ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)
30 Março 2000 (1)
«Recurso de decisão do Tribunal de Primeira Instância - Concorrência -
Decisão de rejeição de uma denúncia - Compatibilidade com o artigo 2.° do
Regulamento n.° 26 de uma taxa cobrada a fornecedores externos sobre
produtos de floricultura entregues a grossistas instalados no recinto de uma
associação cooperativa de venda em leilão - Fundamentação»
No processo C-265/97 P,
Coöperatieve Vereniging De Verenigde Bloemenveilingen Aalsmeer BA (VBA), com
sede em Aalsmeer (Países Baixos), representada por G. van der Wal, advogado no
foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do
advogado A. May, 398, route d'Esch,
que tem por objecto um recurso de anulação do acórdão proferido pelo Tribunal
de Primeira Instância das Comunidades Europeias (Segunda Secção Alargada) em
14 de Maio de 1997, Florimex e VGB/Comissão (T-70/92 e T-71/92, Colect.,
p. II-693),
sendo ainda partes no processo:
Florimex BV e Vereniging van Groothandelaren in Bloemkwekerijproducten (VGB),
com sede em Aalsmeer (Países Baixos), representadas por J. A. M. P. Keijser,advogado no foro de Nimègue, com domicílio escolhido no Luxemburgo no
escritório do advogado A. Kronshagen, 22, rue Marie-Adélaïde,
recorrentes em primeira instância,
e
Comissão das Comunidades Europeias, representada por B. J. Drijber, membro
do Serviço Jurídico, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no
Luxemburgo no gabinete de C. Gómez de la Cruz, membro do mesmo serviço,
Centre Wagner, Kirchberg,
recorrida em primeira instância,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),
composto por: J. C. Moitinho de Almeida, presidente da Sexta Secção, exercendo
funções de presidente da Quinta Secção, L. Sevón, J.-P. Puissochet, P. Jann
(relator) e M. Wathelet, juízes,
advogado-geral: A. Saggio,
secretário: L. Hewlett, administradora,
visto o relatório para audiência,
ouvidas as alegações das partes na audiência de 17 de Dezembro de 1998, em que
a Coöperatieve Vereniging De Verenigde Bloemenveilingen Aalsmeer BA (VBA)
foi representada por G. van der Wal, a Florimex BV e a Vereniging van
Groothandelaren in Bloemkwekerijproducten (VGB) por J. A. M. P. Keijser e a
Comissão por W. Wils, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agente,
ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 8 de Julho
de 1999,
profere o presente
Acórdão
- 1.
- Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 19 de Julho
de 1997, a Coöperatieve Vereniging De Verenigde Bloemenveilingen Aalsmeer BA
(a seguir «VBA») interpôs, nos termos do artigo 49.° do Estatuto CE do Tribunal
de Justiça, recurso de anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de
14 de Maio de 1997, Florimex e VGB/Comissão (T-70/92 e T-71/92, Colect.,
p. II-693, a seguir «acórdão recorrido»), pelo qual este anulou a decisão da
Comissão (IV/32.751 - Florimex/Aalsmeer II e IV/32.990 - VGB/Aalsmeer, a seguir
«decisão controvertida»), contida num ofício de 2 de Julho de 1992, que indeferiu
as denúncias apresentadas pela Florimex BV (a seguir «Florimex») e pela
Vereniging van Groothandelaren in Bloemkwekerijproducten (a seguir «VGB»)
relativas à taxa de utilização das instalações da VBA que esta aplica às entregas
de produtos efectuadas por fornecedores que não são seus associados.
Factos submetidos ao Tribunal de Primeira Instância
- 2.
- Do acórdão recorrido resulta que a VBA é uma associação cooperativa de direito
neerlandês que agrupa cultivadores de flores e de plantas ornamentais. Representa
mais de 3 000 empresas, a maioria das quais é neerlandesa e uma pequena minoria
belga (n.° 1).
- 3.
- A VBA organiza, no seu recinto em Aalsmeer (Países Baixos), vendas em leilão de
produtos da floricultura. Estes produtos estão sujeitos ao disposto no
Regulamento (CEE) n.° 234/68 do Conselho, de 27 de Fevereiro de 1968, que
estabelece uma organização comum de mercado no sector das plantas vivas e dos
produtos de floricultura (JO L 55, p. 1; EE 03 F2 p. 94) (n.° 2).
- 4.
- As instalações da VBA em Aalsmeer servem, em primeiro lugar, para as próprias
vendas em leilão, mas uma parte do recinto está reservada ao arrendamento de
«instalações comerciais» destinadas ao exercício do comércio grossista de produtos
da floricultura, nomeadamente à selecção e embalagem desses produtos. Os
arrendatários são sobretudo grossistas de flores cortadas (n.° 4).
- 5.
- A Florimex é uma empresa de comércio de flores estabelecida em Aalsmeer, perto
do complexo da VBA. Importa produtos da floricultura provenientes dos
Estados-Membros da Comunidade Europeia e de países terceiros, para revenda
essencialmente a grossistas estabelecidos nos Países Baixos (n.° 5).
- 6.
- A VGB é uma associação que agrupa numerosos grossistas neerlandeses de
produtos da floricultura, entre os quais a Florimex, bem como grossistas
estabelecidos no recinto da VBA (n.° 6).
- 7.
- O artigo 17.° dos estatutos da VBA impõe aos seus membros que vendam por seu
intermédio todos os produtos destinados ao consumo cultivados nas suas
explorações. É facturada aos membros uma taxa ou comissão («taxa de leilão»)pelos serviços fornecidos pela VBA. Em 1991, essa taxa era de 5,7% do produto
da venda (n.° 7).
- 8.
- Até 1 de Maio de 1988, a regulamentação dos leilões da VBA continha, no seu
artigo 5.°, n.os 10 e 11, disposições susceptíveis de impedir a utilização das suas
instalações para entregas, compras e vendas de produtos da floricultura que não
passassem pelos seus próprios leilões (n.° 8).
- 9.
- Na prática, a autorização pela VBA de operações comerciais no seu recinto
incidentes sobre esses produtos que só era concedida no quadro de determinados
contratos-tipo denominados «handelsovereenkomsten» (contratos comerciais) ou
mediante o pagamento de uma taxa de 10% (n.° 9).
- 10.
- Através desses contratos comerciais, a VBA concedia a certos distribuidores a
possibilidade de venderem e entregarem a compradores por ela acreditados
determinados produtos da floricultura adquiridos noutros leilões neerlandeses ou
de venderem flores cortadas de origem estrangeira, mediante o pagamento de uma
taxa (n.os 10 e 11).
- 11.
- Na sequência de uma denúncia da Florimex, a Comissão adoptou, em 26 de Julho
de 1988, a Decisão 88/491/CEE relativa a um processo de aplicação do artigo 85.°
do Tratado CEE (IV/31.379 - Bloemenveilingen Aalsmeer) (JO L 262, p. 27).
- 12.
- No dispositivo desta decisão, a Comissão declarou, designadamente, que os acordos
concluídos pela VBA, por força dos quais os distribuidores estabelecidos nas suas
instalações e os respectivos fornecedores eram obrigados, no que respeita aos
produtos da floricultura que não tivessem sido comprados por intermédio da VBA,
a só negociar ou mandar fornecer esses produtos nas suas instalações com a sua
autorização e nas condições por si fixadas e de só armazenar esses produtos nas
instalações da VBA contra pagamento de uma taxa por si fixada, constituíam
infracções ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado CE (actual artigo 81.°, n.° 1, CE).
- 13.
- Apurou, por outro lado, que as taxas destinadas a prevenir a utilização abusiva das
instalações da VBA, que esta impôs aos distribuidores estabelecidos nas suas
instalações, bem como os contratos comerciais concluídos entre a VBA e esses
distribuidores constituíam igualmente, tal como foram notificados à Comissão,
infracções desse tipo (n.° 18).
- 14.
- A partir de 1 de Maio de 1988, a VBA suprimiu formalmente as obrigações de
compra e as restrições à livre disposição da mercadoria decorrentes da sua
regulamentação dos leilões, bem como os regimes das taxas contestadas, impondo
porém uma «taxa de utilização» («facilitaire heffing»). A VBA instituiu igualmente
versões alteradas dos contratos comerciais (n.° 19).
- 15.
- Na versão que vigorava à data dos factos do litígio, o artigo 4.°, n.° 15, da
regulamentação dos leilões dispunha que a entrega de produtos no recinto do leilãopodia ser sujeita a uma taxa de utilização. Ao abrigo dessa disposição, a VBA
adoptou, para vigorar a partir de 1 de Maio de 1988, um regime de taxas de
utilização que foi posteriormente alterado. Este regime era aplicável ao
abastecimento directo dos distribuidores estabelecidos no recinto da VBA,
entendendo-se que as mercadorias em causa eram escoadas sem recurso aos
serviços da VBA (n.° 20).
- 16.
