Language of document : ECLI:EU:T:2004:38

Arrêt du Tribunal

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)
10 de Fevereiro de 2004 (1)

«Regulamento (CE) n.º 111/1999 – Auxílio alimentar à Rússia – Regulamento (CE) n.º 1799/1999 – Fornecimento de carne bovina – Regulamento (CE) n.º 1815/1999 – Fornecimento de leite em pó desnatado – Concurso para fornecimento do transporte – Relação contratual – Cláusula compromissória – Responsabilidade contratual – Responsabilidade extracontratual – Admissibilidade»

Nos processos apensos T-215/01, T-220/01 e T-221/01,

Calberson GE, com sede em Paris (França), representada por T. Gallois, advogado,

demandante,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por G. Berscheid, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandada,

que tem por objecto

no processo T-215/01, um pedido que visa a condenação da Comissão no pagamento à demandante dos montantes de 14 290,61 euros e de 57 859,56 dólares dos Estados Unidos (USD), acrescidos de juros legais, como indemnização do prejuízo alegadamente sofrido,

no processo T-220/01, um pedido que visa a condenação da Comissão no pagamento à demandante do montante de 106 901,96 marcos alemães (DEM), acrescidos de juros legais, como indemnização do prejuízo alegadamente sofrido,

no processo T-221/01, um pedido que visa a condenação da Comissão no pagamento à demandante dos montantes de 23 115,49 euros e de 25 761,11 USD, acrescidos de juros legais, como indemnização do prejuízo alegadamente sofrido,

todos apresentados, a título principal, com base no artigo 238.º CE e do artigo 16.º do Regulamento (CE) n.º 111/1999 da Comissão, de 18 de Janeiro de 1999, que estabelece as normas gerais de execução do Regulamento (CE) n.º 2802/98 do Conselho, relativo a um programa de abastecimento de produtos agrícolas à Federação da Rússia e, a título subsidiário, com base no artigo 235.º CE e no artigo 288.º, segundo parágrafo, CE,



O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),



composto por: N. J. Forwood, presidente, J. Pirrung e A. W. H. Meij, juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 8 de Julho de 2003,

profere o presente



Acórdão




Quadro regulamentar

Disposições pertinentes nos processos T‑215/01, T‑220/01 e T‑221/01

1
O Regulamento (CE) n.° 2802/98 do Conselho, de 17 de Dezembro de 1998, relativo a um programa de abastecimento da Federação da Rússia em produtos agrícolas (JO L 349, p. 12), prevê a colocação de produtos agrícolas à disposição da Federação da Rússia.

2
Segundo o artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2802/98, os custos de fornecimento, incluindo o transporte até aos portos ou postos fronteiriços, excluindo o descarregamento, serão determinados por concurso ou, em caso de urgência ou de dificuldades de transporte, por concurso limitado.

3
Nos termos do artigo 4.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2802/98, a Comissão será responsável pela execução das acções nas condições previstas por este regulamento.

4
O artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 111/1999 da Comissão, de 18 de Janeiro de 1999, que estabelece as normas gerais de execução do Regulamento n.° 2802/98 (JO L 14, p. 3), dispõe:

«A determinação das despesas de fornecimento, até aos portos marítimos e postos fronteiriços de tomada a cargo pelo beneficiário fixados no anúncio de concurso, de produtos [...] retirados dos armazéns de intervenção [...] é efectuada mediante concurso.

a)      As despesas podem dizer respeito ao fornecimento dos produtos, à saída do armazém do organismo de intervenção, no cais de carga ou no meio de transporte, até ao local de tomada a cargo no estádio de entrega fixado [...].»

5
Nos termos do artigo 5.°, n.° 1, alínea e), ponto 5, do Regulamento n.° 111/1999, a proposta deve, para ser admissível, conter, nomeadamente, a discriminação precisa da proposta de acordo com as rubricas indicadas no Anexo II deste regulamento. Entre as rubricas referidas no Anexo II, na redacção do Regulamento (CE) n.° 1125/1999 da Comissão, de 28 de Maio de 1999, que altera o Regulamento n.° 111/1999 (JO L 135, p. 41), consta a rubrica «Despesas de manutenção e de carregamento».

6
O artigo 7.°, n.° 1, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 111/1999, na redacção do Regulamento n.° 1125/1999, dispõe:

«A retirada da mercadoria pode ocorrer logo que o organismo de intervenção comprovar que a garantia de fornecimento foi constituída [...].»

7
O artigo 8.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999 tem a seguinte redacção:

«Em caso de dificuldades supervenientes, no decurso da execução do fornecimento, após a tomada a cargo dos produtos pelos adjudicatários, exceptuados os casos de urgência, apenas a Comissão pode dar instruções para facilitar o prosseguimento do fornecimento.»

8
O artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 111/1999 dispõe que a Comissão pode, a pedido do organismo de intervenção em causa, conceder uma tolerância quanto às perdas não identificáveis, para ter em conta dificuldades especiais.

9
O artigo 9.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento n.° 111/1999 dispõe que, se a mercadoria posta à disposição pelo organismo de intervenção não for conforme aos requisitos mínimos prescritos para a compra em intervenção, o organismo de intervenção deve colocar imediatamente à disposição mercadoria que satisfaça os requisitos fixados para o fornecimento. O artigo 9.°, n.° 3, segundo parágrafo, deste regulamento dispõe:

«Os custos suplementares suportados pelos adjudicatários (custos de transporte suplementares, sobreestadias, etc.) são suportados pelo organismo de intervenção.»

10
Segundo o artigo 10.°, n.° 1, do Regulamento n.° 111/1999, na redacção do Regulamento n.° 1125/1999, o pedido de pagamento do fornecimento deve ser apresentado ao organismo de intervenção.

11
O artigo 16.° do Regulamento n.° 111/1999 dispõe:

«O Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias é competente para dirimir quaisquer litígios decorrentes da execução, da não execução ou da interpretação das normas aplicáveis aos fornecimentos efectuados nos termos do presente regulamento.»

Outras disposições pertinentes nos processos T‑215/01 e T‑221/01

12
O artigo 1.° do Regulamento n.° 1815/1999 da Comissão, de 18 de Agosto de 1999, relativo ao fornecimento de leite em pó desnatado à Rússia (JO L 220, p. 13), dispõe:

«É aberto um concurso para a determinação das despesas do fornecimento do transporte, a partir de existências de intervenção de [...] leite em pó desnatado a entregar [na Rússia], a título de um fornecimento referido no n.° 1, alínea a), do artigo 2.° do Regulamento [...] n.° 111/1999.»

13
O artigo 2.° do Regulamento n.° 1815/1999 dispõe:

«O fornecimento compreende:

a)      a tomada a cargo da mercadoria no cais de carga, à partida de armazéns dos organismos de intervenção [pertinentes]; e

b)      o transporte, por meios adequados, até aos locais de destino e até às datas fixadas [...].»

14
O Anexo do Regulamento (CEE) n.° 1643/89 da Comissão, de 12 de Junho de 1989, que define os montantes fixos que servem para o financiamento das operações materiais resultantes da armazenagem pública dos produtos agrícolas (JO L 162, p. 12), dispõe:

«Lista das operações materiais cobertas pelos montantes fixos (forfetários) referidos no artigo 6.° do Regulamento (CEE) n.° 1883/78 do Conselho, de 2 de Agosto de 1987, relativo às regras gerais sobre o financiamento das intervenções pelo Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola, Secção [‘Garantia’(JO L 216, p. 1)]

[…]

Sector dos produtos lácteos: LPD

[…]

III. Desarmazenagem

[…]

c) Movimentos do LPD até aos cais do entreposto e carregamento, com exclusão da estiva, no meio de transporte se se tratar de um camião [...].»

Outras disposições pertinentes no processo T‑220/01

15
O artigo 1.° do Regulamento (CE) n.° 1799/1999 da Comissão, de 16 de Agosto de 1999, relativo ao fornecimento de carne de bovino à Rússia (JO L 217, p. 20), dispõe:

«É aberto um concurso para a determinação das despesas do fornecimento do transporte, a partir de existências de intervenção, de [...] carne de bovino [...] a entregar [na Rússia], a título de um fornecimento referido no n.° 1, alínea a), do artigo 2.° do Regulamento [...] n.° 111/1999.»

16
O artigo 2.° do Regulamento n.° 1799/1999 dispõe:

«O fornecimento compreende:

a)      a tomada a cargo da mercadoria no cais de carga, à partida de armazéns dos organismos de intervenção [pertinentes]; e

b)      o transporte, por meios adequados, até aos locais de destino e até às datas fixadas [...].»


Matéria de facto na origem dos litígios

No processo T‑215/01

17
No âmbito do concurso aberto pelo Regulamento n.° 1815/1999, a demandante apresentou ao organismo de intervenção britânico, a Intervention Board Executive Agency (a seguir «IBEA»), uma proposta para a determinação das despesas de fornecimento do transporte de 3 000 toneladas de leite em pó desnatado, que constituíam o lote n.° 4 descrito nos Anexos I e II do Regulamento n.° 1815/1999, do armazém da sociedade Alpine Cold Storage (a seguir «Alpine») para a Rússia. Nos termos desta proposta, o transporte deste lote incluía o trajecto em camião do armazém da Alpine para um entreposto situado no porto de Grimsby (Reino Unido) e o posterior carregamento deste lote para bordo do navio Freedom III, com vista ao seu transporte marítimo para a Rússia. Na proposta, a demandante tomou em consideração o facto de a Alpine ter declarado, numa cotação de 25 de Agosto de 1999, que podia proceder a dez carregamentos de camiões por dia. A proposta apresentada pela demandante elevava‑se a 79,60 euros por tonelada bruta de mercadoria a transportar. Esta proposta não abrangia as despesas de manutenção e de carregamento, que a demandante considerou não se aplicarem ao caso em apreço.

18
Por decisão de 7 de Setembro de 1999, a Comissão atribuiu, nomeadamente, à demandante, o fornecimento do lote n.° 4.

19
Em 8 de Outubro de 1999, a demandante indicou à Alpine que o carregamento dos camiões deveria começar no dia 13 de Outubro seguinte.

20
Devido a um desacordo entre a demandante e a Alpine, relativo, por um lado, a montantes suplementares por esta exigidos pelo carregamento e pela estiva da mercadoria e, por outro, à constituição de uma caução, também exigida por ela para garantir a restituição das paletes sobre as quais a mercadoria estava colocada, o carregamento não começou em 13 de Outubro de 1999.

21
Informados destas dificuldades, os serviços da Comissão indicaram, num fax de 14 de Outubro de 1999, dirigido à IBEA (a seguir «fax de 14 de Outubro de 1999») que a imposição de despesas suplementares e a exigência de garantias financeiras relativas às paletes eram injustificadas e inoportunas. Por outro lado, os serviços da Comissão indicaram, neste fax, que os armazéns agiam em nome e por conta da Comunidade e pediram à IBEA para intervir junto da Alpine para que esta respeitasse as regras aplicáveis aos armazéns dos organismos de intervenção aquando das operações de desarmazenagem. Além disso, pedia‑se à IBEA que tomasse as medidas necessárias para que o carregamento pudesse começar sem mais atrasos.

