Language of document : ECLI:EU:T:2020:287

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

25 de junho de 2020 (*)

«Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas adotadas tendo em conta a situação na Ucrânia — Congelamento de fundos — Lista das pessoas, entidades e organismos aos quais se aplica o congelamento dos fundos e dos recursos económicos — Manutenção do nome do recorrente na lista — Obrigação do Conselho de verificar se a decisão de uma autoridade de um Estado terceiro foi tomada em conformidade com os direitos de defesa e o direito a uma proteção jurisdicional efetiva»

No processo T‑295/19,

Oleksandr Viktorovych Klymenko, residente em Moscovo (Rússia), representado por M. Phelippeau, advogado,

recorrente,

contra

Conselho da União Europeia, representado por A. Vitro e P. Mahnič, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objeto um pedido com base no artigo 263.o TFUE e destinado à anulação da Decisão (PESC) 2019/354 do Conselho, de 4 de março de 2019, que altera a Decisão 2014/119/PESC que impõe medidas restritivas dirigidas a certas pessoas, entidades e organismos, tendo em conta a situação na Ucrânia (JO 2019, L 64, p. 7), e do Regulamento de Execução (UE) 2019/352 do Conselho, de 4 de março de 2019, que dá execução ao Regulamento (UE) n.o 208/2014 que impõe medidas restritivas dirigidas a certas pessoas, entidades e organismos, tendo em conta a situação na Ucrânia (JO 2019, L 64, p. 1), na medida em que estes atos mantiveram nome do recorrente na lista das pessoas, entidades e organismos aos quais se aplicam essas medidas restritivas,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto por: D. Spielmann, presidente, O. Spineanu‑Matei e R. Mastroianni (relator), juízes,

secretário: E. Coulon,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        O presente processo inscreve‑se no âmbito do contencioso associado às medidas restritivas adotadas contra certas pessoas, entidades e organismos, tendo em conta a situação na Ucrânia, na sequência da repressão das manifestações na Praça da Independência em Kiev (Ucrânia) em fevereiro de 2014.

2        O recorrente, Oleksandr Viktorovych Klymenko, desempenhou as funções de Ministro do Tesouro e dos Impostos da Ucrânia.

3        Em 5 de março de 2014, o Conselho da União Europeia adotou a Decisão 2014/119/PESC, que impõe medidas restritivas dirigidas a certas pessoas, entidades e organismos, tendo em conta a situação na Ucrânia (JO 2014, L 66, p. 26). Na mesma data, o Conselho adotou o Regulamento (UE) n.o 208/2014, que impõe medidas restritivas dirigidas a certas pessoas, entidades e organismos, tendo em conta a situação na Ucrânia (JO 2014, L 66, p. 1).

4        Os considerandos 1 e 2 da Decisão 2014/119 precisam o seguinte:

«(1)      Em 20 de fevereiro de 2014, o Conselho condenou nos termos mais enérgicos todo e qualquer recurso à violência na Ucrânia. Apelou à cessação imediata da violência na Ucrânia e ao pleno respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais. Exortou o Governo ucraniano a usar da máxima contenção e os dirigentes da oposição a distanciarem‑se dos que recorrem à ação radical, inclusive à violência.

(2)      Em 3 de março de 2014, o Conselho acordou em fazer incidir as medidas restritivas no congelamento e recuperação de ativos de pessoas identificadas como responsáveis pelo desvio de fundos públicos ucranianos e de pessoas responsáveis por violações de direitos humanos, tendo em vista consolidar e apoiar o Estado de direito e o respeito pelos direitos humanos na Ucrânia.»

5        O artigo 1.o, n.os 1 e 2, da Decisão 2014/119 dispõe o seguinte:

«1.      São congelados todos os fundos e recursos económicos pertencentes, na posse ou que se encontrem à disposição ou sob controlo de pessoas identificadas como responsáveis por desvios de fundos públicos ucranianos e de pessoas responsáveis por violações de direitos humanos na Ucrânia, e de pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos a elas associados, enumerados no nexo.

2.      É proibido colocar, direta ou indiretamente, fundos ou recursos económicos à disposição das pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos enumerados no Anexo, ou disponibilizá‑los em seu proveito.»

6        As modalidades deste congelamento de fundos estão definidas no artigo 1.o, n.os 3 a 6, da Decisão 2014/119.

7        Em conformidade com a Decisão 2014/119, o Regulamento n.o 208/2014 impõe a adoção das medidas restritivas em causa e define as suas modalidades em termos idênticos, em substância, aos da referida decisão.

8        Os nomes das pessoas visadas pela Decisão 2014/119 e pelo Regulamento n.o 208/2014 constam da lista que figura no anexo da referida decisão e no Anexo I do referido regulamento (a seguir «lista») com, nomeadamente, a fundamentação da sua inclusão. Inicialmente, o nome do recorrente não aparecia na lista.

9        A Decisão 2014/119 e o Regulamento n.o 208/2014 foram alterados pela Decisão de Execução 2014/216/PESC do Conselho, de 14 de abril de 2014, que dá execução à Decisão 2014/119 (JO 2014, L 111, p. 91), e pelo Regulamento de Execução (UE) n.o 381/2014 do Conselho, de 14 de abril de 2014, que dá execução ao Regulamento n.o 208/2014 (JO 2014, L 111, p. 33) (a seguir, em conjunto, «atos de abril de 2014»).

10      Através dos atos de abril de 2014, o nome do recorrente foi acrescentado à lista, com as informações de identificação «antigo Ministro do Tesouro e dos Impostos» e com a fundamentação seguinte:

«Sujeito a inquérito na Ucrânia por implicação em crimes relacionados com o desvio de fundos do Estado ucraniano e a sua transferência ilegal para fora do país.»

11      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de junho de 2014, o recorrente interpôs um recurso, registado com o número de processo T‑494/14, que tinha por objeto, designadamente, a anulação dos atos de abril de 2014, na parte em que lhe diziam respeito.

12      Em 29 de janeiro de 2015, o Conselho adotou a Decisão (PESC) 2015/143, que altera a Decisão 2014/119 (JO 2015, L 24, p. 16), e o Regulamento (UE) 2015/138, que altera o Regulamento n.o 208/2014 (JO 2015, L 24, p. 1).