- O regime, tal como vigorava em 1991, comportava os seguintes elementos:
a) A taxa é devida pelo fornecedor, ou seja, pela própria pessoa que introduz
os produtos no recinto do leilão ou pela empresa que lhe conferiu mandato
para esse efeito. A entrega é controlada à entrada do recinto. O fornecedor
é obrigado a indicar a quantidade e a natureza das mercadorias entradas,
mas não o seu destino.
b) A taxa, sujeita a revisão anual, é cobrada com base no número de pés de
flores (flores cortadas) ou de plantas fornecidas e fixada em montantes que
variam em função das diferentes categorias de produtos.
c) é fixada pela VBA com base nos preços anuais médios obtidos no ano
anterior para as categorias em causa. Segundo a VBA, é aplicada uma
percentagem de cerca de 4,3% do preço anual médio da categoria em
causa.
d) Nos termos das «modalidades relativas à taxa de utilização» instituídas pela
VBA a partir de Fevereiro de 1990, os fornecedores podem pagar uma taxa
de 5% em vez de se sujeitarem ao regime descrito nas alíneas.
e) Um arrendatário de instalações comerciais que introduza mercadorias no
recinto da VBA fica isento da taxa de utilização se tiver comprado esses
produtos noutro leilão de flores da Comunidade ou se os tiver importado
por sua própria conta para os Países Baixos, desde que não os revenda a
distribuidores no recinto do leilão (n.° 21).
- 17.
- Por circular de 29 de Abril de 1988, a VBA suprimiu, a partir de 1 de Maio de
1988, as restrições previstas até então nos contratos comerciais. Existem desde
então três tipos de contratos comerciais. Todos estes contratos aplicam uma taxa
de 3% do valor bruto das mercadorias fornecidas aos clientes no recinto da VBA.
Segundo esta última, trata-se em grande parte de produtos que não são
suficientemente cultivados nos Países Baixos.
- 18.
- Por cartas de 18 de Maio, 11 de Outubro e 29 de Novembro de 1988, a Florimex
apresentou formalmente à Comissão uma denúncia contra a taxa de utilização. A
VGB apresentou uma denúncia semelhante por carta de 15 de Novembro de 1988
(n.os 29 e 30).
- 19.
- No termo do procedimento administrativo, por carta de 4 de Março de 1991 (a
seguir «carta nos termos do artigo 6.°»), a Comissão comunicou às denunciantes,
nos termos do artigo 6.° do Regulamento n.° 99/63/CEE da Comissão, de 25 de
Julho de 1963, relativo às audições previstas nos n.os 1 e 2 do artigo 19.° do
Regulamento n.° 17 do Conselho (JO 1963, L 127, p. 2268; EE 08 F1 p. 62), que
os elementos recolhidos não lhe permitiam dar seguimento favorável às denúncias
respeitantes à taxa de utilização pedida pela VBA (n.° 37).
- 20.
- As considerações de facto e de direito que levaram a Comissão a esta conclusão
foram expostas em detalhe num documento anexo à carta nos termos do artigo 6.°
A Comissão enviou também esse documento à VBA, em 4 de Março de 1991,
esclarecendo que se tratava do anteprojecto de uma decisão que tencionava
adoptar ao abrigo do disposto no artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, doRegulamento n.° 26 do Conselho, de 4 de Abril de 1962, relativo à aplicação de
determinadas regras de concorrência à produção e ao comércio de produtos
agrícolas (JO 1962, 30, p. 993; EE 08 F1 p. 29) (n.° 38).
- 21.
- Na parte «apreciação jurídica» desse documento, a Comissão começou por
declarar que as disposições relativas ao abastecimento para as vendas em leilão e
as regras relativas ao abastecimento directo dos distribuidores estabelecidos no
recinto da VBA fazem parte de um conjunto de decisões e de acordos relativos à
oferta de produtos da floricultura no recinto da VBA, que caem sob a alçada do
artigo 85.°, n.° 1, do Tratado. Em segundo lugar, concluiu que essas decisões e
acordos eram necessários à realização dos objectivos enunciados no artigo 39.° do
Tratado CE (actual artigo 33.° CE), na acepção do artigo 2.°, n.° 1, primeiro
período, do Regulamento n.° 26 (n.° 39).
- 22.
- Antes do mais, quanto à aplicação do artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do
Regulamento n.° 26 no que respeita ao abastecimento directo dos distribuidores
estabelecidos no recinto da VBA, a Comissão considerou, no ponto II, n.° 2, alínea
b), do referido documento:
«As taxas de utilização constituem um elemento essencial do sistema de
distribuição da VBA, sem o qual a sua capacidade concorrencial, e, portanto, a sua
sobrevivência, ficariam comprometidas. Em consequência, também são necessárias
à realização dos objectivos enunciados no artigo 39.°
Se a VBA, que é especializada na exportação, pretende ter condições para realizar
o seu objectivo enquanto empresa, ou, dito de outro modo, se pretende
desenvolver-se e manter-se como fonte importante de abastecimento para o
comércio internacional de flores, é necessário, tendo em consideração a natureza
perecível e frágil dos produtos negociados ('produtos da floricultura), que os
distribuidores para exportação estejam geograficamente próximos dela. A
concentração geográfica da procura no seu recinto, prosseguida pela VBA no seu
próprio interesse, não é apenas consequência do facto de uma gama completa de
produtos estar aí disponível, mas também e sobretudo do facto de essesdistribuidores poderem também dispor aí de serviços e instalações que favorecem
o exercício do seu comércio.
A concentração geográfica da oferta e da procura no recinto da VBA constitui uma
vantagem económica que é resultado de esforços importantes, materiais e
imateriais, realizados pela VBA.
Se os distribuidores pudessem beneficiar gratuitamente dessa vantagem, a
sobrevivência da VBA ficaria comprometida, porque a discriminação de tratamento
que daí resultaria para os fornecedores ligados à VBA impediria a amortização das
inevitáveis despesas da VBA e a cobertura dos encargos correntes de exploração»
(n.° 41).
- 23.
- A seguir, quanto à questão de saber se, com a taxa de utilização, a VBA obtinha
uma vantagem injustificada que tinha como efeito restringir a concorrência, a
Comissão considerou, no ponto II, n.° 2, alínea b), quinto e sexto parágrafos, do
mesmo documento, que não era necessário calcular os montantes das taxas com
precisão matemática baseando-se numa repartição dos diferentes custos que tivesse
em conta a economia interna da empresa, mas que bastava comparar o montante
das taxas facturadas aos fornecedores respectivos. A Comissão concluiu, no ponto
II, n.° 2, alínea b), sétimo parágrafo:
«Resulta da comparação entre as taxas de leilão e as taxas de utilização que é
garantida uma ampla igualdade de tratamento entre os fornecedores. É certo que
uma parte, que não é possível determinar com precisão, das taxas de leilão é
constituída pela compensação que deve ser paga pelo serviço fornecido pelo leilão,
mas, admitindo que neste contexto seja possível uma comparação com as taxas de
utilização quanto ao montante, esse serviço tem como contrapartida obrigações de
abastecimento. Os distribuidores que celebraram contratos comerciais com a VBA
assumem igualmente essas obrigações de abastecimento. Em consequência, as
regras relativas às taxas de utilização não implicam efeitos incompatíveis com o
mercado comum» (n.° 42).
- 24.
- Por último, no ponto II, n.° 2, alínea b), sexto parágrafo, a Comissão considerou
que o efeito da taxa de utilização é semelhante ao do preço mínimo de venda em
leilão. Segundo o que afirma: «Quanto mais reduzido for o preço efectivamente
obtido, maior é o encargo. Isto tem como consequência desincentivar o
abastecimento em períodos de excesso de oferta, o que é seguramente desejável»
(n.° 43).
- 25.
- Por carta de 17 de Abril de 1991, a Florimex e a VGB responderam à carta nos
termos do artigo 6.° mantendo as suas denúncias quanto à taxa de utilização.
(n.° 44).
- 26.
- Em 2 de Julho de 1992, a Comissão enviou ao advogado das recorrentes uma carta
registada com aviso de recepção, na qual precisa que a fundamentação dela
constante constitui um complemento e uma explicitação da constante da sua carta
nos termos do artigo 6.°, para a qual remete. A Comissão prossegue nos seguintes
termos:
«Os elementos em que se baseia a apreciação efectuada pela Comissão, no quadro
do direito da concorrência, são constituídos pelo conjunto das decisões e acordos
relativos à oferta de produtos da floricultura no recinto da VBA. As regras relativas
ao abastecimento directo dos comerciantes estabelecidos nesse recinto são apenas
uma parte desse conjunto. Para a Comissão, o conjunto das decisões e acordos em
causa é, em princípio, necessário para a realização dos objectivos enunciados no
artigo 39.° do Tratado CEE. O facto de, até ao presente, a Comissão não o ter
ainda declarado através de uma decisão formal nos termos do artigo 2.° do
Regulamento n.° 26/62 não afecta a atitude positiva adoptada pela Comissão a esse
respeito» (n.os 45 e 46).
- 27.
- Em 21 de Setembro de 1992, a Florimex e a VGB interpuseram respectivamente
os recursos T-70/92 e T-71/92 contra a decisão controvertida (n.° 52).
