Language of document : ECLI:EU:T:2022:586

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção)

28 de setembro de 2022 (*)

«Acesso aos documentos — Regulamento (CE) n.o 1049/2001 — Documentos relativos ao inquérito contra o antigo primeiro‑ministro da República Checa por utilização abusiva de fundos europeus e potenciais conflitos de interesses — Recusa de acesso — Exceção relativa à proteção de objetivos de atividades de inspeção, inquérito e auditoria — Perda parcial do interesse em agir — Não conhecimento parcial do mérito — Dever de fundamentação»

No processo T-174/21,

Agrofert, a.s., com sede em Praga (República Checa), representada por S. Sobolová, advogada,

recorrente,

contra

Parlamento Europeu, representado por N. Görlitz, J.‑C. Puffer e O. Hrstková Šolcová, na qualidade de agentes,

recorrido,

apoiado por

Comissão Europeia, representada por C. Ehrbar, M. Salyková e J. Hradil, na qualidade de agentes,

interveniente,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção),

composto, na deliberação, por: G. De Baere (relator), presidente, G. Steinfatt e S. Kingston, juízes,

secretário: E. Coulon,

vistos os autos,

visto não terem as partes requerido a marcação de uma audiência de alegações no prazo de três semanas a contar da notificação do encerramento da fase escrita do processo e tendo sido decidido, nos termos do artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, julgar o recurso prescindindo da fase oral do processo,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso, interposto ao abrigo do artigo 263.o TFUE, a recorrente, Agrofert, a.s., pede a anulação da Decisão A(2019) 8551 C (D 300153) do Parlamento Europeu, de 15 de janeiro de 2021 (a seguir «decisão impugnada»), pela qual este lhe recusou o acesso a dois documentos relativos ao inquérito contra o antigo primeiro‑ministro da República Checa por utilização abusiva de fundos europeus e potenciais conflitos de interesses.

 Antecedentes do litígio

2        A recorrente é uma sociedade holding checa que controla mais de 230 sociedades ativas em diversos setores da economia, tais como a agricultura, a produção de géneros alimentícios, a indústria química ou os meios de comunicação social. Inicialmente, foi constituída por Andrej Babiš, que se tornou primeiro‑ministro da República Checa em 2017 e se manteve no cargo até dezembro de 2021.

3        Por carta de 31 de julho de 2020, a recorrente apresentou ao Parlamento um pedido de acesso a documentos ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43).

4        No seu pedido, a recorrente indicou que a Resolução 2019/2987 (RSP) do Parlamento, de 19 de junho de 2020, sobre a reabertura do processo judicial contra o primeiro‑ministro da República Checa por utilização indevida de fundos da UE e potenciais conflitos de interesses (JO 2021, C 362, p. 37; a seguir «Resolução»), afirmava que A. Babiš continuava a controlar o grupo Agrofert após a sua designação como primeiro‑ministro da República Checa. Considerando esta afirmação imprecisa, a recorrente explicou que pretendia conhecer as fontes e as informações detidas pelo Parlamento antes de adotar a Resolução, com exceção do relatório sobre a missão de informação da Comissão do Controlo Orçamental (CONT) do Parlamento na República Checa de 26 a 28 de fevereiro de 2020 (a seguir «relatório sobre a missão de informação»), que continha a mesma afirmação. Assim, pediu acesso, em primeiro lugar, a todos os documentos recolhidos ou utilizados pela Comissão do Controlo Orçamental do Parlamento como documentos justificativos em apoio da afirmação de que o primeiro‑ministro da República Checa, A. Babiš, ainda controlava o grupo Agrofert e outras afirmações relativas à recorrente ou ao grupo Agrofert que figuravam no relatório sobre a missão de informação, em segundo lugar, a todos os documentos que foram utilizados na preparação da Proposta de resolução do Parlamento, de 15 de junho de 2020, sobre a reabertura do inquérito contra o primeiro‑ministro da República Checa por utilização abusiva de fundos europeus e potenciais conflitos de interesses e, em terceiro lugar, a todos os documentos fornecidos ou pedidos pelos deputados do Parlamento ou pelos grupos políticos do Parlamento relacionados com a Resolução ou a proposta de resolução.

5        Por Decisão de 14 de setembro de 2020, o Parlamento respondeu ao pedido da recorrente. Por um lado, identificou um certo número de documentos como correspondentes a esse pedido e informou a recorrente de que uma parte desses documentos estava publicamente acessível. Por outro lado, com fundamento no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), terceiro travessão, e n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, o Parlamento recusou o acesso a dois documentos (a seguir «documentos pedidos»), nomeadamente, em primeiro lugar, a carta do membro da Comissão Europeia, G. Oettinger, ao primeiro‑ministro da República Checa, de 29 de novembro de 2018, com a referência ARES (2018) 6120850 (a seguir «carta da Comissão») e, em segundo lugar, o Relatório Final de Auditoria da Comissão, de 29 de novembro de 2019, com a referência ARES (2019) 7370050, relativo a uma auditoria sobre o funcionamento dos sistemas de gestão e de controlo em vigor na República Checa para evitar os conflitos de interesses em conformidade com os artigos 72.o a 75.o e 125.o do Regulamento (UE) n.o 1303/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, que estabelece disposições comuns relativas ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, ao Fundo Social Europeu, ao Fundo de Coesão, ao Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural e ao Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas, que estabelece disposições gerais relativas ao Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, ao Fundo Social Europeu, ao Fundo de Coesão e ao Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e das Pescas, e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1083/2006 do Conselho (JO 2013, L 347, p. 320) (a seguir «Relatório Final de Auditoria»).

6        Por carta de 9 de outubro de 2020, registada pelo Parlamento em 28 de outubro de 2020, a recorrente apresentou um pedido confirmativo para que o Parlamento revisse a sua posição. Em seu entender, o tratamento do seu pedido inicial não estava em conformidade com o Regulamento n.o 1049/2001. Em primeiro lugar, considerava que a lista dos documentos identificados pelo Parlamento era incompleta e, em segundo lugar, que a recusa de acesso aos documentos pedidos era injustificada.

7        Na decisão impugnada, o Parlamento começou por indicar que os documentos identificados na sua Decisão de 14 de setembro de 2020 constituíam todos os documentos na sua posse correspondentes ao pedido da recorrente. Em seguida, o Parlamento confirmou a sua recusa de acesso aos documentos pedidos com fundamento no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, relativo à proteção dos objetivos de atividades de inspeção, inquérito e auditoria.

8        O Parlamento recordou que, sendo a Comissão a autora dos documentos pedidos, a tinha consultado nos termos do artigo 4.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1049/2001, a fim de obter a sua opinião quanto a uma eventual divulgação desses documentos. A Comissão informou o Parlamento de que a divulgação dos documentos pedidos prejudicaria os inquéritos e as auditorias em curso relativos a questões suscitadas na Resolução e comprometeria a integridade dos seus resultados.

9        O Parlamento considerou que os documentos pedidos tinham sido elaborados pela Comissão no âmbito de um inquérito em curso relativo a uma eventual violação, pela República Checa, do direito da União Europeia relativo à prevenção de conflitos de interesses e que a sua divulgação prejudicaria o objetivo desse inquérito.

10      Por um lado, o Parlamento indicou que o objetivo dos inquéritos da Comissão relativos a potenciais violações do direito da União é dar ao Estado‑Membro em causa a oportunidade de cumprir as obrigações que lhe incumbem por força desse direito e de exercer os seus direitos de defesa contra as objeções formuladas pela Comissão. Considerou que o Estado‑Membro em causa tinha o direito de esperar da Comissão o respeito da confidencialidade, sem o qual poderia revelar‑se ainda mais difícil dar início a um diálogo entre a Comissão e esse Estado‑Membro com vista a pôr termo à alegada infração, a fim de permitir o respeito do direito da União e evitar processos judiciais. Em seu entender, a confidencialidade justificava uma recusa de acesso a documentos relativos a inquéritos da Comissão que podiam eventualmente conduzir a um procedimento de infração ao direito da União.