22
Por carta de 19 de Outubro de 1999 dirigida à Alpine, de que foi enviada cópia à IBEA e à Comissão, a demandante contestou a cotação de preços emitida pela Alpine, relativa às operações de carregamento dos camiões com fundamento em que, por força do Regulamento n.° 1643/89, os encargos com estas operações incumbiam ao armazém do organismo de intervenção. A demandante mencionou também a chegada iminente do navio Freedom III para bordo do qual a mercadoria devia ser carregada e a aplicação de sobreestadias em caso de imobilização indevida deste navio.

23
As operações de carregamento dos camiões começaram em 22 de Outubro de 1999. O ritmo de carregamento foi inferior ao de dez carregamentos por dia, inicialmente anunciado pela Alpine na sua cotação de 25 de Agosto de 1999.

24
Em 2 de Novembro de 1999, o capitão do navio Freedom III dirigiu ao agente da demandante uma carta de reserva em que, por um lado, declarava que das 3 000 toneladas de leite em pó desnatado esperadas apenas tinham sido carregadas 798 toneladas e, por outro, recordava que, em conformidade com a carta‑partida celebrada entre a demandante e o armador, o período previsto para o carregamento expirava em 3 de Novembro de 1999 e que, após esta data, aplicar‑se‑iam sobreestadias. A demandante enviou cópia desta carta à IBEA e à Comissão em 2 de Novembro de 1999.

25
Foi só em 18 de Novembro de 1999 que a totalidade da mercadoria a transportar foi carregada para bordo do navio. Por conseguinte, a demandante teve que pagar sobreestadias num montante de 23 072,89 dólares dos Estados Unidos (USD) devido a ultrapassagem, no porto de partida, do crédito total de dias de imobilização do navio para as operações de carga e de descarga da mercadoria.

26
O navio chegou ao destino e ficou pronto para a descarga da mercadoria em 25 de Novembro de 1999. A descarga da mercadoria só começou em 11 de Dezembro de 1999, terminando em 17 de Dezembro de 1999. Devido a uma ultrapassagem do crédito de dias de imobilização do navio, a demandante teve que pagar sobreestadias num montante de 54 347,25 USD.

27
Em 4 de Janeiro de 2000, a demandante enviou à IBEA a factura BRU 135 039 relativa ao transporte do lote n.° 4. Esta factura respeitava a um montante total de 318 987,24 euros, dos quais 243 115,51 euros a título de despesas de transporte e 75 871,73 euros a título de sobreestadias.

28
O montante de 75 871,73 euros relativo às sobreestadias resultava da conversão do montante pago pelas sobreestadias incorridas nos portos de partida e de chegada – ou seja, 77 420,14 USD – através da aplicação de uma taxa de conversão USD/euro de 0,98.

29
Na sequência de uma intervenção da Comissão, a IBEA procedeu ao pagamento de um montante de 19 904,51 USD, a título de liquidação fixa e definitiva das sobreestadias referidas pela demandante quanto ao navio Freedom III. A demandante contestou este pagamento parcial.

30
Em 28 de Julho de 2000, a demandante notificou a IBEA para o pagamento do saldo da verba relativa às sobreestadias da factura BRU 135 039, montante esse que avaliava em 57 516 USD, bem como da factura BRU 138 552, no montante de 7 096,37 euros e da factura BRU 138 553, no montante de 343,93 USD, ambas relativas a encargos financeiros incorridos em resultado de atrasos de pagamento de facturas dirigidas à IBEA. Esta notificação não produziu efeitos.

31
Por carta de 16 de Maio de 2001, a demandante notificou a Comissão para intervir no sentido de a IBEA proceder ao pagamento dos montantes devidos. Nos termos desta notificação, a IBEA continuava devedora de 7 194,24 euros, a título de despesas de transporte, de 57 515,63 USD, a título de sobreestadias bem como de 7 096,37 euros e de 343,93 USD, a título de encargos financeiros emergentes de atrasos de pagamento, ou seja, um total de 14 290,61 euros e de 57 859,56 USD. Esta notificação não produziu efeitos.

No processo T‑220/01

32
No concurso aberto pelo Regulamento n.° 1799/1999, a demandante apresentou ao organismo de intervenção alemão, o Bundesanstalt für Landwirtschaft und Ernährung (a seguir «BLE»), duas propostas para determinação das despesas de fornecimento do transporte de carne de bovino. Estas propostas respeitavam à tomada a cargo e ao transporte dos lotes n.° 5 e n.° 7, descritos nos Anexos I e II do Regulamento n.° 1799/1999, a partir de diversos armazéns até ao posto de fronteira de Krasnoïe na Rússia.

33
As propostas incluíam as despesas de manutenção e de carregamento que, segundo a discriminação respectiva, se elevavam a 21,80 euros por tonelada bruta.

34
Por decisão de 23 de Setembro de 1999, a Comissão atribuiu, nomeadamente, à demandante, o fornecimento dos lotes n.° 5 e n.° 7. Uma parte de cada um destes lotes estava depositada nos armazéns da sociedade Nordfrost Kühl u. Lagerhaus (a seguir «Nordfrost»).

35
A Nordfrost procedeu às operações de manutenção e de carregamento da parte dos lotes n.° 5 e n.° 7 depositada nos seus armazéns. A Nordfrost enviava as facturas por estas prestações ao BLE, que as refacturava à demandante. Por fim, a demandante reintegrava esta despesa nas suas facturas globais de transporte enviadas ao BLE a um preço de 21,80 euros/tonelada, em conformidade com as suas propostas para as despesas de manutenção e de carregamento relativas aos lotes n.° 5 e n.° 7. (v. n.° 33, infra).

36
Aquando do carregamento das mercadorias, a Nordfrost exigiu à demandante o pagamento de montantes correspondentes aos custos suplementares relativos a estas operações de carregamento.

37
Informados desta exigência por fax da demandante de 10 de Novembro de 1999, os serviços da Comissão responderam‑lhe, por fax de 15 de Novembro de 1999, que consideravam que todas as despesas de carregamento estavam já incluídas nos montantes que o BLE facturava à demandante pelo carregamento das mercadorias. Neste fax, os serviços da Comissão recomendaram também à demandante que enviasse directamente ao BLE as facturas da Nordfrost relativas às operações de carregamento.

38
Tendo‑se a Nordfrost recusado a proceder ao carregamento das mercadorias em seu poder até receber o pagamento das somas correspondentes aos custos suplementares, a demandante pagou os montantes exigidos. Facturou depois estas despesas ao BLE através das facturas BRU 135 963, num montante de 82 991,96 marcos alemães (DEM) e BRU 135 964, num montante de 16 050 DEM.

39
Por outro lado, a demandante foi objecto de aplicação de multas, num montante de 6 960 DEM, por parte da polícia polaca, por os camiões que transportavam a carne de bovino dos lotes n.° 5 e n.° 7 terem excesso de carga por cada eixo. A demandante refacturou este montante ao BLE na sua factura BRU 135 099.

40
Por carta registada de 13 de Julho de 2000, a demandante notificou o BLE para lhe pagar as facturas BRU 135 963, no montante de 82 991,96 DEM, referentes a despesas de carregamento adicionais, BRU 135 098, no montante de 900 DEM e BRU 135 099, no montante de 6 960 DEM, relativas às multas pagas às autoridades polacas. Esta notificação não produziu efeitos.

41
Por carta registada de 1 de Agosto de 2001, a demandante notificou a Comissão para intervir e lhe pagar as facturas pendentes relativas ao fornecimento dos lotes n.° 5 e n.° 7, num montante total de 106 901,96 DEM. Esta notificação não produziu efeitos.

No processo T‑221/01

42
Em novo concurso aberto pelo Regulamento n.° 1815/1999, a demandante apresentou ao organismo de intervenção irlandês, o Department of Agriculture, Food and Rural Development (a seguir «DAF»), uma proposta para a determinação das despesas de fornecimento do transporte de leite em pó desnatado. Esta proposta respeitava à tomada a cargo e ao transporte do lote n.° 5, descrito nos Anexos I e II do Regulamento n.° 1815/1999, a partir dos armazéns do DAF até ao porto de São Petersburgo (Rússia). Para assegurar o transporte do leite em pó desnatado até à Rússia, a demandante celebrou uma carta‑partida com um armador, relativa ao fretamento do navio Okapi MV.

43
Por decisão de 23 de Setembro de 1999, a Comissão atribuiu, nomeadamente, à demandante, o fornecimento do lote n.° 5.

44
Em 5 de Outubro de 1999, a demandante informou o DAF de que estava previsto um primeiro envio de 3 500 toneladas de mercadoria a partir de 15 de Outubro de 1999, data de chegada do navio Okapi MV ao porto de Greenore (Irlanda).

45
Em 14 de Outubro de 1999, a demandante, tendo constatado que o DAF ainda não tinha emitido os certificados que lhe permitiam levantar a mercadoria nos armazéns de intervenção, informou a Comissão desse facto e emitiu reservas quanto às eventuais sobreestadias associadas à imobilização do navio Okapi MV.

46
Em 21 de Outubro de 1999, o DAF enviou à demandante os certificados que lhe permitiam desarmazenar cerca de 2 500 toneladas de mercadoria e informou‑a de que as 1 000 toneladas de mercadoria em falta deveriam ser levantadas no armazém de Mallow, não previsto pelo Regulamento n.° 1815/1999 e situado a cerca de 300 quilómetros do porto de Greenore. No mesmo dia, a demandante comunicou as suas reservas à Comissão e ao DAF.

47
Em 28 de Outubro de 1999, as 3 500 toneladas de mercadoria foram colocadas à disposição da demandante. No mesmo dia, foi atribuído ao navio Okapi MV um cais, com vista ao carregamento das mercadorias.

48
Devido aos atrasos de carregamento do navio, a demandante teve de pagar sobreestadias. O montante total relativo às sobreestadias elevava‑se a 102 219,44 USD. Deste total, considerou‑se que um montante de 55 788,89 USD devia ser imputado às autoridades russas e foi, por isso, assumido pelo Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA). Um montante adicional de 20 669,44 USD foi assumido pelo DAF. As somas assim pagas, ou seja, 76 458,33 USD, correspondiam às sobreestadias incorridas no porto de chegada na Rússia.

49
O DAF considerou que não tinha que assumir as sobreestadias incorridas no porto de partida, ou seja, 25 761,11 USD, porque estas não eram devidas nos termos da carta‑partida que rege as relações entre a demandante e o armador.

50
A demandante e o DAF trocaram correspondência relativa a estas sobreestadias, sem, todavia, chegarem a um acordo.

51
Em 3 de Agosto de 2001, a demandante notificou a Comissão para intervir e pagar o saldo da factura BRU 114 4316, no montante de 25 761,11 USD, bem como saldo de uma factura BRU 413 1828, no montante de 23 115,49 euros. Esta notificação não produziu efeitos.


