Language of document : ECLI:EU:T:2013:260

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

17 de maio de 2013 (*)

«Concorrência ― Acordos, decisões e práticas concertadas ― Mercado europeu das mangueiras marinhas ― Decisão que declara uma infração ao artigo 81.° CE e ao artigo 53.° do Acordo EEE ― Fixação de preços, repartição do mercado e trocas de informações comercialmente sensíveis ― Conceito de infração continuada ou repetida ― Prescrição ― Dever de fundamentação ― Igualdade de tratamento ― Confiança legítima ― Coimas ― Gravidade e duração da infração ― Circunstâncias atenuantes ― Cooperação»

No processo T‑154/09,

Manuli Rubber Industries SpA (MRI), com sede em Milão (Itália), representada por L. Radicati di Brozolo, M. Pappalardo e E. Marasà, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por V. Di Bucci, S. Noë e L. Prete, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto, a título principal, um pedido de anulação parcial da Decisão C(2009) 428 final da Comissão, de 28 de janeiro de 2009, relativa a um processo nos termos do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/39406 ― Mangueiras marinhas), na parte respeitante à recorrente, e, a título subsidiário, um pedido de anulação ou de redução substancial da coima que lhe foi aplicada nessa decisão,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),

composto por: J. Azizi, presidente, M. Prek e S. Frimodt Nielsen (relator), juízes,

secretário: J. Weychert, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 26 de abril de 2012,

profere o presente

Acórdão

 Factos na origem do litígio

A ―  Setor das mangueiras marinhas destinadas ao petróleo e ao gás

1        As mangueiras marinhas são utilizadas para carregar petróleo bruto doce ou transformado e outros produtos petrolíferos em embarcações a partir de instalações offshore (por exemplo, boias ― normalmente ancoradas ao largo e que servem de amarração aos petroleiros ―, instalações flutuantes de extração, armazenagem e descarga ― que são sistemas de cisternas flutuantes utilizadas para extrair o petróleo ou o gás de uma plataforma vizinha, tratá‑los e armazená‑los até ao seu transbordo para um petroleiro) e para o seu posterior descarregamento em instalações offshore ou em terra (por exemplo, boias ou molhes).

2        As mangueiras marinhas são utilizadas offshore ― isto é, dentro ou próximo de água ― enquanto as mangueiras industriais ou terrestres são utilizadas em terra.

3        Cada instalação de mangueiras marinhas comporta, consoante as necessidades específicas dos clientes, um certo número de mangueiras‑tipo, de mangueiras específicas com junções nas duas extremidades e dispositivos complementares, como válvulas, uma engrenagem terminal ou ainda um equipamento flutuante. No caso, a expressão «mangueiras marinhas» engloba esses dispositivos complementares.

4        As mangueiras marinhas são utilizadas por companhias petrolíferas, fabricantes de boias, terminais portuários, pela indústria petrolífera e pelos governos, e são compradas para novos projetos ou para efeitos de substituição.

5        Quanto aos novos projetos, os terminais petrolíferos ou os outros utilizadores finais contratam geralmente uma sociedade de engenharia (também chamada «construtor de material», «construtor OEM» ou «fornecedor de equipamento») para construir ou instalar novas instalações de distribuição petrolífera, como os sistemas de amarração num ponto único ou as instalações flutuantes de extração, de armazenagem e de descarga. Para esses projetos, o fornecedor de equipamento compra uma instalação completa de mangueiras marinhas a um produtor.

6        Quando essas mangueiras marinhas estão instaladas, as peças individuais devem ser substituídas num período de entre um e sete anos. As compras de mangueiras marinhas para fins de substituição (também conhecidas com o nome «setor das peças sobressalentes») são muitas vezes efetuadas diretamente pelos utilizadores finais. Contudo, em certos casos, estes subcontratam e centralizam as suas compras junto de filiais ou de empresas externas. As vendas para fins de substituição representam mundialmente uma parte do mercado das mangueiras marinhas maior do que as vendas de novos produtos.

7        A procura de mangueiras marinhas depende em grande parte do desenvolvimento do setor petrolífero e, em particular, da exploração do petróleo nas zonas distantes do lugar do consumo. A procura cresceu ao longo do tempo. É cíclica e, em certa medida, está ligada ao desenvolvimento dos preços do petróleo. Começou a ser significativa no final dos anos 60 e aumentou no início dos anos 70, em particular nas regiões produtoras de petróleo no Golfo Pérsico, no Mar do Norte e no Norte de África. Nos anos 80, aumentou a procura pelas empresas petrolíferas nacionais em desenvolvimento da América do Sul. No final dos anos 90, a procura deslocou‑se para a África Ocidental.

8        As mangueiras marinhas são fabricadas por empresas conhecidas pelo fabrico de pneus e de cauchu ou por uma das suas spin‑off. São produzidas a pedido, conforme as necessidades dos clientes. Uma vez que a procura de mangueiras marinhas está amplamente dispersa no plano geográfico, a maior parte dos produtores de mangueiras marinhas contratam um número significativo de agentes que, em mercados específicos, fornecem serviços gerais de marketing e propõem os seus produtos no âmbito de concursos publicados.

9        As mangueiras marinhas são comercializadas em todo o mundo e os principais produtores têm atividade à escala internacional. As exigências regulamentares aplicáveis às mangueiras marinhas não são fundamentalmente diferentes de um país para outro e, embora as exigências técnicas sejam diferentes consoante o ambiente e as condições de utilização, isso não é considerado um obstáculo à venda de mangueiras marinhas em todo o mundo.

10      Por último, no período tido em conta na decisão recorrida, os participantes no cartel venderam mangueiras marinhas produzidas no Japão, no Reino Unido, em Itália e em França a utilizadores finais e a fornecedores de equipamentos estabelecidos em diferentes países da União Europeia e do Espaço Económico Europeu (EEE). Embora a maior parte dos sistemas de mangueiras marinhas tenha por destino final regiões não europeias, alguns dos principais fornecedores de equipamentos no mundo estão nos diversos países da União e do EEE.

B ―  Apresentação da recorrente

11      A recorrente, Manuli Rubber Industries SpA (MRI), é uma sociedade com atividade na conceção, fabrico e distribuição, em todo o mundo, de máquinas e de sistemas e componentes em cauchu/metal para o transporte de fluidos destinados a aplicações marítimas/petrolíferas e sistemas hidráulicos de alta pressão.

12      A recorrente é a sociedade de topo do grupo Manuli. Tem sede em Milão (Itália).

13      Em 2 de dezembro de 1984, a Manuli fundou a Uniroyal Manuli (USA) Inc., com sede no Delaware (Estados Unidos) e integralmente detida pela MRI. Seguidamente, essa sociedade foi denominada Uniroyal Manuli Rubber (USA) Inc. em 1986, Manuli Rubber Industries (USA) Inc. em 1990 e Manuli Oil & Marine (USA) Inc. (a seguir «MOM») em 1997. A sociedade foi liquidada em 31 de dezembro de 2006.

14      Desde a criação da MOM, as vendas e a comercialização das mangueiras marinhas da MRI à escala internacional foram levadas a cabo pela MOM.

15      [confidencial] (1).

16      [confidencial].

17      [confidencial].

18      Em janeiro de 2006, o setor das mangueiras marinhas foi colocado sob a autoridade do grupo de empresas Ingénierie e a MOM respondia perante o seu chefe.

19      Em 1 de janeiro de 2007, depois da liquidação da MOM, a atividade operacional das mangueiras marinhas foi adquirida pela MRI.

C ―  Procedimento administrativo

20      Tendo sido aberto um processo pelo ministério da Justiça dos Estados Unidos e pelas autoridades da concorrência do Japão e do Reino Unido por factos semelhantes, [confidencial], invocando o programa de clemência previsto na comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2006, C 298, p. 17) (a seguir «comunicação sobre a cooperação»), apresentou à Comissão das Comunidades Europeias, em 20 de dezembro de 2006, um pedido de imunidade, denunciando a existência de um cartel no mercado das mangueiras marinhas.

21      A Comissão abriu então uma investigação por violação do artigo 81.° CE e do artigo 53.° do Acordo EEE e procedeu, em 2 de maio de 2007, a uma série de inspeções junto da Parker ITR, de outros produtores envolvidos e ainda de [confidencial] e de W.

22      A MRI, a Parker ITR e a Bridgestone apresentaram respetivamente um pedido de clemência à Comissão em 4 de maio, 17 de julho e 7 de dezembro de 2007.

23      Em 28 de abril de 2008, a Comissão deduziu uma comunicação de acusações que notificou às diversas sociedades em causa entre 29 de abril e 1 de maio de 2008.

24      Todas responderam à comunicação de acusações no prazo previsto e pediram, com exceção de [confidencial]/DOM, da ContiTech AG e da Continental AG, para serem ouvidas numa audição, que decorreu em 23 de julho de 2008.

D ―  Decisão recorrida

25      Em 28 de janeiro de 2009, a Comissão aprovou a Decisão C (2009) 428 final, de 28 de janeiro de 2009, relativa a um processo nos termos do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/39406 — Mangueiras marinhas) (a seguir «decisão recorrida»). No essencial, resulta da decisão recorrida que:

¾        esta foi dirigida a onze sociedades, entre as quais as recorrentes;

¾        as empresas a que se refere essa decisão participaram, por vezes de forma diferente, numa infração única e complexa, que tinha por objeto:

¾        a atribuição de contratos;

¾        a fixação de preços;

¾        a fixação de quotas;

¾        o estabelecimento das condições de venda;

¾        a repartição dos mercados geográficos;

¾        o intercâmbio de informações sensíveis em matéria de preços, volumes de vendas e concursos para a adjudicação de contratos;

¾        o cartel começou pelo menos em 1 de abril de 1986 (embora seja possível que tenha começado no início dos anos 70) e chegou ao fim em 2 de maio de 2007;

¾        de 13 de maio de 1997 a 11 de junho de 1999, relativamente a algumas sociedades, a 21 de junho de 1999, relativamente a outras, e a 9 de maio de 2000 no que respeita à MRI, o cartel teve uma atividade limitada e surgiram fricções entre os seus membros; contudo, segundo a Comissão, isso não levou a uma verdadeira interrupção; com efeito, a estrutura organizada do cartel foi totalmente restabelecida a partir de junho de 1999 segundo as mesmas modalidades e com os mesmos participantes, com exceção da recorrente, que reintegrou plenamente o cartel em 9 de junho de 2000; consequentemente, havia que considerar que os produtores tinham cometido uma infração única e continuada de 1 de abril de 1986 a 2 de maio de 2007 ou, pelo menos, se, apesar de tudo, se viesse a considerar ter existido uma interrupção, uma infração única e repetida, quanto à recorrente, não se tomando em consideração o período entre 13 de maio de 1997 e 9 de junho de 2000 no cálculo da coima, tendo em conta o número limitado de provas da infração quanto a esse período;

¾        foi dada como provada a participação da recorrente na infração pelos períodos entre 1 de abril de 1986 e 1 de agosto de 1992 e entre 3 de setembro de 1996 e 2 de maio de 2007;

¾        segundo os critérios previstos nas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2, parágrafo a), do artigo 23.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003 (JO 2006, C 210, p. 2, a seguir «orientações»), o montante de base da coima a aplicar a cada uma das sociedades foi determinado da seguinte forma:

¾        a Comissão baseou‑se na média das vendas anuais mundiais de cada uma das sociedades no período 2004‑2006, com exceção da Yokohama Rubber, para a qual fixou o período 2003‑2005; a esse respeito, a Comissão teve em conta as vendas faturadas aos compradores estabelecidos no EEE;

¾        determinou as vendas relevantes de cada uma delas aplicando a sua quota de mercado mundial às vendas agregadas no EEE, em aplicação do n.° 18 das orientações;

¾        fixou 25% desse valor (em vez do máximo de 30% previsto nas orientações) atendendo à gravidade da infração;

¾        multiplicou o valor dessa forma obtido pelo número de anos de participação de cada sociedade na infração;

¾        em aplicação do n.° 25 das orientações, fixou um montante adicional igual a 25% das vendas relevantes para efeitos de dissuasão;

¾        seguidamente, a Comissão imputou circunstâncias agravantes à Parker ITR e à Bridgestone e rejeitou todas as circunstâncias atenuantes das outras sociedades;

¾        por último, nos termos da comunicação sobre a cooperação, a Comissão reduziu a coima [confidencial] (100%) e da MRI (30%) e indeferiu os pedidos de redução formulados pela Bridgestone e pela Parker ITR.

26      [confidencial].

27      Não foi tida em conta nenhuma circunstância atenuante a favor da MRI.

28      Contudo, foi‑lhe concedida uma redução da coima de 30% ao abrigo da comunicação sobre a cooperação, fixando‑se assim em 4 900 000 euros o montante da coima aplicada.

 Tramitação do processo e pedidos das partes

29      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 10 de abril de 2009, a recorrente interpôs o presente recurso.

30      Por impedimento de um membro da Primeira Secção, o presidente do Tribunal Geral, nos termos do artigo 32.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, nomeou outro juiz para completar a secção.

31      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal (Primeira Secção) deu início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, o Tribunal convidou as partes a apresentarem certos documentos e colocou‑lhes certas questões por escrito. As partes deram cumprimento ao solicitado.

32      Por requerimento de 25 de abril de 2012, a recorrente pediu a realização da audiência à porta fechada.

33      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões orais colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 26 de abril de 2012.

34      Nessa ocasião, a recorrente desistiu do pedido de audiência à porta fechada.

35      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾        a título principal:

¾        anular o artigo 1.° da decisão recorrida na parte que declara que participou numa infração única e continuada no mercado das mangueiras marinhas de 1 de abril de 1986 a 1 de agosto de 1992 e de 3 de setembro de 1996 a 2 de maio de 2007, nomeadamente no período entre 3 de setembro de 1996 e 9 de maio de 2000;

¾        anular o artigo 2.° da decisão recorrida na parte em que lhe aplica uma coima de 4 900 000 euros;

¾        julgar improcedentes todas as exceções e pedidos contrários;

¾        a título subsidiário:

¾        reduzir, de acordo com o artigo 229.° CE, a coima de 4 900 000 euros que lhe foi aplicada pelo artigo 2.° da decisão recorrida;

¾        condenar a Comissão nas despesas.

36      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

¾        negar provimento ao recurso;

¾        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

A ―  Quanto ao pedido de anulação

37      A recorrente apresenta três fundamentos em apoio do seu recurso de anulação.

38      O primeiro fundamento é relativo a um erro de qualificação da infração e a uma violação do artigo 253.° CE.

39      O segundo fundamento é relativo a diversos erros de apreciação na determinação da duração da infração, à violação dos artigos 81.° CE e 253.° CE e do artigo 2.° do Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO 2003, L 1, p. 1).

40      Subdivide‑se em seis partes, respetivamente relativas a erros na apreciação das provas tidas em conta pela Comissão (primeira parte), ao facto de esta não ter feito a prova que lhe cabia (segunda parte), ao facto de a recorrente ter apresentado provas contrárias e outra explicação plausível (terceira parte), à violação do princípio da igualdade de tratamento e a uma falta de fundamentação por erros de apreciação na comparação da conduta da MRI entre setembro de 1996 e maio de 1997 e da sua conduta entre maio de 1997 e maio de 2000 (quarta parte), à prescrição que deveria ter sido aplicada às distintas infrações individuais eventualmente cometidas no período 1996‑2000 (quinta parte) e ao facto de a utilização dos documentos que a MRI forneceu no âmbito do programa de clemência para demonstrar a existência de uma infração no período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997 ser contrária à comunicação sobre a cooperação e violar a sua confiança legítima (sexta parte).

41      O terceiro fundamento subdivide‑se em cinco partes, respetivamente relativas a um erro de apreciação da gravidade da infração e à violação do princípio da igualdade de tratamento (primeira parte), a um erro no cálculo da coima em função da duração da infração e a uma violação do princípio da confiança legítima (segunda parte), a uma aplicação errada de um agravamento para fins de dissuasão e a uma violação do dever de fundamentação e do princípio da igualdade de tratamento (terceira parte), à errada exclusão de circunstâncias atenuantes e à violação do dever de fundamentação (quarta parte) e a uma redução insuficiente da coima pela cooperação no âmbito do programa de clemência (quinta parte).

42      Há que analisar conjuntamente o primeiro fundamento e as seis partes do segundo fundamento.

B ―  Quanto ao primeiro fundamento, relativo a um erro de qualificação da infração e a uma violação do artigo 253.° CE, e quanto ao segundo fundamento, relativo a erros manifestos de apreciação na determinação da duração da infração e à violação dos artigos 81.° CE e 253.° CE e do artigo 2.° do Regulamento n.° 1/2003

1.     Decisão recorrida

43      No que respeita ao primeiro fundamento, resulta, no essencial, do considerando 412 da decisão recorrida que a Comissão entendeu que a MRI tinha interrompido a sua participação no cartel entre 1 de agosto de 1992 e 3 de setembro de 1996, que a prescrição se podia aplicar ao período da infração entre 1 de abril de 1986 e 1 de agosto de 1992 e que decidia, assim, não lhe aplicar qualquer coima por esse mesmo período. Resulta ainda do artigo 1.° da decisão recorrida que a Comissão considerou que tinha sido cometida uma infração continuada entre 1 de abril de 1986 e 2 de maio de 2007, na qual participou a MRI de 1 de abril de 1986 a 1 de agosto de 1992 e de 3 de setembro de 1996 a 2 de maio de 2007, e dos considerandos 187, 201 a 208 e 446 a 448 da decisão recorrida que o período da infração tomado em conta pela Comissão para efeitos de cálculo da coima se situa entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997 e entre 9 de maio de 2000 e 2 de maio de 2007, sendo o período entre 13 de maio de 1997 e 9 de maio de 2000 considerado, quanto à recorrente, um período de atividade reduzida do cartel que não justifica a aplicação de uma coima.

44      No que respeita ao segundo fundamento, resulta dos considerandos 141 a 147 da decisão recorrida que a Comissão, com base em diversos documentos, incluindo algumas notas internas comunicadas pela MRI no âmbito do seu pedido de clemência (considerandos 143 a 145 da decisão recorrida), considerou que esta tinha integrado ativamente o cartel a partir de 3 de setembro de 1996.

45      Os considerandos 148 a 187 da decisão recorrida expõem, por outro lado, os elementos de prova, incluindo vários documentos comunicados pela MRI no âmbito do seu pedido de clemência, nos quais a Comissão se baseou para considerar que, entre 13 de maio de 1997 e maio de 1999, o cartel tinha tido um período de atividade limitada, durante o qual foram estabelecidos contactos, que envolvem a recorrente, cujo objeto era, nomeadamente, relançar o cartel e negociar as condições de participação dos seus diversos membros. Contudo, a Comissão entendeu que, dado o caráter limitado da atividade dos membros do cartel, não lhes devia ser aplicada qualquer coima por esse período, prolongado, no que respeita à MRI, a 9 de maio de 2000 (considerando 447 da decisão recorrida).

46      Os considerandos 289 a 307 da decisão recorrida expõem seguidamente as razões pelas quais a Comissão considerou que a infração era continuada, ou, a título subsidiário, repetida, não obstante entender que o cartel tinha tido uma atividade limitada entre 13 de maio de 1997 e maio de 1999 e que não havia que aplicar qualquer coima por esse período.

47      Os considerandos 480 a 488 da decisão recorrida expõem, por último, as razões pelas quais a Comissão concede à MRI uma redução de 30% da coima ao abrigo da comunicação sobre a cooperação, mas rejeita a argumentação desta última no sentido de, ao abrigo do n.° 26 dessa comunicação, não serem utilizados contra ela os elementos de prova que forneceu à Comissão sobre o período 1996‑1997.