11      Por outro lado, o Parlamento salientou que, como era indicado na Resolução, os investigadores e as partes interessadas no inquérito pareciam estar rodeados por um clima de ameaças. Considerou que a publicação prematura dos documentos pedidos teria, assim, um impacto negativo no nível de cooperação entre os investigadores e as partes interessadas, que seriam expostos a pressões adicionais por parte de terceiros, e comprometeria a capacidade da Comissão de conduzir o seu inquérito tão eficazmente quanto possível.  Além disso, a qualidade das informações suscetíveis de ser recolhidas pelos investigadores ficaria igualmente comprometida.

12      Pelas razões expostas, o Parlamento considerou que o acesso público aos documentos pedidos prejudicaria o objetivo do inquérito da Comissão.

13      Por último, salientou que os direitos de defesa da recorrente, invocados por esta no seu pedido confirmativo, constituíam um interesse privado e não um interesse público superior. Considerou que não estava demonstrado que, no caso em apreço, um interesse público em que os documentos pedidos fossem acessíveis prevaleceria sobre o interesse que visa proteger o objetivo do inquérito da Comissão.

 Quanto aos factos posteriores à interposição do presente recurso

14      Em 23 de abril de 2021, a Comissão publicou, no seu sítio Internet, o Relatório Final de Auditoria numa versão expurgada dos dados relativos ao funcionamento interno dos fundos fiduciários AB Private Trust I e AB Private Trust II, bem como dos dados pessoais dos indivíduos em causa.

15      No seu sítio Internet, a Comissão indicou:

«Desde a adoção do Relatório Final de Auditoria, foram feitos progressos para clarificar determinadas conclusões da auditoria […], para cumprir corretamente as recomendações da auditoria […] ou para responder parcialmente a outras. As autoridades checas também introduziram algumas melhorias no sistema de gestão e de controlo a fim de atenuar os potenciais conflitos de interesses dos funcionários públicos.

Tendo em conta as medidas de precaução tomadas pelas autoridades do programa a pedido da Comissão, não foi declarada nenhuma despesa para as operações afetadas pelos resultados da auditoria, e os fundos da União continuam protegidos contra os riscos identificados durante a auditoria.

“Disclaimer”: Em princípio, a Comissão não publica os seus relatórios de auditoria nem as informações relativas à auditoria, salvo em situações excecionais como aquelas em que a transparência da informação tem um interesse público importante. O presente Relatório Final de Auditoria é publicado tendo em conta as exigências relativas à proteção de determinadas informações, tais como dados pessoais ou segredos comerciais, em conformidade com o Regulamento n.o 1049/2001.»

 Pedidos das partes

16      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        anular a decisão recorrida;

—        condenar o Parlamento nas despesas.

17      O Parlamento, apoiado pela Comissão, conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        negar provimento ao recurso;

—        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

18      A recorrente invoca dois fundamentos de recurso, relativos, em substância, à violação do artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001. O primeiro fundamento é relativo ao facto de o Parlamento não ter demonstrado que as condições de recusa de acesso aos documentos pedidos eram respeitadas. O segundo fundamento é relativo ao facto de o Parlamento não ter tido em conta a existência de um interesse público superior que justificava a divulgação dos documentos pedidos.

 Quanto ao pedido de desentranhamento dos autos de vários documentos apresentados em anexo à petição

19      A Comissão pede que determinados documentos que figuram nos anexos A.10 a A.12 da petição sejam excluídos dos autos. Trata‑se do projeto de relatório de auditoria de 20 de maio de 2019, do Relatório Final de Auditoria e da carta de seguimento da auditoria de 22 de outubro de 2020 (a seguir «carta de seguimento»), em relação aos quais a Comissão indica não ter autorizado a sua divulgação integral.

20      A Comissão salienta que as filiais da recorrente tiveram acesso a uma parte da carta de seguimento para efeitos do procedimento administrativo nacional relativo à concessão de subvenções. A Comissão indica que, a pedido do Městský soud v Praze (Tribunal de Praga, República Checa), aceitou, em 4 de fevereiro de 2021, que uma das sociedades do grupo Agrofert tivesse acesso ao projeto de relatório de auditoria e ao Relatório Final de Auditoria, mas apenas para efeitos do processo judicial nacional. A Comissão salienta que, em 23 de abril de 2021, publicou o Relatório Final de Auditoria numa versão expurgada dos dados relativos ao funcionamento interno dos fundos fiduciários AB Private Trust I e AB Private Trust II, bem como dos dados pessoais dos indivíduos em causa.

21      Por conseguinte, considera que a manutenção destes três documentos nos autos do presente processo permitiria à recorrente contornar, por um lado, a obrigação de confidencialidade que tinha formulado na comunicação desses documentos ao abrigo da cooperação leal e, por outro, o procedimento de pedido de acesso aos documentos previsto no Regulamento n.o 1049/2001.

22      A recorrente alega que os documentos que figuram nos anexos A.10 a A.12 da petição são os que foram publicados nos meios de comunicação social checos e que ainda são consultáveis na Internet. Não se trata, assim, de documentos que a Comissão tenha comunicado ao abrigo do regime da confidencialidade à recorrente ou a uma das suas filiais, que apresentaram igualmente o Relatório Final de Auditoria conforme publicado na imprensa no âmbito dos seus recursos no Tribunal Geral, registados com os números de processo T‑101/21 e T‑213/21.

23      Importa recordar que o princípio que prevalece no direito da União é o da livre apreciação das provas, do qual decorre que a admissibilidade de um elemento de prova apresentado em tempo útil só pode ser contestada perante os órgãos jurisdicionais da União com fundamento na obtenção irregular do mesmo (v. Acórdão de 30 de setembro de 2021, Tribunal de Contas/Pinxten, C‑130/19, EU:C:2021:782, n.o 104 e jurisprudência referida).

24      Há que salientar que nem o eventual caráter confidencial dos documentos em questão nem o facto de terem podido ser obtidos de modo irregular obsta, em princípio, a que sejam mantidos nos autos. Com efeito, não existe uma disposição que preveja expressamente a proibição de ter em conta provas obtidas ilegalmente (v. Acórdão de 8 de novembro de 2018, QB/BCE, T‑827/16, EU:T:2018:756, n.o 63 e jurisprudência referida).

25      No caso em apreço, é pacífico que a Comissão não autorizou a divulgação das versões integrais dos documentos que figuram nos anexos A.10 a A.12 da petição.

26      Em primeiro lugar, na medida em que as versões desses documentos são as que foram publicadas na Internet pela imprensa checa, não está demonstrado que a recorrente obteve ilegalmente esses documentos. Assim, a Comissão não pode afirmar que a recorrente os apresentou em violação da obrigação de confidencialidade resultante do facto de lhe terem sido comunicados no âmbito de um processo judicial nacional.

27      A este respeito, importa salientar que o caráter confidencial destes documentos ficou, em todo o caso, comprometido devido a essa publicação na Internet, de modo que a sua junção aos autos do presente processo também não afeta o referido caráter (v., neste sentido, Acórdão de 12 de maio de 2015, Dalli/Comissão, T‑562/12, EU:T:2015:270, n.o 50).

28      Em segundo lugar, a Comissão, para alegar que a manutenção desses documentos nos autos do presente processo constitui uma forma de contornar o procedimento de pedido de acesso aos documentos previsto no Regulamento n.o 1049/2001, limita‑se a referir o Despacho de 14 de maio de 2019, Hungria/Parlamento (C‑650/18, não publicado, EU:C:2019:438, n.o 14), o Acórdão de 31 de janeiro de 2020, Eslovénia/Croácia (C‑457/18, EU:C:2020:65, n.o 68), e o Despacho de 17 de dezembro de 2020, Wagenknecht/Comissão (T‑350/20, não publicado, EU:T:2020:635, n.o 19).

29      Ora, segundo a jurisprudência invocada pela Comissão, o Tribunal de Justiça e o Tribunal Geral consideraram que, ao invocar e ao apresentar, no âmbito de um recurso, um parecer jurídico emitido pelo serviço jurídico de uma instituição da União que comporta uma apreciação jurídica sobre questões de direito pertinentes à luz do objeto do recurso, a recorrente pretendia confrontar essa instituição com esse parecer jurídico no processo. Consideraram que autorizar a manutenção desse parecer jurídico nos autos do processo, quando a sua divulgação não tinha sido autorizada pela instituição em causa, equivaleria a permitir à recorrente contornar o procedimento de pedido de acesso a esse documento, instituído pelo Regulamento n.o 1049/2001.