- 28.
- Em memorando que deu entrada no Tribunal em 16 de Outubro de 1992 em cada
um destes processos, a Comissão suscitou uma questão prévia de admissibilidade,
nos termos do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de
Primeira Instância (n.° 53).
- 29.
- Por despacho do Tribunal de Primeira Instância (Primeira Secção) de 6 de Julho
de 1993, a decisão sobre a questão prévia da admissibilidade foi reservada para
final (n.° 55).
- 30.
- Por despacho do presidente da Primeira Secção do Tribunal de Primeira Instância
de 13 de Julho de 1993, a VBA foi admitida como interveniente nos processos
apensos T-70/92 e T-71/92 (n.° 56).
O acórdão recorrido
- 31.
- Através do acórdão recorrido, o Tribunal de Primeira Instância acolheu o recurso
e anulou a decisão controvertida.
- 32.
- A título preliminar, observou, no n.° 137 do acórdão recorrido, que no documento
anexo à carta nos termos do artigo 6.°, que é parte integrante da fundamentação
da decisão controvertida, a Comissão afirmou que a taxa de utilização não cabe no
âmbito de aplicação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado pelo simples motivo de que
constitui «um elemento essencial do sistema de distribuição da VBA», que,
segundo a recorrida, era «necessário à realização dos objectivos enunciados no
artigo 39.° do Tratado», na acepção do primeiro período do artigo 2.°, n.° 1,
primeiro período, do Regulamento n.° 26.
- 33.
- Por este motivo, o Tribunal considerou, no n.° 138, não ter que se pronunciar sobre
os argumentos aduzidos pela interveniente na audiência, relativos à não aplicação
do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado ou à eventual aplicação do artigo 2.°, n.° 1, segundo
período, do Regulamento n.° 26, mas apenas sobre a legalidade da conclusão a que
chegou a Comissão na decisão controvertida, de que a taxa de utilização se
enquadrava no disposto no primeiro período do artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento
n.° 26.
- 34.
- Ao examinar os fundamentos extraídos da inaplicabilidade do artigo 2.°, n.° 1,
primeiro período, do Regulamento n.° 26 e da falta de fundamentação a esse
respeito, o Tribunal de Primeira Instância examinou, em especial, a fundamentação
da decisão controvertida e teceu algumas considerações preliminares.
- 35.
- Observou, designadamente, no n.° 146, que o processo que lhe foi submetido dizia
respeito à regulamentação de uma cooperativa agrícola que impunha uma taxa
sobre as transacções entre duas categorias de terceiros, isto é, por um lado, os
grossistas independentes estabelecidos no recinto da VBA, e, por outro, os
fornecedores interessados em fornecer a esses compradores quer produtos de
outros produtores agrícolas comunitários, quer produtos provenientes de países
terceiros em livre prática na Comunidade. No entender do Tribunal de Primeira
Instância, essa taxa extravasava das relações internas entre os membros da
cooperativa e constituía, pela sua natureza, um entrave ao comércio entre os
grossistas independentes e os floricultores que não eram membros da cooperativa
em questão.
- 36.
- No n.° 147, o Tribunal de Primeira Instância sublinhou que a Comissão nunca até
então considerara que um acordo entre os membros de uma cooperativa, que
afectava o livre acesso dos não membros aos canais de distribuição dos produtores
agrícolas, fosse necessário à realização dos objectivos enunciados no artigo 39.° do
Tratado.
- 37.
- O Tribunal de Primeira Instância acrescentou, nos n.os 148 a 150 do acórdão
recorrido, antes do mais, que, na sua prática decisória anterior, a Comissão tinha
concluído, regra geral, que os acordos que não se contavam entre os meios
previstos pelo regulamento constitutivo da organização comum para a realização
dos objectivos a que se refere o artigo 39.° não eram necessários, na acepção do
artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26, em seguida, que a
organização comum de mercado no sector das plantas vivas e dos produtos da
floricultura estabelecida pelo Regulamento n.° 234/68 não previa a possibilidade de
as cooperativas agrícolas imporem tal taxa a terceiros e, por último, que a
Comissão confirmara não ter conhecimento da existência de uma taxa análoga à
taxa de utilização noutros sectores agrícolas. O Tribunal de Primeira Instância
entendeu, portanto, no n.° 151, que cumpria à Comissão desenvolver o seu
raciocínio de modo particularmente explícito, dado que a sua decisão ia
sensivelmente mais longe do que as decisões anteriores. A este propósito, referiu-seao acórdão de 26 de Novembro de 1975, Groupement des fabricants de papiers
peints de Belgique e o./Comissão (73/74, Colect., p. 503, n.os 31 a 33).
- 38.
- No n.° 152, o Tribunal de Primeira Instância considerou, além disso, referindo-se
ao acórdão de 12 de Dezembro de 1995, Oude Luttikhuis e o., (C-399/93,
Colect., p. I-4515,, n.os 23 a 28), que a obrigação de fundamentação era tanto mais
exigente quanto, tratando-se de uma derrogação à regra de aplicação geral do
artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, o artigo 2.° do Regulamento n.° 26 deve ser
interpretado restritivamente.
- 39.
- Ainda a título preliminar, o Tribunal de Primeira Instância sublinhou, no n.° 153,
que o artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26, só se aplicava se
o acordo entre os membros de uma cooperativa favorecesse a realização de todos
os objectivos do artigo 39.° A este propósito citou os acórdãos de 15 de Maio de
1975, Frubo/Comissão (71/74, Recueil, p. 563, Colect., p. 205, n.os 22 a 27) e Oude
Luttikhuis e o., já referido, n.° 25. De igual forma, a fundamentação da Comissão
devia revelar de que modo o referido acordo satisfazia cada um dos objectivos do
artigo 39.° ou, pelo menos, revelar a forma como a Comissão pôde conciliar essesobjectivos, por vezes divergentes, por forma a permitir a aplicação do artigo 2.°,
n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26.
- 40.
- Foi à luz destas considerações que o Tribunal de Primeira Instância examinou a
fundamentação da decisão controvertida relativa ao que considera serem os três
argumentos principais avançados para justificar a taxa de utilização à luz do artigo
2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26, isto é: a necessidade de
assegurar a sobrevivência da VBA; a existência de uma contrapartida à imposição
da taxa de utilização; e o efeito análogo ao de um preço mínimo de venda em
leilão que a taxa de utilização teria.
- 41.
- Relativamente à necessidade de assegurar a sobrevivência da VBA, o Tribunal de
Primeira Instância admitiu em primeiro lugar, no n.° 156, que a forma jurídica de
cooperativa adoptada pela VBA correspondia, em princípio, aos objectivos
enunciados no artigo 39.° do Tratado. Ao mesmo tempo que dúvida da realidade
do risco relativo à sobrevivência da VBA caso não existisse taxa de utilização, o
Tribunal de Primeira Instância aceitou, no n.° 159, a hipótese de que tal
inexistência poderia levar alguns membros actuais da VBA a abandona-la e que
essa hipótese implicaria o risco de ser posta em causa a própria viabilidade do
sistema da VBA.
- 42.
- O Tribunal de Primeira Instância considerou, no entanto, que daqui não resulta
automaticamente que a taxa de utilização ou um sistema de venda em leilão que
precise dessa taxa satisfaça todas as condições do artigo 39.° do Tratado. Sublinhou
designadamente, no n.° 161, que essa taxa era susceptível de ter efeitos negativos
para outros produtores agrícolas comunitários que não eram membros da VBA,
mas cujos interesses eram igualmente contemplados pelo artigo 39.° do Tratado.
- 43.
- Em especial, Tribunal de Primeira Instância considerou, no n.° 162, que uma taxa
cobrada por uma cooperativa agrícola sobre os fornecimentos dos produtores não
membros aos compradores independentes tinha normalmente como efeito um
aumento dos preços dessas transacções e constituía, no mínimo, um obstáculo
importante à liberdade dos outros produtores agrícolas de venderem através dos
canais de distribuição em questão.
- 44.
- No n.° 163, o Tribunal de Primeira Instância concluiu que, mesmo que o sistema
da VBA correspondesse a determinados objectivos do artigo 39.° do Tratado, a
taxa de utilização era susceptível de ir, em certos aspectos, contra esses objectivos,
como os mencionados, nomeadamente, no artigo 39.°, n.° 1, alíneas b), d) e e),
entravando o aumento do rendimento individual dos produtores não membros da
VBA, obstando à segurança dos abastecimentos por esses outros produtores e
impedindo a evolução favorável dos preços do ponto de vista dos consumidores.
- 45.
