Language of document : ECLI:EU:T:2005:456

Processo T‑210/01

General Electric Company

contra

Comissão das Comunidades Europeias

«Recurso de anulação – Concorrência – Decisão da Comissão que declara uma concentração incompatível com o mercado comum – Regulamento (CEE) n.° 4064/89 – Mercados aeronáuticos – Aquisição da Honeywell pela General Electric – Integração vertical – Vendas de produtos por pacotes – Efeitos de exclusão – Sobreposições horizontais – Direitos de defesa»

Sumário do acórdão

1.      Recurso de anulação – Objecto – Decisões em matéria de controlo de concentrações – Decisão que se baseia em vários pilares de raciocínio, sendo cada um deles suficiente para fundamentar a sua parte decisória – Critérios de incompatibilidade com o mercado comum preenchidos relativamente a, pelo menos, um dos mercados em causa – Não provimento do recurso

[Artigo 230.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 2.°, n.os 1, alínea a), e 3.°]

2.      Concorrência – Concentrações – Exame pela Comissão – Apreciações de ordem económica – Poder discricionário de apreciação – Fiscalização jurisdicional – Alcance – Limites

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 2.°)

3.      Concorrência – Concentrações – Apreciação da compatibilidade com o mercado comum – Inexistência de presunção

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho)

4.      Concorrência – Concentrações – Apreciação da compatibilidade com o mercado comum – Análise prospectiva das potenciais evoluções no mercado em causa – Necessidade de uma análise rigorosa – Fiscalização jurisdicional – Alcance

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 2.°, n.os 2 e 3)

5.      Concorrência – Concentrações – Apreciação da compatibilidade com o mercado comum – Concentração de tipo conglomerado – Conceito – Tomada em consideração da probabilidade de criação ou de reforço de uma posição dominante, no mercado de referência, de uma das empresas partes na operação – Admissibilidade – Possibilidade de a Comissão se basear no comportamento previsível da entidade resultante da concentração – Condições – Apresentação de uma análise rigorosa baseada em provas sólidas

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 2.°, n.os 2 e 3)

6.      Concorrência – Concentrações – Apreciação da compatibilidade com o mercado comum – Concentração de tipo conglomerado – Tomada em consideração de comportamentos anticoncorrenciais previsíveis – Admissibilidade – Não obrigação de a Comissão apreciar a sua verosimilhança à luz dos riscos inerentes à sua adopção por uma empresa

(Artigo 82.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 2.°, n.os 2 e 3)

7.      Concorrência – Concentrações – Apreciação da compatibilidade com o mercado comum – Critérios – Criação ou reforço de uma posição dominante que cria um entrave significativo da concorrência efectiva no mercado comum – Carácter cumulativo – Interacção – Obrigação de associar formalmente considerações emitidas a propósito do primeiro critério, mas igualmente pertinentes à luz do segundo critério, a este último – Inexistência

(Artigos 82.° CE e 253.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 2.°, n.os 2 e 3)

8.      Concorrência – Posição dominante – Conceito

(Artigo 82.° CE)

9.      Concorrência – Posição dominante – Caracterização através da detenção de uma quota de mercado extremamente importante – Apreciação do reforço das quotas de mercado num mercado sujeito a concursos, caracterizado pela adjudicação de um número limitado de contratos de valor elevado

(Artigo 82.° CE)

10.    Concorrência – Posição dominante – Existência – Incidência de uma concorrência viva no mercado em causa – Inexistência em presença de uma empresa que pode adoptar um comportamento sem ter de a tomar em consideração – Concessões financeiras admitidas para ganhar determinados concursos relativos a produtos de valor elevado – Não incidência

(Artigo 82.° CE)

11.    Concorrência – Normas comunitárias – Aplicação pela Comissão – Autonomia relativamente às apreciações efectuadas pelas autoridades de Estados terceiros

12.    Concorrência – Concentrações – Apreciação da compatibilidade com o mercado comum – Efeitos anticoncorrenciais resultantes de uma relação vertical directa – Efeitos dependentes do comportamento futuro da entidade resultante da fusão – Obrigação de a Comissão se basear em provas sólidas quanto à probabilidade do comportamento anticoncorrencial alegado – Liberdade da prova

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho)

13.    Concorrência – Posição dominante para a venda de componentes essenciais – Recusa de venda – Abuso

(Artigo 82.° CE)

14.    Concorrência – Concentrações – Exame pela Comissão – Demonstração da existência de um comportamento, num futuro próximo, que cria ou reforça uma posição dominante – Obrigação de se basear em provas sólidas

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho)

15.    Processo – Dedução de fundamentos novos no decurso da instância – Fundamento novo – Conceito – Resposta a uma questão colocada pelo Tribunal como medida de organização do processo – Exclusão

(Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigos 48.° e 64.°, n.° 3)

16.    Actos das instituições – Fundamentação – Dever – Decisão diferente da que foi acolhida num processo anterior relativa a situações similares ou idênticas ou com os mesmos actores económicos – Alcance

(Artigo 253.° CE)

17.    Concorrência – Normas comunitárias – Execução – Regras adoptadas para esse efeito pela Comissão – Obrigação de esta lhes dar cumprimento – Comunicação relativa à definição do mercado – Alcance