30      Importa salientar que, por um lado, as decisões referidas no n.o 28, supra, diziam respeito à apresentação, no âmbito de um processo judicial, de um parecer do serviço jurídico de uma instituição da União, ou seja, de um documento destinado a uso interno. Por outro lado, nesses acórdãos, a justificação da recusa de juntar o documento aos autos assentava no facto de a instituição em causa ser levada a tomar posição publicamente sobre o conteúdo desse documento no âmbito de um recurso, o que poderia comprometer o interesse das instituições em pedir pareceres jurídicos e em receber pareceres francos, objetivos e completos.

31      Há que salientar que esta jurisprudência não é aplicável no caso em apreço.

32      Com efeito, no caso em apreço, os documentos apresentados nos anexos A.10 a A.12 da petição não são documentos internos do Parlamento nem da Comissão. Além disso, uma vez que o objeto do presente recurso diz respeito à legalidade da decisão do Parlamento que recusa o acesso a determinados documentos, não se trata, no caso em apreço, de pedir ao Parlamento ou à Comissão que tomem posição sobre o conteúdo dos documentos apresentados nos anexos A.10 a A.12 da petição, ou seja, sobre a auditoria realizada por esta última ou sobre a existência de conflitos de interesses na República Checa.

33      Por conseguinte, há que indeferir o pedido da Comissão destinado a que os documentos apresentados pela recorrente, enquanto anexos A.10 a A.12 da petição, sejam retirados dos autos.

 Quanto à perda parcial de interesse em agir da recorrente

34      A recorrente alega que mantém um interesse em agir mesmo após a publicação parcial do Relatório Final de Auditoria, uma vez que esta circunstância não tem influência na questão de saber se o Parlamento tinha adotado a decisão impugnada em conformidade com a regulamentação aplicável. Segundo a jurisprudência, não se pode considerar que a instituição em causa cumpriu a sua obrigação de conceder acesso a um documento pelo simples facto de esse documento ter sido divulgado por um terceiro. A recorrente salienta igualmente que a Comissão só publicou uma parte do Relatório Final de Auditoria e não a sua versão integral.

35      O Parlamento salienta que, na sequência da publicação pela Comissão do Relatório Final de Auditoria, coloca‑se a questão de saber se a recorrente ainda tem interesse em agir na medida em que o seu pedido de anulação tem por objeto a recusa de acesso a esse relatório e indica que remete para a decisão do Tribunal Geral. Acrescenta que a jurisprudência citada pela recorrente não é pertinente na medida em que, no caso em apreço, o Relatório Final de Auditoria foi publicado pelo seu autor, ou seja, a Comissão.

36      A Comissão alega que a publicação parcial do Relatório Final de Auditoria está em conformidade com os objetivos do Regulamento n.o 1049/2001 e priva o primeiro fundamento do seu objeto no que respeita a esse relatório.

37      No caso em apreço, é pacífico que a recorrente tinha interesse em agir quando interpôs o presente recurso em 31 de março de 2021.

38      Ora, posteriormente à interposição do presente recurso, em 23 de abril de 2021, a Comissão publicou, no seu sítio Internet, o Relatório Final de Auditoria numa versão expurgada dos dados relativos ao funcionamento interno dos fundos fiduciários AB Private Trust I e AB Private Trust II, bem como dos dados pessoais dos indivíduos em causa.

39      Em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o interesse em agir de um recorrente deve existir, tendo em conta o objeto do recurso, no momento da sua interposição, sob pena de este ser julgado inadmissível. Este objeto do litígio deve perdurar, tal como o interesse em agir, até à prolação da decisão jurisdicional, sob pena de o Tribunal Geral não conhecer do mérito da causa, o que pressupõe que o recurso possa, pelo seu resultado, proporcionar um benefício à parte que o interpôs (v. Acórdãos de 30 de abril de 2020, Izba Gospodarcza Producentów i Operatorów Urządzeń Rozrywkowych/Comissão, C‑560/18 P, EU:C:2020:330, n.o 38 e jurisprudência referida, e de 21 de janeiro de 2021, Leino‑Sandberg/Parlamento, C‑761/18 P, EU:C:2021:52, n.o 32 e jurisprudência referida).

40      Importa constatar que, mesmo que o Relatório Final de Auditoria tenha sido publicado pela Comissão numa versão expurgada, a decisão impugnada não foi formalmente revogada pelo Parlamento, pelo que, contrariamente ao que alega a Comissão, o litígio manteve o seu objeto (v., neste sentido, Acórdão de 21 de janeiro de 2021, Leino‑Sandberg/Parlamento, C‑761/18 P, EU:C:2021:52, n.o 33 e jurisprudência referida).

41      No entanto, há que considerar que, devido a essa publicação, a recorrente perdeu o seu interesse em pedir a anulação da recusa do Parlamento de conceder acesso a esse documento, baseada na exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001.

42      Com efeito, através da publicação do Relatório Final de Auditoria na Internet, a Comissão tornou esse documento acessível ao público.

43      Ora, importa assinalar que, segundo jurisprudência constante, em conformidade com o seu considerando 1, o Regulamento n.o 1049/2001 inscreve‑se na vontade de criar uma união em que as decisões são tomadas de uma forma tão aberta quanto possível e ao nível mais próximo possível dos cidadãos. Como recorda o considerando 2 deste regulamento, o direito de acesso do público aos documentos das instituições está associado ao caráter democrático destas últimas (v. Acórdão de 22 de março de 2018, De Capitani/Parlamento, T‑540/15, EU:T:2018:167, n.o 57 e jurisprudência referida). O Regulamento n.o 1049/2001 tem por objetivo conceder um direito de acesso do público em geral aos documentos das instituições, e não estabelecer regras cuja finalidade é proteger o interesse específico que uma pessoa possa ter em aceder a um desses documentos (Acórdão de 1 de fevereiro de 2007, Sison/Conselho, C‑266/05 P, EU:C:2007:75, n.o 43).

44      Como o Tribunal de Justiça salientou, isto resulta, designadamente, do artigo 2.o, n.o 1, do artigo 6.o, n.o 1, e do artigo 12.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1049/2001, bem como do seu título e dos seus considerandos 4 e 11. Com efeito, a primeira destas disposições garante indistintamente o direito de acesso a qualquer cidadão da União e a qualquer pessoa singular ou coletiva que resida ou tenha a sua sede num Estado‑Membro, a segunda especifica, a esse propósito, que o requerente não tem a obrigação de justificar o seu pedido. A terceira destas disposições prevê que as instituições, tanto quanto possível, ponham os documentos à disposição «direta» do público, sob forma eletrónica ou através de um registo. O título do mesmo regulamento e os seus considerandos 4 e 11 também sublinham que o objetivo desse diploma é tornar os documentos das instituições acessíveis ao «público» (Acórdão de 1 de fevereiro de 2007, Sison/Conselho, C‑266/05 P, EU:C:2007:75, n.o 44).

45      Importa igualmente recordar que, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1049/2001, os beneficiários do direito de acesso aos documentos das instituições são «[t]odos os cidadãos da União e todas as pessoas singulares ou coletivas que residam ou tenham a sua sede social num Estado‑Membro». Conclui‑se daqui que este regulamento se destina a garantir o acesso de todos aos documentos e não apenas o acesso do requerente aos documentos que a ele se refiram (Acórdãos de 6 de julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, EU:T:2006:190, n.o 136, e de 12 de maio de 2015, Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão, T‑480/11, EU:T:2015:272, n.o 74).

46      Daqui resulta que, na sequência da publicação do Relatório Final de Auditoria, a recusa do Parlamento de conceder acesso a esse documento com fundamento no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 já não produz efeitos na medida em que o autor do documento, a Comissão, decidiu torná‑lo acessível ao público.

47      Há que constatar que, em caso de anulação da decisão impugnada na parte em que o Parlamento recusou o acesso ao Relatório Final de Auditoria, este último, numa nova decisão em que se pronunciou sobre o pedido de acesso da recorrente, apenas poderia constatar que esse documento se tornou público devido à sua publicação pela Comissão. Ora, a anulação da decisão impugnada, na parte em que recusa o acesso da recorrente ao Relatório Final de Auditoria, não acarreta nenhuma consequência suplementar em relação à divulgação desse documento e não pode proporcionar um benefício à recorrente.

