Language of document : ECLI:EU:T:2020:304

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção alargada)

8 de julho de 2020 (*)

«Política económica e monetária — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 — Sanção administrativa pecuniária aplicada pelo BCE a uma instituição de crédito — Artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento (UE) n.o 575/2013 — Violação continuada dos requisitos de fundos próprios — Infração por negligência — Aplicação retroativa de legislação repressiva menos severa — Inexistência — Direitos de defesa — Montante da sanção — Dever de fundamentação»

No processo T‑576/18,

Crédit agricole SA, com sede em Montrouge (França), representada por A. Champsaur e A. Delors, advogados,

recorrente,

contra

Banco Central Europeu (BCE), representado por C. Hernández Saseta, A. Pizzolla e D. Segoin, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 263.o TFUE e destinado à anulação da Decisão ECB/SSM/2018‑FRCAG‑75 do BCE, de 16 de julho de 2018, tomada em aplicação do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63), e aplica à recorrente uma sanção administrativa pecuniária no montante de 4 300 000 euros por violação continuada dos requisitos de fundos próprios previstos no artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1, retificativos JO 2013, L 208, p. 68, e JO 2013, L 321, p. 6),

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção alargada),

composto por: S. Papasavvas, presidente, V. Tomljenović, F. Schalin, P Škvařilová‑Pelzl e I. Nõmm (relator), juízes,

secretário: M. Marescaux, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 21 de janeiro de 2020,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        A recorrente, Crédit agricole SA, é uma instituição de crédito francesa sujeita à supervisão prudencial direta do Banco Central Europeu (BCE).

2        Em 22 de dezembro de 2016, a unidade de averiguação do BCE enviou à recorrente uma comunicação de acusações ao abrigo do artigo 126.o, n.os 1 e 2, do Regulamento (UE) n.o 468/2014 do BCE, de 16 de abril de 2014, que estabelece o quadro de cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o BCE e as autoridades nacionais competentes e com as autoridades nacionais designadas (Regulamento‑Quadro do MUS) (JO 2014, L 141, p. 1). O BCE acusava a recorrente de ter classificado nos seus instrumentos de fundos próprios de base de categoria 1 (a seguir «CET 1») os instrumentos de capital sem obter a autorização prévia da autoridade competente, em violação do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1, retificações JO 2013, L 208, p. 68, e JO 2013, L 321, p. 6).

3        Em 18 de janeiro de 2017, a recorrente apresentou as suas observações escritas sobre a comunicação de acusações.

4        Em 2 de agosto de 2017, a unidade de averiguação do BCE transmitiu à recorrente um projeto de decisão, tendo em vista permitir‑lhe apresentar as suas observações escritas.

5        Em 4 de agosto de 2017, a recorrente solicitou ao BCE uma prorrogação do prazo para apresentar as suas observações. Em 7 de agosto de 2017, o BCE deferiu parcialmente este pedido, prorrogando o referido prazo até 30 de agosto de 2017.

6        Em 30 de agosto de 2017, a recorrente apresentou observações escritas sobre o projeto de decisão que lhe tinha sido comunicado.

7        Em 16 de julho de 2018, o BCE adotou a Decisão ECB/SSM/2018‑FRCAG‑75, tomada em aplicação do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63), e aplicou à recorrente uma sanção administrativa pecuniária no montante de 4 300 000 euros por violação continuada dos requisitos de fundos próprios previstos no artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 (a seguir «decisão impugnada»).

8        Em primeiro lugar, o BCE concluiu pela existência de um comportamento ilícito por parte da recorrente. Considerou que decorria do artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013 que as instituições de crédito apenas podiam classificar os seus instrumentos de capital como instrumentos de CET 1 após terem obtido a autorização prévia da autoridade competente.

9        A este respeito, o BCE refutou a argumentação da recorrente relativa ao facto de as ações ordinárias figurarem na lista publicada pela Autoridade Bancária Europeia (EBA), em aplicação do artigo 26.o, n.o 3, terceiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013 (a seguir «lista publicada pela EBA»). Considerou, em substância, que a presença de um instrumento nesta lista não dispensava uma instituição de crédito de obter a autorização prévia da autoridade competente em aplicação do artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013.

10      O BCE afirmou que a recorrente procedeu, em 23 de junho de 2015, em 12 de novembro de 2015 e em 21 de junho de 2016, a três emissões de ações ordinárias, que incluíam de uma «cláusula de lealdade», segundo a qual os acionistas recebiam um dividendo majorado por cada ação que detivessem durante um período ininterrupto de, pelo menos, dois anos. Acusou‑a de ter classificado, sem a sua autorização, estes instrumentos de capital entre os seus instrumentos de CET 1 nas suas declarações trimestrais consolidadas sobre os fundos próprios e os requisitos de fundos próprios entre o segundo trimestre de 2015 e o segundo trimestre de 2016, bem como nas suas publicações de informações a título do terceiro pilar entre 30 de junho de 2015 e 30 de junho de 2016.

11      O BCE recordou igualmente que, em 18 de abril de 2016, a equipa de supervisão prudencial conjunta tinha prestado à recorrente informação sobre a sua obrigação de pedir e de obter a autorização do BCE antes de classificar os instrumentos de capital entre os seus instrumentos de CET 1, na sequência da qual a recorrente apresentou, em 30 de maio e 22 de junho de 2016, pedidos de autorização relativos, respetivamente, por um lado, às emissões de 23 de junho e 12 de novembro de 2015 e, por outro, às emissões de 21 de junho de 2016. As autorizações foram concedidas pelo BCE em 26 de julho e em 29 de agosto de 2016, respetivamente.

12      O BCE deduziu daqui que a recorrente não respeitou o artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 entre 30 de junho de 2015 e 30 de junho de 2016, ao classificar os instrumentos de capital entre os seus instrumentos de CET 1 sem a autorização da autoridade competente, e que, no mínimo, esta infração foi cometida por negligência.

13      Além disso, na decisão impugnada, o BCE recordou que, posteriormente às autorizações que concedeu, foi informado pela EBA de que ações ordinárias que incluíam uma «cláusula de lealdade» não preenchem os requisitos estabelecidos no artigo 28.o, n.o 4, do Regulamento n.o 575/2013 e não podem ser classificadas como instrumentos de CET 1. Tal levou‑o a pedir à recorrente, em 1 de agosto de 2017, que tomasse as medidas adequadas para que as suas ações ordinárias estivessem plenamente conformes ao Regulamento n.o 575/2013.

14      Em segundo lugar, o BCE aplicou uma sanção administrativa pecuniária no montante de 4 300 000 euros à recorrente, devido ao seu comportamento ilícito. Sublinhou que, em aplicação do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013, tinha o direito de aplicar uma sanção administrativa pecuniária por violação de um dever previsto nos atos pertinentes diretamente aplicáveis da legislação da União Europeia, em consequência dos quais as autoridades competentes deviam aplicar sanções administrativas pecuniárias, nos termos da legislação aplicável da União. Acrescentou que, nos termos do artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1024/2013, as sanções aplicadas devem ser «efetivas, proporcionadas e dissuasivas».

15      No que respeita à gravidade da infração, o BCE teve em conta o facto de os instrumentos de capital em causa representarem 67 pontos de base do rácio de CET 1 da recorrente em 30 de junho de 2016 e de a violação do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 ter ocorrido durante cinco períodos de declarações trimestrais consecutivos e de três publicações de informações, a título do terceiro pilar, em 2015 e 2016. Considerou que, no mínimo, a infração tinha sido cometida por negligência e afirmou que a recorrente tinha continuado a classificar as suas emissões de ações ordinárias como instrumentos de CET 1 após ter sido avisada pela equipa de supervisão prudencial conjunta da obrigação de obter a sua autorização prévia.

16      A título de circunstâncias atenuantes, o BCE teve em conta o facto de ter autorizado a recorrente, na sequência dos pedidos apresentados por esta, a classificar as suas emissões de ações ordinárias entre os seus instrumentos de CET 1.

17      O BCE considerou que uma sanção administrativa pecuniária no montante de 4 300 000 euros, que, segundo afirma, representa, 0,0015 % do volume de negócios anual do grupo ao qual a recorrente pertencia, constituía uma sanção proporcionada.

18      Em terceiro lugar, o BCE decidiu publicar a sanção pecuniária administrativa aplicada, sem anonimização do nome da recorrente, no seu sítio Internet. Considerou que as circunstâncias invocadas pela recorrente para sustentar que tal publicação afetava gravemente a sua reputação e a sua posição no mercado eram puramente hipotéticas, vagas e genéricas e, por conseguinte, não permitiam demonstrar que a referida publicação lhe causava um dano desproporcionado na aceção do artigo 132.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento‑Quadro do MUS.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

19      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de setembro de 2018, a recorrente interpôs o presente recurso.