(Artigo 82.° CE; Comunicação 97/C 372/03)

18.    Concorrência – Concentrações – Exame pela Comissão – Definição do mercado em causa – Critérios – Substituibilidade dos produtos – Conceito

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho; Comunicação da Comissão 97/C 372/03, n.° 36)

19.    Concorrência – Concentrações – Apreciação da compatibilidade com o mercado comum – Mercado caracterizado por uma concorrência indirecta e relativamente reduzida – Aquisição, por uma empresa em posição dominante, do seu único concorrente – Admissibilidade – Condições – Demonstração da inexistência de qualquer concorrência efectiva no mercado antes da operação

(Artigo 82.° CE; Regulamento n.° 4064/89 do Conselho)

20.    Concorrência – Concentrações – Exame pela Comissão – Compromissos das empresas em causa de natureza a tornar a operação notificada compatível com o mercado comum

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho)

21.    Processo – Petição inicial – Requisitos de forma – Identificação do objecto do litígio – Exposição sumária dos fundamentos invocados

(Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 44.°, n.° 1)

22.    Concorrência – Concentrações – Processo administrativo – Acesso ao processo – Respeito dos direitos de defesa – Limites

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho)

23.    Concorrência – Processo administrativo – Acesso ao processo – Distinção segundo os elementos de acusação e de defesa

24.    Concorrência – Processo administrativo – Acesso ao processo – Respeito dos direitos de defesa – Limites

25.    Concorrência – Concentrações – Processo administrativo – Acesso ao processo – Recusa do direito de acesso entre a decisão de instauração do processo e a comunicação de acusações – Violação dos direitos de defesa – Inexistência

[Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 6.°, n.° 1, alínea c)]

26.    Concorrência – Concentrações – Processo administrativo – Acesso ao processo – Direito de acesso parcelar das partes na concentração, ao longo de todo o processo – Inexistência

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho, artigo 18.°, n.° 1)

27.    Concorrência – Concentrações – Processo administrativo – Brevidade dos prazos intermédios de processo – Tomada em consideração do imperativo de celeridade para apreciar o respeito dos direitos de defesa

(Regulamento n.° 4064/89 do Conselho; Regulamento n.° 447/98 da Comissão, artigos 13.° e 21.°)

28.    Concorrência – Processo administrativo – Intervenção do auditor – Decisão que modifica o seu estatuto durante o processo – Substituição directa da antiga função pela nova

(Decisão 2001/462 da Comissão, artigo 2.°, n.os 1 e 2)

29.    Direito comunitário – Princípios – Direitos fundamentais – Respeito assegurado pelo Tribunal de Justiça – Tomada em consideração da Convenção Europeia dos Direitos do Homem

(Artigo 6.°, n.° 2, UE)

1.      Na medida em que determinados fundamentos de uma decisão podem, por si só, ser juridicamente suficientes para justificar essa decisão, os vícios de que possam estar feridos outros fundamentos do acto não têm, de qualquer modo, influência na sua parte decisória.

Além disso, quando a parte decisória de uma decisão da Comissão se baseia em vários pilares de raciocínio, sendo cada um deles, por si só, suficiente para fundamentar essa parte decisória, esse acto só pode ser anulado, em princípio, se cada um desse pilares estiver ferido de ilegalidade. Nesse caso, um erro ou outra ilegalidade que afecte apenas um dos pilares do raciocínio não basta para justificar a anulação da decisão controvertida quando este erro não pôde ter uma influência determinante na parte decisória adoptada pela instituição autora dessa decisão.

Esta regra aplica‑se no contexto das decisões em matéria de controlo de concentrações. A este respeito, a Comissão deve proibir uma concentração que preencha os critérios do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 4064/89. Ora, resulta do artigo 2.°, n.° 1, alínea a), do referido regulamento que a Comissão deve ter em conta, no âmbito da apreciação de uma operação de concentração, designadamente, a necessidade de preservar e desenvolver uma concorrência efectiva no mercado comum, atendendo, nomeadamente, à estrutura de todos os mercados em causa. Assim, a apreciação, pela Comissão, da questão de saber se uma operação cria ou reforça uma ou várias posições dominantes de que resultem entraves significativos de uma concorrência efectiva deve ser efectuada por referência às condições existentes em cada um dos mercados susceptíveis de ser afectados pela operação de concentração notificada. Assim, se verificar que os referidos critérios estão preenchidos em relação unicamente a um dos mercados em causa, a concentração deve ser declarada incompatível com o mercado comum.

Daqui decorre que uma decisão dessa natureza só pode ser anulada se se concluir não apenas que alguns dos seus fundamentos estão feridos de ilegalidade, mas, além disso, que os eventuais fundamentos não feridos de ilegalidade não são suficientes para justificar a incompatibilidade da operação notificada com o mercado comum. No entanto, essa conclusão não afasta a necessidade de examinar se determinados aspectos concorrenciais identificados pela decisão impugnada se reforçam mutuamente, pelo que é artificial apreciar cada um deles de modo isolado.