13      A Decisão 2015/143 precisou, a partir de 31 de janeiro de 2015, os critérios de inclusão das pessoas visadas pelo congelamento de fundos. Em especial, o artigo 1.o, n.o 1, da Decisão 2014/119 foi substituído pelo seguinte texto:

«1.      São congelados todos os fundos e recursos económicos pertencentes, na posse ou que se encontrem à disposição ou sob controlo de pessoas identificadas como responsáveis por desvios de fundos estatais ucranianos e de pessoas responsáveis por violações de direitos humanos na Ucrânia, e de pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos a elas associados, enumerados no anexo.

Para efeitos da presente decisão, as pessoas identificadas como responsáveis por desvios de fundos estatais ucranianos incluem as pessoas sujeitas a inquérito pelas autoridades ucranianas:

a)      por desvios de fundos ou ativos públicos ucranianos, ou por serem cúmplices nesses desvios; ou

b)      por abuso de poder por parte de titular de cargo público para obter, para si ou para outrem, vantagem injustificada, lesando desse modo os fundos ou ativos públicos ucranianos, ou por serem cúmplices nesse abuso.»

14      O Regulamento 2015/138 alterou o Regulamento n.o 208/2014 em conformidade com a Decisão 2015/143.

15      Em 5 de março de 2015, o Conselho adotou a Decisão (PESC) 2015/364, que altera a Decisão 2014/119 (JO 2015, L 62, p. 25), e o Regulamento de Execução (UE) 2015/357, que dá execução ao Regulamento n.o 208/2014 (JO 2015, L 62, p. 1) (a seguir, em conjunto, «atos de março de 2015»). A Decisão 2015/364 substituiu, por um lado, o artigo 5.o da Decisão 2014/119, prorrogando a aplicação das medidas restritivas, no que dizia respeito ao recorrente, até 6 de março de 2016, e, por outro, alterando o anexo desta última decisão. O Regulamento de Execução 2015/357 alterou, em consequência, o Anexo I do Regulamento n.o 208/2014.

16      Através dos atos de março de 2015, o nome do recorrente foi mantido na lista, com as informações de identificação «antigo Ministro do Tesouro e dos Impostos» e a nova fundamentação seguinte:

«Sujeito a ação penal pelas autoridades ucranianas por desvio de fundos ou ativos públicos ucranianos e por abuso de poder por um titular de cargo público a fim de obter benefício ilegítimo para si ou para terceiros, lesando desse modo os fundos ou ativos públicos ucranianos.»

17      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de maio de 2015, o recorrente interpôs um recurso, registado com o número de processo T‑245/15, destinado, designadamente, à anulação dos atos de março de 2015, na parte em que lhe diziam respeito.

18      Em 4 de março de 2016, o Conselho adotou a Decisão (PESC) 2016/318, que altera a Decisão 2014/119 (JO 2016, L 60, p. 76), e o Regulamento de Execução (UE) 2016/311, que dá execução ao Regulamento n.o 208/2014 (JO 2016, L 60, p. 1) (a seguir, em conjunto, «atos de março de 2016»).

19      Através dos atos de março de 2016, a aplicação das medidas restritivas foi prorrogada, nomeadamente, no que diz respeito ao recorrente, até 6 de março de 2017, sem que a fundamentação da sua designação tivesse sido alterada em relação à dos atos de março de 2015.

20      Por articulado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 28 de abril de 2016, o recorrente adaptou a petição relativa ao processo T‑245/15, em conformidade com o artigo 86.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a fim de pedir igualmente a anulação dos atos de março de 2016, na parte em que lhe diziam respeito.

21      Por Despacho de 10 de junho de 2016, Klymenko/Conselho (T‑494/14, EU:T:2016:360), adotado com fundamento no artigo 132.o do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral deu provimento ao recurso acima referido no n.o 11, declarando‑o manifestamente procedente e anulando, portanto, os atos de abril de 2014, na medida em que visavam o recorrente.

22      Em 3 de março de 2017, o Conselho adotou a Decisão (PESC) 2017/381, que altera a Decisão 2014/119 (JO 2017, L 58, p. 34), e o Regulamento de Execução (UE) 2017/374, que dá execução ao Regulamento n.o 208/2014 (JO 2017, L 58, p. 1) (a seguir, em conjunto, «atos de março de 2017»).

23      Através dos atos de março de 2017, a aplicação das medidas restritivas foi prorrogada até 6 de março de 2018, sem que a fundamentação da designação do recorrente tivesse sido alterada em relação à dos atos de março de 2015.

24      Por articulado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 27 de março de 2017, o recorrente adaptou novamente a petição relativa ao processo T‑245/15, a fim de pedir igualmente a anulação dos atos de março de 2017, na parte em que lhe diziam respeito.

25      Por Acórdão de 8 de novembro de 2017, Klymenko/Conselho (T‑245/15, não publicado, EU:T:2017:792), o Tribunal Geral julgou improcedentes todos os pedidos do recorrente referidos nos n.os 17, 20 e 24 supra.

26      Em 5 de janeiro de 2018, o recorrente interpôs recurso no Tribunal de Justiça, registado com o número de processo C‑11/18 P, do Acórdão de 8 de novembro de 2017, Klymenko/Conselho (T‑245/15, não publicado, EU:T:2017:792).

27      Em 5 de março de 2018, o Conselho adotou a Decisão (PESC) 2018/333, que altera a Decisão 2014/119 (JO 2018, L 63, p. 48), e o Regulamento de Execução (UE) 2018/326, que dá execução ao Regulamento n.o 208/2014 (JO 2018, L 63, p. 5) (a seguir, em conjunto, «atos de março de 2018»).

28      Através dos atos de março de 2018, a aplicação das medidas restritivas em causa foi prorrogada até 6 de março de 2019, sem que a fundamentação da designação do recorrente tivesse sido alterada em relação à dos atos de março de 2015.

29      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de abril de 2018, o recorrente interpôs um recurso, registado com o número de processo T‑274/18, destinado à anulação dos atos de março de 2018, na parte em que lhe diziam respeito.

30      Entre dezembro de 2018 e fevereiro de 2019, o Conselho e o recorrente trocaram várias cartas relativas à possível prorrogação das medidas restritivas em causa contra este último. Em especial, o Conselho transmitiu várias cartas da Procuradoria‑Geral da Ucrânia (a seguir «PGU») ao recorrente relativamente aos processos penais contra este último e com base nas quais estava a considerar a referida prorrogação.