20      Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada, o processo foi atribuído a um novo juiz‑relator, que estava afetado à Segunda Secção, à qual o presente processo foi, por conseguinte, atribuído.

21      Sob proposta da Segunda Secção do Tribunal Geral, este decidiu, em aplicação do artigo 28.o do seu Regulamento de Processo, remeter o processo para uma formação de julgamento alargada.

22      Sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Segunda Secção alargada) decidiu dar início à fase oral do processo e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, colocou questões escritas às partes, em 13 de dezembro de 2019. Cada uma das partes respondeu às questões colocadas pelo Tribunal Geral e, em seguida, apresentou as suas observações sobre as respostas da outra parte.

23      Por decisão de 6 de janeiro de 2020, o presidente da Segunda Secção alargada decidiu, ouvidas as partes, apensar o presente processo aos processos T‑577/18 e T‑578/18 para efeitos da fase oral do processo.

24      Na audiência de 21 de janeiro de 2020, foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões orais colocadas pelo Tribunal Geral. Nesta audiência, foi pedido ao BCE para responder por escrito a uma questão do Tribunal Geral e à recorrente para apresentar observações sobre essa resposta. As partes deram cumprimento a este pedido nos prazos fixados.

25      Por decisão de 2 de março de 2020, o Tribunal Geral (Segunda Secção alargada) encerrou a fase oral do processo.

26      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar o BCE nas despesas.

27      O BCE conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

28      A recorrente invoca dois fundamentos de recurso.

29      O primeiro fundamento apresentado é relativo a um excesso de poder que vicia a decisão impugnada. Este fundamento é constituído por três partes. A primeira parte diz respeito a uma violação do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013. A segunda parte é relativa a uma violação do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013 e do princípio da segurança jurídica. A terceira parte tem por objeto a proporcionalidade da sanção administrativa pecuniária aplicada à recorrente.

30      No segundo fundamento, a recorrente acusa o BCE de ter violado o seu direito de ser ouvida, na medida em que baseou a decisão impugnada em acusações não apresentadas no decurso do procedimento administrativo.

31      Como foi sublinhado nos n.os 8 a 18, supra, o BCE, na decisão impugnada, em primeiro lugar, concluiu pela existência de uma infração cometida pela recorrente, em segundo lugar, aplicou‑lhe uma sanção administrativa pecuniária para punir esta infração e, em terceiro lugar, decidiu publicar essa sanção administrativa pecuniária no seu sítio Internet.

32      O Tribunal Geral considera oportuno distinguir as críticas da recorrente consoante incidam sobre a constatação de uma infração por ela cometida ou sobre a aplicação de uma sanção administrativa pecuniária.

 Quanto à legalidade da decisão impugnada, na parte em que conclui pela existência de uma infração por parte da recorrente

33      Na primeira parte do primeiro fundamento, a recorrente alega, em substância, que, ao concluir pela existência de uma infração por si cometida, o BCE violou o artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013. Além disso, no âmbito da primeira alegação da segunda parte do primeiro fundamento, afirma que o BCE violou o artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013 ao considerar que, no mínimo, tinha cometido uma infração por negligência. Por último, no seu segundo fundamento, apresentado a título subsidiário, a recorrente alega, em substância, que a conclusão da existência de uma infração, na decisão impugnada, se baseia em elementos em relação aos quais não teve a possibilidade de fazer valer o seu ponto de vista no decurso do procedimento administrativo, o que constitui uma violação do seu direito de ser ouvida.

 Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa a um erro de direito na interpretação e na aplicação do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013

34      No âmbito da primeira parte do primeiro fundamento, a recorrente invoca, em substância, duas alegações.

35      Na primeira alegação, a recorrente afirma que o BCE cometeu um erro na interpretação e na aplicação do artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013, na sua versão aplicável à data dos factos que lhe são imputados.

36      Na segunda alegação, apresentada na réplica, a recorrente afirma que, em qualquer caso, os factos que lhe são imputados também não constituem uma infração, devido à alteração introduzida no artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 pelo Regulamento (UE) 2019/876 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2019, que altera o Regulamento n.o 575/2013 no que diz respeito ao rácio de alavancagem, ao rácio de financiamento estável líquido, aos requisitos de fundos próprios e passivos elegíveis, ao risco de crédito de contraparte, ao risco de mercado, às posições em risco sobre contrapartes centrais, às posições em risco sobre organismos de investimento coletivo, aos grandes riscos e aos requisitos de reporte e divulgação de informações, e o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2019, L 150, p. 1). Afirma que esta alteração deve ser tida em conta pelo Tribunal Geral, uma vez que se assemelha a uma lei repressiva menos severa.

–       Quanto à primeira alegação, relativa a um erro na interpretação e na aplicação do artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013 na versão aplicável à data dos factos imputados à recorrente

37      No n.o 3 da decisão impugnada, o BCE considerou que o artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013 impunha à recorrente o dever de obter a autorização prévia da autoridade competente antes de classificar as suas emissões de ações ordinárias em instrumentos de CET 1, mesmo que esta categoria de instrumentos de capital figurasse na lista publicada pela EBA, em aplicação do terceiro parágrafo da referida disposição.

38      Importa observar que o artigo 26.o do Regulamento n.o 575/2013 é relativo aos instrumentos de CET 1. Mais particularmente, o seu n.o 3 diz respeito à avaliação, pelas autoridades competentes, da questão de saber se os instrumentos que as instituições de crédito classificam como instrumentos de CET 1 satisfazem os critérios do artigo 28.o ou, se aplicável, do artigo 29.o do Regulamento n.o 575/2013. Esta disposição prevê um regime específico para os instrumentos de capital.

39      Assim, o artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013, na sua versão aplicável ao litígio, dispõe o seguinte:

«As autoridades competentes avaliam se as emissões de instrumentos de [CET 1] satisfazem os critérios estabelecidos no artigo 28.o ou, se aplicável, no artigo 29.o No que diz respeito às emissões posteriores a 28 de junho de 2013, as instituições só classificam os instrumentos de fundos próprios como instrumentos de [CET 1] depois de obtida a autorização das autoridades competentes, que poderão consultar a EBA.

Relativamente aos instrumentos de fundos próprios, com exceção dos auxílios estatais, que são considerados elegíveis para classificação como instrumentos de [CET 1] pela autoridade competente, sempre que, segundo o parecer da EBA, seja materialmente complexo determinar o cumprimento dos critérios estabelecidos no artigo 28.o ou, se aplicável, no artigo 29.o, autoridades competentes apresentam à EBA as suas razões.

Com base nas informações prestadas por cada autoridade competente, a EBA elabora, mantém e publica uma lista das formas de instrumentos de fundos próprios que são elegíveis em cada Estado‑Membro como instrumentos de [CET 1]. A EBA elabora e publica essa lista pela primeira vez até 28 de julho de 2013.

A EBA pode, após o processo de revisão previsto no artigo 80.o e sempre que existam provas evidentes de que esses instrumentos não preenchem os critérios estabelecidos no artigo 28.o ou, se aplicável, no artigo 29.o, decidir retirar dessa lista os instrumentos que não sejam instrumentos de auxílio estatal emitidos após 28 de junho de 2013, podendo fazer uma declaração para esse efeito.»

40      Os artigos 28.o e 29.o do Regulamento n.o 575/2013, para os quais o artigo 26.o, n.o 3, deste mesmo regulamento remete, fixam as condições que os instrumentos de CET 1 devem preencher. O artigo 28.o do Regulamento n.o 575/2013 estabelece as condições aplicáveis aos instrumentos de capital emitidos pelas instituições de crédito, enquanto o artigo 29.o deste regulamento diz respeito às condições específicas dos instrumentos de fundos próprios emitidos por sociedades mútuas, sociedades cooperativas, instituições de poupança e instituições similares.

41      As partes estão em desacordo quanto à interpretação da expressão «autorização das autoridades competentes» que figura no artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013.

42      A este respeito, a recorrente alega que a autorização das autoridades competentes é conferida por categoria de instrumentos de capital e materializa‑se pela inclusão do tipo de instrumentos em causa na lista publicada pela EBA nos termos do artigo 26.o, n.o 3, terceiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013. Na medida em que as ações ordinárias figuravam nesta lista quando a EBA as classificou nos seus instrumentos de CET 1, entende que o BCE errou ao considerar que tinha violado o artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013.

43      Em contrapartida, o BCE considera que o artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013 significa apenas que uma instituição de crédito deve pedir a autorização prévia da autoridade competente antes de classificar um instrumento de capital como instrumento de CET 1, mesmo que o instrumento figure na lista publicada pela EBA. Daqui deduziu que teve razão ao concluir, na decisão impugnada, que a recorrente violou esta disposição ao classificar três emissões de ações ordinárias entre os seus instrumentos de CET 1 sem obter previamente a sua autorização.