2.     Argumentos das partes

a)     Quanto ao primeiro fundamento

48      A recorrente considera, no essencial, que, uma vez que a Comissão admitiu, primeiro, que ela se tinha retirado do cartel entre 1 de agosto de 1992 e 3 de setembro de 1996, segundo, que isso era uma verdadeira interrupção e não uma suspensão da sua participação no cartel, no sentido em que a jurisprudência distingue esses dois conceitos (considerandos 129, 130 e 402 da decisão recorrida) e, terceiro, que devia, portanto, beneficiar das disposições relativas à prescrição quanto ao período anterior a 1992 (considerando 412 da decisão recorrida), uma vez que esse período não deve ser tido em consideração para efeitos de cálculo da coima, a Comissão não podia simultaneamente decidir que ela tinha participado numa infração complexa e continuada de 1 de abril de 1986 a 2 de maio de 2007, o que seria contrário às disposições do artigo 25.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003. O período posterior à retoma da sua participação no cartel não pode, portanto, ser considerado uma infração nova e distinta da anterior.

49      A recorrente contesta ainda, no essencial, que a prescrição lhe tenha sido reconhecida «de forma discricionária» pela Comissão, como esta afirma (considerando 412 da decisão recorrida).

50      Essa fundamentação é ainda contraditória e lacunar, segundo afirma.

51      A recorrente entende também que, face a essa interrupção da sua participação no cartel, a sua situação não pode ser comparada à dos outros membros do cartel.

52      A Comissão contesta essas alegações e afirma que não era obrigada a declarar a prescrição e que se limitou, portanto, a indicar que podia ser aplicada («may apply»).

b)     Quanto ao segundo fundamento

 Quanto à primeira parte

53      A recorrente alega que, para concluir pela sua participação no período 1996‑2000, a Comissão se baseia em certos documentos reveladores dos contactos entre ela e os seus concorrentes e que indicavam que, «no final de 1996, [ela] recomeçou a coordenar algumas propostas sobre as mangueiras marinhas com membros do cartel» (considerando 141 da decisão recorrida) e que, nesse período, ela «tirou partido das informações exaustivas sobre o mercado trocadas para supervisionar os acordos de atribuição dos contratos entre os membros do cartel» (considerando 147 da decisão recorrida).

54      Ora, no essencial, segundo afirma, os elementos de prova em que se baseia a Comissão [confidencial] não permitem chegar a essa conclusão e contesta quer a sua leitura quer a sua interpretação desses elementos de prova, admitindo que a Comissão pudesse validamente basear‑se nos elementos que ela própria lhe forneceu no âmbito da clemência para dar por provado o seu envolvimento no cartel no que respeita ao período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997, período tomado em consideração no cálculo da coima que lhe foi aplicada.

55      A Comissão contesta esta argumentação e precisa que a recorrente admite em várias ocasiões nos seus articulados que teve numerosos contactos proibidos com os seus concorrentes entre 1997 e 2000, apesar de tentar minimizar o seu alcance e significado.

 Quanto à segunda parte

56      A recorrente alega, no essencial, que as provas apresentadas pela Comissão não são suficientes para demonstrar que ela participou ex novo num plano comum no período em causa. Ora, segundo afirma, cabia à Comissão provar que ela tinha participado numa nova infração, visto ter saído completamente do cartel em 1992 e a infração relativa ao período anterior a 1992 estar prescrita. A Comissão não podia pois considerar suficientes os indícios com base nos quais presumia a continuação da sua participação. Ora, foi isso o que fez, baseando‑se erradamente na tese de que a infração era continuada desde 1986.

57      Além disso, a recorrente considera que, de qualquer forma, os indícios recolhidos pela Comissão demonstram a sua recusa expressa de responder favoravelmente às propostas de colaboração dos outros participantes no cartel.

58      A Comissão contesta esta argumentação.

 Quanto à terceira parte

59      Primeiro, a recorrente, por um lado, contesta, no essencial, não ter fornecido uma explicação plausível diferente da participação no acordo colusório dos elementos de prova apresentados pela Comissão (considerando 142 da decisão recorrida) e, por outro, opõe‑se à tese da Comissão de que, em primeiro lugar, a infração pode ser inferida por simples presunções uma vez que foram demonstradas trocas de informações e contactos ilícitos com os concorrentes, o que tem a consequência de caber à empresa dar seguidamente uma outra explicação plausível (considerando 262 da decisão recorrida).

60      Com efeito, a recorrente entende ter dado uma outra explicação, não só plausível mas sustentada em diversas provas ― o primeiro depoimento oral de [confidencial] ―, que permitiria considerar que não tinha participado no cartel entre 3 de setembro de 1986 e 9 de maio de 2000 e que apenas o reintegrou nessa data.

61      A esse respeito, alega que os documentos mencionados na decisão recorrida revelam que os contactos ocorridos eram, na realidade, o resultado dos esforços das outras empresas para tentarem convencê‑la a entrar no cartel e demonstram a estratégia de um dos seus dirigentes que consistia em «fingir uma vaga disposição para colaborar com os concorrentes», a fim de não os levar a porem em prática ações concertadas de boicote que poderiam ser perigosas para ela, como as que foram levadas a cabo pela Dunlop e pela Bridgestone, não deixando de operar no mercado de forma autónoma ou mesmo ofensiva para a concorrência.

62      Segundo, a recorrente alega, no essencial, que a Comissão ignorou indevidamente diversos documentos que sustentavam esta explicação e negou o seu valor probatório.

63      A recorrente entende, a esse respeito, que a Comissão, não deixando de admitir que os documentos em causa «confirmam […] que ela não fazia parte da estrutura formal do clube antes dessa data [9 de maio de 2000]», alega, porém, que «não contradizem a conclusão […] de que ela continuou a ter alguns tipos de contactos ilícitos com os outros membros do cartel e que estes a mantinham ao corrente da cooperação em curso» e ainda que esses contactos respeitavam a «uma cooperação no mercado das mangueiras marinhas», o que a levou a considerar que ela tinha igualmente participado no cartel entre 1997 e 9 de maio de 2000 (considerandos 146, 209 e 210 da decisão recorrida).

64      A recorrente entende que a Comissão parece assim basear‑se na jurisprudência segundo a qual o facto de cada um dos membros do cartel ter desempenhado um papel específico, adotando uma conduta que apenas inclui alguns dos elementos constitutivos da infração, não exclui a responsabilidade de cada uma das empresas por toda a infração, incluindo os atos praticados por outros participantes (considerandos 284 a 288 da decisão recorrida).

65      Ora, a recorrente considera que essa jurisprudência não é aplicável ao caso presente, uma vez que diz respeito à demonstração da participação num cartel por empresas cuja presença em reuniões destinadas à celebração de acordos anticoncorrenciais foi demonstrada e que não manifestaram o seu desacordo face ao cartel em causa.

66      Com efeito, está assente que ela saiu do cartel em 1992, devendo consequentemente os contactos havidos entre 1996 e 2000 ser apreciados em função da sua capacidade de demonstrar a adesão ex novo a um plano comum.

67      A Comissão não podia portanto limitar‑se a simples presunções.

68      Além disso, a recorrente afirma que, segundo acordo com a jurisprudência, não basta que a Comissão, para demonstrar a adesão ao plano comum prosseguido pelos outros membros do cartel, faça prova de que a recorrente tinha conhecimento da existência do cartel ou de que prosseguia o objetivo geral de restringir a concorrência no mercado das mangueiras marinhas ― o que de qualquer forma contesta ―, mas tem de demonstrar também que a sua conduta estava «estreitamente ligada» à realização de «todos os efeitos anticoncorrenciais pretendidos pelos seus autores, no âmbito de um plano global com um objetivo único». Ora, segundo a recorrente, os documentos em que se baseia a Comissão demonstram, na realidade, que não só a recorrente não tinha qualquer intenção de aderir ao plano comum prosseguido pelos outros produtores, mas também que preferia mesmo agir de forma oposta, não deixando de tentar, de forma compreensível, evitar represálias por parte dos seus concorrentes, visto que estes podiam agir de forma concertada para a excluir do mercado ou causar‑lhe graves prejuízos.

69      A recorrente considera ainda, no essencial, que, contra a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a Comissão não teve em conta o facto de, para apreciar a participação efetiva de uma empresa no cartel, é determinante a consciência que os membros do cartel têm da pertença ou não dessa empresa ao cartel. Ora, a recorrente entende que demonstrou que, nos seus contactos com os concorrentes, devidos à iniciativa destes, sempre tinha expressamente recusado qualquer proposta de colaboração, a não ser em termos hipotéticos e futuros, e que os próprios concorrentes tinham a clara impressão de que ela, na realidade, era alheia ao seu plano de conjunto.

70      Por último, contesta que as provas que apresenta tivessem menor valor probatório do que as da Comissão e considera errada a distinção feita pela Comissão entre a estrutura formal do clube e uma participação fora dessa estrutura, uma vez que essa distinção não existia para os membros do clube que só conheciam a estrutura formal. É precisamente por isso que os outros membros do clube, na sua opinião, a consideravam fora dele.

71      A Comissão contesta estas alegações.

 Quanto à quarta parte

72      A recorrente afirma que a Comissão considerou que, quanto ao período entre 13 de maio de 1997 e 9 de maio de 2000, não havia que lhe aplicar qualquer sanção, tendo em conta a menor gravidade e intensidade do cartel. Assim, apenas a puniu pelo período 1996‑1997. Ora, segundo a recorrente, o seu comportamento não mudou de 1996 para 2000, o que entende decorrer dos documentos acima referidos no âmbito do segundo fundamento, uma vez que as provas relativas ao período entre setembro de 1996 e maio de 1997 não são mais concludentes do que as provas relativas ao período entre maio de 1997 e junho de 1999. Assim, nenhuma sanção deveria ter sido aplicada pelo período entre setembro de 1996 e maio de 1997.

73      Considera ainda que a incoerência do raciocínio e das conclusões da Comissão é demonstrada pelo facto de, ao contrário das outras empresas, não ter sido punida pelo período entre junho de 1999 e maio de 2000, uma vez que a sua participação no cartel não tinha sido considerada grave, quando as outras empresas o foram por esse período.

74      A Comissão contesta estas alegações.

 Quanto à quinta parte

75      Primeiro, a recorrente alega que, independentemente da qualificação do cartel de acordo ou de prática concertada, os contactos e trocas de informações limitados havidos entre ela e os seus concorrentes no período entre 1996 e 2000 decorreram fora do mecanismo do cartel em que participavam as outras empresas.

76      Segundo afirma, mesmo que esses comportamentos pudessem constituir uma infração ao artigo 81.° CE, teriam uma natureza e uma gravidade diferentes da participação no cartel, uma vez que não estão ligados ao seu objetivo único, não tendo, de resto, a Comissão demonstrado o contrário.

77      Esses comportamentos devem portanto ser considerados, quando muito, episódios separados e distintos de infrações ao artigo 81.° CE, e ser apreciados distintamente, quer da infração cometida pela recorrente de 1986 a 1992 quer da sua nova adesão ao cartel a partir de 2000.

78      Daí resulta, na sua opinião, que, uma vez que não fazem parte de uma infração única e continuada ou repetida, essas infrações, admitindo‑as demonstradas, ter‑se‑iam consumado no próprio momento em que foram perpetradas. Tendo decorrido mais de cinco anos, relativamente a cada uma delas, entre o momento em que foram cometidas e o momento da atuação da Comissão, de qualquer forma estariam prescritas, por força do artigo 25.°, n.° 1, parágrafo b), do Regulamento n.° 1/2003.

79      Segundo, a recorrente alega que, tendo em conta que a interrupção entre os factos cometidos até 1992 e os factos cometidos a partir de 2000 durou oito anos, esses factos não podem ser considerados suficientemente próximos no tempo para demonstrar que o cartel foi ininterrupto.

80      O mesmo se diga, aliás, se a duração da interrupção fosse apenas de quatro anos (1992‑1996).

81      Terceiro, a recorrente afirma que, de qualquer forma, cessou a sua participação no cartel em 1992 e que é portanto uma interrupção e não uma suspensão da sua participação, o que aliás a Comissão reconhece ao considerar prescritos os factos anteriores a 1992.

82      Quarto, daí resulta que, ao admitir que a interrupção de 1992 podia levar à prescrição, a Comissão não podia deixar essa questão em aberto e afirmar que a não aplicação de uma sanção pelo período anterior era apenas o fruto do exercício do seu poder discricionário. Daí resulta uma falta de fundamentação da qual depende a qualificação da infração.

83      Quinto e último, a recorrente alega que a Comissão não apresentou o menor elemento de prova de que ela teria adotado um dos comportamentos que, segundo a decisão recorrida (considerando 300), demonstrariam a continuidade do cartel entre 1996‑1997 e 2000.

84      Alega que não participou em qualquer reunião com os outros membros do cartel, que não deu qualquer informação ao coordenador a respeito de adjudicações futuras, que não participou em discussões sobre propostas de designação de vencedores em cumprimento de alegados acordos globais e que não lhe foi aplicada qualquer sanção por não ter respeitado alegados acordos prévios.

85      A Comissão não demonstrou portanto que a recorrente tinha reintegrado o cartel, mesmo de forma limitada, durante o período entre 1996 e 2000.

86      A Comissão contesta estas alegações.

 Quanto à sexta parte

87      A recorrente afirma que todos os elementos de prova ― exceto um, a saber [confidencial] ― utilizados pela Comissão para provar a sua culpa no período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997, depois para calcular a coima que lhe aplicou, foram fornecidos por ela própria no âmbito do programa de clemência.

88      A recorrente precisa que, desse modo, a Comissão aumentou significativamente a duração da infração, o que se traduziu num significativo aumento da coima (considerandos 243 e 448 da decisão recorrida).

89      A recorrente acrescenta que colaborou na instrução do procedimento administrativo, entendendo poder considerar que isso não a pode prejudicar. Ora, entende que o fruto dessa cooperação foi utilizado pela Comissão para a condenar apesar de não dispor de quaisquer provas quanto ao período em causa antes de a recorrente lhas fornecer. Entende, assim, que a Comissão violou a sua confiança legítima.

90      Por outro lado, contesta a interpretação da Comissão no sentido de que a redução da coima e a imunidade parcial não são cumuláveis no âmbito da aplicação da comunicação sobre a cooperação.

91      Segundo a Comissão, os argumentos da recorrente, na realidade, são relativos ao cálculo da coima e não à declaração da infração.

92      Além disso, alega que os documentos fornecidos no âmbito da comunicação sobre a cooperação podem sempre ser utilizados para declarar uma infração.

93      A Comissão afirma que a recorrente foi recompensada pela sua cooperação com uma redução da coima em 30%, o que, em termos absolutos, é claramente superior à redução que resultaria de uma eventual imunidade parcial. Ora, no sistema da comunicação sobre a cooperação, os dois benefícios não são cumuláveis.

94      Acresce que, em sua opinião, o n.° 26 da comunicação sobre a cooperação dispõe unicamente que, relativamente à primeira empresa que pode beneficiar de uma redução da coima, os «elementos de prova decisivos» (na aceção do ponto 25 dessa comunicação, isto é, que não necessitam de ser corroborados se forem contestados), que sirvam para «determinar factos adicionais que venham aumentar a gravidade ou a duração da infração», não serão utilizados para determinar o montante das coimas a aplicar a essa empresa.

95      Embora seja certo que as provas fornecidas pela recorrente eram importantes para corroborar as provas obtidas no pedido de imunidade apresentado pela [confidencial] e as inspeções efetuadas em 2 de maio de 2007, isso não basta, porém, segundo a Comissão, para preencher as condições previstas no n.° 26 da comunicação sobre a cooperação, que exige que os elementos de prova permitam «determinar factos adicionais que venham aumentar a gravidade ou a duração da infração» e, salienta a Comissão, da infração no seu conjunto e não apenas em relação a uma ou várias empresas participantes isoladamente.

96      Com efeito, a Comissão entende que a finalidade dessa disposição é dar‑lhe a possibilidade de dar imunidade parcial à empresa que forneça elementos novos, que permitam aumentar a gravidade ou a duração superior de uma infração de que já tinha conhecimento e a propósito da qual já tivesse concedido imunidade total a outra empresa participante. Em contrapartida, uma empresa que simplesmente tenha melhorado o conhecimento que já tinha de um certo período ou de um certo aspeto da infração não pode beneficiar dela, mesmo se a sua colaboração permitir determinar melhor a sua própria participação no cartel.

97      Ora, os elementos de prova fornecidos pela recorrente, segundo a Comissão, não permitiram apurar nem a maior gravidade nem a maior duração da infração de que a Comissão tinha conhecimento.

98      Por último, a Comissão considera que a recorrente não a informou de factos novos no que respeita igualmente à sua participação no cartel no período entre 1996 e 1997. Com efeito, [confidencial] ― que confirma que as duas empresas estão de acordo em que seja atribuído à recorrente um lote maior de um concurso e que prova inequivocamente a colaboração da MRI na atividade ilícita a partir desse momento ― tinha sido descoberta nas inspeções de 2 de maio de 2007 e já estava, portanto, na posse da Comissão quando a MRI apresentou o pedido de clemência de 4 de maio de 2007.

99      Conclui assim pela improcedência da sexta parte do segundo fundamento.

3.     Apreciação do Tribunal Geral

a)     Referência aos princípios relativos ao ónus da prova

100    Segundo jurisprudência assente em matéria de ónus da prova, por um lado, cabe à parte ou à autoridade que alega uma violação do direito da concorrência demonstrá‑la, fazendo prova bastante dos factos constitutivos de uma infração, e, por outro, cabe à empresa que invoca o direito a beneficiar de um meio de defesa contra a declaração de uma infração fazer a prova de que as condições de aplicação desse meio de defesa estão preenchidas, de forma que essa autoridade deverá então recorrer a outros elementos de prova (acórdão do Tribunal Geral de 16 de novembro de 2006, Peróxidos Orgánicos/Comissão, T‑120/04, Colet., p. II‑4441, n.° 50; v. igualmente, neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de dezembro de 1998, Baustahlgewebe/Comissão, C‑185/95 P, Colet., p. I‑8417, n.° 58, e de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colet., p. I‑123, n.° 78). A duração da infração é um elemento constitutivo do conceito de infração nos termos do artigo 81.°, n.° 1, CE, elemento cujo ónus de prova cabe, a título principal, à Comissão (acórdãos do Tribunal Geral de 7 de julho de 1994, Dunlop Slazenger/Comissão, T‑43/92, Colet., p. II‑441, n.° 79, e Peróxidos Orgánicos/Comissão, já referido, n.° 51).

101    Esta repartição do ónus da prova pode porém variar na medida em que os elementos de facto invocados por uma parte podem ser suscetíveis de obrigar a outra parte a fornecer uma explicação ou uma justificação, sem o que se poderá concluir que foi feita a prova (v., neste sentido, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 100, supra, n.° 79, e acórdão Peróxidos Orgánicos/Comissão, n.° 100, supra, n.° 53).