31      Em 4 de março de 2019, o Conselho adotou a Decisão (PESC) 2019/354, que altera a Decisão 2014/119 (JO 2019, L 64, p. 7) e o Regulamento de Execução (UE) 2019/352, que dá execução ao Regulamento (UE) n.o 208/2014 (JO 2019, L 64, p. 1) (a seguir, em conjunto, «atos impugnados»).

32      Através dos atos impugnados, a aplicação das medidas restritivas em causa foi prorrogada até 6 de março de 2020 e o nome do recorrente foi mantido na lista, com a mesma fundamentação recordada no n.o 16 supra, acompanhada de uma precisão redigida nos seguintes termos:

«A informação que consta do dossiê do Conselho monstra que os direitos de defesa e o direito a uma efetiva proteção jurisdicional de Oleksandr Viktorovych Klymenko foram respeitados nos processos penais em que o Conselho se baseou. Este facto é comprovado, em especial, pela decisão do juiz de instrução, de 5 de outubro de 2018, que autoriza uma instrução especial do processo à revelia.»

33      Por carta de 5 de março de 2019, o Conselho informou o recorrente da manutenção das medidas restritivas a seu respeito. Respondeu às observações formuladas pelo recorrente na correspondência de 19 de dezembro de 2018, 21 de janeiro e 4 de fevereiro de 2019 e transmitiu‑lhe os atos impugnados. Além disso, indicou‑lhe o prazo para apresentar observações antes da tomada da decisão sobre a eventual manutenção do seu nome na lista.

 Factos posteriores à interposição do presente recurso

34      Por Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho (T‑274/18, EU:T:2019:509), o Tribunal Geral anulou os atos de março de 2018 na parte em que diziam respeito ao recorrente.

35      Por Acórdão de 26 de setembro de 2019, Klymenko/Conselho (C‑11/18 P, não publicado, EU:C:2019:786), o Tribunal de Justiça anulou, por um lado, o Acórdão de 8 de novembro de 2017, Klymenko/Conselho (T‑245/15, não publicado, EU:T:2017:792) (v. n.o 25 supra), e, por outro, os atos de março de 2015, de março de 2016 e de março de 2017 na parte em que diziam respeito ao recorrente.

 Tramitação processual e pedidos das partes

36      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 3 de maio de 2019, o recorrente interpôs o presente recurso.

37      Em 29 de julho de 2019, o Conselho apresentou a sua contestação.

38      A fase escrita do processo foi encerrada em 20 de setembro de 2019, não tendo o recorrente apresentado réplica dentro do prazo fixado.

39      Tendo a composição das secções do Tribunal Geral sido alterada, nos termos do artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo, o processo foi reatribuído à Quinta Secção, à qual foi afetado um novo juiz‑relator.

40      Em 20 de novembro de 2019, o Tribunal Geral convidou as partes, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, a apresentarem as suas observações sobre as consequências a retirar, no caso vertente, respetivamente do Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho (T‑274/18, EU:T:2019:509), e do Acórdão de 26 de setembro de 2019, Klymenko/Conselho (C‑11/18 P, não publicado, EU:C:2019:786). As partes deram cumprimento a esta medida no prazo fixado.

41      Por força do artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, se as partes no processo principal não tiverem apresentado um pedido de fixação de uma audiência no prazo de três semanas a contar da notificação do encerramento da fase escrita do processo, o Tribunal Geral pode decidir julgar o recurso sem fase oral. No caso em apreço, o Tribunal Geral, considerando‑se suficientemente esclarecido pelas peças dos autos, na falta de tal pedido, decidiu julgar o recurso sem fase oral.

42      O recorrente conclui, em substância, pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular os atos impugnados, na parte em que lhe dizem respeito;

–        condenar o Conselho nas despesas.

43      O Conselho conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar o recorrente nas despesas;

–        a título subsidiário, se os atos impugnados forem anulados na parte em que dizem respeito ao recorrente, ordenar a manutenção dos efeitos da Decisão 2019/354 até que a anulação parcial do Regulamento de Execução 2019/352 produza efeitos.

 Questão de direito

44      O recorrente invoca cinco fundamentos de recurso, relativos, o primeiro, à violação do dever de fundamentação, o segundo, à violação dos direitos de defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva, o terceiro, à falta de base legal, o quarto, a um erro de apreciação e, o quinto, à violação do direito de propriedade.

45      Antes de mais, há que examinar os segundo e quarto fundamentos, considerados em conjunto, na medida em que acusam, nomeadamente, o Conselho de não ter verificado se as autoridades ucranianas respeitaram os direitos de defesa e o direito a uma proteção jurisdicional efetiva do recorrente, o que resulta num erro de apreciação cometido quando os atos impugnados foram adotados.

46      No âmbito destes fundamentos, o recorrente, baseando‑se no Acórdão de 19 de dezembro de 2018, Azarov/Conselho (C‑530/17 P, EU:C:2018:1031), alega, nomeadamente, que o Conselho não verificou se a decisão da PGU, em que se baseou para manter as medidas restritivas a seu respeito, foi tomada no respeito dos seus direitos de defesa e do seu direito a uma proteção jurisdicional efetiva.

47      A este propósito, o recorrente acusa o Conselho de não ter efetuado verificações suficientes e de ter rejeitado de forma arbitrária as suas observações sobre os diversos documentos apresentados pela PGU.

48      Mais especificamente, o recorrente alega que a decisão do juiz de instrução do Tribunal Distrital de Pechersk, em Kiev, de 5 de outubro de 2018 (a seguir «decisão do juiz de instrução de 5 de outubro de 2018»), que autoriza a abertura de um inquérito especial à revelia a seu respeito, não foi adotada, contrariamente ao que alega o Conselho, no respeito dos direitos de defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva, conforme consagrados, nomeadamente, nos artigos 6.o e 13.o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de novembro de 1950 (a seguir «CEDH») e no artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»). Com efeito, por um lado, esta decisão não podia ter sido objeto de recurso e, por outro, foi tomada em violação dos requisitos do Código de Processo Penal ucraniano (a seguir «Código de Processo Penal»). O recorrente sublinha que, apesar de ter informado o Conselho sobre tal, este não realizou nenhuma verificação aprofundada a este respeito.

49      Por outro lado, o recorrente considera que a duração da alegada ação penal a seu respeito na Ucrânia não é razoável na aceção do artigo 6.o, n.o 1, da CEDH, e que, mesmo na sequência da decisão do juiz de instrução de 5 de outubro de 2018, é evidente que o único objetivo prosseguido pelas autoridades ucranianas seria o de justificar a manutenção das medidas restritivas em causa.