Tramitação processual

52
Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 20 de Setembro de 2001, a demandante propôs a acção do processo T‑215/01. Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 24 de Setembro de 2001, a demandante propôs as acções dos processos T‑220/01 e T‑221/01.

53
Por despacho do presidente da Segunda Secção do Tribunal de Primeira Instância de 26 de Junho de 2003, os processos T‑215/01, T‑220/01 e T‑221/01 foram apensos para efeitos da fase oral e do acórdão, nos termos do artigo 50.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

54
Com base no relatório preliminar do juiz‑relator, o Tribunal de Primeira Instância (Segunda Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo e, no quadro das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo colocou questões escritas à demandante e à Comissão, convidando‑as a responder‑lhes na audiência.

55
Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões do Tribunal de Primeira Instância, na audiência realizada em 8 de Julho de 2003.

56
Aquando da audiência, a demandante pediu para juntar aos autos uma nota com as suas respostas às questões escritas do Tribunal de Primeira Instância e dois anexos. A Comissão, convidada a apresentar as suas eventuais observações sobre este pedido, não levantou qualquer objecção. Estes documentos foram, assim, juntos aos autos.

57
No final da audiência, o Tribunal de Primeira Instância convidou a demandante a precisar por escrito a taxa de conversão USD/euro que utilizou no processo T‑215/01 para chegar a um saldo em dívida quanto à verba relativa às sobreestadias da factura BRU 135 039 num montante de 57 516 USD.

58
Em resposta a este pedido, a demandante apresentou uma nota na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância, em 23 de Julho de 2003, da qual resulta que a taxa de conversão USD/euro utilizada era de 0,98.

59
Por carta apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 1 de Agosto de 2003, a Comissão pediu para apresentar observações sobre a nota da demandante em resposta à questão do Tribunal.

60
Tendo o Tribunal deferido o pedido, a Comissão apresentou observações sobre essa nota na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 19 de Setembro de 2003.


Pedidos das partes

61
Nos presentes processos, a demandante conclui pedindo que o Tribunal se digne:

declarar admissíveis e procedentes as acções propostas, a título principal, com base no artigo 238.° CE e, a título subsidiário, com base no artigo 235.° CE e no artigo 288.°, segundo parágrafo, CE e, consequentemente, condenar a Comissão a pagar‑lhe:

no processo T‑215/01, os montantes de 14 290,61 euros e de 57 859,56 USD, acrescidos dos juros legais a partir do 8.° dia de cada factura não paga, subsidiariamente a partir da notificação da IBEA, de 28 de Julho de 2000 ou, ainda mais subsidiariamente, a partir da notificação da Comissão, de 16 de Maio de 2001,

no processo T‑220/01, o montante de 106 901,96 DEM (cerca de 54 658,10 euros), acrescido dos juros legais a partir do 8.° dia posterior à data de cada factura não paga, subsidiariamente a partir de uma pretensa notificação do BLE, de 16 de Março de 2000, ou, ainda mais subsidiariamente, a partir de uma alegada notificação da Comissão, de 16 de Maio de 2001,

no processo T‑221/01, os montantes de 25 761,11 USD e de 23 115,49 euros, acrescidos dos juros legais a partir do 8.° dia posterior à data de cada factura não paga, subsidiariamente a partir de uma pretensa notificação do DAF, de 9 de Março de 2001 ou, ainda mais subsidiariamente, a partir da notificação da Comissão, de 3 de Agosto de 2001;

condenar a Comissão nas despesas.

62
Em cada um dos três processos, a Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

julgar a acção inadmissível, tanto com base no artigo 238.° CE, como no artigo 235.° CE e no artigo 288.°, segundo parágrafo, CE;

a título subsidiário, julgar a acção improcedente, quer com base no artigo 238.° CE, quer com base no artigo 235.° CE e no artigo 288.°, segundo parágrafo, CE;

condenar a demandante nas despesas.

63
No processo T‑220/01, a demandante afirmou, na réplica, que, ao contrário do que fez na petição, os custos suplementares indicadas na factura BRU 135 964, pelo montante de 16 050 DEM, só eram pertinentes no que respeita a 12 300 DEM e que a factura BRU 135 098, num montante de 900 DEM, não era pertinente. Por conseguinte, as pretensões da demandante neste processo foram reduzidas ao pagamento de um montante total de 102 251,96 DEM (cerca de 52 280,60 euros), acrescido de juros.

64
No processo T‑221/01 a demandante declarou, na audiência, que desistia do pedido quanto ao pagamento da factura BRU 413 1828, no montante de 23 115,49 euros.


Quanto aos pedidos principais baseados no artigo 238.° CE

Quanto à admissibilidade

Argumentos das partes

65
Em cada um dos processos a Comissão alega, a título principal, que a acção proposta com base no artigo 238.° CE é inadmissível, por não haver relação contratual entre ela e a demandante. Subsidiariamente, alega que, em cada um dos processos, há vários pedidos que devem ser julgados inadmissíveis, por não satisfazerem as exigências do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo.

66
Em cada dos três processos, a demandante contesta a validade dos fundamentos de inadmissibilidade invocados pela Comissão.

    Quanto ao fundamento de inadmissibilidade assente na inexistência de relação contratual entre as partes

67
A Comissão alega, antes de mais, que a regras aplicáveis aos diversos concursos objecto dos presentes processos não contêm qualquer referência a uma relação de natureza contratual. Na sua opinião, não pode deduzir‑se do artigo 16.° do Regulamento n.° 111/1999 que este contém uma cláusula compromissória que confirme a existência de uma relação contratual entre ela e a demandante. Este artigo só poderá ser entendido no sentido de conter uma cláusula compromissória se a natureza contratual da relação entre a Comissão e a demandante for previamente demonstrada.

68
A Comissão alega, seguidamente, que os regulamentos aplicáveis ao caso em apreço diferem qualitativamente do Regulamento (CEE) n.° 3972/86 do Conselho, de 22 de Dezembro de 1986, relativo à política e à gestão da ajuda alimentar (JO L 370, p. 1), e do Regulamento (CEE) n.° 2200/87 da Comissão, de 8 de Julho de 1987, que estabelece as normas gerais de mobilização na Comunidade de produtos a fornecer a título da ajuda alimentar comunitária (JO L 204, p. 1), pertinentes no processo que deu origem ao acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Fevereiro de 1993, Cebag/Comissão (C‑142/91, Colect., p. I‑553), a que a demandante se refere. Como tal, este acórdão, nos termos do qual o Tribunal de Justiça considerou que a Comissão e um adjudicatário estavam ligados por uma relação contratual, não pode, segundo a Comissão, ser utilmente invocado no âmbito dos processos em apreço. Pelas mesmas razões, o despacho do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Outubro de 1997, Mutual Aid Administration Services/Comissão (T‑186/96, Colect., p. II‑1633), invocado pela demandante, carece também de pertinência, na opinião da Comissão.

69
Sustenta, além disso, que as medidas de mobilização de mercadorias sujeitas a concurso são executadas, em grande parte, pelos organismos de intervenção dos Estados‑Membros e não directamente pela própria Comissão. Além disso, as autoridades nacionais agem, em princípio, em nome próprio e sob a sua própria responsabilidade e não como meros executantes ou mandatários da Comissão. Com efeito, os Regulamentos n.os 111/1999 e 2802/98 integram‑se no âmbito da política agrícola comum, que se caracteriza por um modo de gestão que recorre amplamente aos Estados‑Membros. Segundo a Comissão, decorre do artigo 6.° do Regulamento n.° 2802/98 que a Secção «Garantia» do FEOGA suporta as despesas ligadas à aplicação das medidas de mobilização. Nestas condições, cabe aos Estados‑Membros garantir a execução dos regulamentos comunitários no seu território (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Setembro de 1983, Deutsche Milchkontor, 205/82 a 215/82, Recueil, p. 2633). Se a Comissão tivesse pretendido afastar‑se desta abordagem e limitar as autoridades nacionais a um papel de mero executante, devia tê‑lo explicitado no Regulamento n.° 111/1999, o que, na sua opinião, não foi feito.

70
Segundo a Comissão, o facto de, nos termos do artigo 6.°, n.° 2, do Regulamento n.° 111/1999, ser ela a tomar a decisão de atribuir o fornecimento não obsta a que os organismos de intervenção giram quase todo o fornecimento sob a sua própria responsabilidade. Alega, por outro lado, que o Regulamento n.° 111/1999 confia aos organismos de intervenção a gestão das propostas (recepção, abertura, e exame da admissibilidade), das garantias (constituídas a favor e em benefício deles) bem como dos adiantamentos e dos pagamentos finais.

71
Além disso, a Comissão não dá quaisquer ordens aos organismos de intervenção. A este respeito, ainda que o artigo 8.°, n.os 3 e 4, do Regulamento n.° 111/1999 visem uma actuação da Comissão para «facilitar o prosseguimento do fornecimento» e para «conceder uma tolerância para ter em conta dificuldades», estes modos de intervenção respeitam a situações específicas – distintas das que se verificam nos presentes processos – fora das quais a Comissão não intervém nas relações entre o organismo de intervenção e o adjudicatário.

72
Por fim, ao contrário de certas regulamentações comunitárias, o Regulamento n.° 111/1999 não contém, na opinião da Comissão, qualquer indicação de que o contrato entre o adjudicatário e o organismo de intervenção é celebrado em nome e por conta da Comissão.

73
A demandante sustenta que existe uma relação contratual entre ela e a Comissão. A este respeito observa, antes de mais, que as disposições do Regulamento n.° 111/1999 relativas à celebração do contrato de fornecimento caracterizam uma relação de natureza contratual entre a Comissão e o adjudicatário. Assim, nos termos do artigo 6.° do Regulamento n.° 111/1999, o preço seria em função da proposta apresentada pelo proponente e da sua aceitação pela Comissão. Ora, na opinião da demandante, a jurisprudência consagra o princípio segundo o qual quando o preço de uma prestação resulta da proposta feita pelo proponente e da sua aceitação pela Comissão, existe uma relação contratual entre estas duas partes (acórdão Cebag/Comissão, já referido, e despacho Mutual Aid Administration Services/Comissão, já referido, n.os 38 e seguintes).

74
Sustenta, seguidamente, que as disposições do Regulamento n.° 111/1999 relativas à execução do contrato de fornecimento consagram, na medida do necessário, a qualidade de parte no contrato da Comissão. Segundo a demandante, as prerrogativas da Comissão, tal como são previstas pelo artigo 8.°, n.os 3 e 4, do Regulamento n.° 111/1999, são as que competem a um comitente ou ordenante face a um comissário de transporte, e que só podem emergir de uma relação de natureza contratual. Por outro lado, o artigo 9.° deste regulamento impõe ao adjudicatário que se submeta, antes da saída do território comunitário, a todos os controlos efectuados pela Comissão e por conta desta.

75
A demandante alega, além disso, que o artigo 16.° do Regulamento n.° 111/1999 contém uma cláusula atributiva de competência que deve ser considerada uma cláusula compromissória na acepção do artigo 238.° CE (acórdão Cebag/Comissão e despacho Mutual Aid Administration Services/Comissão, já referidos).