- Por outro lado, o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.° 164, que, se para
certos produtores as vendas directas aos compradores estabelecidos no seu recinto
eram menos dispendiosas ou mais eficazes que o sistema actual da VBA, a taxa de
utilização, enquanto meio essencial para dissuadir os seus membros, sobretudo os
mais importantes, de abandonar a VBA, podia ter efeitos negativos no
desenvolvimento racional da agricultura, no aumento do rendimento individual dos
produtores agrícolas e nos preços de fornecimento aos consumidores,
contrariamente aos objectivos enunciados no artigo 39.°, n.° 1, alíneas a), b) e e),
respectivamente. Segundo o Tribunal de Primeira Instância, tal disposição teria por
efeito restringir exageradamente a liberdade de um membro de uma cooperativa
agrícola de a abandonar e seria dificilmente compatível com os objectivos
enunciados no artigo 39.° do Tratado.
- 46.
- Após ter assim concluído que a Comissão estava confrontada com uma situação
complexa, em que se opunham os interesses divergentes dos pequenos e dos
grandes produtores membros da VBA, dos outros produtores agrícolas
comunitários e dos intermediários envolvidos, o Tribunal de Primeira Instância
entendeu, no n.° 165, que, nessas circunstâncias, a fundamentação da Comissão não
se podia limitar à consideração de que a sobrevivência da VBA, na sua forma
actual, ficaria ameaçada sem a taxa de utilização. Essa fundamentação devia, no
entender do Tribunal de Primeira Instância, igualmente ter tido em conta os efeitos
da taxa de utilização para os outros produtores comunitários, bem como o interesse
comunitário na manutenção de uma concorrência não falseada.
- 47.
- Nos n.os 166 a 168, o Tribunal de Primeira Instância concluiu pela falta de tal
fundamentação bem como de uma fundamentação explícita, por um lado, quanto
à questão de saber de que modo é que a taxa de utilização, ou um sistema de
vendas em leilão que não pode sobreviver sem essa taxa, satisfazem cada um dos
diferentes objectivos enunciados no artigo 39.°, n.° 1, alíneas a) a e), do Tratado e,
por outro, quanto à questão de saber como é que a Comissão conciliou essesdiferentes objectivos para poder considerar a taxa de utilização «necessária» à sua
realização, na acepção do artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento
n.° 26.
- 48.
- Quanto à questão de saber se a taxa de utilização se justificava através de uma
contrapartida real e proporcional, o Tribunal de Primeira Instância considerou, no
n.° 170, que, no quadro do artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento
n.° 26, o interesse comunitário em assegurar a sobrevivência da VBA só pode ser
conciliado com o interesse comunitário, igualmente legítimo, de garantir o acesso
dos outros produtores agrícolas aos canais de distribuição se a taxa de utilização
for cobrada de modo proporcionado, como contrapartida de um serviço ou outro
benefício cujo valor possa legitimar o seu montante.
- 49.
- Com efeito, no n.° 171, o Tribunal de Primeira Instância considerou que, se a taxa
de utilização não fosse justificada por essa contrapartida real, ou se o seu montante
excedesse o valor da contrapartida assim concedida, alguns produtores agrícolas
seriam prejudicados em benefício dos membros existentes da VBA, o que
constituiria uma restrição dissimulada da concorrência, destituída de justificação
objectiva suficiente. Dado que o artigo 2.°, n.° 1, primeiro período do Regulamento
n.° 26, deve ser interpretado restritivamente, o Tribunal de Primeira Instância
considerou que uma taxa com esses efeitos não podia ser considerada «necessária»
à realização dos objectivos do artigo 39.° do Tratado, na acepção dessa disposição.
- 50.
- Nos n.os 172 a 175, o Tribunal de Primeira Instância precisou que a concentração
da oferta e da procura no recinto da VBA era o único benefício invocado como
contrapartida da taxa de utilização cobrada.
- 51.
- Daqui o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.° 178, que a fundamentação
da decisão controvertida devia permitir às partes e, se for caso disso, ao Tribunal
verificar que a taxa em questão não excedia uma remuneração adequada desse
benefício económico.
- 52.
- A este respeito, o Tribunal de Primeira Instância verificou, no n.° 179, que o
benefício económico representado pela concentração da procura só estava descrito
na decisão controvertida em termos gerais, sem se precisar como é que o valor
desse benefício e o montante da taxa de utilização dele resultante podiam ser
calculados e quantificados concretamente.
- 53.
- O Tribunal de Primeira Instância afastou, nos n.os 180 e 181, a justificação extraída
do facto de que a taxa de utilização correspondia aproximadamente à taxa de
leilão, o que estabelecia uma igualdade de tratamento entre os fornecedores
envolvidos, na medida em que os que vendiam em leilão, embora beneficiassem de
todos os serviços da VBA, também assumiam perante esta uma obrigação de
abastecimento que os outros fornecedores não assumiam.
- 54.
- Como, na decisão controvertida, não foram quantificados os diversos custos
decorrentes da utilização, pelos diferentes fornecedores, dos variados serviços e
facilidades oferecidos pela VBA, o Tribunal de Primeira Instância considerou que
não estava em condições de verificar se a taxa de utilização excedia a remuneração
adequada desse benefício e se o montante previsto era necessário para a realização
dos objectivos do artigo 39.° do Tratado.
- 55.
- Quanto à fundamentação da decisão controvertida segundo a qual o efeito da taxa
de utilização era análogo ao de um preço mínimo de venda em leilão, o Tribunal
de Primeira Instância sublinhou, no n.° 185, que essa consideração não constituia
fundamento suficiente para se concluir que a taxa de utilização era necessária para
a realização dos objectivos do artigo 39.°, na acepção do artigo 2.°, n.° 1, primeiro
período, do Regulamento n.° 26.
- 56.
- Com efeito, o Tribunal de Primeira Instância apurou, no n.° 186, a inexistência de
fundamentação para explicar a justeza do ponto de vista segundo o qual a
protecção dos preços mínimos de uma cooperativa agrícola organizada com base
na venda em leilões é mais importante do que o interesse de outros produtores
agrícolas, não membros da cooperativa, em venderem os seus produtos livremente
aos distribuidores independentes. Segundo o Tribunal de Primeira Instância, a
decisão controvertida também não contém qualquer fundamentação para
demonstrar que todos os objectivos do artigo 39.° do Tratado foram atingidos desse
modo.
- 57.
- De tudo quanto precede, o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.° 187, que
o fundamento baseado em fundamentação insuficiente da decisão quanto à
aplicação do artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26, deve ser
julgado procedente.
- 58.
- O Tribunal de Primeira Instância também acolheu o fundamento baseado em
desigualdade de tratamento entre os terceiros fornecedores e os titulares dos
contratos comerciais quanto aos montantes respectivos da taxa de utilização e da
taxa prevista nesses contratos comerciais.
- 59.
- A este propósito, o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.° 192, que os
contratos comerciais não previam obrigações específicas de fornecimento para o
comerciante, que justificassem a aplicação de uma taxa inferior à taxa de utilização.
Com efeito, a única «obrigação» consistia no facto de que, se o titular de um
contrato comercial não vendesse os produtos objecto do contrato de modo
satisfatório para a VBA, o contrato, que tinha a duração de um ano, pura e
simplesmente não era prorrogado.
- 60.
- Daqui o Tribunal de Primeira Instância concluiu, no n.° 194, que a decisão
controvertida não continha fundamentação suficiente que lhe permitisse verificara correcção da afirmação da Comissão de que a diferença de tratamento entre os
dois grupos de fornecedores em causa se justificava objectivamente.
- 61.
- Nestas condições, o Tribunal de Primeira Instância anulou a decisão controvertida
sem ter necessidade de analisar os outros fundamentos aduzidos pela Florimex e
pela VGB.
Quanto ao pedido de apresentação de observações escritas na sequência das
conclusões do advogado-geral
- 62.
- Por carta de 2 de Dezembro de 1999 dirigida à Secretaria do Tribunal de Justiça,
a VBA pediu autorização para apresentar observações na sequência das conclusões
apresentadas em 8 de Julho pelo advogado-geral, que apenas lhe tinham sido
entregues alguns dias antes. Invoca, a este respeito, a jurisprudência do Tribunal
Europeu dos Direitos do Homem relativa ao alcance do artigo 6.°, n.° 1, da
Convenção para Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades
Fundamentais, em especial o acórdão Vermeulen/Bélgica de 20 de Fevereiro de
1996, Colectânea dos acórdãos e decisões, 1996 I, p. 224.
- 63.
- Pelas razões expostas pelo Tribunal de Justiça no despacho de 4 de Fevereiro de
2000, Emesa Sugar (C-17/98, ainda não publicado na Colectânea), há que indeferir
este pedido.
Quanto ao presente recurso
- 64.
- Em apoio do seu recurso, a VBA suscita oito fundamentos.
- 65.
- Os primeiro, quarto, quinto e sexto fundamentos respeitam tanto à intensidade do
controlo que o Tribunal de Primeira Instância efectuou da decisão controvertida
da Comissão quanto à exactidão da sua apreciação. Os segundo e terceiro
fundamentos referem-se à delimitação, pelo Tribunal de Primeira Instância, do
objecto do litígio. Os sétimo e oitavo fundamentos respeitam a outras críticas
precisas que o Tribunal de Primeira Instância formulou a propósito da decisão
controvertida.
Quanto aos primeiro, quarto, quinto e sexto fundamentos
- 66.
