Language of document : ECLI:EU:T:2021:669

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Nona Secção alargada)

6 de outubro de 2021 (*)

«Política económica e monetária — Supervisão prudencial das instituições de crédito — Atribuições específicas de supervisão conferidas ao BCE — Decisão de revogar a autorização de uma instituição de crédito — Violação da legislação de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo — Admissibilidade — Competências das Autoridades Nacionais Competentes (ANC) dos Estados‑Membros participantes e do BCE no Mecanismo Único de Supervisão (MUS) — Igualdade de tratamento — Proporcionalidade — Proteção da confiança legítima — Segurança jurídica — Desvio de poder — Direitos de defesa — Dever de fundamentação»

Nos processos T‑351/18 e T‑584/18,

Ukrselhosprom PCF LLC, com sede em Solone (Ucrânia),

Versobank AS, com sede em Tallinn (Taline, Estónia),

representados por O. Behrends, advogado,

recorrentes,

contra

Banco Central Europeu (BCE), representado por C. Hernández Saseta e G. Marafioti, na qualidade de agentes, assistidas por B. Schneider, advogado,

recorrido,

apoiado por

Comissão Europeia, representada por A. Steiblytė, D. Triantafyllou e A. Nijenhuis, na qualidade de agentes,

interveniente,

que tem por objeto um pedido apresentado ao abrigo do artigo 263.o TFUE por meio do qual é pedida a anulação, em primeiro lugar, da Decisão ECB_SSM_2018_EE_1 WHD_2017‑0012 do BCE, de 26 de março de 2018, em segundo lugar, da Decisão ECB_SSM_2018_EE_2 WHD_2017‑0012, de 17 de julho de 2018, que substituiu a Decisão ECB_SSM_2018_EE_1 WHD_2017‑0012, através das quais o BCE revogou a autorização bancária concedida ao Versobank, e, em terceiro lugar, da Decisão ECB/SSM/2018‑EE‑3, de 14 de agosto de 2018, relativa às despesas atinentes ao processo de reexame,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção alargada),

composto por: M. J. Costeira (relatora), presidente, D. Gratsias, M. Kancheva, B. Berke e T. Perišin, juízes,

secretário: P. Cullen, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 25 de setembro de 2020,

profere o presente

Acórdão

I.      Antecedentes do litígio

1        O Versobank AS, segunda recorrente, é uma instituição de crédito estabelecida na Estónia. O seu principal acionista é a Ukrselhosprom PCF LLC, primeira recorrente, que detém 85,2622 % do seu capital.

2        A segunda recorrente estava classificada como instituição menos significativa na aceção do artigo 6.o do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao BCE atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63, a seguir «Regulamento MUS de base»).

3        Enquanto instituição de crédito menos significativa, a segunda recorrente estava colocada sob a supervisão prudencial da Finantsinspektsioon (FSA, Estónia), que atuava na qualidade de autoridade nacional competente (ANC), na aceção do artigo 2.o, n.o 2, do Regulamento MUS de base. Além disso, esta última era também competente para supervisionar o respeito das regras em matéria de luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo (a seguir «LBC/FT»).

4        A partir de 2015, a FSA verificou de forma recorrente que a segunda recorrente cometia infrações relacionadas, por um lado, com a ineficácia do seu regime em matéria LBC/FT no que toca à gestão dos riscos decorrentes do seu modelo de empresa e, por outro, com a inadequação dos seus sistemas de governação implementados na matéria.

5        A FSA efetuou diversas inspeções in situ. A primeira teve lugar entre 13 de abril e 12 de junho de 2015.

6        Por as violações observadas se terem reiterado, a FSA, depois de por diversas vezes ter instado a segunda recorrente a dar cumprimento às exigências regulamentares, adotou uma recomendação, datada de 8 de agosto de 2016.

7        A recomendação em causa, que impunha a correção imediata das deficiências observadas quando da inspeção no local realizada em 2015, exigia que a segunda recorrente adotasse determinadas medidas: em primeiro lugar, aplicação das políticas e dos procedimentos internos existentes em matéria de LBC/FT, mas não corretamente implementadas, em segundo lugar, aplicação das medidas de monitorização previstas no artigo 13.o, n.o 1, pontos 3 a 5, da Rahapesu ja terrorismi rahastamise tõkestamise seadus (Lei estónia em matéria de LBC/FT), de 19 de dezembro de 2007, que transpôs a Diretiva (UE) 2015/849 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo, que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, e que revoga a Diretiva 2005/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e a Diretiva 2006/70/CE da Comissão (JO 2015, L 141, p. 73), na versão que se encontrava em vigor no momento em que ocorreram os factos em causa no presente processo, em terceiro lugar, verificação da correta aplicação das medidas de monitorização previstas no artigo 13.o, n.o 1, pontos 3 a 5, da Lei estónia em matéria de LBC/FT, em quarto lugar, recusa de executar transações se o artigo 27.o, n.o 2, desta lei, na versão que se encontrava em vigor no momento em que ocorreram os factos em causa no presente processo, a obrigasse a exercer esse direito e, em quinto lugar, cumprimento imediato da obrigação de notificação constante do artigo 32.o da referida lei, na versão que se encontrava em vigor no momento em que ocorreram os factos em causa no presente processo, que impunha uma obrigação de sinalização no caso de existirem suspeitas de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo quando se encontrassem preenchidos os respetivos requisitos. Além disso, essa recomendação exigia que, o mais tardar até 9 de dezembro de 2016, a referida recorrente apresentasse por escrito informações sobre a forma como pretendia cumprir essas obrigações.

8        A FSA realizou uma segunda inspeção in situ entre 13 de setembro e 11 de novembro de 2016.

9        Além disso, a FSA procedeu a uma terceira inspeção in situ entre 5 de setembro e 14 de novembro de 2016. Essa inspeção tinha por objeto as deficiências identificadas na exploração, pela segunda recorrente, de uma sucursal ou filial pretensamente ilegal na Letónia.

10      Por carta de 9 de dezembro de 2016, a segunda recorrente apresentou à FSA as suas observações escritas sobre a recomendação em causa.

11      Por carta de 28 de fevereiro de 2017, a FSA comunicou à segunda recorrente que esta continuava sem cumprir todas as obrigações previstas na recomendação em causa. Em 10 de abril de 2017, adotou uma declaração de insolvência real ou previsível da referida recorrente (a seguir «decisão FOLTF»).

12      Na sequência das informações enviadas pela segunda recorrente, a FSA entendeu que era necessário proceder a uma investigação aprofundada. Realizou uma quarta inspeção in situ entre 4 e 22 de setembro de 2017. Nesta inspeção, apurou que existiam violações graves e importantes da legislação em matéria de LBC/FT análogas às que haviam sido já detetadas quando das duas anteriores inspeções e concluiu que o sistema de controlo interno da referida recorrente era medíocre e insuficiente.

13      Em 8 de fevereiro de 2018, o BCE recebeu da FSA uma proposta de revogação da autorização da segunda recorrente, ao abrigo do artigo 80.o do Regulamento (UE) n.o 468/2014 do BCE, de 16 de abril de 2014, que estabelece o quadro de cooperação, no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão, entre o BCE e as ANC e com as autoridades nacionais designadas («Regulamento‑Quadro do MUS») (JO 2014, L 141, p. 1).

14      No âmbito da obrigação de cooperação instituída pelo artigo 80.o, n.o 2, do Regulamento‑Quadro do MUS, a FSA atuou, ao abrigo do artigo 3.o da Finantskriisi ennetamise ja lahendamise seadus (Lei estónia Relativa à Prevenção e Resolução das Ccrises Financeiras), de 18 de fevereiro de 2015, também na qualidade de autoridade nacional competente para a resolução de instituições de crédito, através do seu departamento de resolução. Em 7 de fevereiro de 2018, o seu conselho de administração aprovou a avaliação feita pelo referido departamento de resolução segundo a qual não havia interesse geral para exercer os poderes de resolução, ao abrigo do artigo 39.o, n.os 1, 3 e 4, da referida lei, que transpôs o artigo 32.o, n.o 1, alínea c), e n.o 5, da Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho, e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/CE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos (UE) n.o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2014, L 173, p. 190).

15      Em 6 de março de 2018, o Conselho de Supervisão do BCE aprovou o projeto de decisão de revogação da autorização da segunda recorrente e concedeu‑lhe um prazo para apresentar as suas observações sobre o referido projeto, em conformidade com o disposto no artigo 31.o do Regulamento‑Quadro do MUS. Após a revogação da autorização, foi encetado o processo de liquidação da referida recorrente tendo‑se procedido à nomeação dos administradores judiciais.

16      Em 14 de março de 2018, a segunda recorrente apresentou as suas observações, que foram tidas em consideração no âmbito da decisão definitiva. Depois de ter examinado as referidas observações, o BCE concluiu que era necessário retirar a autorização à referida recorrente.

17      Ao abrigo do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), e do artigo 14.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base, do artigo 83.o do Regulamento‑Quadro do MUS e do artigo 17.o da Krediidiasutuste seadus (Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito) de 9 de fevereiro de 1999, que transpõe a Diretiva 2013/36/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e à supervisão prudencial das instituições de crédito e empresas de investimento, que altera a Diretiva 2002/87/CE e revoga as Diretivas 2006/48/CE e 2006/49/CE (JO 2013, L 176, p. 338), o BCE adotou e notificou à segunda recorrente a sua Decisão de 26 de março de 2018, de lhe retirar a autorização (a seguir «Decisão de 26 de março de 2018»).

18      Em 27 de março de 2018, o órgão jurisdicional estónio competente tomou a decisão de dar início ao processo de liquidação da segunda recorrente.

19      Em 26 de abril de 2018, a Comissão de Reexame de natureza administrativa do BCE (a seguir «CRNA») recebeu um pedido da primeira recorrente por meio do qual esta solicitava a revisão da Decisão de 26 de março de 2018. A referida comissão considerou que esse pedido de revisão era admissível porque a mencionada decisão dizia direta e individualmente respeito à referida recorrente.

20      Em 22 de junho de 2018, a CRNA adotou e comunicou ao Conselho de Supervisão do BCE o parecer AB/2018/03 no qual lhe propunha que considerasse que as violações substanciais e processuais invocadas não tinham fundamento e adotasse uma decisão de conteúdo idêntico ao da Decisão de 26 de março de 2018.

21      O Conselho do BCE concordou com este parecer e adotou a Decisão de 17 de julho de 2018 (a seguir «Decisão de 17 de julho de 2018») que foi notificada aos administradores judiciais da segunda recorrente, que entretanto entrada em processo de liquidação.

22      Através da Decisão de 26 de março de 2018, o BCE retirou à segunda recorrente a autorização de instituição de crédito. Através da Decisão de 17 de julho de 2018, revogou e substituiu a sua Decisão de 26 de março de 2018. Através de uma decisão sobre as despesas, também condenou a primeira recorrente a suportar as despesas do processo de reexame.

23      No ponto 3.2 da Decisão de 17 de julho de 2018, o BCE recorda, em primeiro lugar, que foi no termo de um longo e ininterrupto período de deficiências e violações cometidas pela segunda recorrente às disposições aplicáveis que a proposta de revogação da sua autorização de acesso às atividades de instituição de crédito foi adotada, em segundo lugar, que a ANC tinha realizado quatro inspeções in situ após 2015 e tinha adotado uma recomendação em 2016 e, em terceiro lugar, uma vez que a referida recorrente não tinha dado cumprimento nem aos pedidos informais nem à recomendação em causa, não lhe era possível formular uma apreciação positiva quanto à possibilidade de no futuro esta recorrente respeitar as exigências regulamentares que lhe eram impostas.

24      Ainda no ponto 3.2 da Decisão de 17 de julho de 2018, o BCE entendeu que, com base nas provas recolhidas e nos resultados das inspeções in situ efetuadas pela FSA, havia que considerar, relativamente à segunda recorrente, que estavam preenchidos os requisitos de revogação da autorização previstos no artigo 18.o, alínea f), da Diretiva 2013/36, conforme transposta para o ordenamento jurídico estónio. Foram os seguintes os fundamentos de tal revogação da autorização:

–        inexistência, na referida recorrente, dos dispositivos de governação exigidos pela FSA, em conformidade com as disposições nacionais de transposição do artigo 74.o da Diretiva 2013/36;

–        inexistência, na referida recorrente, de um regime eficaz em matéria de LBC/FT para gerir os riscos decorrentes do seu modelo de empresa, não obstante terem sido realizadas três inspeções in situ a respeito desta matéria, diversas reuniões e terem sido emitidas advertências, a recomendação em causa e ter sido enviada uma carta sobre o não cumprimento da referida recomendação;

–        o não cumprimento, pela mesma recorrente, desta recomendação dentro do prazo e na medida definidos;

–        a apresentação, pela recorrente em questão, de documentos e informações enganosos e inexatos à FSA e a violação, pela mesma recorrente, das condições previstas na legislação de um Estado‑Membro do Espaço Económico Europeu (isto é, a República da Letónia).

25      Em especial, no que respeita ao primeiro fundamento que esteve na base da revogação da autorização, ou seja, ao facto de não existirem, na segunda recorrente, os sistemas de governo exigidos pela FSA, em conformidade com as disposições nacionais de transposição do artigo 74.o da Diretiva 2013/36, o BCE esclareceu, no ponto 3.3.1, alínea a), da Decisão de 17 de julho de 2018, que o sistema de controlos era deficiente e inadequado atento o tipo, as finalidades e a complexidade do modelo de empresa da referida recorrente.

26      Quanto ao segundo fundamento que esteve na base da revogação da autorização, o BCE especificou, no ponto 3.3.1, alínea b), da Decisão de 17 de julho de 2018, que o modelo de negócio da segunda recorrente estava centrado na prestação de serviços a clientes profissionais não residentes com elevado património líquido e que, no decurso das três primeiras inspeções in situ realizadas pela FSA entre 2015 e 2017, tinha sido observado um número importante de transações inabituais.

27      Além disso, segundo o BCE, as atividades do Conselho de Administração e do Conselho de Supervisão da segunda recorrente em matéria de LBC/FT e de gestão dos riscos haviam sido consideradas insatisfatórias, pois o referido Conselho de Administração não tinha determinado o nível de tolerância de risco da referida recorrente, não tinha posto em prática um sistema autónomo de avaliação dos riscos nessa matéria, nem tinha preparado uma análise dos riscos operacionais, que incluísse uma análise aprofundada dos riscos na referida matéria, em violação do artigo 55.o, n.o 2, pontos 2 e 3, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito.

28      Assim, segundo o BCE, a segunda recorrente não dispunha dos sistemas de governação exigidos pelo artigo 67.o, n.o 1, alínea o), da Diretiva 2013/36 e preenchia assim o requisito para ficar sujeita a uma revogação da autorização, prevista no artigo 18.o, alínea f), da mesma diretiva. Além disso, atendendo ao anterior desempenho da referida recorrente, compartilhou da opinião da FSA segundo a qual seria altamente improvável que o novo Conselho de Administração desta recorrente, o quarto desde 2015, pusesse em prática de forma séria as alterações anunciadas a respeito do seu sistema de gestão dos riscos em matéria de LBC/FT.

29      Quanto ao terceiro fundamento que esteve na base da revogação da autorização, o BCE observou, no ponto 3.3.1, alínea c), da Decisão de 17 de julho de 2018, que a segunda recorrente não tinha dado cumprimento da recomendação em causa dentro do prazo fixado, isto é, até 9 de dezembro de 2016. Em seu entender, através da referida recomendação, a FSA obrigava, em especial, a referida recorrente a, em primeiro lugar, aplicar as regras processuais, em segundo lugar, passar a aplicar corretamente o artigo 13.o, n.o 1, pontos 3 a 5 da Lei estónia em matéria de LBC/FT, na versão em vigor no momento da adoção dessa recomendação, e evitar encetar relações comerciais quando isso fosse necessário, em terceiro lugar, verificar se as referidas disposições tinham sido corretamente aplicadas às relações comerciais existentes e, se necessário, aplicar de novo as medidas de monitorização em relação à clientela, em quarto lugar, evitar, se fosse caso disso, efetuar transações ao abrigo do artigo 27.o, n.o 2, da referida lei, na versão em vigor no momento da adoção da recomendação em causa, em quinto lugar, informar a unidade de informação financeira quando uma atividade ou outras circunstâncias pudessem constituir um indício da realização, ou da tentativa de realização, de branqueamento de capitais ou de um financiamento de terrorismo, ou quando essa recorrente tivesse motivos para crer ou soubesse que se tratava de branqueamento de capitais ou de financiamento de terrorismo e, em sexto lugar, fornecer à FSA um relatório das ações levadas a cabo para cumprir as obrigações acima indicadas. Porém, quando da terceira inspeção in situ, a FSA observou que as referidas obrigações não tinham sido inteiramente respeitadas e que as deficiências apontadas subsistiam. Por conseguinte, o BCE concluiu que o incumprimento da recomendação em questão constituía outro fundamento passível de justificar a revogação da autorização, nos termos do artigo 18.o, alínea f), da Diretiva 2013/36.

30      Quanto ao quarto fundamento que esteve na base da revogação da autorização, o BCE sublinhou, no ponto 3.3, alínea d), da Decisão de 17 de julho de 2018, que a segunda recorrente tinha fornecido informações e documentos enganosos e inexatos à FSA respeitantes às suas atividades na Letónia quando afirmou, por um lado, que aí não possuía nenhuma filial e quando indicou, por outro, na sua Comunicação de 9 de fevereiro de 2016 à referida ANC que tinha encerrado o seu estabelecimento na Letónia, quando na verdade este ainda estava operacional. Segundo afirma, os resultados da inspeção in situ realizada por esta ANC entre 5 de setembro e 14 de novembro de 2016 tinham, na realidade, demonstrado que a referida recorrente prestara ininterruptamente serviços financeiros na Letónia desde outubro de 2013. Observou que, de acordo com as informações transmitidas pela autoridade nacional letã de supervisão à FSA, esta recorrente tinha criado a sua «filial» na Letónia em violação das disposições legislativas letãs, que transpuseram os artigos 35.o a 38.o da Diretiva 2013/36, relativa ao procedimento de «passaporte». Segundo entende, semelhante comportamento consubstancia uma violação do artigo 17.o, n.o 1, pontos 2 e 15, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito. O BCE chegou assim à conclusão de que as referidas atuações constituíam mais um motivo para a revogação da autorização, nos termos do artigo 18.o, alínea e), da referida diretiva.

31      No que se refere ao exame da proporcionalidade da revogação da autorização e, em primeiro lugar, à adequação de tal revogação, o BCE sublinhou que o objetivo da revogação da autorização concedida a uma instituição de crédito era o de pôr termo às violações das disposições legais aplicáveis cometidas por esta e que a necessidade de que tal instituição pusesse em prática um sistema de governação adequado decorria do facto de as anomalias de semelhante sistema poderem conduzir à falência da mesma instituição e a problemas sistémicos tanto nos Estados‑Membros como a nível global. Considerou que, atendendo a que as violações da legislação antibranqueamento que eram imputadas à segunda recorrente existiam há já muito tempo, a FSA devia intervir e que, no caso concreto, esta tinha começado por adotar uma recomendação, e que só depois de esta ter sido violada tinha sido proposto revogar a autorização, devendo, nessas circunstâncias, considerar‑se que a revogação era uma medida adequada e proporcional. O BCE considerou que a referida medida era igualmente adequada atendendo à violação do procedimento de comunicação, dito «de passaporte», que devia ser respeitado para efeitos do estabelecimento de uma sucursal noutro Estado‑Membro.

32      Em segundo lugar, no que respeita ao exame da necessidade da revogação da autorização, o BCE atendeu não apenas à gravidade das violações observadas, mas também a todas as medidas menos gravosas que já tinham sido tomadas para remediar as falhas imputáveis à segunda recorrente. Atendendo ao comportamento ilegal reiterado da referida recorrente, às informações incorretas que esta forneceu sobre as suas atividades na Letónia bem como à ineficácia da importante ação de supervisão e de inspeção já realizada pela FSA, considerou, depois de ter analisado não apenas as ações empreendidas pela FSA, mas também todas as outras medidas disponíveis ao abrigo da legislação nacional aplicável, isto é, a Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito, que não existiam outras medidas menos gravosas suscetíveis de serem eficazes no restabelecimento da legalidade.

33      Em especial, o BCE considerou que a opção da venda forçada (liquidação) da segunda recorrente não era juridicamente possível. Em seguida, elencou as diferentes medidas analisadas, sublinhando as razões pelas quais considerava que não eram eficazes para efeitos do restabelecimento da legalidade. Primeiro, não se considerou que uma nova alteração da composição do conselho de administração da referida recorrente fosse uma medida eficaz, pois, em primeiro lugar, essa recorrente já tinha procedido a diversas alterações de conselho de administração sem que isso tivesse produzido efeitos em termos de cumprimento das obrigações legais em causa, em segundo lugar, esta mesma recorrente tinha por diversas vezes anunciado, a partir de 2015, uma alteração de estratégia comercial sem que esses anúncios tivessem sido acompanhados de factos concretos, em terceiro lugar, ao abrigo do direito estónio, embora o conselho de administração tenha poder para influenciar a estratégia comercial de uma instituição de crédito, não tem poder para a definir de forma autónoma, estando a sua responsabilidade limitada à direção da atividade corrente do referido estabelecimento, em quarto lugar, no presente caso, as hipóteses de que uma alteração do conselho de administração acarretasse uma alteração da estratégia eram diminutas, porquanto as duas posições‑chave nesse conselho são ocupadas pelos dois principais acionistas da instituição de crédito, que estavam em condições de influenciar informalmente a estratégia e de manter assim o statu quo.

34      Segundo, no que respeita à cessação ou suspensão dos direito de voto de certos acionistas, ao abrigo da disposição de direito estónio que transpôs o artigo 26.o, n.o 2, de Diretiva 2013/36, o BCE sublinhou que porque a composição acionista da segunda recorrente era muito concentrada, essa medida teria por consequência abandonar a gestão do banco nas mãos de acionistas que detinham participações minoritárias, que tinham um menor nível de envolvimento no desempenho da instituição de crédito e que, além disso, estavam muito vinculados aos acionistas maioritários através de laços familiares ou de interesses financeiros comuns, o que se poderia vir a traduzir numa influência indireta desses mesmos acionistas na direção estratégica da referida recorrente, não obstante a medida adotada.

35      Terceiro, relativamente à adoção de outra recomendação que proibisse a segunda recorrente de prestar serviços financeiros, pelo menos aos clientes não residentes de elevado risco, o BCE considerou essa medida desadequada pois, por um lado, a não execução da anterior recomendação suscitava questões quanto à capacidade e à vontade da referida recorrente em cumprir uma eventual segunda recomendação e, por outro, a restrição das atividades do banco causar‑lhe‑ia perdas operacionais mensais muito elevadas, que poriam em prego a sua liquidez e assim as poupanças dos clientes.

36      Quarto, no que respeita à liquidação por iniciativa própria, o BCE reconheceu que a segunda recorrente tinha proposto essa solução no âmbito das suas observações sobre o projeto de decisão de 26 de março de 2018, que essa possibilidade existia ao abrigo do direito estónio, e que essa solução teria fosse como fosse levado à revogação da autorização, mas que, porém, decidira não optar por essa via, pois, antes de mais, a liquidação por iniciativa própria teria encoberto as razões de fundo que levaram a FSA a propor a revogação da autorização, segundo, a revogação da autorização baseava‑se no artigo 16.o, n.o 3, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito e não no seu artigo 17.o, terceiro, a liquidação por iniciativa própria teria veiculado uma visão incorreta da gravidade das violações do direito aplicável cometidas pela referida recorrente, as quais, segundo o BCE, justificavam uma revogação coerciva da autorização e, quarto, por força do artigo 20.o, n.o 5, da Diretiva 2013/36, a notificação da revogação da autorização deve abranger não apenas a própria revogação, mas também os fundamentos em que se baseia.

37      Quinto, no que respeita à aquisição por outra sociedade estónia, o BCE não acolheu esta solução, pois, por um lado, esta não apresentou nenhuma prova documental da existência de um compromisso concreto por parte de qualquer um dos investidores e, por outro, o projeto de plano de empresa apresentado pela segunda recorrente não fornecia informações suficientes para se determinar se a transação conduziria a uma alteração da estratégia comercial. Além disso, não obstante o prazo suplementar concedido à referida recorrente para apresentar a documentação, esta não forneceu as informações necessárias.

38      Em terceiro lugar, no que toca ao exame da razoabilidade da revogação da autorização, o BCE considerou que, atenta a gravidade e a duração das violações, por a segunda recorrente ter reiterado o seu comportamento ilegal não obstante as diversas advertências que recebeu e o prejuízo que o seu comportamento causou à confiança geral no sistema financeiro estónio e europeu, o interesse público no restabelecimento da legalidade primava sobre os interesses privados da referida recorrente em que a sua autorização não fosse revogada.

39      Quanto à compatibilidade da revogação da autorização com o princípio da proteção da confiança legítima, o BCE considerou que a segunda recorrente não podia invocar este princípio, pois, primeiro, tinha recebido várias advertências em diversas ocasiões (quatro inspeções in situ, uma recomendação e diversas advertências) sem tomar as medidas adequadas para pôr termo ao seu comportamento ilegal, segundo, a FSA nunca lhe deu indicações de que a sua autorização não seria revogada e, terceiro, ninguém podia invocar a confiança legítima em ter ou em manter um comportamento ilegal.

40      Atendendo a tudo o que precede, o BCE concluiu que existiam motivos, ao abrigo do artigo 18.o da Diretiva 2013/36, para revogar a autorização da segunda recorrente e que essa medida devia ser considerada proporcionada (adequada, necessária e razoável), dadas as circunstâncias do caso concreto e o princípio da proteção da confiança legítima.

II.    Tramitação dos processos e pedido das partes

A.      Início do processo e pedidos das partes no processo T351/18

41      Por petição que deu entrada na secretaria do Tribunal Geral em 5 de junho de 2018, as recorrentes interpuseram um recurso.

42      O BCE apresentou a sua contestação em 21 de setembro de 2018.

43      Por requerimento apresentado na secretaria do Tribunal Geral em 9 de outubro de 2018, a Comissão Europeia pediu para intervir em apoio do BCE.

44      Por Decisão de 26 de novembro de 2018, o presidente da Segunda Secção do Tribunal Geral deferiu o pedido de intervenção.

45      As recorrentes apresentaram a réplica em 12 de dezembro de 2018. O BCE apresentou a tréplica em 18 de fevereiro de 2019.

46      A Comissão apresentou o articulado de intervenção em 20 de dezembro de 2018. As recorrentes apresentaram as suas observações sobre o referido articulado em 25 de fevereiro de 2019.