44      Uma vez que a expressão «autorização das autoridades competentes» utilizada no artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 não é definida por este regulamento, é necessário proceder à sua interpretação.

45      Em aplicação de jurisprudência constante, para interpretar uma disposição de direito da União, há que ter em conta não apenas os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte (v. Acórdão de 7 de junho de 2005, VEMW e o., C‑17/03, EU:C:2005:362, n.o 41 e jurisprudência referida).

46      No que respeita, em primeiro lugar, à redação do artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013, daí resulta que a autorização da autoridade competente deve ser obtida pela instituição de crédito antes de esta classificar os seus instrumentos de capital como instrumentos de CET 1.

47      Importa observar que as modalidades de manifestação desta autorização da autoridade competente não podem ser deduzidas apenas da redação do artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013, uma vez que o termo «autorização» pode designar, simultaneamente, uma autorização prévia aplicável aos instrumentos de capital numa base individual e uma autorização conferida globalmente por categoria de instrumentos de capital.

48      A este respeito e contrariamente ao que alega a recorrente, o facto de outras disposições do Regulamento n.o 575/2013 remeterem expressamente para a obtenção de uma «autorização prévia» da autoridade competente não implica necessariamente que a utilização do termo «autorização» no artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013 vise um mecanismo diferente do mecanismo da autorização prévia.

49      Com efeito, não resulta da leitura do conjunto das disposições do Regulamento n.o 575/2013 que se referem à concessão de uma «autorização» ou de uma «autorização prévia» da autoridade competente que as modalidades de uma aprovação da autoridade competente variem consoante a terminologia utilizada pelas referidas disposições. Além disso, importa assinalar que esta distinção não tem um caráter sistemático, uma vez que outras versões linguísticas do Regulamento n.o 575/2103 não reproduzem necessariamente a distinção entre «autorização» e «autorização prévia» que figura na versão em língua francesa deste regulamento.

50      De igual modo, o BCE erra ao alegar que o conceito de «categoria de instrumentos» não figura no artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013. Com efeito, na medida em que o terceiro parágrafo desta disposição se refere a uma «lista das formas de instrumentos de fundos próprios que são elegíveis em cada Estado‑Membro como instrumentos [CET 1]», publicada pela EBA, o artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 prevê uma análise da elegibilidade dos instrumentos de capital por categoria. Por conseguinte, não é possível considerar que a referência aos «instrumentos de capital» que consta do primeiro parágrafo desta disposição implique necessariamente uma análise de cada instrumento de capital numa base individual.

51      No que respeita, em segundo lugar, à interpretação contextual do artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013, a recorrente remete para os segundo e terceiro parágrafos desta disposição. Assim, o segundo parágrafo deste artigo visa uma análise da elegibilidade de uma forma de instrumentos de capital pela autoridade competente com a EBA, a qual conduz à inclusão da referida forma de instrumentos de capital na lista publicada pela EBA ao abrigo do terceiro parágrafo desse mesmo artigo. Esta publicação pela EBA materializa a autorização da autoridade competente prevista no artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013. Assim, tal publicação implica que o instrumento preencha as condições gerais estabelecidas no artigo 28.o do Regulamento n.o 575/2013 e que cabe às instituições de crédito em causa verificar se o instrumento de capital em causa cumpre as condições individuais previstas neste artigo, podendo a autoridade competente fiscalizar, a posteriori, o mérito dessa apreciação.

52      Tal interpretação não pode ser aceite.

53      Por um lado, esta interpretação é incompatível com a diferença de natureza da consulta da EBA, consoante seja considerada nos termos do primeiro ou do segundo parágrafo do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013. Com efeito, mesmo que a referida consulta seja apresentada como uma simples faculdade para as autoridades competentes no âmbito do primeiro parágrafo, uma vez que as referidas autoridades «podem consultar a EBA», o segundo parágrafo desta mesma disposição implica, pelo contrário, uma consulta sistemática da EBA pelas autoridades competentes.

54      Por outro lado, seguir a abordagem da recorrente implicaria que apenas o preenchimento das condições gerais estabelecidas no artigo 28.o ou, se aplicável, no artigo 29.o do Regulamento n.o 575/2013 seria fiscalizado pela autoridade competente antes da classificação de um instrumento de capital como instrumento de CET 1. Como reconhece a própria recorrente, é à instituição de crédito que cabe verificar se a emissão de um instrumento de capital preenche as condições individuais previstas no artigo 28.o ou, se aplicável, no artigo 29.o deste regulamento.

55      Importa constatar que tal limitação da fiscalização das autoridades competentes é contrária ao artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013. Com efeito, deste decorre que um instrumento de capital apenas pode ser classificado como instrumento de CET 1 após autorização das autoridades competentes e que a avaliação destas tem por objeto o preenchimento das condições estabelecidas no artigo 28.o, ou, se aplicável, no artigo 29.o deste regulamento, sem que seja efetuada uma distinção consoante estas condições possuam caráter geral ou individual.

56      Por conseguinte, há que considerar que o artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 deve ser interpretado no sentido de que prevê duas tomadas de decisão diferentes. Por um lado, uma decisão resultante da cooperação entre as autoridades competentes e a EBA prevista no artigo 26.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013, relativo à elegibilidade das formas de instrumentos de capital e materializa‑se pela sua inscrição na lista publicada pela EBA, prevista no terceiro parágrafo desta disposição. Por outro lado, uma decisão da autoridade competente, a respeito da qual a consulta da EBA constitui apenas uma mera faculdade, que visa verificar se um instrumento de capital preenche todas as condições estabelecidas no artigo 28.o ou, se aplicável, no artigo 29.o do Regulamento n.o 575/2013, independentemente de estas possuírem caráter geral ou individual.

57      Daqui resulta que, embora a inclusão de um instrumento de capital na lista publicada pela EBA implique que este seja, em princípio, elegível para uma classificação como instrumento de CET 1, na medida em que preenche as condições gerais estabelecidas no artigo 28.o ou, se aplicável, no artigo 29.o do Regulamento n.o 575/2013, não permite, por si só, a uma instituição de crédito classificá‑lo entre os seus instrumentos de CET 1. Previamente, este deve comunicar tal instrumento à autoridade competente para que a mesma verifique em concreto o preenchimento das referidas condições, nomeadamente, das condições que disponham de caráter individual.

58      Por último, em terceiro lugar, há que ter em conta a intenção do legislador, aquando da adoção do Regulamento n.o 575/2013, de melhorar a quantidade e qualidade do capital no sistema bancário, recordada no considerando 1 do Regulamento n.o 575/2013 e reiterada no considerando 72 desse mesmo regulamento. O considerando 72, nomeadamente, salienta a necessidade de melhorar e de harmonizar ainda mais as obrigações em matéria de fundos próprios aplicáveis às instituições de crédito e refere‑se, a este respeito, a um «rigoroso conjunto de critérios aplicáveis aos instrumentos de fundos próprios principais».

59      Por conseguinte, está em conformidade com a intenção do legislador de privilegiar a interpretação do artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013, que melhor permite à autoridade competente garantir o preenchimento das condições de elegibilidade de um instrumento para a qualificação de fundos próprios da máxima qualidade, designadamente, entre os instrumentos de CET 1.

60      Ora, há que constatar que a fiscalização do preenchimento das condições estabelecidas no artigo 28.o ou, se aplicável, no artigo 29.o do Regulamento n.o 575/2013 é melhor assegurada por um procedimento de autorização prévia do que por um sistema no qual a verificação do preenchimento de algumas destas condições incumbe, em primeiro lugar, à própria instituição de crédito, ocorrendo a fiscalização da autoridade competente apenas a posteriori, sem revestir um caráter necessariamente sistemático.

61      Os outros argumentos apresentados pela recorrente não põem em causa o mérito desta conclusão.

62      É o que acontece, nomeadamente, em primeiro lugar, com a referência à interpretação do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 privilegiada pela EBA ou pela Autorité de contrôle prudentiel et de résolution [Autoridade de Fiscalização Prudencial e de Resolução] (ACPR). A este respeito, basta recordar que a interpretação da legislação relevante por uma autoridade administrativa não pode vincular o juiz da União, que continua a ter competência exclusiva para interpretar o direito da União, nos termos do artigo 19.o TUE (Acórdão de 13 de dezembro de 2017, Crédit mutuel Arkéa/BCE, T‑712/15, EU:T:2017:900, n.o 75).

63      O mesmo sucede, em segundo lugar, quanto ao facto de o texto do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 ter sido posteriormente alterado pelo Regulamento 2019/876. A este respeito, basta sublinhar que, embora resulte do considerando 23 do Regulamento 2019/876 que o objetivo desta alteração foi introduzir um novo processo de aprovação claro e transparente relativamente à classificação de instrumentos como CET 1, daí não se pode deduzir qualquer indicação quanto ao sentido desta disposição antes da sua alteração.