- Através do primeiro fundamento, a VBA alega que o Tribunal de Primeira
Instância cometeu um erro de direito ao estabelecer exigências demasiado severas
em matéria de fundamentação da decisão controvertida. Ao fazê-lo, o Tribunal
tinha violado o poder discricionário de que a Comissão dispunha quando decide
nos termos das disposições conjugadas do artigo 39.° do Tratado e do artigo 2.°,
n.° 1, do Regulamento n.° 26.
- 67.
- A VBA sublinha, a este propósito, que os cinco objectivos da Política Agrícola
Comum, enunciados no artigo 39.°, n.° 1, do Tratado, podem revelar-se antagónicose entrar em conflito com o direito da concorrência. Neste contexto, o artigo 2.°,
n.° 1, do Regulamento n.° 26 deve, segundo a VBA, ser interpretado no sentido de
reconhecer o primado dos objectivos enunciados no artigo 39.° do Tratado. A VBA
refere-se a este propósito ao acórdão de 15 de Outubro de 1996, Ijssel-Vliet
(C-311/94, Colect., p. I-5023, n.° 31).
- 68.
- A VBA considera que o âmbito da obrigação de fundamentação varia em função
do acto em causa e que, numa decisão que rejeita uma denúncia em sede de
concorrência, a Comissão não é obrigada a tomar posição sobre todos os
argumentos invocados pelos autores dessa denúncia, podendo-se limitar a expor os
factos e as considerações jurídicas que revestem uma importância decisiva na
economia da decisão adoptada.
- 69.
- Quanto à intensidade do controlo da legalidade da decisão controvertida, a VBA
sustenta que o Tribunal de Primeira Instância se devia ter limitado a verificar se
a Comissão tinha cometido um erro de apreciação manifesto. Em seu entender, o
Tribunal de Primeira Instância, sob a capa da análise da fundamentação da
referida decisão, examinou detalhadamente a exactidão da apreciação em sede de
mérito efectuada pela Comissão. Assim, o Tribunal de Primeira Instância tinha
violado o artigo 173.°, segundo parágrafo, do Tratado CE (que passou, após
alteração, a artigo 230.°, segundo parágrafo, CE).
- 70.
- Por outro lado, foi com desrespeito pelas competências da Comissão, que
considerara que o conjunto das regulamentações da VBA integrava o âmbito do
artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, embora cumprisse as condições enunciadas no artigo
2.°, n.° 1, do Regulamento n.° 26, que o Tribunal de Primeira Instância considerou
que a taxa de utilização, em si mesma, integrava o âmbito do artigo 85.°, n.° 1, do
Tratado e era, portanto, necessário examinar se as condições enunciadas no artigo
2.°, n.° 1, do Regulamento n.° 26 se encontravam satisfeitas no que a si respeitava.
- 71.
- Além disso, a VBA alega que, em conformidade com o acórdão do Tribunal de
Primeira Instância de 18 de Setembro de 1992, Automec/Comissão (T-24/90,
Colect., p. II-2223), a Comissão não é obrigada a concluir pela existência de uma
infracção e pode rejeitar uma denúncia por falta de interesse comunitário. Se, em
processos como o em apreço, a Comissão fosse obrigada a provar que a
regulamentação de uma associação cooperativa é necessária à realização de cada
um dos objectivos da Política Agrícola Comum, teria de rejeitar cada vez com mais
assiduidade as denúncias apresentadas com base nessa jurisprudência. A VBA
duvida que essa tendência esteja em conformidade com o interesse geral.
- 72.
- Em resposta ao primeiro fundamento, a Florimex e a VGB sustentam que, no
quadro do Regulamento n.° 26, a Comissão não goza de uma competência
discricionária, apenas podendo declarar se se encontram ou não satisfeitas as
condições dos artigos 2.°, n.° 1. Como esta disposição constitui uma excepção ao
artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, que deve ser interpretada de forma restritiva, oTribunal não se podia, segundo a Florimex e a VGB, contentar-se com um controlo
marginal da decisão controvertida. Em consequência, a obrigação de
fundamentação devia ser estritamente respeitada.
- 73.
- Segundo a Florimex e a VGB, o Tribunal de Primeira Instância distinguiu
efectivamente entre a exigência de fundamentação e a apreciação em sede de
mérito. Além disso, a análise segundo a qual a taxa de utilização estava abrangida,
enquanto tal, pela proibição constante do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, não era
própria ao Tribunal de Primeira Instância antes tendo sido amplamente exposta
pela Florimex e a VGB durante o processo.
- 74.
- A Comissão alega que o presente processo suscita fundamentalmente um problema
institucional, que respeita à repartição das competências entre ela própria e o
Tribunal de Primeira Instância, bem como ao alcance e à intensidade do controlo
jurisdicional das decisões que rejeitam uma denúncia apresentada por particulares
contra outros particulares. Segundo a Comissão, esse controlo só pode ser
marginal. Por conseguinte, associa-se inteiramente ao primeiro fundamento da
VBA.
- 75.
- Através do seu quarto fundamento, a VBA sustenta que o Tribunal de Primeira
Instância cometeu um erro de direito ao considerar que a decisão controvertida se
baseava numa interpretação do artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento
n.° 26 mais ampla do que a que a Comissão fizera em decisões anteriores.
- 76.
- A VBA alega ser erróneo considerar que qualquer restrição acordada ou aprovada
no âmbito de uma cooperativa agrícola deve ser por si só necessária à realização
dos objectivos enunciados no artigo 39.° do Tratado. Pelo contrário, se essa
cooperativa contribuir para a realização dos objectivos referidos no artigo 39.° do
Tratado e se, atenta a sua importância, a taxa de utilização se revelar indispensável
e proporcional, nesse âmbito, deixa de ser necessário, segundo a VBA, controlar
a taxa de utilização na perspectiva dos objectivos enunciados no artigo 39.° do
Tratado.
- 77.
- A VBA contesta, por outro lado, a fundamentação do Tribunal de Primeira
Instância segundo a qual a Comissão concluíra não serem necessários os acordos
que não figuram entre os fundamentos previstos no regulamento que institui a
organização comum para a realização dos objectivos referidos no artigo 39.° Com
efeito, a VBA alega que nem todas as organizações comuns de mercado estão
regulamentadas de um modo completo e exaustivo. No caso em apreço, o
Regulamento n.° 234/68 tinha um âmbito mais restrito do que organização comum
dos mercados na maior parte dos outros sectores agrícolas.
- 78.
- A Florimex e a VGB sustentam, em contrapartida, que o escoamento dos produtos
agrícolas é afectado pela imposição de uma taxa na relação entre terceiros não
membros da cooperativa e os compradores. Alegam, invocando os n.os 12 e 13 do
acórdão Oude Luttikhuis e o., já referido, que o facto de a cooperativa, em simesma, não ser considerada uma prática restritiva da concorrência não significa
que as disposições estatutárias dessa cooperativa sejam automaticamente subtraídas
à proibição constante do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.
- 79.
- A Comissão argumenta que as considerações preliminares formuladas pelo
Tribunal de Primeira Instância assentam numa premissa triplemente errónea: antes
de mais, não era correcto qualificar a taxa de utilização como taxa sobre as
transacções entre terceiros. A referida taxa era, pelo contrário, a contrapartida pela
possibilidade oferecida aos produtores não membros da cooperativa de entregarem
e venderem flores no recinto da VBA. Em seguida, era igualmente inexacto afirmar
que a taxa de utilização integra, enquanto tal, o âmbito da proibição enunciada no
artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, pois essa análise não resulta, de qualquer modo, da
decisão controvertida. Por último, era erróneo presumir que a regulamentação
relativa à taxa de utilização só se podia justificar nos termos do artigo 2.°, n.° 1,
primeiro período, do Regulamento n.° 26 se contribuísse para a realização de cada
um dos objectivos do artigo 39.° do Tratado, devendo cada objectivo ser alvo de
uma fundamentação distinta.
- 80.
- Através do seu quinto fundamento, a VBA refuta a conclusão do Tribunal de
Primeira Instância segundo o qual a exposição dos fundamentos da decisão
controvertida, no que respeita à sobrevivência da VBA na sua forma actual, não
basta, por si só, para demonstrar que a taxa de utilização era necessária à
realização dos objectivos do artigo 39.° do Tratado.
- 81.
- Foi erroneamente que o Tribunal de Primeira Instância examinou os efeitos da
taxa de utilização sublinhando que esta podia ter efeitos gravosos para outros
produtores agrícolas comunitários que não eram membros da VBA e que conduzia
a um aumento dos preços das transacções entre estes últimos e os compradores
independentes. Esta apreciação dos factos não encontra, segundo a VBA, qualquer
apoio nos autos. A conclusão segundo a qual a taxa de utilização entravava o
aumento do rendimento individual dos produtores que não eram membros da VBA
era, portanto, igualmente incorrecta.
- 82.