(cf. n.os 42‑45, 48, 734)

2.      A Comissão dispõe de uma margem de apreciação em matéria económica para efeitos de aplicação das regras materiais do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, em especial do seu artigo 2.° Daqui resulta que a fiscalização pelo juiz comunitário está limitada à verificação da exactidão material dos factos e à inexistência de erro manifesto de apreciação.

Quanto à natureza dessa fiscalização, existe uma distinção essencial entre, por um lado, os dados e as constatações de facto, cuja eventual inexactidão pode ser referida pelo juiz à luz dos argumentos e elementos de prova que lhe são apresentados e, por outro, as apreciações de ordem económica.

Embora deva ser reconhecida à Comissão uma margem de apreciação para efeitos da aplicação das regras materiais do Regulamento n.° 4064/89, isso não implica que o juiz comunitário não deva fiscalizar a qualificação jurídica que a Comissão faz de dados de natureza económica. Com efeito, o juiz comunitário deve, designadamente, não só verificar a exactidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também fiscalizar se esses elementos constituem todos os dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são susceptíveis de fundamentar as conclusões que deles se extraem.

(cf. n.os 60, 62, 63, 253)

3.      O Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, não estabelece nenhuma presunção quanto à compatibilidade com o mercado comum de uma operação de concentração notificada, pelo que não se pode considerar que, quando tenha dúvidas, a Comissão deva tendencialmente ser favorável à aprovação de uma operação que é da sua competência. Em cada caso, compete à Comissão formar uma opinião clara sobre a referida compatibilidade e decidir em conformidade.

(cf. n.° 61)

4.      Tendo em conta a margem de apreciação de que dispõe a Comissão, em matéria económica, para efeitos de aplicação das regras materiais do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, uma fiscalização jurisdicional efectiva ainda é mais necessária quando a Comissão efectua uma análise prospectiva das evoluções num mercado que poderiam resultar da concentração projectada.

Essa análise prospectiva necessita de ser efectuada com grande atenção, uma vez que não se trata de examinar acontecimentos do passado, a respeito dos quais se dispõe frequentemente de numerosos elementos que permitem compreender as suas causas, nem mesmo acontecimentos presentes, mas sim de prever os acontecimentos que se produzirão no futuro, segundo uma probabilidade mais ou menos forte, se não for adoptada nenhuma decisão que proíba ou que precise as condições da concentração projectada. A análise prospectiva que consiste em examinar de que modo uma operação de concentração pode alterar os factores que determinam o estado da concorrência num dado mercado, a fim de verificar se daí resulta um entrave significativo de uma concorrência efectiva exige que se imaginem os diversos encadeamentos de causa e efeito, a fim de ter em conta aqueles cuja probabilidade é maior.

(cf. n.° 64)

5.      As concentrações de tipo conglomerado são as que não implicam sobreposições horizontais entre as actividades das partes na concentração nem relações verticais entre essas partes em sentido estrito. Mesmo que, de modo geral, tais concentrações não produzam efeitos anticoncorrenciais, em determinados casos, podem, contudo, produzir esses efeitos. No âmbito de uma análise prospectiva dos efeitos de uma operação de concentração de tipo conglomerado, se a Comissão puder concluir, devido aos efeitos de conglomerado, que uma posição dominante seria, com toda a probabilidade, criada ou reforçada num futuro relativamente próximo e teria como consequência criar, de modo significativo, entraves à concorrência efectiva no mercado em causa, deve proibir esta concentração.

A este respeito, as operações de concentração de tipo conglomerado criam determinados problemas específicos, designadamente na medida em que, por um lado, a análise dessa operação pode implicar uma análise prospectiva que tenha em consideração um lapso de tempo que se prolonga no futuro e, por outro, um dado comportamento da parte da entidade resultante da fusão pode determinar, em grande medida, os efeitos desta concentração. Por conseguinte, os encadeamentos de causa e efeito subsequentes a essa concentração podem ser dificilmente reconhecíveis, incertos e difíceis de demonstrar. Neste contexto, a qualidade dos elementos de prova apresentados pela Comissão para fundamentar uma decisão que declara uma operação de concentração incompatível com o mercado comum é especialmente importante, devendo esses elementos corroborar as apreciações da Comissão segundo as quais, caso essa decisão não fosse tomada, o cenário de evolução económica em que essa instituição se baseia seria plausível.

(cf. n.os 65, 66)

6.      Aquando da análise, pela Comissão, dos efeitos de uma operação de concentração de tipo conglomerado, a probabilidade da adopção de determinados comportamentos futuros deve ser examinada de forma completa, ou seja, tomando em consideração não apenas os incentivos à adopção de tais comportamentos como os factores susceptíveis de diminuir, ou até de eliminar, tais incentivos, incluindo o carácter eventualmente ilegal destes comportamentos.