64      A primeira alegação da recorrente deve, assim, ser rejeitada.

–       Quanto à segunda alegação, relativa, em substância, à aplicação retroativa da nova versão do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013

65      Na sua réplica, a recorrente sublinha, em substância, que a redação do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 foi alterada pelo artigo 1.o, n.o 15, do Regulamento 2019/876 a partir de 27 de junho de 2019. Considera que, à luz desta nova versão do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013, o seu comportamento deixou de ter um caráter ilícito e que, por conseguinte, o princípio de aplicação retroativa da lei repressiva menos severa implica que esta nova versão do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 lhe seja aplicada.

66      O BCE considera que a presente alegação deve ser rejeitada.

67      No que diz respeito, a título liminar, à admissibilidade desta alegação por ter sido apresentada na fase da réplica, há que observar que o artigo 84.o, n.o 1, do Regulamento de Processo proíbe, em princípio, deduzir fundamentos novos no decurso da instância, a menos que esses fundamentos tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo. Assim, a presente alegação é admissível, na medida em que se baseia num elemento de direito que se revelou durante o processo, nomeadamente, a entrada em vigor, em 27 de junho de 2019, do artigo 1.o, n.o 15, do Regulamento 2019/876.

68      No entanto, nas circunstâncias do caso em apreço, tal alegação não é suscetível de conduzir à anulação da decisão impugnada.

69      É certo que o princípio da aplicação retroativa da lei repressiva menos severa constitui um princípio geral do direito da União (Acórdão de 11 de março de 2008, Jager, C‑420/06, EU:C:2008:152, n.o 59; v., igualmente, neste sentido, Acórdãos de 3 de maio de 2005, Berlusconi e o., C‑387/02, C‑391/02 e C‑403/02, EU:C:2005:270, n.os 67 a 69, e de 27 de junho de 2017, NC/Comissão, T‑151/16, EU:T:2017:437, n.os 53 e 54), atualmente consagrado na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

70      Nos termos do artigo 49.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais:

«Ninguém pode ser condenado por uma ação ou por uma omissão que, no momento da sua prática, não constituía infração perante o direito nacional ou o direito internacional. Igualmente não pode ser imposta uma pena mais grave do que a aplicável no momento em que a infração foi cometida. Se, posteriormente à infração, a lei previr uma pena mais leve, deve ser essa a pena aplicada.»

71      Além disso, o princípio da aplicação retroativa da lei repressiva menos severa é invocável não apenas contra decisões que aplicam sanções penais em sentido estrito, mas também contra as que impõem sanções administrativas (v., neste sentido, Acórdãos de 8 de março de 2007, Campina, C‑45/06, EU:C:2007:154, n.os 32 e 33; de 11 de março de 2008, Jager, C‑420/06, EU:C:2008:152, n.o 60, e de 27 de junho de 2017, NC/Comissão, T‑151/16, EU:T:2017:437, n.o 54).

72      No entanto, importa observar que o princípio da aplicação retroativa da lei repressiva menos severa, embora possa conduzir à anulação de uma decisão na eventualidade de ter ocorrido uma alteração do quadro jurídico após os factos do caso em apreço, mas antes da decisão impugnada (v., neste sentido, Acórdão de 27 de junho de 2017, NC/Comissão, T‑151/16, EU:T:2017:437, n.o 63), não pode ser pertinente para a fiscalização da legalidade de um ato adotado antes da referida alteração do quadro jurídico, uma vez que não se pode acusar a instituição recorrida de ter violado regras jurídicas ainda não aplicáveis.

73      Além disso, apenas no âmbito do exercício, pelo Tribunal Geral, do seu poder de alteração do montante da sanção aplicada, na eventualidade de o Tribunal Geral dispor dessa competência, em aplicação do artigo 261.o TFUE, contra as sanções administrativas impostas pelo BCE nos termos do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013, é que uma evolução do quadro jurídico posteriormente à decisão impugnada poderia, eventualmente, ser tida em conta. Com efeito, chamado a pronunciar‑se sobre tal pedido, o Tribunal Geral seria levado a determinar se deve, à data em que adota a sua decisão, substituir a apreciação do BCE pela sua própria apreciação, de modo que o montante da sanção seja adequado (v., neste sentido, Acórdão de 17 de dezembro de 2015, Orange Polska/Comissão, T‑486/11, EU:T:2015:1002, n.o 67 e jurisprudência referida).

74      No entanto, não foi submetido ao Tribunal Geral qualquer pedido de alteração do montante da sanção aplicada, facto que a recorrente confirmou expressamente na audiência.

75      Assim, há que rejeitar a segunda alegação e, por conseguinte, a primeira parte do primeiro fundamento.

 Quanto à primeira alegação da segunda parte do primeiro fundamento, relativa a uma violação do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013

76      Na decisão impugnada, o BCE considerou que a recorrente tinha cometido uma infração ao artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013, no mínimo, por negligência na aceção do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013.

77      A recorrente entende que o BCE violou o artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013 ao concluir pela existência de uma infração cometida por negligência, uma vez que não se podia considerar que sabia ou devia saber que o seu comportamento constituía uma infração. Recorda, nomeadamente, ter seguido a interpretação privilegiada pela EBA e pela ACPR, apesar de o BCE não ter fornecido qualquer orientação relativa ao artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013, e que quase todas as instituições de crédito adotaram a mesma interpretação. Considera, igualmente, que uma mera divergência de interpretação não constitui um ato ilícito e que não podia ter consciência de que o seu comportamento era ilegal.

78      O BCE alega que a presente alegação deve ser rejeitada.

79      O artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013 estabelece que «[p]ara efeitos do exercício das atribuições que lhe são conferidas pelo presente regulamento, caso as instituições de crédito, as companhias financeiras ou as companhias financeiras mistas infrinjam, dolosa ou negligentemente, uma violação […] o BCE pode aplicar sanções administrativas pecuniárias».

80      Como o Tribunal de Justiça teve oportunidade de sublinhar, o conceito de negligência visa uma ação ou omissão involuntária através da qual a pessoa responsável viola o seu dever de diligência (Acórdão de 3 de junho de 2008, Intertanko e o., C‑308/06, EU:C:2008:312, n.o 75). Além disso, para apreciar a existência de tal negligência, há que ter em conta, nomeadamente, a complexidade das disposições em causa, assim como a experiência profissional e a diligência da empresa em causa (v., por analogia, Acórdão de 11 de novembro de 1999, Söhl & Söhlke, C‑48/98, EU:C:1999:548, n.o 56).

81      A este respeito, importa salientar que a recorrente, na sua qualidade de instituição de crédito, devia ter dado provas de grande prudência na aplicação das disposições do Regulamento n.o 575/2013, prestando especial atenção ao alcance das obrigações que lhe incumbem nos termos dessas disposições.

82      Além disso, embora o artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 não tivesse, até ao presente acórdão, sido objeto de interpretação pelo juiz da União, o alcance exato das obrigações das instituições de crédito podia ser deduzido de uma análise atenta desta disposição, como demonstra o raciocínio que figura nos n.os 53 a 60, supra.

83      Com efeito, tal análise teria conduzido a recorrente à conclusão de que a publicação efetuada pela EBA ao abrigo do terceiro parágrafo do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 e a autorização da autoridade competente prevista no primeiro parágrafo da referida disposição incidiam sobre duas questões, certamente conexas, mas distintas: por um lado, a elegibilidade de um instrumento de capital para uma classificação como instrumento de CET 1 e, por outro, a verificação concreta do preenchimento das condições — nomeadamente de alcance individual — estabelecidas no artigo 28.o ou, se aplicável, no artigo 29.o do referido regulamento.

84      Por conseguinte, o BCE teve razão ao considerar negligente o comportamento da recorrente e ao concluir que esta cometeu uma infração nos termos do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013.

85      Esta conclusão não é infirmada pela argumentação da recorrente segundo a qual, em substância, seguiu a interpretação que figura na cláusula introdutória da lista publicada pela EBA, que implica que não estava obrigada a pedir a autorização prévia da autoridade competente quanto à classificação entre os seus instrumentos de CET 1 de uma categoria de instrumentos que consta da referida lista.

86      A este respeito, já foi sublinhado no n.o 62, supra, que a interpretação da EBA não pode prevalecer sobre o teor do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013.