    Quanto ao fundamento de inadmissibilidade assente na não conformidade das petições com o disposto no artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo

76
A Comissão sustenta que vários pedidos devem ser declarados inadmissíveis, em cada um dos processos, por não satisfazerem as exigências do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo.

77
Assim, no processo T‑215/01, o pedido do pagamento do saldo da factura BRU 135 039, no montante de 7 194,24 euros, é, segundo a Comissão, inadmissível por a justificação deste pedido não resultar, com suficiente clareza, do teor da petição. Por conseguinte, o pedido relativo aos alegados encargos financeiros no montante de 7 096,37 euros, respeitantes ao atraso de pagamento do montante de 7 194,24 euros é, também, inadmissível, na medida em que é acessório de um pedido principal inadmissível. De qualquer modo, os pedidos relativos aos encargos financeiros (7 096,37 euros e 343,93 USD) são, segundo a Comissão, inadmissíveis por não serem justificados na petição.

78
No âmbito do processo T‑220/01, a Comissão sustenta que o pedido de pagamento relativo à factura BRU 135 964, mesmo reduzido ao montante de 12 300 DEM, não é explicado nem justificado na fase da petição, pelo que é inadmissível.

79
Por outro lado, em cada um dos três processos, o pedido de pagamento de juros contados a partir do 8.° dia posterior à de cada factura não paga, subsidiariamente a partir da data da alegada notificação do organismo de intervenção pertinente e, ainda mais subsidiariamente, a partir da data da alegada notificação da Comissão, é também, na opinião da Comissão, inadmissível, por falta de justificação deste pedido em cada uma das petições.

80
A demandante sustenta, essencialmente, que os diferentes pedidos que a Comissão considera inadmissíveis são conformes ao disposto no artigo 44.ᄚ, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo.

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

    Quanto ao fundamento de inadmissibilidade assente na inexistência de relação contratual entre as partes

81
Há que examinar se existe, em cada um dos presentes processos, uma relação jurídica entre a Comissão e a demandante e, se assim for, determinar se a relação é de natureza contratual.

82
Antes de mais, nos termos do artigo 4.°, n.° 1, do Regulamento n.° 2802/98, a Comissão é responsável pela execução das acções de colocação de produtos agrícolas à disposição da Rússia. Seguidamente, segundo o disposto no artigo 6.° do Regulamento n.° 111/1999, a Comissão decide a adjudicação do fornecimento a um adjudicatário, enquanto o papel dos organismos de intervenção se limita, nesta fase, a receber e a transmitir à Comissão as propostas válidas dos proponentes. Em cada um dos presentes processos, o fornecimento foi adjudicado com base numa decisão da Comissão (v. n.os 18, 34 e 43, supra). Acresce que, nos termos do artigo 8.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999, apenas a Comissão pode dar instruções para facilitar o prosseguimento do fornecimento. Além disso, segundo o artigo 9.° do mesmo regulamento, o controlo do fornecimento cabe à Comissão.

83
Resulta destas disposições e destas circunstâncias que existe uma relação jurídica entre a Comissão, agindo como autoridade adjudicante, e a demandante, na qualidade de adjudicatária. A existência de uma relação jurídica entre a Comissão e a demandante não é contrariada pelo facto de as medidas de mobilização dos produtos em questão serem executadas em parte pelos organismos de intervenção dos Estados‑Membros (v., neste sentido, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Outubro de 2002, Fuchs/Comissão, T‑134/01, Colect., p. II‑3909, n.° 50).

84
Quanto à qualificação da relação jurídica existente entre a Comissão e a demandante, há que reconhecer, em primeiro lugar, que os regulamentos aplicáveis aos processos em apreço, a saber, os Regulamentos n.os 2802/98, 111/1999 e 1799/1999 (processo T‑220/01) ou 1815/1999 (processos T‑215/01 e T‑221/01), não contêm qualquer indicação explícita. Estes regulamentos distinguem‑se, portanto, neste ponto, do Regulamento n.° 3972/86, aplicável no processo em que foi proferido o acórdão Cebag/Comissão, já referido, e do Regulamento (CE) n.° 1292/96 (que substituiu o Regulamento n.° 3972/86), nos quais está expressamente previsto que a ajuda alimentar é fornecida com base em compromissos contratuais.

85
Contudo, a falta de tal qualificação explícita nos regulamentos aplicáveis a cada um dos presentes processos não exclui, ainda assim, que a relação entre a Comissão e a demandante, na qualidade de partes num concurso, possa ser considerada de natureza contratual.

86
Em cada um dos presentes processos, em resultado da proposta da demandante e da sua aceitação pela Comissão, foi criada uma relação jurídica entre estas duas partes constitutiva de direitos e obrigações recíprocos. A demandante comprometeu‑se, nomeadamente, a tomar a cargo uma determinada mercadoria, num local determinado, e a transportá‑la para a Rússia dentro de um determinado prazo. A Comissão, por sua vez, comprometeu‑se, nomeadamente, a que o preço acordado seja pago. Tal relação preenche os critérios de um contrato bilateral (v., neste sentido, o acórdão Fuchs/Comissão, já referido, n.° 53, e os despachos do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Julho de 1997, Oleifici Italiani/Comissão, T‑44/96, Colect., p. II‑1331, n.os 33 a 35, e Mutual Aid Administration Services/Comissão, já referido, n.os 41 a 44).

87
Além disso, há que observar que a cláusula contida no artigo 16.° do Regulamento n.° 111/1999, segundo a qual o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias é competente para dirimir quaisquer litígios decorrentes da execução, da não execução ou da interpretação das normas aplicáveis aos fornecimentos efectuados nos termos desse regulamento, só faz razoavelmente sentido quando existe uma relação contratual entre a Comissão e um adjudicatário como a demandante.

88
Decorre do que precede que o fundamento de inadmissibilidade assente na pretensa inexistência de relação contratual entre a Comissão e a demandante deve ser julgado improcedente em cada um dos presentes processos.

    Quanto ao fundamento de inadmissibilidade assente na não conformidade das petições com o disposto no artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo

89
No processo T‑215/01, a petição indica claramente que o pedido de pagamento do montante de 7 194,24 euros se refere ao saldo da verba «transporte» da factura BRU 135 039, enviada pela demandante à IBEA. Por outro lado, a petição indica também que os montantes de 7 096,37 euros e de 343,93 USD, cujo pagamento a demandante pede, se referem aos saldos das facturas BRU 138 552 e BRU 138 553, relativas aos chamados encargos financeiros resultantes de pretensos atrasos de pagamento da IBEA. No processo T‑220/01, a petição indica que o pedido de pagamento do montante de 16 050 DEM (reduzido, na fase da réplica, a 12 300 DEM) se refere às despesas com as folhas de plástico impostas pela Nordfrost e cujo reembolso a demandante pediu ao BLE, em conformidade com a factura BRU 135 964. Nestas condições, há que considerar que cada um destes pedidos é acompanhado de uma justificação que, embora bastante curta, é suficiente à luz da exigência do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

90
No que respeita, nos três processos, ao pedido de pagamento de juros de mora, há que sublinhar que é geralmente admitido nos direitos dos Estados‑Membros que um atraso no pagamento provoca um prejuízo pelo qual o credor deve ser indemnizado. O direito comunitário reconhece essa obrigação de indemnização como um princípio geral de direito (v., a título de exemplo, o acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de Junho de 1990, Sofrimport/Comissão, C‑152/88, Colect., p. I‑2477, n.° 32, e os acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Julho de 1998, von Löwis e Alvarez‑Cotera/Comissão, T‑202/96 e T‑204/96, Colect., p. II‑2829, e Fuchs/Comissão, já referido, n.° 56).

91
Na medida em que, em cada um dos presentes processos, o pedido se refere ao pagamento de juros de mora enquanto indemnização fixa e abstracta, não tem que ser especificamente fundamentado e é, por isso, admissível (acórdão Fuchs/Comissão, já referido, n.° 57).

92
À luz das considerações anteriores, há que julgar improcedente, em cada um dos presentes processos, o fundamento de inadmissibilidade assente na falta de respeito dos requisitos previstos no artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo. Consequentemente, as acções propostas nos termos do artigo 238.° CE devem ser julgadas admissíveis.

Quanto ao mérito

Argumentos das partes

93
Em cada um dos presentes processos, a demandante alega, em primeiro lugar, que existe responsabilidade contratual da Comunidade, uma vez que a Comissão deve, na sua qualidade de mandante ou de ordenante, responder pelos erros cometidos pelos organismos de intervenção que agiram como mandatários.

94
Segundo a demandante, a Comissão tem, em cada um dos presentes processos, a qualidade de mandante ou dador de ordem dos organismos de intervenção e dos seus armazéns. Alega, a este respeito, em cada um dos três processos, que, no fax de 14 de Outubro de 1999, a Comissão reconheceu expressamente que os armazéns agiam em nome e por conta da Comunidade Europeia. Além disso, nos processos T‑215/01 e T‑220/01, sustenta que a Comissão deu instruções aos organismos de intervenção em questão, a saber, a IBEA e o BLE, o que confirma que a Comissão tem a qualidade de mandante ou de dador de ordem relativamente a estes organismos.

95
Segundo a demandante, a Comissão criou, pelo menos, aparências que levaram a demandante a aceitar incorrer em custos suplementares em cada um dos três processos. Assim, nos processos T‑215/01 e T‑221/01, foi com base no fax de 14 de Outubro de 1999, pelo qual esta instituição reconheceu expressamente que a IBEA e a Alpine agiam em nome e por conta dela, que a demandante aceitou pagar sobreestadias ao armador do navio Freedom III, no processo T‑215/01, e ao armador do navio Okapi MV, no processo T‑221/01. No processo T‑220/01, foi com base no fax de 15 de Novembro de 1999, através do qual a Comissão a aconselhava a enviar directamente ao BLE as facturas da Nordfrost relativas aos custos suplementares, que a demandante aceitou avançar custos suplementares à Nordfrost.

96
A demandante sustenta, em cada um dos presentes processos, que o organismo de intervenção pertinente cometeu um erro ao recusar‑se a assumir os custos suplementares por ela suportadas. Este erro consiste na violação do artigo 9.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999, nos termos do qual o organismo de intervenção deve pagar os custos suplementares suportados pelo adjudicatário quando tais custos surjam na sequência da uma não conformidade da mercadoria colocada à disposição pelo organismo de intervenção.

97
Na sua opinião, embora o texto desta disposição se refira apenas à entrega de mercadorias não conformes, não há nada que justifique que o organismo de intervenção não deva pagar custos suplementares quando resultem de entrega tardia ou de entrega feita em condições prejudiciais para o adjudicatário. É isso, no seu entender, que se verifica em cada um dos presentes processos.