50      Com efeito, desde a abertura do inquérito preliminar, as autoridades responsáveis, na ausência de prova, limitaram‑se a atrasá‑lo e não tomaram qualquer decisão de remessa do processo para um tribunal ou do seu encerramento, violando, por conseguinte, o Código de Processo Penal.

51      O Conselho alega, designadamente, que, tal como decorre da sua carta de 5 de março de 2019, teve em consideração as observações do recorrente, verificando o mérito e, à luz das informações recebidas pela PGU, considerou que existiam motivos suficientes para manter o nome do recorrente na lista. No âmbito dos seus contactos com o recorrente, o Conselho considera ter verificado os argumentos por ele invocados ao ter colocado questões precisas e obtido esclarecimentos junto da PGU. Além disso, o recorrente exerceu o seu direito de ser representado por um advogado na Ucrânia nos processos que lhe diziam respeito e fez um uso útil dos seus direitos, pelo que os seus recursos foram por vezes bem‑sucedidos.

52      Aliás, não resulta da correspondência que o recorrente enviou ao Conselho que tenha utilizado as vias de oposição ou de impugnação disponíveis ao abrigo do Código de Processo Penal relativamente a determinadas situações processuais, tais como a suspensão das investigações ou o facto de estas não terem sido concluídas dentro do prazo previsto.

53      Além disso, o Conselho recorda que foram proferidas várias decisões judiciais em relação ao recorrente. Trata‑se da concessão da autorização de detenção para a sua comparência em juízo por parte do juiz de instrução do Tribunal Distrital de Petchersk em Kiev, da autorização de 1 de março de 2017 para conduzir a investigação relativa ao processo com a referência 42017000000000113 (a seguir «processo 113») e da decisão que autoriza a abertura de um inquérito especial à revelia no âmbito do processo com a referência 42014000000000521 (a seguir «processo 521»). Resulta, ainda, de outros elementos, como, por exemplo, a notificação de 21 de abril de 2017 aos advogados do recorrente sobre o fim da investigação judicial que lhes deu acesso ao processo, que os direitos de defesa e o direito a uma proteção jurisdicional efetiva do recorrente foram respeitados no âmbito dos processos que lhe diziam respeito.

54      Assim, os advogados do recorrente tinham sido efetivamente informados dos processos em curso, mas utilizaram o facto de este não estar na Ucrânia para invocar vícios processuais e para o impedir de comparecer perante os tribunais.

55      Finalmente, o Conselho considera que pôde verificar que tinham sido adotadas várias decisões durante a condução do processo penal no respeito pelos direitos de defesa e de uma proteção jurisdicional efetiva do recorrente.

56      No que se refere aos argumentos do recorrente relativos à duração excessiva dos inquéritos e à sua não incriminação, o Conselho observa que solicitou e obteve esclarecimentos sobre esta questão junto das autoridades ucranianas e que as investigações do processo 113 e do processo 521 foram encerradas em 2017 e outubro de 2018, respetivamente, o que indica uma evolução processual.

57      O Conselho afirma ainda que, contrariamente ao alegado pelo recorrente, baseou‑se em factos suficientemente sólidos, na medida em que apresentou elementos que provam, por um lado, a existência de processos penais contra o recorrente relativamente a um desvio de fundos pertencentes ao Estado ucraniano e, por outro, o respeito dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo.

58      Na sua resposta à questão referida no n.o 40 supra, o Conselho alega, por último, que resulta de toda a troca de correspondência com o recorrente que verificou com a PGU os argumentos invocados nas cartas do recorrente, colocando questões específicas e obtendo esclarecimentos adicionais.

59      Resulta de jurisprudência assente que, aquando da fiscalização de medidas restritivas, os órgãos jurisdicionais da União Europeia devem assegurar a fiscalização, em princípio integral, da legalidade de todos os atos da União em relação aos direitos fundamentais que fazem parte da ordem jurídica da União, entre os quais figuram, nomeadamente, o direito a uma proteção jurisdicional efetiva e os direitos de defesa, conforme consagrados nos artigos 47.o e 48.o da Carta (v. Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 40 e jurisprudência referida; v. igualmente, nesse sentido, Acórdão de 26 de setembro de 2019, Klymenko/Conselho, C‑11/18 P, não publicado, EU:C:2019:786, n.os 21 e 22 e jurisprudência referida).

60      A efetividade da fiscalização jurisdicional garantida pelo artigo 47.o da Carta exige que, ao fiscalizar a legalidade dos fundamentos em que se baseia a decisão de incluir ou de manter o nome de uma pessoa na lista de pessoas objeto de medidas restritivas, o juiz da União se certifique de que essa decisão, que reveste alcance individual para essa pessoa, assente numa base factual suficientemente sólida. Isso implica uma verificação dos factos alegados na exposição de motivos subjacente à referida decisão, de modo a que a fiscalização jurisdicional não se limite à apreciação da verosimilhança abstrata dos fundamentos invocados, mas incida sobre a questão de saber se estes fundamentos, ou, pelo menos um deles, considerado suficiente, por si só, para apoiar os referidos atos, são justificados (v. Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 41 e jurisprudência referida).

61      A adoção e a manutenção de medidas restritivas como as previstas na Decisão 2014/119 e no Regulamento n.o 208/2014, conforme alterados, tomadas contra uma pessoa que tenha sido identificada como responsável por um desvio de fundos pertencentes a um Estado terceiro, assentam, em substância, na decisão de uma autoridade deste, competente a este respeito, de instaurar e de conduzir um inquérito penal relativo a essa pessoa e relativo a um crime de desvio de fundos públicos (v. Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 42 e jurisprudência referida).

62      Da mesma forma, embora, ao abrigo do critério de inclusão, conforme recordado no n.o 13 supra, o Conselho possa basear medidas restritivas na decisão de um Estado terceiro, a obrigação que incumbe a esta instituição, de respeitar os direitos de defesa e o direito a uma proteção jurisdicional efetiva, implica que aquele deve garantir o respeito dos referidos direitos pelas autoridades do Estado terceiro que adotou a referida decisão (v. Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 43 e jurisprudência referida).