87      Não é menos verdade que, uma vez que uma das funções da EBA, nos termos do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento (UE) n.o 1093/2010 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro de 2010, que cria uma Autoridade Europeia de Supervisão (Autoridade Bancária Europeia), altera a Decisão n.o 716/2009/CE e revoga a Decisão 2009/78/CE da Comissão (JO 2010, L 331, p. 12), é «[c]ontribuir para uma aplicação coerente dos atos juridicamente vinculativos da União, nomeadamente contribuindo para o desenvolvimento de uma cultura comum de supervisão», a sua interpretação do Regulamento n.o 575/2013, nomeadamente quando uma disposição ainda não foi interpretada pelo juiz da União, é particularmente relevante.

88      De igual modo, é certo que, considerada isoladamente, uma frase do n.o 4 da cláusula introdutória da lista publicada pela EBA podia levar a pensar que a EBA entende que a inclusão de um instrumento de capital na lista que publica implica que o mesmo pode ser classificado entre os instrumentos de CET 1, uma vez que é referido que «[a] inscrição de um instrumento na lista implica que este cumpre os critérios de elegibilidade do Regulamento [n.o 575/2013] e que pode ser incluído nos [instrumentos de CET 1] por todas as instituições do Estado‑Membro em causa».

89      No entanto, a leitura desta cláusula no seu âmbito mais geral devia ter levado a recorrente a relativizar o alcance desta frase. Com efeito, esta possibilidade de classificar os instrumentos de capital que constam da lista publicada pela EBA entre os instrumentos de CET 1 não é apresentada por esta como sendo incondicional. Em contrapartida, remete‑se para o necessário cumprimento das regras da legislação nacional, bem como para a eventual necessidade de obtenção da autorização das autoridades competentes em aplicação do Regulamento n.o 575/2013. Embora a redação da cláusula não seja muito clara, não deixa de ser verdade que a referência ao eventual cumprimento de outras condições ou à obtenção de uma autorização das autoridades competentes devia ter levado a recorrente a interrogar‑se sobre o alcance exato das obrigações que lhe incumbem nos termos do artigo 26.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 575/2013.

90      Por outro lado, importa assinalar que, em 18 de abril de 2016, a recorrente recebeu uma mensagem de correio eletrónico de esclarecimento do BCE sobre o alcance das suas obrigações nos termos do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013. Neste correio eletrónico o BCE indicou que era necessária uma autorização prévia antes de classificar os aumentos de capital como instrumentos de CET 1 e apresentou a lista dos documentos que deviam ser fornecidos.

91      Contrariamente ao que alega a recorrente, o conteúdo do correio eletrónico do BCE de 18 de abril de 2016 era inequívoco no que dizia respeito à interpretação que este privilegiava do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013.

92      No entanto, apesar deste aviso, a recorrente continuou a seguir uma interpretação divergente e errada das obrigações que lhe incumbem nos termos do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013, ao classificar, em 30 de junho de 2016, na sua publicação de informações a título do terceiro pilar e na sua declaração trimestral consolidada sobre os fundos próprios e as exigências de fundos próprios, as suas emissões 1 a 3 entre os seus instrumentos de CET 1, antes de o BCE lhe comunicar a sua autorização.

93      A recorrente alega igualmente, em substância, que a falta de clareza do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 levou algumas autoridades nacionais e várias instituições de crédito a seguir a mesma interpretação que ela privilegiou, o que explica a alteração desta disposição pelo Regulamento 2019/876.

94      Tal circunstância, admitindo‑a provada, não permite, no entanto, demonstrar a inexistência de negligência por parte da recorrente.

95      Com efeito, embora tais elementos possam constituir indícios de que alguns operadores tiveram dificuldades na interpretação do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013, não deixa de ser verdade que a prudência e a diligência que se pode esperar de uma instituição de crédito da importância da recorrente deviam tê‑la levado a fazer uma leitura atenta desta disposição, calo que lhe teria permitido superar as referidas dificuldades de interpretação quanto ao alcance das suas obrigações.

96      Tendo em consideração o exposto, há que rejeitar a primeira alegação da segunda parte do primeiro fundamento.

 Quanto ao segundo fundamento, apresentado a título subsidiário, relativo à violação do direito de a recorrente ser ouvida

97      A recorrente alega, em substância, que o BCE violou o seu direito de ser ouvida ao fundamentar a decisão impugnada em elementos de facto ou de direito sobre os quais não teve oportunidade de apresentar as suas observações no decurso do procedimento administrativo e recorda que, em aplicação do artigo 22.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013, o BCE baseia as suas decisões apenas nas objeções sobre as quais as partes em causa tenham tido oportunidade de apresentar as suas observações, quer estas tenham afetado desfavoravelmente ou não as referidas partes. A este respeito, acusa, em particular, o BCE de ter procedido, pela primeira vez na decisão impugnada, à sua própria interpretação do relatório da EBA de 23 de maio de 2017, de se ter referido ao facto de a EBA pôr em causa a «cláusula de lealdade» que figura nas suas ações ordinárias e de ter declarado que a recorrente tinha comunicado informações erradas ao mercado relativamente à sua situação prudencial.

98      No que respeita mais especificamente à referência, na decisão impugnada, ao facto de a EBA pôr em causa a «cláusula de lealdade» e a uma alegada comunicação de informações erradas ao mercado, a recorrente considera que as mesmas tiveram influência no montante da sanção que lhe foi aplicada.

99      O BCE alega que nenhum dos elementos de facto ou de direito não referidos no projeto de decisão de sanção, mas que figuram na decisão impugnada, foi suscetível de afetar desfavoravelmente os direitos de defesa da recorrente ou foi decisivo para o desfecho do processo.

100    Segundo jurisprudência constante, o respeito dos direitos de defesa, em qualquer processo instaurado contra uma pessoa e suscetível de conduzir à adoção de um ato que seja lesivo para ela constitui um princípio fundamental do direito da União e deve ser garantido, mesmo na falta de regulamentação relativa ao processo em causa (v. Despacho de 12 de maio de 2010, CPEM/Comissão, C‑350/09 P, não publicado, EU:C:2010:267, n.o 76 e jurisprudência referida).

101    O artigo 22.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013 reflete este princípio, uma vez que prevê que o BCE dá às pessoas que são objeto do procedimento a possibilidade de serem ouvidas e que este baseia as suas decisões apenas nas objeções sobre as quais as partes em causa tenham tido oportunidade de apresentar as suas observações.

102    Este princípio figura tanto no artigo 31.o, sob a epígrafe «Direito de audiência», como no artigo 126.o, sob a epígrafe «Direitos processuais», do Regulamento‑Quadro do MUS.

103    O artigo 31.o do Regulamento‑Quadro do MUS é aplicável, nos termos do seu n.o 1, a qualquer decisão de supervisão prudencial «dirigida a uma parte, suscetível de afetar adversamente os direitos dessa parte». Estabelece que esta parte deve ter a oportunidade de apresentar por escrito ao BCE comentários sobre os factos, objeções e fundamentos jurídicos relevantes para a decisão de supervisão do BCE, previamente à sua adoção.

104    O artigo 126.o do Regulamento‑Quadro do MUS, que diz especificamente respeito às decisões que aplicam sanções administrativas distintas de sanções pecuniárias temporárias, dispõe o seguinte:

«1. Depois de concluir as suas investigações e antes de elaborar e submeter uma proposta de projeto de decisão completo ao Conselho de Supervisão, a unidade de averiguação informará por escrito a entidade supervisionada em causa das conclusões da investigação e das objeções formuladas.

2. Na notificação referida no n.o 1, a unidade de averiguação informará a entidade supervisionada em causa do seu direito de apresentar observações escritas à unidade de averiguação sobre as conclusões de facto da investigação e objeções contra a entidade enunciadas na mesma, incluindo cada uma das disposições alegadamente infringidas, e fixa um prazo razoável para a receção dessas observações. O BCE não é obrigado a tomar em conta as observações escritas recebidas após o decurso do prazo fixado pela unidade de averiguação.»

105    Como a jurisprudência teve a oportunidade de sublinhar em relação ao artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos [101.o] e [102.o TFUE] (JO 2003, L 1, p. 1), cujo sentido é substancialmente idêntico ao do artigo 22.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013 e ao do artigo 126.o do Regulamento‑Quadro do MUS, a exigência relacionada com os direitos da defesa é respeitado, quando, por um lado, é enviada às partes de uma comunicação de acusações que enuncia, de forma clara, todos os elementos essenciais em que a Comissão se baseia nessa fase do processo e, por outro, a decisão não imputa aos interessados infrações diferentes das acusações que lhes foram comunicadas no decurso do procedimento administrativo e apenas se baseie em factos sobre os quais os interessados tenham tido a oportunidade de se explicar (v. Acórdão de 24 de maio de 2012, MasterCard e o./Comissão, T‑111/08, EU:T:2012:260, n.o 266 e jurisprudência referida).