98
Assim, no processo T‑215/01, os custos suplementares incorridos pela demandante foram, segundo esta, causados pelo atraso culposo da Alpine na entrega da mercadoria ao transportador da demandante. Com efeito, por um lado, a Alpine tentou que a demandante suportasse prestações e encargos não previstos pelo contrato de fornecimento e, por outro, não conseguiu fornecer a mercadoria ao ritmo anteriormente previsto. Ora, o carregamento da mercadoria é uma operação que incumbe exclusivamente ao armazém. O atraso sofrido por esta operação não pode, portanto, ser imputado à demandante.

99
No processo T‑220/01, os custos suplementares resultaram, segundo a demandante, do comportamento culposo da Nordfrost, que, por um lado, exigiu indevidamente o pagamento de um suplemento de preço para o carregamento das mercadorias e para a utilização de folhas de plástico nos camiões e, por outro, executou incorrectamente as operações de carregamento, o que levou à aplicação de multas à demandante.

100
No que respeita aos custos relativos às operações de desarmazenagem, de carregamento e de fornecimento de folhas de plástico, são custos suplementares na medida em que não tinham sido previstos na cotação da Nordfrost para as operações de manutenção e de carregamento. Estes custos não podem ser imputados à demandante, uma vez que as operações de desarmazenagem e de carregamento incumbiam à Nordfrost. Além disso, a demandante considera que a própria Comissão reconheceu, no seu fax de 15 de Novembro de 1999, que estes custos deviam ser pagos pelo BLE.

101
No que respeita à má execução da operação de carregamento, a demandante precisa que, ao contrário do que a Comissão sustenta, a prova da culpa do armazém aquando desta operação resulta suficientemente das actas elaboradas pela polícia polaca que constatou a existência de sobrecargas no eixo dos camiões utilizados para encaminhar a mercadoria carregada pela Nordfrost. Cabendo o carregamento do meio de transporte exclusivamente ao armazém, a sua culpa é manifesta, na opinião da demandante.

102
No processo T‑221/01, foi, segundo a demandante, o atraso culposo do DAF na emissão dos certificados de retirada da mercadoria (Removal Warrants) que gerou os custos suplementares, a saber os custos de imobilização do navio Okapi MV. Por isso, nem os atrasos no carregamento nem os custos que daí resultem podem ser imputáveis à demandante.

103
No que respeita, mais em particular, às sobreestadias pagas pela demandante pela imobilização do navio Okapi MV, esta entende que se deve rejeitar a tese defendida pelo DAF e retomada pela Comissão segundo a qual a demandante não devia ter pago sobreestadias porque a carta‑partida celebrada entre a demandante e o armador era uma «berth charter» e não uma «port charter», qualificação que teria permitido à demandante recusar o pagamento das sobreestadias exigidas. A demandante alega, a este respeito, que o DAF não tem a qualidade nem o poder que lhe permitam requalificar uma convenção de que não é parte. Observa também que, segundo o organismo «BIMCO», cujo objecto estatutário é propor aos seus membros contratos‑tipo e cláusulas normalizadas, as cláusulas BIMCO utilizadas na carta‑partida são típicas de uma «port charter». Por fim, acrescenta que os contraentes da carta‑partida tinham acordado em que celebravam uma «port charter». Foi devido a esta qualificação não contestada pelas partes signatárias da carta‑partida, e em aplicação do princípio da obrigatoriedade das convenções legalmente celebradas, que a demandante pagou ao armador os custos suplementares decorrentes da imobilização do navio, cuja realidade não é contestada.

104
Considerando os erros cometidos em cada um dos presentes processos pelos organismos de intervenção pelos quais a Comissão deve, na opinião da demandante, responder, na sua qualidade de mandante ou de dador de ordem, está já envolvida a responsabilidade contratual da Comissão.

105
A demandante alega, em segundo lugar, nos três processos, que existe também responsabilidade contratual da Comissão com fundamento na violação, pela Comissão, da obrigação prevista no artigo 8.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999.

106
Segundo a demandante, esta disposição, que confere à Comissão poder de direcção no âmbito da execução dos contratos, sujeita esta instituição a uma obrigação de resultado quanto ao prosseguimento da boa execução do fornecimento.

107
Em cada um dos três processos, o facto de ter deixado os custos suplementares a cargo da demandante constitui da parte da Comissão, um acto que entrava o prosseguimento do fornecimento, do ponto de vista dos interesses legítimos do adjudicatário. Isto constitui violação das modalidades do fornecimento previstas pelo Regulamento n.° 111/1999, em função dos quais a demandante apresentou uma proposta e celebrou o contrato de fornecimento. Além disso, certas circunstâncias particulares de cada processo confirmam, segundo a demandante, que a Comissão violou as suas obrigações emergentes do artigo 8.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999.

108
Assim, nos processos T‑215/01 e T‑221/01, a Comissão não interveio com suficiente eficácia para pôr fim aos entraves que implicaram atrasos aquando do carregamento da mercadoria, o que, segundo a demandante, constitui uma violação do artigo 8.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999.

109
No processo T‑220/01, a demandante sustenta que o fax de 15 de Novembro de 1999, no qual a Comissão deu instruções ao BLE para pagar os custos suplementares impostos pela Nordfrost, não produziu efeitos, o que basta para implicar a responsabilidade contratual desta instituição. No caso de o fax de 15 de Novembro de 1999 não dever ser qualificado como instrução, na acepção do artigo 8.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999, existe, ainda assim, responsabilidade contratual da Comissão, pela falta de instruções eficazes com vista a facilitar o prosseguimento do fornecimento.

110
A demandante alega, em terceiro lugar, em todos os processos, que determinados montantes, cujo pagamento pede, devem ser considerados provados, na medida em que a Comissão não os contesta.

111
Por outro lado, ao contrário do que a Comissão sustenta, todos os pedidos de pagamento são justificados, na opinião da demandante. Assim, no processo T‑215/01, o pedido de pagamento do saldo da verba «transporte» da factura BRU 135 039 – num montante de 7 194,24 euros – é totalmente justificado pelos documentos anexos à petição. De igual modo, no processo T‑220/01, o pedido de pagamento da factura BRU 135 964, quanto ao montante de 12 300 DEM, é abonado com base em justificativos desta factura anexos à petição, de que a Comissão tem cópia.

112
A demandante alega, por fim, que são devidos juros de mora sobre todos os montantes cujo pagamento exige. Estes juros começam a correr a partir do 8.° dia posterior à data de cada factura não paga. Subsidiariamente, sustenta que os juros deverão começar a correr a partir da data da notificação do organismo de intervenção pertinente, ou seja, 28 de Julho de 2000, no processo T‑215/01, 16 de Março de 2000, no processo T‑220/01 e 9 de Março de 2001, no processo T‑221/01. A título ainda mais subsidiário, a data a contar da qual os juros devem começar a correr será determinada pela notificação da Comissão, ou seja, 16 de Maio de 2001, nos processos T‑215/01 e T‑220/01 e 3 de Agosto de 2001, no processo T‑221/01.

113
A Comissão contesta, liminarmente, a existência de qualquer relação contratual entre ela e a demandante em cada um dos processos. Alega também que a sua eventual responsabilidade só pode, de qualquer modo, admitir‑se a título subsidiário, sendo subordinada à interposição, pela demandante, de uma acção judicial contra os outros operadores em questão, a saber, os organismos de intervenção e os armazéns, perante os órgãos jurisdicionais nacionais competentes. Por esta razão contesta, desde já, a sua responsabilidade contratual.

114
Seguidamente a Comissão sustenta, essencialmente, que, mesmo admitindo, em cada um dos três processos, que existe um contrato entre ela e a demandante, a responsabilidade contratual da Comunidade não pode resultar dos fundamentos invocados pela demandante.

115
A Comissão começa por rejeitar a tese da demandante de que deve responder pelos erros cometidos pelos organismos de intervenção. A este respeito sustenta, em primeiro lugar, que não tem a qualidade de mandante ou comitente dos organismos de intervenção ou dos armazéns. Mais precisamente, sustenta que nem o fax de 14 de Outubro de 1999 (nos processos T‑215/01 e T‑221/01) nem o fax de 15 de Novembro de 1999 (no processo T‑220/01) lhe podem conferir a qualidade de comitente relativamente aos organismos de intervenção em questão, se a regulamentação aplicável não o prevê. Ora, no caso em apreço, a regulamentação comunitária pertinente não lhe atribui tal qualidade. Antes de mais, o artigo 8.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999, que atribui à Comissão o poder de dar instruções para facilitar o prosseguimento do fornecimento, só respeita às dificuldades com a Rússia e não atribui à Comissão a qualidade de comitente relativamente aos Estados‑Membros. Seguidamente, o artigo 9.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999 permite aos organismos de intervenção de assumir custos suplementares sem autorização da Comissão. Contesta também o facto de a demandante poder invocar um pretenso mandato aparente porquanto, em cada um dos presentes processos, a demandante tratou directamente com o organismo de intervenção em questão.

116
A Comissão alega, em segundo lugar, que, mesmo admitindo, em cada um dos três processos, que é mandante ou comitente dos outros operadores em causa (organismos de intervenção ou armazéns), o que contesta, não se pode deduzir de princípios gerais, invocados pela demandante e cuja existência não é demonstrada, que a Comissão assuma qualquer responsabilidade automática relativamente à demandante. A este respeito sustenta, essencialmente, que decorre do artigo 8.°, n.° 1, do Regulamento n.° 111/1999, que a demandante deve assumir o risco comercial associado a cada fornecimento, o que obsta a uma responsabilidade automática do organismo de intervenção e, por maioria de razão, da Comissão.

117
Em terceiro lugar, sustenta que, ao recusarem‑se a assumir os custos suplementares alegados pela demandante, os organismos de intervenção não cometeram qualquer erro em nenhum dos três processos. Alega, a este respeito, que os pretensos custos suplementares não são abrangidos pelo artigo 9.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999, que faz recair sobre o organismo de intervenção os custos suplementares resultantes da não conformidade das mercadorias entregues. Na sua opinião, o carácter derrogatório desta disposição relativamente ao princípio de que o risco comercial recai sobre o adjudicatário obsta a uma extensão analógica do seu âmbito a situações em que não se verifique a não conformidade da mercadoria entregue. Como tal, nem os atrasos na entrega das mercadorias, invocados pela demandante nos processos T‑215/01 e T‑221/01, nem as condições alegadamente insatisfatórias do seu carregamento, invocadas pela demandante no processo T‑220/01, podem ser abrangidos por esta disposição. Acresce que estas situações não são comparáveis à entrega de uma mercadoria não conforme, a qual, por definição, não pode ser imputável ao adjudicatário do fornecimento do transporte, ao passo que um atraso na entrega ou condições de carregamento alegadamente insatisfatórias podem, por seu lado, ser‑lhe imputáveis.

118
A Comissão acrescenta que a eventual aplicação do artigo 9.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999, relativo aos custos suplementares alegados pela demandante em cada um dos três processos, pressupõe a demonstração do erro do organismo de intervenção ou do armazém.