102    Quanto aos meios de prova que a Comissão pode tomar em conta, o princípio que vigora no direito da concorrência é o da livre administração da prova (acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de janeiro de 2007, Dalmine/Comissão, C‑407/04 P, Colet., p. I‑829, n.° 63, e acórdão do Tribunal Geral de 8 de julho de 2004, JFE Engineering e o./Comissão, T‑67/00, T‑68/00, T‑71/00 e T‑78/00, Colet., p. II‑2501, n.° 273). Com efeito, uma vez que são notórias a proibição de participação em práticas e acordos anticoncorrenciais e as sanções em que podem incorrer os infratores, é habitual que as atividades correspondentes a essas práticas e acordos decorram de forma clandestina, que as reuniões sejam realizadas secretamente, a maior parte das vezes num país terceiro, e que a respetiva documentação seja reduzida ao mínimo. Mesmo que a Comissão descubra documentos que demonstrem expressamente um contacto ilegítimo entre operadores, como as atas de uma reunião, em geral serão apenas fragmentários e incoerentes, pelo que frequentemente é necessário reconstituir certos pormenores através de deduções. Na maior parte dos casos, a existência de uma prática ou de um acordo anticoncorrencial deve ser inferida de um certo número de coincidências e de indícios que, considerados em conjunto, podem constituir, na falta de outra explicação coerente, a prova de uma violação do direito da concorrência (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 100, supra, n.os 55 a 57). Esses indícios e coincidências permitem revelar não só a existência de comportamentos ou de acordos anticoncorrenciais, mas igualmente a duração de um comportamento anticoncorrencial continuado e o período de aplicação de um acordo celebrado em violação do direito da concorrência (acórdão do Tribunal de Justiça do 21 de setembro de 2006, Technische Unie/Comissão, C‑113/04 P, Colet., p. I‑8831, n.° 166).

103    É necessário que a Comissão apresente provas precisas e concordantes para servirem de base à firme convicção de que a infração foi cometida (v. acórdãos do Tribunal Geral de 6 de julho de 2000, Volkswagen/Comissão, T‑62/98, Colet., p. II‑2707, n.os 43 e 72 e jurisprudência aí referida, e de 25 de outubro de 2005, Groupe Danone/Comissão, T‑38/02, Colet., p. II‑4407, n.° 217). Contudo, não é necessário que cada uma das provas apresentadas pela Comissão respeite esses critérios relativamente a cada elemento da infração. Com efeito, basta que o conjunto de indícios invocado pela instituição (v. n.° 102, supra), apreciado globalmente, respeite essa exigência (acórdãos JFE Engineering e o./Comissão, n.° 102, supra, n.° 180, e Groupe Danone/Comissão, já referido, n.° 218; v., ainda, neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 20 de abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão, dito «PVC II», T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colet., p. II‑931, n.os 768 a 778 e, em particular, n.° 777). No que respeita à duração da infração, a jurisprudência exige que, na falta de elementos de prova capazes de demonstrar diretamente a duração de uma infração, a Comissão se baseie, pelo menos, em elementos de prova relativos a factos suficientemente próximos no tempo, de forma que se possa razoavelmente admitir que essa infração prosseguiu ininterruptamente entre duas datas precisas (acórdão Technische Unie/Comissão, n.° 102, supra, n.° 169; acórdãos Dunlop Slazenger/Comissão, n.° 100, supra, n.° 79, e Peróxidos Orgánicos/Comissão, n.° 100, supra, n.° 51).

104    Quanto ao valor probatório a dar aos diferentes elementos de prova, há que salientar que o único critério relevante para apreciar as provas livremente apresentadas reside na sua credibilidade (acórdão Dalmine/Comissão, n.° 102, supra, n.° 63; v. acórdãos do Tribunal Geral de 8 de julho de 2004, Mannesmannröhren‑Werke/Comissão, T‑44/00, Colet., p. II‑2223, n.° 84 e jurisprudência aí referida, e JFE Engineering e o./Comissão, n.° 102, supra, n.° 273). Segundo as normas geralmente aplicáveis em matéria de prova, a credibilidade e, portanto, o valor probatório de um documento dependem da sua origem, das circunstâncias da sua redação, do seu destinatário e do seu conteúdo (acórdão do Tribunal Geral de 15 de março de 2000, Cimenteries CBR e o./Comissão, T‑25/95, T‑26/95, T‑30/95 a T‑32/95, T‑34/95 a T‑39/95, T‑42/95 a T‑46/95, T‑48/95, T‑50/95 a T‑65/95, T‑68/95 a T‑71/95, T‑87/95, T‑88/95, T‑103/95 e T‑104/95, Colet., p. II‑491, n.° 1053; conclusões do juiz Vesterdorf no exercício de funções de advogado‑geral no processo que deu origem ao acórdão do Tribunal Geral de 24 de outubro de 1991, Rhône‑Poulenc/Comissão, T‑1/89, Colet., p. II‑867, II‑869, II‑956). Nomeadamente, há que dar uma grande importância ao facto de um documento ter sido redigido em ligação imediata com os factos (acórdão do Tribunal Geral de 11 de março de 1999, Ensidesa/Comissão, T‑157/94, Colet., p. II‑707, n.° 312), ou por uma testemunha direta desses factos (v., neste sentido, acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 102, supra, n.° 207). Os documentos de que resulta que houve contactos entre várias empresas e que estas prosseguiram precisamente o objetivo de eliminar antecipadamente a incerteza sobre o comportamento futuro dos seus concorrentes fazem prova bastante da existência de uma prática concertada (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça do 16 de dezembro de 1975, Suiker Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73 a 56/73, 111/73, 113/73 e 114/73, Colet., p. 563, n.os 175 e 179). Além disso, as declarações que vão contra os interesses do declarante devem, em princípio, ser consideradas elementos de prova particularmente fiáveis (v., neste sentido, acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 102 supra, n.os 207, 211 e 212).

105    Por outro lado, tem vindo a ser decidido de forma constante que o facto de comunicar informações aos seus concorrentes com vista a preparar um acordo anticoncorrencial basta como prova da existência de uma prática concertada, na aceção do artigo 81.° CE (acórdãos do Tribunal Geral de 6 de abril de 1995, Tréfilunion/Comissão, T‑148/89, Colet., p. II‑1063, n.° 82, e de 8 de julho de 2008, BPB/Comissão, T‑53/03, Colet., p. II‑1333, n.° 178).

106    Por último, há que lembrar que o papel do julgador num recurso de anulação interposto, nos termos do artigo 230.° CE, contra uma decisão da Comissão que declara a existência de uma infração ao direito da concorrência e que aplica coimas aos seus destinatários, consiste em apreciar se as provas e outros elementos invocados pela Comissão na sua decisão são suficientes para demonstrar a existência da infração (acórdão JFE Engineering e o./Comissão, n.° 102, supra, n.os 174 e 175; v. igualmente, neste sentido, acórdão «PVC II», n.° 103, supra, n.° 891). A existência de uma dúvida no espírito do julgador deve aproveitar aos destinatários da decisão, de modo que o julgador não pode concluir que a Comissão fez prova bastante da existência da infração em causa se ainda subsistir uma dúvida no seu espírito quanto a essa questão (acórdãos JFE Engineering e o./Comissão, n.° 102, supra, n.° 177, e Groupe Danone/Comissão, n.° 103, supra, n.° 215). Com efeito, nesta última situação, é necessário ter em conta o princípio da presunção da inocência, como resulta nomeadamente do artigo 6.°, n.° 2, da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de novembro de 1950, que faz parte dos direitos fundamentais que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, reafirmada no preâmbulo do Ato Único Europeu, no artigo 6.°, n.° 2, UE e no artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, proclamada em 7 de dezembro de 2000 em Nice (JO C 364, p. 1), são protegidos no ordenamento jurídico da União. Tendo em conta a natureza das infrações em causa e a natureza e o grau de gravidade das sanções a elas ligadas, o princípio da presunção da inocência aplica‑se, nomeadamente, nos processos relativos a violações do direito da concorrência suscetíveis de levar à aplicação em coimas ou sanções pecuniárias compulsórias (acórdãos do Tribunal de Justiça do 8 de julho de 1999, Hüls/Comissão, C‑199/92 P, Colet., p. I‑4287, n.os 149 e 150, e Montecatini/Comissão, C‑235/92 P, Colet., p. I‑4539, n.os 175 e 176; acórdão Groupe Danone/Comissão, n.° 103, supra, n.° 216).

107    A existência de uma infração deve ser apreciada unicamente em função dos elementos de prova reunidos pela Comissão na decisão que declara a referida infração e a única questão relevante é portanto a de saber, em substância, se foi ou não feita a prova da infração à luz desses elementos de prova (acórdão Cimenteries CBR e o./Comissão, n.° 104, supra, n.° 726).

108    Por último, a fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição autora do ato, de forma a permitir que os interessados conheçam as razões da medida adotada e que o órgão jurisdicional competente exerça a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas direta ou individualmente afetadas pelo ato podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato cumpre as exigências do artigo 253.° CE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (acórdãos do Tribunal de Justiça de 2 de abril de 1998, Comissão/Sytraval e Brink’s France, C‑367/95 P, Colet., p. I‑1719, n.° 63; de 30 de setembro de 2003, Alemanha/Comissão, C‑301/96, Colet., p. I‑9919, n.° 87, e de 22 de junho de 2004, Portugal/Comissão, C‑42/01, Colet., p. I‑6079, n.° 66).

109    A jurisprudência acima referida é aplicável, por analogia, ao artigo 53.° do Acordo EEE e às decisões da Comissão adotadas nos termos desse artigo.

110    É à luz das regras acima expostas nos n.os 100 a 109 que há que verificar se, na decisão recorrida, a Comissão refere elementos suficientemente credíveis, precisos e concordantes para basear, no âmbito de uma apreciação global e depois de analisar as explicações ou as justificações alternativas fornecidas pela recorrente, a firme convicção de que a recorrente reintegrou o cartel a partir de 3 de setembro de 1996 e em que medida participou na infração entre essa data e 9 de maio de 2000, na medida em que não contesta a sua participação na infração no período anterior, entre 1986 e 1992, nem no período posterior, entre 9 de maio de 2000 e 2 de maio de 2007.

b)     Quanto à participação da recorrente na infração entre 3 de setembro de 1996 e 9 de maio de 2000

111    A argumentação da recorrente pressupõe a distinção entre dois períodos: por um lado, o período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997, pelo qual lhe foi aplicada uma coima e relativamente ao qual contesta no essencial que a Comissão invoque contra ela elementos de prova que ela lhe tinha fornecido e que permitiram àquela considerar que a infração tinha prosseguido até maio de 1997, e por outro, o período entre 13 de maio de 1997 e 9 de maio de 2000 (a seguir «período intermédio») pelo qual a Comissão não lhe aplicou qualquer coima e a respeito do qual a recorrente alega no essencial que os elementos de prova tomados em conta pela Comissão contra ela apenas demonstram a sua intenção de dar a entender aos outros membros do cartel uma certa disponibilidade para discutir, mas para os enganar e evitar represálias, e não o seu envolvimento no cartel, mesmo durante esse período de atividades reduzidas.

 Quanto ao período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997

112    A esse respeito, há que analisar, antes de mais, a sexta parte do segundo fundamento.

113    Com efeito, há que verificar se a recorrente tem razão ao alegar que, em face do último parágrafo do n.° 26 da comunicação sobre a cooperação, a Comissão não podia opor‑lhe, pelo período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997, os elementos de prova que ela própria lhe tinha comunicado no âmbito do seu pedido de clemência.

–       Quanto ao alcance do n.° 26 da comunicação sobre a cooperação

114    O artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1/2003 dispõe que, para determinar o montante da coima, deve tomar‑se em consideração a gravidade e a duração da infração.

115    Por outro lado, resulta de jurisprudência assente que, nos limites previstos no Regulamento n.° 1/2003, a Comissão dispõe de um amplo poder de apreciação no exercício do seu poder de aplicar essas coimas (acórdãos do Tribunal de Justiça de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, Colet., p. I‑5425, n.° 172, e de 24 de setembro de 2009, Erste Group Bank e o./Comissão, C‑125/07 P, C‑133/07 P, C‑135/07 P e C‑137/07 P, Colet., p. I‑8681, n.° 123). Contudo, esse poder é limitado; com efeito, quando a Comissão adota orientações destinadas a precisar, respeitando o Tratado, os critérios que tenciona aplicar no exercício do seu poder de apreciação, daí resulta uma autolimitação desse poder, na medida em que tem de se conformar com as regras indicativas que impôs a si própria (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de junho de 2010, Lafarge/Comissão, C‑413/08 P, Colet., p. I‑5361, n.° 95, e acórdão do Tribunal Geral de 8 de outubro de 2008, Carbone‑Lorraine/Comissão, T‑73/04, Colet., p. II‑2661, n.° 192 e jurisprudência aí referida). A Comissão não se pode afastar num caso concreto sem apresentar razões que sejam compatíveis com o princípio da igualdade de tratamento ou da proteção da confiança legítima (acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, já referido, n.° 209).

116    É neste quadro que se devem encarar os n.os 23 a 26 da comunicação sobre a cooperação, que dispõem:

«23.      As empresas que revelem a sua participação num alegado cartel que afete a Comunidade, mas que não preenchem as condições previstas na Secção II supra podem ser elegíveis para uma redução da coima que de outra forma lhes seria aplicada.

24.      Por forma a poder beneficiar desta redução, a empresa deve fornecer à Comissão elementos de prova da alegada infração, que apresentem um valor acrescentado significativo relativamente aos elementos de prova já na posse da Comissão e preencher as condições cumulativas estabelecidas nas alíneas a) a c) do [n.°]12.

25. O conceito de ‘valor acrescentado’ refere‑se à forma como os elementos de prova apresentados reforçam, pela sua própria natureza e/ou pelo seu nível de pormenor, a capacidade de a Comissão provar o alegado cartel. Na sua apreciação, a Comissão considerará normalmente que os elementos de prova escritos que datem do período a que os factos se referem têm um valor superior aos elementos de prova de origem subsequente. Considera‑se geralmente que os elementos de prova diretamente relacionados com os factos em questão têm um valor superior aos elementos de prova que com eles apenas têm uma ligação indireta. Da mesma forma, o grau de corroboração por outras fontes, necessário para sustentar os elementos de prova apresentados contra outras empresas envolvidas no processo, terá incidência sobre o valor desses elementos; assim, aos elementos de prova decisivos será atribuído um valor superior, comparativamente a elementos de prova tais como declarações, que necessitam de ser corroboradas se forem contestadas.

26.      Na decisão final adotada no termo do processo administrativo, a Comissão determinará o nível de redução de que a empresa beneficiará, que será determinado da seguinte forma tendo por base a coima que de outra forma seria aplicada.

¾        À primeira empresa que forneça um valor acrescentado significativo: uma redução de 30‑50%

[…]

Para determinar o nível de redução no âmbito de cada uma destas margens de variação, a Comissão levará em linha de conta a data na qual foram apresentados os elementos de prova que preencham as condições previstas no [n.°] 24 e o grau de valor acrescentado que estes representem.

Se o requerente de um pedido de redução de coima for o primeiro a apresentar elementos de prova decisivos, na aceção do [n.°] 25, que a Comissão utilize para determinar factos adicionais que venham aumentar a gravidade ou a duração da infração, a Comissão não tomará em consideração estes elementos ao fixar o montante de qualquer coima a aplicar à empresa que os forneceu.»

117    Por outras palavras, para beneficiar das disposições do último parágrafo do n.° 26 da comunicação sobre a cooperação, devem estar preenchidas diversas condições: a empresa deve fornecer provas determinantes na aceção do n.° 25 da comunicação sobre a cooperação, o que significa que estas devem ter um valor acrescentado significativo e não necessitam de corroboração; essas provas devem permitir apurar factos adicionais aos que a Comissão consegue apurar, que reforcem a gravidade ou a duração da infração.

118    Quando essas condições estiverem reunidas, a Comissão não terá em conta esses factos para fixar o montante da coima ― fixado em função da gravidade e da duração da infração, de acordo com o artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1/2003 ― que será aplicada à empresa que permitiu demonstrar esses factos pelas provas que apresentou à Comissão, tal como precisa o último parágrafo do n.° 26 da comunicação sobre a cooperação.

119    Consequentemente, resulta do último elemento da frase do último parágrafo do n.° 26 da comunicação sobre a cooperação que a Comissão não deve basear‑se nesses elementos de prova para determinar a gravidade ou a duração da infração do autor do pedido de clemência, desde que este preencha as condições previstas no n.° 26 dessa comunicação, permitindo ainda que o requerente da clemência beneficie, quanto ao resto, da redução prevista nessa comunicação pelo resto do período da infração que lhe é imputado.

120    Há que salientar que o facto de o mecanismo de proteção do requerente de clemência ter sido previsto no n.° 26, dedicado à redução da coima, confirma que as duas medidas podem ser aplicadas simultaneamente pela Comissão, contrariamente ao que esta alega.

121    A redução da coima em percentagem deve, portanto, ser proporcional ao valor acrescentado das provas apresentadas pelo requerente de clemência, uma vez que o último parágrafo do n.° 26 tem ainda por objeto evitar que uma empresa seja punida unicamente com base nos elementos de prova que ela própria forneceu à Comissão.

122    Improcede portanto a tese da Comissão neste ponto.

–       Quanto à determinação, no caso presente, de factos adicionais que venham aumentar a gravidade ou a duração da infração

123    Seguidamente, há que analisar a objeção da Comissão no sentido de que os elementos de prova apresentados pela recorrente não lhe permitiram determinar factos novos, o que é uma das condições de aplicação do último parágrafo do n.° 26 da comunicação sobre a cooperação.

124    Há que observar que a comunicação sobre a cooperação menciona «factos adicionais» que venham aumentar a duração ou a gravidade da infração.

125    No caso, para justificar a atividade do cartel entre setembro de 1996 e maio de 1997, a Comissão baseou‑se essencialmente em:

¾        [confidencial] (considerando 142 da decisão recorrida),

¾        [confidencial] (considerandos 143 a 145 da decisão recorrida);

¾        «quatro exemplos de comunicação com outros membros do cartel entre maio de 1995 e março de 1996 e entre setembro de 1996 e janeiro de 1997, gravados em disquetes descobertas nos estabelecimentos de W. […]» (considerando 139 da decisão recorrida); contudo precisa na nota de pé de página n.° 216 da decisão recorrida que «embora os repertórios dessas disquetes revelem muitas outras pastas relativas a esse período com nomes semelhantes, o que sugere que consistem noutras telecópias enviadas entre os membros do cartel, a Comissão não utilizará o conteúdo dessas pastas como elementos de prova, na medida em que não fazem parte da pasta a que a Comissão tem acesso»;

¾        a resposta da Bridgestone à comunicação de acusações («a Bridgestone afirmou que o cartel criado em 1986 tinha deixado de existir na primavera de 1997») (considerando 291 da decisão recorrida);

¾        as respostas da DOM a essa mesma comunicação de acusações («a DOM afirmou que [estava] claramente demonstrado que o cartel tinha deixado de funcionar no período entre março de 1997 e 1999») (considerando 292 da decisão recorrida);

¾        o historial da atividade feito por W. («3/97: paragem de qualquer cooperação») (considerando 157 da decisão recorrida);

¾        as declarações de [confidencial] («o clube das mangueiras marinhas quase desapareceu em 1998») (considerando 151 da decisão recorrida);

¾        as respostas ao pedido de informações de P. de 29 de junho de 2007 e da Trelleborg de 15 de junho de 2007 e os documentos descobertos na Trelleborg e na Dunlop (n.° 163 da contestação);

¾        e, por último, os quadros de W. relativos ao período entre novembro de 1996 e dezembro de 1997 e aos anos de 1998 e 1999 (considerando 165 da decisão recorrida).

126    Assim, é certo que a Comissão dispunha de um conjunto de indícios, mas tinha na sua posse uma única prova documental contemporânea, a saber [confidencial], bem como os quadros de W. ― que reconhece não poder datar com precisão ― e as declarações dos diferentes membros do cartel, se excetuarmos os elementos de prova fornecidos pela MRI no âmbito do seu pedido de clemência.