106    A este respeito, importa assinalar que, em aplicação de jurisprudência constante relativa ao respeito dos direitos da defesa no decurso de processos de controlo de violações aos artigos 101.o e 102.o TFUE, essa indicação pode ser feita de forma sumária e a decisão não tem de ser necessariamente uma cópia da comunicação de acusações, uma vez que essa comunicação constitui um documento preparatório cujas apreciações de facto e de direito têm caráter puramente provisório. Assim, admite‑se que sejam feitos aditamentos à comunicação de acusações tendo em conta a resposta das partes cujos argumentos demonstrem que estas puderam, efetivamente, exercer os seus direitos de defesa. A Comissão pode também, atendendo ao procedimento administrativo, rever ou acrescentar argumentos de facto ou de direito em apoio das acusações que formulou (v. Acórdão de 24 de maio de 2012, MasterCard e o./Comissão, T‑111/08, EU:T:2012:260, n.o 267 e jurisprudência referida).

107    Resulta desta mesma jurisprudência que a comunicação de um complemento de acusações aos interessados só é necessária se o resultado das averiguações levar a Comissão a imputar às empresas atos novos ou a modificar sensivelmente os elementos de prova das infrações contestadas (v. Acórdão de 24 de maio de 2012, MasterCard e o./Comissão, T‑111/08, EU:T:2012:260, n.o 268 e jurisprudência referida).

108    Por último, ainda segundo a jurisprudência aplicável à fiscalização de violações aos artigos 101.o e 102.o TFUE, existe violação dos direitos de defesa quando exista uma possibilidade de que, por causa de uma irregularidade praticada pela Comissão, o procedimento administrativo pudesse ter tido um resultado diferente. Uma empresa recorrente prova que tal violação ocorreu quando demonstra de forma bastante não que a decisão da Comissão teria tido um conteúdo diferente, mas sim que poderia ter assegurado melhor a sua defesa sem essa irregularidade, por exemplo, devido ao facto de poder ter utilizado em sua defesa os documentos cujo acesso lhe foi recusado durante o procedimento administrativo (v. Acórdão de 24 de maio de 2012, MasterCard e o./Comissão, T‑111/08, EU:T:2012:260, n.o 269 e jurisprudência referida).

109    Os mesmos princípios são aplicáveis, por analogia, ao respeito dos direitos da defesa no âmbito de um processo instaurado pelo BCE relativo a uma violação de um dever previsto nos atos pertinentes diretamente aplicáveis da legislação da União, nos termos do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013.

110    Em primeiro lugar, importa sublinhar que a única acusação imputada à recorrente pelo BCE — nomeadamente, a classificação sem autorização de determinados instrumentos de capital entre os seus instrumentos de CET 1, em violação do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 — foi formulada, de modo claro, desde a comunicação de acusações que lhe foi enviada em 22 de dezembro de 2016.

111    Em segundo lugar, a recorrente pôde pronunciar‑se sobre esta acusação, não só na sua resposta à referida comunicação mas também nas suas observações sobre o projeto de decisão que o BCE lhe enviou em 2 de agosto de 2017.

112    Em terceiro lugar, há que constatar que os três elementos cuja presença pela primeira vez na decisão impugnada é criticada pela recorrente não podem ser considerados novas acusações.

113    Com efeito, em primeiro lugar, no que diz respeito à referência efetuada pelo BCE, no n.o 3.2.2.4 da decisão impugnada, ao relatório da EBA de 23 de maio de 2017, há que assinalar que o BCE referiu‑o para justificar o mérito da sua interpretação do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013. Ora, esta questão foi amplamente discutida pelas partes no decurso do procedimento administrativo. Mais precisamente, deve sublinhar‑se que esta referência foi efetuada pelo BCE em resposta ao argumento da recorrente relativo ao facto de que, nessa mesma data, a EBA tinha afirmado que o artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 podia dar origem a interpretações diferentes.

114    Em segundo lugar, no que diz respeito à referência, no n.o 3.2.2.4 da decisão impugnada, segundo o qual a EBA tinha considerado que a cláusula de lealdade que figura nas ações ordinárias da recorrente impedia a sua classificação como instrumentos de CET 1, basta sublinhar que esta questão é relativa à conformidade das ações ordinárias da recorrente com as condições estabelecidas no artigo 28.o do Regulamento n.o 575/2013 e que é alheia à acusação do BCE contra a recorrente, que tem exclusivamente por objeto a violação, por esta última, do artigo 26.o, n.o 3, deste mesmo regulamento.

115    Em terceiro lugar, a referência do BCE, no n.o 3.2.4 da decisão impugnada, ao facto de que o cumprimento do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013 não «[levou a recorrente] a declarar informações inexatas relativamente à sua situação prudencial às autoridades competentes e ao mercado» não pode ser entendido no sentido de que constitui uma nova acusação contra a recorrente. Com efeito, este comentário foi efetuado pelo BCE no âmbito da apreciação do caráter negligente do comportamento da recorrente, em resposta à afirmação desta, nas suas observações de 30 de agosto de 2017, de que tinha agido «com prudência e diligência, com o objetivo de evitar qualquer comunicação errada sobre a situação real dos seus fundos próprios».

116    Em quarto lugar, no que diz respeito à crítica da recorrente relativa ao facto de os elementos referidos nos n.os 114 e 115, supra, terem influenciado o montante da sanção pecuniária que lhe foi aplicada, há que salientar que esta questão não diz respeito à legalidade da constatação de uma infração por parte da recorrente, mas à legalidade do montante da sanção que lhe foi aplicada.

117    Assim, há que concluir que o segundo fundamento deve ser julgado improcedente, na parte em que tem por objeto a legalidade da constatação de uma infração contra a recorrente.

118    Tendo em consideração o exposto, há que concluir que a recorrente não demonstrou a ilegalidade da decisão impugnada, na parte em que esta declara a existência de uma infração cometida por si.

 Quanto à legalidade da decisão impugnada, na parte em que aplica uma sanção administrativa pecuniária à recorrente

119    Na segunda alegação da segunda parte do primeiro fundamento, a recorrente alega que a aplicação de uma sanção administrativa pecuniária é, nas circunstâncias do processo principal, contrária ao princípio da segurança jurídica. Além disso, no âmbito da terceira parte do primeiro fundamento, considera que a sanção pecuniária que lhe foi aplicada viola o princípio da proporcionalidade. Por último, e conforme referido nos n.os 98 e 116, supra, no âmbito do segundo fundamento, a recorrente alega que determinados elementos sobre os quais não foi ouvida tiveram influência no montante da sanção que lhe foi aplicada, pelo que o seu direito de ser ouvida foi violado.

120    Mais particularmente, no âmbito da terceira parte do primeiro fundamento, a recorrente contesta não apenas a proporcionalidade do próprio princípio da aplicação de uma sanção, mas igualmente o montante desta. No que diz respeito a este último, alega, nomeadamente, que não representa 0,0015 % do volume de negócios do grupo Crédit Agricole, conforme indicado na decisão impugnada, mas um montante dez vezes superior. Acusa igualmente o BCE de não ter respeitado a metodologia que, nos seus articulados, afirma ter seguido para efeitos da apreciação da gravidade da infração. Além disso, sublinha que o BCE alegou pela primeira vez no Tribunal Geral ter tido em conta a dimensão da instituição de crédito em causa para efeitos da determinação do montante da sanção, apesar de tal fundamento não constar da decisão impugnada. Considera que o BCE se refere erradamente, neste âmbito, a uma apreciação da dimensão das instituições de crédito baseada no montante total dos seus ativos sob gestão, em vez do seu volume de negócios, e alega que, em qualquer caso, este fator não pode ser tido em conta pelo Tribunal Geral, uma vez que não é mencionado na decisão impugnada. Acrescenta que a inexistência deste fator na referida decisão corresponde a uma fundamentação insuficiente, que fere de ilegalidade a decisão impugnada.

121    Antes de mais, importa referir que, para que o Tribunal Geral possa apreciar as críticas da recorrente, é necessário que a decisão impugnada especifique, de forma juridicamente bastante, os fundamentos que levaram à fixação da sanção aplicada à recorrente no montante de 4 300 000 euros, que representa 0,015 % do volume de negócios do grupo a que esta pertence.

122    O Tribunal Geral considera necessário apreciar, a título preliminar, o caráter suficientemente fundamentado da decisão impugnada no que se refere à determinação do montante da sanção aplicada.

123    A este respeito, importa recordar que, no âmbito de um recurso de anulação, um fundamento assente em falta ou insuficiência de fundamentação constitui um fundamento de ordem pública que deve ser conhecido oficiosamente pelo juiz da União e que, por conseguinte, pode ser invocado pelas partes em qualquer fase do processo (Acórdão de 13 de dezembro de 2001, Krupp Thyssen Stainless e Acciai speciali Terni/Comissão, T‑45/98 e T‑47/98, EU:T:2001:288, n.o 125).