47      Por requerimento apresentado na secretaria do Tribunal Geral em 1 de abril de 2019, as recorrentes solicitaram a marcação de audiência, a audição das testemunhas e a adoção de determinadas diligências de instrução.

48      Por ato que deu entrada na secretaria do Tribunal Geral em 29 de abril de 2019, o BCE e a Comissão apresentaram as suas observações sobre o pedido de audição das testemunhas e de diligências de instrução apresentado pelas recorrentes.

49      As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão de 26 de março de 2018;

–        condenar o BCE nas despesas.

50      O BCE conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso inadmissível no que respeita à primeira recorrente;

–        a título subsidiário, julgar o recurso improcedente no que respeita à primeira recorrente;

–        julgar o recurso improcedente no que respeita à segunda recorrente;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

51      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso inadmissível no que respeita à primeira recorrente;

–        de qualquer modo, julgar o recurso improcedente;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

B.      Início do processo e pedidos das partes no processo T584/18

52      Por petição que deu entrada na secretaria do Tribunal Geral em 27 de setembro de 2018, as recorrentes interpuseram um recurso.

53      O BCE apresentou a sua contestação em 20 de dezembro de 2018.

54      Por requerimento apresentado na secretaria do Tribunal Geral em 23 de janeiro de 2019, a Comissão pediu para intervir em apoio do BCE.

55      Por Decisão de 25 de fevereiro de 2019, o presidente da Segunda Secção do Tribunal Geral deferiu o pedido de intervenção.

56      As recorrentes apresentaram a réplica em 28 de março de 2019. O BCE apresentou a tréplica em 3 de junho de 2019.

57      A Comissão apresentou o articulado de intervenção em 5 de abril de 2019. As recorrentes apresentaram as suas observações sobre o referido articulado em 27 de maio de 2019.

58      As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a Decisão de 17 de julho de 2018;

–        anular a decisão sobre as despesas;

–        condenar o BCE nas despesas.

59      O BCE conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso inadmissível no que respeita à primeira recorrente;

–        a título subsidiário, julgar o recurso improcedente no que respeita à primeira recorrente;

–        julgar o vigésimo quinto fundamento inadmissível, porquanto foi suscitado pela segunda recorrente;

–        julgar o recurso improcedente no que respeita à segunda recorrente, inclusive no que respeita ao vigésimo quinto fundamento, caso o Tribunal Geral não o declare inadmissível;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

60      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso inadmissível no que respeita à primeira recorrente;

–        de qualquer modo, julgar o recurso improcedente;

–        condenar as recorrentes nas despesas.

61      No âmbito dos respetivos articulados, as recorrentes formularam pedidos de diligências de instrução e, designadamente, um pedido de apresentação de diversos documentos e um pedido de audição de testemunhas.

C.      Continuação do processo nos dois processos

62      Tendo a composição das Secções do Tribunal Geral sido alterada, nos termos do artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, o juiz relator ficou afeto à Nona Secção, à qual foram consequentemente atribuídos os presentes processos.

63      Mediante proposta da Nona Secção, o Tribunal Geral decidiu, em 5 de fevereiro de 2020, ao abrigo do artigo 28.o do Regulamento de Processo, remeter os presentes processos a uma Secção alargada.

64      Mediante proposta do juiz relator, o Tribunal Geral (Nona Secção alargada) decidiu dar início à fase oral do processo e, no contexto das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, colocou às partes questões por escrito, questões essas a que a Comissão, o BCE e as recorrentes responderam por atos que deram entrada na secretaria do Tribunal Geral em, respetivamente, 13 de março, e 16 e 17 de abril de 2020.

65      Por Decisão de 27 de abril de 2020 do presidente da Nona Secção, os presentes processos foram apensos para efeitos da fase oral do processo.

66      Na audiência de 25 de setembro de 2020, as partes foram ouvidas nas respetivas alegações e nas suas respostas às questões do Tribunal Geral. As partes também foram ouvidas sobre a eventual apensação desses processos para efeitos da decisão que porá termo à instância.

67      Na sequência do falecimento do juiz B. Berke ocorrido em 1 de agosto de 2021, os três juízes cuja assinatura se encontra aposta no presente acórdão prosseguiram as deliberações, em conformidade com o disposto no artigo 22.o e no artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento de Processo.

68      Por Decisão do presidente do Tribunal Geral de 13 de agosto de 2021, o presente processo foi atribuído a um novo juiz relator, que faz parte da Nona Secção.

III. Questão de direito

69      Os processos T‑351/18 e T‑584/18 são apensos para efeitos do acórdão.

A.      Quanto à manutenção do objeto do litígio e do interesse em agir dos recorrentes no processo T351/18

70      Segundo jurisprudência constante, um recurso de anulação interposto por uma pessoa singular ou coletiva só é admissível se esta tiver interesse na anulação do ato recorrido. Semelhante interesse, condição primeira e essencial de qualquer ação judicial, pressupõe que a anulação desse ato possa, por si só, produzir consequências jurídicas e que o resultado do recurso possa, assim, proporcionar um benefício à parte que o interpôs (v. Acórdão de 17 de setembro de 2015, Mory e o./Comissão, C‑33/14 P, EU:C:2015:609, n.os 55 e 58 e jurisprudência referida).

71      O interesse em agir do recorrente deve existir, tendo em conta o objeto do recurso, no momento da sua interposição, sob pena de este ser julgado inadmissível. Este objeto do litígio deve perdurar, assim como o interesse em agir, até à prolação da decisão jurisdicional, sob pena de ser declarada a inutilidade superveniente da lide, o que pressupõe que o recurso possa, pelo seu resultado, conferir um benefício à parte que o interpôs (v. Acórdão de 7 de junho de 2007, Wunenburger/Comissão, C‑362/05 P, EU:C:2007:322, n.o 42 e jurisprudência referida).

72      A questão do não conhecimento do mérito da causa resultante da não manutenção do interesse em agir pode ser suscitada oficiosamente pelos órgãos jurisdicionais da União Europeia (Acórdão de 6 de setembro de 2018, Bank Mellat/Conselho, C‑430/16 P, EU:C:2018:668, n.o 49).

73      A este respeito, o Tribunal Geral, através de uma medida de organização do processo de 3 de março de 2020, solicitou às partes que se pronunciassem sobre a manutenção do interesse em agir das recorrentes na sequência da adoção, pelo BCE, da Decisão de 17 de julho de 2018, segundo a qual este revogou retroativamente a Decisão de 26 de março de 2018.

74      As recorrentes consideram que mantêm o seu interesse em agir no que respeita à Decisão de 26 de março de 2018, na sequência da adoção da Decisão de 17 de julho de 2018. Em primeiro lugar, segundo afirmam, a revogação de uma medida não pode ser sistematicamente equiparada a uma anulação decidida pelo órgão jurisdicional da União porque, por definição, não equivale ao reconhecimento da ilegalidade da decisão. Em segundo lugar, o BCE não podia impedir uma declaração judicial da ilegalidade de uma decisão através da adoção de uma nova decisão e da revogação da anterior. A possibilidade de atuar desta forma poderia consubstanciar um abuso contrário ao Estado de direito. Em terceiro lugar, a alegada e suposta substituição da decisão inicial pela decisão posterior numa qualquer data do passado seria uma ficção incompatível com o direito. Em quarto lugar, as recorrentes indicam que requereram a anulação da Decisão de 26 de março de 2018, nomeadamente para proteger os seus interesses em termos de reputação e por terem interesse em ser financeiramente indemnizadas. A legitimidade destes interesses foi reconhecida no Despacho de 12 de setembro de 2017, Fursin e o./BCE (T‑247/16, não publicado, EU:T:2017:623, n.os 17 a 23), e deste excerto do despacho do Tribunal Geral não foi interposto recurso, pelo que era juridicamente válida. O Tribunal de Justiça confirmou esta parte do despacho do Tribunal Geral. O facto de o Tribunal de Justiça não ter examinado expressamente este aspeto não é relevante. Não era necessário fazê‑lo porque nem o BCE nem a Comissão interpuseram recurso dessa parte do despacho. Em quinto lugar, uma decisão que altera a situação jurídica do destinatário que produza efeitos ex tunc só é possível em circunstâncias muito limitadas, designadamente quando dela resultem efeitos positivos para o destinatário. Por conseguinte, nunca seria possível revogar a autorização com um pretenso efeito anterior à data da decisão.

75      O BCE alega que as recorrentes não têm nenhum interesse que não possa ser satisfeito no âmbito da fiscalização jurisdicional da Decisão de 17 de julho de 2018. Por conseguinte, as recorrentes deixaram de ter interesse em agir contra a Decisão de 26 de março de 2018.

76      Conforme resulta do artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento MUS de base, o BCE institui uma CRNA encarregada de proceder a uma revisão administrativa interna das decisões tomadas pelo BCE no exercício dos poderes que lhe são conferidos pelo referido regulamento. De acordo com o n.o 2 deste artigo, a CRNA é composta por cinco figuras de grande reputação dos Estados‑Membros, com conhecimentos relevantes comprovados e experiência profissional, com exclusão dos atuais funcionários do BCE e dos atuais funcionários das autoridades competentes ou de outras instituições nacionais ou de instituições, órgãos e organismos da União. Através da sua Decisão 2014/360/UE, de 14 de abril de 2014, relativa à instituição de uma Comissão de Reexame e respetivas Regras de Funcionamento (JO 2014, L 175, p. 47), adotada com base no artigo 24.o do Regulamento MUS de base, o BCE instituiu a CRNA.

77      Além disso, resulta do artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento MUS de base, que a revisão administrativa interna das decisões do BCE em matéria de supervisão prudencial comporta três fases. Em primeiro lugar, a CRNA emite um parecer destinado ao Conselho de Supervisão prudencial para ser elaborado um novo projeto de decisão. Em segundo lugar, o Conselho de Supervisão prudencial tem em conta o parecer da CRNA e apresenta o novo projeto de decisão ao Conselho do BCE no prazo previsto no artigo 17.o, n.o 2, da Decisão 2014/360. O novo projeto de decisão «revoga a decisão inicial, substitui essa decisão por outra de conteúdo idêntico, ou substitui a decisão inicial por uma decisão alterada». Em terceiro lugar, o novo projeto de decisão é considerado adotado, salvo se o Conselho do BCE formular objeções no prazo máximo de 10 dias úteis.

78      Por último, nos termos do artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento MUS de base, a revisão administrativa interna tem como objeto a conformidade processual e material, com o referido regulamento, das decisões tomadas pelo BCE no exercício das competências que lhe são conferidas por este regulamento. É certo que, por força do artigo 10.o, n.o 2, da Decisão 2014/360, a CRNA se limita a analisar os fundamentos apresentados pelo requerente conforme figuram no pedido de revisão. Todavia, segundo o artigo 17.o, n.o 1, da mesma decisão, a avaliação do Conselho de Supervisão prudencial não fica limitada ao exame dos fundamentos apresentados pelo requerente no pedido de revisão, podendo igualmente ter em conta outros elementos na sua proposta de novo projeto de decisão.

79      Da leitura conjugada das disposições acima mencionadas nos n.os 76 a 78 resulta que a revisão administrativa interna das decisões tomadas pelo BCE no exercício das competências que lhe são atribuídas pelo Regulamento MUS de base, consideradas no seu conjunto, consiste numa nova e integral avaliação do processo, não limitada aos fundamentos invocados para sustentar o pedido de reexame. Esta especificidade do processo de revisão administrativa encontra‑se espelhada no facto de, por força do artigo 17.o, n.o 1, da Decisão 2014/360, o próprio Conselho de Supervisão prudencial, depois de ter tomado o parecer da CRNA em consideração, instituída para efeitos da revisão das decisões do BCE em condições reforçadas de independência e de perícia (v. n.o 76, supra), estar ele próprio dotado de competência alargada.

80      Neste contexto, o artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento MUS de base, prevê que o processo de revisão pode conduzir a três resultados. O primeiro consiste na revogação pura e simples da decisão inicial. O segundo consiste na substituição da decisão inicial por uma idêntica. O terceiro consiste na substituição da decisão inicial por uma decisão alterada.

81      Pelas razões acima expostas nos n.os 82 a 85, o artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento MUS de base prevê uma obrigação que faz recair sobre o BCE o ónus de fazer retroagir os efeitos da decisão adotada no termo da revisão ao momento da produção dos efeitos da decisão inicial, independentemente do resultado da referida revisão.

82      Em especial, se o Conselho de Supervisão prudencial e o Conselho do BCE considerarem que a decisão inicial, por força da qual se procedeu à revogação da autorização da instituição de crédito, é válida, o Conselho do BCE não procede a um simples indeferimento do pedido de revisão substancial, mas, ao abrigo do artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento MUS de base, à adoção de uma decisão idêntica à que foi objeto da referida revisão. Ora, neste caso, não é concebível que se proceda a uma segunda revogação da mesma autorização. Por conseguinte, a decisão que tem um conteúdo idêntico ao da decisão reexaminada só pode substituir esta última com efeitos retroativos ao momento da produção de efeitos da decisão que é objeto da revisão.

83      Esta interpretação, imposta pela natureza das medidas em causa, também é válida quando o Conselho de Supervisão prudencial e o Conselho do BCE considerem que a revogação da autorização não se justifica ou que é possível remediar as deficiências observadas através de medidas menos gravosas. Com efeito, nesta hipótese, o ato revogatório da revogação da autorização ou que impõe essas medidas tem obrigatoriamente de produzir efeitos retroativos, por forma a suprimir ex tunc a revogação da autorização da instituição de crédito e, eventualmente, substituí‑la por uma medida considerada mais adequada. Não se produzindo tal efeito retroativo, a decisão proferida após a revisão só poderia produzir os seus efeitos se houvesse atribuição de uma nova autorização, de acordo com o procedimento previsto no artigo 14.o do Regulamento MUS de base.

84      Esta apreciação é, indireta mas necessariamente, confirmada pelo artigo 24.o, n.o 8, do Regulamento MUS de base bem como pelo artigo 9.o, n.o 1, da Decisão 2014/360, segundo os quais o pedido de revisão não tem efeito suspensivo relativamente à aplicação da decisão em causa. Daqui resulta que a substituição da decisão revista por uma decisão alterada deve retroagir ao momento em que a decisão revista produziu os seus efeitos, sob pena de a decisão final não poder produzir o seu efeito útil.

85      Resulta igualmente da análise que precede que da substituição da decisão inicial por uma decisão idêntica ou alterada no termo do processo de revisão resulta o desaparecimento definitivo da decisão inicial do ordenamento jurídico.

86      No presente caso, por um lado, de acordo o preâmbulo da Decisão de 26 de março de 2018, o ato impugnado no processo T‑351/18, essa decisão produziu efeitos às 23 horas do dia da sua notificação à segunda recorrente, em conformidade com o disposto no artigo 297.o, n.o 2, terceiro parágrafo, TFUE. Por outro lado, segundo o preâmbulo da Decisão de 17 de julho de 2018, ou seja, o ato impugnado no processo T‑584/18, «a decisão [de 26 de março de 2018] é revogada e substituída pela presente decisão com efeitos a partir das 23 horas da data em que teve lugar a notificação da Decisão [de 26 de março de 2018]».

87      A Decisão de 17 de julho de 2018 foi adotada no termo da revisão administrativa solicitada em relação à Decisão de 26 de março de 2018 e tem conteúdo idêntico a esta, na aceção do artigo 24.o, n.o 7, do Regulamento MUS de base.

88      Consequentemente, com a Decisão de 17 de julho de 2018, o BCE procedeu, em conformidade com o quadro jurídico que rege o processo de revisão administrativa (v. n.os 76 a 81, supra), à substituição da Decisão de 26 de março de 2018 com efeitos que se retroagem ao momento em que esta produziu os seus efeitos e não, como parecem sustentar as recorrentes, à sua simples revogação com efeitos para o futuro.

89      Ora, o desaparecimento do objeto do litígio pode resultar designadamente da revogação ou da substituição do ato impugnado no decurso da instância (v., neste sentido, Acórdão de 1 de junho de 1961, Meroni e o./Alta Autoridade, 5/60, 7/60 e 8/60, EU:C:1961:10, p. 211 a 213; Despachos de 17 de setembro de 1997, Antillean Rice Mills/Comissão, T‑26/97, EU:T:1997:131, n.os 14 e 15, e de 12 de janeiro de 2011, Terezakis/Comissão, T‑411/09, EU:T:2011:4, n.o 15).

90      Com efeito, um ato que é revogado e substituído desaparece completamente e ex tunc da ordem jurídica da União, pelo que um acórdão que anulasse o ato revogado não teria nenhuma consequência jurídica suplementar relativamente às consequências da revogação operada (v., neste sentido, Despachos de 28 de maio de 1997, Proderec/Comissão, T‑145/95, EU:T:1997:74, n.o 26; de 6 de dezembro de 1999, Elder/Comissão, T‑178/99, EU:T:1999:307, n.o 20, e de 9 de setembro de 2010, Phoenix‑Reisen e DRV/Comissão, T‑120/09, não publicado, EU:T:2010:381, n.o 23).

91      Daqui resulta que, em caso de revogação do ato impugnado, o recorrente não conserva nenhum interesse em obter a sua anulação e o recurso interposto desse ato fica desprovido de objeto, pelo que o Tribunal Geral não tem de se pronunciar (Acórdão de 1 de junho de 1961, Meroni e o./Alta Autoridade, 5/60, 7/60 e 8/60, EU:C:1961:10, pp. 211 a 213; Despachos de 6 de dezembro de 1999, Elder/Comissão, T‑178/99, EU:T:1999:307, n.os 21 e 22; de 9 de setembro de 2010, Phoenix‑Reisen e DRV/Comissão, T‑120/09, não publicado, EU:T:2010:381, n.os 24 a 26, e de 24 de março de 2011, Internationaler Hilfsfonds/Comissão, T‑36/10, EU:T:2011:124, n.os 46, 50 e 51).

92      Esta conclusão é ainda mais evidente quando, como sucedeu no presente caso, o ato impugnado tenha sido substituído, com efeitos retroativos, por um ato idêntico, que não é afetado pela eventual anulação do primeiro ato.

93      Além disso, as recorrentes não podem validamente basear a sua argumentação no Despacho de 12 de setembro de 2017, Fursin e o./BCE (T‑247/16, não publicado, EU:T:2017:623). Com efeito, este despacho foi anulado pelo Acórdão de 5 de novembro de 2019, BCE e o./Trasta Komercbanka e o. (C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P, EU:C:2019:923), sem que o desaparecimento do interesse em agir dos recorrentes devido à substituição, retroativa, do ato impugnado por uma nova decisão de conteúdo idêntico, adotada no termo de uma revisão administrativa, tenha sido objeto dos recursos.

94      Por conseguinte, contrariamente ao que as recorrentes alegam, num contexto jurídico que institui uma revisão administrativa que dá lugar à adoção de atos destinados a substituir, retroativamente, os atos objeto da referida revisão, os interesses das partes afetadas ficam inteiramente protegidos graças à possibilidade de requerer a anulação do ato adotado no termo da revisão em questão bem como o ressarcimento de todos os prejuízos decorrentes da sua adoção.

95      Daqui resulta que o recurso no processo T‑351/18 ficou desprovido de objeto depois de o recurso ter sido interposto e que, por conseguinte, as recorrentes perderam o interesse em prosseguir o pedido de anulação da decisão impugnada neste processo. O Tribunal Geral não tem assim de se pronunciar sobre o recurso.

B.      Quanto à admissibilidade no processo T584/18

96      O BCE, sem invocar formalmente uma exceção de inadmissibilidade, contesta, por um lado, a admissibilidade dos recursos apenas no que se refere a terem sido interpostos pela primeira recorrente e, por outro, no âmbito do processo T‑584/18, a admissibilidade da segunda recorrente no que respeita ao fundamento 25 respeitante à anulação da decisão relativa às despesas do processo de revisão. A Comissão compartilha deste entendimento.

97      Em primeiro lugar, as recorrentes consideram que a primeira recorrente tem legitimidade para impugnar as Decisões de 26 de março de 2018 e de 17 de julho de 2018, enquanto principal acionista da segunda recorrente detentora de 85 % dos direitos de voto, fundando‑se para tal no Despacho de 12 de setembro de 2017, Fursin e o./BCE (T‑247/16, não publicado, EU:T:2017:623).

98      Além disso, as recorrentes consideram que, na medida em que o BCE reconhece a legitimidade da primeira recorrente no que respeita ao pedido de anulação da decisão sobre as despesas, atendendo a que este se baseia na ilegalidade das Decisões de 26 de março de 2018 e de 17 de julho de 2018, a legitimidade para agir contra a decisão sobre as despesas não pode ser excluída. Elencam em seguida os outros diferentes interesses de que era titular a primeira recorrente, como, designadamente, o interesse em evitar a liquidação forçada, o interesse relacionado com a possibilidade de vender o banco a outro investidor, o interesse na sua própria reputação, que é diferente da do banco, para além de que o impacto financeiro que a revogação da autorização produzirá em si é diferente daquele que produzirá no banco.

1.      Quanto à admissibilidade do pedido de anulação da Decisão de 17 de julho de 2018

99      Em primeiro lugar, há que constatar que a segunda recorrente tem legitimidade para apresentar o pedido de anulação da Decisão de 17 de julho de 2018. Com efeito, a referida recorrente é a titular da autorização que foi revogada e a destinatária desta decisão. Além disso, o antigo diretor geral da segunda recorrente conferiu um mandato ad litem aos representantes, sem que a sua validade fosse posta em causa pelos seus administradores judiciais. Além disso, a fundamentação do BCE relativa à admissibilidade de pedido de anulação da referida decisão não se baseia no facto de este ter sido apresentado por esta recorrente.

100    Em segundo lugar, no que respeita à primeira recorrente, há que recordar que o Tribunal de Justiça declarou que os acionistas de uma instituição de crédito não podem interpor recurso de uma decisão do BCE de revogação da autorização, na medida em que não são diretamente afetados por essa decisão. Por um lado, o Tribunal de Justiça considerou que, na sequência da revogação da autorização, a instituição de crédito deixava de estar em condições de prosseguir a sua atividade e, por conseguinte, a sua capacidade para distribuir dividendos era duvidosa, mas que esse efeito negativo da revogação reveste caráter económico, ao passo que o direito dos acionistas de receberem dividendos, bem como o direito de participarem na gestão da sociedade em nada era afetado pela decisão controvertida (v., neste sentido, Acórdão de 5 de novembro de 2019, BCE e o./Trasta Komercbanka e o., C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P, EU:C:2019:923, n.o 111). Por outro lado, o Tribunal de Justiça declarou que embora a liquidação afete diretamente o direito dos acionistas de participarem na gestão da sociedade, esta não constitui a execução puramente automática e decorrente apenas da regulamentação da União da Decisão de 17 de julho de 2018 na aceção da jurisprudência aplicável (v., neste sentido, Acórdão de 5 de novembro de 2019, BCE e o./Trasta Komercbanka e o., C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P, EU:C:2019:923, n.os 113 e 114).

101    Por conseguinte, o pedido de anulação da Decisão de 17 de julho de 2018 é admissível no que respeita apenas à segunda recorrente.

2.      Quanto à admissibilidade do pedido de anulação da decisão sobre as despesas

102    No que se refere à admissibilidade do pedido de anulação da decisão sobre as despesas, há que declarar que a primeira recorrente tem legitimidade para apresentar semelhante pedido de anulação visto que é a única destinatária desta decisão que a obriga a pagar as despesas do processo de revisão que intentou e no qual foi a única que participou. Além disso, o BCE não contesta a admissibilidade do referido pedido de anulação pelo facto de ter sido apresentado por esta recorrente.

103    Em contrapartida, a segunda recorrente, que optou por não apresentar um pedido de revisão na CRNA, embora tivesse o direito de o fazer, não tem nenhum interesse em pedir a anulação da decisão sobre as despesas porque esta não produz efeitos que a afetem. Aliás, a referida recorrente não é destinatária dessa decisão e não se pode considerar que esta decisão lhe diz direta e individualmente respeito.

104    Por conseguinte, o pedido de anulação da decisão sobre as despesas só é admissível relativamente à primeira recorrente.

C.      Quanto ao mérito

105    Em apoio do recurso que interpuseram no processo T‑584/18, as recorrentes apresentam 25 fundamentos: os fundamentos 1 a 24 em apoio do pedido de anulação da Decisão de 17 de julho de 2018 e o 25, relativo à ilegalidade da Decisão de 17 de julho de 2018, em apoio do pedido de anulação da decisão sobre as despesas. Importa reagrupá‑los, atento à sua substância e à sua natureza, da seguinte forma:

–        os fundamentos 1, 2, 14, 15 e 19, relativos ao facto de o BCE não ter competência para adotar uma decisão relativa à revogação da autorização e da liquidação, para avaliar as questões relativas ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, para recusar a liquidação por iniciativa própria e para recusar a possibilidade de a segunda recorrente ser vendida a outros potenciais investidores; no mesmo grupo de fundamentos pode também incluir‑se o fundamento 19, relativo a desvio de poder, por os argumentos aduzidos em seu apoio se confundirem com os que foram apresentados no âmbito dos outros fundamentos acima mencionados, relativos à falta de competência do BCE;

–        o fundamento 3, relativo à violação dos deveres de diligência e de imparcialidade no exame efetuado pelo BCE;

–        os fundamentos 4 e 5, relativos a erros de apreciação ou à não tomada em consideração de determinados elementos pertinentes do processo;

–        os fundamentos 6, 12 e 18, relativos a um erro de apreciação, na medida em que o BCE se baseou erradamente na violação da recomendação da FSA e à violação do princípio da segurança jurídica;

–        os fundamentos 7 a 11, 13 a 15 e 17, relativos à violação do princípio da proporcionalidade;

–        os fundamentos 16 e 18, relativos à violação dos princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação, da proteção da confiança legitima e da segurança jurídica;

–        os fundamentos 20 a 22, relativos à violação de formalidades substanciais e, respetivamente, do direito de audiência, dos direitos de defesa, do dever de fundamentação;

–        os fundamentos 23 e 24, relativos, designadamente, à violação do direito de acesso ao processo da segunda recorrente e dos direitos dos acionistas no âmbito do processo de revisão;

–        o fundamento 25, deduzido em apoio do pedido de anulação da decisão sobre as despesas, relativo à ilegalidade da Decisão de 17 de julho de 2018.