48      Esta conclusão não é posta em causa pelo argumento da recorrente segundo o qual a Comissão não publicou a versão integral do Relatório Final de Auditoria.

49      Com efeito, importa recordar que um pedido de acesso a um documento com base no Regulamento n.o 1049/2001 tem por efeito tornar esse documento acessível ao público e só pode, assim, conduzir à divulgação da versão pública desse documento.

50      A este respeito, há que salientar que a Comissão, quando publicou o Relatório Final de Auditoria no seu sítio Internet, indicou que «[o] presente Relatório Final de Auditoria é publicado tendo em conta as exigências relativas à proteção de determinadas informações, tais como dados pessoais ou segredos comerciais, em conformidade com o Regulamento n.o 1049/2001».

51      Daqui resulta que a decisão da Comissão de não tornar acessíveis ao público certos dados contidos no Relatório Final de Auditoria não se baseia na exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, relativa à proteção dos objetivos de atividades de inspeção, inquérito e auditoria.

52      Por conseguinte, a anulação da decisão impugnada na parte em que o Parlamento recusou o acesso ao Relatório Final de Auditoria com base no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 não pode ter por efeito tornar esses dados públicos. Não sendo o Parlamento o autor do Relatório Final de Auditoria, não pode ir além da divulgação concedida pela Comissão, autora desse documento.

53      Assim, a recorrente obteve, devido à publicação do Relatório Final de Auditoria, o único benefício que o seu recurso, na parte em que visa a recusa de acesso a esse documento com fundamento no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, lhe poderia ter proporcionado.

54      Por outro lado, há que salientar que, para demonstrar a manutenção do seu interesse em obter a anulação da recusa de acesso ao Relatório Final de Auditoria, a recorrente não pode invocar utilmente o n.o 45 do Acórdão de 21 de janeiro de 2021, Leino‑Sandberg/Parlamento (C‑761/18 P, EU:C:2021:52), segundo o qual «não se pode considerar que a instituição em causa cumpriu a sua obrigação de possibilitar acesso a um documento pelo simples facto de esse documento ter sido divulgado por um terceiro e de o requerente dele ter tomado conhecimento».

55      Com efeito, esta jurisprudência não é aplicável no caso em apreço, na medida em que a divulgação do Relatório Final de Auditoria resulta da sua publicação na Internet pela Comissão, isto é, a instituição autora do mesmo.

56      O facto de a recorrente ter optado por pedir o acesso ao Relatório Final de Auditoria ao Parlamento e não à instituição que dele é autora não pode levar a considerar que a publicação desse documento pela Comissão constitui uma divulgação por um «terceiro».

57      A este respeito, há que salientar que, no n.o 46 do Acórdão de 21 de janeiro de 2021, Leino‑Sandberg/Parlamento (C‑761/18 P, EU:C:2021:52), invocado pela recorrente, o Tribunal de Justiça considerou que, contrariamente à situação em que a própria instituição em causa divulgou um documento, permitindo assim ao requerente tomar conhecimento desse documento e utilizá‑lo de forma lícita e estar seguro quanto ao caráter exaustivo e à integridade desse documento, não se pode considerar que um documento divulgado por um terceiro constitui um documento oficial ou que exprima a posição oficial de uma instituição caso inexista uma aprovação unívoca dessa instituição segundo a qual o que foi expresso provém efetivamente dessa instituição e exprime a sua posição oficial.

58      Por conseguinte, o Tribunal de Justiça declarou que, numa situação em que a recorrente tinha obtido unicamente acesso ao documento controvertido divulgado por um terceiro e em que o Parlamento lhe continuava a recusar o acesso ao documento pedido, não se podia considerar que a recorrente tinha obtido acesso a este documento, na aceção do Regulamento n.o 1049/2001, nem, portanto, que tinha perdido o interesse em pedir a anulação da decisão controvertida apenas devido a essa divulgação. Pelo contrário, nessa situação, a recorrente conservava um interesse real em obter o acesso a uma versão autenticada do documento pedido, na aceção do artigo 10.o, n.os 1 e 2, deste regulamento, que garantisse que essa instituição era a sua autora e que esse documento expressava a posição oficial desta (Acórdão de 21 de janeiro de 2021, Leino‑Sandberg/Parlamento, C‑761/18 P, EU:C:2021:52, n.o 48).

59      Ora, não é o que sucede no caso em apreço. A publicação do Relatório Final de Auditoria pela Comissão, que é a sua autora, garante que a recorrente teve acesso à versão autenticada do documento.

60      Daqui resulta que, uma vez que a recorrente já não tem interesse em agir no que respeita ao pedido de anulação da decisão impugnada na parte em que o Parlamento recusou o acesso ao Relatório Final de Auditoria, não há que conhecer deste pedido.

61      Por conseguinte, o presente recurso deve ser analisado como um pedido de anulação parcial da decisão impugnada na medida em que o Parlamento recusou à recorrente o acesso à carta da Comissão.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, na medida em que o Parlamento não demonstrou que as condições de recusa de acesso à carta da Comissão eram respeitadas

62      A recorrente alega que o Parlamento não podia basear a sua recusa de acesso à carta da Comissão no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, afirmando que a sua divulgação prejudicaria o objetivo do inquérito em curso, na medida em que, em primeiro lugar, o inquérito de auditoria já tinha alcançado o seu objetivo e que, em segundo lugar e em todo o caso, o Parlamento não demonstrou que a sua divulgação poderia prejudicar esse inquérito.

63      Importa recordar que resulta do considerando 2 do Regulamento n.o 1049/2001 que a abertura permite conferir às instituições da União uma maior legitimidade, eficácia e responsabilidade perante os cidadãos da União num sistema democrático. Para o efeito, o artigo 1.o deste regulamento prevê que este tem por objetivo conferir ao público um direito de acesso aos documentos das instituições da União que seja o mais amplo possível. Resulta igualmente do artigo 4.o do referido regulamento, que institui um regime de exceções a este respeito, que este direito de acesso está sujeito a certos limites baseados em razões de interesse público ou privado (v. Acórdãos de 22 de janeiro de 2020, MSD Animal Health Innovation e Intervet international/EMA, C‑178/18 P, EU:C:2020:24, n.os 50 a 52 e jurisprudência referida, e de 28 de maio de 2020, Campbell/Comissão, T‑701/18, EU:T:2020:224, n.o 25 e jurisprudência referida).

64      Uma vez que tais exceções derrogam o princípio do acesso mais amplo possível do público aos documentos, devem ser interpretadas e aplicadas de forma estrita (v. Acórdãos de 22 de janeiro de 2020, MSD Animal Health Innovation e Intervet international/EMA, C‑178/18 P, EU:C:2020:24, n.o 53 e jurisprudência referida, e de 28 de maio de 2020, Campbell/Comissão, T‑701/18, EU:T:2020:224, n.o 26 e jurisprudência referida).

65      Entre as exceções ao direito de acesso aos documentos figura a prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, nos termos do qual as instituições recusarão o acesso aos documentos cuja divulgação pudesse prejudicar a proteção de objetivos de atividades de inspeção, inquérito e auditoria, exceto quando um interesse público superior imponha a divulgação.

66      A título preliminar, importa salientar que a apreciação do mérito da aplicação de uma das exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001 deve ser feita tendo em conta os factos existentes à data da adoção da decisão que recusa o acesso aos documentos com base nessa exceção. Com efeito, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a legalidade de um ato da União deve ser apreciada em função dos elementos de facto e de direito existentes à data em que o ato foi adotado (v. Acórdãos de 11 de maio de 2017, Suécia/Comissão, C‑562/14 P, EU:C:2017:356, n.o 63 e jurisprudência referida, e de 6 de fevereiro de 2020, Compañía de Tranvías de la Coruña/Comissão, T‑485/18, EU:T:2020:35, n.o 36 e jurisprudência referida).

67      No caso em apreço, a data de 15 de janeiro de 2021, em que a decisão impugnada foi adotada, é a única pertinente no que respeita à questão de saber se a exceção baseada no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 se justificava. Assim, a publicação do Relatório Final de Auditoria no sítio Internet da Comissão, em 23 de abril de 2021, sendo posterior à adoção da decisão impugnada, não é pertinente no que respeita à apreciação da legalidade da decisão impugnada.