124    Além disso, esta obrigação de o juiz da União suscitar oficiosamente um fundamento de ordem pública deve ser exercida à luz do princípio do contraditório (v., neste sentido, Acórdão de 2 de dezembro de 2009, Comissão/Irlanda e o., C‑89/08 P, EU:C:2009:742, n.os 59 e 60). No processo principal, importa assinalar que o BCE, na audiência, teve a oportunidade de se manifestar sobre o caráter suficientemente fundamentado, ou não, da decisão impugnada.

125    Na audiência, o BCE alegou que a decisão impugnada estava suficientemente fundamentada. Em substância, declarou ter aplicado uma metodologia em duas fases para determinar o montante da sanção.

126    No âmbito da primeira fase, é determinado o montante de base da sanção aplicável. O ponto de partida deste montante de base consiste em avaliar a gravidade da infração em causa, observando os efeitos da infração na situação prudencial da instituição de crédito em questão e o comportamento dessa instituição. O BCE sublinha que tal elemento figura na decisão impugnada, uma vez que aí é feita referência ao montante total dos instrumentos que foram objeto de uma classificação errada. De igual modo, a ilicitude do comportamento da instituição de crédito é evidenciada na decisão impugnada, na qual o BCE insistiu no facto de que a recorrente devia ter tido conhecimento das obrigações que lhe eram impostas nos termos do artigo 26.o, n.o 3, do Regulamento n.o 575/2013. Uma vez determinada a gravidade da infração, o BCE incluía na equação o montante total dos ativos sob gestão da instituição de crédito. Assim, o montante de base é calculado tendo em conta, em primeiro lugar, a gravidade da infração e o montante total dos ativos sob gestão.

127    Numa segunda fase, este montante de base é ajustado para ter em conta eventuais circunstâncias atenuantes ou agravantes. No processo principal, a recorrente beneficiou de uma circunstância atenuante.

128    Na audiência, o BCE alegou igualmente que a falta, na decisão impugnada, de explicação da metodologia que permite determinar o montante exato da sanção tinha por objetivo preservar o caráter dissuasivo da referida sanção. Deve evitar‑se que as instituições de crédito possam prever o montante das sanções suscetíveis de ser aplicadas, pois isto poderia reduzir o incentivo ao cumprimento das regulamentações prudenciais. Reconheceu igualmente que a tomada em consideração do montante total dos ativos sob gestão da recorrente não figurava na decisão impugnada, mas considerou que isso não correspondia a uma fundamentação insuficiente, uma vez que se tratava de um elemento puramente objetivo.

129    Importa recordar que, em aplicação de jurisprudência constante, o dever de fundamentação previsto no artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE constitui uma formalidade essencial que deve ser distinguida da questão da procedência da fundamentação, a qual faz parte da legalidade em sede de mérito do ato controvertido. Nesta perspetiva, a fundamentação exigida deve ser adaptada à natureza do ato em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do ato, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adotada e ao órgão jurisdicional competente exercer o seu controlo. Quanto, em particular, à fundamentação das decisões individuais, o dever de fundamentar tais decisões tem assim por finalidade, além de permitir uma fiscalização jurisdicional, fornecer ao interessado indicações suficientes para saber se a decisão enferma eventualmente de um vício que permita contestar a sua validade (v. Acórdão de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, EU:C:2011:620, n.os 146 a 148 e jurisprudência referida; Acórdãos de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.os 114 e 115, e de 13 de dezembro de 2016, Printeos e o./Comissão, T‑95/15, EU:T:2016:722, n.o 44).

130    A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas a quem o ato diga respeito na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE podem ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (Acórdãos de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, EU:C:2011:620, n.o 150; de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 116, e de 13 de dezembro de 2016, Printeos e o./Comissão, T‑95/15, EU:T:2016:722, n.o 45).

131    Resulta igualmente da jurisprudência que a fundamentação deve, em princípio, ser comunicada ao interessado, ao mesmo tempo que a decisão de acusação. Não se pode considerar que a falta de fundamentação foi sanada pelo facto de o interessado tomar conhecimento dos fundamentos da decisão no decurso do processo perante os órgãos jurisdicionais da União (Acórdãos de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, EU:C:2011:620, n.o 149; de 19 de julho de 2012, Alliance One International e Standard Commercial Tobacco/Comissão, C‑628/10 P e C‑14/11 P, EU:C:2012:479, n.o 74, e de 13 de dezembro de 2016, Printeos e o./Comissão, T‑95/15, EU:T:2016:722, n.o 46).

132    No que diz respeito, mais particularmente, à fundamentação das sanções administrativas pecuniárias aplicadas ao abrigo do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2103, em primeiro lugar, importa recordar que o BCE tem o direito aplicar uma sanção administrativa pecuniária cujo montante máximo pode corresponder a 10 % do volume de negócios anual total do grupo a que pertence a pessoa coletiva em causa.

133    Daqui decorre que o BCE dispõe de um amplo poder de apreciação no que diz respeito à determinação do montante da sanção pecuniária. Neste contexto, é jurisprudência constante que o respeito das garantias conferidas pela ordem jurídica da União nos procedimentos administrativos assume uma importância ainda mais fundamental. Entre estas garantias figura, nomeadamente, o direito de o interessado ver fundamentada a decisão em causa de forma juridicamente bastante. Só assim o Tribunal de Justiça e o Tribunal Geral podem verificar se estão reunidos os elementos de facto e de direito de que depende o exercício do poder de apreciação (Acórdãos de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, EU:C:1991:438, n.o 14, e de 6 de novembro de 2008, Países Baixos/Comissão, C‑405/07 P, EU:C:2008:613, n.o 56).

134    Por conseguinte, tendo em conta tanto o amplo poder de apreciação conferido ao BCE pelo artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013 como o nível muito elevado das sanções administrativas pecuniárias aplicadas, o dever de fundamentação das decisões que impõem essa sanção assume especial importância.

135    Em segundo lugar, há que salientar que a fundamentação de uma decisão que aplica uma sanção deve permitir ao Tribunal Geral apreciar se a referida decisão está em conformidade com o direito da União, nomeadamente, com o princípio da proporcionalidade, assim como verificar se o BCE fez uma justa apreciação dos critérios que figuram no artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1024/2013, o qual evidencia, além do caráter proporcionado da sanção, a sua eficácia e o seu caráter dissuasivo.

136    Ora, para que tal fiscalização possa ser efetuada, é necessário que a fundamentação da decisão impugnada deixe transparecer, de forma juridicamente bastante, a metodologia seguida pelo BCE para determinar o montante da sanção (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 2006, Jungbunzlauer/Comissão, T‑43/02, EU:T:2006:270, n.o 91), assim como a ponderação e a avaliação que fez dos elementos tomados em consideração (v., neste sentido, Acórdão de 8 de dezembro de 2011, Chalkor/Comissão, C‑386/10 P, EU:C:2011:815, n.o 61).

137    Por último, em terceiro lugar, decorre da jurisprudência referida no n.o 130, supra, que a apreciação do caráter suficientemente fundamentado de uma decisão deve ser apreciada, nomeadamente, à luz do contexto em que se insere.

138    Assim, considerou‑se que, quando uma decisão do BCE se segue ao parecer da Comissão de Reexame, as explicações que aí figuram podem ser tidas em conta para examinar o caráter suficientemente fundamentado da decisão controvertida (v., neste sentido, Acórdão de 8 de maio de 2019, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, C‑450/17 P, EU:C:2019:372, n.o 92). Além disso, ainda no contexto em que se insere essa decisão, foi declarado, reiteradamente, que uma decisão que se insere na linha de uma prática decisória constante pode ser fundamentada de forma sumária, nomeadamente por uma referência a essa prática (Acórdãos de 14 de fevereiro de 1990, Delacre e o./Comissão, C‑350/88, EU:C:1990:71, n.o 15, e de 8 de novembro de 2001, Silos, C‑228/99, EU:C:2001:599, n.o 28). De igual modo, a publicação pela instituição recorrida da metodologia que entende seguir no momento do exercício do seu poder de decisão é suscetível de flexibilizar o seu dever de fundamentação das suas decisões individuais, desde que aplique a referida metodologia.

139    No entanto, no processo principal, a decisão impugnada não foi adotada no seguimento de um parecer da Comissão de Reexame e não existe nenhuma prática anterior do BCE no que diz respeito à aplicação de uma sanção administrativa pecuniária, em aplicação do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1024/2013. Além disso, o BCE não tornou pública a metodologia que tencionava aplicar para determinar o montante das sanções aplicadas ao abrigo desta disposição.

140    Por conseguinte, o caráter suficientemente fundamentado da decisão impugnada deve ser apreciado apenas com base nos fundamentos que figuram nessa decisão.