1.      Quanto aos fundamentos

106    Em primeiro lugar, as recorrentes alegam, no âmbito dos seus fundamentos 1, 14 e 15, que o BCE excedeu as suas competências por não lhes ter oferecido a possibilidade de procederem à liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente, conforme resulta do ponto 3.3.2, alínea b), i), da Decisão de 17 de julho de 2018, embora, no contexto da repartição fundamental das responsabilidades entre as ANC e o BCE ao abrigo do mecanismo único de supervisão (MUS) e do mecanismo único de resolução (a seguir «MUR»), o BCE não tivesse competência para tal. Sucede o mesmo no que respeita à recusa que o BCE opôs à venda da referida recorrente a outro investidor potencialmente interessado, conforme resultava do ponto 3.3.2, alínea b), ii), dessa decisão.

107    Em segundo lugar, o BCE estava impedido de tomar uma decisão de revogação da autorização, pois a FSA já tinha tomado, em 7 de fevereiro de 2018, a decisão FOLTF, que determinava se a instituição de crédito estava em situação de «insolvência real ou previsível», optando assim entre a medida de resolução e a revogação da autorização, opção essa que era da competência exclusiva da FSA. As recorrentes também contestam a afirmação do BCE segundo a qual a referida decisão era destituída de pertinência e confidencial e por isso não lhe devia ter sido comunicada.

108    Além disso, as recorrentes contestam o argumento do BCE segundo o qual não foi feito um pedido oficial de liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente. Em seu entender, o BCE, na Decisão de 17 de julho de 2018, independentemente da existência de tal pedido, recusou autorizar a referida liquidação por iniciativa própria, embora as pudesse ter convidado a apresentar um pedido nesse sentido ou pudesse ter convidado a FSA a tomar uma decisão sobre esta questão. Com efeito, o único obstáculo a esta liquidação por iniciativa própria era apenas a preferência negativa manifestada pelo BCE. O novo regime «MUS‑MUR» instituiu um sistema de intervenção precoce que é anterior ao colapso efetivo de um banco, ao abrigo do qual as ANC de resolução tinham a possibilidade de examinar se uma instituição de crédito está em situação de insolvência real ou previsível e de verificar se se encontram disponíveis outras soluções de supervisão antes de analisar se as medidas de resolução eram de interesse público. As recorrentes consideram que, no caso de as ANC considerarem que não era esse o caso, pois a insolvência do banco não era um problema sistémico, a análise relativa ao regime de resolução ficaria terminada. Em seguida, essas ANC deviam determinar se a entidade suscetível de colapsar colapsaria efetivamente. Se assim fosse, seria possível impedir o colapso, ou seja, a insolvência, adequadamente através do processo nacional de insolvência. Consequentemente, nunca poderia ocorrer uma liquidação compulsiva. Em contrapartida, este sistema não punha em causa a possibilidade de liquidação por iniciativa própria, reconhecida por todos os ordenamentos jurídicos nacionais, desde que a sociedade em causa seja solvente.

109    Em terceiro lugar, as recorrentes sustentam que o BCE não era competente para adotar a Decisão de 17 de julho de 2018, pois esta fundava‑se apenas em alegadas violações em matéria de LBC/FT, domínio em que não dispõe de competências. A revogação da autorização em causa não se justificava por razões prudenciais, apenas servindo os interesses da FSA e do BCE numa publicidade fácil.

110    Em quarto lugar, no âmbito do fundamento 2 e implicitamente do fundamento 3, as recorrentes acusam o BCE de não ter examinado as questões subjacentes à Decisão de 17 de julho de 2018 em matéria de LBC/FT e de não ter verificado as apreciações da FSA. O BCE não pode ser responsável pela estabilidade das instituições de crédito e excluir artificialmente da sua avaliação domínios inteiros que são fonte de riscos. Além disso, todas as deficiências da referida decisão devidas ao projeto elaborado pela FSA deviam poder ser invocadas no contexto de um recurso de anulação interposto desta decisão.

111    Além disso, o objetivo de restabelecer a legalidade, prosseguido pelo BCE na Decisão de 17 de julho de 2018, não era um objetivo legítimo da revogação da autorização, pois só os objetivos prudenciais o eram. Todavia, atendendo a que em teoria é possível que questões em matéria de LBC/FT sejam pertinentes para revogar uma autorização, na medida em que essas questões podem estar na origem de riscos prudenciais, a repartição de responsabilidades entre as ANC e o BCE, por um lado, e o princípio da proporcionalidade, por outro, pressupõe que se tenha previamente esgotado todo o arsenal de medidas possíveis nesta matéria (coimas, proibição de exercer certos tipos de atividade, processos penais).

112    O BCE, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos das recorrentes.

113    Importa sublinhar que, no âmbito do presente grupo de fundamentos, as recorrentes apresentam, no essencial, dois fundamentos relativos, o primeiro, à incompetência do BCE para adotar a Decisão de 17 de julho de 2018 e, o segundo, a um desvio de poder. Antes de os examinar, o Tribunal considera ser oportuno recordar a repartição de competências entre o BCE e as ANC.

a)      Quanto à repartição de competências entre o BCE e as ANC dos EstadosMembros participantes no MUS no que respeita à revogação da autorização por violação das regras em matéria de LBC/FT

114    Em primeiro lugar, resulta dos considerandos 15 e 28 do Regulamento MUS de base que as competências que não são atribuídas ao BCE continuam a incumbir às ANC.

115    Em especial, o considerando 28 do Regulamento MUS de base elenca, entre as «atribuições de supervisão não conferidas ao BCE» e que devem continuar a incumbir às autoridades nacionais, «[a] prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento de atividades terroristas, e [a] proteção dos consumidores».

116    Porém, o artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento MUS de base esclarece que, «[n]os termos do artigo 6.o, cabe ao BCE […] exercer em exclusivo, para fins de supervisão prudencial, as seguintes atribuições relativamente à totalidade das instituições de crédito estabelecidas nos Estados‑Membros participantes». Segue‑se uma lista de nove atribuições, entre as quais figura a concessão e a revogação da autorização a instituições de crédito. Por conseguinte, ao abrigo do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do referido regulamento, a competência em matéria de revogação da autorização cabe em exclusivo ao BCE.

117    Nos termos do artigo 4.o, n.o 3, do Regulamento MUS de base, «[p]ara efeitos do exercício das atribuições que lhe são conferidas [por este] regulamento e com o objetivo de assegurar elevados padrões de supervisão, o BCE aplica toda a legislação aplicável da União e, no caso de diretivas, a legislação nacional que as transpõe. Caso a legislação aplicável da União seja constituída por regulamentos, e nos casos em que esses regulamentos concedam expressamente certas opções aos Estados‑Membros, o BCE deve aplicar também a legislação nacional relativa ao exercício dessas opções».

118    O artigo 6.o, n.o 2, do Regulamento MUS de base, precisa que «[t]anto o BCE como as [ANC] estão sujeitos ao dever de cooperação leal, bem como à obrigação de trocarem informações.»

119    Resulta do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento MUS de base que, no que se refere às atribuições definidas no artigo 4.o, com exceção do n.o 1, alíneas a) e c), do referido regulamento, o BCE e as ANC dispõem dos poderes previstos, respetivamente, nos n.os 5 e 6 deste artigo. Por força do n.o 6 do mesmo artigo, as ANC exercem diretamente a supervisão das instituições de crédito menos significativas, de acordo com os critérios estabelecidos neste número e informam o BCE, de acordo com o estabelecido no n.o 7 deste artigo, das medidas tomadas ao abrigo do n.o 6 e coordenam estreitamente essas medidas com o BCE.

120    Contudo, resulta do artigo 6.o, n.o 5, alíneas b) a d), do Regulamento MUS de base que, em primeiro lugar, «quando necessário para garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão, o BCE pode, a qualquer momento, por iniciativa própria e após consulta às [ANC] ou a pedido de uma [ANC], decidir exercer diretamente todos os poderes relevantes em relação a uma ou mais das instituições de crédito a que se refere o n.o 4», em segundo lugar, o BCE supervisiona o funcionamento do sistema, com base nos poderes e nos procedimentos previstos neste artigo e, em terceiro lugar, pode, a qualquer momento, exercer os poderes previstos nos artigos 10.o a 13.o deste regulamento, relativos aos poderes de investigação que o BCE pode exercer diretamente.

121    O artigo 6.o, n.o 7, do Regulamento MUS de base prevê que o BCE adote e publique o enquadramento legal sobre as modalidades práticas de aplicação deste artigo e constitua a base jurídica para a adoção do Regulamento‑Quadro do MUS.

122    O artigo 14.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base prevê:

«Sob reserva do disposto no n.o 6, o BCE pode revogar a autorização nos casos previstos na legislação aplicável da União, por sua própria iniciativa, na sequência de consultas com a [ANC] do Estado‑Membro participante em que a instituição de crédito está estabelecida, ou sob proposta dessa [ANC]. Essas consultas garantem em especial que, antes de tomar uma decisão em matéria de revogação, o BCE dá tempo suficiente às autoridades nacionais para decidirem das medidas corretivas necessárias, incluindo eventuais medidas de resolução, e tem em conta as medidas decididas.

Caso a [ANC] que propôs a autorização nos termos do n.o 1 considere que essa autorização deve ser revogada de acordo com a legislação nacional aplicável, apresenta ao BCE uma proposta nesse sentido. O BCE toma uma decisão sobre a revogação proposta tendo plenamente em conta a justificação apresentada pela [ANC].»

123    O artigo 14.o, n.o 6, do Regulamento MUS de base dispõe que «[e]nquanto continuarem a ser competentes em matéria de resolução de instituições de crédito, e nos casos em que considerem que a revogação da autorização iria prejudicar a adequada implementação das medidas necessárias para a resolução ou para manter a estabilidade financeira, as autoridades nacionais notificam devidamente as suas objeções ao BCE, explicando pormenorizadamente o prejuízo que a revogação iria causar», que, «[n]esses casos, o BCE abstém‑se de proceder à revogação por um prazo decidido de comum acordo com as autoridades nacionais» e que «[o] BCE pode decidir prorrogar esse prazo se entender que foram efetuados progressos suficientes. Se, no entanto, o BCE determinar, numa decisão fundamentada, que as autoridades nacionais não implementaram as adequadas medidas necessárias para manter a estabilidade financeira, a revogação da autorização é imediatamente aplicável».

124    O artigo 80.o do Regulamento‑Quadro do MUS, sob a epígrafe «Proposta de revogação de autorização por parte da ANC», tem a seguinte redação:

«1.      Se a ANC relevante considerar que a autorização de uma instituição de crédito deve ser revogada total ou parcialmente de acordo com a legislação nacional ou da União aplicável, incluindo a pedido da instituição de crédito, deve apresentar ao BCE um projeto de decisão propondo a revogação da autorização (a seguir “projeto de decisão de revogação”), juntamente com os documentos de apoio pertinentes.

2.      A ANC deve coordenar com a autoridade nacional competente para a resolução de instituições de crédito (a seguir “autoridade nacional de resolução”) qualquer projeto de decisão de revogação que seja relevante para a autoridade de resolução.»

125    Nos termos do artigo 81.o do Regulamento‑Quadro do MUS:

«1.      O BCE avaliará o projeto de decisão de revogação sem demora injustificada. Deve nomeadamente tomar em consideração os motivos apresentados pela ANC quanto à urgência do caso.

2.      É aplicável o direito de audiência previsto no artigo 31.o»

126    O artigo 83.o do Regulamento‑Quadro do MUS prevê:

«1.      O BCE tomará a decisão sobre a revogação de uma autorização sem demora injustificada. Para esse efeito, pode aceitar ou rejeitar o projeto de decisão de revogação em causa.

2.      Ao tomar a sua decisão, o BCE terá em consideração todos os elementos seguintes: a) a sua avaliação das circunstâncias que fundamentam a revogação; b) se for caso disso, o projeto de decisão de revogação da ANC; c) a consulta à ANC relevante e, caso a ANC não seja a autoridade nacional de resolução, à autoridade nacional de resolução (juntamente com a ANC, as “autoridades nacionais”); d) quaisquer comentários submetidos pela instituição de crédito nos termos do artigo 81.o, n.o 2, e do artigo 82.o, n.o 3.

3.      O BCE tomará igualmente uma decisão nos casos descritos no artigo 84.o se a autoridade nacional de resolução relevante não se opuser à revogação da autorização, ou o BCE determinar que não foram aplicadas as medidas adequadas para manter a estabilidade financeira pelas autoridades nacionais.»

127    O artigo 84.o do Regulamento‑Quadro do MUS dispõe:

«1.      Se a autoridade nacional de resolução notificar a sua objeção à intenção do BCE de revogar uma autorização, o BCE e a autoridade nacional de resolução acordarão num prazo durante o qual o BCE se absterá de proceder à revogação da autorização. O BCE informará a ANC imediatamente depois de estabelecer contacto com a autoridade nacional de resolução para chegarem a acordo.

2.      Expirado o prazo acordado, o BCE julgará se pretende proceder à revogação da autorização ou, tendo em conta os progressos alcançados, prorrogar o prazo acordado nos termos do artigo 14.o, n.o 6, do Regulamento do MUS. O BCE consultará a ANC relevante e a autoridade nacional de resolução, se esta for uma entidade diferente da ANC. A ANC informará o BCE das medidas tomadas por estas autoridades e da sua avaliação sobre as consequências da revogação.

3.      Se a autoridade nacional de resolução não se opuser à revogação da autorização, ou o BCE determinar que não foram aplicadas as medidas adequadas para manter a estabilidade financeira pelas autoridades nacionais, aplica‑se o disposto no artigo 83.o»

128    O artigo 18.o da Diretiva 2013/36, que prevê os casos em que as [ANC] podem propor, em relação às instituições menos significativas, a revogação da autorização, tem a seguinte redação:

«As autoridades competentes só podem revogar a autorização concedida a uma instituição de crédito caso essa instituição de crédito:

[…]

e)      Se encontre em qualquer outra situação em que o direito nacional preveja a revogação; ou

f)      Cometa uma das infrações a que se refere o artigo 67.o, n.o 1.»

129    O artigo 67.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36 dispõe:

«O presente artigo aplica‑se pelo menos em qualquer das seguintes situações:

[…]

d)      A instituição não pôr em vigor sistemas de governo exigidos pelas autoridades competentes de acordo com as disposições legais nacionais de transposição do artigo 74.o;

e)      A instituição não reportar informações sobre o cumprimento da obrigação de satisfazer os requisitos de fundos próprios estabelecidos no artigo 92.o do Regulamento (UE) n.o 575/2013 [do Parlamento Europeu e do Conselho, 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1)], às autoridades competentes, ou reportá‑las de forma incompleta ou inexata, em infração ao artigo 99.o, n.o 1, desse regulamento;

[…]

o)      A instituição ser considerada responsável por uma infração grave às disposições legais nacionais aprovadas por força da Diretiva [2005/60 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de outubro de 2005, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo (JO 2005, L 309, p. 15)];

[…]»

130    O artigo 74.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36 prevê que «[a]s instituições devem dispor de sistemas de governo sólidos, que incluam uma estrutura organizativa clara, com linhas de responsabilidade bem definidas, transparentes e coerentes, processos eficazes para identificar, gerir, controlar e comunicar os riscos a que estão ou podem vir a estar expostas, mecanismos adequados de controlo interno, incluindo procedimentos administrativos e contabilísticos sólidos, e políticas e práticas de remuneração consentâneas com uma gestão sólida e eficaz do risco e que promovam esse tipo de gestão».

131    Resulta das disposições acima evocadas nos n.os 115 a 118 que o MUS centraliza as funções prudenciais a nível do BCE, ao mesmo tempo que prevê uma execução descentralizada pelas ANC dos Estados‑Membros participantes, sob a supervisão do BCE, com o qual cooperam e a quem prestam assistência. Assim, no âmbito do MUS, por um lado, o BCE exerce determinadas competências exclusivas: a supervisão prudencial «direta» das instituições de crédito importantes e as competências que lhe são atribuídas pelo artigo 4.o do Regulamento MUS de base em relação a todas as instituições, independentemente da respetiva importância. Por outro lado, a supervisão prudencial das instituições menos significativas insere‑se na competência descentralizada das referidas ANC e é enquadrada e supervisionada, em última instância, pelo BCE, que tem por missão velar pelo bom funcionamento e pela eficácia do sistema de supervisão prudencial bem como pela aplicação coerente e uniforme das regras prudenciais em todos os Estados‑Membros participantes. O BCE exerce sobre as instituições menos significativas uma supervisão «indireta», em cujo estas ANC prestam a sua colaboração e assistência ao BCE. Além disso, estas mesmas ANC conservam a sua competência em relação às matérias que não se regem pelo Regulamento MUS de base: a proteção dos consumidores, os mercados de instrumentos financeiros, a LBC/FT, a luta contra a corrupção.

132    Mais concretamente, no âmbito deste MUS, resulta da economia do artigo 6.o, n.os 4 a 6, do Regulamento MUS de base uma diferença entre a supervisão prudencial das entidades «importantes» e a das entidades qualificadas de «menos significativas», no que respeita a sete das nove atribuições cuja lista figura no artigo 4.o, n.o 1, do referido regulamento.

133    Daqui decorre, em primeiro lugar, que a supervisão prudencial das entidades «importantes» é da competência exclusiva do BCE. Sucede o mesmo com a supervisão prudencial das entidades «menos significativas», no que respeita à atribuição referida no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento MUS de base relativa à concessão e à revogação da autorização às instituições de crédito.

134    Em segundo lugar, no que respeita às entidades «menos significativas» e relativamente às outras atribuições a que se refere o artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento MUS de base, resulta da leitura conjugada do artigo 6.o, n.os 5 e 6, do referido regulamento que a sua execução está confiada, sob a supervisão do BCE, às ANC dos Estados‑Membros participantes, as quais exercem assim a supervisão prudencial direta em relação às referidas entidades.

135    Com efeito, o Tribunal Geral declarou que decorre do exame da interação existente entre as disposições do artigo 4.o, n.o 1, e as do artigo 6.o do Regulamento MUS de base, conforme acima indicado nos n.os 116 a 121, que a lógica da relação entre estas consiste em permitir que as competências exclusivas delegadas ao BCE possam ser executadas num quadro descentralizado, em vez de ser organizada uma repartição de competências entre o BCE e as ANC no exercício das atribuições previstas no artigo 4.o, n.o 1, deste regulamento. Esta constatação encontra apoio na leitura dos considerandos do referido regulamento. Por um lado, resulta dos considerandos 15 e 28 do mesmo regulamento que só são excluídas da competência dos Estados‑Membros as atribuições explicitamente conferidas ao BCE e que a supervisão prudencial das instituições financeiras por motivos distintos dos enumerados no artigo 4.o, n.o 1, do regulamento em causa continua a ser da competência dos Estados‑Membros. Daqui resulta que a repartição das competências entre o BCE e as referidas ANC teve lugar necessariamente na fase da definição das atribuições conferidas ao BCE pelo artigo 4.o, n.o 1, do regulamento em causa. Por outro lado, importa salientar que embora o considerando 28 do regulamento MUS de base apresente uma lista de atribuições de supervisão que continuam a incumbir às autoridades nacionais, não inclui nenhuma das atribuições enumeradas no artigo 4.o, n.o 1, deste regulamento. Mais ainda, o referido considerando não apresenta a supervisão direta das entidades menos significativas no sentido de que constitui o exercício de uma competência que incumbe às autoridades nacionais (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, EU:T:2017:337, n.os 54 a 57).

136    Em terceiro lugar, no âmbito do MUS composto pelo BCE e pelas ANC dos Estados‑Membros participantes, por um lado, resulta da economia do artigo 6.o, n.os 2 e 3, do Regulamento MUS de base que tanto o BCE como as referidas ANC têm de respeitar o dever de cooperação e a obrigação de trocar informações. Em especial, por força do artigo 6.o, n.o 2, segundo parágrafo, do referido regulamento, «as [ANC] devem, em especial, fornecer ao BCE todas as informações necessárias para que este exerça as atribuições que lhe são conferidas». Além disso, nos termos do n.o 3 deste artigo, incumbe às referidas ANC coadjuvar o BCE na preparação e aplicação de quaisquer atos relacionados com as atribuições referidas no artigo 4.o deste regulamento em relação a todas as instituições de crédito, incluindo a coadjuvação em atividades de verificação.

137    Com efeito, já foi declarado que a supervisão das instituições qualificadas de «menos significativas» é mencionada nos considerandos 38 a 40 do Regulamento MUS de base, imediatamente após o considerando 37 do mesmo regulamento, o qual refere que «as [ANC] deverão ser responsáveis por coadjuvar o BCE na preparação e aplicação dos atos relativos ao exercício das suas atribuições de supervisão» e que «[t]al deverá incluir nomeadamente a avaliação diária e permanente da situação dos bancos e as correspondentes verificações no local». Esta configuração dos considerandos do referido regulamento tende a implicar que a supervisão prudencial direta exercida pelas ANC no âmbito do MUS foi prevista pelo Conselho da União Europeia como uma modalidade de assistência ao BCE, mais do que como o exercício de uma competência autónoma (Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, EU:T:2017:337, n.o 58).

138    Por outro lado, o exercício da supervisão prudencial direta pelas ANC é enquadrado pelo BCE, que dispõe, em aplicação do artigo 6.o, n.o 5, alíneas a) e b), do Regulamento MUS de base, do poder de, por um lado, emitir «regulamentos, orientações ou instruções gerais, dirigidos às [ANC], de acordo com os quais as autoridades nacionais competentes exercem as suas atribuições previstas no artigo 4.o» do referido regulamento e, por outro, de decidir «exercer diretamente todos os poderes relevantes em relação a uma ou mais das instituições de crédito». Além disso, são também abrangidos por este enquadramento pelo BCE da supervisão direta exercida pelas ACN, por um lado, os poderes de supervisão previstos no artigo 6.o, n.o 5, alínea c), deste regulamento, que remete para o n.o 7, alínea c), do referido artigo, e, por outro, os poderes de supervisão e de investigação, previstos nos artigos 10.o a 13.o do regulamento em questão, que o BCE pode decidir exercer diretamente em relação às instituições de crédito menos significativas ao abrigo do artigo 4.o, n.o 6, alínea d), do mesmo regulamento.

139    Por conseguinte, cabe sublinhar que o BCE continua a dispor de prerrogativas significativas nas próprias circunstâncias em que as ANC exercem as atribuições de supervisão previstas no artigo 4.o, n.o 1, alíneas b) e d) a i), do Regulamento MUS de base e que a existência de tais prerrogativas é reveladora do caráter subordinado da intervenção das autoridades nacionais, quando exercem as referidas atribuições (Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, EU:T:2017:337, n.o 59).

140    Em quarto lugar, no que se refere, em especial, à revogação da autorização a uma instituição de crédito, prevista no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento MUS de base, a cooperação entre o BCE e as ANC exprime‑se, em conformidade com o artigo 14.o, n.o 5, do referido regulamento, através, por um lado, da obrigação de consultar estas ANC, caso o BCE revogue a autorização por sua própria iniciativa, e, por outro, da possibilidade de essas autoridades proporem a referida revogação ao BCE.

141    Quando uma ANC, ao abrigo do artigo 14.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base, propõe a revogação da autorização, o BCE, em conformidade com o disposto no segundo parágrafo desta disposição e no artigo 83.o, n.o 2, do Regulamento‑Quadro do MUS, deve ter plenamente em conta a justificação apresentada pela ANC, a consulta efetuada a esta e, eventualmente, à autoridade nacional de resolução, bem como quaisquer comentários submetidos pela instituição de crédito em causa. Deve também proceder ao seu próprio exame da existência das circunstâncias que justificam a revogação e, assim, decidir aceitar ou recusar o projeto de decisão de revogação da autorização da ANC.

142    Em quinto lugar, importa sublinhar que resulta dos considerandos 28 e 29 do Regulamento MUS de base que a prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento de atividades terroristas é da competência das autoridades nacionais e que o BCE tem, neste domínio, um dever de cooperação com as referidas autoridades nacionais.

143    Em sexto lugar, no que respeita ao nexo entre a LBC/FT e a supervisão prudencial, há que observar que, entre as circunstâncias que justificam a revogação da autorização bancária, por um lado, o artigo 18.o, alínea f), da Diretiva 2013/36 menciona as infrações a que se refere o artigo 67.o, n.o 1, dessa diretiva, entre as quais figuram as infrações graves às disposições nacionais adotadas ao abrigo da Diretiva 2005/60, relativa à prevenção da utilização do sistema financeiro para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo. Por outro lado, o artigo 18.o, alínea e), da referida diretiva menciona os outros casos de revogação da autorização previstos no direito nacional.

144    A este respeito, há que sublinhar que, embora o artigo 18.o da Diretiva 2013/36 faça referência ao poder de revogação da autorização das ANC, atenta a repartição de atribuições entre as referidas ANC e o BCE, prevista no artigo 4.o do Regulamento MUS de base e, designadamente, o facto de a competência para as revogações das autorizações ter passado a ser exclusiva do BCE, que este pode exercer, ao abrigo do artigo 14.o, n.o 5, do referido regulamento, sob proposta da ANC, o artigo 18.o desta diretiva deve ser interpretado no sentido de que se refere ao poder de propor a revogação da autorização, que continua a ser da competência das ANC.

145    Em sétimo lugar, no que respeita à interação entre o MUS e o MUR, resulta do considerando 11 do Regulamento (UE) n.o 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 (JO 2014, L 255, p. 1, a seguir «Regulamento MUR»), que a supervisão e a resolução são dois aspetos complementares no âmbito da União bancária europeia e que, em princípio, não são assim alternativos.

146    Com efeito, importa sublinhar que o MUS e o MUR têm objetivos diferentes. Conforme o considerando 7 do Regulamento MUR recorda, o MUS visa garantir uma política de supervisão microprudencial das instituições de crédito a nível europeu que seja aplicada de forma coerente e eficaz em todos os Estados‑Membros da área do euro e dos Estados‑Membros não pertencentes à área do euro que optem por nele participar. Também tem por objeto a supervisão macroprudencial e, em última análise, a estabilidade financeira da União. Em contrapartida, o MUR tem como principal atribuição a gestão de crises existentes, a criação de mecanismos de resolução mais eficientes, para evitar que se propaguem os danos resultantes de situações de insolvência de bancos, segundo regras e um processo uniformes, conforme resulta dos considerandos 6 e 8 e do artigo 1.o do referido regulamento. Assim, embora os dois sistemas colaborem para o objetivo final da solidez e estabilidade do sistema financeiro da União, o MUS atua para prevenção das crises e o MUR para a sua resolução.

147    Em oitavo lugar, as declarações de insolvência real ou previsível que podem ser formuladas pelo BCE ou pelo Conselho Único de Resolução (CUR), no que respeita às instituições de crédito importantes, ou pelas ANC ou pelas autoridades nacionais de resolução, no que respeita às instituições de crédito menos significativas, conforme resulta do artigo 7.o, n.o 3, do Regulamento MUR, são atos preparatórios que precedem a adoção de um programa de resolução, embora não impliquem necessariamente a sua adoção. A adoção de tal programa é da competência exclusiva do CUR ou das autoridades nacionais de resolução, em função da importância da instituição de crédito.