127    Consequentemente, há que analisar se os elementos do conjunto de indícios tomados em conta pela Comissão na decisão recorrida para concluir pela prossecução da plena atividade do cartel entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997, que não sejam os elementos de prova fornecidos pela MRI no âmbito do seu pedido de clemência, bastam, só por si, para chegar a essa conclusão.

128    Antes de mais, há que ter em conta [confidencial] dirigida à DOM (considerando 142 da decisão recorrida).

129    O texto da [confidencial] controvertida tem a seguinte redação:

«Creio que temos uma oportunidade única de restabelecer um melhor nível de preços este ano; segundo julgo entender, a Sumed deverá estar pronta presentemente para um aumento de preços significativo.

Estou de acordo com a vossa sugestão de deixar C. ter uma parte substancial desse mercado e proponho os seguintes números, em que o segundo, depois do vencedor está em PL × 0,65; devemos tentar isso.

Agradeço que confirmem se todos os membros estão de acordo; se assim não for, agradecia que me enviassem sugestões o mais depressa possível.»

130    Este texto é acompanhado de um quadro no qual estão repartidos os vários lotes (ou partes) do contrato «Sumed» entre diversos «vencedores» designados entre as seis empresas membros do cartel:


ITEM

Qty

Designation

PL

A 1

A 2

C

B 1

B 2

B 3

1

2

FOB 24" 35’

80,900

52,640

53,920

53,210

54,860

Champion

54,155

2

3

FOB 20" 35’

63,420

42,380

41,220

41,900

43,280

Champion

41,468

3

12

FF 24" 35’

73,590

50,290

49,300

50,150

47,830

Champion

48,116

4

36

FF 20" 35’

50,370

33,720

34,380

Champion

34,150

32,600

32,740

5

34

FF 16" 35’

45,170

29,860

Champion

29,360

30,440

30,830

30,793

6

1

Red 24/20" 35’

67,790

46,270

46,190

44,130

44,060

Champion

44,222

7

3

Red 20/16" 35’

47,230

32,355

32,910

30,700

30,950

Champion

30,735

8

3

TRH 16" 35’

55,180

36,830

Champion

35,870

36,090

37,660

35,982


131    As referências A 1, A 2, B 1, B 2, B 3 e C são os nomes de código habituais dos diversos membros do cartel (considerando 114 da decisão recorrida). Segundo esses nomes de código, a Bridgestone é a A 1, a Yokohama Rubber a A 2, a DOM a B1, a Trelleborg a B2, a Parker ITR a B 3 e a MRI a C.

132    Este quadro mostra não só que, para cada lote ou cada parte do contrato, foi designado um «vencedor» [champion], mas também que o preço oferecido pelo «segundo», que surge no quadro em negrito, itálico e sublinhado, bem como os preços oferecidos pelos outros participantes, foram igualmente previstos.

133    A importância do papel desempenhado pelo «segundo» na manipulação da oferta pode também ser deduzido do texto da telecópia, que precisa, com efeito, que «Proponho os seguintes números em que o segundo depois do vencedor está em PL × 0.65».

134    Pode observar‑se ainda que o preço para cada lote no que respeita ao segundo corresponde sempre a este cálculo: preço PL × 0,65. Só há uma exceção, no que respeita ao «item 5» onde, segundo esse cálculo, o preço do segundo deveria ser de 29 360 (coluna C, isto é, a MRI) e não de 29 860. Trata‑se com toda a probabilidade de um erro material, tendo o autor do quadro sem dúvida assinalado a negrito e sublinhado por erro 29 860.

135    A importância do papel do «segundo» é igualmente confirmada pela recorrente nas suas respostas às questões escritas que lhe foram colocadas pelo Tribunal. Com efeito, indica que «a regra comum conhecida do cartel consistia justamente em decidir [o] preço do ‘proponente com o segundo preço mais baixo, enquanto os pormenores da oferta do vencedor eram [...] deixados à sua discrição».

136    Resulta assim do quadro que a recorrente é o vencedor designado numa proposta ― o que não poderia ter sido orquestrado sem a sua participação nas discussões ou mesmo sem estar ao corrente, como alega ― e também que foi designada para ficar em segundo por duas vezes, ou mesmo três, se se tiver em conta o erro relativo ao «item 5».

137    Para a manipulação da proposta prevista nesse quadro funcionar, era absolutamente necessário que cada sociedade assumisse o papel que lhe estava atribuído e, em particular, o segundo, pois, no caso contrário, o vencedor nunca teria a garantia de ganhar.

138    Daí resulta que não é verosímil que a orquestração minuciosa e pormenorizada do concurso «Sumed» que consta desse quadro pudesse ter funcionado sem a participação ativa e voluntária da recorrente nem que o papel de «segundo» previsto para ela lhe fosse atribuído pelos outros membros do cartel sem ela estar plenamente associada às atividades do cartel logo em setembro de 1996.

139    Daí resulta que, mesmo embora esse seja um documento de terceiros, faz prova bastante da participação da MRI nas discussões sobre o contrato «Sumed».

140    Consequentemente, não colhe a argumentação da recorrente de que, no essencial, ignorava tudo desse documento e da discussão que ele relata.

141    Resulta ainda do quadro feito por W. (anexo 10 da petição, linha 87), relativo aos contratos efetivamente repartidos entre os membros do cartel, que três empresas repartiram entre si um concurso «Sumed» adjudicado em novembro de 1996, isto é, pouco mais de dois meses depois da proposta de coordenação dirigida por [confidencial]. No caso, trata‑se da Yokohama Rubber (designada como Japan C0.2), da Trelleborg (designada European C0.2) e da MRI (designada European C0.4).

142    Ora, trata‑se das três empresas entre as quais estavam repartidos os lotes do concurso «Sumed» no quadro anexo à telecópia da Trelleborg.

143    É certo que há que observar, como alega a recorrente, que o quadro de W. contém a menção «estimativas» (estimates) relativamente ao contrato «Sumed», mas não é menos verdade que os três adjudicatários dos lotes correspondem à repartição como era proposta na telecópia de Trelleborg e que, relativamente a dois deles, os montantes correspondem ao valor dos lotes multiplicado pelo preço unitário do vencedor, tais como resultam da mesma telecópia.

144    O Tribunal considera que, nestas condições, não se pode tratar de puras coincidências ou conjeturas relativas à MRI, como esta afirma.

145    Além disso, o Tribunal considera que, uma vez que o quadro de W. reflete assim os resultados da coordenação do concurso «Sumed» tal como resulta da telecópia da Trelleborg, o valor probatório desse elemento de prova é assim reforçado.

146    Ora, os quadros de W. expõem em várias páginas os resultados de diversas coordenações de concursos ocorridas entre os diversos membros do cartel entre 1996 e o final de 1997.

147    Daí resulta que a Comissão tinha razões para se basear nesse quadro, não só para dar por provada a reintegração da MRI no cartel a partir de 3 de setembro de 1996 e a sua participação plena e completa até 13 de maio de 1997, mas também para corroborar, de forma mais geral, os elementos ― e em particular as diversas declarações que tinha recolhido (v. n.° 125, supra) ― de que dispunha a respeito da prossecução do cartel pelos outros membros do cartel até essa data.

148    Não precisava portanto dos documentos fornecidos pela MRI para chegar a essa conclusão.

149    Daí resulta que os elementos de prova fornecidos pela MRI à Comissão respeitantes ao período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997 não permitiram que a Comissão desse por provada uma maior duração ou uma maior gravidade da infração.

150    A recorrente não pode portanto reivindicar o previsto no último parágrafo do n.° 26 da comunicação sobre a cooperação.

151    Daí resulta igualmente que esses elementos de prova podiam ser utilizados pela Comissão contra ela.

152    Assim, improcede a sexta parte do segundo fundamento.

153    Acresce que alguns desses elementos de prova confirmam indubitavelmente o envolvimento da MRI na coordenação de algumas propostas.

154    Assim, em [confidencial], F. indicava:

«[Recusei] essa proposta na medida em que alterava o acordo inicial que me tinha sido dado pela Dunlop e também pelo facto de, no primeiro concurso, termos recebido só 18 comprimentos em vez dos 36 previstos por causa de condicionalismos orçamentais da Sumed. Temos a certeza de que a Kléber tem problemas com os 24” na Sumed e foi por essa razão que apenas receberam 4 comprimentos em vez dos 12 indicados num concurso anterior.»

155    Ora, no quadro que consta no anexo da telecópia da Trelleborg (v. n.° 130, supra), a MRI é designada vencedora para um lote de 36 comprimentos de FF 20’’ e a «Kléber» ― isto é, a Trelleborg ― para cinco lotes entre os quais um lote de 12 comprimentos de FF 24’’.

156    As referências feitas por F. a um anterior contrato «Sumed» correspondem assim perfeitamente ao quadro anexo a [confidencial] (v. n.° 130, supra), o que não pode ser uma simples coincidência.

157    Além disso, as precisões que constam dessa comunicação permitem compreender a menção «estimativas» feita por W. no seu quadro sobre o concurso «Sumed» objeto de [confidencial], que indica que a MRI acabou por obter um lote menor do que o inicialmente previsto.

158    Não colhe portanto o resto da argumentação da recorrente de que, no essencial, não tem condições para determinar presentemente se a proposta «Sumed» em causa nessa [confidencial] corresponde à referida em [confidencial].

159    Se necessário for (v. n.° 147, supra), a participação da recorrente na infração de 3 de setembro de 1996 a 13 de maio de 1997 fica assim confirmada.

 Quanto ao período intermédio

160    Segundo jurisprudência assente, o conceito de prática concertada refere‑se a uma forma de coordenação entre empresas que, sem ter chegado à realização de uma convenção propriamente dita, substitui cientemente uma cooperação prática entre elas com risco para a concorrência (acórdãos do Tribunal de Justiça do 8 de julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni, C‑49/92 P, Colet., p. I‑4125, n.° 115, e Hüls/Comissão, n.° 106, supra, n.° 158).

161    A esse respeito, o artigo 81.°, n.° 1, CE opõe‑se a qualquer contacto direto ou indireto entre operadores económicos capaz de influir no comportamento de um concorrente efetivo ou potencial no mercado ou de revelar a esse concorrente o comportamento que o operador económico em causa tenha decidido ou previsto manter por si próprio no mercado, quando esses contactos tenham por objetivo ou por efeito a restrição da concorrência (v., neste sentido, acórdão Comissão/Anic Partecipazioni, n.° 160, supra, n.os 116 e 117).

162    O facto de comunicar informações aos seus concorrentes com vista a preparar um acordo anticoncorrencial basta para provar a existência de uma prática concertada, na aceção do artigo 81.° CE (acórdãos Tréfilunion/Comissão, n.° 105, supra, n.° 82, e BPB/Comissão, n.° 105, supra, n.° 178).

163    Segundo jurisprudência assente, os conceitos de acordo e de prática concertada, na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE, incluem formas de colusão que partilham da mesma natureza e só se distinguem pela sua intensidade e pelas formas em que se manifestam (acórdão Comissão/Anic Partecipazioni, n.° 160, supra, n.os 131 e 132, e acórdão do Tribunal Geral de 20 de março de 2002, HFB e o./Comissão, T‑9/99, Colet., p. II‑1487, n.° 190).

164    No âmbito de uma infração complexa, que envolveu durante vários anos vários produtores que prosseguiam um objetivo de regulação do mercado em comum, não se pode exigir que a Comissão qualifique com precisão a infração de acordo ou de prática concertada, uma vez que, em qualquer caso, ambas as formas de infração estão previstas no artigo 81.° CE (v., neste sentido, acórdão Comissão/Anic Partecipazioni, n.° 160, supra, n.os 111 a 114, e acórdão PVC II, n.° 103, supra, n.° 696).

165    A dupla qualificação da infração de acordo «e/ou» de prática concertada deve ser entendida no sentido de que designa um todo complexo que contém alguns elementos de facto qualificados de acordo e outros de prática concertada, na aceção do artigo 81.°, n.° 1, CE, que não prevê qualquer qualificação específica para esse tipo de infração complexa (acórdãos do Tribunal Geral de 17 de dezembro de 1991, Hercules Chemicals/Comissão, T‑7/89, Colet., p. II‑1711, n.° 264, e HFB e o./Comissão, n.° 163, supra, n.° 187).

166    Há que observar que, no caso, a Comissão decidiu punir a recorrente e os seus concorrentes por terem participado «num conjunto de acordos e práticas concertadas no setor das mangueiras marinhas» no período em causa.

167    Nos considerandos 263 a 272 da decisão recorrida, indicou como tencionava qualificar os factos ilícitos de que tinha conhecimento e precisou, em particular, nos considerandos 271 e 272 da decisão recorrida, que as trocas de informações constituíam práticas concertadas.

168    Imputou à recorrente a troca de informações com certos membros do cartel durante o período intermédio, nomeadamente com vista a relançar o cartel.

169    Ora, o facto de comunicar informações aos seus concorrentes com vista à preparação de um acordo anticoncorrencial basta para provar a existência de uma prática concertada, na aceção do artigo 81.° CE (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de junho de 2009, T‑Mobile Netherlands e o., C‑8/08, Colet., p. I‑4529, n.os 51 e 52, e conclusões da advogada‑geral Kokott no processo que deu origem a esse acórdão, Colet., p. I‑4523, n.os 90 e 91 e jurisprudência aí referida).

170    A questão de saber se esse comportamento surgiu no âmbito da «estrutura do clube» ou fora dela é portanto indiferente, improcedendo a argumentação da recorrente a esse respeito no âmbito da terceira parte do segundo fundamento.

171    Resulta ainda da decisão recorrida que a recorrente se retirou do cartel em 1992.

172    Por outro lado, está igualmente demonstrado que a recorrente reintegrou o cartel em 1996 por ocasião da manipulação do concurso «Sumed», o que se traduziu por uma atribuição de quotas e uma fixação dos preços no mercado das mangueiras marinhas na sequência de uma concertação para o efeito, na qual se deve considerar que a recorrente participou (v. n.os 128 a 159, supra).

173    No que respeita ao período intermédio em curso, na parte respeitante à recorrente, de maio de 1997 a maio de 2000, primeiro há que precisar que a recorrente confirmou, na audiência, em resposta a uma questão que lhe foi colocada pelo Tribunal, que o seu fundamento se limitava aos elementos de prova relativos ao período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997.

174    Esses elementos de prova podiam portanto ser utilizados pela Comissão para demonstrar que a recorrente tinha participado em certos contactos e em certas discussões durante o período intermédio.

175    A recorrente contesta porém o alcance desses contactos e a interpretação dada pela Comissão aos documentos que os relatam.

176    Consequentemente, há que analisar esses documentos a fim de determinar se a Comissão teve razão ao concluir que a recorrente tinha participado numa infração continuada durante o período intermédio, não obstante a inexistência da aplicação de qualquer coima a ela ou aos outros membros do cartel por esse mesmo período.

177    Há que considerar, à luz dos documentos da recorrente [confidencial] (considerandos 174 e 176 da decisão recorrida) que estes permitem determinar, pelo menos, por um lado, que W. contactou F., da MRI, a respeito de três concursos (CPC Taiwan, Ancap Uruguay e Petrobras Brazil), tendo essa tentativa de coordenação envolvido igualmente a Bridgestone, a DOM, a Yokohama Rubber e a Parker ITR, e, por outro lado, que, embora F. tivesse rejeitado a proposta que lhe havia sido feita, o cartel tentava pelo menos funcionar durante esse período. Assim, não existe qualquer dúvida de que as diferentes empresas estavam em contacto entre si e com a recorrente a fim de coordenarem certos concursos. O facto de esses documentos poderem dar a entender que nem tudo ia bem no cartel e que existiam discordâncias está, de resto, em conformidade com a análise feita pela Comissão na decisão recorrida sobre esse período. No que respeita ao documento de F. datado de 4 de fevereiro de 1999, no qual apresenta um historial do cartel, mas apresenta também o estado da situação nessa época, documento destinado a um dos agentes comerciais da recorrente, não se pode deixar de observar que, mesmo embora F. aí alegue que a recorrente não faz parte do cartel, esse documento comprova pelo menos os contactos em que F. participou com outros membros do cartel. Esses documentos demonstram assim claramente que, entre as diferentes empresas em causa, existiram contactos com vista, pelo menos, a tentar coordenar propostas.

178    [confidencial] (considerando 177 da decisão recorrida) demonstra a existência de contactos entre diversos protagonistas do cartel (W., F. e P.), por ocasião dos quais trocaram dados comerciais. O facto de o cartel atravessar nesse momento um período de crise, como demonstra igualmente esse documento, não retira a ilicitude a esses contactos. Além disso, o cartel retomou pouco tempo depois de esses contactos terem ocorrido, o que tende a corroborar a ideia de que contribuíram para relançar o cartel, ainda que a recorrente só tivesse voltado a ser completamente parte dele um ano depois dos outros protagonistas.

179    [confidencial] (considerando 201 da decisão recorrida) demonstra, pelo seu lado, um contacto entre C. e F. num momento em que o cartel ainda não tinha retomado plenamente ― pelo menos no que respeita à recorrente. Demonstra porém que C. e F. trocaram informações comerciais sensíveis, mas também que F. procurava um novo modo de funcionamento do cartel já nesse momento, nomeadamente no que respeita à coordenação do cartel, não deixando de tentar desde logo fixar a quota de mercado da recorrente em 12%. Como indica ainda a Comissão, esse elemento de prova deve ser visto na perspetiva das reuniões que recomeçaram a realizar‑se a partir de junho de 1999. Embora seja verdade que o envolvimento pleno e integral da recorrente apenas começará mais tarde, não é menos verdade que, a partir desse momento, preparava o seu regresso no cartel e colaborava pelo menos à margem com alguns dos seus concorrentes.

180    Por último, o documento intitulado [confidencial] (considerando 190 da decisão recorrida) demonstra claramente o âmbito da cooperação renovada. A recorrente alega que não participava na reunião ― o que a Comissão não contesta ― e que o facto de a quota de mercado que lhe era atribuída constar desse documento não significa que fazia parte do cartel. É certo que a Comissão considerou que ela só tinha reintegrado o cartel a partir de 9 de maio de 2000 (v. considerando 202 da decisão recorrida, no qual a Comissão indica que dispõe de provas de que foram novamente atribuídas quotas à MRI a partir desse momento). Contudo, existe, primeiro, uma prova direta de que a recorrente teve contactos ilícitos para efeitos de reintegrar o cartel em junho de 1999 (comunicação interna da recorrente de 30 de junho de 1999), segundo, um documento distribuído em dezembro de 1999, no âmbito de uma reunião realizada depois da retoma do cartel pelos outros membros do cartel, na qual é fixada a quota de mercado a atribuir à recorrente, e, terceiro, provas de que efetivamente reintegrou o cartel em maio de 2000, o que aliás não contesta. Consequentemente, há que considerar que, uma vez que os outros membros do cartel tinham retomado as suas atividades ilícitas, a quota de mercado que tencionavam dar à recorrente só poderia resultar de uma forte coordenação com esta. Ora, está demonstrado que a MRI negociava as condições do seu regresso em junho de 1999, isto é, seis meses antes da elaboração dos quadros distribuídos em dezembro de 1999. Esses quadros constituem, portanto, um indício particularmente sério da participação da recorrente, em dezembro de 1999, nas discussões relativas à repartição e à coordenação das quotas de mercado respetivas dos membros do cartel.