No entanto, seria contrário ao objectivo de prevenção do Regulamento n.° 4064/89 exigir que a Comissão examinasse, em relação a cada projecto de concentração, em que medida os incentivos à adopção de comportamentos anticoncorrenciais seriam reduzidos, ou mesmo eliminados, em razão da ilegalidade dos comportamentos em questão, da probabilidade de serem detectados e de serem reprimidos pelas autoridades competentes, tanto a nível comunitário como nacional, e das sanções que daí poderiam resultar. Daí decorre que a Comissão deve, em princípio, tomar em consideração o carácter eventualmente ilegal, e, portanto, susceptível de ser sancionado, de um comportamento enquanto factor susceptível de diminuir, ou até de eliminar, os incentivos a que uma empresa adopte um dado comportamento. Em contrapartida, esta última apreciação não exige um exame exaustivo e detalhado das legislações das várias ordens jurídicas que podem ser aplicadas e da política repressiva por estas praticada, dado que uma análise destinada a demonstrar a existência provável de uma infracção e a assegurar que esta será objecto de sanção em várias ordens jurídicas seria demasiado especulativa.

Assim, na medida em que a Comissão possa, sem realizar um inquérito específico e detalhado a este respeito, identificar o carácter ilegal do comportamento em causa, à luz do artigo 82.° CE ou de outras disposições do direito comunitário cuja aplicação seja da sua competência, incumbe à Comissão declará‑lo e tê‑lo em conta para efeitos da sua apreciação da probabilidade de a entidade resultante da fusão adoptar esse comportamento.

A este respeito, embora a Comissão se possa basear numa análise sumária da legalidade dos comportamentos em causa e do grau de probabilidade de que eles serão reprimidos, em função dos elementos de que dispõe no momento de adoptar a sua decisão em matéria de controlo de concentrações, cabe‑lhe, no entanto, no âmbito da sua apreciação, identificar os comportamentos que prevê e, sendo caso disso, avaliar e tomar em consideração o efeito dissuasivo que poderia ter o seu eventual carácter clara ou muito provavelmente ilícito à luz do direito comunitário.

(cf. n.os 70‑75, 303, 304, 424, 425, 468)

7.      O artigo 2.°, n.os 2 e 3, do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, impõe dois critérios cumulativos relativos, o primeiro, à criação ou ao reforço de uma posição dominante, e o segundo, ao facto de esta ter como consequência o entrave significativo da concorrência no mercado comum. Consequentemente, uma operação de concentração só pode ser proibida se os dois critérios previstos no artigo 2.°, n.° 3, estiverem reunidos.

Pode constituir um abuso de posição dominante o facto de uma empresa que esteja em posição dominante reforçar essa posição de tal forma que o grau de domínio assim alcançado impeça substancialmente a concorrência, isto é, que só permaneçam no mercado empresas cujo comportamento esteja dependente da empresa dominante. Resulta desta jurisprudência que o reforço de uma posição dominante pode, em si mesmo, criar, de modo substancial, um entrave à concorrência a ponto de constituir, por si só, um abuso desta posição.

Por conseguinte, a fortiori, o reforço ou a criação de uma posição dominante, na acepção do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 4064/89, pode corresponder, em determinados casos, à demonstração de um entrave significativo de uma concorrência efectiva. Esta constatação não significa, de modo nenhum, que o segundo critério imposto pelo artigo 2.° do Regulamento n.° 4064/89 se confunda juridicamente com o primeiro, mas apenas que pode resultar de uma mesma análise factual de um dado mercado que os dois critérios estão preenchidos.

As circunstâncias susceptíveis de serem invocadas pela Comissão para demonstrar o grau de falta de liberdade de acção dos concorrentes de uma empresa, necessário para se concluir que foi criada ou reforçada uma posição dominante, são frequentemente as mesmas que são pertinentes para apreciar se desta criação ou deste reforço resulta um entrave significativo da concorrência efectiva no mercado comum. Com efeito, uma circunstância que afecta significativamente a liberdade de os concorrentes determinarem a sua política comercial de modo autónomo pode igualmente criar um entrave a uma concorrência efectiva.

Daí resulta que, na medida em que dos considerandos de uma decisão que declara uma operação de concentração notificada incompatível com o mercado comum, mesmo daqueles que são formalmente dedicados a uma análise da criação ou do reforço de uma posição dominante, decorra que esta operação produzirá efeitos anticoncorrenciais significativos, não há que considerar a mesma decisão ferida de ilegalidade pelo simples facto de a Comissão não ter associado explícita e especificamente a sua descrição destes elementos ao segundo critério do artigo 2.° do Regulamento n.° 4064/89, seja à luz do dever de fundamentação, previsto no artigo 253.° CE, seja quanto ao mérito. Com efeito, a abordagem inversa consistiria em impor à Comissão uma obrigação puramente formal de invocar duas vezes algumas destas considerações, primeiro na sua análise da criação ou do reforço de uma posição dominante num dado mercado, e uma segunda vez em relação ao entrave significativo da concorrência no mercado comum.

(cf. n.os 84, 86‑89)

8.      Uma posição dominante é demonstrada pelo facto de a empresa em causa se encontrar numa situação de poder económico que lhe permite obstar à manutenção de uma concorrência efectiva no mercado em causa, dando‑lhe a possibilidade, numa medida considerável, de comportamentos independentes em relação aos seus concorrentes, aos seus clientes e, finalmente, aos consumidores. A este respeito, a Comissão não necessita de demonstrar que os concorrentes de uma empresa serão excluídos do mercado, mesmo a prazo, para provar a existência de uma posição dominante.