148    Além disso as avaliações de insolvência real ou previsível não constituem de modo nenhum decisões formais sobre os incumprimentos das obrigações regulamentares que incumbem às instituições de crédito, antes sendo atos preparatórios que não alteram a situação jurídica da instituição de crédito em causa. Com efeito, estes atos contêm uma avaliação dos factos pelo BCE (ou pela ANC) relativamente à questão da insolvência real ou previsível da referida instituição, que não é de forma alguma vinculativa, mas que constitui a base da adoção, pelo CUR (ou pela autoridade nacional de resolução), de programas de resolução ou de decisões que determinam que a resolução não é realizada no interesse público (v., neste sentido, Despacho de 6 de maio de 2019, ABLV Bank/BCE, T‑281/18, EU:T:2019:296, n.os 36, 48 e 49).

149    Com efeito, resulta do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento MUR, que a adoção deste programa depende de saber se estão reunidos determinados requisitos. Em especial, não apenas a instituição de crédito deve encontrar‑se numa situação de insolvência real ou previsível, como não deve existir nenhuma perspetiva razoável de outras medidas de natureza privada ou de caráter prudencial puderem impedir a sua insolvência num prazo razoável. Além disso, uma medida de resolução deve ser necessária em termos de interesse público.

150    A este respeito, de acordo com a jurisprudência, nos termos do considerando 26 do Regulamento MUR, apesar de o BCE (e, por analogia, as ANC) e o CUR deverem ser capazes de avaliar se uma instituição de crédito está em situação ou em risco de falência, compete exclusivamente ao CUR (e, por analogia, às autoridades nacionais de resolução) avaliar as condições necessárias para uma resolução e adotar um programa de resolução caso considere que todas as condições estão preenchidas, conforme também resulta expressamente do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento MUR. É certo que o BCE (e por analogia, as ANC) tem competência para apresentar uma avaliação a respeito da primeira condição, ou seja, a situação ou o risco de insolvência, mas trata‑se precisamente de uma mera avaliação, que em nada vincula o CUR (e, por analogia, as autoridades nacionais de resolução) (v., neste sentido, Despacho de 6 de maio de 2019, ABLV Bank/BCE, T‑281/18, EU:T:2019:296, n.o 34).

151    Em nono lugar, resulta do considerando 57 do Regulamento MUR, por um lado, que o facto de uma entidade não cumprir os requisitos para a autorização não deverá justificar, por si só, que se coloque uma entidade sob resolução, particularmente se a entidade continuar a ser ou for suscetível de continuar a ser viável. Por outro lado, deverá considerar‑se que uma entidade se encontra em situação ou em risco de insolvência quando essa entidade tiver deixado de cumprir ou estiver, num futuro próximo, em risco de deixar de cumprir os requisitos necessários à continuidade da sua autorização.

152    Não existe equivalência funcional entre uma avaliação da situação de insolvência real ou previsível e uma revogação da autorização. Com efeito, embora seja verdade que, por força do disposto no artigo 18.o, n.o 4, alínea a), do Regulamento MUR, essa avaliação se pode basear na apreciação da circunstância de as condições de manutenção da aprovação terem deixado de estar reunidas, estes dois atos não são de modo nenhum equivalentes. A este respeito, basta constatar que as condições da revogação da autorização enunciadas no artigo 18.o da Diretiva 2013/36/UE são manifestamente diferentes das considerações que subjazem à avaliação da situação ou do risco de insolvência previstas no artigo 18.o, n.o 4, do referido regulamento (Despacho de 6 de maio de 2019, ABLV Bank/BCE, T‑281/18, EU:T:2019:296, n.o 46).

153    É à luz destas considerações que importa examinar o presente grupo de fundamentos.

b)      Quanto à primeira parte relativa ao facto de o BCE não ser competente para revogar a autorização de instituição de crédito, dado que a ANC já havia proferido uma declaração de insolvência real ou previsível

154    No presente caso, em primeiro lugar, há que referir que a Decisão de 17 de julho de 2018 diz respeito à revogação da autorização de acesso às atividades de instituição de crédito da segunda recorrente por violação das disposições do ordenamento jurídico estónio que, através desta medida, pune a inexistência de sistemas de governo e de um sistema eficaz em matéria de LBC/FT, a não execução de uma instrução da ANC e a transmissão de informações ou de documentos enganosos.

155    Em segundo lugar, importa observar que o BCE adotou a Decisão de 26 de março de 2018, e posteriormente a de 17 de julho de 2018, sob proposta da FSA, que é a ANC estónia, ao abrigo do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), e do artigo 14.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base, bem como do artigo 83.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS.

156    Em terceiro lugar, no contexto desta decisão e do exercício descentralizado da sua competência exclusiva em matéria de revogação da autorização, sendo a segunda recorrente uma instituição de crédito menos significativa, o BCE estava obrigado, por força do artigo 14.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base e do artigo 83.o, n.o 2, alíneas b) e c), do Regulamento‑Quadro do MUS, a ter plenamente em conta a justificação da revogação, apresentada pela ANC, bem como a cooperar com esta através de consultas sobre as eventuais medidas de resolução que a autoridade nacional de resolução tenha considerado necessárias.

157    Em quarto lugar, resulta do ponto 3.2, alínea d), da Decisão de 17 de julho de 2018 que a FSA, que, na Estónia, é simultaneamente a ANC no contexto do MUS e autoridade nacional de resolução no âmbito do MUR (artigo 3.o da Lei estónia Relativa à Prevenção e Resolução das Crises Financeiras), adotou, em 10 de abril de 2017, a decisão FOLTF porque a segunda recorrente tinha por diversas vezes violado os requisitos exigidos para efeitos da autorização, pelo que esta lhe poderia ter sido revogada, conforme previsto no considerando 57 do Regulamento MUR.

158    Com efeito, nos termos do considerando 57 do Regulamento MUR, deverá considerar‑se que uma entidade se encontra em situação ou em risco de insolvência quando essa entidade tiver deixado de cumprir ou estiver em risco de deixar de cumprir os requisitos necessários à continuidade da sua autorização.

159    Em seguida, resulta do ponto 3.1, alínea b), da Decisão de 17 de julho de 2018 que, em 7 de fevereiro de 2018, a FSA, atuando na qualidade de autoridade nacional de resolução, adotou uma decisão em declarava que a resolução não era do interesse público. É a esta decisão que as recorrentes se referem, nos seus escritos, como «segunda decisão FOLTF».

160    Por conseguinte, embora a FSA tenha adotado a Decisão FOLTF, para a qual era competente, e que o primeiro requisito previsto no artigo 18.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento MUR, para a adoção de um programa de resolução está assim preenchido, foi considerado que não havia interesse público para implementar medidas de resolução, pelo que não se encontrava preenchido o terceiro requisito previsto no artigo 18.o, n.o 1, alínea c), do referido regulamento. Consequentemente, a referida decisão não conduziu, no presente caso, a autoridade nacional de resolução (a FSA) à adoção de um programa de resolução, pois os requisitos previstos não se encontravam cumulativamente preenchidos.

161    Em contrapartida, resulta do ponto 3.1, alínea c), da Decisão de 17 de julho de 2018 que, em 6 de março de 2018, a FSA adotou uma proposta de decisão de revogação da autorização e que o BCE, na sequência da receção dessa proposta, ofereceu à segunda recorrente a possibilidade de apresentar os seus comentários sobre esta proposta, para em seguida adotar a Decisão de 26 de março de 2018, e em seguida a de 17 de julho de 2018, que se baseia nos fundamentos e nas apreciações factuais e nos resultados das verificações e inspeções efetuadas pela FSA.

162    Ora, em primeiro lugar, foi corretamente que o BCE considerou, no ponto 2.1 da Decisão de 17 de julho de 2018, ter competência exclusiva para adotar uma decisão em matéria de revogação da autorização. Esta conclusão é conforme, por um lado, com o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), e o artigo 14.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base, bem como com o artigo 83.o do Regulamento‑Quadro do MUS e, por outro, à jurisprudência acima evocada no n.o 135.

163    Em segundo lugar, foi em conformidade com a repartição de competências entre as ANC dos Estados‑Membros participantes e o BCE no âmbito do MUS, com as disposições aplicáveis e a jurisprudência, acima mencionados nos n.os 136, 137, 140 e 141, que a FSA transmitiu ao BCE uma proposta de decisão de revogação da autorização e que este último se baseou nos fundamentos desta para justificar a sua própria decisão.

164    Com efeito, sendo a segunda recorrente uma instituição de crédito menos significativa, por um lado, cabia à FSA, isto é, à ANC estónia, efetuar as verificações factuais necessárias, bem como preparar e dar assistência ao BCE na elaboração e na aplicação de qualquer ato relacionado com as atribuições a que se refere o artigo 4.o do Regulamento MUS de base, entre as quais se conta a decisão de revogação da autorização.

165    Por outro lado, por força das disposições e da jurisprudência acima evocadas nos n.os 138 e 139, o BCE dispunha de um poder de enquadramento da ação de supervisão direta exercida pela FSA, que o BCE utilizou, no presente caso, ao proceder a diversas consultas à FSA, sobretudo após abril de 2017, e após a última inspeção, conforme foi confirmado pelo BCE na audiência.

166    Em terceiro lugar, o BCE dispunha seguramente de competência para adotar a Decisão de 17 de julho de 2018, apesar e independentemente das decisões invocadas pelas recorrentes.

167    A este propósito, os argumentos das recorrentes segundo os quais o BCE não era competente para adotar a Decisão de 17 de julho de 2018, pois a ANC tinha adotado uma decisão relativa à insolvência real ou previsível da segunda recorrente, decorrem de uma leitura errada da interação entre o MUS, por um lado, e o MUR, por outro, bem como de determinados erros factuais.

168    Com efeito, as recorrentes consideram, no essencial, que o MUS e o MUR são sistemas alternativos, que, ao contrário do que estava anteriormente previsto na legislação nacional, a não adoção de uma medida de resolução não implica a liquidação da instituição de crédito ao abrigo do direito nacional e que o BCE não dispõe, após uma decisão FOLTF, de competência para decidir a revogação da autorização.

169    Porém, contrariamente ao que as recorrentes sustentam, a FSA não adotou duas decisões, mas, por um lado, a decisão FOLTF, isto é, uma declaração de insolvência real ou previsível, em 10 de abril de 2017 e, por outro, no exercício das suas funções de autoridade nacional de resolução, uma decisão em que declarava que a resolução não era do interesse público, em 7 de fevereiro de 2018, conforme claramente resulta da Decisão de 17 de julho de 2018, cujas passagens foram acima recordadas nos n.os 157 e 159.

170    Os atos em causa são distintos, sendo uma declaração de insolvência real ou previsível uma das condições prévias à adoção de uma decisão final sobre a resolução, ou seja, um programa de resolução nos termos do artigo 18.o, n.o 6, do Regulamento MUR. Todavia, esta condição é uma condição necessária, mas não suficiente para efeitos da adoção de uma medida de resolução, conforme resulta do acima exposto no n.o 149.

171    Esta interpretação foi confirmada pela jurisprudência acima mencionada no n.o 148, segundo a qual a declaração de insolvência real ou previsível inclui uma avaliação dos factos pela ANC por referência à questão da insolvência real ou previsível da referida instituição, que não é de forma nenhuma obrigatória, mas que constitui a base da adoção, pela autoridade nacional de resolução, de programas de resolução ou de decisões que declaram não ser a resolução de interesse público.

172    Foi uma decisão deste segundo tipo que a FSA, atuando no desempenho das suas funções de autoridade nacional de resolução, adotou no presente caso.

173    Ora, contrariamente ao que as recorrentes afirmam, tal decisão não impede de modo nenhum o BCE de vir a adotar uma decisão de revogação da autorização.

174    Importa, pelo contrário, considerar que, na medida em que a declaração de insolvência real ou previsível, que pode ser adotada, designadamente, quando os requisitos para a revogação da autorização se encontrem preenchidos, conforme resulta do considerando 57 do Regulamento MUR e como é também reconhecido pela segunda recorrente, e que pode ser tomada como base para a adoção de uma medida de resolução, não dá lugar a tal medida, segundo a autoridade nacional de resolução competente para a adotar ao abrigo do artigo 7.o, n.o 3, alínea e), do referido regulamento (relativamente a uma instituição de crédito menos significativa), o BCE pode decidir proceder à revogação da autorização da instituição de crédito que deixe de respeitar os requisitos para a manutenção dessa autorização.

175    Com efeito, embora o MUR compartilhe das mesmas atribuições do MUS no que respeita à proteção da estabilidade e da segurança do sistema financeiro da União, sendo assim complementar em relação a este, conforme resulta do considerando 11 do Regulamento MUR, destina‑se no entanto a ser aplicado quando uma entidade se encontra numa situação de insolvência ou em risco de se tornar insolvente e visa uma gestão das crises financeiras uma vez estas ocorridas, conforme resulta do considerando 7 desse Regulamento.

176    Esta conclusão também encontra confirmação no considerando 57 do Regulamento MUR, nos termos do qual «[o] facto de deixar de cumprir os requisitos para a autorização não deverá justificar, por si só, que se coloque uma entidade sob resolução, particularmente se a entidade continuar a ser ou for suscetível de continuar a ser viável», bem como na jurisprudência acima recordada no n.o 152.

177    As medidas adotadas ao abrigo do MUS e do MUR só se poderiam excluir mutuamente, conforme alegado pelas recorrentes, se uma entidade não só deixar de garantir as condições para a manutenção da autorização, mas também deixar de ser solvente.

178    Só neste caso deve o BCE dar prioridade a uma medida de resolução do CUR ou de uma autoridade nacional de resolução (consoante a importância da instituição de crédito), ao abrigo do mecanismo de coordenação e de cooperação com essas outras autoridades, delineado nos artigos 14.o, n.os 5 e 6, do Regulamento MUS de base, bem como no artigo 83.o, n.o 3, e no artigo 84.o do Regulamento‑Quadro do MUS. Além disso, o BCE é obrigado, ao abrigo do artigo 83.o, n.o 2, do referido regulamento‑quadro, a ter devidamente em conta as consultas com as autoridades nacionais de resolução, antes de adotar a sua decisão de revogação da autorização.

179    A coexistência do MUS e do MUR não pode ser vista no sentido de que exclui a possibilidade de a autoridade competente em matéria de supervisão prudencial, ou seja, o BCE, revogar a autorização, quando não se verifiquem as condições para adotar uma medida de resolução, ou seja, quando a instituição de crédito em causa não corre o risco de se tornar inviável.

180    Com efeito, isso equivaleria a isentar as instituições de crédito, que são sólidas do ponto de vista financeiro, da obrigação de respeitar as outras regras prudenciais que lhes são impostas para efeitos da manutenção da respetiva autorização.

181    No que respeita ao argumento das recorrentes segundo o qual as «decisões FOLTF» lhes devem ser comunicadas, basta sublinhar que a decisão final por meio da qual a autoridade nacional de resolução declarou não haver interesse público na resolução e a declaração de insolvência real ou previsível da FSA se inscrevem num processo distinto daquele que conduziu à Decisão de 17 de julho de 2018, pelo que a não notificação da decisão FOLTF à segunda recorrente não afeta a legalidade da Decisão de 17 de julho de 2018. Além disso, na medida em que os fundamentos da decisão FOLTF coincidem com os fundamentos da proposta de decisão de revogação da autorização da FSA, conforme figura na Decisão de 17 de julho de 2018, deve considerar‑se que a recorrente, que é a destinatária destas últimas decisões, deles tinha conhecimento.

182    Além disso, atentos os esclarecimentos acima fornecidos nos n.os 173 a 180 relativos às interações entre os sistemas MUS e MUR, há que considerar que os argumentos das recorrentes relativos à referência, na Decisão de 17 de julho de 2018, a uma disposição do ordenamento jurídico nacional alegadamente revogada devido à entrada em vigor destes dois sistemas, designadamente ao artigo 118.o da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito, são irrelevantes.

183    De tudo o que precede resulta que a presente parte do fundamento não pode ser julgada procedente.

c)      Quanto à segunda parte relativa ao facto de o BCE não ser competente para avaliar as questões em matéria de LBC/FT

184    As recorrentes contestam, no essencial, a competência do BCE para adotar uma decisão de revogação da autorização devido à violação das disposições em matéria de LBC/FT, domínio no qual é incompetente. Em contrapartida, a revogação da autorização justificar‑se‑ia apenas por razões prudenciais.

185    Em primeiro lugar, conforme resulta do artigo 67.o da Diretiva 2013/36, a revogação da autorização também tem lugar em caso de violação pela instituição de crédito das obrigações em matéria de LBC/FT. Assim, o cumprimento das obrigações nesta matéria é manifestamente pertinente no âmbito da supervisão prudencial, pois, conforme sublinhado nos considerandos 1 e 2 da Diretiva 2005/60, a utilização do sistema financeiro para fins de branqueamento de capitais pode prejudicar a estabilidade, a integridade e a reputação do referido sistema e do mercado único.

186    O facto de a redação do artigo 18.o da Diretiva 2013/36 mencionar ainda a competência das autoridades nacionais de supervisão para revogar a autorização não é passível de pôr em causa a vontade do legislador da União, conforme esta resulta das disposições do Regulamento MUS de base atualmente em vigor.

187    Com efeito, embora os Estados‑Membros continuem a ser competentes para aplicar as disposições em matéria de LBC/FT, conforme explicitamente previsto no considerando 28 do Regulamento MUS de base, o BCE tem competência exclusiva para efeitos da revogação da autorização, relativamente a todas as instituições de crédito, independentemente da respetiva importância, mesmo quando baseada, como no caso em apreço, nos fundamentos constantes do artigo 67.o, n.o 1, alíneas d), e) e o), da Diretiva 2013/36, para o qual remete o artigo 18.o desta diretiva, porquanto o artigo 14.o, n.o 5, do referido regulamento define como condição para a revogação da autorização a existência de um ou mais fundamentos que justifiquem a revogação nos termos do artigo 18.o da referida diretiva. Por conseguinte, as recorrentes não podiam, validamente e por esta razão, pôr em causa a competência do BCE para adotar a Decisão de 17 de julho de 2018.

188    Em segundo lugar, no que se refere aos fundamentos da revogação da autorização no presente caso, as recorrentes não podiam validamente contestar que estes correspondem efetivamente a alguns fundamentos justificadores da revogação da autorização, designadamente aos constantes do artigo 18.o, alínea e) e f), da Diretiva 2013/36, conforme exigido pelo artigo 14.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base. Em especial, o artigo 18.o, alínea f), da referida diretiva diz respeito ao caso das infrações cometidas pela instituição de crédito a que se refere o artigo 67.o, n.o 1, desta diretiva.

189    No presente caso, as infrações elencadas no artigo 67.o, n.o 1, alínea d), e) e o), da Diretiva 2013/36 foram imputadas à segunda recorrente no contexto da Decisão de 17 de julho de 2018. Estas infrações dizem respeito à inexistência de sistemas de governo exigidos pelas ANC de acordo com o estabelecido nas disposições nacionais de transposição do artigo 74.o da referida diretiva, à falta de informações ou à transmissão de informações incorretas ou incompletas às ANC, no que se refere ao respeito da obrigação de satisfazer os requisitos de fundos próprios, e ao cometimento de uma infração grave às disposições nacionais adotadas ao abrigo da Diretiva 2005/60 em matéria de LBC/FT.

190    Por conseguinte, tendo igualmente em conta as considerações acima desenvolvidas nos n.os 185 e 187, os argumentos das recorrentes relativos à falta de competência do BCE para utilizar o instrumento da revogação da autorização por violações em matéria de LBC/FT não podem ser acolhidos.

191    Além disso, no que se refere mais especificamente ao argumento das recorrentes segundo o qual a repartição de competências entre as ANC dos Estados‑Membros participantes e o BCE no âmbito do MUS e o princípio da proporcionalidade implicam que, antes de revogar a autorização bancária devido a infrações à legislação em matéria de LBC/FT, se deve esgotar todo o arsenal de outras medidas disponíveis (coimas, proibição de exercer certos tipo de atividade, processos penais), este argumento deve ser julgado improcedente.

192    Com efeito, resulta dos autos que a FSA ofereceu à segunda recorrente diversas oportunidades para cumprir as exigências regulamentares em matéria de LBC/FT, conforme resulta do acima exposto nos n.os 25, 26 e 29, inclusive ao adotar uma recomendação, que também não foi respeitada pela referida recorrente. Nestas circunstâncias, as recorrentes não podiam validamente acusar o BCE de ter adotado uma decisão de revogação da autorização de forma prematura ou em violação do princípio da proporcionalidade.

193    Em terceiro lugar, na medida em que a aplicação e a fiscalização do respeito das disposições em matéria de LBC/FT pelas instituições de crédito são indubitavelmente da competência das autoridades nacionais, e que, no presente caso, foi efetivamente a FSA que exerceu essas competências, as recorrentes não podiam validamente invocar a violação das competências próprias desta última pelo BCE.

194    Com efeito, por um lado, foi de acordo com a repartição de competências entre as ANC dos Estados‑Membros participantes e o BCE no âmbito do MUS, acima destacada nos n.os 131, 136, 137 e 140 e, em especial, com o exercício descentralizado das competências exclusivas em matéria de revogação da autorização, reconhecido pela jurisprudência acima evocada no n.o 135, que a FSA cumpriu o seu dever de cooperação e de assistência para com o BCE, conforme previsto no artigo 6.o, n.os 2, segundo parágrafo, e 3, do Regulamento MUS de base, em primeiro lugar, efetuando os controlos e as verificações materiais necessárias, em segundo lugar, comunicando com a instituição de crédito em causa a fim de resolver precocemente os problemas, inclusive consultando a autoridade nacional de resolução também constituída no seu âmbito, e, em terceiro lugar, dispondo de um projeto de decisão de revogação da autorização, ao abrigo do artigo 14.o, n.o 5, do referido regulamento.

195    Por outro lado, as recorrentes não podem validamente acusar o BCE de ter baseado a Decisão de 17 de julho de 2018 nesta proposta de decisão de revogação da autorização da FSA, pois, quando uma ANC propõe a revogação da autorização ao BCE, resulta do artigo 14.o, n.o 5, segundo parágrafo, do Regulamento MUS de base, bem como do artigo 83.o, n.o 2, do Regulamento‑Quadro do MUS que o BCE é obrigado a ter plenamente em conta os fundamentos aduzidos por esta ANC que justificam a referida revogação.

196    Além disso, importa sublinhar que o BCE também solicitou as observações da segunda recorrente sobre o projeto de decisão de revogação da autorização da FSA e tomou‑os em consideração, de acordo com o disposto no artigo 83.o, n.o 2, alínea d), do Regulamento‑Quadro do MUS.

197    Foi assim sem violar a repartição de competências entre as ANC dos Estados‑Membros participantes e o BCE no âmbito do MUS, que, no presente caso, os factos constitutivos das violações da legislação em matéria de LBC/FT foram apurados pela FSA, que a apreciação jurídica que determinou se esses factos justificavam uma revogação da autorização e a apreciação da proporcionalidade ficaram, em contrapartida, reservados para o BCE.

198    Além disso, atento o que precede, os argumentos, expostos pelas recorrentes no contexto do presente grupo de fundamentos, relativos à inexistência de uma peritagem e de uma especialização no âmbito do BCE em matéria de LBC/FT são inoperantes.

199    À luz do que precede, há que negar provimento à presente parte do fundamento.

d)      Quanto à terceira parte relativa ao facto de o BCE não ser competente para recusar a liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente e a venda do banco a outro investidor

200    As recorrentes acusam o BCE, no essencial, de ter adotado uma decisão em que recusava a liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente ou a venda da instituição de crédito a outros investidores.

201    A título preliminar, no que respeita à liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente, importa esclarecer que, nos termos do artigo 117.o da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito, para proceder à sua liquidação por iniciativa própria, uma instituição de crédito deve apresentar um pedido de dissolução voluntária à FSA, que é assim a autoridade competente para aceitar ou rejeitar esse pedido.

202    Resulta dos autos que, por um lado, a segunda recorrente não afirma ter apresentado um pedido de liquidação por iniciativa própria e, por outro, que acusa o BCE de não lhe ter dado a oportunidade de o apresentar. Ora, a referida recorrente não apresentou um tal pedido. Além disso, o BCE não está decerto obrigado a incentivar uma instituição de crédito a apresentar um pedido de liquidação por iniciativa própria a uma autoridade nacional, nem é competente para adotar uma decisão formal de autorização ou de indeferimento de um pedido de liquidação por iniciativa própria, como as partes admitem.

203    Daqui decorre que os argumentos das recorrentes são pertinentes apenas na medida em que, na realidade, visam a avaliação do BCE sobre a proporcionalidade da decisão de revogação da autorização, efetuada no ponto 3.3.2 da Decisão de 17 de julho de 2018, e serão examinados no âmbito da análise dedicada à proporcionalidade da referida revogação (v. n.os 306 a 344, infra). Sucede o mesmo em relação aos argumentos relativos à incompetência do BCE para impedir a venda da instituição de crédito a outros investidores, formulados no âmbito do fundamento 15 da petição.

204    Atento o que precede, há que negar provimento à presente parte do fundamento.

e)      Quanto à quarta parte relativa ao desvio de poder

205    Em apoio da presente parte, as recorrentes sustentam, no essencial, que o BCE não aceitou a liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente (nem a sua venda a outros investidores ou outras medidas menos intrusivas) e revogou a sua autorização por motivos estranhos à supervisão prudencial, em particular, pelas consequências em termos de publicidade favorável que tanto esta como a FSA teriam retirado da mesma, em violação do considerando 75 e do artigo 19.o do Regulamento MUS de base, que obrigam o BCE a exercer as suas atribuições em plena independência de todas as influências políticas.

206    O BCE, apoiado pela Comissão, responde que esse fundamento é manifestamente improcedente.

207    A título preliminar, recorde‑se que, nos termos do considerando 75 do Regulamento MUS de base, «[a] fim de exercer de modo eficaz as suas atribuições de supervisão, o BCE deverá exercer as atribuições de supervisão que lhe são conferidas com plena independência, em especial, de influências políticas indevidas e de interferências do setor bancário que afetariam a sua independência operacional».