181    Em conclusão, há que considerar que a Comissão apresentou provas suficientes de que, no período intermédio, a existência de um comportamento ilícito da recorrente, é certo que reduzido relativamente aos períodos anteriores e posteriores, o que de resto levou a Comissão a não lhe aplicar qualquer coima por esse período.

182    Quanto ao resto, improcedem as alegações da recorrente de que tencionava assim dar aos outros membros do cartel a impressão de um certo interesse no relançamento do cartel, protegendo‑se de eventuais represálias comerciais por meio desse artifício.

183    Com efeito, não só as alegadas intenções da recorrente a esse respeito são indiferentes, como há que observar ainda que ela reconhece assim que, ao manter contactos com os outros membros do cartel, tentou proteger‑se da sua concorrência, o que basta para demonstrar a existência de uma infração.

184    Acresce que os documentos acima referidos provam que esses contactos tiveram essencialmente por objeto o relançamento do cartel e que a recorrente neles participou nomeadamente a fim de negociar o lugar que nele lhe cabia.

185    Assim, há que rejeitar a sua argumentação de que só participou nessas discussões com o objetivo de enganar os seus antigos ― e futuros ― parceiros de cartel e que entende dar uma explicação alternativa plausível aos diversos documentos em que a Comissão se baseou para demonstrar a sua participação na infração no período intermédio.

186    De resto, esta conclusão de modo nenhum é posta em causa pelos diversos elementos de prova ― [confidencial] ― invocados pela recorrente em apoio da sua tese.

187    Com efeito, esses diferentes documentos demonstram indubitavelmente que a MRI reintegrou plenamente o cartel em maio de 2000, mas não desmentem a existência das suas manobras com vista a essa reintegração ao longo dos anos anteriores.

188    Improcede pois a argumentação da recorrente no restante.

c)     Quanto à existência de uma infração continuada

189    A recorrente contesta, no essencial, por um lado, que a infração fosse continuada entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997, entendendo que, a serem‑lhe imputadas infrações por esse período, são infrações isoladas desligadas dos períodos anteriores e posteriores, e, por outro lado, que a infração fosse continuada entre 13 de maio de 1997 e 9 de maio de 2000, uma vez que não participou nas discussões com objetivo anticoncorrencial, mas, pelo contrário, para se defender de eventuais represálias dos outros membros do cartel e que, de qualquer forma, a Comissão não pode concomitantemente dar por provada a existência de uma infração continuada dando ao mesmo tempo por provada a existência de uma atividade reduzida em razão de uma situação de crise entre os membros do cartel, que aliás a levou a não aplicar qualquer coima por esse período.

 Quanto ao conceito de infração continuada e de infração repetida

190    Nos termos do artigo 25.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003, a prescrição começa a correr no dia em que foi cometida a infração. Todavia, no que se refere às infrações continuadas ou repetidas, a de prescrição só começa a correr a partir do dia em que tiver cessado a infração.

191    A jurisprudência precisou, a esse respeito, que, na maior parte dos casos, a existência de uma prática ou de um acordo anticoncorrencial deve ser inferida de um certo número de coincidências e de indícios que, considerados em conjunto, possam constituir, na falta de outra explicação coerente, a prova de uma violação das normas da concorrência. Esses indícios e coincidências, quando avaliados globalmente, permitem revelar não só a existência de comportamentos ou de acordos anticoncorrenciais, mas também a duração de um comportamento anticoncorrencial continuado e o período de aplicação de um acordo celebrado em violação das normas da concorrência (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 100, supra, n.° 57, e de 21 de setembro de 2006, Nederlandse Federatieve Vereniging voor de Groothandel op Elektrotechnisch Gebied/Comissão, C‑105/04 P, Colet., p. I‑8725, n.os 94 a 96 e jurisprudência aí referida).

192    Por outro lado, essa violação do artigo 81.°, n.° 1, CE pode resultar não só de um ato isolado, mas também de uma série de atos ou ainda de um comportamento continuado. Esta interpretação não pode ser posta em causa pelo facto de um ou mais elementos dessa série de atos ou de esse comportamento continuado poderem igualmente constituir em si mesmos e isoladamente uma violação dessa disposição. Quando as diferentes ações se inscrevem num «plano de conjunto», pelo seu objetivo idêntico que falseia o jogo da concorrência no interior do mercado comum, a Comissão pode imputar a responsabilidade dessas ações em função da participação na infração no seu conjunto (acórdãos Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 100, supra, n.° 258, e de 21 de setembro de 2006, Nederlandse Federatieve Vereniging voor de Groothandel op Elektrotechnisch Gebied/Comissão, C‑105/04 P, Colet., p. I‑8725, n.° 110).

193    Quanto à falta de prova da existência de um acordo em certos períodos determinados ou, pelo menos, quanto à sua execução por uma empresa num dado período, há que lembrar que o facto de não ter sido feita a prova da infração em relação a certos períodos não obsta a que se considere constituída a infração durante um período global mais amplo do que esses períodos, desde que isso assente em indícios objetivos e concordantes. No âmbito de uma infração que se estende por vários anos, o facto de as manifestações do cartel ocorrerem em períodos diferentes, que podem ser separados por intervalos de tempo mais ou menos longos, não tem qualquer importância para a existência do cartel, na medida em que as diferentes ações que fazem parte dessa infração prossigam uma única finalidade e se integrem no âmbito de uma infração com caráter único e continuado (acórdão Nederlandse Federatieve Vereniging voor de Groothandel op Elektrotechnisch Gebied/Comissão, n.° 192, supra, n.os 97 e 98; v. ainda, neste sentido, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, n.° 100, supra, n.° 260).

194    A esse respeito, a jurisprudência identificou vários critérios relevantes para apreciar o caráter único de uma infração, isto é, a identidade dos objetivos das práticas em causa (v., neste sentido, acórdão Technische Unie/Comissão, n.° 102, supra, n.os 170 e 171, e acórdãos do Tribunal Geral de 20 de março de 2002, Dansk Rørindustri/Comissão, T‑21/99, Colet., p. II‑1681, n.° 67, e de 27 de setembro de 2006, Jungbunzlauer/Comissão, T‑43/02, Colet., p. II‑3435, n.° 312), a identidade dos produtos e dos serviços em causa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 15 de junho de 2005, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑71/03, T‑74/03, T‑87/03 e T‑91/03, não publicado na Coletânea, n.os 118, 119 e 124, e Jungbunzlauer/Comissão, já referido, n.° 312), a identidade das empresas participantes (acórdão Jungbunzlauer/Comissão, já referido, n.° 312) e a identidade das formas de execução (acórdão Dansk Rørindustri/Comissão, já referido, n.° 68). Além disso, a identidade das pessoas singulares envolvidas por conta das empresas e a identidade do âmbito de aplicação geográfico das práticas em causa são igualmente suscetíveis de ser tomadas em consideração para efeitos dessa análise.

195    A jurisprudência permite assim que a Comissão presuma que a infração ― ou que a participação de uma empresa na infração ― não foi interrompida, mesmo que não tenha provas da infração relativamente a determinados períodos, na medida em que as diferentes ações que fazem parte dessa infração prossigam uma única finalidade e sejam suscetíveis de se integrar no âmbito de uma infração com caráter único e continuado, devendo essa constatação assentar em indícios objetivos e concordantes que demonstrem a existência de um plano de conjunto.

196    Quando essas condições estiverem reunidas, o conceito de infração continuada permite assim que a Comissão aplique uma coima por todo o período da infração tomado em consideração e determine em que data começa a correr o prazo de prescrição, isto é, a data em que a infração continuada teve o seu termo.

197    Contudo, as empresas acusadas de colusão podem elidir essa presunção, apresentando indícios ou provas de que, pelo contrário, a infração ― ou que a sua participação na infração ― não prosseguiu durante esses mesmos períodos.

198    Por outro lado, há que distinguir o conceito de infração repetida do conceito de infração continuada (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 19 de maio de 2010, IMI e o./Comissão, T‑18/05, Colet., p. II‑1769, n.os 96 e 97), distinção essa que, de resto, é confirmada pelo uso da conjunção «ou» no artigo 25.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003.

199    Quando se puder demonstrar que a participação de uma empresa na infração foi interrompida e que a infração cometida pela empresa antes e depois desse período apresenta as mesmas caraterísticas, que devem ser apreciadas nomeadamente à luz da identidade dos objetivos das práticas em causa, dos produtos em causa, das empresas participantes na colusão, das principais formas de execução, das pessoas singulares envolvidas por conta das empresas e, por último, do âmbito de aplicação geográfico dessas práticas, a infração em causa deve ser qualificada de única e repetida.

200    Nesse caso, a Comissão não pode aplicar qualquer coima pelo período em que a infração esteve interrompida.

201    Além disso, de acordo com as disposições do artigo 25.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 1/2003, a duração da interrupção não pode exceder cinco anos, caso em que a aplicação de uma coima pelo período de infração anterior a essa interrupção prescreve.

 Quanto à existência de uma infração continuada no caso presente

202    Consequentemente, há que determinar se, nessas condições, a Comissão podia imputar a existência de uma infração continuada à recorrente entre 1 de abril de 1986 e 1 de agosto de 1992 e entre 3 de setembro de 1996 e 2 de maio de 2007.

203    Há que lembrar que, no caso, resulta da decisão recorrida que as empresas nela indicadas participaram, de formas por vezes diferentes, numa infração materializada pela atribuição de concursos, pela fixação dos preços, pela fixação de quotas, pela fixação das condições de venda, pela partilha de mercados geográficos, e pela troca de informações sensíveis sobre os preços, os volumes das vendas e os concursos, no mercado mundial das mangueiras marinhas.

204    A esse respeito, refira‑se que a existência de um plano de conjunto está claramente demonstrada na decisão recorrida. Esse plano resulta da identidade, antes e depois do período intermédio, dos objetivos das práticas em causa, dos produtos em causa, das empresas participantes na colusão, das principais formas de execução, das pessoas singulares envolvidas por conta das empresas e, por último, do âmbito de aplicação geográfico dessas práticas.

205    Além disso, os comportamentos que tinham o objetivo de conciliar as divergências entre os membros do cartel e de relançar o cartel no período intermédio, tal como resultam dos documentos apresentados pela recorrente e acima analisados nos n.os 177 a 180, devem consequentemente ser considerados parte integrante do plano de conjunto prosseguido pelos membros do cartel.

206    Por outro lado, ouvida quanto a este ponto na audiência, a recorrente não nega ter participado na infração entre 1 de abril de 1986 e 1 de agosto de 1992, e depois entre 9 de maio de 2000 e 2 de maio de 2007.

207    É certo que a recorrente alega que são infrações distintas e que não podem ser qualificadas de infração continuada ou repetida, o que confirmou na audiência, mas há que considerar que a existência de um plano de conjunto resulta claramente da decisão recorrida, tendo em conta a identidade, entre 1986 e 2007, dos objetivos das práticas em causa, dos produtos em causa, das empresas participantes na colusão, das principais formas de execução, das pessoas singulares envolvidas por conta das empresas e, por último, do âmbito de aplicação geográfico dessas práticas.

208    Está também demonstrado que a recorrente reintegrou o cartel a partir de 3 de setembro de 1996 e participou na infração até 13 de maio de 1997 (v. n.os 147 e segs., supra) e que teve parte ativa nas discussões que decorreram no período intermédio com vista a relançar o cartel e a reintegrá‑lo (v. n.os 181 e segs., supra).

209    As explicações alternativas que a recorrente avançou sobre o seu comportamento nesse período foram também rejeitadas pelo Tribunal (v. n.os 181 e segs., supra).

210    A Comissão admite ainda e resulta do artigo 1.° da decisão recorrida que a recorrente interrompeu a sua participação no cartel entre 1 de agosto de 1992 e 3 de setembro de 1996.

211    É certo que a Comissão deu por provada a existência de uma infração continuada imputável à MRI, apesar de simultaneamente dar por provado que a sua participação no cartel tinha sido interrompida entre 1 de agosto de 1992 e 3 de setembro de 1996.

212    Contudo, não cometeu qualquer erro a Comissão ao dar por provado que a recorrente tinha participado no cartel em dois períodos de infração distintos entre 1 de abril de 1986 e 1 de agosto de 1992 e entre 3 de setembro de 1996 e 2 de maio de 2007.

213    Consequentemente, o erro de apreciação da Comissão acima referido no n.° 211 não tem qualquer incidência na legalidade da decisão recorrida, uma vez que podia considerar que a infração cometida pela recorrente era uma infração repetida na aceção do artigo 25.° do Regulamento n.° 1/2003 ― uma vez que os dois períodos da infração se caracterizam pela existência de um plano de conjunto (v. n.os 203 e 204, supra) ― e que a interrupção da participação de MRI na infração entre 1 de agosto de 1992 e 3 de setembro de 1996 era inferior a cinco anos (v. n.° 201, supra).

214    Em conclusão, por um lado, uma vez que há que considerar que a infração cometida entre 1 de abril de 1986 e 1 de agosto de 1992 não estava prescrita, há que julgar improcedente o primeiro fundamento, o de, no essencial, a Comissão não poder declarar uma infração prescrita. Há que julgar igualmente improcedente a alegação de falta de fundamentação, uma vez que resulta da decisão recorrida que a recorrente tinha participado no cartel durante dois períodos de infração distintos entre 1 de abril de 1986 e 1 de agosto de 1992 e entre 3 de setembro de 1996 e 2 de maio de 2007.

215    Por outro lado, também a argumentação apresentada pela recorrente em apoio do seu segundo fundamento relativo à prescrição do período de infração entre 3 de setembro de 1996 e 9 de maio de 2000 deve ser julgada improcedente, uma vez que está demonstrado que reintegrou o cartel a partir de 3 de setembro de 1996 e que participou, durante o período intermédio, em discussões destinadas a relançar o cartel e a determinar a sua posição neste.

216    Resulta do exposto que há que julgar improcedentes as primeira, segunda e terceira partes do segundo fundamento, na medida em que a recorrente alega, no essencial, por um lado, que a Comissão interpretou erradamente os elementos de prova à sua disposição e não fez prova do seu envolvimento no cartel entre 3 de setembro de 1996 e 9 de maio de 2000 e, por outro, que a recorrente deu uma explicação alternativa plausível para os elementos de prova tidos em conta pela Comissão e para o seu comportamento nesse período.

d)     Quanto ao mérito das outras partes do segundo fundamento

217    Por outro lado, no que respeita à argumentação da recorrente no âmbito da segunda parte do segundo fundamento, argumentação segundo a qual a Comissão deveria ter feito prova de que a recorrente tinha participado numa infração nova, uma vez que a infração anterior a 1992 estava prescrita e que a Comissão não podia dar por provada a esse respeito a existência de uma infração continuada a partir de 1 de abril de 1986, há que lembrar que a Comissão não cometeu qualquer erro ao considerar que a recorrente tinha participado no cartel durante dois períodos de infração, certamente distintos, mas nos quais tinha participado num plano comum caracterizado pela identidade, antes e depois do período intermédio, dos objetivos das práticas em causa, dos produtos em causa, das empresas participantes na colusão, das principais formas de execução, das pessoas singulares envolvidas por conta das empresas e, por último, do âmbito de aplicação geográfico dessas práticas (v. n.os 203 e 204, supra). Não tem pois razão a recorrente quando alega que participou numa infração nova, devendo portanto a sua argumentação ser julgada improcedente.

218    Quanto à argumentação da recorrente em apoio da terceira parte do segundo fundamento, segundo a qual a Comissão não demonstrou que a sua conduta, entre 3 de setembro de 1996 e 9 de maio de 2000, estava estreitamente ligada à realização de todos os efeitos anticoncorrenciais pretendidos pelos outros autores da infração, no âmbito de um plano de conjunto com um objetivo único, há que observar que, por um lado, tendo aderido à coordenação organizada pelo cartel em 3 de setembro de 1996 e tendo obtido uma parte do concurso «Sumed» nessa ocasião e, por outro, tendo participado ativamente nos contactos destinados ao relançamento do cartel no período intermédio, está claramente demonstrado que a recorrente esteve estreitamente ligada à realização de todos os efeitos anticoncorrenciais de um plano de conjunto pretendidos pelos outros autores da infração. A sua argumentação deve, consequentemente, ser julgada improcedente.

219    Improcede também a argumentação da recorrente no âmbito da quarta parte do segundo fundamento, segundo a qual só foi punida pelo período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997, apesar de o seu comportamento ter sido o mesmo durante o período intermédio e de essa diferença de tratamento ser injustificada. Com efeito, resulta do exposto que participou novamente no cartel entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997, obtendo uma parte do contrato «Sumed» na sequência de uma coordenação para o efeito com os outros membros do cartel e que, durante o período intermédio, participou nos contactos destinados ao relançamento do cartel e negociou o seu lugar no interior deste. São, portanto, comportamentos diferentes que justificam a decisão da Comissão de aplicar uma coima pelo período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997 e de não a aplicar pelo período intermédio.

220    Esta conclusão de modo nenhum é posta em causa pela argumentação da recorrente de que não foi punida pelo período entre maio de 1999 e maio de 2000 quando os outros membros do cartel o foram, uma vez que essa distinção é justificada pelo facto de só ter reintegrado ativamente o cartel um ano depois dos seus outros membros, tendo com efeito prolongado os seus contactos com eles a fim de renegociar as condições da sua participação.

221    Consequentemente, improcede integralmente a quarta parte do segundo fundamento.

222    Quanto à quinta parte do segundo fundamento, no âmbito da qual a recorrente alega, no essencial, que os factos ilícitos do período entre 1996 e 2000 são distintos dos comportamentos ilícitos cometidos no âmbito do cartel propriamente dito e devem ser punidos distintamente, admitindo que não estivessem prescritos, há que remeter para as apreciações acima expostas nos n.os 123 a 187 e 202 a 214 e, consequentemente, julgar improcedentes tanto a argumentação de mérito da recorrente como a alegação de falta de fundamentação.

223    Em conclusão, consequentemente há que julgar improcedentes os primeiro e segundo fundamentos.

C ―  Quanto ao terceiro fundamento, relativo a diversos erros na determinação do montante da coima, à violação do princípio da proporcionalidade, do princípio da adequação da sanção, do princípio da igualdade de tratamento, do princípio da proteção da confiança legítima e a uma falta de fundamentação

224    Há que lembrar, a título preliminar, que o princípio da igualdade de tratamento exige que as situações comparáveis não sejam tratadas de forma diferente e que as situações diferentes não sejam tratadas de forma igual, a menos que esse tratamento seja objetivamente justificado (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de maio de 2007, Advocaten voor de Wereld, C‑303/05, Colet., p. I‑3633, n.° 56 e jurisprudência aí referida).

225    Por outro lado, o princípio da proporcionalidade exige que os atos das instituições não vão além dos limites do apropriado e necessário para atingir o objetivo pretendido. No contexto do cálculo das coimas, a gravidade das infrações deve ser determinada em função de numerosos elementos, não havendo que atribuir a nenhum deles uma importância desproporcionada face aos outros elementos de apreciação. O princípio da proporcionalidade implica, nesse contexto, que a Comissão deve fixar a coima proporcionalmente aos elementos tomados em conta para apreciar a gravidade da infração e que esta deve aplicar esses elementos de forma coerente e objetivamente justificada (v. acórdãos do Tribunal Geral Jungbunzlauer/Comissão, n.° 194, supra, n.os 226 a 228 e jurisprudência aí referida, e de 28 de abril de 2010, Gütermann e Zwicky/Comissão, T‑456/05 e T‑457/05, Colet., p. II‑1443, n.° 264).