68      Por conseguinte, há que julgar inoperantes os argumentos da recorrente, invocados na réplica, segundo os quais a publicação do Relatório Final de Auditoria pela Comissão confirma o mérito do seu recurso, na medida em que esta admitiu, através da divulgação do Relatório Final de Auditoria, que já não era possível prejudicar os objetivos da sua atividade de inquérito e de auditoria.

 Quanto à primeira parte, relativa ao facto de o inquérito já ter alcançado o seu objetivo

69      A recorrente alega que o Parlamento não lhe podia recusar o acesso à carta da Comissão pelo facto de a sua divulgação ser suscetível de prejudicar os objetivos do inquérito em curso, na medida em que o inquérito de auditoria já tinha alcançado o seu objetivo.

70      Considera que o inquérito, mencionado pelo Parlamento, é um inquérito de auditoria aberto pela Direção‑Geral da Política Regional e Urbana e pela Direção‑Geral do Emprego, dos Assuntos Sociais e da Inclusão da Comissão, cujo objetivo é controlar a conformidade dos sistemas de gestão e de controlo implementados na República Checa com o quadro jurídico relativo à prevenção de conflitos de interesses.

71      A recorrente alega que, à data da adoção pela Comissão da carta de seguimento, o processo de inquérito estava terminado, que a realização dos objetivos da auditoria já não podia ser prejudicada e que, assim, a exceção já não era aplicável. A recorrente indica que, segundo essa carta de seguimento, as conclusões da auditoria estavam clarificadas, algumas recomendações da auditoria tinham sido executadas e outras ainda estavam pendentes. Alega que, nessa data, em conformidade com o artigo 75.o, n.os 1 e 3, do Regulamento n.o 1303/2013, a Comissão se tinha certificado da forma como funcionavam os sistemas de gestão e de controlo instituídos pela República Checa e tinha pedido às autoridades checas que adotassem as medidas que considerava necessárias.

72      A auditoria atingiu assim o seu objetivo, na medida em que permitiu à Comissão apresentar as suas conclusões e formular as suas recomendações. Esta última indicou, numa carta dirigida à recorrente em 22 de outubro de 2020, que, «nesta fase do processo, após a adoção do Relatório Final de Auditoria, cabia às autoridades do programa [de subvenção] em causa executar as recomendações». Ora, segundo a recorrente, não se pode considerar que a execução das recomendações formuladas no âmbito da auditoria constitui um «inquérito em curso». Uma interpretação estrita da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 não permite incluir um simples controlo da execução das recomendações já adotadas.

73      Importa assinalar que o artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 que, como qualquer exceção ao direito de acesso a documentos, deve ser interpretada e aplicada estritamente, não visa proteger as atividades de inquérito enquanto tais, mas os objetivos prosseguidos por estas atividades (v. Acórdão de 5 de abril de 2017, França/Comissão, T‑344/15, EU:T:2017:250, n.o 83 e jurisprudência referida). Assim, esta disposição só é aplicável se a divulgação dos documentos em questão puder pôr em perigo a conclusão das atividades de inspeção, inquérito ou auditoria (Acórdãos de 6 de julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, EU:T:2006:190, n.o 109, e de 7 de junho de 2011, Toland/Parlamento, T‑471/08, EU:T:2011:252, n.o 43).

74      É certo que os diferentes atos de inquérito ou de inspeção podem ficar abrangidos pela exceção relativa à proteção de atividades de inspeção, inquérito e auditoria enquanto as atividades de inquérito ou de inspeção prosseguem, mesmo que esteja terminado o inquérito ou a inspeção particular que deu lugar ao relatório ao qual é pedido acesso (v. Acórdãos de 6 de julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, EU:T:2006:190, n.o 109 e jurisprudência referida, e de 7 de junho de 2011, Toland/Parlamento, T‑471/08, EU:T:2011:252, n.o 44 e jurisprudência referida).

75      Todavia, admitir que os diferentes documentos relativos a atividades de inspeção, inquérito ou auditoria estão abrangidos pela exceção constante do artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 enquanto o seguimento a dar a esses procedimentos não estiver decidido equivale a submeter o acesso aos referidos documentos a um acontecimento aleatório, futuro e eventualmente longínquo, dependente da celeridade e da diligência das diferentes autoridades. Esta solução colide com o objetivo que consiste em garantir o acesso do público aos documentos relativos a eventuais irregularidades cometidas na gestão dos interesses financeiros, com a finalidade de dar aos cidadãos a possibilidade de controlarem de forma mais efetiva a legalidade do exercício do poder público (v. Acórdãos de 6 de julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, EU:T:2006:190, n.os 111 e 112 e jurisprudência referida, e de 7 de junho de 2011, Toland/Parlamento, T‑471/08, EU:T:2011:252, n.o 45 e jurisprudência referida).

76      Assim, importa verificar se, no momento da adoção da decisão impugnada, estavam ainda em curso atividades de inspeção e inquérito, que pudessem ter sido postas em causa pela divulgação da carta da Comissão e se a prossecução dessas atividades ocorreu num prazo razoável (Acórdão de 6 de julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, EU:T:2006:190, n.o 113; v., igualmente, Acórdão de 7 de junho de 2011, Toland/Parlamento, T‑471/08, EU:T:2011:252, n.o 46 e jurisprudência referida).

77      Resulta destas enunciações que a exceção ao direito de acesso prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 pode ser declarada aplicável a um relatório de auditoria cuja divulgação ponha em perigo atividades de inspeção ou inquérito prosseguidas, num prazo razoável, com base no seu conteúdo (Acórdão de 7 de junho de 2011, Toland/Parlamento, T‑471/08, EU:T:2011:252, n.o 47).

78      Há que constatar que, na decisão impugnada, o Parlamento salientou que «[e]nquanto o inquérito decorr[ia], diversos atos de inquérito, como uma auditoria particular que deu origem a um relatório de auditoria, pod[ia]m continuar a estar abrangidos por esta exceção». O Parlamento considerou que «[o]s documentos em questão [tinham sido] elaborados pela Comissão no âmbito de um inquérito em curso relativo a uma eventual violação, pela República Checa, do direito da União Europeia em matéria de prevenção de conflitos de interesses» e que «[a] divulgação pública desses documentos comprometeria o objetivo do presente inquérito».

79      No caso em apreço, a Comissão realizou a auditoria relativa ao funcionamento dos sistemas de gestão e de controlo instituídos na República Checa para evitar conflitos de interesses com fundamento, nomeadamente, no artigo 75.o do Regulamento n.o 1303/2013.

80      A este respeito, o artigo 75.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1303/2013 prevê que a Comissão deve certificar‑se, com base na informação disponível, incluindo auditorias efetuadas por organismos da União, de que os Estados‑Membros dispõem de sistemas de gestão e de controlo conformes com este regulamento e com as regras específicas dos Fundos Europeus Estruturais e de Investimento (a seguir «FEEI»), e de que esses sistemas funcionam de forma eficaz durante a execução dos programas. Segundo o artigo 75.o, n.o 2, deste regulamento, os funcionários ou representantes autorizados da Comissão podem efetuar auditorias cujo âmbito pode incluir, em particular, a verificação da eficácia dos sistemas de gestão e de controlo de um programa ou parte de um programa, as operações e a avaliação da boa gestão financeira das operações ou programas. Em aplicação do artigo 75.o, n.o 3, do mesmo regulamento, a Comissão pode solicitar a um Estado‑Membro que tome as medidas necessárias para garantir o funcionamento eficaz do seu sistema de gestão e de controlo ou a regularidade da despesa em conformidade com as regras específicas dos FEEI.