208    Além disso, resulta do considerando 15 do Regulamento MUS de base que são conferidas ao BCE atribuições de supervisão específicas indispensáveis para assegurar uma aplicação coerente e eficaz da política da União no que se refere à supervisão prudencial das instituições de crédito, incluindo a adoção de medidas com vista a promover a estabilidade macroprudencial, segundo disposições específicas que reflitam o papel das autoridades nacionais. O artigo 19.o, n.o 1, do referido regulamento, está redigido nos seguintes termos:

«No exercício das atribuições que lhe são conferidas pelo presente regulamento, o BCE e as [ANC] que compõem o MUS devem agir de forma independente. Os membros do Conselho de Supervisão e o comité diretor agem de forma independente e objetiva, no interesse da União no seu conjunto, e não devem procurar obter nem receber instruções das instituições ou órgãos da União, do Governo de qualquer Estado‑Membro ou de qualquer outro organismo público ou privado.»

209    Além disso, resulta de jurisprudência constante que o conceito de desvio de poder se refere ao facto de uma autoridade administrativa ter usado os seus poderes com um objetivo diferente daquele para que lhe foram conferidos. Uma decisão só padece de desvio de poder se, com base em indícios objetivos, pertinentes e concordantes, se verificar que foi adotada para um fim dessa natureza. Além disso, em caso de pluralidade de objetivos prosseguidos, mesmo quando um motivo injustificado se junta aos motivos válidos, a decisão não enferma, por esse facto, de desvio de poder, quando não sacrifique o objetivo essencial (v. Acórdão de 13 de dezembro de 2017, Crédit mutuel Arkéa/BCE, T‑52/16, EU:T:2017:902, n.o 210 e jurisprudência referida).

210    No presente caso, basta observar que as recorrentes não lograram provar que o BCE, ao ter adotado a Decisão de 17 de julho de 2018, prosseguiu um objetivo diferente do exercício da missão que lhe foi confiada de supervisão prudencial das instituições de crédito. Também não apresentaram nenhum elemento de prova suscetível de demonstrar uma eventual falta de independência do BCE, em violação do artigo 19.o do Regulamento MUS de base.

211    De todo o modo, a Decisão de 17 de julho de 2018 baseia‑se num conjunto de fundamentos de revogação da autorização previstos no artigo 18.o da Diretiva 2013/36, que se referem a infrações graves à legislação em matéria de LBC/FT. Daqui resulta que a fundamentação da referida decisão é conforme com os objetivos prosseguidos pelas atribuições de supervisão conferidas ao BCE.

212    Por conseguinte, a presente parte do fundamento deve também ser julgada improcedente.

213    O presente grupo de fundamentos deve, portanto, ser julgado improcedente no seu conjunto.

2.      Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação dos deveres de diligência e de imparcialidade no exame do BCE

214    Segundo as recorrentes, o BCE não apreciou com cuidado e imparcialidade todos os aspetos pertinentes do processo. Todavia, limitam‑se a acusar o BCE de se ter contentado em aceitar as conclusões da FSA, que se baseavam em informações enganosas fornecidas por essa ANC, sem ter procedido ao seu próprio exame das razões subjacentes ao projeto de decisão de revogação da autorização.

215    O BCE contesta os argumentos das recorrentes.

216    Segundo jurisprudência constante, o dever de diligência implica a obrigação de examinar com cuidado e imparcialidade todos os elementos relevantes do caso concreto (v., neste sentido, Acórdãos de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, EU:C:1991:438, n.o 14, e de 16 de setembro de 2013, ATC e o./Comissão, T‑333/10, EU:T:2013:451, n.o 84).

217    No presente caso, em primeiro lugar, há que constatar, à semelhança do BCE, que a Decisão de 17 de julho de 2018 contém uma exposição completa e clara das razões que justificaram a revogação que, por um lado, se basearam nas apreciações da FSA enquanto ANC para a supervisão prudencial da segunda recorrente (instituição de crédito menos significativa) e, por outro, se referem a uma apreciação autónoma do BCE quanto ao respeito das outras condições para decidir da revogação da autorização, incluindo a avaliação da proporcionalidade da medida de revogação.

218    Em segundo lugar, a crítica formulada genericamente a respeito de uma pretensa falta de diligência e de imparcialidade do BCE não pode ser acolhida, a menos que sejam circunstanciadamente expostas as eventuais omissões que o BCE teria cometido no contexto da adoção da Decisão de 17 de julho de 2018.

219    Em terceiro lugar, cabe sublinhar, à semelhança do BCE, que as violações verificadas pela FSA, não utilmente contestadas pela segunda recorrente, devem ser tratadas pelo BCE como factos assentes que, por conseguinte, não necessitam de ser reexaminados pelo BCE. Assim, este limitou‑se, muito corretamente, a verificar se essas violações correspondiam efetivamente a fundamentos que justificavam a revogação da autorização. Esse exame foi efetuado nos pontos 3.3.1 e 3.3.2 da Decisão de 17 de julho de 2018.

220    Em quarto lugar, as simples alegações das recorrentes relativas ao facto de o BCE se ter contentado em se basear nas conclusões da ANC devem também ser rejeitadas pelas razões já acima expostas nos n.os 194 a 198.

221    Além disso, importa constatar que a afirmação das recorrentes segundo a qual a Decisão de 17 de julho de 2018 se baseia em informações enganosas fornecidas pela FSA constitui uma simples alegação que não se baseia em nenhum elemento de prova e deve, por conseguinte, ser rejeitada.

222    Do que precede resulta que o terceiro fundamento deve ser julgado rejeitado.

223    Na medida em que o terceiro fundamento diz respeito à existência de erros de apreciação na proposta de decisão da FSA, há que recordar que o Tribunal de Justiça declarou recentemente que no caso de o direito da União não visar instituir uma partilha entre duas competências, uma nacional, a outra da União, que tenham objetivos distintos, mas, pelo contrário, consagrar um poder decisório exclusivo de uma instituição da União, compete ao juiz da União, a título da sua competência exclusiva para fiscalizar a legalidade dos atos da União ao abrigo do artigo 263.o TFUE, pronunciar‑se sobre a legalidade da decisão final adotada pela instituição da União em causa e, a fim de garantir uma proteção jurisdicional efetiva dos interessados, examinar os eventuais vícios que inquinem os atos instrutórios ou as propostas das autoridades nacionais suscetíveis de afetar a validade dessa decisão final (v. Acórdão de 19 de dezembro de 2018, Berlusconi e Fininvest, C‑219/17, EU:C:2018:1023, n.o 44 e jurisprudência referida).

224    Nestas circunstâncias, o juiz da União deve examinar os eventuais vícios que inquinam a legalidade do projeto de decisão da FSA conforme figuram na Decisão de 17 de julho de 2018, na medida em que esses vícios são contestados pelas recorrentes no contexto dos outros fundamentos que apresentaram.

225    Há assim que examinar se a segunda recorrente logrou pôr em causa as apreciações feitas na Decisão de 17 de julho de 2018.

3.      Quanto aos quarto e quinto fundamentos, relativos a erros de apreciação ou à não tomada em consideração de determinados elementos pertinentes do processo

a)      Quanto ao quinto fundamento, relativo à não tomada em consideração do papel positivo desempenhado pela nova direção da segunda recorrente

226    As recorrentes alegam que a Decisão de 17 de julho de 2018 não tem em conta o papel positivo desempenhado pela nova direção da segunda recorrente e que, dada a competência e a boa reputação desta direção, cujo mandato se iniciou em novembro de 2017, o BCE não devia ter revogado a autorização em março de 2018.

227    O BCE contesta os argumentos das recorrentes.

228    Em primeiro lugar, na medida em que as recorrentes alegam que o BCE não tomou em consideração um elemento pertinente, há que constatar que, no ponto 3.3.1, alínea b), ii), da Decisão de 17 de julho de 2018, a alteração da composição da direção da segunda recorrente foi devidamente tida em conta e que as razões pelas quais essa alteração não foi considerada suficiente para resolver os problemas observados no sistema de gestão de riscos em matéria de LBC/FT foram detalhadamente analisados na referida decisão.

229    Com efeito, em primeiro lugar, na Decisão de 17 de julho de 2018, o BCE declarou, nomeadamente, que embora a nova direção da segunda recorrente, em funções desde 1 de novembro de 2017, tenha aprovado a posição da FSA, relativa à incapacidade de a referida recorrente apresentar uma estratégia inequívoca em relação à sua clientela, uma definição circunstanciada dos riscos para essa clientela e uma avaliação financeira dos riscos operacionais, e que a referida direção tenha assumido o compromisso de alterar a estratégia comercial dessa recorrente no período de 2018‑2021, também confirmou que o seu alvo principal em termos de atividade continuavam a ser os mercados russo e ucraniano.

230    Em segundo lugar, na Decisão de 17 de julho de 2018 vinha indicado que, de acordo com a legislação nacional aplicável (artigos 52.o, n.o 4, e 55.o, n.o 1, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito), a estratégia comercial das instituições de crédito era determinada pelo Conselho de Supervisão, e não pelo conselho de administração.

231    Em terceiro lugar, na Decisão de 17 de julho de 2018 também vinha referido que, não obstante as mudanças de membros do Conselho de Supervisão da segunda recorrente, também ocorridas entre 2012 e 2018, os dois acionistas maioritários da referida recorrente continuavam a fazer parte do referido Conselho de Supervisão e que a FSA não tinha identificado nenhuma alteração de estratégia no que diz respeito aos princípio de gestão do risco, o que permitia concluir com alguma razoabilidade que estes eram sobretudo influenciados pelos dois referidos acionistas maioritários. Esta influência também podia ser confirmada pelo facto de, não obstante as três mudanças de direção entre 2012 e 2017, essa recorrente nunca ter alterado o seu modelo de empresa e a sua atitude quanto ao não respeito das exigências regulamentares em matéria de LBC/FT.

232    Por todos estes motivos, a FSA no seu projeto de decisão e o BCE na Decisão de 17 de julho de 2018 concluíram que as melhorias observadas na sequência da alteração de direção da segunda recorrente não eram suficientes para garantir que esta respeitaria a legislação em matéria de LBC/FT.

233    Ora, estes fundamentos, que de resto não foram circunstanciadamente postos em causa pelas recorrentes no contexto do recurso interposto no processo T‑584/18, por um lado, demonstram que o BCE tomou efetivamente em consideração a nova direção da referida recorrente enquanto elemento pertinente do processo e, por outro, que não estão viciados por um erro de apreciação.

234    Em segundo lugar, na medida em que as recorrentes invocam um erro de apreciação do BCE no que respeita à Decisão de 17 de julho de 2018, importa sublinhar que a revogação da autorização da segunda recorrente não se baseou na falta de qualidade do conselho de administração, ao abrigo do artigo 18.o, alínea c), da Diretiva 2013/36, conjugado com o artigo 13.o, n.o 1, da referida diretiva, mas na não adoção pela referida recorrente das medidas necessárias para dar cumprimento às exigências regulamentares em matéria de LBC/FT, o que, como acima se sublinhou no n.o 231, não obstante a nova direção dessa recorrente, as recorrentes não contestaram validamente.

235    Em terceiro lugar, na medida em que os argumentos das recorrentes se referem a um erro de apreciação do BCE na sua avaliação da proporcionalidade da Decisão de 17 de julho de 2018, por referência a outras medidas menos intrusivas que a revogação da autorização, há que remeter para o exame da avaliação da proporcionalidade (v. n.os 306 a 344, infra).

236    Atento o que precede, o quinto fundamento deve ser julgado improcedente.

b)      Quanto ao quarto fundamento, relativo a um erro de apreciação no que respeita ao caráter errado das informações sobre a atividade da segunda recorrente na Letónia

237    As recorrentes alegam que o BCE não podia ter baseado a Decisão de 17 de julho de 2018 na transmissão de informações incorretas à FSA a respeito das atividades transfronteiriças da segunda recorrente na Letónia. As recorrentes afirmam, em primeiro lugar, que as declarações factuais alegadamente inexatas não são concretizadas nem se baseiam em elementos de prova, sendo que nunca ocultaram as atividades que a segunda recorrente exercia na Letónia, publicamente transmitidas na página Internet desta. Em segundo lugar, estas declarações incidiam apenas sobre uma questão de distinção terminológica entre «gabinete de representação» e «serviço/gabinete transfronteiriço» ou entre «gabinete de apoio» e «sucursal». Em terceiro lugar, o procedimento de passaporte para exercer atividades financeiras transfronteiriças noutros países que a referida recorrente não respeitou era um procedimento de natureza puramente formal e a própria recorrente respeitou‑o relativamente às suas atividades na Alemanha, Suécia e Reino Unido. Em quarto lugar, esta questão já não é pertinente porque foi resolvida no âmbito de um acordo num tribunal administrativo letão e nem a FSA nem a ANC letã aplicaram sanções a esta recorrente por este motivo. Em quinto lugar, era necessário que as declarações revestissem particular gravidade para conduzirem à revogação da autorização.

238    Além disso, as recorrentes consideram que a FSA teve uma atitude ambivalente a partir da adoção da decisão FOLTF e não deu a entender à segunda recorrente que considerava que a questão ainda estava em aberto. Baseiam‑se, a este respeito, no comunicado de imprensa da referida recorrente, de 28 de julho de 2017, no qual o acordo perante a ANC letã se encontrava resumido e do qual resultava que o assunto relativo às atividades da segunda recorrente na Letónia estava encerrado. Acrescentam que é absurdo considerar que uma simples inexatidão pode constituir um fundamento de revogação da autorização de uma instituição de crédito. Solicitam ao Tribunal Geral que ordene à FSA e ao BCE que identifiquem as declarações alegadamente enganosas e transmitam os documentos nos quais a FSA e o BCE suscitaram a questão como se ainda estivesse pendente, não obstante o acordo a que se chegou no tribunal administrativo letão. Solicitam igualmente que os representantes da FSA e do BCE apresentem o seu testemunho a este respeito.

239    O BCE contesta os argumentos das recorrentes.

240    A título preliminar, importa recordar que o considerando 19 da Diretiva 2013/36 estipula que «[a]s instituições de crédito autorizadas num Estado‑Membro de origem deverão poder exercer em toda a União a totalidade ou parte das atividades referidas na lista de operações sujeitas ao reconhecimento mútuo, através do estabelecimento de sucursais ou através da prestação de serviços».

241    Nos termos do considerando 20 da Diretiva 2013/36, «[é] conveniente alargar o benefício do reconhecimento mútuo àquelas operações quando as mesmas sejam exercidas por uma instituição financeira filial de uma instituição de crédito, desde que essa filial seja incluída na supervisão em base consolidada à qual está sujeita a empresa‑mãe e preencha determinados requisitos estritos».

242    No âmbito do capítulo 2 do título V da Diretiva 2013/36, relativo ao direito de estabelecimento das instituições de crédito, os artigos 35.o e 36.o instituem uma obrigação de comunicação e regulam as relações entre as autoridades competentes.

243    O artigo 35.o da Diretiva 2013/36 determina que as instituições de crédito que pretendam estabelecer uma sucursal no território de outro Estado‑Membro comunicam esse facto às autoridades competentes do seu Estado‑Membro de origem (n.o 1). Essa comunicação deve ser acompanhada das informações relativas, nomeadamente, ao Estado‑Membro em cujo território tencionam estabelecer a sucursal, ao programa de atividades, no qual devem ser indicados o tipo de operações previsto e a estrutura organizativa da sucursal, ao endereço no Estado‑Membro de acolhimento ao qual possam ser solicitados documentos e ao nome dos dirigentes que serão responsáveis pela gestão da sucursal (n.o 2).

244    O artigo 35.o, n.o 4, da Diretiva 2013/36 dispõe que, «[c]aso as autoridades competentes do Estado‑Membro de origem recusem comunicar as informações a que se refere o n.o 2 às autoridades competentes do Estado‑Membro de acolhimento, devem dar a conhecer os motivos da recusa à instituição de crédito interessada no prazo de três meses a contar da receção de todas as informações».

245    O artigo 36.o, n.os 1 a 4, da Diretiva 2013/36 está redigido nos seguintes termos:

«1.      Antes de a sucursal da instituição de crédito iniciar as suas atividades, as autoridades competentes do Estado‑Membro de acolhimento dispõem de um período de dois meses a contar da data de receção da comunicação a que se refere o artigo 35.o para organizar a supervisão da instituição de crédito, nos termos do Capítulo 4, e para definir, se for caso disso, as condições em que, por razões de interesse geral, essas atividades devem ser exercidas no Estado‑Membro de acolhimento.

2.      A partir da receção de uma comunicação da autoridade competente do Estado‑Membro de acolhimento ou, na falta de tal comunicação, decorrido o prazo fixado no n.o 1, a sucursal pode ser estabelecida e iniciar as suas atividades.

3.      Em caso de modificação do conteúdo de uma das informações comunicadas por força do artigo 35.o, n.o 2, alíneas b), c) ou d), a instituição de crédito notifica por escrito a modificação em causa às autoridades competentes do Estado‑Membro de origem e do Estado‑Membro de acolhimento, pelo menos um mês antes de proceder a essa modificação, a fim de que as autoridades competentes do Estado‑Membro de origem se pronunciem na sequência de uma comunicação nos termos do artigo 35.o e de que as autoridades competentes do Estado‑Membro de acolhimento se pronunciem, definindo as condições da modificação, nos termos do n.o 1 do presente artigo.

4.      As sucursais que tenham iniciado as suas atividades, de acordo com a regulamentação dos Estados‑Membros de acolhimento, antes de 1 de janeiro de 1993, são consideradas como tendo sido objeto do procedimento estabelecido no artigo 35.o e nos n.os 1 e 2 do presente artigo. Com efeitos desde 1 de janeiro de 1993, essas sucursais regem‑se pelo disposto no n.o 3 do presente artigo, nos artigos 33.o e 52.o e no Capítulo 4.»

246    O artigo 39.o da Diretiva 2013/36, sob a epígrafe «Procedimento de comunicação», prevê nos seus n.os 1 e 2:

«1.      As instituições de crédito que desejem exercer pela primeira vez as suas atividades no território de outro Estado‑Membro ao abrigo da liberdade de prestação de serviços devem comunicar às autoridades competentes do Estado‑Membro de origem as atividades constantes da lista do Anexo I que pretendam exercer.

2.      As autoridades competentes do Estado‑Membro de origem enviam às autoridades competentes do Estado‑Membro de acolhimento a comunicação prevista no n.o 1 no prazo de um mês a contar da sua receção.»

247    O artigo 67.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36 tem a seguinte redação:

«O presente artigo aplica‑se pelo menos em qualquer das seguintes situações:

a)      A instituição ter obtido uma autorização por meio de falsas declarações ou de qualquer outra forma irregular;

[…]

e)      A instituição não reportar informações sobre o cumprimento da obrigação de satisfazer os requisitos de fundos próprios estabelecidos no artigo 92.o do Regulamento (UE) n.o 575/2013, às autoridades competentes, ou reportá‑las de forma incompleta ou inexata, em infração ao artigo 99.o, n.o 1, desse regulamento;

f)      A instituição não reportar às autoridades competentes os dados a que se refere o artigo 101.o do Regulamento (UE) n.o 575/2013, ou reportá‑los de forma incompleta ou inexata;

g)      A instituição não reportar informações sobre um grande risco às autoridades competentes, ou reportá‑las de forma incompleta ou inexata, em infração ao artigo 394.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 575/2013;

h)      A instituição não reportar informações sobre a liquidez às autoridades competentes, ou reportá‑las de forma incompleta ou inexata, em infração ao artigo 415.o, n.os 1 e 2, do Regulamento (UE) n.o 575/2013;

i)      A instituição não reportar informações sobre o rácio de alavancagem às autoridades competentes, ou reportá‑las de forma incompleta ou inexata, em infração ao artigo 430.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 575/2013;

[…]

m)      A instituição não divulgar informações, ou divulgar informações incompletas ou inexatas[,] em infração ao artigo 431.o, n.os 1, 2 e 3, ou ao artigo 451.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 575/2013;

[…]»

248    No ponto 3.3.1, alínea d), da Decisão de 17 de julho de 2018, ao basear‑se no projeto de decisão de revogação da autorização da FSA, o BCE considerou que a segunda recorrente tinha violado a legislação letã de transposição dos artigos 35.o a 38.o da Diretiva 2013/36, por se ter estabelecido na Letónia com uma sucursal sem ter respeitado os procedimentos previstos, e, por conseguinte de forma ilegal, bem como ao fornecer informações falsas à FSA a respeito do estabelecimento na Letónia. Por um lado, a FSA tinha‑se baseado em duas cartas que recebera da referida recorrente: na primeira, negava ter explorado uma sucursal na Letónia, embora o contrário tenha sido provado e, na segunda, afirmava ter fechado a sucursal na Letónia, embora ainda estivesse operacional. Por outro lado, tinha tomado em consideração os elementos de prova obtidos durante uma inspeção no local que realizara de 5 de setembro a 14 de novembro de 2016, da qual resultou que essa recorrente tinha prestado serviços financeiros através de uma sucursal estabelecida na Letónia desde outubro de 2013.

249    As recorrentes contestam, no essencial, o caráter obrigatório do procedimento de comunicação (dito de «passaporte»), a que se referem os artigos 35.o e 36.o da Diretiva 2013/36.

250    A este respeito, há que observar que a Diretiva 2013/36 tem por objetivo a harmonização dos requisitos para a concessão da autorização para o acesso às atividades financeiras das instituições de crédito em toda a União para que uma instituição autorizada no seu próprio Estado‑Membro possa ser autorizada a exercer todas ou parte das suas atividades em toda a União através do estabelecimento de sucursais ou através da prestação de serviços, beneficiando do reconhecimento mútuo, conforme também resulta do considerando 19 da referida diretiva.

251    Além disso, resulta dos artigos 35.o a 38.o da Diretiva 2013/36 que o legislador da União decidiu criar, para as instituições de crédito que pretendam estabelecer uma sucursal noutro Estado‑Membro, um sistema de comunicação à autoridade competente do Estado‑Membro de origem. Esta é, assim, a autoridade competente para avaliar da existência das condições para o acesso desta sucursal às atividades financeiras noutro Estado‑Membro.

252    O poder decisório da autoridade competente do Estado‑Membro de origem incide, nomeadamente, sobre a suficiência e a exaustividade das informações enumeradas no n.o 2 do artigo 35.o da Diretiva 2013/36, que devem ser transmitidas à autoridade nacional competente do Estado de acolhimento, e sobre o controlo da adequação da estrutura administrativa ou da situação financeira da instituição de crédito que pretende abrir uma sucursal noutro Estado‑Membro. Em caso de dúvida, essas informações não são comunicadas e a instituição de crédito em causa é informada dos fundamentos da recusa.

253    Do poder de recusar a comunicação e da margem de que dispõe a autoridade competente do Estado‑Membro de origem para apreciar as informações que devem ser comunicadas pela instituição de crédito que pretende estabelecer uma sucursal noutro Estado‑Membro decorre o caráter não puramente formal do procedimento de comunicação, dito de «passaporte».

254    Além disso, resulta do artigo 36.o, n.o 1, da Diretiva 2013/36 que a autoridade nacional competente do Estado‑Membro de acolhimento só prepara a supervisão da sucursal após receber as informações a que se refere o artigo 35.o da mesma diretiva. Daqui decorre que a comunicação dessas informações constitui uma formalidade essencial para que a referida autoridade competente possa exercer a sua atividade de supervisão sobre a sucursal de uma instituição de crédito de outro Estado‑Membro.

255    Esta conclusão encontra confirmação numa interpretação teleológica e sistemática da Diretiva 2013/36, designadamente dos capítulos 2 e 3 do título V desta diretiva. Com efeito, a razão de ser destas disposições consiste em conciliar a possibilidade de uma instituição de crédito autorizada num Estado‑Membro exercer a sua liberdade de prestação serviços e o seu direito de estabelecimento noutros Estados‑Membros, com a exigência da supervisão prudencial das eventuais sucursais da referida instituição noutros Estados‑Membros. Na perspetiva de facilitar o exercício deste direito e o reconhecimento mútuo das autorizações na União, numa época em que a competência para conceder essas autorizações era das autoridades nacionais, o legislador optou, na Diretiva 2013/36, por concentrar nas mãos da autoridade competente do Estado‑Membro de origem a responsabilidade pela verificação da existência das condições para o exercício das atividades financeiras de uma sucursal de uma instituição de crédito. Com efeito, esta autoridade é aquela que está em melhores condições para conhecer a sua estrutura organizacional e a sua política comercial e para prestar assistência, através do fornecimento dessas informações, à autoridade competente do Estado‑Membro de acolhimento na sua missão de supervisão da sucursal estabelecida no seu território.

256    Atento o que precede, há que reconhecer que o procedimento de comunicação, dito de «passaporte», reveste caráter vinculativo.

257    Ora, as recorrentes não contestam o facto de que a segunda recorrente não deu início ao procedimento de comunicação, tendo‑se antes limitado a pôr em causa a gravidade do seu comportamento, que consideram ser um simples incumprimento de exigências puramente formais. Todavia, resulta do acima exposto nos n.os 248 a 256 que o procedimento de comunicação que a referida recorrente violou não corresponde a uma simples formalidade, mas a uma obrigação legal. Por conseguinte, esta estabeleceu uma sucursal na Letónia e exerceu atividades financeiras ilegalmente.

258    Além disso, na medida em que a FSA forneceu ao BCE uma explicação detalhada dos resultados das suas investigações sobre esta questão da qual resulta também que a segunda recorrente prestava serviços financeiros na Letónia simultaneamente a clientes letões e de países terceiros, e que esses clientes recrutados na Letónia tinham gerado, entre novembro de 2013 e agosto de 2016, 66 % da receita total dos serviços prestados pela segunda recorrente, e que esses resultados nunca foram circunstanciadamente postos em causa pelas simples alegações não fundamentadas da segunda recorrente, estes factos devem considerar‑se assentes.

259    Ora, a prestação de serviços financeiros aos clientes letões e a importância que isso tem nas receitas da segunda recorrente demonstram que a sucursal na Letónia não era um simples gabinete de representação ou de apoio.

260    Nestas circunstâncias, não se pode considerar que as apreciações da FSA a respeito da falsidade das informações que lhe foram transmitidas nas duas cartas de 26 de setembro de 2013 e de 9 de fevereiro de 2016 sejam erróneas. Com efeito, embora as recorrentes afirmem que as atividades da referida sucursal não tinham por destinatários os letões, mas clientes de países terceiros, resulta dos elementos pormenorizados obtidos pela FSA durante a sua inspeção in situ que 66 % da receita da referida recorrente decorria das atividades desta sucursal e que 3 % das contas aí abertas pertenciam a residentes letões. Há que constatar que as recorrentes nem sequer tentaram contestar os números que a FSA forneceu ao BCE.

261    Por último, há que rejeitar os argumentos por meio dos quais as recorrentes acusam o BCE de não ter analisado a gravidade dos comportamentos da segunda recorrente.