- Por outro lado, a VBA critica a conclusão do Tribunal de Primeira Instância
segundo a qual a Comissão devia ter apresentado uma fundamentação mais
circunstanciada a propósito da questão de saber se a taxa de utilização constituía
um meio para dissuadir os membros da VBA de a abandonarem e podia, assim,
ter efeitos negativos no que respeita a alguns dos objectivos enunciados no artigo
39.° do Tratado. Esta conclusão era incompatível com a premissa que esteve na
base da fundamentação do Tribunal de Primeira Instância, que aceitou a hipótese
da necessidade da taxa de utilização para evitar a perda de utilidade do leilão.
- 83.
- A Florimex e a VGB sustentam que foi correctamente que o Tribunal de Primeira
Instância examinou se a regulamentação concreta preenchia todas as condições do
artigo 39.° do Tratado, embora a cooperativa, em si mesma, satisfizesse emprincípio os objectivos enunciados nessa disposição. Quanto aos efeitos restritivos
que a regulamentação relativa à taxa de utilização produzia a nível da
concorrência, a Florimex e a VGB sustentam que esta questão foi profundamente
examinada no Tribunal de Primeira Instância.
- 84.
- A Comissão associa-se aos argumentos da VBA ao alegar que, se se aceitar que
a associação cooperativa satisfaz os objectivos do artigo 39.°, o mesmo se deve
necessariamente passar em relação ao sistema de venda em leilão, que obriga ao
pagamento de uma taxa de utilização.
- 85.
- Quanto aos efeitos restritivos que alegadamente a taxa de utilização exerce sobre
a concorrência, a Comissão aceita tratar-se de matéria de facto apurada pelo
Tribunal de Primeira Instância, mas sustenta que factos que não encontrem apoio
nos elementos dos autos e que sejam manifestamente inexactos não podem escapar
à censura do Tribunal de Justiça.
- 86.
- Por outro lado, a conclusão de que a taxa de utilização entrava o aumento do
rendimento individual dos produtores que não são membros da VBA era aquiirrelevante, pois os recorrentes em primeira instância são grossistas. Do mesmo
modo, a Comissão sustenta que as considerações sobre os interesses dos outros
produtores agrícolas comunitários e sobre o interesse comunitário na manutenção
de uma concorrência não falseada, bem como sobre o regime de saída da
cooperativa aplicável aos seus membros não estão relacionadas com o objecto das
denúncias.
- 87.
- Através do seu sexto fundamento, a VBA alega que o Tribunal de Primeira
Instância cometeu um erro de direito ao declarar que uma taxa instituída no
interesse da sobrevivência da VBA só podia ser aceite se fosse cobrada de forma
proporcional ao serviço prestado ou ao benefício oferecido, enquanto contrapartida
deste.
- 88.
- A VBA critica este raciocínio ao sustentar que qualquer empresa pode,
normalmente, definir as condições de acesso aos seus locais ou instalações. No
presente processo, não era aplicável nenhuma das derrogações possíveis a esta
regra.
- 89.
- Era, por outro lado, inexacto afirmar que os terceiros fornecedores a quem era
cobrada a taxa de utilização não beneficiavam dos inúmeros serviços oferecidos
pela VBA.
- 90.
- De qualquer modo, o Tribunal de Primeira Instância tinha cometido um erro de
direito ao exigir que a decisão controvertida fosse fundamentada por forma a
permitir-lhe verificar se a taxa em questão era uma remuneração adequada e se
o seu montante não excedia o valor do beneficio económico de que auferiam os
terceiros fornecedores que praticavam o abastecimento directo.
- 91.
- A Florimex e a VGB consideram, em contrapartida, ser correcto considerar que
a taxa de utilização é uma restrição dissimulada à concorrência, na medida em que
impedia o acesso dos terceiros ao mercado. Para que lhe fosse aplicável a excepção
constante do artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento n.° 26, devia, portanto, justificar-se
através de uma contrapartida e ser proporcionada ao seu valor.
- 92.
- A Comissão, à semelhança da VBA, sustenta que a exigência de que a taxa de
utilização se devia justificar através de uma contrapartida real e equitativa não
assenta em nenhum fundamento jurídico. Na medida em que critica a inexistência
de valores e de cálculos concretos no que respeita ao montante da taxa de
utilização na fundamentação da decisão controvertida, a fundamentação do
Tribunal de Primeira Instância não era relativa à fundamentação enquanto tal da
referida decisão, mas à apreciação dos factos que estão na base dessa
fundamentação.
- 93.
- No que respeita a esses quatro fundamentos, que importa examinar conjuntamente,
cabe recordar que, de acordo com jurisprudência constante, a fundamentação
exigida pelo artigo 190.° do Tratado (actual artigo 253.° CE) deve ser adaptada à
natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, a
argumentação da instituição, autora do acto, por forma a permitir aos interessados
conhecer as razões da medida adoptada e ao Tribunal exercer o seu controlo. A
exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do
caso em apreço, designadamente do conteúdo do acto, da natureza dos
fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas
directa e individualmente afectadas pelo acto podem ter em obter explicações. Não
é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito
pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um acto
satisfaz as exigências do artigo 190.° do Tratado deve ser apreciada à luz não
somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas
jurídicas que regem a matéria em causa (v., designadamente, acórdão de 2 de Abril
de 1998, Comissão/Sytraval e Brink's France, C-367/95 P, Colect., p. I-I-1719,
n.° 63).
- 94.
- Como se trata de uma decisão da Comissão que rejeita uma denúncia em matéria
de concorrência com base no artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento
n.° 26, importa observar em seguida que foi correctamente que o Tribunal de
Primeira Instância exigiu, invocando os já referidos acórdãos Frubo/Comissão e
Oude Luttikhuis e o., que a fundamentação da decisão deve revelar de que modo
o acordo entre os membros de uma cooperativa satisfaz cada um dos objectivos do
artigo 39.° do Tratado ou ainda o modo como a Comissão pôde conciliar esses
objectivos por forma a permitir a aplicação dessa disposição derrogatória, que deve
ser interpretada de forma restritiva.
- 95.
- Por outro lado, o primado da política agrícola sobre os objectivos do Tratado no
domínio da concorrência, invocado pela recorrente, não dispensa a Comissão deproceder a um exame para determinar se os objectivos enunciados no artigo 39.°
do Tratado foram efectivamente alcançados pelo referido acordo.
- 96.
- Por último, a referência que a recorrente faz ao já referido acórdão do Tribunal
de Primeira Instância Automec/Comissão é destituída de pertinência. Com efeito,
no n.° 80 desse acórdão, o Tribunal de Primeira Instância declarou que, quando a
Comissão decide arquivar uma denúncia, sem proceder a instrução, o controlo de
legalidade a que deve proceder o Tribunal visa determinar que a decisão
controvertida não assenta em factos materialmente inexactos, não sofre de nenhum
erro de direito, bem como de nenhum erro manifesto de apreciação nem de desvio
de poder. À luz destes princípios, o Tribunal de Primeira Instância examinou então
se a Comissão tinha fundamentado correctamente a sua decisão ao referir-se, como
critério de prioridade, designadamente ao interesse comunitário do processo.
- 97.
- Daqui resulta que a fundamentação de uma decisão de rejeição de uma denúncia
por falta de interesse comunitário desta, também não escapa ao controlo
jurisdicional.
- 98.
- De resto, não foi numa argumentação desta natureza que se apoiou a Comissão
para rejeitar a denúncia que lhe foi apresentada, mas numa fundamentação
extraída da aplicabilidade do artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento
n.° 26. Segue-se que o Tribunal de Primeira Instância não cometeu qualquer erro
de direito ao examinar a questão de saber se essa fundamentação era coerente e
completa.
- 99.
- Das considerações que precedem resulta que a Comissão era obrigada a
fundamentar a sua decisão demonstrando de que forma os acordos celebrados no
quadro da VBA eram necessários à realização de cada um dos objectivos
enunciados no artigo 39.° do Tratado ou, de qualquer modo, de que forma esses
objectivos podiam ser conciliados. Não é portanto necessário examinar a correcção
dos fundamentos do acórdão do Tribunal de Primeira Instância relativos à
incidência das medidas instauradas pelo Regulamento n.° 234/68 bem como ao
alcance da decisão controvertida, que excedia, segundo o Tribunal de Primeira
Instância, o das decisões anteriores.
- 100.
- Com efeito, essas considerações não tiverem, no caso em apreço, consequências a
nível da amplitude de obrigação de fundamentação da decisão controvertida, que
o Tribunal de Primeira Instância apreciou correctamente ao referir-se ao artigo 2.°,
n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26.
- 101.
- Quanto à fundamentação da decisão controvertida no que respeita à sobrevivência
da VBA, cabe observar que a crítica que a recorrente e a Comissão fizeram,
segundo a qual o Tribunal de Primeira Instância tinha, de uma forma juridicamente
errónea, procedido a um exame isolado da taxa de utilização, não tem qualquer
fundamento.
- 102.