119
Não é esse o caso no processo T‑220/01. Com efeito, os custos suplementares de carregamento, bem como os relativos à utilização de folhas de plástico, resultantes de problemas sanitários, veterinários e de carregamento, deviam ter sido previstos pela demandante, como operador informado. No que respeita às multas aplicadas pelas autoridades polacas à demandante pelas sobrecargas no eixo dos camiões que transportavam a mercadoria, a Comissão sustenta que a demandante não faz prova do erro do armazém que terá implicado a aplicação destas multas.

120
Também não é esse o caso no processo T‑221/01, uma vez que os custos suplementares que consistiam em sobreestadias pagas ao armador do navio Okapi MV resultavam de má apreciação, pela demandante, das suas obrigações relativas ao armador, por força da carta‑partida. Segundo a Comissão, a carta‑partida constitui uma «berth charter» e não uma «port charter», que, nas circunstâncias do caso em apreço, não impunha à demandante o pagamento das sobreestadias.

121
A Comissão alega, em segundo lugar, que, ao contrário do que a demandante sustenta, a responsabilidade contratual da Comunidade não pode, de modo algum, ser envolvida com base no artigo 8.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999, que, considerando o seu âmbito limitado às dificuldades com a Rússia, não lhe confere poderes de direcção relativamente aos Estados‑Membros, nomeadamente aos seus organismos de intervenção. Por outro lado, ainda que esta disposição conferisse à Comissão tal poder de direcção e que o fax de 14 de Outubro de 1999 (nos processos T‑215/01 e T‑221/01) e o fax de 15 de Novembro de 1999 (no processo T‑220/01) devessem ser considerados instruções, na acepção que a demandante lhes dá, a ineficácia de tais instruções não prova de modo algum a culpa da Comissão.

122
Por fim, contesta o mérito de certos pedidos em cada um dos três processos. Sustenta, antes de mais, em todos os processos, que, ainda que não tenha contestado a realidade de certas somas cujo pagamento a demandante exige, contesta, todavia, o princípio, e considera que não pode ser devedora das mesmas. Seguidamente, quanto a todos os processos, os pedidos relativos aos juros não têm fundamento. Ainda que resultassem de acordos comerciais com terceiros, tais acordos não são oponíveis à Comissão, como parte terceira relativamente a esses acordos.

123
Por outro lado, no processo T‑215/01, o pedido do pagamento de 7 194,24 euros deve, segundo a Comissão, ser julgado improcedente por carecer de qualquer justificação. É certo que a demandante menciona, nas suas peças processuais, dificuldades relativas às operações de carregamento e aos custos de fornecimento de paletes. Porém, não se demonstra qualquer nexo entre estas pretensas dificuldades e o pedido de pagamento de 7 194,24 euros. De igual modo, o pedido relativo aos encargos financeiros não é comprovado. Ainda que estes custos decorressem de um acordo comercial celebrado com um terceiro, tal acordo é, de qualquer modo, inoponível à Comissão.

124
Por fim, no processo T‑220/01, a Comissão sustenta que, mesmo admitindo que tenha eventual responsabilidade pelos custos de protecção suplementar (folhas de plástico) e pelas multas decorrentes das sobrecargas no eixo, o que contesta, haveria, a título subsidiário, que proceder a uma partilha de responsabilidades com a demandante, responsável por estes custos na sua qualidade de adjudicatário.

Apreciação do Tribunal

125
A título liminar, há que recordar que, pelos motivos expostos nos n.os 81 a 88 do presente acórdão, existe, em cada um dos processos, um contrato entre a Comissão e a demandante. Recorde‑se, seguidamente, que, em cada um dos três processos, o litígio respeita a montantes cujo pagamento a demandante pede, com fundamento na responsabilidade contratual da Comunidade. Há, assim, que determinar, em cada processo e quanto a cada montante exigido, se as somas cujo pagamento a demandante pede respeitam à violação de uma obrigação contratual e, sendo esse o caso, que identificar o titular da obrigação em questão.

    No processo T‑215/01

126
O litígio respeita, em primeiro lugar, a um montante de 7 194,24 euros, não se contestando que corresponde ao saldo, não pago pela IBEA, da verba relativa à prestação de transporte da factura BRU 135 039. Resulta dos autos que esta soma foi retida pela IBEA como indemnização dos alegados danos e prejuízos respeitantes a paletes sobre as quais estava carregada a mercadoria a transportar.

127
No que respeita a este pedido, há que determinar se, entre as obrigações da demandante, na sua qualidade de adjudicatário, consta a de restituir à Alpine as ditas paletes, em bom estado.

128
Há que constatar, a este respeito, que o contrato não contém qualquer disposição que permita considerar que a demandante era obrigada, na sua qualidade de adjudicatário, a restituir ao armazém as paletes sobre as quais a mercadoria se encontrava armazenada. Assim, a eventual falta de restituição das mesmas em bom estado não é, de qualquer modo, uma violação por parte da demandante das suas obrigações, tais como são definidas pelo contrato.

129
Daqui decorre que a soma de 7 194,24 euros foi imputada à demandante sem que esta imputação tenha qualquer fundamento na relação contratual entre a Comissão e a demandante. Há, assim, que acolher o pedido da demandante relativo ao montante de 7 194,24 euros (v., neste sentido, o acórdão Fuchs/Comissão, já referido n.os 76 e 77).

130
O litígio respeita, em segundo lugar, a uma soma de 57 515,63 USD, não se contestando que corresponde ao saldo, não pago pela IBEA, do montante facturado pela demandante a título de sobreestadias (factura BRU 135 039).

131
Segundo a demandante, as sobreestadias cujo pagamento exige resultam do atraso no carregamento da mercadoria à partida do armazém da Alpine. Há que examinar, portanto, se a operação de carregamento é uma operação abrangida pelo contrato celebrado entre a Comissão e a demandante e, se assim for, que determinar se é a demandante ou a Comissão que assume a responsabilidade desta operação.

132
Nos termos do artigo 1.° do Regulamento n.° 1815/1999, o concurso é aberto para a determinação das despesas do fornecimento do transporte de leite em pó desnatado, a partir de existências de intervenção, e até determinados locais de destino na Rússia. O contrato celebrado entre a Comissão e a demandante apresenta‑se, portanto, como um contrato de transporte. Por conseguinte, há que considerar que este contrato implica, como qualquer contrato de transporte, uma prestação de carregamento, que é uma operação prévia necessária à deslocação da mercadoria. Nenhuma disposição dos Regulamentos n.os 111/1999 e 1815/1999 exclui a operação de carregamento do âmbito do contrato de fornecimento. Nestas condições, há que considerar que esta operação faz parte do contrato.

133
Nos termos do artigo 2.° do Regulamento n.° 1815/1999, o fornecimento de que o adjudicatário se encarrega inclui, além do transporte, a tomada a cargo da mercadoria, no cais de carga, à partida de armazéns dos organismos de intervenção.

134
No caso em apreço, a tomada a cargo em questão no artigo 2.° do Regulamento n.° 1815/1999 não pode abranger a operação material de carregamento. Com efeito, nos termos do Regulamento n.° 1643/89, aquando da desarmazenagem, os movimentos de leite em pó desnatado até ao cais do entreposto e o seu carregamento para camiões, com exclusão da estiva, são operações materiais cobertas pelos montantes fixos pagos pelo FEOGA pelas operações materiais resultantes da armazenagem dos produtos agrícolas. Daqui decorre que o FEOGA financiava já a operação de carregamento para os camiões das 3 000 toneladas de leite em pó desnatado que constituíam o lote n.° 4, no âmbito do concurso aberto pelo Regulamento n.° 1815/1999. Nestas condições, o princípio da boa gestão dos recursos financeiros da Comunidade, tal como foi reconhecido pela jurisprudência comunitária (acórdão do Tribunal de Justiça de 10 de Julho de 2003, Comissão/CCRE, C‑87/01 P, Colect., p. I‑7617, n.° 40), obsta a que esta operação seja remunerada uma segunda vez, confiando‑a ao adjudicatário do fornecimento no âmbito do concurso aberto pelo Regulamento n.° 1815/1999. A própria Comissão admitiu, na audiência, que a operação de carregamento não podia dar lugar a dupla remuneração. Nestas condições, há que considerar que, no caso em apreço, o artigo 2.° do Regulamento n.° 1815/1999 não pode ter como efeito confiar à demandante o carregamento da mercadoria em questão.

135
Resulta, além disso, da discriminação da proposta, cuja conformidade com os requisitos do artigo 5.°, n.° 1, alínea e), ponto 5, do Regulamento n.° 111/1999 não é contestada, que a demandante excluiu as prestações de manutenção e de carregamento das operações que se comprometia a fornecer. Com efeito, sob a rubrica «Despesas de manutenção e de carregamento» da discriminação da proposta, tal como é prevista pelo Anexo II do Regulamento n.° 111/1999, na redacção do Regulamento n.° 1125/1999, a demandante inseriu a menção «não aplicável». Ora, foi com base nesta proposta que a Comissão adjudicou o fornecimento à demandante.

136
Decorre do que precede que a operação de carregamento da mercadoria não podia incumbir à demandante. Como tal, é da responsabilidade da Comissão, na sua qualidade de parte num contrato de transporte no âmbito do qual a prestação de carregamento é uma operação prévia necessária para se poder, seguidamente, proceder à deslocação da mercadoria.

137
Nesta fase, há que determinar se a Comissão violou as suas obrigações contratuais relativas à operação de carregamento.

138
No caso em apreço, não foi a própria Comissão que procedeu ao carregamento da mercadoria em questão. Esta operação foi executada pela Alpine, que agia por conta da Comissão, tal como é demonstrado pelo fax de 14 de Outubro de 1999, em que os serviços da Comissão indicaram que os armazéns agiam em nome e por conta da Comunidade.

139
Não se contesta que a execução da operação de carregamento revelou atraso, devido ao comportamento da Alpine. Por um lado, as operações materiais de carregamento começaram com oito dias de atraso, na sequência da recusa injustificada da Alpine de proceder ao carregamento enquanto não fossem aceites as suas exigências relativas a custos de estiva e à constituição de uma garantia. O carácter injustificado da recusa da Alpine é confirmado pelo fax de 14 de Outubro de 1999, em que os serviços da Comissão indicavam, essencialmente, que os custos suplementares eram injustificados e que a exigência de uma garantia suplementar para as paletes não era adequada nem prevista pela regulamentação aplicável. Por outro lado, a Alpine não respeitou o ritmo de dez carregamentos por dia que tinha indicado à demandante na sua cotação de 25 de Agosto de 1999.

140
Resulta do que precede que a operação de carregamento da mercadoria para os camiões que, por força do contrato, incumbia à Comissão, não foi correctamente executada. A Comissão deve, portanto, responder pelas consequências desta má execução.