262    A este respeito, por um lado, deve sublinhar‑se que a transmissão de informações falsas a uma autoridade nacional de supervisão reveste uma gravidade intrínseca na medida em que pode pôr em causa a fiabilidade das informações transmitidas pelas instituições de crédito sujeitas à supervisão, necessária para garantir a efetividade e a eficácia da sua missão bem como o sistema de confiança mútua entre as ANC, que a criação do procedimento de comunicação, dito de «passaporte», pretende garantir no âmbito do MUS.

263    A importância de as ANC disporem das informações necessárias e poderem confiar na correção das informações para desempenharem as suas funções de supervisão prudencial e, por conseguinte, a gravidade do comportamento de uma instituição de crédito que viola as suas obrigações de informação também encontra confirmação na redação do artigo 67.o, n.o 1, alíneas a), e) a i) e m), da Diretiva 2013/36, que prevê como casos de revogação da autorização [por força da remissão feita para esta disposição pelo artigo 18.o, alínea f), da mesma diretiva] o não reporte de informações nos casos das alíneas e) a i) e m) deste último artigo e a transmissão de informações para efeitos da obtenção de uma autorização no caso da alínea a) do mesmo artigo.

264    Por outro lado, é certo que o BCE devia tomar em consideração a existência de um «acordo judicial administrativo» entre a instituição de crédito e a autoridade competente do Estado‑Membro de acolhimento, através do qual a referida instituição se comprometeu a pôr termo às violações em causa, no âmbito da sua apreciação da proporcionalidade da medida de revogação da autorização, não bastando para este efeito afirmar que as referidas violações constituem o fundamento desta revogação nos termos do direito nacional estónio (artigo 17.o, n.o 1, pontos 2 e 15, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito).

265    Todavia, cabe observar que, no âmbito do «acordo judicial administrativo» em causa, a segunda recorrente comprometeu‑se a respeitar plenamente a decisão da ANC letã que a proibiu de prestar serviços financeiros na Letónia e de aí recrutar novos clientes, e que a obrigou a pôr termo às suas relações contratuais com os clientes existentes na Letónia e às suas relações comerciais com os clientes recrutados na Letónia no âmbito do princípio da liberdade de prestação de serviços.

266    Além disso, por um lado, o «acordo judicial administrativo» em causa não era suscetível de legalizar retroativamente os comportamentos ilegais da segunda recorrente, mas apenas de evitar a eventualidade de outras medidas, incluindo sanções, no futuro.

267    Por outro lado, resulta do comunicado de imprensa da ANC letã que, para continuar a prestar os seus serviços na Letónia, a segunda recorrente devia antes de mais ter obtido uma autorização de acordo com os procedimentos previstos na regulamentação. Isto demonstra que a situação não estava inteiramente resolvida, porquanto a referida recorrente ainda não tinha dado início a um processo com vista à obtenção de uma autorização.

268    Do que precede resulta que o quarto fundamento não pode ser acolhido. Por conseguinte, o presente grupo de fundamentos deve ser julgado improcedente.

4.      Quanto aos fundamentos 6, 12 e 18 relativos a um erro de apreciação por o BCE se ter erradamente baseado na violação da recomendação da FSA e à violação do princípio da segurança jurídica

269    No seu fundamento 18, as recorrentes alegam a violação do princípio da segurança jurídica, na medida em que, na recomendação, a FSA não definiu com exatidão o que esperava em relação às exigências regulamentares a respeitar em matéria de LBC/FT. A referida recomendação previa, na sua parte operacional, uma coima de 32 000 euros caso essas exigências não fossem respeitadas, o que podia dar origem a que a segunda recorrente ficasse na legítima expectativa de que, antes de haver uma revogação da autorização, a referida ANC tomaria medidas prudenciais menos intrusivas. No contexto do fundamento 6, as recorrentes observam que esta ANC, no seu projeto de decisão de revogação da autorização, e o BCE, na Decisão de 17 de julho de 2018, não indicaram quais as exigências regulamentares e os critérios padronizados que a referida recorrente não tinha respeitado e por referência aos quais se tinha procedido à avaliação de não conformidade.

270    No âmbito do fundamento 12, as recorrentes alegam que a violação de uma recomendação de uma ANC não constitui um fundamento válido de revogação da autorização, sobretudo quando, como no presente caso, a recomendação está formulada de um modo vago, sem especificar quais são, em concreto, as medidas corretivas a adotar. O texto da recomendação da FSA, apenso à contestação do BCE, remete para o conteúdo de um relatório da inspeção in situ realizada entre 13 de abril e 12 de junho de 2015, que, porém, não foi junto ao processo. O ónus da prova da concretude do conteúdo da instrução cabia ao BCE. A Decisão de 17 de julho de 2018 deixava vagamente perceber que a referida recomendação não tinha sido inteiramente respeitado ou não o tinha sido no prazo fixado. Um tal fundamento não justificava a medida de supervisão mais intrusiva, isto é, a revogação da autorização. Por último, as recorrentes afirmam que a segunda recorrente pediu esclarecimentos sobre o conteúdo concreto das exigências regulamentares em matéria de LBC/FT, mas que não as recebeu.

271    O BCE refuta os argumentos das recorrentes.

272    Importa recordar que, nos termos do artigo 74.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2013/36:

«1. As instituições devem dispor de dispositivos de governo sólidos, que incluam uma estrutura organizativa clara, com linhas de responsabilidade bem definidas, transparentes e coerentes, processos eficazes para identificar, gerir, controlar e comunicar os riscos a que estão ou podem vir a estar expostas, mecanismos adequados de controlo interno, incluindo procedimentos administrativos e contabilísticos sólidos, e políticas e práticas de remuneração consentâneas com uma gestão sólida e eficaz do risco e que promovam esse tipo de gestão.

2. Os dispositivos, processos e mecanismos referidos no n.o 1 devem ser completos e proporcionados à natureza, nível e complexidade dos riscos inerentes ao modelo de negócio e às atividades da instituição. Devem ser tidos em consideração os critérios técnicos fixados nos artigos 76.o a 95.o»

273    Segundo a jurisprudência, o princípio da segurança jurídica obriga a ter em conta o estado do direito em vigor no momento da aplicação do texto controvertido (Acórdão de 14 de julho de 1971, Henck, 12/71, EU:C:1971:86, n.o 5) e exige que qualquer ato das instituições que produza efeitos jurídicos seja claro, preciso e levado ao conhecimento do interessado de tal forma que este possa conhecer, com certeza, o momento a partir do qual o referido ato existe e começa a produzir os seus efeitos jurídicos. (v. Acórdão de 22 de janeiro de 1997, Opel Áustria/Conselho, T‑115/94, EU:T:1997:3, n.o 124 e jurisprudência referida).

274    No presente caso, no ponto 3.3.1, alínea c), da Decisão de 17 de julho de 2018, o BCE referiu, com base no projeto de decisão da FSA, que a segunda recorrente não tinha respeitado a recomendação em causa, adotada em 8 de agosto de 2016, por força do qual esta era obrigada, em primeiro lugar, a aplicar as regras processuais, em segundo lugar, a aplicar corretamente o artigo 13.o, n.o 1, pontos 3 a 5, da Lei estónia em Matéria de LBC/FT, na versão aplicável no momento da adoção da recomendação, e a evitar encetar, se fosse caso disso, relações comerciais, em terceiro lugar, a verificar se as referidas disposições tinham sido corretamente aplicadas às relações comerciais existentes e, se necessário, voltar a aplicar os procedimentos de controlo em relação à clientela, em quarto lugar, a evitar efetuar transações, se fosse caso disso, ao abrigo do artigo 27.o, n.o 2, da referida lei, na versão em vigor no momento da adoção da referida recomendação, em quinto lugar, a recorrer à unidade de informação financeira quando uma atividade ou outras circunstâncias possam indiciar um branqueamento ou uma tentativa de branqueamento de capitais ou o um financiamento ou tentativa de financiamento de terrorismo, ou quando a referida recorrente tivesse razões para crer ou soubesse que se tratava de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo e, em sexto lugar, a fornecer à FSA, antes de 9 de dezembro de 2016, um relatório sobre a forma como essa recorrente tinha dado execução a essa recomendação. O BCE concluiu que, por não ter dado inteira execução à recomendação em causa dentro do prazo previsto, a segunda recorrente tinha assim violado o artigo 17.o, n.o 1, ponto 14, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito e que esta violação do direito nacional constituía outro fundamento de revogação da autorização, nos termos do artigo 18.o, alínea f), da Diretiva 2013/36.

275    As recorrentes consideram, no essencial, que a recomendação em causa não podia ser respeitada, pois limitava‑se a recordar as disposições com as quais a segunda recorrente tinha de se conformar e que o objetivo do restabelecimento da legalidade não era um objetivo legítimo para revogar a autorização de uma instituição de crédito.

276    Em primeiro lugar, contrariamente ao que as recorrentes sustentam, uma medida de revogação da autorização tem por objetivo pôr termo às repetidas violações das exigências regulamentares que todas as instituições de crédito são obrigadas a respeitar. Neste âmbito, a adoção de uma recomendação pela ANC mais não faz do que confirmar que o seu destinatário teve diversas oportunidades para as cumprir e que a medida mais intrusiva, a revogação da autorização, só foi adotada em última instância.

277    Em segundo lugar, não é plausível que, após diversas advertências da ANC e inúmeros contactos com esta a este respeito, incluindo a possibilidade de apresentar comentários sobre os relatórios das inspeções que lhe foram transmitidos e de solicitar informações, formal ou informalmente, durante o processo, uma instituição de crédito não compreenda de que forma deve dar cumprimento a disposições legais, como as em vigor em matéria de LBC/FT. Além disso, há que rejeitar a alegação das recorrentes segundo a qual a FSA e o BCE se recusaram a fornecer‑lhes as informações que haviam solicitado, uma vez que não se encontram de modo nenhum fundamentadas.

278    A este respeito, cabe esclarecer que a FSA efetuou quatro inspeções in situ. A recomendação em causa foi adotada em 8 de agosto de 2016, na sequência da primeira inspeção in situ que teve lugar em 2015. Durante a segunda inspeção in situ, no outono de 2016, a FSA verificou que as deficiências apontadas persistiam e que a segunda recorrente ainda não tinha cumprido a referida recomendação. Na sequência desta segunda inspeção in situ, essa recorrente teve a oportunidade de apresentar os seus comentários e realizaram‑se diversas reuniões com a FSA no outono de 2016. A FSA realizou uma terceira inspeção in situ em setembro de 2017, cujo relatório foi transmitido em 4 de outubro de 2017 à referida recorrente, que pôde apresentar os seus comentários. Para além da possibilidade permanente de que a referida recorrente gozava de pedir explicações à FSA a respeito das indicações que lhe foram por diversas vezes fornecidas sobre as unidades estruturais que importava criar, não sendo suficientes os elementos de pessoal necessários, as regras processuais a cumprir, as regras de separação entre as unidades específicas que importava manter e os fluxos de informação a instalar, importa observar que a recorrente em questão dispôs de catorze meses entre esta recomendação e a transmissão do referido relatório e ainda de seis meses até à revogação da autorização para compreender as exigências regulamentares e lhes dar cumprimento.

279    Em terceiro lugar, embora o BCE observe que a recomendação em causa deve ser lida em conjugação com o relatório da segunda inspeção in situ, comunicado à segunda recorrente, há que reconhecer que a Decisão de 17 de julho de 2018 é suficientemente clara e precisa quanto às exigências regulamentares a que a referida recorrente tinha de dar cumprimento.

280    Relativamente à alegada insuficiência dos sistemas de governação, a Decisão de 17 de julho de 2018 precisa que, não obstante a existência, na estrutura da segunda recorrente, de unidades organizacionais e de regras processuais apropriadas, estas unidades sofriam de uma falta de efetivos e exerciam demasiadas funções, e que os procedimentos internos não eram corretamente aplicados. Estas deficiências tinham sido observadas em relação a três linhas de defesa relativas, respetivamente, aos controlos das transações individuais efetuadas pelos gestores de clientes, às funções de deteção, gestão e de acompanhamento dos riscos, à falta de separação efetiva entre a primeira e a segunda linha de defesa (assunção dos riscos e gestão dos riscos) que ocasiona situações de conflitos de interesses graves, e às funções de auditoria interna. Embora, já em 2013 e 2014, os responsáveis pela deteção, pela gestão e pelo acompanhamento dos riscos tivessem identificado e assinalado ao conselho de administração que as disposições internas não eram respeitadas, este não reagiu adequadamente, em violação do artigo 55.o, n.o 2, ponto 31, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito, que transpôs o artigo 88.o da Diretiva 2013/36. Além disso, o conselho de administração não providenciou o pessoal necessário aos agentes responsáveis pela conformidade, que representam a segunda linha de defesa, em violação do artigo 31.o, n.o 2, da Lei estónia em Matéria de LBC/FT que transpôs a Diretiva 2015/849, na versão aplicável no momento da adoção da recomendação em causa.

281    Relativamente às deficiências apontadas em matéria de LBC/FT, a Decisão de 17 de julho de 2018 precisa que tinha sido observado um grande número de transações inabituais. A saída média de caixa da segunda recorrente em 2015 foi quatro vezes mais elevada e a entrada em caixa média foi sete vezes mais elevada do que a média do sistema bancário estónio. Estes pagamentos foram principalmente efetuados por clientes que apresentavam um elevado nível de risco nesta área e representavam cerca de 97 % de todas as transferências realizadas na Estónia em 2015. Não obstante os avisos recorrentes da FSA a propósito da necessidade de a referida recorrente pôr em prática uma nova estratégia comercial que respondesse às preocupações manifestadas e não obstante os anúncios dos três diferentes conselhos de administração desta recorrente no que respeita à vontade de alterar o modelo de empresa, os resultados da terceira inspeção in situ demonstraram que a estratégia comercial da mesma recorrente não tinha sido significativamente alterada e que esta última ainda operava num segmento de mercado caracterizado por riscos mais elevados nesta área.

282    Também ficou especificado não existirem regras eficazes em matéria de LBC/FT para gerir os riscos associados ao modelo de empresa da segunda recorrente, por um lado, no que respeita às medidas de monitorização da clientela no momento da criação de uma nova relação contratual bem como à inexistência de um controlo constante das relações comerciais existentes e, por outro, no que respeita ao controlo das transações efetuadas e do perfil de risco dos clientes em causa. Considerou‑se que as deficiências observadas tinham natureza estrutural e não correspondiam a casos isolados.

283    Além disso, não obstante certas alterações nas políticas de controlo do risco em matéria de LBC/FT e da redução, efetuada pela segunda recorrente, dos clientes de alto risco, estas medidas foram consideradas ineficazes, porquanto não garantiam um controlo constante das relações comerciais existentes, incluindo no que respeita à origem dos fundos utilizados nas transações efetuadas, e não identificavam nem verificavam as transações complexas, conexas e de montante invulgarmente elevado, ou as transações desprovidas de um objetivo económico claro.

284    Além disso, as atividades do conselho de administração e do Conselho de Supervisão da segunda recorrente em matéria de LBC/FT e de gestão dos riscos foram consideradas insatisfatórias porque o conselho de administração não tinha determinado o nível de tolerância dos riscos da referida recorrente, nem posto em prática um sistema separado de avaliação dos riscos na matéria, nem preparado uma análise dos riscos operacionais, que incluísse uma análise aprofundada dos ricos nesta matéria, em violação do artigo 55.o, n.o 2, pontos 2 e 3, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito.

285    O BCE tomou efetivamente em consideração a alteração do conselho de administração da segunda recorrente ocorrida em novembro de 2017, bem como as declarações através das quais este se distanciou das políticas comerciais anteriores, reconheceu a persistente inexistência de uma estratégia inequívoca relativamente à sua clientela e anunciou a sua vontade de elaborar uma nova estratégia comercial para os anos de 2018 a 2021. Todavia, observou, por um lado, que o novo conselho de administração confirmou a intenção da referida recorrente de prosseguir com a sua estratégia comercial anterior, o que fazia com que pairassem dúvidas sobre a possibilidade real de essa recorrente pôr efetivamente em prática as alterações anunciadas.

286    Por outro lado, o BCE recordou que, embora uma alteração do conselho de administração pudesse influenciar a estratégia de uma instituição de crédito, a aprovação das suas decisões estratégicas, de acordo com o artigo 52.o, n.o 4, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito, era da competência Conselho de Supervisão. No presente caso, a alteração da composição deste não tinha, contudo, afetado dois membros, dois acionistas maioritários da segunda recorrente, os quais tinham provavelmente influência na definição da estratégia e dos princípios de gestão dos riscos da referida recorrente, pelo que nenhuma alteração radical ou substancial podia ser posta em prática ou ser razoavelmente ponderada para o futuro. A este respeito, as melhorias do sistema, apresentadas por esta recorrente à FSA, foram consideradas insuficientes em termos de integral conformidade com as disposições legais aplicáveis em matéria de LBC/FT.

287    Assim, resulta claramente que as exigências regulamentares violadas se encontram descritas de forma muito detalhada face a situações concretas, relacionadas, designadamente, com, em primeiro lugar, a inexistência de sistemas de governação adaptados ao modelo de empresa da segunda recorrente, que se concentrava na prestação de serviços financeiros a clientes profissionais não residentes com elevado património líquido e com um perfil de elevado risco, conforme imposto pelas disposições nacionais de transposição do artigo 74.o da Diretiva 2013/36, em segundo lugar, a insuficiência das unidades organizacionais encarregadas de pôr em prática as regras procedimentais relativas à proteção e gestão dos riscos em matéria de LBC/FT, no que em especial respeita à deteção, gestão e monitorização dos riscos, à identificação dos clientes antes do início das relações contratuais bem como enquanto durarem, aos controlos das transações individuais efetuadas pelos gestores de clientes, à inexistência de separação entre as funções de controlo dos riscos, por um lado, e a gestão dos riscos, por outro, apta a criar situações de conflitos de interesses, em terceiro lugar, as deficiências no que toca às funções de auditoria interna, em quarto lugar, a inexistência de procedimentos internos ou a violação dos procedimentos internos existentes, em quinto lugar, a existência de um número importante de transações não habituais relacionadas com clientes de elevado risco, que representavam cerca de 97 % de todas as transferências realizadas na Estónia (em 2015), em sexto lugar, a falta de monitorização da clientela quando da constituição de uma nova relação contratual bem como a falta de uma monitorização constante das relações comerciais existentes, incluindo no que respeita à origem dos fundos e à identificação das transações complexas, de montante invulgarmente elevado ou sem um objetivo económico claro e, em sétimo lugar, as atividades com pouco desempenho dos conselhos de administração e de supervisão, no que respeita à gestão dos riscos em matéria de LBC/FT, que não tinham definido o nível de risco tolerável da segunda recorrente, nem posto em prática um sistema de avaliação dos riscos separado em matéria de LBC/FT, nem preparado uma análise dos riscos operacionais.

288    Por conseguinte, nestas circunstâncias, a segunda recorrente não podia validamente alegar uma qualquer violação do princípio da segurança jurídica, na aceção da jurisprudência acima evocada no n.o 273.

289    Em quarto lugar, cabe declarar que a segunda recorrente nunca contestou que não respeitou a totalidade da recomendação em causa no prazo concedido ou que, de acordo com o direito nacional estónio, o incumprimento de uma recomendação da FSA é fundamento da revogação da autorização.

290    A este propósito, resulta dos autos que todas estas deficiências em matéria de LBC/FT, acima evocadas no n.o 287, atenta a sua persistência ao longo de vários anos e a sua dimensão, tinham sido consideradas estruturais e não tinham sido adequadamente corrigidas através das melhorias introduzidas pela segunda recorrente. Em especial, a simples «redução» dos clientes de elevado risco não podia resolver todas as questões referidas. Além disso, a enésima alteração do conselho de administração não produziu os efeitos pretendidos, pois a estratégia comercial da segunda recorrente não sofreu alterações profundas e também não parecia provável que as viesse a sofrer dentro de um prazo razoável, pelas razões acima expostas nos n.os 229 a 232.

291    Com exceção das referências às melhorias introduzidas no que respeita à redução dos clientes de elevado risco e à alteração do conselho de administração, a segunda recorrente não contesta circunstanciadamente todas as deficiências acima mencionadas no n.o 287.

292    Daqui resulta que, como o incumprimento da recomendação em causa constitui de facto um fundamento de revogação da autorização nos termos do direito nacional, e, assim, ao abrigo do artigo 18.o, alínea f), da Diretiva 2013/36, e como a segunda recorrente não respeitou a totalidade da recomendação em causa dentro do prazo concedido, há que concluir que o BCE não cometeu nenhum erro de apreciação por também ter utilizado este fundamento para justificar a revogação da autorização.

293    Em quinto lugar, na medida em que as recorrentes acusam o BCE de não ter definido as exigências regulamentares à luz das quais havia que apreciar o incumprimento da recomendação em causa pela segunda recorrente, importa sublinhar que estas exigências figuram nas disposições do direito nacional estónio que transpôs as diretivas em matéria de LBC/FT. Deve ser dada execução a estas disposições de acordo com a especificidade de cada instituição de crédito. A forma de as cumprir deve assim ser adaptada a cada instituição e integra‑se no âmbito de competência da própria instituição de crédito. Quando a autoridade de supervisão competente, no presente caso a FSA, considera que as modalidades adotadas pela instituição de crédito em causa não são adequadas, informa‑a e propõe medidas corretivas. No presente caso, conforme acima se referiu no n.o 278, a referida recorrente teve a oportunidade de compreender, no âmbito dos diversos contactos tidos com a FSA, as medidas corretivas adequadas que podia e devia ter adotado para cumprir as referidas exigências.

294    Em sexto lugar, na medida em que as recorrentes afirmam que a recomendação em causa não permitia compreender que a revogação da autorização da segunda recorrente era uma possibilidade em caso de violação das exigências regulamentares em matéria de LBC/FT e consideram, no essencial, que a referida recorrente só corria o risco de lhe serem aplicadas coimas, importa observar, à semelhança do BCE, que o ponto 4.8 da referida recomendação refere explicitamente que «a sanção que a FSA podia aplicar no que respeita às infrações observadas era a revogação da autorização ao abrigo do artigo 17.o, n.o 1, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito, e que, porém, por força do n.o 2, desta mesma disposição, a FSA podia, antes de se pronunciar sobre a revogação de uma autorização, adotar uma recomendação, cujo destinatário era a instituição de crédito, e definir um prazo para pôr cobro às deficiências que estavam na origem da revogação da autorização».

295    Daqui há que concluir que a segunda recorrente, na sequência da recomendação em causa, estava consciente das deficiências observadas, de como devia proceder para lhes pôr cobro, bem como do risco, em caso de incumprimento, que a sua autorização corria.

296    Por conseguinte, o presente grupo de fundamentos deve ser rejeitado.

5.      Quanto aos fundamentos 7 a 11, 13 a 15 e 17, relativos à violação do princípio da proporcionalidade

297    No âmbito do fundamento 17, as recorrentes alegam a violação do princípio da proporcionalidade, afirmando que a Decisão de 17 de julho de 2018 aplica uma medida de última instância, a saber, a revogação da autorização, que é desproporcionada face ao desrespeito das exigências regulamentares. Em primeiro lugar, contestam que o objetivo de «restaurar a legalidade» de tal medida seja um objetivo legítimo, pois é demasiado abstrato. Essa medida devia, pelo contrário, encontrar justificação num objetivo específico legítimo de regulação. Em segundo lugar, as recorrentes opõem‑se à análise da adequação da medida em questão, alegando, por um lado, que, como a FSA é a ANC em matéria de LBC/FT, o cumprimento das normas na matéria deve ser imposto principalmente através de medidas adotadas ao abrigo da regulamentação nesta matéria e não através da supervisão bancária. Por outro lado, a medida em causa não era uma forma adequada de punir um incumprimento passado, pois as medidas de regulação devem ter apenas por objeto situações atuais ou devem ser concebidas para prevenir situações de incumprimento futuro. Como a questão das atividades da segunda recorrente na Letónia ficou encerrada com o acordo judicial, semelhante medida era claramente desproporcionada relativamente a esta alegada violação no passado. Em terceiro lugar, segundo as recorrentes, o BCE interpretou incorretamente o critério da necessidade da medida em causa. Em quarto lugar, consideram que o exame da razoabilidade da referida medida, efetuado pelo BCE, também é abstrato e que não tem nenhuma utilidade, pois limitou‑se a comparar de forma abstrata o interesse público na manutenção da legalidade com os interesses privados de um banco, quando deveria ter comparado um objetivo de regulação concreto, como a prevenção de um risco específico, com os referidos interesses privados. Além disso, consideram que o BCE devia ter justificado a gravidade das alegações de incumprimento através da comparação destas com outros casos de incumprimento no setor bancário. Por último, alegam que o BCE não tomou em consideração outras medidas alternativas menos intrusivas, como a imposição de medidas concretas em relação a questões específicas dentro de prazos precisos ou eventualmente sanções ou coimas ou ainda medidas contra os administradores da instituição de crédito ou a nomeação de uma pessoa competente para enquadrar os esforços da referida recorrente para respeitar as exigências regulamentares não cumpridas.

298    Através dos fundamentos 7 a 9, as recorrentes contestam, no essencial, a apreciação feita pelo BCE, por não ter tomado suficientemente em consideração nem o facto de que uma parte importante das atividades da segunda recorrente não dá origem a um risco significativo em matéria de LBC/FT, nem que havia uma redução significativa de clientes nas categorias que apresentavam um risco mais elevado, tendo erradamente concluído que, não obstante os progressos observados, não era razoavelmente expectável que a referida recorrente remediasse os problemas verificados num prazo razoável.

299    Em especial, no contexto do fundamento 7, as recorrentes esclarecem que estando a infração circunscrita a uma parte das suas atividades, o BCE devia apenas ter imposto a cessação das atividades de maior risco, em vez de revogar a autorização.

300    No âmbito do fundamento 8, as recorrentes sustentam que o BCE não atribuiu importância suficiente à redução significativa de clientes das categorias de risco elevado da segunda recorrente e que, embora seja certo que os incumprimentos devem ser corrigidos, era manifestamente incorreto afirmar que qualquer incumprimento justifica a revogação da autorização.

301    No contexto do fundamento 9, as recorrentes consideram que a conformidade com as exigências regulamentares foi sempre possível e que o BCE não podia assim ter concluído que qualquer outra solução diferente da revogação da autorização era irrealista.