81      Além disso, o artigo 144.o do Regulamento n.o 1303/2013, que enuncia os critérios das correções financeiras, prevê que a Comissão aplica correções financeiras, cancelando a totalidade ou parte da contribuição da União para um programa operacional quando, após ter efetuado as verificações necessárias, conclua, nomeadamente, que o sistema de gestão e de controlo do programa apresenta uma falha grave, que pôs em risco a contribuição da União já paga para o programa operacional. Segundo o procedimento previsto no artigo 145.o do Regulamento n.o 1303/2013, antes de decidir aplicar uma correção financeira, a Comissão dá início ao procedimento comunicando ao Estado‑Membro as conclusões provisórias da sua avaliação e convidando‑o a apresentar as suas observações no prazo de dois meses. Este artigo descreve o procedimento de diálogo entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa e prevê, nomeadamente no seu n.o 4, que caso um Estado‑Membro não aceite as conclusões provisórias da Comissão, é convidado a participar numa audição da Comissão a fim de garantir que foram recolhidas todas as informações e observações relevantes para justificar as conclusões da Comissão sobre a aplicação da correção financeira. Além disso, o artigo 145.o, n.o 6, do mesmo regulamento dispõe que, para aplicar as correções financeiras, a Comissão adota uma decisão, através de atos de execução, no prazo de seis meses a contar da data da audição, ou da data de receção das informações adicionais, caso o Estado‑Membro aceite fornecer essas informações após a audição, e que [a Comissão] tem em conta todas as informações apresentadas e todas as observações feitas durante o procedimento. Ademais, o artigo 145.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1303/2013 prevê, nomeadamente, que se a Comissão, no exercício das responsabilidades que lhe incumbem por força do artigo 75.o do mesmo regulamento, detetar irregularidades que revelem uma deficiência grave no funcionamento dos sistemas de gestão e controlo, a correção financeira resultante deve reduzir o apoio dos FEEI destinado ao programa operacional.

82      A este respeito, a recorrente não tem razão quando alega que o objetivo do artigo 75.o do Regulamento n.o 1303/2013 foi atingido com a adoção da carta de seguimento, na medida em que a Comissão se certificou da forma como funcionam os sistemas de controlo e de gestão na República Checa e em que pediu às autoridades checas que adotassem as medidas necessárias para assegurar esse funcionamento. Com efeito, o objetivo da auditoria em causa, conduzida com base neste artigo, é permitir à Comissão garantir a conformidade dos sistemas de controlo e de gestão existentes na República Checa com o direito da União e, para tal, pode pedir às autoridades checas que tomem as medidas necessárias.

83      Como salienta o Parlamento, o objetivo da atividade de inquérito da Comissão não pode ser limitado apenas à análise, pela Comissão, dos sistemas instituídos pela República Checa. Com efeito, a execução pelo Estado das recomendações formuladas pela Comissão no âmbito da auditoria constitui uma etapa para a realização do objetivo do inquérito, que visa assegurar a conformidade dos sistemas de controlo e de gestão de um Estado‑Membro com o direito da União.

84      Resulta das disposições mencionadas nos n.os 80 e 81, supra, e da economia geral do Regulamento n.o 1303/2013 que a elaboração de um Relatório Final de Auditoria e o envio desse relatório, que contém recomendações relativas às ações a adotar, apenas põem termo a uma fase do procedimento, designadamente, a fase de auditoria, e dão início a uma fase de troca de correspondência com o Estado‑Membro em questão a respeito das ações em causa (Despacho de 16 de setembro de 2019, Polónia/Comissão, T‑703/18, não publicado, EU:T:2019:628, n.o 53).

85      Esta fase de troca de correspondência tem por objetivo permitir ao Estado‑Membro em questão fornecer informações suplementares que possam alterar as apreciações que figuram no Relatório Final de Auditoria, adotar, se for caso disso, as ações recomendadas pela Comissão, ou ainda propor ações alternativas (Despacho de 16 de setembro de 2019, Polónia/Comissão, T‑703/18, não publicado, EU:T:2019:628, n.o 54).

86      Esta interpretação é igualmente aplicável à carta de seguimento em que a Comissão assegura o acompanhamento das recomendações formuladas no Relatório Final de Auditoria e que abre igualmente uma fase de troca de correspondência com o Estado‑Membro.

87      Ora, no caso em apreço, há que observar que a recorrente reconhece que, na carta de seguimento, certas recomendações continuavam pendentes de execução. Assim, à data da adoção da carta de seguimento, no que se refere às recomendações formuladas no Relatório Final de Auditoria que ainda estavam pendentes, as autoridades checas ainda podiam apresentar observações com o objetivo de responder a essas recomendações.

88      Em conformidade com a jurisprudência referida nos n.os 73 e 74, supra, a proteção dos objetivos das atividades de inquérito assegurada pela exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 não termina com a adoção do Relatório Final de Auditoria nem com a adoção da carta de seguimento da Comissão. A fase de troca de correspondência com o Estado‑Membro sobre as recomendações da Comissão que continuam pendentes faz parte das atividades de inquérito abrangidas por esta exceção.

89      Daqui decorre que a recorrente não tem razão quando afirma, por um lado, que a auditoria alcançou o seu objetivo pelo facto de a Comissão ter apresentado as suas conclusões e formulado as suas recomendações na carta de seguimento e, por outro, que a execução, pelas autoridades checas, das recomendações, que figuram no Relatório Final de Auditoria e na carta de seguimento, bem como o controlo pela Comissão dessa execução, não fazem parte do inquérito em curso.

90      Resulta do exposto que a recorrente não pode afirmar que, na sequência da adoção pela Comissão da carta de seguimento, a auditoria tinha atingido o seu objetivo e já não constituía um inquérito em curso.

91      Por outro lado, a recorrente alega que considerar que o procedimento de auditoria previsto no artigo 75.o do Regulamento n.o 1303/2013 inclui um número previamente indefinido de trocas de correspondência entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa, que decorriam enquanto as conclusões e as recomendações constantes do relatório de auditoria podiam ser alteradas, faria com que a divulgação da carta da Comissão estivesse sujeita à existência de um acontecimento aleatório, futuro e potencialmente muito longínquo, dependente da diligência das autoridades em causa. Afirma que a conclusão do diálogo entre o Estado‑Membro em causa e a Comissão não é formalizada pelo Regulamento n.o 1303/2013 e depende da vontade da Comissão. Em aplicação da jurisprudência mencionada no n.o 75, supra, esta interpretação ilimitada do conceito de auditoria é contrária ao objetivo do Regulamento n.o 1049/2001.

92      Resulta da jurisprudência que o Parlamento pode invocar a presunção geral de ofensa aos objetivos de atividades de inquérito, inspeção e auditoria para recusar a divulgação de documentos relativos a um inquérito quando este está em curso ou quando tiver sido encerrado recentemente e quando, neste último caso, as autoridades nacionais competentes ainda não tiverem decidido, num prazo razoável, o seguimento a dar ao seu relatório de inquérito (v., por analogia, Acórdão de 1 de setembro de 2021, Homoki/Comissão, T‑517/19, não publicado, EU:T:2021:529, n.o 63 e jurisprudência referida).

93      Basta salientar que, no caso em apreço, a Comissão transmitiu à República Checa a carta de seguimento em 22 de outubro de 2020 na versão inglesa e em 18 de dezembro de 2020 na versão checa. Como indica o Parlamento e como resulta da carta de seguimento, o prazo de três meses de que dispunham as autoridades checas para responder à carta de seguimento começou com o envio da versão checa e, por isso, não tinha expirado à data da adoção da decisão impugnada, em 15 de janeiro de 2021.

94      Assim, há que considerar que, à data da adoção da decisão impugnada, em 15 de janeiro de 2021, não tendo as autoridades checas tomado ainda posição sobre a carta de seguimento, o objetivo das atividades de inquérito ainda não tinha sido alcançado.

95      Resulta do exposto que a recorrente afirma erradamente que, à data da adoção da decisão impugnada, o Parlamento não podia invocar a exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001.

96      Por conseguinte, a primeira parte deve ser julgada improcedente.

 Quanto à segunda parte, relativa ao facto de o Parlamento não ter demonstrado que a divulgação da carta da Comissão poderia prejudicar o inquérito

97      A recorrente afirma que, admitindo que o inquérito ainda estava «em curso», o Parlamento não demonstrou que a divulgação da carta da Comissão podia prejudicar esse inquérito. Alega que, segundo a jurisprudência, a circunstância de um documento dizer respeito a uma atividade de inquérito não basta, por si só, para justificar a aplicação da exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, mas que a instituição deve fornecer explicações quanto à questão de saber de que modo o acesso a esse documento implicaria um risco razoavelmente previsível de prejudicar concreta e efetivamente o interesse protegido.

98      Há que recordar que, em conformidade com a conclusão que figura no n.o 60, supra, não é necessário decidir sobre os argumentos da recorrente relativos à recusa de acesso ao Relatório Final de Auditoria.