63      A exigência de verificação, pelo Conselho, de que as decisões dos Estados terceiros em que pretende basear‑se foram adotadas no respeito dos referidos direitos visa garantir que a adoção ou a manutenção das medidas de congelamento de fundos só se verifique com uma base factual suficientemente sólida e, deste modo, proteger as pessoas ou as entidades em causa. Assim, o Conselho só pode considerar que a adoção ou a manutenção de tais medidas assenta numa base factual suficientemente sólida depois de ele próprio ter verificado se os direitos de defesa e o direito a uma proteção jurisdicional efetiva foram respeitados aquando da adoção da decisão do Estado terceiro em causa na qual pretende basear‑se (v. Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 44 e jurisprudência referida).

64      Por outro lado, embora o facto de o Estado terceiro fazer parte dos Estados que aderiram à CEDH implique uma fiscalização, pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH»), dos direitos fundamentais garantidos pela CEDH, os quais, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 3, TUE, fazem parte do direito da União como princípios gerais, esse facto não pode, contudo, tornar supérfluo o requisito da verificação recordado no n.o 63 supra (v. Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 45 e jurisprudência referida).

65      Segundo a jurisprudência, o Conselho está obrigado a apresentar, na exposição de motivos relativos à adoção ou à manutenção das medidas restritivas contra uma pessoa ou uma entidade, nem que seja de forma sucinta, as razões pelas quais considera que a decisão do Estado terceiro na qual pretende basear‑se foi adotada no respeito dos direitos de defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva. Assim, cabe ao Conselho, a fim de satisfazer o seu dever de fundamentação, indicar, na decisão que impõe medidas restritivas, que verificou se a decisão do Estado terceiro, em que baseia essas medidas, foi adotada respeitando esses direitos (v. Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 46 e jurisprudência referida).

66      Em última análise, quando baseia a adoção ou a manutenção de medidas restritivas, como as do caso em apreço, na decisão de um Estado terceiro de instaurar e de conduzir um processo penal por desvio de fundos ou ativos públicos por parte da pessoa em causa, o Conselho deve, por um lado, assegurar‑se de que, no momento da adoção da referida decisão, as autoridades desse Estado terceiro respeitaram os direitos de defesa e o direito a uma proteção jurisdicional efetiva da pessoa que é objeto do processo penal em causa e, por outro, mencionar, na decisão que impõe medidas restritivas, as razões pelas quais considera que a referida decisão do Estado terceiro foi adotada no respeito desses direitos (Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 47).

67      É à luz destes princípios jurisprudenciais que se deve analisar se o Conselho cumpriu essas obrigações.

68      A título preliminar, há que salientar que, embora seja verdade que o Conselho referiu, nos atos impugnados (v. n.o 32 supra), as razões pelas quais tinha considerado que a decisão das autoridades ucranianas de instaurar e de conduzir um processo penal por desvio de fundos ou ativos públicos em relação ao recorrente tinha sido adotada no respeito dos direitos da defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva, deve, no entanto, verificar‑se se o Conselho considerou corretamente que essas autoridades tinham, no âmbito dos processos em que se basearam os atos impugnados, respeitado esses direitos do recorrente.

69      Com efeito, o exame do mérito da fundamentação, que faz parte da legalidade material dos atos impugnados e que consiste, no caso concreto, em verificar se os elementos invocados pelo Conselho estão demonstrados e se são suscetíveis de demonstrar a verificação do respeito desses direitos pelas autoridades ucranianas, deve distinguir‑se da questão da fundamentação, que diz respeito a uma formalidade essencial (v., nesse sentido, Acórdão de 15 de novembro de 2012, Conselho/Bamba, C‑417/11 P, EU:C:2012:718, n.os 60 e 61) e constitui apenas o corolário da obrigação do Conselho de assegurar, antecipadamente, que os referidos direitos sejam respeitados.

70      Ora, o recorrente foi objeto de novas medidas restritivas adotadas pelos atos impugnados com fundamento no critério de inclusão enunciado no artigo 1.o, n.o 1, da Decisão 2014/119, conforme especificado na Decisão 2015/143, e no artigo 3.o do Regulamento n.o 208/2014, conforme especificado no Regulamento 2015/138 (v. n.os 13 e 14 supra). Este critério prevê o congelamento dos fundos de pessoas que foram identificadas como sendo responsáveis por desvios de fundos públicos pertencentes ao Estado ucraniano, incluindo as que são alvo de um inquérito pelas autoridades ucranianas.

71      Há que observar que, para decidir sobre a manutenção do nome do recorrente na lista, o Conselho se baseou na circunstância de este ser objeto de um processo penal por parte das autoridades ucranianas por infrações constitutivas de desvio de fundos ou ativos públicos relacionados com um abuso de poder, cuja existência foi demonstrada pelas cartas da PGU, das quais o recorrente tinha recebido cópia (v. n.o 30 supra).

72      A manutenção das medidas restritivas tomadas contra o recorrente assentava, portanto, como nos processos que deram origem ao Acórdão de 26 de setembro de 2019, Klymenko/Conselho (C‑11/18 P, não publicado, EU:C:2019:786), e ao Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho (T‑274/18, EU:T:2019:509), na decisão das autoridades ucranianas de iniciar e conduzir um processo penal relativo à infração de desvio de fundos pertencentes ao Estado ucraniano.

73      Há igualmente que salientar que, ao alterar, através dos atos impugnados, o anexo da Decisão 2014/119 e o Anexo I do Regulamento n.o 208/2014, o Conselho aditou uma nova secção, inteiramente dedicada aos direitos de defesa e ao direito a uma proteção jurisdicional efetiva, que se divide em duas partes.

74      Na primeira parte figura uma mera recapitulação, de ordem geral, dos direitos de defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva nos termos do Código de Processo Penal. Em especial, antes de mais, são recordados os diferentes direitos processuais de que goza qualquer pessoa suspeita ou constituída arguida num processo penal nos termos do artigo 42.o do Código de Processo Penal. Em seguida, por um lado, recorda‑se que, nos termos do artigo 306.o deste mesmo código, as reclamações contra decisões, atos ou omissões da autoridade de investigação ou do Ministério Público têm de ser examinadas por um juiz de instrução ou pelo tribunal local, na presença do reclamante ou do seu advogado de defesa ou representante legal. Por outro lado, indica‑se, nomeadamente, que o artigo 309.o do referido código especifica as decisões do juiz de instrução que podem ser impugnadas por via de recurso. Por último, precisa‑se que um certo número de medidas de investigação processuais, como a apreensão de bens e as medidas de detenção, só são possíveis se o juiz de instrução ou um tribunal assim decidir.

