o 2, da Diretiva 2004/38, esse direito só se mantém enquanto o cidadão da União e os membros da sua família preencherem essas condições. Resulta do considerando 10 dessa diretiva que essas condições têm, nomeadamente, por objetivo evitar que essas pessoas se tornem uma sobrecarga não razoável para o regime de segurança social do Estado‑Membro de acolhimento. V., a este respeito, Acórdãos de 21 de dezembro de 2011, Ziolkowski e Szeja (C‑424/10 e C‑425/10, EU:C:2011:866, n.o 40); e de 17 de abril de 2018, B e Vomero (C‑316/16 e C‑424/16, EU:C:2018:256, n.o 53).


38      V. artigo 11.o da Diretiva 2004/38.


39      V., igualmente, artigo 18.o da Diretiva 2004/38.


40      V., designadamente, Acórdãos de 21 de dezembro de 2011, Ziolkowski e Szeja (C‑424/10 e C‑425/10, EU:C:2011:866, n.o 41); e de 17 de abril de 2018, B e Vomero (C‑316/16 e C‑424/16, EU:C:2018:256, n.o 54).


41      O sublinhado é meu.


42      V. Acórdãos de 25 de julho de 2008, Metock e o. (C‑127/08, EU:C:2008:449, n.o 82); de 18 de dezembro de 2014, McCarthy e o. (C‑202/13, EU:C:2014:2450, n.o 31); e de 5 de junho de 2018, Coman e o. (C‑673/16, EU:C:2018:385, n.o 18 e jurisprudência referida).


43      V. n.o 47 das presentes conclusões.


44      V., a este propósito, Acórdãos de 21 de dezembro de 2011, Ziolkowski e Szeja (C‑424/10 e C‑425/10, EU:C:2011:866, n.o 38); de 16 de janeiro de 2014, Onuekwere (C‑378/12, EU:C:2014:13, n.o 30); e de 17 de abril de 2018, B e Vomero (C‑316/16 e C‑424/16, EU:C:2018:256, n.o 51).


45      Proposta de Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao direito à livre circulação e residência dos cidadãos da União e membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros [COM(2001) 257 final, JO 2001, C 270 E, p. 150, em especial p. 153].


46      Resolução legislativa do Parlamento Europeu de 11 de fevereiro de 2003 sobre a proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao direito à livre circulação e residência dos cidadãos da União e membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros [COM(2001) 257], Posição do Parlamento Europeu de 11 de fevereiro de 2003 (JO 2004, C 43 E, p. 31).


47      O artigo 6.o, n.o 2 (alteração 24) dispunha que «a posse de um documento de residência válido emitido por um Estado‑Membro isenta da obrigação de visto». O sublinhado é meu. Proposta alterada de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao direito à livre circulação e residência dos cidadãos da União e membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros (apresentada pela Comissão em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 250.o do Tratado CE), COM(2003) 199 final — 2001/0111 (COD), p. 20.)


48      O artigo 5.o, n.o 2, da posição comum do Conselho determinava, «[p]ara efeitos da presente diretiva, a posse do cartão de residência válido a que se refere o artigo 10. o isenta esses membros da família da obrigação de visto». Posição Comum (CE) n.o 6/2004, de 5 de dezembro de 2003, adotada pelo Conselho tendo em vista a adoção da Diretiva 2004/[38]/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de […] relativa ao direito de livre circulação e residência dos cidadãos da União e dos membros das suas famílias no território dos Estados‑Membros, que altera o Regulamento (CEE) n.o 1612/68 e que revoga as Diretivas 64/221/CEE, 68/360/CEE, 72/194/CEE, 73/148/CEE, 75/34/CEE, 75/35/CEE, 90/364/CEE, 90/365/CEE e 93/96/CEE (JO 2004, C 54 E, p. 12).


49      O que é o caso, designadamente, do título de residência concedido pelas autoridades de um Estado‑Membro aos nacionais de um Estado terceiro membros da família de um cidadão da União que não exerceu o seu direito à livre circulação e a quem, de acordo com o disposto no artigo 3.o da Diretiva 2004/38, essa diretiva não se aplica.