99      Quanto à recusa de acesso à carta da Comissão, a recorrente alega que a fundamentação da decisão impugnada é insuficiente.

100    Segundo jurisprudência constante, a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição ou organismo, autora do ato, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adotada e ao juiz da União exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente, do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas direta e individualmente afetadas pelo ato podem ter em obter explicações. Não é exigido que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada não só à luz do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v. Acórdãos de 1 de fevereiro de 2007, Sison/Conselho, C‑266/05 P, EU:C:2007:75, n.o 80 e jurisprudência referida, e de 26 de março de 2020, Bonnafous/Comissão, T‑646/18, EU:T:2020:120, n.os 22 e 23 e jurisprudência referida).

101    Resulta de jurisprudência igualmente constante que, quando é apresentado um pedido de acesso a um documento a uma instituição, a um órgão ou a um organismo da União e é decidido recusar este pedido ao abrigo de uma das exceções previstas no artigo 4.o do Regulamento n.o 1049/2001, incumbe‑lhe, em princípio, apresentar explicações sobre a questão de saber de que forma o acesso a esse documento poderia prejudicar concreta e efetivamente o interesse protegido por essa exceção, devendo o risco de tal prejuízo ser razoavelmente previsível e não meramente hipotético (v. Acórdãos de 29 de outubro de 2020, Intercept Pharma e Intercept Pharmaceuticals/EMA, C‑576/19 P, EU:C:2020:873, n.o 51 e jurisprudência referida, e de 29 de setembro de 2021, AlzChem Group/Comissão, T‑569/19, EU:T:2021:628, n.o 39 e jurisprudência referida).

102    Compete, portanto, à instituição que recusou o acesso a um documento fornecer uma fundamentação que permita compreender e verificar, por um lado, se o documento pedido está efetivamente abrangido pelo domínio objeto da exceção invocada e, por outro, se a necessidade de proteção relativa a essa exceção é real (Acórdão de 1 de fevereiro de 2007, Sison/Conselho, C‑266/05 P, EU:C:2007:75, n.o 61; v., igualmente, Acórdão de 26 de março de 2020, Bonnafous/Comissão, T‑646/18, EU:T:2020:120, n.o 24 e jurisprudência referida).

103    Embora a instituição em causa seja obrigada a expor os fundamentos que justificam a aplicação ao caso em apreço de uma das exceções ao direito de acesso previstas pelo Regulamento n.o 1049/2001, não é obrigada a fornecer informações que vão além do que é necessário para a compreensão, pelo requerente do acesso, das razões que estiveram na origem da sua decisão e para a fiscalização, pelo Tribunal Geral, da legalidade desta última (v. Acórdão de 26 de março de 2020, Bonnafous/Comissão, T‑646/18, EU:T:2020:120, n.o 25).

104    Por outro lado, quando uma resposta confirma, como no caso em apreço, o indeferimento de um pedido com base nos mesmos fundamentos em que assenta a decisão inicial de indeferimento, há que apreciar o caráter suficiente da fundamentação à luz da troca de correspondência entre a instituição e o requerente, tendo em conta as informações que o requerente tinha à sua disposição quanto à natureza e ao conteúdo dos documentos solicitados (v., neste sentido, Acórdão de 6 de abril de 2000, Kuijer/Conselho, T‑188/98, EU:T:2000:101, n.o 44).

105    Em primeiro lugar, a recorrente alega que o Parlamento não demonstrou a existência de uma ligação pertinente entre a carta da Comissão e o inquérito de auditoria. Tendo em conta que nem o projeto de relatório de auditoria, nem o Relatório Final de Auditoria, nem a carta de seguimento fazem referência à carta da Comissão, o Parlamento não demonstrou que os resultados do inquérito de auditoria dependiam dessa carta e é possível supor que essa carta não tem qualquer ligação ao inquérito de auditoria.

106    No caso em apreço, em primeiro lugar, importa recordar que a carta pedida é uma carta do membro da Comissão, G. Oettinger, responsável pelo orçamento, dirigida ao primeiro‑ministro da República Checa, que foi identificada, em resposta ao pedido de acesso da recorrente, pelo Parlamento como fazendo parte dos documentos relativos ao inquérito contra o primeiro‑ministro da República Checa por utilização abusiva dos fundos europeus e potenciais conflitos de interesses.

107    Em segundo lugar, há que salientar que, na Decisão de 14 de setembro de 2020, em resposta ao pedido inicial da recorrente, o Parlamento indicou que, após análise do seu conteúdo, essa carta dizia respeito a um inquérito sobre os interesses económicos na aceção do artigo 61.o, n.o 3, do Regulamento (UE, Euratom) 2018/1046 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de julho de 2018, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União, que altera os Regulamentos (UE) n.o 1296/2013 (UE) n.o 1301/2013 (UE) n.o 1303/2013, UE n.o 1304/2013 (UE) n.o 1309/2013 (UE) n.o 1316/2013 (UE) n.o 223/2014 e (UE) n.o 283/2014, e a Decisão n.o 541/2014/UE, e revoga o Regulamento (UE, Euratom) n.o 966/2012 (JO 2018, L 193, p. 1), o qual contém a definição de conflito de interesses.

108    Em terceiro lugar, na decisão impugnada, o Parlamento salientou que a Comissão o tinha informado de que a divulgação da carta da Comissão prejudicaria os inquéritos e auditorias em curso relacionados com as questões suscitadas na Resolução. Considerou que, enquanto o inquérito prosseguia, diversos atos de inquérito, como uma auditoria particular que deu origem a um relatório de auditoria, podiam ficar abrangidos pela exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001. Indicou que a carta da Comissão tinha sido elaborada por esta no âmbito de um inquérito em curso relativo a uma eventual violação, pela República Checa, do direito da União em matéria de prevenção de conflitos de interesses.

109    Assim, como salienta o Parlamento, daí resulta que a carta da Comissão tinha o mesmo objeto que o inquérito de auditoria.

110    Em quarto lugar, há que constatar, à semelhança do que fez a Comissão, que a correspondência com G. Oettinger, membro da Comissão, é mencionada no Relatório Final de Auditoria e na carta de seguimento como sendo relativa às atividades do primeiro‑ministro checo, A. Babiš, no Conselho checo para os FEEI.

111    Ora, como alega a recorrente, o Relatório Final de Auditoria e a carta de seguimento foram publicados na imprensa checa e eram do seu conhecimento antes da adoção da decisão impugnada. Por conseguinte, não pode alegar que a carta da Comissão não era mencionada no Relatório Final de Auditoria e na carta de seguimento, documentos que, de resto, apresentou em anexo à petição.

112    Daqui resulta que todos estes elementos eram suficientes para que a recorrente compreendesse que a carta da Comissão era um documento respeitante ao inquérito de auditoria relativo a uma eventual violação pelo primeiro‑ministro checo do direito da União em matéria de prevenção de conflitos de interesses e não pode, assim, alegar uma insuficiência de fundamentação a este respeito.

113    Por outro lado, a recorrente não pode alegar utilmente que o Parlamento não estabeleceu a existência de uma ligação entre a carta da Comissão e o inquérito de auditoria ao não ter demonstrado que os resultados do inquérito de auditoria dependiam dessa carta. Com efeito, para demonstrar essa ligação, o Parlamento devia unicamente demonstrar que essa carta fazia parte dos documentos relativos às atividades do inquérito em curso.

114    Em segundo lugar, a recorrente alega que, por não estabelecer uma ligação entre a carta da Comissão e o inquérito de auditoria, o Parlamento não demonstrou a existência de um risco razoavelmente previsível de prejuízo concreto e efetivo ao inquérito de auditoria pela divulgação dessa carta. O Parlamento não explicou de que modo a divulgação da carta da Comissão era suscetível de prejudicar a auditoria.

115    Em primeiro lugar, importa recordar que, na decisão impugnada, o Parlamento justificou a recusa de acesso à carta da Comissão com o fundamento, nomeadamente, de que o objetivo do inquérito da Comissão era dar ao Estado‑Membro em causa a oportunidade de cumprir as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União e de exercer os seus direitos de defesa contra as objeções formuladas pela Comissão e de que o Estado‑Membro tinha o direito de esperar da Comissão o respeito da confidencialidade, sem o qual poderia revelar‑se ainda mais difícil dar início a um diálogo entre a Comissão e o Estado‑Membro com vista a pôr termo à alegada infração.