(cf. n.os 85, 114, 243)

9.      Embora o significado das quotas de mercado possa diferir de um mercado para outro, quotas de mercado extremamente importantes constituem por si só, e salvo circunstâncias excepcionais, a prova da existência de uma posição dominante. Tal pode ser o caso de uma quota de mercado de 50%.

Tratando‑se, porém, de um mercado caracterizado pela adjudicação de um número limitado de contratos de valor elevado, a circunstância de uma determinada empresa ter ganho os últimos concursos não implica necessariamente que um dos seus concorrentes não possa ganhar o seguinte. Na condição de ter um produto competitivo e de outros factores não jogarem a favor da primeira empresa de forma preponderante, um concorrente pode sempre obter um contrato importante e aumentar de forma considerável, de uma só vez, as suas quotas de mercado.

Contudo, esta constatação não justifica a conclusão de que as quotas de mercado não têm praticamente qualquer valor para efeitos de apreciação do poder dos diferentes fabricantes num mercado desta natureza, sobretudo na medida em que essas quotas se mantenham relativamente estáveis ou revelem uma tendência de reforço da posição de uma empresa. Mesmo num mercado sujeito a concursos, o facto de um fabricante manter, ou até reforçar, as suas quotas de mercado durante um período de vários anos consecutivos constitui um indício de poder no mercado. Com efeito, há obrigatoriamente um momento em que a diferença entre a quota de mercado de um fabricante e a dos seus concorrentes deixa de poder ser atribuída ao número limitado de concursos que compõem a procura no mercado.

(cf. n.os 115, 149‑151, 540, 571)

10.    O facto de uma empresa ser obrigada a baixar os seus preços, sob a pressão de reduções da iniciativa dos seus concorrentes é, regra geral, incompatível com a independência de comportamento característica de uma posição dominante.

Contudo, o facto de existir concorrência, mesmo forte, num determinado mercado, não exclui a existência de uma posição dominante nesse mesmo mercado, uma vez que esta posição se caracteriza fundamentalmente pela capacidade de adoptar um comportamento sem ter de tomar em consideração essa concorrência, na sua estratégia de mercado, e sem, com isso, sofrer os efeitos prejudiciais devidos a essa atitude. Assim, a eventual existência de concorrência no mercado é certamente uma circunstância pertinente, designadamente para efeitos de apreciação da existência de uma posição dominante, mas não constitui, em si mesma, uma circunstância determinante a este respeito.

Assim, num mercado que diz respeito a produtos vendidos no âmbito de concursos realizados periodicamente, tendo cada um deles por objecto vendas de valor elevado, e caracterizados por negociações prolongadas, haverá necessariamente concessões financeiras, sob uma ou outra forma, por parte dos proponentes, na medida em que estes fenómenos são parte integrante desse processo de negociação. Neste contexto, o simples facto de uma empresa ter proposto descontos para ganhar determinados concursos não é, em si mesmo, incompatível com o facto de esta deter uma posição dominante.

(cf. n.os 116, 117, 184, 215, 249)

11.    O facto de, no âmbito dos seus próprios processos, as autoridades competentes de um ou vários Estados terceiros apreciarem uma questão de determinada forma não basta, em si mesmo, para infirmar a apreciação divergente eventualmente efectuada pelas autoridades comunitárias competentes. Os elementos e argumentos apresentados no âmbito do procedimento administrativo a nível comunitário, assim como as regras jurídicas aplicáveis, não são necessariamente os que foram tidos em conta pelas autoridades dos Estados terceiros em questão e as apreciações de uma e da outra parte podem, portanto, divergir. Se uma parte considerar que o raciocínio que justifica a conclusão das autoridades de um Estado terceiro é especialmente pertinente e transponível para um processo comunitário, pode sempre invocá‑lo como argumento de mérito, mas a força probatória desse raciocínio não pode ser determinante.

(cf. n.° 179)

12.    Os efeitos anticoncorrenciais de uma concentração que resulta de uma relação vertical directa entre fornecedor e cliente dependem dos comportamentos futuros da entidade resultante da fusão, sem os quais este aspecto da fusão não teria nenhuma consequência nefasta. Assim, cabe à Comissão apresentar provas sólidas quanto à probabilidade destes comportamentos.

Em determinados casos, estas provas poderão ser constituídas por estudos económicos que demonstrem a evolução provável da situação no mercado e indiquem a existência de um incentivo para a entidade resultante da fusão se comportar de determinada maneira.

Contudo, dado que o princípio que prevalece em direito comunitário é o da liberdade da prova, a falta deste tipo de provas não é, em si mesma, determinante. Em especial, numa situação em que é manifesto que o interesse comercial de uma empresa pesa de forma preponderante a favor de um determinado comportamento, como a utilização da possibilidade de perturbar a empresa de um concorrente, a Comissão não comete um erro manifesto de apreciação ao considerar que a adopção real do comportamento previsto pela entidade resultante da fusão constitui uma probabilidade. Neste caso, as simples realidades económicas e comerciais do caso em análise podem constituir as provas sólidas exigidas pela jurisprudência.

(cf. n.os 295‑297, 433)

13.    Embora uma posição dominante não possa privar uma empresa do direito de preservar os seus próprios interesses comerciais, certos comportamentos são abusivos quando têm precisamente por objecto reforçar essa posição dominante e abusar dela. Por conseguinte, a recusa de venda de um componente essencial aos seus concorrentes, por parte de uma empresa em posição dominante, é constitutiva, em si mesma, de um abuso desta posição.