226    Por último, segundo jurisprudência assente, o direito de invocar o princípio da proteção da confiança legítima pertence a qualquer sujeito de direito em quem uma instituição da União, ao fornecer‑lhe garantias precisas, criou esperanças fundadas (acórdãos do Tribunal de Justiça de 24 de novembro de 2005, Alemanha/Comissão, C‑506/03, não publicado na Coletânea, n.° 58, e de 18 de julho de 2007, AER/Karatzoglou, C‑213/06 P, Colet., p. I‑6733, n.° 33). Constituem tais garantias, qualquer que seja a forma como são comunicadas, as informações precisas, incondicionais e concordantes [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de dezembro de 2008, Masdar (UK)/Comissão, C‑47/07 P, Colet., p. I‑9761, n.os 34 e 81].

1.     Quanto à primeira parte do terceiro fundamento, relativa a um erro de apreciação da gravidade da infração e à violação do princípio da igualdade de tratamento

a)     Decisão recorrida

227    Resulta dos considerandos 437 a 445 da decisão recorrida que a Comissão fixou uma percentagem de 25% das vendas relevantes para determinar o montante de base da coima, em função da gravidade da infração.

b)     Argumentos das partes

228    A recorrente considera que a utilização de uma percentagem de 25% das vendas relevantes para determinar o montante de base da coima, em função da gravidade da infração, é errada e injustificada, pois, desse modo, a Comissão equiparou‑a de forma discriminatória aos outros produtores, pois, em sua opinião, a gravidade da infração que cometeu é claramente menor do que a gravidade da infração cometida pelas outras empresas.

229    Ora, resulta da jurisprudência, segundo afirma, que, para respeitar os princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade da sanção, a Comissão não se pode eximir a uma análise dos fatores que levam a uma apreciação diferente da gravidade da infração imputável a cada uma das empresas, o que implica que deve determinar a coima tendo razoavelmente em conta as circunstâncias específicas que distinguem a posição de uma empresa da das outras. Ora, segundo afirma, a Comissão não procedeu a qualquer apreciação relativa à diferença de grau e de intensidade do seu envolvimento no cartel, apesar de, na decisão, ter reconhecido em várias ocasiões a sua posição particular no cartel (por exemplo, nos considerandos 170, 187 e 211 a 214 da decisão recorrida).

230    A recorrente alega que, desse modo, a Comissão não teve nomeadamente em conta o facto de, ao contrário dos outros produtores, ela nunca ter sido «uma participante fiel, entusiasta e dinâmica» do cartel, como demonstra o facto de ter decidido pôr fim à sua participação no cartel por duas vezes, que é a única a ter organizado as suas atividades em oposição ao cartel, que sofreu constantemente pressões, ameaças e medidas de retaliação por parte dos seus concorrentes, e que também não lhe pode ser imputada a participação numa infração única e complexa durante todo o período tido em consideração pela Comissão.

231    Daí resulta, na sua opinião, que a Comissão violou os princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento, princípios que as orientações sobre as coimas não podem reduzir a nada.

232    A Comissão contesta essa argumentação.

c)     Apreciação do Tribunal Geral

233    No essencial, a recorrente invoca simultaneamente um erro de apreciação, a violação dos princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento e uma falta de fundamentação.

234    Como a Comissão acertadamente recorda, segundo jurisprudência assente, a gravidade de uma infração é determinada tendo em conta numerosos elementos ― como as circunstâncias particulares do processo, o seu contexto e o alcance dissuasivo das coimas ― à luz dos quais a Comissão dispõe de uma margem de apreciação (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de maio de 2007, SGL Carbon/Comissão, C‑328/05 P, Colet., p. I‑3921, n.° 43).

235    Entre os elementos suscetíveis de entrar na apreciação da gravidade das infrações, figuram o comportamento de cada uma das empresas, o papel desempenhado por cada uma delas na criação do cartel, o benefício que tiveram com ele, a sua dimensão e o valor das mercadorias em causa, bem como o risco que as infrações desse tipo representam para os objetivos da União. A esse título, é possível, com vista à determinação da coima, ter em conta tanto o volume de negócios global da empresa, que constitui uma indicação, ainda que aproximativa e imperfeita, da dimensão da mesma e do seu poder económico, como a parte desse volume que provém das mercadorias objeto da infração e que, portanto, pode dar uma indicação da amplitude da mesma. Não há que atribuir nem a um nem a outro desses valores uma importância desproporcionada relativamente aos outros elementos de apreciação e, por conseguinte, a fixação de uma coima adequada não pode ser o resultado de um simples cálculo baseado no volume de negócios realizado com a venda do produto em causa. Além disso, não existe no direito da União um princípio de aplicação geral segundo o qual a sanção deva ser proporcional ao volume de negócios realizado pela empresa através da venda do produto objeto da infração (acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de dezembro de 2011, KME Germany e o./Comissão, C‑389/10 P, n.os 58 a 60).

236    No caso, não se pode deixar de observar que, embora seja certo que a recorrente interrompeu a sua participação no cartel em 1992, não é menos verdade que reintegrou o cartel em 3 de setembro de 1996 e que, de maio de 1997 a dezembro de 1999, manteve contactos ilícitos com ele para o reintegrar de forma plena e completa novamente em maio de 2000, até maio de 2007. Alega ter sido obrigada a isso, mas essa argumentação não pode porém ser aceite, como também não colhem as suas alegações sobre o facto de não ter participado numa infração única e complexa (v. n.os 159, 185 e 202 a 214, supra).

237    Daí resulta que não estava numa situação que a distinguisse dos outros participantes no cartel e que justifique que lhe seja aplicada uma diferente percentagem das vendas relevantes para determinar o montante de base da coima.

238    Daí resulta igualmente que a Comissão não violou o princípio da proporcionalidade.

239    A primeira parte do terceiro fundamento deve, portanto, ser julgada integralmente improcedente.

2.     Quanto à segunda parte do terceiro fundamento, relativa a um erro no cálculo da coima em função da duração da infração e à violação do princípio da proteção da confiança legítima

a)     Decisão recorrida

240    Resulta dos considerandos 141 a 147 da decisão recorrida que a Comissão, com base em diversos documentos, incluindo certas notas internas comunicadas pela MRI no âmbito do seu pedido de clemência (considerandos 143 a 145 da decisão recorrida), considerou que esta tinha aderido ativamente ao cartel a partir de 3 de setembro de 1996.

241    O considerando 487 da decisão recorrida expõe as razões pelas quais a Comissão se opõe à argumentação da recorrente em que pede que, nos termos do n.° 26 da comunicação sobre a cooperação, não sejam utilizados contra ela os elementos de prova que forneceu à Comissão relativamente ao período 1996‑1997.

242    Os considerandos 447 e 448 da decisão recorrida precisam, por último, a duração do período da infração tomado em consideração pela Comissão para efeitos de cálculo da coima.

b)     Argumentos das partes

243    No essencial, a recorrente alega que, ao integrar o período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997, a duração da infração foi erradamente fixada em oito anos (tendo esse período de oito meses sido arredondado para um ano suplementar), o que levou a um agravamento da coima de cerca de [confidencial]. Com efeito, entende ter sido indevidamente punida por esse período, unicamente com base em provas que ela própria tinha comunicado à Comissão no âmbito do programa de clemência. Ora, essas provas não lhe podiam ter sido opostas, de acordo com a comunicação sobre a cooperação, constituindo esse ato contra os seus direitos igualmente uma violação do princípio da proteção da confiança legítima. Afirma ainda que a decisão recorrida não tem uma fundamentação adequada a esse respeito.

244    A esse respeito, a Comissão limita‑se a remeter para a sua argumentação apresentada no âmbito do segundo fundamento.

c)     Apreciação do Tribunal Geral

245    Resulta da análise do segundo fundamento que a Comissão teve razão ao considerar que a recorrente tinha reintegrado o cartel em 3 de setembro de 1996 e que tinha participado plenamente na infração até 13 de maio de 1997 (v. n.° 159, supra).

246    A Comissão não cometeu portanto um erro ao tomar em consideração o período de infração entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997 nem ao aumentar a duração da infração de sete anos e meio para oito anos, segundo as suas orientações.

247    Além disso, não se pode deixar de observar que a decisão recorrida contém uma fundamentação adequada, que consta dos seus considerandos 141 a 147 e 487. Improcede portanto a alegação de falta de fundamentação.

248    Por outro lado, improcede a alegação de violação do princípio da proteção da confiança legítima, na medida em que a Comissão lhe opôs certos documentos que ela tinha apresentado no âmbito do seu pedido de cooperação, uma vez que a Comissão não tinha de afastar esses documentos nos termos do n.° 26, último parágrafo, da comunicação sobre a cooperação e que, de qualquer forma, esses documentos não eram necessários para demonstrar a infração cometida entre setembro de 1996 e maio de 1997 (v. n.os 123 a 159, supra).

249    Consequentemente, improcede na íntegra a segunda parte do terceiro fundamento.

3.     Quanto à terceira parte do terceiro fundamento, relativa a um erro no agravamento da coima a título dissuasivo, e a uma violação do dever de fundamentação e do princípio da igualdade de tratamento

a)     Decisão recorrida

250    Resulta dos considerandos 449 e 450 da decisão recorrida que a Comissão, aplicando o n.° 25 das orientações, aplicou um agravamento do montante de base em 25% do valor das vendas a título dissuasivo.

b)     Argumentos das partes

251    A recorrente lembra que o agravamento de 25% com vista a assegurar um efeito dissuasivo é o máximo permitido pelas orientações, que dispõem que esse agravamento se situará entre 15% e 25% das vendas relevantes.

252    Entende que, ao aplicar‑lhe esse agravamento máximo, a Comissão a equiparou indevidamente aos outros produtores em violação dos princípios aplicáveis e sem fundamentação.

253    Assim, a Comissão não teve em conta, segundo a recorrente, o facto de ela ter sensivelmente menor dimensão do que os outros produtores. Ora, a jurisprudência exige que o agravamento aplicado com o objetivo de assegurar um efeito dissuasivo tenha em conta as diferenças de dimensão das empresas participantes no cartel.

254    A recorrente alega que isso vale também no que respeita à diferença do seu comportamento, na medida em que não era um membro assíduo do cartel, saiu dele em 1992 e fez o que podia para se distanciar dele e só voltou por não poder resistir às pressões e ameaças dos outros membros do cartel. Acresce que, em 2003, a sua direção manifestou inequivocamente a vontade de sair do cartel e, se, apesar de tudo, continuou no cartel depois dessa data, foi unicamente em razão da conduta de certos empregados desleais da filial dos Estados Unidos, que agiram à sua revelia e contra a sua vontade, nunca tendo aliás a Comissão afirmado que a recorrente tinha tido conhecimento das atividades da sua parte americana e menos ainda que as tivesse aprovado. Além disso, logo que teve conhecimento do seu papel no cartel e da sua violação do seu código de ética, cortou imediatamente as suas relações com F., consultor, e a sua relação laboral com um antigo empregado da MOM.

255    Além disso, tinha instituído desde 2005 um procedimento interno destinado a impor aos seus empregados o respeito pela regulamentação relativa à concorrência e, em aplicação do novo código de ética aprovado nesse âmbito, puniu um dos seus empregados.

256    Isso revela, em seu entender, que estava e está plenamente convencida da necessidade de não participar no futuro em atividades anticoncorrenciais, sendo o agravamento da coima para efeitos de dissuasão totalmente inútil e desprovido de fundamentação.

257    Por último, de qualquer forma, a aplicação da taxa máxima do agravamento é injustificada à luz do papel que desempenhou no cartel.

258    A Comissão contesta esta argumentação.

c)     Apreciação do Tribunal Geral

259    Primeiro, há que lembrar que as orientações dispõem:

«10.      Em primeiro lugar, a Comissão determinará um montante de base para cada empresa ou associação de empresas.

11.      Em segundo lugar, a Comissão poderá ajustar este montante de base para cima ou para baixo.

[…]

19.      O montante de base da coima estará ligado a uma proporção do valor das vendas, determinado em função do grau de gravidade da infração, multiplicado pelo número de anos de infração.

20.      A apreciação da gravidade será feita numa base casuística para cada tipo de infração, tendo em conta todas as circunstâncias relevantes do caso.

[…]

23.      Os acordos horizontais de fixação de preços, de repartição de mercado e de limitação de produção, que são geralmente secretos, são pela sua natureza considerados as restrições de concorrência mais graves. No âmbito da política da concorrência serão sancionados severamente […]»

260    Segundo, tem sido repetidamente decidido no sentido de que, enquanto o montante de partida da coima é fixado em função da infração, a sua gravidade relativa é determinada por referência a muitos fatores, sobre os quais a Comissão dispõe de uma margem de apreciação (acórdão KME Germany e o./Comissão, n.° 235, supra, n.° 58). Além disso, resulta das orientações que a apreciação da gravidade da infração é feita em duas etapas. Num primeiro momento, a gravidade geral é apreciada unicamente em função dos elementos específicos da infração, tais como a sua natureza e o seu impacto no mercado, e, num segundo momento, a apreciação da gravidade relativa é modulada em função das circunstâncias específicas da empresa em causa, o que leva ainda a Comissão a tomar em consideração não só as eventuais circunstâncias agravantes mas também, sendo caso disso, as circunstâncias atenuantes. Isso permite, nomeadamente no âmbito de infrações que envolvam várias empresas, ter em conta, na apreciação da gravidade da infração, o papel desempenhado por cada empresa e a sua atitude para com a Comissão durante o procedimento (acórdãos do Tribunal Geral de 12 de julho de 2001, Tate & Lyle e o./Comissão, T‑202/98, T‑204/98 e T‑207/98, Colet., p. II‑2035, n.° 109, e de 28 de abril de 2010, BST/Comissão, T‑452/05, Colet., p. II‑1373, n.° 48). Assim, mesmo admitindo que fosse despiciendo, o papel individual da recorrente não pode pôr em causa o grau de gravidade da infração.

261    Consequentemente, não merece reparo a Comissão por ter entendido que a infração ― que durou pelo menos de 1986 a 2007 e foi caracterizada quer por acordos sobre os preços quer por repartições de mercados geográficos e de quotas ― apresentava uma significativa gravidade geral.

262    Ora, a recorrente participou plenamente nos comportamentos ilícitos, mesmo tendo‑se afastado do cartel em 1992 e só o tendo reintegrado em 1996, o que foi tido em conta no cálculo da coima que lhe foi aplicada, não tendo sido aplicada qualquer coima, com efeito, pelo período anterior a 3 de setembro de 1996 (v. considerando 448 da decisão recorrida).

263    Improcede, portanto, a alegação de violação do princípio da igualdade de tratamento.

264    Terceiro, segundo jurisprudência assente, uma vez que a Comissão não tem de efetuar o cálculo do montante da coima a partir de montantes baseados no volume de negócios das empresas em causa, também não tem de assegurar, no caso de aplicação de coimas a várias empresas envolvidas na mesma infração, que os montantes finais das coimas resultantes do seu cálculo traduzam toda a diferenciação entre elas quanto ao seu volume de negócios global ou ao seu volume de negócios no mercado do produto em causa. A esse respeito, há que precisar que o artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de fevereiro de 1962, primeiro regulamento de execução dos artigos 81.° e 82.° [CE] (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22) e o artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1/2003 também não exigem que, no caso de aplicação de coimas a várias empresas envolvidas na mesma infração, o montante da coima aplicada a uma empresa de pequena ou média dimensão não seja superior, em percentagem do volume de negócios, ao das coimas aplicadas às empresas maiores. Com efeito, resulta dessas disposições que, tanto para as empresas de pequena ou média dimensão como para as empresas de maior dimensão, há que tomar em consideração, na determinação do montante da coima, a gravidade e a duração da infração. Na medida em que a Comissão aplique a cada uma das empresas envolvidas na mesma infração coimas justificadas, relativamente à gravidade e à duração da infração, não merece qualquer reparo o facto de, para algumas delas, o montante da coima ser superior, face ao volume de negócios, ao de outras empresas. Assim, a Comissão não tem de reduzir o montante das coimas quando as empresas em causa são pequenas e médias empresas. Com efeito, a dimensão da empresa já foi tida em conta no limite fixado no artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17, no artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento n.° 1/2003, e nas disposições das orientações. Com exceção destas considerações relativas à dimensão, não há qualquer razão para tratar as pequenas e médias empresas de forma diferente das outras empresas. O facto de as empresas em causa serem pequenas e médias empresas não as isenta do respeito das normas da concorrência (v. acórdãos do Tribunal Geral Gütermann e Zwicky/Comissão, n.° 225, supra, n.os 279 a 281 e jurisprudência aí referida, e de 28 de abril de 2010, Amann & Söhne e Cousin Filterie/Comissão, T‑446/05, Colet., p. II‑1255, n.os 198 a 200).

265    Consequentemente, a recorrente não tem razão quando alega que a sua pequena dimensão lhe deveria ter valido um tratamento diferenciado no plano da apreciação da gravidade da infração, na qual, de resto, se provou ter participado plenamente.

266    Improcede, assim, igualmente a alegação de violação do princípio da proporcionalidade.

267    Quarto, uma vez que a recorrente não pode utilmente alegar que só participou no cartel de forma marginal entre 1996 e 2000 ou que a sua participação tinha o objetivo de adotar uma atitude defensiva face aos seus concorrentes (v. nomeadamente n.° 185, supra), não se pode criticar a Comissão por não ter tido em conta esses elementos na sua apreciação da gravidade da infração.

268    Por outro lado, embora a recorrente alegue que não estava ao corrente das atuações ilícitas da sua filial americana MOM, não contesta, no presente recurso, ser plenamente responsável pelos atos praticados por esta, na aceção da jurisprudência (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de setembro de 2009, Akzo Nobel e o./Comissão, C‑97/08 P, Colet., p. I‑8237). Com efeito, limita‑se a contestar a percentagem de agravamento aplicada para fins dissuasivos pela Comissão, que não teria tido suficientemente em conta a sua atitude, nomeadamente face às outras empresas envolvidas no cartel.

269    Nestas circunstâncias, a intenção que exprimiu em 2003 de deixar o cartel é irrelevante, uma vez que, pelo menos, está demonstrado que a sua filial continuou a participar na infração até 2007.

270    A Comissão podia portanto tomar em consideração o facto de a recorrente, pelo menos através da sua filial, ter participado no cartel até maio de 2007.

271    Consequentemente, a Comissão não cometeu qualquer erro na sua apreciação da gravidade da infração a esse respeito.

272    Isto vale também no que respeita ao programa interno da recorrente destinado ao respeito do direito da concorrência, uma vez que, com efeito, já foi decidido no sentido de que, embora seja certamente importante que uma empresa tenha tomado medidas para impedir futuramente a prática de novas infrações ao direito da concorrência da União por membros do seu pessoal, isso em nada muda a realidade da infração. Esse facto não obriga a Comissão a reduzir, como circunstância atenuante, o montante da coima aplicada a essa empresa (v., neste sentido, acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, n.° 115, supra, n.° 373).

273    Consequentemente, não colhe a alegação de falta de efeito dissuasivo do agravamento da coima pelo facto de a recorrente já ter aprovado disposições que revelam a sua vontade de evitar ser envolvida em atividades colusórias.

274    Quinto e último, resulta destas considerações que a alegação de falta de fundamentação também não pode ser aceite.

275    Improcede, portanto, a terceira parte do terceiro fundamento.

4.     Quanto à quarta parte do terceiro fundamento, relativa a um erro na apreciação das condições para a aplicação de circunstâncias atenuantes e à violação do dever de fundamentação

a)     Decisão recorrida

276    Resulta do considerando 464 da decisão recorrida que a Comissão não reconhece aos membros do cartel nenhuma circunstância atenuante que possa resultar de um papel passivo ou secundário no interior do cartel.

b)     Argumentos das partes

277    A recorrente entende que, sem proceder a um exame específico da situação individual das empresas e sem qualquer fundamentação, a Comissão não aceitou aplicar circunstâncias atenuantes no considerando 464 da decisão recorrida.