75      A segunda parte da secção diz respeito à aplicação dos direitos de defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva a cada uma das pessoas incluídas na lista. No que respeita mais especificamente ao recorrente, precisa‑se que, segundo as informações que figuram no dossiê do Conselho, os seus direitos de defesa e o seu direito a uma proteção jurisdicional efetiva foram respeitados nos processos penais em que o Conselho se baseou, o que é comprovado, em especial, pela decisão do juiz de instrução de 5 de outubro de 2018 (v. n.o 32, supra).

76      Há que salientar também que, na carta de 5 de março de 2019 (v. n.o 33 supra), o Conselho, por um lado, limitou‑se a indicar que as cartas da PGU estabeleciam que o recorrente continuava a ser objeto dos processos 113 e 521 por desvio de fundos ou ativos públicos e, por outro, no que diz respeito aos direitos de defesa e ao direito a uma proteção jurisdicional efetiva do recorrente, referiu‑se expressamente apenas ao processo 521, especificando que resultava da decisão do juiz de instrução de 5 de outubro de 2018 que esses direitos tinham sido respeitados no caso em apreço. O respeito desses direitos decorre da circunstância de a referida decisão ter sido tomada na sequência de uma audiência pública com a participação da defesa. Além disso, através desta, considerou‑se que o recorrente era um suspeito no referido processo penal, que o seu nome estava incluído numa «lista das pessoas procuradas», que a acusação tinha demonstrado suspeitas razoáveis e que havia razões para crer que se escondia das autoridades responsáveis pelo inquérito preliminar.

77      Daqui decorre que apesar de na sua carta de 5 de março de 2019 (v. n.o 33 supra), o Conselho ter também referido o processo 113, o processo 521 é o único em relação ao qual declara ter efetivamente verificado que os direitos de defesa e o direito a uma proteção jurisdicional efetiva do recorrente foram respeitados.

78      A este respeito, deve observar‑se, a título preliminar, que o Conselho ainda não demonstrou em que medida a decisão do juiz de instrução de 5 de outubro de 2018, que é um ato de natureza meramente processual, demonstra o respeito dos direitos de defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva do recorrente durante o processo 521. Com efeito, como foi recordado nos n.os 61 e 62 supra, no caso em apreço, o Conselho estava obrigado a verificar, antes de decidir sobre a manutenção das medidas restritivas em causa, se a decisão da administração judicial ucraniana de instaurar e conduzir processos de inquérito penal relativos às infrações inerentes ao desvio de fundos ou ativos públicos e ao abuso de poder cometidos pelo titular de um cargo público tinha sido adotada no respeito pelos referidos direitos do recorrente.

79      Nesta perspetiva, a decisão do juiz de instrução de 5 de outubro de 2018, que é totalmente incidental no processo 521, não pode ser identificada, pelo menos a nível formal, como a de início e condução do processo de inquérito que justifica a manutenção das medidas restritivas. No entanto, é possível admitir que, de um ponto de vista substantivo, uma vez que foi adotada por um juiz, essa decisão foi efetivamente tomada pelo Conselho como sendo a base factual que justifica a manutenção das medidas em causa. É portanto necessário verificar se o Conselho teve razão em considerar que a mesma comprovava o respeito pelos direitos de defesa e pelo direito a uma proteção jurisdicional efetiva do recorrente.

80      Ora, contrariamente ao que alega o Conselho, não resulta claramente da decisão do juiz de instrução de 5 de outubro de 2018 que esses direitos foram garantidos ao recorrente no caso em apreço. A este respeito, embora seja verdade, como sublinha o Conselho na sua carta de 5 de março de 2019 (v. n.o 33 supra), que a referida decisão foi adotada na sequência de uma audiência pública com a participação de um representante da defesa e que o juiz de instrução aí concluiu que o recorrente era um suspeito, que estava incluído numa «lista das pessoas procuradas», que o Ministério Público tinha feito prova de uma suspeita razoável e que havia motivos para crer que o recorrente se escondia das autoridades responsáveis pelo inquérito preliminar, não é menos verdade que resultava dos documentos dos autos que o Conselho tinha examinado as informações que o recorrente lhe tinha comunicado nas suas cartas de 19 de dezembro de 2018 e de 4 de fevereiro de 2019.

81      Com efeito, o recorrente tinha alegado, apoiando‑se em documentos, primeiro, que, contrariamente às informações que a PGU tinha fornecido ao juiz de instrução, o seu nome não estava inscrito na lista das pessoas procuradas a nível internacional elaborada pela Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol) (a seguir «lista das pessoas procuradas pela Interpol»), segundo, que, na audiência perante o referido juiz, tinha sido representado não pelos advogados que tinha designado, mas por um advogado oficioso que não podia assegurar uma defesa adequada, e, terceiro, que, por um lado, os requisitos para autorizar um processo à revelia não estavam preenchidos no caso concreto, e, por outro, que a decisão do juiz de instrução de 5 de outubro de 2018 violava o direito a uma proteção jurisdicional efetiva na medida em que não podia ser objeto de recurso.

82      A este respeito, em primeiro lugar, há que salientar que não resulta dos documentos dos autos que o Conselho tenha verificado em que medida uma decisão, como a do presente caso, que não podia ser objeto de recurso, se conciliava com o artigo 42.o do Código de Processo Penal, expressamente referido na secção dos atos impugnados relativa aos direitos de defesa e ao direito a uma proteção jurisdicional efetiva (v. n.o 74 supra), nos termos do qual o suspeito tem o direito de «contestar decisões, atos e omissões da autoridade de investigação, do Ministério Público e do juiz de instrução».

83      Em segundo lugar, não resulta dos documentos dos autos que o Conselho tenha verificado, apesar das informações que lhe foram apresentadas pelo recorrente, as razões pelas quais este não foi representado por advogados por ele designados, mas por um advogado oficioso.