(cf. n.° 306)

14.    Ao analisar os efeitos de uma operação de concentração, cabe à Comissão demonstrar, quanto à evolução futura do mercado, com base em provas sólidas e com um grau de probabilidade suficiente, não só que um eventual comportamento que ela prevê terá lugar num futuro relativamente próximo, mas que, além disso, este comportamento levará à criação ou ao reforço de uma posição dominante num futuro relativamente próximo. Não basta que a Comissão apresente uma série de etapas lógicas, mas hipotéticas, cuja realização prática receia tenha consequências nefastas para a concorrência numa série de mercados diferentes. Pelo contrário, incumbe‑lhe analisar especificamente a evolução provável de cada mercado no qual pretende demonstrar a criação ou o reforço de uma posição dominante devido à operação notificada, apoiando‑se em provas sólidas.

(cf. n.os 327, 429, 433, 464)

15.    A tomada em consideração, pelo Tribunal de Primeira Instância, das respostas dadas por uma parte às questões colocadas enquanto medidas de organização do processo baseadas no artigo 64.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, tendo a outra parte tido a possibilidade, sendo caso disso, de tomar posição sobre estes elementos na audiência, não viola o artigo 48.° do referido regulamento.

(cf. n.° 505)

16.    Contrariamente ao que é válido quando uma decisão se insere na linha de uma prática decisória constante, do facto de a Comissão não se poder contentar em apresentar uma fundamentação sumária, devendo antes fornecer uma fundamentação explícita, sempre que alarga o âmbito de uma prática, não se pode inferir que a Comissão deva, para além do facto de fundamentar a sua decisão por referência aos autos do processo objecto da decisão, expor especificamente as razões pelas quais chegou a uma conclusão diferente da que foi acolhida num processo anterior relativo a situações similares ou idênticas ou com os mesmos operadores económicos.

(cf. n.° 513)

17.    A Comissão não se pode afastar das regras que se impõe a si própria. Assim, na medida em que a comunicação relativa à definição do mercado em causa, para efeitos do direito comunitário da concorrência, indica, por meio de formulações imperativas, o método através do qual a Comissão decidiu definir os mercados no futuro e não reserva nenhuma margem de apreciação, a Comissão deve, efectivamente, tomar em consideração os termos desta comunicação.

Quando se exprime numa comunicação em termos que lhe deixam a possibilidade de, entre os tipos de elementos ou de abordagens que podem teoricamente ser pertinentes, escolher os mais adequados nas circunstâncias de um determinado caso, a Comissão conserva uma grande liberdade de acção.

A este respeito, a Comissão não se comprometeu, na comunicação relativa à definição do mercado, a utilizar um método preciso e especial para efeitos de apreciação da substituibilidade ao nível da procura. Ao invés, observou que a abordagem que adoptar deverá variar em função das circunstâncias de cada caso individual e reservou‑se uma parte importante da sua margem de apreciação a fim de poder tratar cada caso concreto de uma maneira adaptada.

(cf. n.os 516, 519)

18.    No que respeita ao exame, pela Comissão, da compatibilidade de uma operação de concentração com o mercado comum, na medida em que o n.° 36 da comunicação relativa à definição do mercado relevante para efeitos do direito comunitário da concorrência precisa que «[a] intersubstituibilidade funcional ou a semelhança das suas características podem não constituir, em si, critérios suficientes, uma vez que a reacção dos clientes às oscilações dos preços relativos pode ser igualmente determinada por outras considerações», decorre desta citação, a contrario, que, em determinados casos, ou até regra geral, salvo circunstâncias especiais que indiquem o contrário, produtos funcionalmente permutáveis entre si e que apresentam características similares são substituíveis.

(cf. n.° 524)

19.    Em matéria de aplicação do artigo 82.° CE, a conclusão de que uma empresa está em posição dominante não constitui, em si mesma, nenhuma censura a essa empresa, mas significa apenas que incumbe a esta última, independentemente das causas dessa posição, a responsabilidade especial de não atentar, através do seu comportamento, contra uma concorrência efectiva e não falseada no mercado comum. Além disso, o conceito de exploração abusiva, na acepção do artigo 82.° CE, é um conceito objectivo que abrange os comportamentos de uma empresa em posição dominante susceptíveis de influenciar a estrutura de um mercado no qual, precisamente devido à presença da empresa em questão, o grau de concorrência já está enfraquecido e que têm por efeito impedir, através de meios diferentes daqueles que regem uma competição normal de produtos ou serviços com base em prestações dos operadores económicos, a manutenção do grau de concorrência ainda existente no mercado ou o desenvolvimento desta concorrência.

Numa situação em que a única concorrência imediata num dado mercado é indirecta e já relativamente reduzida, o facto de uma empresa adquirir o único concorrente que ainda realiza vendas nesse mercado é particularmente nefasto. Há que aplicar, por analogia, os princípios acima mencionados, elaborados no contexto da proibição dos abusos de posição dominante, ao quadro jurídico próximo do controlo das concentrações, considerando que quanto mais importante for o domínio de uma empresa maior é a sua responsabilidade especial de se abster de qualquer acção susceptível de enfraquecer ainda mais ou, por maioria de razão, de eliminar a concorrência ainda existente no mercado.