141
A este respeito, há que constatar que os atrasos na execução da operação de carregamento resultaram na imobilização indevidamente prolongada do navio Freedom III no porto de Grimsby. Em contrapartida, os autos não contêm qualquer elemento que permita confirmar a tese da demandante de que a imobilização indevida do navio Freedom III no porto de chegada também foi causada pela má execução da operação de carregamento da mercadoria à partida do armazém da Alpine. Resulta dos autos que o navio Freedom III estava pronto a descarregar, no porto de chegada, no dia 25 de Novembro de 1999 e que a descarga só começou efectivamente a 11 de Dezembro de 1999, terminando em 17 de Dezembro de 1999 (v. n.° 26, supra). Nestas condições, há que considerar que a imobilização do navio Freedom III no porto de chegada resulta do atraso ou da lentidão das operações de descarga. As sobreestadias incorridas no porto de chegada não podem, portanto, ser causadas pela má execução, pela Alpine, das operações de carregamento. Só as sobreestadias relativas à imobilização do navio no porto de partida devem, portanto, ser assumidas pela Comissão.

142
Resulta dos autos que as sobreestadias relativas à imobilização do navio no porto de partida se elevam a 23 072,89 USD (v. n.° 25, supra). Há, assim, que acolher o pedido da demandante de pagamento do saldo da verba referente às sobreestadias da factura BRU 135 039 pelo montante de 23 072,89 USD.

143
O litígio respeita, em terceiro lugar, por um lado, a encargos financeiros num montante de 7 096,37 euros e de 343,93 USD, impostos em resultado de atrasos no pagamento de facturas enviadas à IBEA e, por outro, a juros de mora relativos aos montantes cujo pagamento a demandante pede na presente acção.

144
Resulta dos elementos dos autos que os montantes de 7 096,37 euros e de 343,93 USD respeitavam à indemnização fixa, à taxa de 14 % por ano de atraso do pagamento, pela IBEA, da factura BRU 135 039, cuja data de vencimento tinha sido fixada pela demandante em 12 de Janeiro de 2000 e que foi paga em 10 de Março de 2000 e da factura BRU 137 810, cuja data de vencimento, fixada pela demandante, era 25 de Maio de 2000 e que foi paga em 23 de Junho de 2000. É certo que um atraso de pagamento implica um prejuízo pelo qual o credor deve ser indemnizado. Porém, só se pode constatar um atraso de pagamento a partir da notificação do devedor (v., neste sentido, o acórdão Fuchs/Comissão, já referido, n.° 78). No caso em apreço, há que constatar que o contrato de fornecimento não prevê que a mora se inicie pelo simples decurso do prazo. Por outro lado, não resulta dos autos que a Comissão tenha sido notificada antes de 16 de Maio de 2001. Nestas condições, deve ser indeferido o pedido de pagamento dos montantes de 7 096,37 euros e de 343,93 USD, ambos respeitantes a pretensos atrasos de pagamento anteriores a 16 de Maio de 2001.

145
Quanto aos juros de mora, são devidos apenas sobre os montantes de 7 194,24 euros e de 23 072,89 USD, a contar de 16 de Maio de 2001, data em que a demandante exigiu à Comissão o pagamento dessas somas, e até ao integral pagamento. No que respeita à percentagem da taxa anual dos juros de mora a aplicar, na falta de taxa convencional fixada por acordo entre as partes no contrato, deve ser calculada com base na taxa fixada pelo Banco Central Europeu para as operações principais de refinanciamento, aplicável nas diferentes fases do período em questão, acrescida de dois pontos (acórdão Fuchs/Comissão, já referido, n.° 78).

    No processo T‑220/01

146
O litígio tem por objecto diferentes montantes, sendo pacífico que respeitavam a custos suplementares, todos relativos à operação de carregamento da mercadoria. Assim, o de 82 991,96 DEM corresponde ao montante não pago da factura BRU 135 963, relativa a custos suplementares pagos pela demandante à Nordfrost por operações de carregamento. De igual modo, é pacífico que 12 300 DEM correspondem à parte pertinente do montante não pago da factura BRU 135 964, relativa aos custos suplementares referentes à utilização de folhas de plástico impostas pela Nordfrost no carregamento da mercadoria. Também não se contesta entre as partes que os 6 960 DEM exigidos pela demandante correspondem ao montante não pago da factura BRU 135 099, relativa às multas impostas à demandante pelas autoridades polacas devido à sobrecarga dos eixos dos camiões utilizados para o transporte da mercadoria.

147
Há que determinar, portanto, se a operação de carregamento se integra no contrato celebrado entre a Comissão e a demandante, no âmbito do concurso aberto pelo Regulamento n.° 1799/1999 e, se assim for, identificar a parte à qual incumbe esta operação.

148
Nos termos do artigo 1.° do Regulamento n.° 1799/1999, o concurso é aberto para a determinação das despesas do fornecimento do transporte, de certos lotes de carne de bovino, a partir de existências de intervenção, para certos locais de destino na Rússia. O contrato entre a Comissão e a demandante constitui, portanto, como o em questão no processo T‑215/01 (v. n.° 132, supra), um contrato de transporte que implica, em princípio, uma operação de carregamento. No caso em apreço, nenhuma disposição dos Regulamentos n.os 111/1999 e 1799/1999 exclui esta operação das prestações abrangidas pelo contrato. Por conseguinte, a operação de carregamento faz parte do contrato celebrado entre a Comissão e a demandante.

149
No âmbito deste contrato, a operação de carregamento incumbe à demandante. Com efeito, nos termos do artigo 2.° do Regulamento n.° 1799/1999, o fornecimento compreende, além da prestação de transporte, a tomada a cargo da mercadoria no cais de carga, à partida de armazéns dos organismos de intervenção. No caso em apreço, nada obsta a que a tomada a cargo da mercadoria abranja a prestação do seu carregamento pois, ao contrário do que se prevê quanto ao fornecimento de leite em pó desnatado (v. n.° 134, supra), a operação de carregamento não beneficia de um financiamento comunitário separado, por força do Regulamento n.° 1643/89. Acresce que, na discriminação da proposta com base na qual o fornecimento lhe foi adjudicado pela Comissão, a demandante indicou explicitamente que facturaria as operações de manutenção e de carregamento à razão de 21,80 euros por tonelada bruta de mercadoria.

150
Todavia, embora a demandante tenha reconhecido, na audiência, que a operação de carregamento lhe incumbia por força do contrato, alegou, porém, que tinha sido compelida, pelo BLE, por um lado, a incluir as operações de manutenção e de carregamento na sua proposta e, por outro, a subcontratar essas operações à Nordfrost. Em apoio das suas alegações, limita‑se a invocar o complexo esquema de facturação relativo às operações de manutenção e de carregamento (v. n.° 35, supra). Basta observar, a este respeito, que nenhum elemento dos autos, nem sequer o dito esquema de facturação, permite corroborar a alegação de que a proposta da demandante de fornecer a prestação de carregamento resulta de uma qualquer imposição. Por outro lado, também não se demonstrou que a demandante tenha sido obrigada a recorrer aos serviços da Nordfrost para efectuar a operação de carregamento. Há que concluir, portanto, que a demandante deu o seu pleno acordo quanto ao fornecimento da prestação de carregamento e que confiou voluntariamente a sua execução à Nordfrost.

151
No que respeita ao argumento da demandante de que a Nordfrost agiu na qualidade de mandatária da Comissão na execução da operação de carregamento, basta observar que os autos não contêm qualquer elemento que permita essa conclusão. Mais precisamente, ao contrário do que a demandante alega, o fax de 14 de Outubro de 1999, enviado pelos serviços da Comissão à IBEA no contexto do processo T‑215/01, não tem qualquer pertinência quando, como no processo T‑220/01, a operação de carregamento incumbe à demandante. Com efeito, esse fax surgiu num processo em que a operação de carregamento incumbia à Comissão (v. n.° 136, supra) e tinha sido confiada ao armazém. Só nesta hipótese se pode considerar, eventualmente, que o armazém agiu, no âmbito contratual, em nome e por conta da Comissão.

152
À luz do atrás exposto, há que considerar que a pretensa má execução pela Nordfrost da operação de carregamento e os eventuais custos suplementares que teria gerado são, no âmbito da relação contratual entre a Comissão e a demandante, da responsabilidade exclusiva da demandante.

153
Nestas condições, ao contrário do que a demandante sustenta (v. n.os 97, 99 e seguintes, supra), foi com razão que o BLE se recusou a assumir os custos suplementares referentes ao carregamento, não podendo esta recusa constituir violação do artigo 9.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999. De qualquer modo, esta disposição refere‑se apenas à tomada a cargo de custos suplementares associados à entrega de mercadoria não conforme, o que não se verifica no caso em apreço.

154
Por outro lado, a alegada falta de intervenção eficaz da Comissão para assegurar o pagamento de certas despesas pelo BLE, como a demandante sustentou (v. n.os 107 e 109, supra) não pode constituir incumprimento da obrigação prevista no artigo 8.°, n.° 3, do Regulamento n.° 111/1999, como foi alegado. Com efeito, se foi com razão que o BLE não procedeu ao pagamento dos custos suplementares incorridos pela demandante, nenhuma intervenção da Comissão quanto a este pagamento poderia ter facilitado o prosseguimento do fornecimento.

155
Decorre do que precede que a responsabilidade contratual da Comunidade não pode ser implicada no âmbito do processo T‑220/01. Por conseguinte, deve julgar‑se improcedente o pedido formulado pela demandante, a título principal, no presente processo.

    No processo T‑221/01

156
Dada a desistência da demandante do pedido de pagamento da factura BRU 413 1828, no montante de 23 115,49 euros, o litígio respeita a um montante de 25 761,11 USD, correspondente ao saldo em dívida da factura BRU 114 4316 , relativa a sobreestadias.

157
É pacífico que, em 5 de Outubro de 1999, a demandante informou o DAF do propósito de levantar a mercadoria a partir de 15 de Outubro de 1999. É também pacífico que, em 15 de Outubro de 1999, a demandante não pôde levantar a mercadoria por o DAF não ter emitido os certificados de tomada a cargo. Também não se contesta que a mercadoria só ficou disponível em 28 de Outubro de 1999.

158
Há que considerar que, no âmbito do contrato entre a demandante e a Comissão no processo T‑221/01, esta assumiu a obrigação de colocar a mercadoria à disposição da demandante. Por outro lado, resulta do artigo 7.° do Regulamento n.° 111/1999, na redacção do Regulamento n.° 1125/1999, que a retirada da mercadoria pode ocorrer logo que o organismo de intervenção comprovar que a garantia de fornecimento foi constituída.

159
No caso em apreço, não foi demonstrado, nem sequer alegado, que em 15 de Outubro de 1999 o DAF não estava na posse da prova de que tinha sido constituída a garantia de fornecimento. Há que considerar, portanto, que a mercadoria devia poder ser retirada pela demandante em 15 de Outubro de 1999. Por outro lado, a Comissão não alegou qualquer razão para a mercadoria não estar disponível nessa data. Nestas condições, há que concluir que a não disponibilidade da mercadoria em 15 de Outubro de 1999 constitui incumprimento, pela Comissão, das suas obrigações contratuais.

160
A Comissão sustenta, todavia, que as sobreestadias pagas ao armador do navio Okapi MV resultam de incorrecta apreciação, pela demandante, da natureza da carta‑partida entre ela e o referido armador. Segundo esta instituição, a carta‑partida constitui uma «berth charter» e não uma «port charter», qualificação que permitia à demandante recusar o pagamento das sobreestadias exigidas.