278    Assim, não teve em conta a situação particular da recorrente nem uma série de circunstâncias determinantes para qualificar o seu comportamento para com o cartel e no seu interior, assim violando o princípio da igualdade de tratamento.

279    A recorrente alega ainda que não consta entre «várias empresas» (considerando 434 da decisão recorrida) que invocaram a pequena importância da sua atividade no setor das mangueiras marinhas para lhes serem reconhecidas circunstâncias atenuantes, o que constitui uma equiparação sem distinção e superficial da sua defesa à de outros produtores.

280    Por outro lado, a Comissão limitou‑se, segundo afirma, a aplicar‑lhe o mesmo tratamento que à Trelleborg e à Dunlop, apesar de nem o comportamento nem o peso dessas empresas serem comparáveis aos seus.

281    A recorrente entende, por último que a redução que lhe deveria ter sido concedida em caso algum deveria ter sido inferior a 30%.

282    A Comissão contesta estas alegações.

c)     Apreciação do Tribunal Geral

283    Há que lembrar que as orientações dispõem:

«29.      O montante de base da coima pode ser diminuído sempre que a Comissão verifique existirem circunstâncias atenuantes, designadamente quando:

[…]

a empresa em causa prova que a sua participação na infração é substancialmente reduzida e demonstra por conseguinte que, durante o período em que aderiu aos acordos que são objeto de infração, se subtraiu efetivamente à respetiva aplicação adotando um comportamento concorrencial no mercado. O simples facto de uma empresa ter participado numa infração por um período mais curto que as outras não será considerado como uma circunstância atenuante, dado que esta circunstância já se encontra refletida no montante de base.

[...]»

284    O considerando 464 da decisão recorrida, sob a epígrafe «Papel passivo e/ou secundário», tem a seguinte redação:

«Várias empresas em causa afirmam que a sua atividade [relativa às mangueiras marinhas] é uma atividade pouco importante. A Comissão entende geralmente que isso não pode servir de ponto de partida para determinar um papel passivo ou secundário, que se baseia unicamente no tipo de papel que uma empresa desempenhou no interior de um cartel e não na importância da atividade no interior do grupo. A Comissão assinala ainda que, não obstante a importância relativa da atividade, todas as empresas envolvidas consideraram que a atividade [relativa às mangueiras marinhas] era suficientemente importante para se manter, provavelmente por razões de rentabilidade (com exceção da Bridgestone que cessou a sua atividade após o final da infração). Por último, a Comissão afirma que a importância relativa da atividade é suficientemente refletida no cálculo do montante de base e que já não tem que ser tida em conta.»

285    Antes de mais, há que analisar se, como alega a recorrente, a Comissão cometeu um erro de apreciação ao concluir que não lhe deviam ser reconhecidas circunstâncias atenuantes.

286    Há que lembrar a esse respeito que, segundo a jurisprudência, as pressões exercidas por empresas com vista a induzir outras a participarem numa infração ao direito da concorrência não ilibam, independentemente da sua dimensão, a empresa em causa da sua responsabilidade pela infração praticada, em nada modificam a gravidade do cartel e não constituem uma circunstância atenuante para efeitos do cálculo dos montantes das coimas, dado que a referida empresa poderia ter denunciado as eventuais pressões às autoridades competentes e apresentado queixa (v., neste sentido, acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, n.° 115, supra, n.os 369 e 370, e acórdão do Tribunal Geral de 29 de novembro de 2005, Union Pigments/Comissão, T‑62/02, Colet., p. II‑5057, n.° 63). Consequentemente, a Comissão não tinha de tomar em conta as ameaças aqui invocadas como circunstância atenuante (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 26 de abril de 2007, Bolloré e o./Comissão, T‑109/02, T‑118/02, T‑122/02, T‑125/02, T‑126/02, T‑128/02, T‑129/02, T‑132/02 e T‑136/02, Colet., p. II‑947, n.° 640).

287    Por outro lado, resulta da jurisprudência que, entre os elementos capazes de revelar o papel passivo de uma empresa num cartel, podem ser tomados em conta o caráter sensivelmente mais esporádico da sua participação nas reuniões face à dos outros membros do cartel (acórdão do Tribunal Geral de 9 de julho de 2003, Cheil Jedang/Comissão, T‑220/00, Colet., p. II‑2473, n.° 168; v., igualmente, acórdão do Tribunal Geral de 29 de abril de 2004, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑236/01, T‑239/01, T‑244/01 a T‑246/01, T‑251/01 e T‑252/01, Colet., p. II‑1181, n.° 331 e jurisprudência aí referida), tal como a sua entrada tardia no mercado objeto da infração, independentemente da duração da sua participação (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de dezembro de 1985, Stichting Sigarettenindustrie e o./Comissão, 240/82 à 242/82, 261/82, 262/82, 268/82 e 269/82, Recueil, p. 3831, n.° 100, e acórdão Carbone‑Lorraine/Comissão, n.° 115, supra, n.° 164 e jurisprudência aí referida), ou ainda a existência de declarações expressas nesse sentido feitas por representantes de empresas terceiras que tenham participado na infração (v. acórdão de 29 de abril de 2004, Tokai Carbon e o./Comissão, já referido, n.° 331 e jurisprudência aí referida). Por outro lado, o Tribunal Geral já decidiu no sentido de que o «papel exclusivamente passivo» de um membro de um cartel implicava que este adotasse uma «atitude discreta», isto é, que não participasse ativamente na elaboração do ou dos acordos anticoncorrenciais (v. acórdão Jungbunzlauer/Comissão, n.° 194, supra, n.° 252 e jurisprudência aí referida).

288    Além disso, o mero facto de uma empresa que se provou ter participado numa concertação com os seus concorrentes não se ter comportado no mercado do modo acordado com eles, prosseguindo uma política mais ou menos independente no mercado, não constitui necessariamente um elemento a ter em conta como circunstância atenuante. Não se pode excluir a possibilidade de essa empresa ter simplesmente tentado utilizar o cartel em seu benefício (acórdão do Tribunal Geral de 16 de junho de 2011, FMC Foret/Comissão, T‑191/06, Colet., p. II‑2959, n.os 345 e 346).

289    Por último, segundo jurisprudência assente, para determinar se uma empresa deve beneficiar de uma circunstância atenuante pela não aplicação efetiva de acordos ilícitos, há que verificar se a empresa apresentou argumentos capazes de demonstrar que, durante o período em que aderiu aos acordos ilícitos, se subtraiu efetivamente à sua aplicação adotando um comportamento concorrencial no mercado ou, no mínimo, se violou claramente e de modo considerável o compromisso de aplicar esse acordo, a ponto de ter perturbado o seu próprio funcionamento (v. acórdãos do Tribunal Geral de 15 de março de 2006, Daiichi Pharmaceutical/Comissão, T‑26/02, Colet., p. II‑713, n.° 113, e Carbone‑Lorraine/Comissão, n.° 115, supra, n.° 196).

290    Daí resulta que a recorrente não pode invocar utilmente as alegadas pressões a que teria sido sujeita nem a menor duração da sua participação na infração.

291    Quanto ao caráter alegadamente passivo do seu comportamento e ao seu impacto na coima, há que lembrar que a recorrente reintegrou plenamente o cartel a partir de 3 de setembro de 1996, participou nas discussões destinadas a relançar o cartel realizadas entre 1997 e 1999 e que, a partir de maio de 2000, retomou plenamente a sua atividade no interior do cartel.

292    Assim, não pode invocar qualquer papel passivo no cartel nem, portanto, reivindicar o reconhecimento de circunstâncias atenuantes baseadas nesse facto.

293    Além disso, segundo o seu próprio raciocínio, a sua intenção e o seu comportamento tiveram, nesse período, o objetivo da fazer crer que tinha uma atitude favorável ao cartel e, para esse efeito, pelo menos mantinha contactos e trocava informações com certos membros do cartel, o que significa que, pelas suas próprias palavras, participou na infração de forma ativa.

294    Quanto à alegação de falta de fundamentação, refira‑se que a Comissão não contesta a argumentação da recorrente de que, no procedimento administrativo, não invocou a pequena importância das suas atividades no setor das mangueiras marinhas para lhe serem reconhecidas circunstâncias atenuantes.

295    A Comissão também não contesta o facto de, no procedimento administrativo, a recorrente ter apresentado argumentos semelhantes aos que apresenta no presente recurso, isto é, «a menor duração da sua participação no cartel e […] o seu papel menor ou marginal nesse [cartel]».

296    Contudo, embora nos considerandos da decisão recorrida dedicados à análise das circunstâncias atenuantes, a Comissão não tenha respondido expressamente aos diferentes argumentos da recorrente, resulta das considerações acima expostas nos n.os 283 a 293 que, no seu conjunto, a decisão recorrida contém uma fundamentação suficientemente detalhada que permite ao Tribunal e à recorrente compreender por que razões não lhe podem ser reconhecidas circunstâncias atenuantes no caso presente.

297    Consequentemente, há que considerar que a fundamentação da decisão recorrida respeita os critérios jurisprudenciais acima referidos no n.° 108.

298    Daí resulta que improcede na íntegra a quarta parte do terceiro fundamento.

5.     Quanto à quinta parte do terceiro fundamento, relativa à redução da coima por cooperação no âmbito do programa de clemência

a)     Decisão recorrida

299    Os considerandos 480 a 488 da decisão recorrida expõem as razões pelas quais a Comissão considerou que se devia conceder à recorrente uma redução de 30% da coima que lhe era aplicada, tendo em consideração o seu contributo no processo.

300    A esse respeito, a Comissão entendeu, no essencial, que era verdade que se devia ter em conta a data em que a MRI tinha decidido colaborar na investigação (considerandos 480 e 485 da decisão recorrida), mas que o seu contributo tinha um valor limitado, na medida em que a Comissão, nesse momento, já dispunha de um grande número de elementos de prova que permitiam determinar as principais características do cartel (considerando 485 da decisão recorrida).

301    No essencial, precisa que a MRI forneceu elementos de prova a respeito do cartel a partir do final dos anos 80 (considerando 481 da decisão recorrida), nomeadamente um documento de 1989 que demonstra que os membros do cartel trocavam entre si dados estatísticos (considerando 482 da decisão recorrida) e dois documentos trocados em 2000 com o coordenador do cartel que permitem apurar uma repartição geográfica dos mercados entre membros do cartel (considerando 483 da decisão recorrida) e, por último, documentos internos do início de 1997 sobre a existência do cartel nesse momento, que permitem determinar o papel da MRI no cartel entre 1996 e 1997 e que reforçam a capacidade da Comissão de provar a existência do cartel na segunda metade dos anos 90 (considerando 484 da decisão recorrida).

b)     Argumentos das partes

302    A recorrente afirma que a Comissão cometeu um erro na determinação da redução da coima pela cooperação que prestou no âmbito do programa de clemência. A Comissão concedeu‑lhe a redução mínima, isto é 30%, quando a comunicação sobre a cooperação prevê que a primeira empresa admitida a beneficiar da clemência tenha direito a uma redução de até 50%, de acordo com o n.° 26 da comunicação sobre a cooperação. Entende que esse erro resulta do facto de a Comissão não ter tido suficientemente em conta o contributo determinante que deu para a instrução.

303    Lembra que a data em que são fornecidos os elementos de prova em apoio do seu pedido e o seu valor acrescentado são os dois critérios que, segundo a comunicação sobre a cooperação, permitem definir o nível da redução.

304    Ora, a sua diligência foi máxima, como demonstra o considerando 480 da decisão recorrida, uma vez que forneceu a maior parte das provas mais significativas na sua posse no dia seguinte às inspeções, isto é, 4 de maio de 2007.

305    Além disso, entende que o seu contributo foi muito significativo. Contrariamente ao que afirma a Comissão no considerando 482 da decisão recorrida, as provas e informações que forneceu não só «reforçaram» ou «afinaram» a capacidade de a Comissão elaborar a comunicação de acusações que dirigiu aos produtores, mas, da leitura desta e da decisão recorrida, verifica‑se, na sua opinião, que as informações que forneceu foram determinantes para sustentar as acusações da Comissão quanto às características do cartel, ao seu funcionamento e à duração da infração, bem como à medida da participação dos produtores. Entende que, em muitos casos, essas informações foram os únicos elementos em apoio da tese da Comissão.

306    A esse respeito, a recorrente precisa que as informações e dados que forneceu, por um lado, permitiram corroborar os depoimentos orais prestados pelo primeiro denunciante ― insuficientes, na falta de provas documentais ou objetivas capazes de os confirmar, para servirem de base inatacável às acusações correspondentes ― e as informações dadas pelas outras empresas e, por outro lado, foram os únicos verdadeiros elementos de suporte da acusação da Comissão de os outros produtores terem participado numa infração única e continuada.

307    Por outro lado, entende que as provas que forneceu sobre o período entre março de 1997 e junho de 1999 são o único ou o principal fundamento das conclusões da Comissão sobre esse período. Embora seja certo que existem outros elementos de prova, são claramente insuficientes para demonstrar o que quer que seja sobre o cartel nesse período. Assim, na falta dessas provas, a Comissão teria ficado reduzida, na sua opinião, a dar por provadas duas infrações distintas e não uma infração única e continuada ou repetida.

308    Portanto, foi erradamente que a Comissão entendeu, no considerando 485 da decisão recorrida, que «já estava na posse de uma grande quantidade de documentos, com base nos quais podia provar os principais elementos do cartel».

309    Consequentemente, para a recorrente, a aplicação da taxa mínima da redução é injustificada, além de não estar fundamentada. Entende ainda que essa decisão viola o princípio da igualdade de tratamento, uma vez que, noutros casos, concedeu reduções superiores em contrapartida de menores prestações de informações.

310    A Comissão contesta estas alegações.

311    A Comissão considera que, segundo jurisprudência assente, beneficia de um amplo poder de apreciação no que diz respeito ao método de cálculo das coimas e pode, a esse respeito, ter em conta múltiplos elementos, entre os quais figura a cooperação das empresas em causa na investigação conduzida pelos seus serviços. Nesse contexto, é chamada a efetuar apreciações factuais complexas, como as relativas à cooperação respetiva dessas empresas. Em particular, dispõe de um vasto poder de apreciação na valoração da qualidade e da utilidade da cooperação prestada por uma empresa, designadamente em comparação com as contribuições de outras empresas. As suas avaliações são objeto de fiscalização jurisdicional restrita.

312    A Comissão contesta que a MRI tenha sido a primeira e única empresa cujo contributo tenha sido considerado capaz de justificar a sua admissão ao programa de clemência. Com efeito, entende que o processo tem a sua origem no pedido de imunidade de [confidencial], que deixou de participar no cartel antes desse pedido e que desvendou a existência, o objeto e as caraterísticas do cartel, o que lhe permitiu efetuar a investigação e justificou que fosse concedido a [confidencial] o benefício de uma imunidade total. Em contrapartida, a MRI só começou a cooperar depois das inspeções.

313    Quanto à importância e utilidade da cooperação da MRI, é certo que facilitou a missão da Comissão, mas, primeiro, esta já conhecia a existência, o objeto e as modalidades de funcionamento do cartel, segundo, contesta que, sem a MRI, não teria conseguido provar a persistência da infração, terceiro, nenhuma da empresas participantes foi punida pelo período entre 13 de maio de 1997 e 11 de junho de 1999 em que a cooperação da MRI se revelou mais útil, quarto, teria sido possível, segundo a Comissão, qualificar a infração de repetida mesmo tendo estado interrompida alguns anos, para depois recomeçar, com os mesmos participantes, o mesmo objeto e métodos análogos, com vista à execução de um mesmo projeto global. Assim, entende não ter razão a MRI quando alega que a sua cooperação era necessária para se poder qualificar a infração de continuada.

314    Por outro lado, quanto aos outros períodos, a cooperação da MRI foi de uma utilidade limitada, tendo em conta as indicações já dadas por [confidencial] e os documentos descobertos nas inspeções.

315    Assim, justifica‑se amplamente uma redução da coima de 30%.

316    A Comissão considera ainda despropositadas as comparações que a MRI faz com outras empresas, na medida em que, por um lado, esse tipo de comparação entre processos diferentes é extremamente difícil e, por outro, o facto de a Comissão ter concedido, na sua prática decisória anterior, uma certa taxa de redução por um comportamento determinado não implica que tenha de conceder a mesma redução na apreciação de um comportamento semelhante num procedimento administrativo posterior, segundo a jurisprudência.

317    Por último, considera que a sua decisão de não conceder mais de 30% de redução está fundamentada no considerando 485 da decisão recorrida.

c)     Apreciação do Tribunal Geral

318    O n.° 26 da comunicação sobre a cooperação dispõe:

«Na decisão final adotada no termo do processo administrativo, a Comissão determinará o nível de redução de que a empresa beneficiará, que será determinado da seguinte forma tendo por base a coima que de outra forma seria aplicada.

¾        À primeira empresa que forneça um valor acrescentado significativo: uma redução de 30%‑50%,

¾        À segunda empresa que forneça um valor acrescentado significativo: uma redução de 20%‑30%,

¾        Às empresas seguintes que forneçam um valor acrescentado significativo: uma redução até 20%.

Para determinar o nível de redução no âmbito de cada uma destas margens de variação, a Comissão levará em linha de conta a data na qual foram apresentados os elementos de prova que preencham as condições previstas no [n.°] 24 e o grau de valor acrescentado que estes representem.»

319    Há que lembrar que o n.° 24 da comunicação sobre a cooperação precisa que, por forma a poder beneficiar desta redução, a empresa deve fornecer à Comissão elementos de prova da alegada infração que apresentem um valor acrescentado significativo relativamente aos elementos de prova já na posse da Comissão, sendo o próprio conceito de valor acrescentado determinado no n.° 25 da comunicação sobre a cooperação (v. n.° 116, supra).

320    Os termos da comunicação sobre a cooperação pressupõem, consequentemente, que se distingam duas etapas:

¾        primeiro, para poder beneficiar de uma redução da coima, é necessário que a empresa forneça à Comissão elementos de prova com um valor acrescentado significativo; à primeira empresa a cooperar dessa forma será concedida uma redução do montante da coima num nível mínimo de 30% e num nível máximo de 50% do montante de base;

¾        segundo, para determinar a taxa da redução dentro desse intervalo, a Comissão deve tomar em conta dois critérios: a data em que foram comunicados os elementos de prova e o grau de valor acrescentado que estes representaram.

321    Além disso, o conceito de valor acrescentado significativo é entendido, na aceção da comunicação sobre a cooperação, no sentido de que se refere à medida em que os elementos de prova fornecidos reforçam, pela sua natureza ou pelo seu nível de precisão, a capacidade da Comissão de demonstrar a existência do alegado cartel, sendo esse mesmo valor apreciado em função de um certo número de parâmetros descritos no n.° 25 da comunicação sobre a cooperação.

322    Assim, quando os elementos de prova fornecidos à Comissão tiverem um valor acrescentado significativo e a empresa tiver sido a primeira a comunicar esses elementos, a taxa mínima de redução da coima será de 30%. Seguidamente, quanto mais precoce tiver sido a cooperação e quanto mais importante tiver sido o grau de valor acrescentado, mais a taxa de redução aumentará, para atingir no máximo 50% do montante da coima.