Daí que, nestas circunstâncias, cabe às partes na concentração apresentar provas que demonstrem a inexistência de qualquer concorrência efectiva no mercado antes da operação.

(cf. n.os 549‑551)

20.    No âmbito do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, a Comissão apenas está habilitada a aceitar compromissos susceptíveis de tornarem a operação notificada compatível com o mercado comum. Há que considerar, a este respeito, que compromissos estruturais propostos pelas partes só preenchem este critério na medida em que a Comissão possa concluir, com segurança, que a sua execução será possível e que as novas estruturas comerciais resultantes serão suficientemente viáveis e duradouras para que a criação ou o reforço de uma posição dominante, ou os entraves de uma concorrência efectiva, que os compromissos têm por finalidade impedir, não poderão produzir‑se num futuro relativamente próximo.

(cf. n.os 555, 612)

21.    A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que uma acção seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que assenta resultem, pelo menos sumariamente, mas de uma maneira coerente e compreensível, do texto da própria petição. A este respeito, embora o corpo da petição possa ser baseado e completado, em pontos específicos, por remissões para passagens de documentos a ela juntos, uma remissão global para outros escritos, ainda que anexos à petição, não pode suprir a inexistência dos elementos essenciais da argumentação jurídica, que devem constar da própria petição.

(cf. n.° 592)

22.    O procedimento de acesso ao processo tem como objecto permitir aos destinatários de uma comunicação de acusações tomar conhecimento das provas que constam do dossier da Comissão, a fim de poderem pronunciar‑se utilmente sobre as conclusões a que a Comissão chegou com base nesses elementos. O direito de acesso ao processo justifica‑se pela necessidade de garantir às empresas em causa a possibilidade de se defenderem utilmente das acusações contra elas formuladas na referida comunicação.

Contudo, o acesso a determinados documentos pode ser recusado, o que sucede nomeadamente com os documentos, ou partes destes, que contenham segredos comerciais de outras empresas, os documentos internos da Comissão, as informações que permitem identificar os denunciantes que não queiram ver a sua identidade revelada, assim como as informações comunicadas à Comissão na condição de respeitar o seu carácter confidencial.

Embora as empresas tenham direito à protecção dos seus segredos de negócios, este direito deve ser, no entanto, ponderado juntamente com a garantia dos direitos de defesa. Assim, a Comissão pode ter de conciliar interesses opostos através da preparação de versões não confidenciais de documentos que contêm segredos de negócios ou outros dados sensíveis. Os mesmos princípios são aplicáveis ao acesso aos dossiers nos processos de concentração examinados no âmbito do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, mesmo que a aplicação destes princípios possa razoavelmente ser condicionada pelo imperativo de celeridade que caracteriza a economia geral do referido regulamento. Não há que aplicar um nível de protecção diferente ou mais extensivo dos direitos de defesa em matéria de controlo das concentrações do que em matéria de infracções.

(cf. n.os 629‑631)

23.    Num procedimento administrativo em matéria de concorrência, deve distinguir‑se entre os elementos exclusivamente de acusação e os documentos de defesa, ou que contêm elementos de defesa, no que respeita ao acesso ao dossier. Os elementos de acusação só são pertinentes na medida em que a Comissão neles se baseie, caso em que a sua comunicação é essencial; mas se não tiverem sido considerados, a sua não comunicação não tem qualquer repercussão na licitude do processo. Em contrapartida, se se verificar que, na fase do procedimento administrativo, uma empresa não teve acesso a um documento de defesa, ou seja, a um elemento que poderia ter sido útil para a sua defesa e que poderia, por conseguinte, ter conduzido o procedimento administrativo a um resultado diferente se a referida empresa o tivesse podido invocar, o raciocínio na decisão afectado por este documento deve, em princípio, ser considerado ferido de um vício.

(cf. n.° 649)

24.    Um pedido de tratamento confidencial pode justificar a recusa de acesso a documentos provenientes de terceiros, tais como denúncias, num processo em matéria de concorrência. Com efeito, uma empresa em posição dominante no mercado é susceptível de adoptar medidas de retaliação contra concorrentes, fornecedores ou clientes que tenham colaborado na instrução levada a cabo pela Comissão e, nessas condições, as empresas terceiras que transmitem à Comissão, no decurso das investigações por ela realizadas, documentos cuja entrega julgam poder dar origem represálias contra elas, só podem fazê‑lo sabendo que o seu pedido de confidencialidade será tomado em consideração.

(cf. n.° 650)

25.    O direito de ser ouvido nos processos em matéria de concorrência só diz respeito às objecções que a Comissão tem intenção de acolher.

Assim, visto que uma decisão de instauração ao abrigo do artigo 6.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, não tem por finalidade dirigir objecções às partes, mas simplesmente enunciar, de modo provisório, as dúvidas sérias da Comissão que a levam a lançar a segunda fase da investigação, uma empresa não pode afirmar que a falta de acesso ao dossier antes do envio da comunicação das acusações a privou da possibilidade de se defender. Com efeito, o facto de a empresa ter tido a oportunidade de apresentar as suas observações escritas e orais sobre a comunicação de acusações, após ter tido acesso ao dossier administrativo da Comissão, permitiu‑lhe exprimir, em tempo útil, o seu ponto de vista sobre as acusações acolhidas.