161
Basta observar, a este respeito, que a Comissão, como terceiro relativamente à carta‑partida, não está habilitada a requalificá‑la como «berth charter». Acresce que não se contesta entre a demandante e o armador que a carta‑partida constitui uma «port charter». Além disso, foi nessa qualidade que foi executada. Nestas condições, nada permite considerar que a demandante pagou indevidamente as sobreestadias ao armador do navio Okapi MV.

162
Não se contesta que o montante de 25 761,11 USD, pago pela demandante a título de sobreestadias pela imobilização indevida do navio Okapi MV no porto de partida, tem origem na colocação à disposição tardia da mercadoria. O pedido da demandante deste montante deve, portanto, ser acolhido.

163
A este montante devem acrescer juros de mora, a partir de 3 de Agosto de 2001, data em que a demandante exigiu à Comissão o pagamento do montante em dívida, até integral pagamento. Na falta de taxa convencional, fixada por acordo entre as partes, a taxa aplicável aos juros de mora deve ser calculada com base na taxa fixada pelo Banco Central Europeu para as operações principais de refinanciamento, aplicável nas diferentes fases do período em questão, acrescida de dois pontos.

Conclusão sobre os pedidos principais baseados no artigo 238.° CE

164
No processo T‑215/01, certos elementos do pedido principal não mereceram acolhimento. Assim, o pedido da demandante de pagamento do saldo em dívida sobre a verba «sobreestadias» da factura BRU 135 039, num montante de 57 515,63 USD, só foi acolhido quanto ao montante de 23 072,89 USD. Por outro lado, o pedido da demandante de pagamento de encargos financeiros no montante de 7 096,37 euros e de 343,93 USD não foi acolhido. Por fim, só os montantes que a Comissão deve pagar à demandante são acrescidos de juros de mora.

165
No processo T‑220/01, o pedido principal é julgado totalmente improcedente.

166
No processo T‑221/01, o pedido principal, alterado dada a desistência da demandante do pedido de pagamento da factura BRU 413 1828, é acolhido.

167
Não se julgando integralmente procedentes os pedidos principais nos processos T‑215/01 e T‑220/01, há que apreciar os pedidos apresentados a título subsidiário nestes dois processos.


Quanto aos pedidos subsidiários assentes no artigo 235.° CE e no artigo 288.°, segundo parágrafo, CE, nos processos T‑215/01 e T‑220/01

Quanto à admissibilidade

Argumentos das partes

168
A Comissão alega, essencialmente, que, nos processos T‑215/01 e T‑220/01, os pedidos assentes nos artigos 235.° CE e 288.°, segundo parágrafo, CE são inadmissíveis por as petições não satisfazerem os requisitos do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo.

169
Mais precisamente, segundo a Comissão, a demandante não indica, em nenhum destes dois processos, em que medida os alegados incumprimentos da Comissão constituem uma violação suficientemente caracterizada de uma norma superior de direito que protege os particulares e não apresenta qualquer desenvolvimento da questão da existência de nexo de causalidade entre esses pretensos incumprimentos e os prejuízos alegados.

170
Sustenta também que os pedidos de pagamento de encargos financeiros nos montantes de 7 096,37 euros e de 343,93 USD, no processo T‑215/01, bem como o pedido de pagamento da factura BRU 135 964, no processo T‑220/01 carecem de qualquer justificação na petição.

171
A demandante alega, essencialmente, que, em cada um dos dois processos, a petição contém uma exposição sumária dos fundamentos do pedido subsidiário, em conformidade com os requisitos do artigo 44.° do Regulamento de Processo.

172
Sustenta, a este respeito, em cada um dos processos, que a petição quantifica exactamente o dano sofrido como sendo o saldo em dívida das facturas enviadas ao organismo de intervenção pertinente.

173
Cada petição identifica, na opinião da demandante, o comportamento que se censura à Comissão como resultado, por um lado, de erros de concepção e de redacção das condições gerais do fornecimento em causa e, por outro, da falha na organização e no controlo do trabalho dos outros intervenientes no âmbito deste fornecimento, a saber, os organismos de intervenção e os armazéns.

174
A demandante considera que cada petição faz prova da existência de nexo de causalidade entre o dano e o comportamento censurado, precisando que a intervenção e o controlo da Comissão teriam permitido desbloquear as recusas do armazém e do organismo de intervenção pertinentes.

175
Alega ainda, em cada um dos processos, que, ao contrário do que a Comissão sustenta, os diferentes elementos dos pedidos são acompanhados de justificação suficiente, à luz dos requisitos do artigo 44.° do Regulamento de Processo.

Apreciação do Tribunal

176
Tem sido reiteradamente declarado que para preencher os requisitos do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo o pedido de reparação de prejuízos pretensamente causados por uma instituição comunitária, com base em responsabilidade extracontratual da Comunidade deve conter os elementos que permitam identificar o comportamento que a demandante censura à instituição, as razões por que considera existir nexo de causalidade entre o comportamento e o prejuízo que alega ter sofrido, bem como o carácter e a extensão deste prejuízo (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Setembro de 1996, Asia Motor France e o./Comissão, T‑387/94, Colect., p. II‑961, n.° 107, e de 10 de Abril de 2003, Travelex Global and Financial Services e Interpayment Services/Comissão, T‑195/00, Colect., p. II‑1677, n.° 27).

177
Nos processos T‑215/01 e T‑220/01, a petição identifica o comportamento censurado à Comissão como sendo uma concepção e uma organização defeituosas do fornecimento, dado que esta instituição não previu os casos de carências, falhas, ou má vontade dos armazéns e dos organismos de intervenção.

178
Além disso, cada petição identifica os danos sofridos como sendo os custos suplementares incorridos no fornecimento do transporte das mercadorias em questão.

179
Quanto ao nexo de causalidade entre o comportamento censurado e prejuízo alegado, há que constatar, em cada um dos dois processos, que a petição é omissa. Observe‑se, a este respeito, que, ao contrário do que a demandante sustenta (v. n.° 174, supra), nenhuma das petições indica que o nexo de causalidade resulta de o controlo e a intervenção da Comissão teriam permitido desbloquear a recusa do armazém e do organismo de intervenção pertinentes. De qualquer modo, ainda que o texto de cada petição pudesse ser interpretado no sentido de conter tal indicação, esta não poderia ser considerada a demonstração da existência de nexo de causalidade entre o comportamento censurado e os danos efectivamente alegados.

180
Nestas condições, deve considera‑se que, no que respeita aos pedidos subsidiários, assentes nos artigos 235 CE e 288.°, segundo parágrafo, CE, nenhuma das petições satisfaz os requisitos do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo. Os pedidos apresentados a título subsidiário nos processos T‑215/01 e T‑220/01 devem pois ser julgados inadmissíveis.


Quanto às despesas

181
Por força do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se tal tiver sido requerido. Nos termos do n.° 3 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, o Tribunal pode repartir as despesas ou decidir que cada parte suportará as suas se forem vencidas, respectivamente, num ou vários dos seus pedidos.

182
No processo T‑215/01, tendo a acção sido julgada parcialmente procedente, far‑se‑á justa apreciação das circunstâncias do caso decidindo que a demandante suportará um terço das suas despesas e um terço das despesas da Comissão e que esta suportará dois terços das suas despesas e dois terços das despesas da demandante.

183
No processo T‑220/01, tendo a demandante sido vencida, deve ser condenada na totalidade das despesas, nos termos do pedido da Comissão.

184
No processo T‑221/01, é certo que a acção foi julgada procedente. Porém, há que recordar que a demandante desistiu parcialmente do pedido na parte em que visava o pagamento da factura BRU 413 1828 , no montante de 23 115,49 euros. Nestas condições, as circunstâncias do caso serão devidamente apreciadas decidindo que a demandante suportará um quarto das suas despesas e um quarto das despesas da Comissão e que esta suportará três quartos das suas despesas e três quartos das despesas da demandante.


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)
No processo T‑215/01, a Comissão é condenada a pagar à demandante o montante de 7 194,24 euros e o montante de 23 072,89 USD, ambos acrescidos de juros de mora a partir de 16 de Maio de 2001 e até integral pagamento. A taxa de juro a aplicar é calculada com base na taxa fixada pelo Banco Central Europeu para as operações principais de refinanciamento, aplicável no período em causa, acrescida de dois pontos.

2)
A acção no processo T‑215/01 é julgada improcedente quanto ao restante.

3)
A demandante suportará, no processo T‑215/01, um terço das suas despesas e um terço das despesas da Comissão e esta suportará dois terços das suas despesas e dois terços das despesas da demandante.

4)
A acção no processo T‑220/01 é julgada improcedente.

5)
A demandante é condenada na totalidade das despesas do processo T‑220/01.

6)
No processo T‑221/01, a Comissão é condenada a pagar à demandante o montante de 25 761,11 USD, acrescido de juros de mora, a partir de 3 de Agosto de 2001 e até integral pagamento. A taxa de juro a aplicar é calculada com base na taxa fixada pelo Banco Central Europeu para as operações principais de refinanciamento, aplicável no período em causa, acrescida de dois pontos.

A demandante suportará, no processo T‑221/01, um quarto das suas despesas e um quarto das despesas da Comissão e esta suportará três quartos das suas despesas e três quartos das despesas da demandante.

Forwood

Pirrung

Meij

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de Fevereiro de 2004.

O secretário

O presidente

H. Jung

N. J. Forwood

Índice

Quadro regulamentar

    Disposições pertinentes nos processos T‑215/01, T‑220/01 e T‑221/01

    Outras disposições pertinentes nos processos T‑215/01 e T‑221/01

    Outras disposições pertinentes no processo T‑220/01

Matéria de facto na origem dos litígios

    No processo T‑215/01

    No processo T‑220/01

    No processo T‑221/01

Tramitação processual

Pedidos das partes

Quanto aos pedidos principais baseados no artigo 238.° CE

    Quanto à admissibilidade

        Argumentos das partes

            – Quanto ao fundamento de inadmissibilidade assente na inexistência de relação contratual entre as partes

            – Quanto ao fundamento de inadmissibilidade assente na não conformidade das petições com o disposto no artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo

        Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

            – Quanto ao fundamento de inadmissibilidade assente na inexistência de relação contratual entre as partes

            – Quanto ao fundamento de inadmissibilidade assente na não conformidade das petições com o disposto no artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo

    Quanto ao mérito

        Argumentos das partes

        Apreciação do Tribunal

            – No processo T‑215/01

            – No processo T‑220/01

            – No processo T‑221/01

    Conclusão sobre os pedidos principais baseados no artigo 238.° CE

Quanto aos pedidos subsidiários assentes no artigo 235.° CE e no artigo 288.°, segundo parágrafo, CE, nos processos T‑215/01 e T‑220/01

    Quanto à admissibilidade

        Argumentos das partes

        Apreciação do Tribunal

Quanto às despesas



1
Língua do processo: francês.