- Com efeito, o Tribunal de Primeira Instância, sem proceder a um apuramento da
matéria de facto preciso, formulou, no entanto, considerações de ordem geral no
que respeita aos efeitos que a taxa de utilização podia produzir relativamente a
outros produtores agrícolas comunitários que não eram membros da VBA.
- 103.
- Atentos os efeitos que a taxa de utilização podia ter relativamente a determinados
operadores cujos interesses estão entre os referidos no artigo 39.° do Tratado, o
Tribunal de Primeira Instância pôde correctamente considerar que uma
fundamentação que justificasse essa taxa através dos seus efeitos benéficos para,
apenas, os membros da VBA era insuficiente.
- 104.
- Com efeito, se as disposições estatutárias que regem as relações entre uma
cooperativa e os seus membros não ficam automaticamente subtraídas à proibição
do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado (acórdão Oude Littikhuis e o., já referido, n.° 13)
o mesmo se deve passar, por maioria de razão, relativamente a disposições que
afectam terceiros que não as subscreveram.
- 105.
- Por outro lado, do acórdão Oude Littikhuis e o., já referido, resulta que o exame
das restrições impostas por uma cooperativa não deve incidir apenas sobre os seus
efeitos, considerados no seu conjunto, tal como a recorrente afirma.
- 106.
- Além disso, contrariamente ao que a Comissão sustenta, as considerações sobre os
interesses dos outros produtores agrícolas comunitários e sobre o interesse
comunitário na manutenção de uma concorrência não falseada tem, claramente,
uma relação com o objecto das denúncias. Com efeito, a aplicabilidade do artigo
2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26, que tem consequências directas
a nível da situação da Florimex e da VGB, depende precisamente do facto de se
atender a esses interesses.
- 107.
- Do que precede resulta que foi correctamente que o Tribunal de Primeira Instância
considerou que a fundamentação da decisão controvertida, no que respeita à
sobrevivência da VBA, era insuficiente para concluir que a taxa de utilização era
necessária à realização dos objectivos mencionados no artigo 39.° do Tratado.
- 108.
- Quanto à questão de saber se a taxa de utilização se devia justificar através de uma
contrapartida real e proporcionada, cabe sublinhar que a conclusão do Tribunal de
Primeira Instância, segundo a qual a concentração da oferta e da procura no
recinto da VBA é a única vantagem invocada como contrapartida da referida taxa,
representa matéria de facto apurada que não pode ser posta em causa por ocasião
de um recurso de uma decisão do Tribunal de Primeira Instância.
- 109.
- De resto, importa observar que, no ponto da decisão controvertida que se debruça
sobre a referida questão, tratava-se de saber se, através da taxa de utilização, a
VBA obtinha uma vantagem injustificada que tinha por efeito restringir a
concorrência. A Comissão considerou, a este propósito, que as diferentes taxas deutilização não podiam ser objecto de crítica na medida em que garantiam a
igualdade de tratamento do abastecimento com vista à venda em leilão e do
abastecimento directo dos distribuidores estabelecidos no recinto da VBA.
- 110.
- Ora, o Tribunal de Primeira Instância, embora no acórdão recorrido tenha
excedido a Comissão, ao explicitar a forma como a taxa de utilização podia
constituir uma restrição dissimulada da concorrência, limitou-se, na sequência do
seu raciocínio, a seguir a análise da Comissão, segundo a qual as diferentes formas
de abastecimento deviam ser tratadas igualmente.
- 111.
- A este respeito, o Tribunal de Primeira Instância não considerou suficiente a
fundamentação extraída do facto de os fornecedores que vendem em leilão e de
os terceiros fornecedores pagarem aproximadamente a mesma taxa de utilização.
Dado que a concentração da oferta e da procura no recinto da VBA era a única
vantagem de que beneficiavam estes últimos, o Tribunal de Primeira Instância
considerou não ter ficado provada que a igualdade de tratamento entre todos os
fornecedores.
- 112.
- Ora, importa observar que a decisão controvertida enuncia claramente as razões
pelas quais a Comissão considerou estar garantida a igualdade de tratamento entre
os fornecedores que vendiam em leilão e os terceiros fornecedores que tinham de
pagar a taxa de utilização.
- 113.
- Segue-se que, a este respeito, a decisão controvertida se encontra suficientemente
fundamentada.
- 114.
- A este propósito, há que recordar que a violação do artigo 190.° do Tratado e o
erro manifesto de apreciação são dois fundamentos distintos que podem ser
invocados no âmbito do recurso previsto pelo artigo 173.° do Tratado. O primeiro,
que visa uma falta ou uma insuficiência de fundamentação, cabe na violação de
formas substanciais, na acepção dessa disposição, e constitui um fundamento de
ordem pública que deve ser conhecido oficiosamente pelo juiz comunitário. Em
contrapartida, o segundo, que é relativo à legalidade em sede de mérito da decisão
controvertida, enquadra-se na violação de uma regra de direito relativa à aplicação
do Tratado, na acepção do mesmo artigo 173.°, e só pode ser examinado pelo juiz
comunitário se for invocado pelo recorrente (v. acórdão Comissão/Sytraval e
Brink's France, já referido, n.° 67).
- 115.
- Ora, do acórdão recorrido resulta que, na realidade, o Tribunal de Primeira
Instância criticou a Comissão por ter cometido um erro manifesto de apreciação.
Assim, não estabeleceu a distinção necessária entre a exigência de fundamentação
e a legalidade em sede de mérito da decisão.
- 116.
- Todavia, há que declarar que este erro de direito é irrelevante para efeitos da
solução do litígio.
- 117.
- Com efeito, a decisão controvertida sofre efectivamente de um erro manifesto de
apreciação e este foi suscitado pelas recorrentes em primeira instância.
- 118.
- Por um lado, a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar
que bastava comparar o montante das taxas a que estavam sujeitos os respectivos
fornecedores para se ficar com a certeza de que havia uma garantia de igualdade
de tratamento entre eles. Com efeito, este método não toma em consideração o
facto de que os fornecedores que não eram membros da VBA só beneficiavam da
vantagem decorrente da concentração da oferta e da procura, enquanto que os
seus membros podiam recorrer a inúmeros outros serviços.
- 119.
- Por outro lado, dos n.os 108, 113 e 114 do acórdão recorrido resulta que a Florimex
e a VGB acusaram a Comissão de ter cometido um erro de apreciação no que
respeita à contrapartida da taxa de utilização.
- 120.
- Segue-se que, embora o Tribunal devesse ter rejeitado os fundamentos relativos à
insuficiência de fundamentação da decisão controvertida, era obrigado a acolher
o fundamento relativo ao erro manifesto de apreciação, que é procedente.
- 121.
- Ora, importa recordar que, segundo uma jurisprudência constante, embora os
fundamentos de um acórdão do Tribunal de Primeira Instância mostrem uma
violação do direito comunitário, se a sua parte decisória se mostrar fundada, por
diferentes razões jurídicas, deve ser negado provimento ao recurso dele interposto
(v. acórdãos de 9 de Junho de 1992, Lestelle/Comissão, C-30/91 P, Colect.,
p. I-3755, n.° 28, e de 12 de Novembro de 1996, Ojha/Comissão, C-294/95 P,
Colect., p. I-5863, n.° 52).
- 122.
- Segue-se que os primeiro, quarto, quinto e sexto fundamentos do presente recurso
devem ser julgados improcedentes.
Quanto aos segundo e terceiro fundamentos
- 123.
- Através dos seus segundo e terceiro fundamentos, a VBA põe em causa os n.os 137
e 138 do acórdão recorrido, nos quais o Tribunal de Primeira Instância considerou
que não era obrigado a pronunciar-se sobre os argumentos da VBA relativos à não
aplicação do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado ou à eventual aplicação do artigo 2.°,
n.° 1, segundo período, do Regulamento n.° 26, tendo apenas que se pronunciar
sobre a legalidade da conclusão a que a Comissão chegara na sua decisão
controvertida, segundo a qual a taxa de utilização integrava o âmbito do artigo 2.°,
n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26.
- 124.
- Por um lado, a VBA considera que a Comissão não limitou a sua apreciação ao
artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26. Com efeito, no
documento junto à carta nos termos do artigo 6.°, citado no n.° 41 do acórdão
recorrido, a Comissão declarara que a taxa de utilização era um elementofundamental do sistema de distribuição da VBA, o que representava uma condição
de aplicação do artigo 2.°, n.° 1, segundo período, do Regulamento n.° 26. A VBA
considera, por conseguinte, que a rejeição da sua denúncia comporta,
implicitamente, a aplicação desta disposição.
- 125.
- Por outro lado, a VBA alega que o Tribunal de Primeira Instância devia ter
verificado se a Comissão tinha atendido ao facto de que o direito comunitário da
concorrência não se opõe a que uma associação cooperativa aplique e mantenha
em vigor restrições necessárias para assegurar o seu bom funcionamento e para
sustentar o seu poder contratual em relação aos produtores (acórdão do Tribunal
de Justiça de 15 de Dezembro de 1994, DLG, C-250/92, Colect., p. I-5641, n.os 34
e 35). De acordo com o acórdão Oude Luttikhuis e o., já referido, estas restrições
não integram o âmbito do artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.