323    No caso, há que considerar que, na decisão recorrida, a Comissão reconheceu que a MRI era a primeira empresa a preencher as condições para a obtenção de uma redução da coima, na medida em que os documentos que tinha fornecido à Comissão tinham um valor acrescentado significativo, mas que se limitou a conceder à MRI o nível mínimo de redução da coima, isto é, 30%. A única questão debatida entre as partes e a decidir pelo Tribunal é portanto o valor da redução concedida pela Comissão no interior desse intervalo e não o próprio princípio dessa redução.

324    Embora seja certo que a Comissão deve avaliar, à luz dos elementos de prova comunicados pela MRI, a percentagem de redução a aplicar ao requerente de clemência, não é menos verdade que se deve verificar se ela definiu essa percentagem em conformidade com os critérios que fixou na comunicação sobre a cooperação e se indicou, na decisão recorrida, o raciocínio que tinha seguido para o efeito, de forma a permitir à recorrente tomar conhecimento das justificações da medida tomada a seu respeito e ao Tribunal exercer a sua fiscalização.

325    Quanto à data em que foram fornecidos os elementos de prova, está assente que o pedido de clemência foi apresentado, acompanhado de elementos de prova, em 4 de maio de 2007 (considerando 480 da decisão recorrida) ― isto é, dois dias depois da inspeção organizada pela Comissão na sequência do pedido de clemência apresentado por [confidencial] em 20 de dezembro de 2006.

326    A Comissão entende que esta é uma colaboração prestada numa fase precoce da investigação (considerando 486 da decisão recorrida).

327    Ora, não se pode deixar de observar que essa apreciação não está refletida na taxa de redução aplicada à coima da recorrente.

328    Quanto ao grau de valor acrescentado significativo dos elementos de prova fornecidos pela MRI, refira‑se o seguinte.

329    Na decisão recorrida, a Comissão precisou que a MRI tinha fornecido elementos de prova a respeito do cartel a partir do final dos anos 80 ― nomeadamente um documento de 1989 que demonstra que os membros do cartel trocavam entre si dados estatísticos ― e dois documentos trocados em 2000 com o coordenador do cartel que permitem demonstrar uma repartição geográfica dos mercados entre membros do cartel e, por último, documentos internos do início de 1997 relativos à existência do cartel nesse momento, que permitem demonstrar o papel da MRI no cartel entre 1996 e 1997 e que reforçam a capacidade de a Comissão provar a existência do cartel durante a segunda metade dos anos 90. Contudo, indicou que o contributo da MRI tinha um valor limitado, na medida em que já dispunha, no momento em que foi prestado, de um grande número de elementos de prova que permitiam demonstrar as principais caraterísticas do cartel (v. n.os 300 e 301, supra).

330    Refira‑se, porém, que os considerandos 148 a 187 da decisão recorrida expõem os elementos de prova em que se baseou a Comissão para considerar que, entre 13 de maio de 1997 e junho de 1999, o cartel tinha tido um período de atividades limitadas, no qual foram mantidos contactos em que a recorrente estava envolvida e cujo objeto era, nomeadamente, tentar relançar o cartel.

331    Esses elementos de prova são os seguintes: [confidencial].

332    A Comissão precisa, por outro lado, que diversos documentos ― a saber, duas telecópias de [confidencial], datadas de 11 de junho de 1999, e uma telecópia da Parker ITR, datada de 21 de junho de 1999 ― permitem verificar que as divergências entre os membros do cartel tinham cessado a partir de 11 de junho de 1999 (considerando 178 da decisão recorrida).

333    No essencial, as provas documentais reunidas pela Comissão sobre o período intermédio entre 13 de maio de 1997 e junho de 1999 têm, portanto, origem na MRI e foram por ela apresentadas no âmbito do seu pedido de clemência.

334    Além disso, há que observar que a Comissão só refere o valor relativo dos documentos fornecidos pela MRI e não o seu valor intrínseco, apesar de estes lhe terem permitido confirmar um certo número de declarações e de indícios de que dispunha unicamente até então.

335    Ora, por um lado, as provas fornecidas pela MRI à Comissão sobre o período entre 13 de maio de 1997 e junho de 1999 ― ao contrário das que apresentou sobre o período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997 (v. n.os 148 e 149, supra) ― são provas documentais que reforçaram a capacidade da Comissão para demonstrar a existência do cartel entre maio de 1997 e junho de 1999 e que lhe permitiram demonstrar que certas alegações dos outros membros do cartel quanto ao facto de o cartel ter tido uma interrupção completa entre maio de 1997 e junho de 1999 eram inexatas.

336    Por outro lado, esses elementos de prova permitiram à Comissão apoiar a sua tese de que a infração tinha um caráter continuado de abril de 1986 a maio de 2007, não obstante a crise que o cartel tinha atravessado entre maio de 1997 e junho de 1999 (v. considerandos 289, 293 e 294 da decisão recorrida), mesmo não tendo aplicado qualquer coima por esse período intermédio. A esse respeito, há que observar que a Comissão se limita, a esse respeito, a fazer referência, na nota de pé de página n.° 733 da decisão recorrida, a outras notas de pé de página dessa mesma decisão, que remetem para três documentos relativos ao período intermédio, mas sem que os considerandos 481 a 484 da decisão recorrida mencionem esse período ou a contribuição da MRI a esse respeito.

337    A esse respeito, há que lembrar que, nos termos do n.° 25 da comunicação sobre a cooperação, o conceito de valor acrescentado se refere à forma como os elementos de prova apresentados reforçam, pela sua própria natureza e/ou pelo seu nível de pormenor, a capacidade de a Comissão provar o alegado cartel. O n.° 25 dessa comunicação precisa que o grau de corroboração por outras fontes, necessário para sustentar os elementos de prova apresentados contra outras empresas envolvidas no processo, terá incidência sobre o valor desses elementos, pelo que, aos elementos de prova decisivos será atribuído um valor superior, comparativamente a elementos de prova tais como declarações, que necessitam de ser corroboradas se forem contestadas.

338    Consequentemente, não se pode deixar de observar que o grau de valor acrescentado dos elementos de prova fornecidos pela recorrente à Comissão não está refletido na taxa de redução da coima fixada no nível mínimo de 30% pela Comissão.

339    Consequentemente, a Comissão inobservou os critérios que impôs a si própria no n.° 26 da comunicação sobre a cooperação.

340    Quanto à alegação de falta de fundamentação, a Comissão limita‑se a indicar, no considerando 486 da decisão recorrida, que, «considerando o valor do seu contributo no presente processo, a fase precoce em que deu esse contributo e a extensão da sua cooperação na sequência das suas declarações, deve ser concedida à MRI uma redução de 30% da coima que, sem isso, lhe teria sido aplicada».

341    Consequentemente, há que considerar, a título subsidiário, que, se a Comissão tinha razões particulares para limitar a 30% a taxa de redução da coima da recorrente e para não aumentar essa taxa apesar da precocidade da sua cooperação e do grau significativo de valor acrescentado dos elementos de prova fornecidos, cabia‑lhe fundamentar a decisão recorrida nesse ponto, o que não fez, pelo que o Tribunal não tem condições para fiscalizar com segurança se também cometeu um erro manifesto de apreciação a esse respeito.

342    Tendo em conta o facto de nem o caráter precoce da cooperação da recorrente nem o grau de valor acrescentado dos elementos de prova por ela fornecidos estarem refletidos na taxa de redução aplicada pela Comissão na decisão recorrida e a sua falta de fundamentação, há que julgar parcialmente procedente a quinta parte do terceiro fundamento e anular o artigo 2.°, alínea f), da decisão recorrida.

343    Quanto à alegação de violação do princípio da igualdade de tratamento, há que observar que a recorrente não apresenta quaisquer elementos suficientes que possam demonstrar que a sua situação é semelhante à de outras empresas em circunstâncias idênticas. Essa alegação deve, pois, ser julgada improcedente.

344    Improcede, assim, a quinta parte do terceiro fundamento no restante.

D ―  Quanto ao pedido de redução da coima

345    Há que recordar que, em conformidade com o artigo 229.° CE, os regulamentos adotados em conjunto pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia, por força das disposições do Tratado, podem atribuir plena jurisdição ao Tribunal de Justiça no que respeita às sanções previstas nesses regulamentos. Essa competência foi conferida ao julgador comunitário pelo artigo 31.° do Regulamento n.° 1/2003. Por conseguinte, para além da simples fiscalização da legalidade da sanção, pode substituir a apreciação da Comissão pela sua e, desse modo, anular, reduzir ou aumentar a coima ou a sanção pecuniária compulsória aplicada. Daí resulta que o julgador da União pode exercer a sua competência de plena jurisdição, quando a questão do montante da coima é submetida à sua apreciação, e que essa competência pode ser exercida tanto para reduzir esse montante como para o aumentar (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de fevereiro de 2007, Groupe Danone/Comissão, C‑3/06 P, Colet., p. I‑1331, n.os 60 a 62 e jurisprudência aí referida).

346    Por outro lado, nos termos do artigo 23.°, n.° 3, do Regulamento (CE) n.° 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° e 82.° do Tratado (JO L 1, p. 1), para se determinar o montante da coima, deve tomar‑se em consideração, além da gravidade, a duração da infração. Além disso, o montante da coima não pode exceder 10% do volume de negócios total da empresa, realizado no exercício social anterior, de acordo com o artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1/2003.

347    Além disso, como lembra o artigo 49.° da Carta dos Direitos Fundamentais, a intensidade das penas não pode ser desproporcionada face à infração.

348    Além disso, há que lembrar que, por natureza, a fixação de uma coima pelo Tribunal Geral, no âmbito do exercício do seu poder de plena jurisdição, não é um exercício aritmético preciso. Por outro lado, o Tribunal Geral não está vinculado pelos cálculos da Comissão, devendo efetuar a sua própria apreciação, tendo em conta todas as circunstâncias do caso (acórdãos do Tribunal Geral de 14 de setembro de 2004, Aristrain/Comissão, não publicado na Coletânea, T 156/94, n.° 43).

349    O Tribunal de Justiça considerou que, na determinação do montante das coimas, havia que ter em conta a duração das infrações e todos os elementos capazes de entrar na apreciação da sua gravidade, tais como o comportamento de cada empresa, o papel desempenhado por cada uma delas na instituição das práticas concertadas, o lucro por elas auferido por causa dessas práticas, a sua dimensão e o valor das mercadorias em causa, bem como o risco que as infrações desse tipo representam para a União (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de dezembro de 2011, Chalkor/Comissão, C‑386/10 P, Colet., p. I‑13085, n.° 56 e jurisprudência aí referida).

350    O Tribunal de Justiça indicou igualmente que os elementos objetivos como o conteúdo e a duração dos comportamentos anticoncorrenciais, o seu número e a sua intensidade, a extensão do mercado afetado e a deterioração da ordem pública económica devem ser tidos em conta. A análise deve igualmente levar em consideração a importância relativa e a quota de mercado das empresas responsáveis, bem como uma eventual reincidência (acórdão Chalkor/Comissão, n.° 349, supra, n.° 57).

351    Já tem sido igualmente decidido de forma constante que o princípio da proporcionalidade exige que os atos das instituições não vão além dos limites do que for apropriado e necessário à realização dos objetivos legítimos prosseguidos pela disposição em causa, sendo que, quando existe uma escolha entre várias medidas apropriadas, há que recorrer à menos restritiva e que os inconvenientes causados não devem ser desmesurados face aos objetivos pretendidos. Daí resulta que as coimas não devem ser desmesuradas face aos objetivos pretendidos, isto é, face ao respeito das normas da concorrência, e que o montante da coima aplicada a uma empresa por uma infração em matéria de concorrência deve ser proporcional à infração, apreciada no seu conjunto, nomeadamente tendo em conta a sua gravidade (v. acórdão do Tribunal Geral de 5 de outubro de 2011, Romana Tabacchi/Comissão, T‑11/06, Colet., p. II‑6681, n.° 280 e jurisprudência aí referida).

352    No caso, à luz da apreciação efetuada pelo Tribunal no âmbito da quinta parte do terceiro fundamento e dos erros aí observados (v. n.° 342, supra), o Tribunal considera apropriado exercer a competência de plena jurisdição que lhe é conferida pelo artigo 31.° do Regulamento n.° 1/2003 e substituir pela sua a apreciação da Comissão no que respeita ao montante da coima a aplicar à recorrente.

353    Antes de mais, no caso, há que lembrar, por um lado, que o volume de negócios consolidado à escala mundial realizado pela MRI por todos os seus produtos era, em 2006, de [confidencial] e, em 2007, de [confidencial] (considerando 44 da decisão recorrida) e, por outro lado, que a quota de mercado mundial da empresa foi avaliada pela Comissão em [confidencial], o que não foi impugnado pela recorrente (v. considerando 433 da decisão recorrida).

354    Há que referir, seguidamente, que o cartel reveste uma gravidade certa, tendo em conta a duração da infração e o facto de os comportamentos ilícitos, nos quais a recorrente participou plenamente, se terem caracterizado pela atribuição de concursos, pela fixação dos preços, pela fixação de quotas, pela fixação das condições de venda, pela partilha de mercados geográficos e pela troca de informações sensíveis sobre os preços, os volumes de vendas e os concursos. É ainda um cartel de dimensão mundial.

355    Por outro lado, está assente que a recorrente participou na infração de 1 de abril de 1986 a 1 de agosto de 1992 ― período que não está prescrito (v. n.os 212 a 214, supra) ― depois, de 3 de setembro de 1996 a 2 de maio de 2007, é certo que, durante esse segundo episódio ilícito, com um período de atividade reduzida no período intermédio, mas em que F. participou plenamente na perspetiva, nomeadamente, do relançamento do cartel e da negociação do lugar da recorrente no seu interior.

356    É certo que se deve ter em conta a colaboração prestada pela recorrente na investigação da Comissão. A recorrente, graças aos elementos de prova que forneceu de forma precoce à Comissão, permitiu, com efeito, que esta imputasse a existência de uma infração continuada aos outros membros do cartel, não obstante a existência de um período de crise que, sem esses elementos de prova, poderia, com toda a probabilidade, ter levado a Comissão a considerar que o cartel se tinha interrompido durante um período de dois anos ― ou mesmo três, no que respeita à própria recorrente.

357    Contudo, há que tomar em consideração que, mesmo sem esses elementos de prova, a Comissão teria podido imputar a existência de uma infração repetida aos membros do cartel (v. a esse respeito os elementos apresentados pela Comissão nos considerandos 296 a 304 e 307 da decisão recorrida), o que tende a relativizar a importância do valor acrescentado da cooperação da MRI.

358    O Tribunal entende que, nessas condições, a taxa de redução da coima deveria ter sido de 40%.

359    Contudo, em face destas considerações e da necessidade de ponderar os diversos elementos a tomar em consideração para efeitos de fixação do montante da coima (v. n.os 349 e 350, supra), o Tribunal considera que o montante da coima aplicada à recorrente, tendo em conta, em particular, a gravidade da infração e a duração da participação da MRI, é apropriado, pelo que não há que o reduzir.

360    Assim, há que julgar improcedente o pedido de alteração apresentado pela recorrente, na medida em que se refere à redução do montante da coima de 4 900 000 euros que lhe foi aplicada.

 Quanto às despesas

361    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Nos termos do n.° 3, primeiro parágrafo, da mesma disposição, o Tribunal Geral pode repartir as despesas ou decidir que cada parte suporte as suas próprias despesas, se as partes obtiverem vencimento parcial.

362    Tendo a recorrente e a Comissão sido parcialmente vencidas, há que condená‑las a suportar as respetivas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)

decide:

1)      É anulado o artigo 2.°, alínea f), da Decisão C(2009) 428 final da Comissão, de 28 de janeiro de 2009, relativa a um processo nos termos do artigo 81.° [CE] e do artigo 53.° do Acordo EEE (Processo COMP/39406 ― Mangueiras marinhas).

2)      O montante da coima aplicada à MRI é fixado em 4 900 000 euros.

3)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

4)      Cada parte suportará as suas próprias despesas.

Azizi

Prek

Frimodt Nielsen

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 17 de maio de 2013.

Assinaturas

Índice


Factos na origem do litígio

A ―  Setor das mangueiras marinhas destinadas ao petrσleo e ao gαs

B ―  Apresentaηγo da recorrente

C ―  Procedimento administrativo

D ―  Decisγo recorrida

Tramitação do processo e pedidos das partes

Questão de direito

A ―  Quanto ao pedido de anulaηγo

B ―  Quanto ao primeiro fundamento, relativo a um erro de qualificaηγo da infraηγo e a uma violaηγo do artigo 253.° CE, e quanto ao segundo fundamento, relativo a erros manifestos de apreciaηγo na determinaηγo da duraηγo da infraηγo e ΰ violaηγo dos artigos 81.° CE e 253.° CE e do artigo 2.° do Regulamento n.° 1/2003

1.  Decisão recorrida

2.  Argumentos das partes

a)  Quanto ao primeiro fundamento

b)  Quanto ao segundo fundamento

Quanto à primeira parte

Quanto à segunda parte

Quanto à terceira parte

Quanto à quarta parte

Quanto à quinta parte

Quanto à sexta parte

3.  Apreciação do Tribunal Geral

a)  Referência aos princípios relativos ao ónus da prova

b)  Quanto à participação da recorrente na infração entre 3 de setembro de 1996 e 9 de maio de 2000

Quanto ao período entre 3 de setembro de 1996 e 13 de maio de 1997

―  Quanto ao alcance do n.° 26 da comunicaηγo sobre a cooperaηγo

―  Quanto ΰ determinaηγo, no caso presente, de factos adicionais que venham aumentar a gravidade ou a duraηγo da infraηγo

Quanto ao período intermédio

c)  Quanto à existência de uma infração continuada

Quanto ao conceito de infração continuada e de infração repetida

Quanto à existência de uma infração continuada no caso presente

d)  Quanto ao mérito das outras partes do segundo fundamento

C ―  Quanto ao terceiro fundamento, relativo a diversos erros na determinaηγo do montante da coima, ΰ violaηγo do princνpio da proporcionalidade, do princνpio da adequaηγo da sanηγo, do princνpio da igualdade de tratamento, do princνpio da proteηγo da confianηa legνtima e a uma falta de fundamentaηγo

1.  Quanto à primeira parte do terceiro fundamento, relativa a um erro de apreciação da gravidade da infração e à violação do princípio da igualdade de tratamento

a)  Decisão recorrida

b)  Argumentos das partes

c)  Apreciação do Tribunal Geral

2.  Quanto à segunda parte do terceiro fundamento, relativa a um erro no cálculo da coima em função da duração da infração e à violação do princípio da proteção da confiança legítima

a)  Decisão recorrida

b)  Argumentos das partes

c)  Apreciação do Tribunal Geral

3.  Quanto à terceira parte do terceiro fundamento, relativa a um erro no agravamento da coima a título dissuasivo, e a uma violação do dever de fundamentação e do princípio da igualdade de tratamento

a)  Decisão recorrida

b)  Argumentos das partes

c)  Apreciação do Tribunal Geral

4.  Quanto à quarta parte do terceiro fundamento, relativa a um erro na apreciação das condições para a aplicação de circunstâncias atenuantes e à violação do dever de fundamentação

a)  Decisão recorrida

b)  Argumentos das partes

c)  Apreciação do Tribunal Geral

5.  Quanto à quinta parte do terceiro fundamento, relativa à redução da coima por cooperação no âmbito do programa de clemência

a)  Decisão recorrida

b)  Argumentos das partes

c)  Apreciação do Tribunal Geral

D ―  Quanto ao pedido de reduηγo da coima

Quanto às despesas


* Língua do processo: italiano.


1 ―      Dados confidenciais ocultados.