84      Mais especificamente, é verdade, como recorda o Conselho, que, em janeiro de 2019, recebeu, em resposta a um pedido dirigido às autoridades ucranianas que visava, nomeadamente, a questão de saber se o recorrente tinha sido representado por um advogado na audiência perante o juiz de instrução, a carta da PGU, datada de 22 de janeiro de 2019, na qual se indicava que a defesa do recorrente tinha sido assegurada por um advogado do centro de assistência jurídica gratuita atribuído oficiosamente pelo juiz de instrução. No entanto, há que salientar, por um lado, que o recorrente, na sua carta de 4 de fevereiro de 2019, enviada no prazo fixado pelo Conselho em resposta à sua carta de 25 de janeiro de 2019, se queixou do facto de não ter sido representado pelos advogados por si designados, e não da falta de representação legal, e, por outro, que o Conselho se limitou à resposta da PGU, que, aliás, apenas reproduz grande parte da decisão do juiz de instrução, sem realmente ter em conta os elementos invocados pelo recorrente no que diz respeito à designação pelo juiz de instrução de um advogado oficioso.

85      Com efeito, resulta da decisão do juiz de instrução de 5 de outubro de 2018 que este estava informado da existência de um advogado designado pelo recorrente, uma vez que afirma ter‑lhe comunicado a nova notificação de suspeição emitida em 6 de março de 2018. Nestas circunstâncias, o Conselho, que é responsável, em caso de contestação, por determinar o mérito dos fundamentos apresentados contra a pessoa em causa (v., nesse sentido, Acórdão de 26 de setembro de 2019, Klymenko/Conselho, C‑11/18 P, não publicado, EU:C:2019:786, n.o 38 e jurisprudência referida), não cumpriu, no caso em apreço, a sua obrigação de garantir que os direitos de defesa do recorrente tinham sido respeitados no âmbito do processo 521.

86      Em terceiro lugar, não resulta dos documentos dos autos, por um lado, quais as informações em que o juiz de instrução se baseou para considerar que o nome do recorrente estava inscrito na lista de pessoas procuradas pela Interpol e, por outro, quais as razões pelas quais o Conselho se limitou a meras afirmações da PGU e do juiz de instrução a esse respeito, apesar de todos os documentos enviados pelo recorrente demonstrarem que o seu nome não figurava na lista das pessoas procuradas pela Interpol.

87      Por outro lado, este último aspeto não é irrelevante no âmbito da apreciação do respeito dos direitos de defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva do recorrente, à luz do artigo 297.o‑4 do Código de Processo Penal, nos termos do qual o facto de estar inscrito numa lista das pessoas procuradas interestadual ou internacional é um dos dois requisitos que o Ministério Público deve demonstrar quando pede autorização para poder proceder à revelia.

88      A este respeito, há que salientar que, na sua decisão de 5 de outubro de 2018, o juiz de instrução indica os dois requisitos sem todavia se pronunciar expressamente sobre o requisito relativo à inclusão do nome da pessoa em causa na lista. Quanto à PGU, não se pode deixar de observar que se limita a indicar, na sua carta de 22 de janeiro de 2019, que, em 5 de junho de 2014, o nome do recorrente tinha sido incluído numa lista internacional das pessoas procuradas e que as informações correspondentes tinham sido registadas no processo do Secretariado‑Geral da Interpol, mas que foram em seguida bloqueadas até ao exame da queixa devido às impugnações apresentadas pelo recorrente.

89      Em quarto lugar, no que se refere ao respeito do direito do recorrente a ser julgado num prazo razoável, não resulta das cartas da PGU a razão pela qual, tendo em conta a ausência prolongada do recorrente do território ucraniano, de que as autoridades ucranianas tinham sido informadas, só foi apresentado ao juiz de instrução um pedido para proceder à revelia em 9 de julho de 2018, ou seja, mais de quatro anos após a abertura do inquérito preliminar.

90      Impõe‑se igualmente constatar que a versão integral da decisão de proceder à revelia foi apresentada pela PGU em resposta a uma questão do Conselho de 18 de janeiro de 2019 e que, até à adoção dos atos impugnados, o Conselho não foi informado pelas autoridades ucranianas sobre o estado de adiantamento do processo 521 à luz da referida decisão de autorização de proceder à revelia, nem tomou a iniciativa de pedir informações a essas autoridades a esse respeito. Aliás, na carta de 22 de janeiro de 2019, a PGU limitou‑se a indicar que uma acusação contra o recorrente seria enviada ao tribunal, quando a defesa se tivesse familiarizado com os elementos da ação penal em curso.

91      Relativamente ao argumento que o Conselho pretende retirar da existência de outras decisões judiciais proferidas contra o recorrente (v. n.o 53 supra), importa salientar, como já foi feito no processo que deu origem ao Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho (T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 81), que se inserem no âmbito das ações penais que justificaram a inscrição e a manutenção do nome do recorrente na lista e são meramente incidentais à luz destas, na medida em que são de natureza cautelar ou processual.

92      Ora, essas decisões, que podem, no máximo, servir para demonstrar a existência de uma base factual suficientemente sólida, ou seja, o facto de, em conformidade com o critério de inclusão, o recorrente ser objeto de processos penais relativos, nomeadamente, a uma infração de desvio de fundos ou de ativos pertencentes ao Estado ucraniano, não são ontologicamente suscetíveis, só por si, de demonstrar que a decisão da administração judicial ucraniana de instaurar e conduzir os referidos processos penais, na qual assenta, em substância, a manutenção das medidas restritivas contra o recorrente, foi tomada no respeito pelos seus direitos de defesa e pelo direito a uma proteção jurisdicional efetiva.

93      Além disso, quanto à circunstância de o recorrente ter admitido ter tido acesso, em 21 de abril de 2017, ao processo de que a PGU dispunha a seu respeito, deve concluir‑se que se trata de uma condição necessária, mas certamente insuficiente, para considerar que os seus direitos de defesa e o seu direito a uma proteção jurisdicional efetiva foram respeitados (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 88).

94      Em todo o caso, o Conselho não invoca nenhum documento dos autos que tenha conduzido à adoção dos atos impugnados do qual resulte que examinou as decisões dos órgãos jurisdicionais ucranianos, invocadas de forma genérica, e que daí pôde concluir que os direitos processuais do recorrente tinham sido respeitados na sua substância.

95      Além disso, o Conselho também não explica como é que a existência dessas decisões judiciais permite considerar que a proteção dos direitos em questão foi garantida, quando, como o recorrente alegou nas cartas enviadas ao Conselho, o processo 521, que tinha sido iniciado em abril de 2014 e dizia respeito a factos alegadamente cometidos entre 2011 e 2014, se encontrava ainda na fase do inquérito preliminar e o processo em causa não tinha sido submetido a um tribunal ucraniano quanto ao mérito, mas o tinha sido, quando muito, apenas por questões processuais.