302    No âmbito dos fundamentos 10 e 11, as recorrentes criticam a tomada em consideração, como medidas alternativas à revogação da autorização, avaliadas pelo BCE no seu exame da proporcionalidade da medida de revogação da autorização no ponto 3.3.2, alínea b), ii), da Decisão de 17 de julho de 2018, respetivamente, da posterior alteração do conselho de administração da segunda recorrente, quando teria bastado deixar trabalhar aquele que acabara de ser nomeado em novembro de 2017, e da suspensão dos direitos de voto dos acionistas, pois estes já não estavam diretamente envolvidos na gestão da referida recorrente.

303    No âmbito do fundamento 13, ao contestar a apreciação feita pelo BCE, no ponto 3.3.2, alínea b), iv), da Decisão de 17 de julho de 2018, no que se refere à medida alternativa que é a adoção de uma segunda recomendação da FSA que proíbe a prestação de serviços financeiros, as recorrentes afirmam que uma tal proibição geral equivalia de facto a uma revogação da autorização e que a FSA não tinha competência para tal. Em contrapartida, reiteram que uma segunda recomendação da FSA, que proíbe uma parte das suas atividades, concretamente a prestação de serviços financeiros apenas aos clientes não residentes, teria sido possível e menos intrusiva do que a revogação da autorização. Contestam que uma tal proibição tivesse posto termo à viabilidade financeira da segunda recorrente.

304    Por último, por meio dos argumentos expostos no âmbito dos fundamentos 14 e 15, relativos à falta de competência do BCE para recusar a liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente e a sua venda a outro investidor, as recorrentes põem em causa a apreciação do BCE relativa à inadequação destas medidas, no âmbito do exame da proporcionalidade da revogação da autorização. Também segundo as recorrentes, o BCE atuou arbitrariamente por não ter dado tempo suficiente para que a cessão se realizasse. Consideram ainda que a referida liquidação por iniciativa própria só foi afastada porque o BCE pretendia alcançar um efeito publicitário positivo.

305    O BCE contesta os argumentos das recorrentes.

306    A título preliminar, importa recordar que, nos termos do artigo 5.o, n.o 4, TUE, ao abrigo do princípio da proporcionalidade, o conteúdo e a forma da ação da União não devem exceder o necessário para alcançar os objetivos dos Tratados. As instituições da União aplicam o princípio da proporcionalidade em conformidade com o Protocolo n.o 2 relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, anexo ao TFUE.

307    Segundo jurisprudência constante, o princípio da proporcionalidade, que faz parte dos princípios gerais do direito da União, exige que os atos das instituições da União sejam adequados para realizar os objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa e não ultrapassem os limites do que é necessário à realização destes objetivos, sendo que, quando existe uma escolha entre várias medidas adequadas, há que recorrer à que seja menos restritiva e que os inconvenientes causados não devem ser desmedidos face aos objetivos prosseguidos (v. Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, EU:T:2017:337, n.o 67 e jurisprudência referida).

308    Além disso, segundo o Tribunal de Justiça, a apreciação da proporcionalidade de uma medida deve ser conciliada com o respeito pela margem de apreciação eventualmente reconhecida às instituições da União quando da sua adoção (v. Acórdão de 8 de maio de 2019, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, C‑450/17 P, EU:C:2019:372, n.o 53 e jurisprudência referida).

309    No presente caso, depois de ter apurado a existência de diversos fundamentos que a justificavam com base nas disposições aplicáveis, no ponto 3.3.2, da Decisão de 17 de julho de 2018, o BCE analisou a proporcionalidade da medida de revogação da autorização.

310    Em primeiro lugar, o BCE analisou se a medida de revogação da autorização era adequada para alcançar o objetivo de pôr termo às infrações graves e duradouras cometidas pela segunda recorrente, tendo concluído que, atentas as violações relativas à inexistência de um sistema sólido de governação da empresa, à violação das disposições em matéria de LBC/FT, ao desrespeito de uma decisão vinculativa de uma autoridade de supervisão nacional, à transmissão de informações enganadoras a essa autoridade e à exploração ilegal de uma sucursal noutro Estado‑Membro, a revogação da autorização era adequada para alcançar este objetivo.

311    Em segundo lugar, o BCE examinou a necessidade da medida de revogação da autorização, designadamente se existiam outras medidas alternativas menos intrusivas, adequadas para alcançar do mesmo modo o objetivo de restabelecimento da legalidade. Tomou em consideração as seguintes opções: em primeiro lugar, a destituição do conselho de administração da segunda recorrente, tendo concluído que esta medida não era adequada, pois as anteriores alterações de estratégia comercial, ocorridas com três conselhos de administração diferentes, não tinham garantido o respeito da legislação aplicável; em segundo lugar, a cessação ou a suspensão dos direitos de voto de determinados acionistas da referida recorrente, tendo concluído que esta medida não seria eficaz atenta a qualidade de membro do Conselho de Supervisão dos acionistas maioritários, que poderiam ter continuado a exercer uma influência determinante na estratégia desta recorrente, mesmo estando desprovidos do direito de voto; em terceiro lugar, a emissão de uma nova recomendação pela FSA, que esta afastou porque, por um lado, esta recorrente não respeitou a primeira recomendação e não era assim razoavelmente expectável que respeitasse uma segunda e, por outro, uma recomendação destinada a impor a cessação das atividades de elevado risco não ser viável para a recorrente em questão, cuja estratégia comercial se centrava precisamente numa clientela com risco elevado; em quarto lugar, a liquidação por iniciativa própria da recorrente em causa, tendo concluído no entanto que através desta medida o objetivo de restabelecer a legalidade e de proteger os direitos dos depositantes não poderia ser alcançado e que, neste caso, a decisão de sair do mercado incumbiria aos acionistas e, em quinto lugar, a cessão da referida recorrente a outro investidor, que foi excluída pois não parecia existir nenhum compromisso concreto e o plano de empresa apresentado pelo potencial comprador não fornecia elementos suficientes para se apreciar se a operação acarretaria uma alteração importante do modelo de empresa desta recorrente.

312    Em terceiro lugar, o BCE analisou a razoabilidade da medida de revogação da autorização e procedeu a uma ponderação entre o interesse público no restabelecimento da legalidade e o interesse privado da segunda recorrente em evitar a medida de revogação e prosseguir as suas atividades.

313    Ora, importa declarar que o exame realizado pelo BCE a respeito da proporcionalidade da medida de revogação da autorização foi estruturado e efetuado de forma completa. Não está ferido de ilegalidade nem padece de erros de apreciação. Seja como for, esta fundamentação não é posta em causa pelas acusações formuladas pelas recorrentes.

314    As recorrentes contestam em vão todas as etapas da análise que o BCE fez da proporcionalidade da medida de revogação da autorização.

315    Em primeiro lugar, as recorrentes contestam que o objetivo de restabelecer a legalidade fosse um objetivo legítimo para adotar uma medida de revogação da autorização. Em apoio da argumentação que apresentam, limitam‑se no entanto a reiterar que uma simples ilegalidade não deve dar lugar à medida mais intrusiva. A este respeito, há que reconhecer que as violações e as deficiências enumeradas nas páginas 5, 6 e 10 a 20 da Decisão de 17 de julho de 2018 e acima evocadas no n.o 279, aliás não detalhadamente contestadas pelas recorrentes, conforme resulta do acima indicado no n.o 289, não devem ser consideradas uma «simples ilegalidade» ou uma ilegalidade menor, atendendo igualmente à sua pluralidade, à sua gravidade, à sua duração, bem como às inúmeras ocasiões para lhes pôr cobro não exploradas pela segunda recorrente.

316    Em segundo lugar, as recorrentes contestam o exame efetuado pelo BCE a respeito da adequação da medida de revogação da autorização. A este respeito, por um lado, no que se refere ao argumento segundo o qual a referida medida não era adequada para corrigir as infrações em matéria de LBC/FT, este deve ser rejeitado pelas mesmas razões que já foram acima enunciadas nos n.os 185 a 195. Por outro lado, é certo que tal medida não devia ser utilizada para punir violações ocorridas no passado, conforme acima se indicou no n.o 267. Por conseguinte, se o BCE tivesse baseado a sua avaliação da proporcionalidade da medida em questão apenas na infração relativa ao estabelecimento de uma «filial» na Letónia sem respeitar o procedimento de «passaporte», esta poderia ser posta em causa. Todavia, no presente caso, semelhante erro não podia fazer com que toda a fundamentação do BCE atinente à proporcionalidade da medida em causa fosse ilegal, pois o BCE considerou‑a proporcionada face ao conjunto das infrações imputadas à segunda recorrente.

317    Com efeito, dada a margem de discricionariedade de que o BCE dispõe no contexto da adoção de uma medida de revogação da autorização, a avaliação da adequação da referida medida não pode, no presente caso, ser considerada manifestamente errada na perspetiva da jurisprudência acima evocada no n.o 308, bem como da pluralidade, da gravidade e da duração das infrações cometidas pela segunda recorrente e ainda da reduzida probabilidade de esta respeitar integralmente as exigências regulamentares num prazo aceitável, que justificam a aplicação da medida mais intrusiva e não permitem concluir que um eventual erro na avaliação da proporcionalidade, dadas as violações do procedimento de «passaporte», podia ter uma influência determinante no resultado da apreciação global efetuada pelo BCE.

318    Em terceiro lugar, as recorrentes põem em causa as conclusões do BCE sobre a razoabilidade da medida de revogação da autorização. A este respeito, por um lado, não tem fundamento a alegação segundo a qual o BCE efetuou um exame demasiado vago entre um interesse geral abstrato na legalidade e os seus próprios interesses privados, pois ficou acima assente, no n.o 315, que o BCE analisou a gravidade das infrações, a sua longa duração, as múltiplas ocasiões de as sanar que não foram exploradas pela segunda recorrente bem como a perda de confiança do público nos mercados financeiros estónio e europeu, tendo chegado à conclusão de que o interesse público no restabelecimento da legalidade primava sobre o interesse privado dessa recorrente em não ser submetida à referida medida. Por outro lado, o argumento segundo o qual o BCE não baseou a gravidade das acusações de não conformidade num exame comparativo com a situação de outras instituições de crédito atendendo à sua conformidade com as normas em matéria de LBC/FT deve ser julgado rejeitado pelas mesmas razões que foram acima expostas no n.o 315, bem como pelas razões expostas no contexto da análise do fundamento relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento (v. n.o 353, infra).

319    Em quarto lugar, as recorrentes contestam a análise da necessidade da medida de revogação da autorização. Por um lado, é contestada a interpretação que o BCE fez do critério da necessidade.

320    A este respeito, é verdade que, por força da jurisprudência acima referida no n.o 307, quando existe uma escolha entre várias medidas adequadas, há que recorrer à que seja menos restritiva. Porém, para que se possa considerar que as medidas alternativas são adequadas, devem ser igualmente eficazes (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de dezembro de 2010, Comissão/França, C‑89/09, EU:C:2010:772, n.o 80, e de 6 de setembro de 2017, Eslováquia e Hungria/Conselho, C‑643/15 e C‑647/15, EU:C:2017:631, n.o 236).

321    Ora, como o BCE só tomou em consideração as medidas alternativas suscetíveis de serem tão eficazes como a medida de revogação da autorização, há que considerar, contrariamente ao que as recorrentes sustentam, que interpretou corretamente o critério da necessidade.

322    Por outro lado, as recorrentes contestam a análise das diferentes medidas alternativas à revogação da autorização e alegam que o BCE não tomou em consideração outras medidas alternativas menos intrusivas, como a imposição de medidas concretas para questões específicas dentro de prazos bem definidos ou sanções ou coimas ou ainda medidas contra os administradores da instituição de crédito ou a nomeação de uma pessoa competente para enquadrar os esforços da segunda recorrente para dar cumprimento às exigências regulamentares desrespeitadas.

323    No que se refere, em primeiro lugar, à imposição de medidas concretas dentro de prazos estritos, este argumento coincide, no essencial, com o que é relativo à imposição de uma segunda recomendação, que será a seguir analisado nos n.os 331 a 333. No que se refere, em segundo lugar, às sanções ou às coimas, importa observar, à semelhança do BCE, que as sanções pecuniárias administrativas não fazem parte das medidas prudenciais que o BCE podia ter analisado como alternativas à revogação da autorização. No que se refere, em terceiro lugar, às outras medidas sugeridas pelas recorrentes, designadamente em relação aos administradores da instituição de crédito, importa referir que estas medidas apresentavam os mesmos inconvenientes que outras medidas afastadas pelo BCE, ou seja, não permitiam alcançar o objetivo do restabelecimento da confiança nos mercados financeiros estónio e europeu no mais curto prazo possível, dada a longa duração das infrações anteriormente cometidas, conforme foi referido no ponto 3.3.2, alínea b), da Decisão de 17 de julho de 2018.

324    A este propósito, há que tomar em conta a gravidade, o caráter estrutural e irremediável e a persistência das infrações durante um longo período, bem como a perda de confiança na capacidade e na vontade efetiva da segunda recorrente de corrigir as alegadas falhas, conforme se revelam através da inércia desta última relativamente à conformidade das exigências regulamentares e da prática de outras infrações após as diferentes intervenções da FSA entre 2015 e 2018. O comportamento da referida recorrente também foi tomado em consideração quando da apreciação da razoabilidade de cada uma das medidas alternativas para fazer cessar as infrações cometidas. A inobservância de uma recomendação da FSA, a não alteração da estratégia comercial, não obstante as diferentes alterações do conselho de administração, a influência (ainda que indireta) exercida pelos acionistas maioritários com assento no Conselho de Supervisão desta recorrente, que não é suscetível de cessar, nem sequer em caso de suspensão ou de cessação dos seus direitos de voto, a concentração principal e persistente das atividades da mesma recorrente numa clientela não residente e que apresenta um nível de risco elevado, associada à inexistência de sistemas de governação e de regras procedimentais de gestão dos riscos adequadas a esse modelo de empresa são, todos eles, elementos suscetíveis de pôr em causa a eficácia das medidas alternativas analisadas. Foi nomeadamente o que aconteceu, pelo menos, com todas as medidas que não eram suscetíveis de produzir a cessação total das atividades da recorrente em questão (ou seja, a destituição do conselho de administração, a suspensão ou a cessação dos direitos de voto de determinados acionistas e a emissão de uma nova recomendação pela FSA).

325    Nessas circunstâncias, a medida de revogação da autorização não excedeu o que era adequado e necessário para atingir os objetivos que visavam pôr termo às violações cometidas pela segunda recorrente.

326    É certo que a liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente ou a sua cessão a outro investidor eram medidas que também podiam garantir semelhante efeito. Estas opções, que não eram proibidas, podiam de resto ter sido postas em prática pelas recorrentes antes da adoção da Decisão de 26 de março de 2018.

327    Todavia, há que constatar, em primeiro lugar, que o fator «tempo» foi tido em conta, no âmbito da avaliação da proporcionalidade e da capacidade destas medidas para pôr termo às infrações verificadas, pelo BCE, que de forma muito clara considerou que estas propostas das recorrentes eram tardias, formuladas apenas no âmbito dos seus comentários sobre o projeto de decisão de revogação da autorização da FSA, que lhes foi comunicado pelo BCE, e cuja concretização não era iminente. Além disso, a realidade destas infrações não foi posta em causa nos diversos fundamentos apresentados ao Tribunal Geral pelas recorrentes.

328    Em segundo lugar, a adoção pelo BCE da medida de revogação da autorização também prosseguia, no presente caso, um objetivo de dissuasão, de «prevenção geral» da repetição de comportamentos como as infrações à legislação em matéria de LBC/FT no mercado dos serviços financeiros. Com efeito, resulta do ponto 3.3.2, alínea b), i), sob a epígrafe «selfliquidation» (liquidação por iniciativa própria), da Decisão de 17 de julho de 2018, no qual o BCE considerou que a liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente obscureceria as razões substantivas pelas quais a sua autorização seria revogada e que essa liquidação por iniciativa própria se devia basear no artigo 16.o, n.o 3, da Lei estónia Relativa às Instituições de Crédito, e não no seu artigo 17.o, que ocultaria o facto de a referida recorrente ter cometido infrações graves, que justificavam que a cessação das suas atividades fosse coerciva e não voluntária. Segundo o BCE, o facto de a base jurídica da sua ação ser também comunicada constituía um objetivo legítimo da aplicação da lei, conforme previsto no artigo 20.o, n.o 5, da Diretiva 2013/36.

329    Por conseguinte, no presente caso, as opções da liquidação por iniciativa própria e da venda a outro investidor não constituíam medidas alternativas à revogação da autorização para alcançar os objetivos legalmente prosseguidos pelo BCE, na aceção da jurisprudência evocada no n.o 320, supra.

330    Quanto aos fundamentos 7 e 13, há que examiná‑los em conjunto, na medida em que estão estreitamente relacionados entre si. Com efeito, por meio do fundamento 7, as recorrentes acusam o BCE de não ter tomou em consideração que a segunda recorrente também exercia atividades que não eram de risco. Consideram que o BCE podia assim ter adotado a medida menos intrusiva da cessação da única parte das suas atividades de risco. Embora esteja formulado no sentido de que visa a não tomada em consideração de um elemento pertinente do processo, o referido fundamento visa na verdade pôr em causa a proporcionalidade da revogação da autorização, dada a existência de outras medidas menos intrusivas, como a cessação da única parte das suas atividades ilegais. No contexto do fundamento 13, as recorrentes contestam que o BCE tenha afastado semelhante opção, ou seja, a adoção de uma segunda recomendação pela FSA que obrigaria à cessação apenas das suas atividades que tinham por destinatários uma clientela não residente que apresentava um nível de risco elevado.

331    Como o BCE observa corretamente, resulta do ponto 3.2.2, alínea b) iv), da Decisão de 17 de julho de 2018 que o BCE tomou em consideração a possibilidade de a FSA adotar outra recomendação (que é uma medida administrativa vinculativa) que proibiria a segunda recorrente de prestar serviços financeiros ou que limitaria essa proibição à prestação de serviços aos clientes não residentes de elevado risco, o que corresponderia à cessação das atividades ilegais.

332    Com efeito, o BCE excluiu semelhante medida por não ser adequada, pois, por um lado, a segunda recorrente já tinha sido destinatária de uma recomendação em causa e nunca a tinha cumprido, deixando pairar dúvidas sobre a sua capacidade ou sobre a vontade real de o respeitar, e, por outro, as atividades de elevado risco correspondiam à parte mais importante das receitas desta recorrente e, por conseguinte, da sua cessação teriam ocasionado perdas operacionais mensais, das quais resultaria um risco para a sua viabilidade e assim para os seus depositantes.

333    Por conseguinte, em primeiro lugar, as recorrentes não podem acusar validamente o BCE de não ter tido suficientemente em consideração a circunstância de a segunda recorrente ter atividades que não eram de risco e sustentar que o BCE podia assim ter adotado a medida menos intrusiva da cessação relativamente a uma única parte das suas atividades, uma vez que esta medida não foi considerada eficaz a montante. Em segundo lugar, há que constatar que as recorrentes, através da sua afirmação de caráter geral de modo nenhum fundamentada, por meio da qual pretenderam negar o risco relativo à viabilidade colocado por essa opção e invocado pelo BCE, não logram pôr em causa essa apreciação, que é absolutamente razoável.

334    Além disso, no que respeita aos argumentos das recorrentes destinados a pôr em causa a falta de vontade da segunda recorrente em respeitar a recomendação em questão que se traduzem na simples alegação de que a referida recomendação era vaga e não fora possível cumpri‑la, devem ser rejeitados pelas mesmas razões já acima expostas nos n.os 276 a 288. Cabe também observar que as recorrentes não contestam a realidade da não observância desta recomendação, conforme foi constatada na Decisão de 17 de julho de 2018, nem aduzem argumentos passíveis de demonstrar de que modo poderia a referida recorrente cumprir concretamente uma segunda recomendação da FSA, que lhe proibia exercer as atividades de risco elevado.

335    Por conseguinte, os fundamentos 7 e 13 devem ser rejeitados.

336    No âmbito do fundamento 8, as recorrentes criticam o BCE, no essencial, por não ter atribuído importância suficiente à redução significativa de clientes da segunda recorrente nas categorias de risco elevado.

337    No presente caso, basta constatar que, no ponto 3.3.1, alínea b), i), da Decisão de 17 de julho de 2018, o BCE tomou efetivamente em consideração a redução de clientes da segunda recorrente nas categorias de risco elevado e o encerramento das respetivas contas bancárias, designadamente a respeito das contas de pessoas conhecidas e dos acionistas da referida recorrente, conjuntamente com outras medidas adotadas efetivamente por esta recorrente com o objetivo de respeitar as exigências regulamentares incumpridas. Contudo, há que constatar que o BCE, com base nas conclusões da FSA, chamou a atenção para o facto de que o problema não estava circunscrito a este grupo de clientes, revestindo antes caráter estrutural. Além disso, continuou a verificar‑se a violação de diversas exigências de natureza regulamentar no que respeita à falta de sistemas de governação suficientes e adaptados ao modelo de empresa, que era o seu e que permanecia substancialmente inalterado, mesmo em presença de uma redução dos clientes de elevado risco ou da alteração do conselho de administração, o que as recorrentes não contestam.

338    Com efeito, as recorrentes limitam‑se a contestar que o BCE devia exigir a conformidade integral, considerando que este se devia ter contentado com uma conformidade parcial e com os esforços feitos pela segunda recorrente, e isso mesmo após as advertências que a FSA já tinha endereçado à referida recorrente e as ocasiões que esta última teve para com elas se conformar, antes da adoção do projeto de decisão de revogação da autorização. Ademais, há que constatar que as recorrentes não põem em causa a conclusão do BCE segundo a qual continuavam a verificar‑se outras infrações. Além disso, a tese segundo a qual a conformidade absoluta com as exigências regulamentares não era possível contraria a acusação segundo a qual o BCE não concedeu à segunda recorrente tempo suficiente para alcançar essa conformidade total.

339    Nestas circunstâncias, o fundamento 8 deve também ser rejeitado.

340    Relativamente ao fundamento 9, há que constatar que este está enunciado de forma genérica e não foi exposto de forma suficientemente clara e precisa, pelo que não cumpre os requisitos de forma mínimos, impostos pelo artigo 76.o do Regulamento de Processo. Seja como, admitindo que este fundamento fosse admissível, caso se trate da não tomada em consideração de qualquer outra medida, sem verdadeira identificação, basta recordar, à semelhança do BCE, que este não é obrigado a analisar todas as medidas teoricamente possíveis, mas apenas aquelas que são relevantes e têm uma perspetiva razoável de alcançar os mesmos objetivos. Ora, resulta do n.o 311, supra, [bem como do ponto 3.3.2, alínea b), da Decisão de 17 de julho de 2018] que o BCE procedeu, circunstanciadamente, a esse exame. Caso a segunda recorrente pretenda, pelo contrário, criticar as conclusões do BCE por meio das quais recusa as outras medidas alternativas tidas em conta e analisadas, há que remeter para as considerações apresentadas no contexto da análise dos outros fundamentos, através dos quais a segunda recorrente formula críticas mais concretas em relação à apreciação de cada uma dessas outras medidas alternativas.

341    Por conseguinte, o fundamento 9 deve ser julgado inadmissível ou, seja como for, improcedente.

342    Através dos fundamentos 10 e 11, as recorrentes contestam a tomada em consideração pelo BCE das medidas alternativas à revogação da autorização relativas à destituição do conselho de administração da segunda recorrente e à cessação dos direitos de voto de determinados acionistas seus.

343    A este respeito, basta constatar que as medidas alternativas em causa foram tomadas em consideração para em seguida serem excluídas pelo BCE. Por conseguinte, não prejudicam a segunda recorrente. Daqui decorre que os fundamentos 10 e 11 são inoperantes.

344    No que se refere, finalmente, aos fundamentos 14 e 15, na medida em que visam, mais do que um problema de incompetência do BCE (v. n.o 203, supra), pôr em causa a avaliação que este fez da proporcionalidade efetuada pelo BCE no que respeita às medidas alternativas à medida de revogação da autorização relativas à liquidação por iniciativa própria da segunda recorrente e à venda desta ultima a outro investidor, há que julgá‑los improcedentes pelas mesmas razões que foram acima expostas nos n.os 326 a 329.

345    Atendendo a tudo o que precede, há que concluir que a análise da proporcionalidade da medida de revogação da autorização não está inquinada por um erro de apreciação.

346    Por conseguinte, há que rejeitar o presente grupo de fundamentos.

6.      Quanto aos fundamentos 16 e 18, relativos à violação dos princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação, da proteção da confiança legitima e da segurança jurídica

347    No âmbito do fundamento 16, as recorrentes consideram que a Decisão de 17 de julho de 2018 viola o princípio da igualdade de tratamento e da não discriminação na medida em que não inclui nenhuma análise comparativa da situação da segunda recorrente e a de outros bancos comparáveis, na Estónia ou noutro lugar, no âmbito da LBC/FT. Afirmam que a referida decisão não inclui nenhuma informação pertinente a este respeito proveniente da FSA e que esta escolheu a referida recorrente para exemplo, não devido à gravidade das suas falhas, mas antes devido à sua pequena dimensão, à sua solidez financeira que facilitava a liquidação, bem como ao facto de ser detida por estrangeiros, a quem seria mais difícil opor‑se a essa decisão.

348    O BCE contesta os argumentos das recorrentes.

349    Resulta de jurisprudência constante que o princípio da igualdade de tratamento constitui um princípio geral de direito da União, atualmente consagrado nos artigos 20.o e 21.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que exige que situações comparáveis não sejam tratadas de modo diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de modo igual, exceto se esse tratamento for objetivamente justificado [v. Acórdão de 9 de março de 2017, Milkova, C‑406/15, EU:C:2017:198, n.o 55 e jurisprudência referida, e Parecer 1/17 (Acordo ECG UE‑Canadá), de 30 de abril de 2019, EU:C:2019:341, n.o 176 e jurisprudência referida].

350    Além disso, o respeito pelo princípio da igualdade de tratamento deve ser conjugado com o do princípio da legalidade, o que implica que ninguém pode invocar em seu proveito uma ilegalidade cometida em favor de outrem (v. Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, EU:T:2017:337, n.o 84 e jurisprudência referida).

351    Por outro lado, já foi declarado, designadamente em matéria de sanções pelas infrações no domínio da concorrência, que a prática decisória anterior de uma instituição não serve de enquadramento jurídico às coimas em matéria de concorrência e que as decisões relativas a outros processos têm caráter meramente indicativo no que diz respeito à existência de discriminações (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 134 e jurisprudência referida).

352    No presente caso, há que sublinhar que para invocar uma violação do princípio da igualdade de tratamento as recorrentes limitam‑se a invocar a inexistência de uma análise comparativa entre as infrações imputadas à segunda recorrente e as que foram cometidas por outras instituições de crédito.