141    É à luz destas considerações que importa verificar se o BCE cumpriu, no caso em apreço, o seu dever de fundamentação.

142    O n.o 4.1.2 da decisão impugnada, sob a epígrafe «Montante da sanção», tem a seguinte redação:

«Para determinar a sanção administrativa aplicável, o BCE teve em conta as seguintes circunstâncias:

4.1.2.1. No que diz respeito à gravidade da infração, o BCE tem em conta o facto de a entidade supervisionada ter incluído incorretamente instrumentos de capital nos seus instrumentos de CET 1 num montante total de 2 088 milhões de euros, o que representa 67 pontos de base do rácio de [CET 1] da entidade supervisionada, numa base consolidada, em 30 de junho de 2016. O facto de a maioria dos instrumentos de capital classificados como instrumento de CET 1 de forma incorreta terem sido emitidos na sequência da distribuição de dividendos em ações aos acionistas e serem, assim, idênticos às ações ordinárias que os geravam é igualmente tido em conta na avaliação da gravidade da violação.

4.1.2.2. Além disso, o BCE tem em consideração o facto de a violação ter ocorrido durante cinco períodos de declaração trimestrais consecutivos e de três publicações de informações a título do terceiro pilar em 2015 e 2016.

[4.1.2.3.] No que diz respeito à gravidade do incumprimento cometido pela entidade supervisionada, o BCE considera que, no mínimo, a infração foi cometida por negligência. Em particular, a ilicitude do comportamento censurável é demonstrada pelas circunstâncias descritas na secção 3.3. A entidade supervisionada beneficiou de tempo suficiente para adaptar as suas operações aos requisitos regulamentares do Regulamento (UE) n.o 575/2013 e foi informada pelo BCE (equipa de supervisão prudencial conjunta) da necessidade de obter a autorização prévia do BCE antes de classificar os instrumentos de capital como instrumentos de [CET 1]. No entanto, embora tenha tido conhecimento destes requisitos, a entidade supervisionada continuou a classificar os instrumentos sem dispor da autorização exigida.

4.1.2.4. O BCE tem igualmente em conta, a título de circunstância atenuante, o facto de que, na sequência do pedido da entidade supervisionada, concedeu a autorização de classificação das emissões como instrumentos de CET 1 […]

Por conseguinte, atendendo a todos os elementos acima referidos, incluindo os argumentos invocados pela entidade supervisionada nas suas observações escritas, e tendo em conta o princípio da proporcionalidade que orienta o BCE no exercício dos seus poderes sancionatórios, a sanção administrativa é fixada em 4 300 000 euros, o que representa cerca de 0,0015 % do volume de negócios anual total do exercício de 2017 do grupo supervisionado a que pertence a entidade supervisionada e garante um efeito dissuasivo credível e eficaz para evitar que tal infração seja cometida no futuro.»

143    No n.o 4.2.4 da decisão impugnada, o BCE acrescentou «que a sanção administrativa imposta não ex[cedia] 10 % do volume de negócios anual total do grupo supervisionado a que [a recorrente] pertenc[ia], no exercício anterior à data da decisão [impugnada]».

144    Há que constatar que este excerto da decisão impugnada não fornece precisões quanto à metodologia aplicada pelo BCE para determinar o montante da sanção aplicada, limitando‑se a salientar algumas considerações sobre a gravidade da infração, a sua duração, a gravidade do incumprimento imputado à recorrente e a garantia de que fora tida em conta uma circunstância atenuante.

145    Tal como estão redigidos, os n.os 4.1.2.1 a 4.1.2.4 da decisão impugnada não permitem nem à recorrente compreender a metodologia privilegiada pelo BCE nem ao Tribunal Geral exercer a sua fiscalização da legalidade sobre a sanção aplicada.

146    A circunstância de o BCE ter especificado, na sua contestação, e posteriormente na audiência, a metodologia que aplicou no caso em apreço não é suscetível de sanar essa insuficiência, uma vez que, em aplicação da jurisprudência referida no n.o 131, supra, não podia regularizar uma fundamentação insuficiente através da comunicação dos fundamentos da decisão no decurso do processo no Tribunal Geral. Por outro lado, a recorrente tinha o direito de conhecer o método de cálculo do montante da sanção que lhe foi aplicada, sem estar obrigada, para tal, a recorrer ao Tribunal Geral.

147    Além disso, os n.os 4.1.2.1 a 4.1.2.4 da decisão impugnada não fornecem as informações mínimas que poderiam ter permitido compreender e verificar a relevância e a ponderação dos elementos tomados em consideração pelo BCE na determinação do montante da sanção.

148    Embora, no n.o 4.1.2.1 da decisão impugnada, relativo à gravidade da infração, o BCE sublinhe que os instrumentos de capital classificados sem autorização representavam 67 pontos de base do rácio de CET 1 da recorrente, não fornece qualquer explicação adicional quanto ao grau de gravidade desse incumprimento sob o ângulo do cumprimento das obrigações prudenciais que incumbem à recorrente.

149    No mesmo número da decisão impugnada, o BCE salienta que os instrumentos de capital classificados de forma incorreta foram maioritariamente emitidos na sequência da distribuição de dividendos em ações aos acionistas e sublinha que este é um elemento que foi tido em conta na avaliação da gravidade da violação. No entanto, também a este respeito, não é fornecida qualquer explicação quanto à influência desta constatação na determinação do montante da sanção aplicada à recorrente.

150    Por último, embora, no n.o 4.1.2.4 da decisão impugnada, o BCE assegure que teve em conta, enquanto circunstância atenuante, o facto de ter acabado por autorizar a recorrente a classificar os instrumentos em causa entre os seus instrumentos de CET 1, não é fornecida qualquer indicação quanto à ponderação que atribuiu a este elemento na determinação do montante final da sanção.

151    Por outro lado, importa recordar que o BCE apenas referiu a dimensão do grupo a que a recorrente pertencia, e não a da recorrente, apesar de a infração ter sido unicamente imputada a esta.

152    Há que observar que, ao não referir, na decisão impugnada, a dimensão da instituição de crédito autora da infração em causa, o BCE não referiu um elemento que, segundo as suas próprias declarações perante o Tribunal Geral, era particularmente relevante para a determinação do montante da sanção.

153    Com efeito, a inexistência de referência à dimensão da instituição de crédito em causa impede o Tribunal Geral de exercer a sua fiscalização sobre a apreciação, por parte do BCE, dos critérios de eficácia, de proporcionalidade e de dissuasão que figuram no artigo 18.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1024/2013.

154    Perante o Tribunal Geral, o BCE alegou que tinha tido em conta a dimensão da instituição em causa na determinação do montante da sanção sob a forma do seu montante total de ativos sob gestão. No entanto, em aplicação da jurisprudência referida no n.o 131, supra, e por fundamentos análogos aos referidos no n.o 146, supra, uma explicação fornecida nesta fase não pode ser tida em conta para apreciar o cumprimento, pelo BCE, do dever de fundamentação que lhe incumbe.

155    Por outro lado, a circunstância, salientada pelo BCE na audiência, de que se trata alegadamente de um elemento «objetivo» não o dispensa de especificar este fator na decisão impugnada, quanto mais não seja para explicar de que maneira e segundo que ponderação o mesmo foi tido em conta na determinação do montante da sanção aplicada à instituição de crédito em causa.

156    Decorre do exposto que a sanção aplicada à recorrente está insuficientemente fundamentada e, por conseguinte, deve ser anulada, não havendo necessidade de apreciar as outras alegações invocadas a este respeito.

157    Uma vez que a apreciação do BCE relativa ao montante da sanção administrativa pecuniária é autonomizável do resto da decisão impugnada, esta apenas deve ser anulada na parte em que aplica à recorrente uma sanção administrativa pecuniária no montante de 4 300 000 euros.

 Quanto às despesas

158    Nos termos do artigo 134.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas.

159    No presente processo, a recorrente foi parcialmente vencida e obteve vencimento parcial, uma vez que a decisão impugnada é anulada apenas na parte em que lhe aplica uma sanção administrativa pecuniária no montante de 4 300 000 euros. Neste contexto, proceder‑se‑á a uma justa apreciação das circunstâncias da causa decidindo que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Segunda Secção alargada)

decide:

1)      A Decisão ECB/SSM/2018FRCAG75 do Banco Central Europeu (BCE), de 16 de julho de 2018, é anulada, na parte em que aplica à Crédit agricole SA uma sanção administrativa pecuniária no montante de 4 300 000 euros.

2)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      A Crédit agricole é condenada a suportar as suas próprias despesas.

4)      O BCE é condenado a suportar as suas próprias despesas.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 8 de julho de 2020.

Secretário

 

Presidente


Índice



*      Língua do processo: francês.