50      O sublinhado é meu.


51      Por força do artigo 12.o, n.o 1, e do artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2004/38, a morte ou a partida de um cidadão da União ou ainda o divórcio, a anulação do casamento ou a cessação da parceria registada não afetam o direito de residência dos membros da sua família que tenham a nacionalidade de um Estado‑Membro. Todavia, antes da aquisição do direito de residência permanente, estes devem igualmente demonstrar que preenchem as condições previstas no n.o 1 do artigo 7.o dessa diretiva. V., igualmente, artigo 18.o do mesmo diploma.


52      V., designadamente, Acórdãos de 8 de abril de 1976, Royer (48/75, EU:C:1976:57, n.os 31 a 33); e de 21 de julho de 2011, Dias (C‑325/09, EU:C:2011:498, n.o 48). V., igualmente, Acórdãos de 25 de julho de 2002, MRAX (C‑459/99, EU:C:2002:461, n.o 74); e de 18 de dezembro de 2014, McCarthy e o. (C‑202/13, EU:C:2014:2450, n.o 49 e jurisprudência referida).


53      Quanto ao conceito de «residência legal», cabe recordar que «uma residência conforme com o direito de um Estado‑Membro, mas que não preencha os requisitos referidos no artigo 7.o, n.o 1, da Diretiva 2004/38, não pode ser considerada uma residência “legal”, na aceção do artigo 16.o, n.o 1, desta». Acórdão de 21 de dezembro de 2011, Ziolkowski e Szeja (C‑424/10 e C‑425/10, EU:C:2011:866, n.o 47).


54      V., neste sentido, Acórdão de 17 de fevereiro de 2005, Oulane (C‑215/03, EU:C:2005:95, n.o 24).


55      V. Conclusões que apresentei no processo McCarthy e o. (C‑202/13, EU:C:2014:345, n.o 139).


56      Acórdão de 18 de dezembro de 2014, McCarthy e o. (C‑202/13, EU:C:2014:2450, n.o 53).


57      V., a este respeito, nota 51 das presentes conclusões.


58      O conceito de «controlos de fronteira» encontra‑se definido no artigo 2.o, ponto 11, desse Código como «os controlos efetuados nos pontos de passagem de fronteira, a fim de assegurar que as pessoas, incluindo os seus meios de transporte e objetos na sua posse, podem ser autorizadas a entrar no território dos Estados‑Membros ou autorizadas a abandoná‑lo».


59      O «guarda de fronteira» está definido no artigo 2.o, ponto 14, do Código das Fronteiras Schengen como «qualquer agente público afetado, nos termos do direito nacional, quer a um ponto de passagem de fronteira quer ao longo da fronteira ou proximidade imediata desta última, e que execute, em conformidade com o presente regulamento e o direito nacional, missões de controlo fronteiriço».


60      V., igualmente, Diretiva 2001/51/CE do Conselho, de 28 de junho de 2001, que completa as disposições do artigo 26.o da Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen de 14 de junho de 1985 (JO 2001, L 187, p. 45).


61      C‑584/18, EU:C:2019:1003, n.o 60.


62      No que respeita ao conceito de «controlos de fronteira», v. Acórdão de 13 de dezembro de 2018, Touring Tours und Travel e Sociedad de Transportes (C‑412/17 e C‑474/17, EU:C:2018:1005, n.o 45 e jurisprudência referida), no qual o Tribunal de Justiça esclareceu que o controlo dos documentos de viagem efetuados pelas empresas de transporte quando dos transportes transfronteiriços por autocarro não constituem controlos de fronteira, na medida em que são efetuados no interior do território de um Estado‑Membro, concretamente aquele em que os viajantes entram no autocarro no início da viagem transfronteiriça e não «nas fronteiras» ou «no momento da passagem da fronteira».


63      Conclusões do advogado‑geral G. Pitruzzella no processo D. Z. (C‑584/18, EU:C:2019:1003, n.o 58).