116    Há que recordar que o objetivo do inquérito de auditoria e, em particular, do diálogo entre a Comissão e as autoridades checas sobre as recomendações que figuram no Relatório Final de Auditoria é permitir à República Checa pôr em conformidade os seus sistemas de gestão e de controlo com o direito da União para evitar conflitos de interesses. Ora, na medida em que resulta da análise da primeira parte que, à data da adoção da decisão impugnada, esse diálogo ainda estava em curso e que a carta da Comissão constitui um elemento desse inquérito, a fundamentação que figura na decisão impugnada é suficiente para explicar a razão pela qual a divulgação dessa carta era suscetível de prejudicar o objetivo das atividades do inquérito de auditoria.

117    Além disso, como salienta o Parlamento, tendo em conta o envolvimento direto do primeiro‑ministro checo, suspeito de se encontrar numa situação de conflito de interesses, era ainda mais importante respeitar a confidencialidade do diálogo entre este último e o membro da Comissão a fim de assegurar um diálogo aberto num espírito de cooperação.

118    Em segundo lugar, o Parlamento salientou igualmente, na decisão impugnada, que os investigadores e as partes interessadas no inquérito pareciam estar rodeados de um clima de ameaças e que uma breve divulgação da carta da Comissão teria um impacto negativo no seu nível de cooperação e comprometeria a capacidade desta última de cumprir o mais eficazmente possível as suas missões de inquérito.

119    A este respeito, há que salientar que o interesse protegido pela exceção relativa à proteção dos objetivos das atividades de auditoria, prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, é o de permitir que as auditorias se realizam de maneira independente e sem pressões, quer estas provenham da entidade auditada, de outras entidades interessadas ou do público em geral (Acórdão de 12 de maio de 2015, Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão, T‑480/11, EU:T:2015:272, n.o 63).

120    Por conseguinte, a recorrente não tem razão quando alega que o Parlamento não indicou suficientemente, na decisão impugnada, o motivo pelo qual a divulgação da carta da Comissão poderia prejudicar concreta e efetivamente os objetivos do inquérito de auditoria.

121    Por outro lado, a recorrente alega que, na medida em que o projeto de relatório de auditoria, o Relatório Final de Auditoria e a carta de seguimento tinham sido difundidos nos meios de comunicação social checos, respetivamente, em junho de 2019, novembro de 2019 e dezembro de 2020, a divulgação da carta da Comissão não constituía uma ameaça concreta e efetiva para o inquérito de auditoria.

122    Ora, na medida em que a recorrente reconhece que a carta da Comissão não tinha sido publicada, nem sequer parcialmente, e em que o conteúdo dessa carta não está reproduzido nos documentos publicados nos meios de comunicação social checos, há que considerar que este argumento não tem impacto na questão de saber se essa carta estava abrangida pela exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, tendo em conta, nomeadamente, a necessidade de manter a confidencialidade do diálogo entre o primeiro‑ministro checo e a Comissão.

123    Resulta do exposto que a fundamentação da decisão impugnada é suficiente para compreender que a carta da Comissão fazia parte do inquérito de auditoria e estava, assim, abrangida pela exceção prevista no artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001 e que, estando este inquérito ainda em curso à data da adoção da decisão impugnada, a necessidade de proteção relativa a essa exceção era real.

124    Daqui decorre que a segunda parte e, assim, todo o fundamento devem ser julgados improcedentes.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001, na medida em que o Parlamento não teve em conta a existência de um interesse público superior que justifique a divulgação da carta da Comissão

125    A recorrente alega que, mesmo admitindo que a auditoria tivesse constituído um inquérito em curso ao qual a divulgação da carta da Comissão pudesse causar prejuízo, o Parlamento não lhe podia recusar o acesso a esse documento na medida em que existia um interesse público superior na sua divulgação na aceção do artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001.

126    A recorrente salienta que a União assenta no respeito do Estado de direito e no respeito dos direitos humanos, incluindo os direitos de defesa. Tendo em conta que, no relatório sobre a missão de informação e na Resolução, o Parlamento formulou acusações graves sobre a forma como o grupo Agrofert era gerido, a recorrente deveria ter sido colocada em condições de analisar os documentos em que essas alegações se baseavam e de se opor às mesmas. O Parlamento estava obrigado a tomar em consideração o interesse público superior que justifica a divulgação da carta da Comissão, o qual consiste na proteção das liberdades e dos direitos fundamentais da recorrente enquanto pessoa direta e individualmente afetada por essas alegações. O Estado de direito, baseado na proteção das liberdades e dos direitos fundamentais, só pode ser mantido mediante o respeito desses direitos e liberdades em cada caso individual e, por conseguinte, o interesse da recorrente constitui um interesse público na aceção do artigo 4.o, n.o 2, terceiro travessão, do Regulamento n.o 1049/2001.

127    Segundo jurisprudência constante, incumbe a quem alega a existência de um interesse público superior invocar de forma concreta as circunstâncias que justificam a divulgação dos documentos em causa (v. Acórdãos de 11 de maio de 2017, Suécia/Comissão, C‑562/14 P, EU:C:2017:356, n.o 56 e jurisprudência referida, e de 29 de setembro de 2021, AlzChem Group/Comissão, T‑569/19, EU:T:2021:628, n.o 124 e jurisprudência referida).

128    Importa recordar que, segundo a jurisprudência referida no n.o 45, supra, o Regulamento n.o 1049/2001 destina‑se a garantir o acesso de todos aos documentos e não apenas o acesso do requerente aos documentos que a ele se refiram.

129    Consequentemente, o interesse particular que um sujeito possa invocar para ter acesso a um documento que lhe diz pessoalmente respeito não pode ser tomado em consideração no âmbito da apreciação da existência de um interesse público superior, na aceção do artigo 4.o, n.o 2, último membro de frase, do Regulamento n.o 1049/2001 (Acórdão de 6 de julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, EU:T:2006:190, n.o 137; v., igualmente, Acórdão de 12 de maio de 2015, Technion e Technion Research & Development Foundation/Comissão, T‑480/11, EU:T:2015:272, n.o 75 e jurisprudência referida).

130    O interesse geral que a recorrente invoca reside nos direitos de defesa. É, por certo, verdade que a própria existência dos direitos de defesa tem interesse geral. Todavia, o facto de esses direitos aqui se manifestarem através do interesse subjetivo da recorrente em se defender implica que o interesse que a recorrente invoca não é um interesse geral, mas um interesse privado (Acórdão de 6 de julho de 2006, Franchet e Byk/Comissão, T‑391/03 e T‑70/04, EU:T:2006:190, n.o 138).

131    Daqui resulta que o Parlamento teve razão ao considerar na decisão impugnada, com base na jurisprudência referida nos n.os 128 a 130, supra, que os direitos de defesa invocados pela recorrente não constituíam um interesse público superior que justificasse a divulgação da carta da Comissão.

132    Assim, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente e, por conseguinte, deve ser negado provimento ao recurso na íntegra.

 Quanto às despesas

133    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, de acordo com o pedido do Parlamento.

134    Por outro lado, nos termos do artigo 137.o do Regulamento de Processo, se não houver lugar a decisão de mérito, o Tribunal decide livremente sobre as despesas. No caso em apreço, tendo em conta as considerações que levaram o Tribunal Geral a declarar o não conhecimento do mérito parcial, será feita uma justa apreciação ao decidir que a recorrente suportará igualmente as despesas correspondentes.

135    Em aplicação do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. Por conseguinte, a Comissão suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção)

decide:

1)      Não há que decidir do pedido de anulação da Decisão A (2019) 8551 C (D 300153) do Parlamento Europeu, de 15 de janeiro de 2021, na parte em que recusou o acesso ao Relatório Final de Auditoria da Comissão, de 29 de novembro de 2019, com a referência ARES (2019) 7370050, relativo a uma auditoria sobre o funcionamento dos sistemas de gestão e de controlo em vigor na República Checa para evitar os conflitos de interesses.

2)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

3)      A Agrofert a.s. é condenada a suportar as suas próprias despesas, bem como as despesas efetuadas pelo Parlamento.

4)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 28 de setembro de 2022.

Assinaturas


*      Língua do processo: checo.