(cf. n.os 692, 693)

26.    Embora o artigo 18.°, n.os 1 e 3, do Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, signifique que às partes numa operação de concentração deve ser dada a oportunidade de apresentarem observações desde a instauração do processo, o mesmo não implica que a Comissão deva permitir o acesso ao seu dossier administrativo nesta fase mais prematura. A necessidade que as partes têm de aceder ao dossier administrativo da Comissão a fim de se poderem defender, definitivamente, das acusações suscitadas pela Comissão na sua comunicação de acusações não deve ser interpretada no sentido de que obriga a Comissão a permitir‑lhes o acesso parcelar ao seu dossier ao longo de todo o procedimento, o que representaria um ónus desproporcionado para a instituição.

(cf. n.° 694)

27.    Para que a Comissão possa respeitar o calendário previsto no Regulamento n.° 4064/89, relativo ao controlo das operações de concentração de empresas, é necessário que os prazos intermédios fixados para cada fase do processo sejam igualmente curtos. Esta circunstância torna menos favoráveis, por definição, as condições nas quais devem trabalhar todos os participantes no processo, mas o ganho em termos de celeridade do processo no seu conjunto foi considerado pelo legislador como justificativo destes sacrifícios, designadamente para ter em conta o interesse comercial das partes numa operação notificada em levar a cabo o seu projecto tão rapidamente quanto possível. A este respeito, ao apreciar as alegadas violações dos direitos de defesa, no contexto de um processo nos termos do Regulamento n.° 4064/89, é necessário ter em conta o imperativo de celeridade que caracteriza a economia geral do referido regulamento.

Além disso, nos termos do artigo 21.° do Regulamento n.° 447/98, relativo às notificações, aos prazos e às audições previstos no Regulamento n.° 4064/89, aplicável, designadamente, ao prazo para responder a uma comunicação das acusações fixado nos termos do artigo 13.° do mesmo regulamento, a Comissão tomará em consideração o tempo necessário para a elaboração das declarações e a urgência do caso. Por conseguinte, cabe à Comissão conciliar, na medida do possível, os direitos de defesa das partes notificantes com a necessidade de adoptar rapidamente uma decisão definitiva.

Nestas condições, as partes numa operação notificada só podem invocar a brevidade dos prazos de que dispuseram no âmbito desse processo na medida em que estes prazos não sejam proporcionados à duração do processo no seu conjunto.

(cf. n.os 701‑703)

28.    Embora o estatuto do auditor tenha sido modificado pela entrada em vigor da Decisão n.° 2001/462, relativa às funções do auditor em determinados processos de concorrência, em especial na medida em que, em conformidade com o artigo 2.°, n.° 2, desta decisão, o auditor passa a ficar adstrito, para efeitos administrativos, ao membro da Comissão responsável pela concorrência, e não à Direcção‑Geral da Concorrência, como acontecia anteriormente, resulta claramente desta decisão que a nova função de auditor substitui directamente a antiga função do mesmo nome ao abrigo da Decisão n.° 94/810. Nestas condições, há que considerar que, na falta de uma decisão que pusesse fim ao seu mandato, nos termos do artigo 2.°, n.° 1, da Decisão 2001/462, o anterior auditor permaneceu em funções após a entrada em vigor desta decisão.

Esta interpretação dos textos acima mencionados é reforçada pela necessidade objectiva que existia, quanto à função de auditor, de assegurar uma continuidade funcional em conformidade com o princípio da boa administração. Refira‑se que a Decisão 2001/462 entrou necessariamente em vigor quando já estavam em curso determinadas processos. Se o efeito da entrada em vigor da Decisão 2001/462, conjugado com a falta de nomeação de um novo auditor, fosse que nenhuma pessoa estava habilitada a assegurar esta função, esses processos não poderiam prosseguir, o que teria privado de efeito útil tanto as disposições do Regulamento n.° 4064/89 como as da Decisão 2001/462 no que diz respeito a estes processos. Por conseguinte, o auditor em funções no momento da entrada em vigor da Decisão 2001/462 continuou a poder assegurar esta função até nova ordem, pelo menos para efeitos de concluir os processos que já lhe tinham sido submetidos.

(cf. n.os 719, 720)

29.    Os direitos fundamentais são parte integrante dos princípios gerais de direito cujo respeito é assegurado pelo Tribunal de Justiça. Para este efeito, o Tribunal de Justiça inspira‑se nas tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, bem como nas indicações fornecidas pelos instrumentos internacionais relativos à protecção dos direitos do homem para os quais os Estados‑Membros cooperam ou a que aderiram. A Convenção para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais reveste, a este propósito, um significado particular. Além disso, nos termos do artigo F, n.° 2, UE, «A União respeita os direitos fundamentais tal como os garante a Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950, e tal como resultam das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros, enquanto princípios gerais do direito comunitário».

(cf. n.° 725)