- 126.
- A este propósito, basta observar que a Comissão tomou a decisão controvertida
com fundamento apenas no facto de a taxa de utilização ser um elemento
fundamental do sistema de distribuição da VBA, sistema esse que, segundo a
Comissão, era necessário à realização dos objectivos enunciados no artigo 39.° do
Tratado, na acepção do artigo 2.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 26,
e que o objecto do recurso da Florimex e da VGB para o Tribunal de Primeira
Instância foi precisamente a aplicação desta última disposição. Foi pois
correctamente que o Tribunal de Primeira Instância não se pronunciou sobre os
argumentos invocados pela VBA relativos à não aplicação do artigo 85.°, n.° 1, do
Tratado, ou à eventual aplicação do artigo 2.°, n.° 1, segundo período, do
Regulamento n.° 26.
- 127.
- Os segundo e terceiro fundamentos do presente recurso devem, por conseguinte,
ser julgados improcedentes.
Quanto ao sétimo fundamento
- 128.
- Através do seu sétimo fundamento, a VBA alega que foi erradamente que o
Tribunal de Primeira Instância considerou, nos n.os 184 a 186 do acórdão recorrido,
que a Comissão também tinha justificado a rejeição das denúncias da Florimex e
da VGB no facto de a taxa de utilização ter um efeito análogo ao de um preço
mínimo e que daí retirou que essa consideração não constituía um fundamento
suficiente.
- 129.
- A este respeito, a VBA sustenta que a passagem em questão do documento junto
à carta nos termos do artigo 6.° não tem significado autónomo e que o Tribunal de
Primeira Instância não o podia chamar à colação para anular a decisão
controvertida.
- 130.
- A VBA invoca diversos argumentos para demonstrar que a taxa de utilização não
pode ter nem o mesmo objecto nem o mesmo efeito que uma regulamentação que
institui um preço mínimo.
- 131.
- Cabe observar que a própria recorrente sustenta, correctamente, que esta parte da
fundamentação da decisão controvertida não tem um significado autónomo. Com
efeito, embora o Tribunal se tenha expressamente referido a esse fundamento, a
referida decisão baseava-se noutros elementos e sofria, a este propósito, tal como
já se observou nos n.os 115 a 119 do presente acórdão, de um vício que justificava
a sua anulação.
- 132.
- Segue-se que a crítica formulada pela VBA a propósito desta parte da
argumentação do Tribunal é irrelevante.
Quanto ao oitavo fundamento
- 133.
- Através do seu oitavo fundamento, a VBA sustenta que o Tribunal de Primeira
Instância cometeu um erro de direito ao exigir que as taxas que a VBA impõe aos
comerciantes titulares de contratos comerciais sejam iguais às que aplica aos
terceiros fornecedores que recorrem ao abastecimento directo, excepto se se
demonstrar a existência de uma diferença entre os dois modos de abastecimento.
- 134.
- O artigo 85.° do Tratado não proibia a VBA de distinguir entre os diferentes
modos de garantir o abastecimento quando estabelece taxas e, por força da sua
liberdade contratual, tinha a liberdade de escolher as empresas com quem pretende
celebrar contratos comerciais. Com efeito, o artigo 85.°, n.° 1, do Tratado só era
aplicável aos acordos que uma empresa celebra com outras empresas e em que se
aplicam taxas diferentes. No caso em apreço, a VBA tinha decidido unilateralmente
celebrar contratos comerciais e cobrar uma taxa de utilização sobre o
abastecimento directo. Em contrapartida, não se tinha comprometido,
relativamente aos terceiros, a aplicar e a manter essas taxas.
- 135.
- A Comissão refuta a conclusão do Tribunal de Primeira Instância segundo a qual
os contratos comerciais não prevêm obrigação específica de fornecimento. Esses
contratos, pelo contrário, estabeleciam com precisão, em concreto, a que espécies
de flores se aplicam, e era apenas no que respeita ao fornecimento desses produtos
que o comerciante beneficiava da tarifa reduzida de 3%. Só se oferecia um
contrato comercial a um comerciante que estivesse disposto a entregar as espécies
de flores procuradas.
- 136.
- Quanto à fundamentação da decisão controvertida sob este aspecto, a Comissão
recorda que não é obrigada a examinar todas as afirmações do autor de uma
denúncia numa decisão que a rejeite.
- 137.
- A este propósito, cabe sublinhar que, nos n.os 191 a 194 do acórdão recorrido, o
Tribunal de Primeira Instância, à semelhança da Comissão, considerou que se devia
garantir a igualdade de tratamento entre os diferentes fornecedores. Examinou o
único argumento que a Comissão e a VBA apresentaram para justificar a diferença
no montante da taxa de utilização, ou seja, a existência de obrigações deabastecimento impostas aos titulares de contratos comerciais. Ora, o Tribunal de
Primeira Instância concluiu não existirem tais obrigações específicas de
fornecimento. Esta conclusão é relativa à matéria de facto.
- 138.
- Ora, dos artigos 168.° A do Tratado CE (actual artigo 225.° CE) e 51.° do estatuto
CE do Tribunal de Justiça resulta que o recurso só pode assentar em fundamentos
relativos à violação de normas jurídicas, com exclusão de qualquer apreciação da
matéria de facto (v., designadamente, acórdão de 28 de Maio de 1998, New
Holland Ford/Comissão, C-8/95 P, Colect., p. I-3175, n.° 25).
- 139.
- Com efeito, o Tribunal de Primeira Instância tem competência exclusiva, por um
lado, para apurar a matéria de facto, excepto em caos nos quais a inexactidão
material das suas conclusões resulte dos elementos juntos aos autos que lhe foram
submetidos e, por outro, para apreciar essa matéria de facto (acórdão New Holland
Ford/Comissão, já referido, n.° 25). Todavia, é ainda necessário que essa
inexactidão resulte de forma manifesta dos elementos do processo sem que seja
necessário proceder a uma nova apreciação dos factos (acórdão New Holland
Ford/Comissão, já referido, n.° 72).
- 140.
- No caso em apreço, os argumentos invocados em apoio da tese segundo a qual oscontratos comerciais previam obrigações específicas de fornecimento, argumentos
que, de resto, são substancialmente idênticos aos apresentados no Tribunal de
Primeira Instância, não revelam a existência de um erro material manifesto no que
respeita à matéria de facto que, sob este aspecto, foi apurada pelo Tribunal de
Primeira Instância.
- 141.
- Em contrapartida, é verdade que o Tribunal de Primeira Instância considerou que
a decisão controvertida não continha fundamentação suficiente que lhe permitisse
controlar a correcção da conclusão segundo a qual a diferença de tratamento entre
as duas categorias de fornecedores se justificava objectivamente, quando, ao mesmo
tempo, acusava a Comissão de ter cometido um erro de apreciação a esse
propósito.
- 142.
- Todavia, pelas razões já expostas nos n.os 115 a 119 do presente acórdão, este erro
de direito é irrelevante para a solução do presente litígio.
- 143.
- Com efeito, por um lado, a inexistência de obrigação de abastecimento, apurada
pelo Tribunal no que respeita aos titulares dos contratos comerciais, revela que a
Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar (v. n.° 23 do
presente acórdão) que existia igualdade de tratamento entre estes últimos e os
outros fornecedores a quem era aplicada a taxa de utilização.
- 144.
- Por outro lado, do n.° 188 do acórdão recorrido resulta que a Florimex e a VGB
tinham alegado, precisamente, no Tribunal de Primeira Instância, que a diferença
entre o montante previsto pelos contratos comerciais e o da taxa de utilização era
discriminatória.
- 145.
- Segue-se que o oitavo fundamento também deve ser julgado improcedente.
- 146.
- Do conjunto das considerações que precede resulta que o presente recurso deve
ser julgado improcedente na sua integralidade.
Quanto às despesas
- 147.
- Nos termos do artigo 122.°, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, se
o recurso for julgado improcedente ou for julgado procedente e o Tribunal de
Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas. Nos
termos do artigo 69.°, n.° 2, do mesmo regulamento, aplicável ao recurso de
decisões do Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 118.°, a parte
vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo
a Florimex e a VGB pedido a condenação da VBA e tendo esta última sido
vencida, há que condená-la a suportar as suas próprias despesas, bem como as da
Florimex e da VGB. A Comissão, que também foi vencida, suportará as suas
próprias despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),
decide:
1) É negado provimento ao recurso.
2) A Coöperatieve Vereniging De Verenigde Bloemenveilingen Aalsmeer BA
(VBA) suportará as suas próprias despesas bem como as da Florimex BV
e da Vereniging van Groothandelaren in Bloemkwekerijproducten (VGB)
correspondentes ao processo no Tribunal de Justiça.
3) A Comissão das Comunidades Europeias suportará as suas próprias
despesas.
Moitinho de AlmeidaSevón
Puissochet
Jann Wathelet
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Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 30 de Março de 2000.
O secretário
O presidente da Quinta Secção
R. Grass
D. A. O. Edward