96      Ora, o artigo 47.o, segundo parágrafo, da Carta, que constitui um critério em função do qual o Conselho aprecia o respeito pelo direito a uma proteção jurisdicional efetiva, prevê que qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido pela lei (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 84 e jurisprudência referida).

97      Na medida em que a Carta contenha direitos correspondentes aos direitos garantidos pela CEDH, como os previstos no artigo 6.o, o sentido e o âmbito desses direitos são, nos termos do artigo 52.o, n.o 3, da Carta, iguais aos conferidos pela CEDH.

98      A este respeito, há que recordar que, ao interpretar o artigo 6.o da CEDH, por um lado, o TEDH salientou que o objetivo do princípio do prazo razoável era, nomeadamente, proteger a pessoa acusada contra a lentidão excessiva do processo e evitar que fique demasiado tempo na incerteza do seu destino, bem como os atrasos suscetíveis de comprometer a eficácia e a credibilidade da administração da justiça (v. TEDH, 7 de julho de 2015, Rutkowski e o./Polónia, CE:ECHR:2015:0707JUD007228710, n.o 126 e jurisprudência referida). Por outro lado, o TEDH considerou que a violação deste princípio podia ser constatada, nomeadamente, quando a fase de instrução de um processo penal se caracterizasse por um certo número de fases de inatividade imputáveis às autoridades competentes para essa instrução (v., nesse sentido, TEDH, 6 de janeiro de 2004, Ruille/França, CE:ECHR:2004:0106JUD005026899, n.os 29 a 31; 27 de setembro de 2007, Reiner e o./Roménia, CE:ECHR:2007:0927JUD 000150502, n.os 57 a 59, e 12 de janeiro de 2012, Borisenko/Ucrânia, CE:ECHR:2012:0112JUD 002572502, n.os 58 a 62).

99      Por outro lado, resulta da jurisprudência que, quando uma pessoa é objeto de medidas restritivas desde há vários anos, e isso em razão da existência, em substância, do mesmo inquérito preliminar conduzido pela PGU, o Conselho está obrigado a aprofundar a questão da eventual violação dos direitos fundamentais dessa pessoa pelas autoridades ucranianas (v., nesse sentido, Acórdão de 30 de janeiro de 2019, Stavytskyi/Conselho, T‑290/17, EU:T:2019:37, n.o 132).

100    Por conseguinte, no caso em apreço, o Conselho deveria, pelo menos, ter indicado os motivos pelos quais, não obstante os argumentos do recorrente reproduzidos no n.o 95 supra, podia considerar que o direito deste a uma proteção jurisdicional efetiva perante a administração judicial ucraniana, que é, evidentemente, um direito fundamental, tinha sido respeitado no que respeita à questão de saber se a sua causa tinha sido julgada num prazo razoável (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 87).

101    Não se pode portanto concluir, com base nos documentos dos autos, que os elementos de que o Conselho dispunha no momento da adoção dos atos impugnados lhe permitiram verificar se a decisão da administração judicial ucraniana tinha sido tomada em conformidade com os direitos do recorrente a uma proteção jurisdicional efetiva e a que o seu caso fosse apreciado num prazo razoável.

102    Acresce, a este respeito, que importa também salientar que a jurisprudência segundo a qual, em caso de adoção de uma decisão de congelamento de fundos como a que diz respeito ao recorrente, cabe ao Conselho ou ao juiz da União verificar não o fundamento das investigações de que a pessoa visada por essas medidas era objeto na Ucrânia, mas apenas da decisão de congelamento dos fundos à luz do ou dos documentos em que essa decisão se baseou, não pode ser interpretada no sentido de que o Conselho não é obrigado a verificar se a decisão de um Estado terceiro na qual pretende basear a adoção de medidas restritivas foi adotada com respeito dos direitos de defesa e do direito a uma proteção jurisdicional efetiva (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 90 e jurisprudência referida).

103    À luz de todas as considerações precedentes, não está provado que o Conselho, antes da adoção dos atos impugnados, tenha assegurado que a administração judicial ucraniana respeitou os direitos de defesa e o direito a uma proteção jurisdicional efetiva do recorrente no âmbito dos processos penais em que se baseou. Daqui decorre que ao decidir manter o nome do recorrente na lista, o Conselho cometeu um erro de apreciação.

104    Nestas circunstâncias, há que anular os atos impugnados na parte em que dizem respeito ao recorrente, sem que seja necessário examinar os outros fundamentos e argumentos invocados por este último.

105    Tendo em conta o pedido apresentado pelo Conselho a título subsidiário (v. n.o 43, terceiro travessão, supra), no qual se pede, em substância, a manutenção dos efeitos da Decisão 2019/354 até terminar o prazo previsto para a interposição do recurso e, no caso de ser interposto um recurso, até à decisão que se pronuncia sobre este, basta referir que a Decisão 2019/354 só produziu efeitos até 6 de março de 2020. Por conseguinte, a anulação desta pelo presente acórdão não tem consequências para o período posterior a essa data, pelo que não é necessário decidir sobre a questão da manutenção dos efeitos desta decisão (v. Acórdão de 11 de julho de 2019, Klymenko/Conselho, T‑274/18, EU:T:2019:509, n.o 93 e jurisprudência referida).

 Quanto às despesas

106    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas, se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o Conselho sido vencido, há que condená‑lo nas despesas, em conformidade com os pedidos do recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

1)      A Decisão (PESC) 2019/354 do Conselho, de 4 de março de 2019, que altera a Decisão 2014/119/PESC que impõe medidas restritivas dirigidas a certas pessoas, entidades e organismos, tendo em conta a situação na Ucrânia, e o Regulamento de Execução (UE) 2019/352 do Conselho, de 4 de março de 2019, que dá execução ao Regulamento (UE) n.o 208/2014 que impõe medidas restritivas dirigidas a certas pessoas, entidades e organismos, tendo em conta a situação na Ucrânia, são anulados na parte em que o nome de Oleksandr Viktorovych Klymenko foi mantido na lista de pessoas, entidades e organismos aos quais se aplicam essas medidas restritivas.

2)      O Conselho da União Europeia é condenado nas despesas.

Spielmann

Spineanu‑Matei

Mastroianni

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 25 de junho de 2020.

Assinaturas


*      Língua do processo: francês.