353    Ora, em primeiro lugar, há que constatar que não é necessário realizar uma análise comparativa entre o responsável por uma ilegalidade e outras pessoas que cometeram ilegalidades semelhantes para imputar uma ilegalidade a uma pessoa singular ou coletiva. A única análise que é necessário efetuar é a que diz respeito à apreciação da realidade dos factos constituem infrações de disposições legais que impõem um determinado comportamento. A gravidade de um comportamento não deve ser apreciada por referência à gravidade do comportamento de outras pessoas, mas unicamente por referência aos padrões legais impostos pelas disposições legais aplicáveis, sendo que essa gravidade só é pertinente para determinar a medida adequada da sanção. Além disso, resulta da jurisprudência acima evocada no n.o 351 que, ainda que tivesse havido outras decisões de revogação da autorização de outras instituições de crédito por motivo de violação das exigências regulamentares em matéria de LBC/FT, o BCE não estava vinculado por essas decisões.

354    Em segundo lugar, na medida em que as recorrentes reiteram que o BCE não podia utilizar as normas em matéria de LBC/FT para fins prudenciais, porque não tinha competência nesta matéria, há que rejeitar esse argumento pelos motivos acima expostos nos n.o 185 a 190, bem como recordar que a violação das normas em matéria de LBC/FT constitui fundamento para a revogação da autorização previsto no artigo 18.o, alínea f), da Diretiva 2013/36, lido em conjugação com o artigo 67.o, n.o 1, da referida diretiva.

355    Por último, há que também rejeitar as simples alegações que não foram de modo nenhum fundamentadas das recorrentes relativas às pretensas razões pelas quais o BCE escolheu a segunda recorrente como primeira instituição de crédito a punir na Estónia por violação de normas em matéria de LBC/FT.

356    Daqui decorre que o presente fundamento também não pode prosperar.

357    No contexto do fundamento 18, as recorrentes alegam que a Decisão de 17 de julho de 2018 também viola os princípios da confiança legítima e da segurança jurídica, na medida em que a FSA evitou efetuar um exame concreto das preocupações invocadas e induziu em erro a nova equipa dirigente da segunda recorrente por não lhe ter transmitido as pretensas avaliações que visavam determinar se a instituição de crédito se encontrava em situação de insolvência real ou previsível. Ademais, a referida recorrente não contava com uma revogação da autorização após a recomendação da FSA.

358    O BCE, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos das recorrentes.

359    Segundo jurisprudência constante, o direito de invocar o princípio da proteção da confiança legítima é extensivo a qualquer particular em relação ao qual uma instituição da União tenha criado expectativas fundadas. O direito de invocar este princípio pressupõe, porém, a reunião de três requisitos cumulativos. Em primeiro lugar, garantias precisas, incondicionais e concordantes, emanadas de fontes autorizadas e fiáveis, devem ter sido fornecidas ao interessado pela Administração da União. Em segundo lugar, essas garantias devem ser suscetíveis de criar uma expectativa legítima no espírito daquele a quem se dirigem. Em terceiro lugar, as garantias devem ser conformes com as normas aplicáveis (v. Acórdão de 7 de outubro de 2015, Accorinti e o./BCE, T‑79/13, EU:T:2015:756, n.o 75 e jurisprudência referida).

360    Além disso, há que recordar que, embora a possibilidade de invocar a proteção da confiança legítima, como princípio fundamental do direito da União, esteja aberta a qualquer operador económico em quem uma instituição tenha criado expectativas fundadas, não é menos verdade que, quando um operador económico prudente e avisado tenha a possibilidade de prever a adoção de uma medida da União suscetível de afetar os seus interesses, não pode invocar esse princípio em seu benefício quando essa medida é adotada. Além disso, os operadores económicos não podem depositar a sua confiança legítima na manutenção de uma situação existente que pode ser alterada no âmbito do poder de apreciação das instituições da União, em especial num domínio como o da política monetária, cujo objetivo implica uma constante adaptação em função das variações da situação económica (v. Acórdão de 7 de outubro de 2015, Accorinti e o./BCE, T‑79/13, EU:T:2015:756, n.o 76 e jurisprudência referida).

361    Por último, o princípio da proteção da confiança legitima não pode ser invocado por uma pessoa que tenha violado o direito em vigor (v. Acórdão de 23 de janeiro de 2019, Fallimento Traghetti del Mediterraneo, C‑387/17, EU:C:2019:51, n.o 68 e jurisprudência referida).

362    No presente caso, a título preliminar, há que constatar que as recorrentes alegam uma violação do princípio da proteção da confiança legitima baseando‑se apenas nos mesmos fundamentos já aduzidos para sustentar a alegação de violação do princípio da segurança jurídica, sem invocar quaisquer garantias precisas e incondicionais que a segunda recorrente pudesse ter recebido da FSA ou do BCE no que respeita à manutenção da sua autorização. Por outro lado, o comportamento imputado é um comportamento da ANC e não do BCE.

363    Além disso, em primeiro lugar, há que constatar que não só a segunda recorrente não recebeu nenhuma garantia precisa, na aceção da jurisprudência acima mencionada no n.o 359, de que não haveria revogação da sua autorização, como também foi suficientemente advertida do contrário pela FSA.

364    Com efeito, resulta do ponto 3.2, alínea d), da Decisão de 17 de julho de 2018 que, em primeiro lugar, a FSA teve duas reuniões com o Conselho de Supervisão e o conselho de administração da segunda recorrente, em 2 de setembro e 30 de outubro de 2015, e uma reunião com o proprietário e com o conselho de administração, em 30 de novembro de 2015, durante as quais a FSA advertiu a referida recorrente de que devia alterar os seus sistemas de governo e os seus procedimentos de monitorização da clientela e que caso as violações em matéria de LBC/FT prosseguissem, seria possível adotar qualquer uma das medidas prudenciais. Em segundo lugar, após a adoção da recomendação, em 9 de agosto de 2016, a FSA teve outra reunião com um membro do Conselho de Supervisão desta recorrente durante a qual discutiu o estabelecimento ilegal de uma sucursal na Letónia e esclareceu que considerava que as violações ocorridas eram graves e que estava a ponderar revogar a autorização da mesma recorrente caso esta não resolvesse os problemas em causa. Em terceiro lugar, teve ainda mais duas reuniões em novembro de 2016 e uma em janeiro de 2017 com o conselho de administração da recorrente em questão durante as quais sublinhou a necessidade de alterar os seus sistemas de governação e indicou novamente que caso as infrações não cessassem, seria possível adotar qualquer uma das medidas prudenciais. Em quarto lugar, em 28 de fevereiro de 2017, comunicou à recorrente em causa que considerava que a referida recomendação tinha sido parcialmente violada e, em 5 de abril de 2017, enviou‑lhe um pedido de esclarecimento sobre o seu eventual envolvimento num plano de branqueamento de capitais, denominado pelos meios de comunicação «Russian Laundromat» (lavandaria russa). Em quinto lugar, apresentou, em 10 de abril de 2017, uma declaração segundo a qual a recorrente se encontrava numa situação de insolvência real ou previsível. Em 7 de fevereiro de 2018, adotou a decisão FOLFT segundo a qual não era do interesse público adotar medidas de resolução. Em sexto lugar, em 7 de agosto de 2017, recusou comunicar a 23 países a intenção da recorrente em causa de continuar a prestar serviços financeiros transfronteiriços. Em sétimo lugar, no âmbito de uma última inspeção in situ realizada entre 4 e 22 de setembro de 2017, detetou novas infrações em matéria de LBC/FT. Por último, só em 8 de fevereiro de 2018 é que a FSA propôs ao BCE a revogação da autorização da recorrente em causa.

365    Em segundo lugar, ainda que se admita que a segunda recorrente tenha recebido essas garantias, não as podia invocar, dado que, por um lado, nas circunstâncias acima descritas no n.o 362, podia prever a adoção de uma medida da União suscetível de afetar os seus interesses, na aceção da jurisprudência acima evocada no n.o 360, e, por outro, se encontrava numa situação de ilegalidade, na aceção da jurisprudência acima evocada no n.o 361.

366    Decorre do que precede que o presente grupo de fundamentos deve ser rejeitado.

7.      Quanto aos fundamentos 20 a 22, relativos à violação de formalidades essenciais

367    Através dos fundamentos 20 e 21, relativos à violação dos direitos de defesa e do direito de audiência, as recorrentes consideram, em primeiro lugar, que o prazo de cinco dias que foi concedido à segunda recorrente para apresentar os seus comentários sobre o projeto de revogação da autorização era insuficiente, em segundo lugar, que as declarações de insolvência real ou previsível não lhe tinham sido comunicadas durante o processo embora fossem pertinentes, contrariamente ao que o BCE afirma. Em terceiro lugar, alegam que o BCE não explicou em que consistia a urgência. Por último, afirmam que as disposições do Regulamento‑Quadro do MUS que previam um prazo de três dias para a apresentação dos comentários sobre o projeto de revogação da autorização representam uma limitação desproporcionada e arbitrária do direito das instituições de crédito a um recurso efetivo e são, por conseguinte, ilegais.

368    No âmbito do fundamento 22, as recorrentes alegam a violação do dever de fundamentação, porquanto o raciocínio que esteve na base da Decisão de 17 de julho de 2018 é superficial e vago e não revela claramente quais as deficiências particularmente graves que justificavam a revogação da autorização da segunda recorrente, por referência às normas de conformidade à escala da indústria bancária.

369    O BCE, apoiado pela Comissão, refuta os argumentos das recorrentes.

a)      Quanto à violação do direito de audiência

370    A título preliminar, importa recordar que, nos termos do artigo 31.o, do Regulamento‑Quadro do MUS, sob a epígrafe «Direito de audiência»:

«1.      Antes de adotar uma decisão de supervisão do BCE dirigida a uma parte, suscetível de afetar adversamente os direitos dessa parte, o BCE concederá à referida parte a oportunidade de apresentar por escrito ao BCE comentários sobre os factos, objeções e fundamentos jurídicos relevantes para a decisão de supervisão do BCE […]

[…]

3.      Deve ser dada às partes, em princípio, a oportunidade de apresentarem comentários por escrito no prazo de duas semanas a contar da receção de um documento expondo os factos, objeções e fundamentos jurídicos nos quais o BCE tenciona basear a sua decisão de supervisão.

A pedido das partes, o BCE pode alargar o prazo conforme entenda adequado.

Em circunstâncias especiais, o BCE pode reduzir o prazo para três dias úteis. O prazo será também reduzido para três dias úteis nas situações previstas pelos artigos 14.o e 15.o do Regulamento do MUS [de base].

4.      Não obstante o disposto no n.o 3, e com subordinação ao disposto no n.o 5, o BCE pode adotar uma decisão de supervisão do BCE dirigida a uma parte suscetível de afetar negativamente os direitos dessa parte sem lhe conceder a oportunidade de comentar os factos, objeções e fundamentos jurídicos relevantes para a decisão de supervisão do BCE, antes da sua adoção, se uma decisão urgente se afigurar necessária a fim de evitar danos graves ao sistema financeiro.

5.      Se for adotada nos termos do n.o 4 uma decisão de supervisão do BCE urgente, será concedida às partes, sem demora injustificada após a sua adoção, a oportunidade de comentarem por escrito os factos, objeções e fundamentos jurídicos relevantes para a decisão de supervisão do BCE. A parte deve, em princípio, ter a oportunidade de apresentar os seus comentários por escrito no prazo de duas semanas a contar da receção da decisão de supervisão do BCE. A pedido das partes, o BCE pode alargar o prazo, o qual todavia não poderá exceder seis meses. O BCE deve analisar a decisão de supervisão do BCE à luz dos comentários das partes, podendo confirmá‑la, revogá‑la e alterá‑la, ou revogá‑la e substituí‑la por uma nova decisão de supervisão do BCE.

[…]»

371    Segundo jurisprudência constante faz parte integrante do respeito pelos direitos de defesa o direito de ser ouvido, que garante que qualquer pessoa tenha a possibilidade de dar a conhecer o seu ponto de vista, de maneira útil e efetiva, no decurso do procedimento administrativo, antes da adoção de qualquer decisão suscetível de afetar desfavoravelmente os seus interesses. Nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça, a regra segundo a qual deve ser dada ao destinatário de uma decisão lesiva dos seus interesses a possibilidade de apresentar as suas observações antes de a mesma ser tomada destina‑se a permitir que a autoridade competente tenha utilmente em conta todos os elementos pertinentes (v. Acórdão de 16 de outubro de 2019, Glencore Agriculture Hungary, C‑189/18, EU:C:2019:861, n.o 41 e jurisprudência referida).

372    No presente caso, resulta do ponto 3.1, alínea a), da Decisão de 17 de julho de 2018 que tendo esta sido adotada ao abrigo do artigo 14.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base, o prazo para apresentar as suas observações era de três dias e que o BCE decidiu exercer o seu poder discricionário para dilatar este prazo para cinco dias úteis.

373    Ora, em primeiro lugar, importa sublinhar que o BCE aplicou corretamente as disposições pertinentes do Regulamento‑Quadro do MUS relativas ao direito de audiência das instituições de crédito destinatárias da decisão do BCE, ou seja, o artigo 31.o, n.o 3, do referido Regulamento‑Quadro.

374    Em segundo lugar, importa reconhecer, à semelhança do BCE, que o legislador da União procedeu a uma avaliação da razoabilidade do prazo previsto nestas disposições através da ponderação dos interesses em conflito, por um lado, os interesses privados das instituições de crédito em disporem de um período de tempo que fosse o mais comprido possível para apresentar as respetivas observações e, por outro, o interesse público em que o restabelecimento da legalidade ocorresse o mais rapidamente possível. As recorrentes não podem assim pôr em causa a razoabilidade dos prazos definidos no Regulamento‑Quadro do MUS, salvo se suscitarem uma exceção de ilegalidade formal em relação às disposições em causa.

375    Na medida em que as recorrentes suscitam uma exceção de ilegalidade em relação a disposições do Regulamento‑Quadro do MUS, no que respeita à desproporcionalidade do prazo previsto para apresentar comentários sobre um projeto de revogação da autorização, há que julgar esta última inadmissível por ter sido apresentada fora de prazo. Com efeito, as recorrentes só a invocaram na réplica. Ora, resulta da jurisprudência que o âmbito do litígio é determinado pela petição inicial e que uma exceção de ilegalidade é inadmissível na fase da réplica. Além disso, a exceção de ilegalidade não se baseia, no presente caso, em nenhum elemento de direito ou de facto que se tenha revelado durante o processo na aceção do artigo 84.o, n.o 2, do Regulamento de Processo (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 27 de setembro de 2005, Common Market Fertilizers/Comissão, T‑134/03 e T‑135/03, EU:T:2005:339, n.o 51 e jurisprudência referida).

376    Em terceiro lugar, a alegação das recorrentes relativa à falta de urgência é inoperante, porque o BCE não aplicou ao presente caso as disposições do Regulamento‑Quadro do MUS que se lhe aplicam, ou seja, o artigo 31.o, n.os 4 e 5, do referido Regulamento‑Quadro. Na verdade, o BCE aplicou corretamente o artigo 31.o, n.o 3, terceiro parágrafo, deste Regulamento‑Quadro, visto que adotou a sua decisão ao abrigo do artigo 14.o do Regulamento MUS de base, uma situação na qual o prazo concedido às partes para serem ouvidas passa a ser de três dias úteis.

b)      Quanto à violação dos direitos de defesa

377    Relativamente à violação dos direitos de defesa, as recorrentes acrescentam apenas que as declarações de insolvência real ou previsível não lhes foram comunicadas.

378    A este respeito, basta recordar que, conforme resulta das considerações acima expostas nos n.os 147 a 152, as declarações de insolvência real ou previsível são apenas atos preparatórios não obrigatórios que antecedem eventuais programas de resolução, cuja adoção não implica necessariamente a adoção de tal programa ao abrigo do Regulamento MUR e que não existe equivalência funcional entre uma avaliação da insolvência real ou previsível e uma revogação da autorização, ainda que os factos subjacentes aos dois atos se possam sobrepor, pois as condições da revogação da autorização são manifestamente diferentes das considerações que subjazem à avaliação da insolvência real ou previsível.

379    Assim, no presente caso, como o BCE corretamente refere, as declarações de insolvência real ou previsível basearam‑se em razões diferentes daquelas que estiveram na base da decisão de revogação da autorização. Em contrapartida, na medida em que se sobrepunham, estes fundamentos foram reproduzidos no projeto de decisão de revogação da autorização da FSA, a única pertinente no presente caso, sobre o qual a segunda recorrente teve a oportunidade de se manifestar. Por conseguinte, a acusação relativa à não transmissão das referidas declarações pode ser rejeitada por ser inoperante.

380    Além disso, as recorrentes não podem acusar a FSA de não ter dialogado com a direção e com os acionistas da entidade supervisionada para alcançar uma conformidade total. Com efeito, resulta do acima exposto nos n.os 23, 39 e 278, supra, que a segunda recorrente foi incontestavelmente advertida por diversas vezes e teve várias oportunidades para dialogar com a FSA e que esta colaborou de forma suficiente para explicar ao longo do procedimento por que é que as deficiências observadas ainda subsistiam.

c)      Quanto à violação do dever de fundamentação

381    Importa recordar, a título preliminar, que, nos termos do artigo 22.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento MUS de base, as decisões do BCE devem ser fundamentadas.

382    De acordo com o disposto no artigo 33.o, n.os 1 e 2, do Regulamento‑Quadro do MUS, a decisão de supervisão do BCE será acompanhada de uma indicação dos fundamentos da decisão. A fundamentação conterá os factos materiais e as razões jurídicas nos quais o BCE baseou a sua decisão de supervisão.

383    O artigo 39.o, n.o 1, do Regulamento‑Quadro do MUS precisa que «[u]ma entidade supervisionada deve ser considerada entidade supervisionada significativa se o BCE assim o determinar numa decisão do BCE tendo por destinatária a entidade supervisionada em causa […], que explique as razões subjacentes à referida decisão».

384    Importa salientar que as disposições acima mencionadas nos n.os 381 a 383 se limitam a recordar, no corpo do Regulamento MUS de base e do Regulamento‑Quadro do MUS, o dever de fundamentação a que as instituições e órgãos da União estão obrigados ao abrigo do artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE (Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, EU:T:2017:337, n.o 121).

385    O dever de fundamentação previsto no artigo 296.o TFUE constitui uma formalidade essencial que deve ser distinguida da questão da procedência da fundamentação, a qual faz parte da legalidade material do ato controvertido (v. Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, EU:T:2017:337, n.o 122 e jurisprudência referida).

386    Nesta perspetiva, por um lado, a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do ato, de modo a permitir aos interessados conhecerem as justificações da medida adotada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização. Em particular, no que respeita à fundamentação das decisões individuais, o dever de fundamentar essas decisões tem, assim, por finalidade, além de permitir uma fiscalização jurisdicional, fornecer ao interessado indicações suficientes para saber se a decisão enferma eventualmente de um vício que permita contestar a sua validade (v. Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, EU:T:2017:337, n.o 123 e jurisprudência referida).

387    Por outro lado, a exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato em causa, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas direta e individualmente interessadas no mesmo podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada tendo em conta não só o seu teor mas também o seu contexto e o conjunto das regras jurídicas que regulam a matéria em causa (v. Acórdão de 16 de maio de 2017, Landeskreditbank Baden‑Württemberg/BCE, T‑122/15, EU:T:2017:337, n.o 124 e jurisprudência referida).

388    No presente caso, basta constatar que a Decisão de 17 de julho de 2018 está estruturada de forma muito clara (uma parte processual, uma parte em que se evocam os factos que estão na origem do processo, uma parte em que se encontram resumidas as deficiências apuradas baseada no projeto de decisão da FSA de revogação da autorização e uma parte em que se analisa a proporcionalidade da medida de revogação da autorização baseada na análise própria do BCE) e expõe de forma exaustiva os elementos de facto e de direito em que as partes se basearam. Além disso, há que sublinhar que a referida decisão se inscreve num contexto de diálogo plurianual entre a segunda recorrente e a FSA, conforme foi acima descrito no n.o 364, que permite concluir que a segunda recorrente conhecia indubitavelmente o contexto factual e processual a que essa decisão se referia, na aceção da jurisprudência acima evocada no n.o 387. Por outro lado, há que referir que a fundamentação desta decisão permitiu à segunda recorrente compreender as razões que levaram à sua adoção e formular as suas objeções e ao juiz da União exercer a sua fiscalização, em conformidade com a jurisprudência acima referida no n.o 386.

389    Decorre de tudo o que precede que o presente grupo de fundamentos deve ser rejeitado.

8.      Quanto aos fundamentos 23 e 24, relativos, nomeadamente, à violação do direito de acesso ao processo da segunda recorrente e dos direitos dos acionistas no âmbito do processo de revisão

390    No âmbito do fundamento 23, as recorrentes alegam uma violação do direito de acesso ao processo da segunda recorrente. Segundo afirmam, o BCE recusou ilicitamente o acesso solicitado antes da apresentação do pedido de revisão, quando os documentos solicitados pela primeira recorrente lhe eram necessários para preparar o referido pedido, tendo‑lhe, em vez disso, facultado esse acesso depois de a CRNA ter declarado a admissibilidade do pedido de revisão, embora com isso o acesso tenha sido reduzido a nada, pois só lhe forneceu 23 documentos dos 230 que figuravam no processo, por considerar que todos os outros eram confidenciais.

391    No fundamento 24, as recorrentes alegam diversas violações dos direitos da primeira recorrente no âmbito do processo de revisão que viciaram a legalidade da Decisão de 17 de julho de 2018, a ponto de justificar a sua anulação.

392    Em primeiro lugar, o BCE cometeu um erro na Decisão de 26 de março de 2018, na medida em que esta continha a informação incorreta de que só a instituição de crédito podia ter apresentado um pedido de revisão, embora a decisão da CRNA também considerasse o acionista elegível para apresentar tal pedido. Além disso, não comunicou essa decisão à primeira recorrente, embora esta tivesse o direito de solicitar a sua revisão.

393    Em segundo lugar, as recorrentes acusam o BCE de não ter autorizado a primeira recorrente a consultar o processo antes da audiência no CRNA, impedindo‑a assim de formular e fundamentar devidamente o seu pedido de revisão com base em pretensos motivos de confidencialidade.

394    Em terceiro lugar, o direito de audiência da primeira recorrente foi restringido visto que lhe foi concedido um prazo excessivamente curto para apresentar observações adicionais depois de ter tido acesso ao processo.

395    Em quarto lugar, as recorrentes alegam que o BCE não permitiu que a CRNA tivesse acesso à versão integral da Decisão de 26 de março de 2018, que só foi apresentada pela primeira recorrente numa versão expurgada que encontrou na página Internet da FSA. A possibilidade de obter uma revisão imparcial e objetiva foi ulteriormente prejudicada pela limitação do exame da CRNA apenas aos fundamentos jurídicos e acusações apresentadas no pedido de revisão, limitação essa prevista no artigo 10.o, n.o 2, da Decisão 2014/360, que não encontra fundamento no artigo 24.o do Regulamento MUS de base.

396    Em quinto lugar, as recorrentes acusam o BCE de não ter associado ao processo de revisão os representantes da segunda recorrente, nem na pessoa dos administradores judiciais nem dos antigos diretores, o que é manifestamente contrário aos princípios de um processo equitativo e viola o direito de ser ouvido da referida recorrente, que é objeto desta última decisão.

397    Em sexto lugar, as recorrentes alegam uma insuficiência de fundamentação da Decisão de 17 de julho de 2018, por os fundamentos do indeferimento do pedido de revisão nela não figuram. A possibilidade de também se tomar em consideração a fundamentação do parecer desta comissão não pode compensar a falta de fundamentação da referida decisão, pois a exigência definida no artigo 24.o, n.o 9, do Regulamento MUS de base não pode ser cumprida através de uma fundamentação per relationem.

398    O BCE, apoiado pela Comissão, refuta os argumentos das recorrentes.

399    A título preliminar, importa recordar que, nos termos do artigo 22.o, n.o 2, do Regulamento MUS de base, do artigo 32.o do Regulamento‑Quadro do MUS e do artigo 20.o da Decisão 2014/360, os direitos de defesa das pessoas em causa são plenamente respeitados durante o processo. Têm o direito de consultar o processo em poder do BCE, sob reserva do interesse legítimo de outras pessoas na proteção dos seus segredos comerciais. O direito de consultar o processo não abrange as informações confidenciais.

400    Além disso, nos termos do artigo 24.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base, qualquer pessoa singular ou coletiva pode apresentar um pedido de revisão de uma decisão do BCE de que seja destinatária ou que lhe diga direta e individualmente respeito.

401    No presente caso, há que constatar, em primeiro lugar, que a segunda recorrente não apresentou um pedido de revisão ao abrigo do artigo 24.o do Regulamento MUS de base, embora tivesse direito de o fazer. Em segundo lugar, relativamente ao primeiro pedido de acesso formulado pela primeira recorrente, esta apresentou um pedido de acesso em 15 de abril de 2018, depois de findo o procedimento de supervisão inicial que deu lugar à Decisão de 26 de março de 2018.

402    A Decisão de 26 de março de 2018 não tinha por destinatário a primeira recorrente e, nos termos da jurisprudência do Tribunal de Justiça, não se podia considerar que a decisão lhe dissesse direta e individualmente respeito (v., neste sentido, Acórdão de 5 de novembro de 2019, BCE e o./Trasta Komercbanka e o., C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P, EU:C:2019:923, n.os 108 a 114 e 119).

403    Nestas circunstâncias, o BCE não cometeu nenhum erro ao não permitir que a primeira recorrente tivesse acesso ao processo, visto que não era parte interessada, na aceção do artigo 22.o, n.o 2, do Regulamento MUS de base e dos artigos 26.o e 32.o do Regulamento‑Quadro do MUS, no momento da apresentação do seu primeiro pedido.

404    No que respeita ao segundo pedido de acesso, apresentado em 26 de abril de 2018 juntamente com o pedido de revisão da Decisão de 26 de março de 2018, bem como às outras acusações relativas à tramitação do processo, há que sublinhar que a CRNA julgou ser admissível o pedido de revisão da primeira recorrente ao abrigo do artigo 24.o, n.o 5, do Regulamento MUS de base. Considerou‑se, com base no Despacho de 12 de setembro de 2017, Fursin e o./BCE (T‑247/16, não publicado, EU:T:2017:623), que os requisitos de admissibilidade definidos nesta disposição, coincidentes com os previstos no artigo 263.o TFUE para os recursos judiciais, estavam preenchidos pela referida recorrente. Por conseguinte, a CRNA também aceitou o pedido de consulta do processo dessa recorrente, enquanto requerente da revisão, ao abrigo do artigo 20.o da Decisão 2014/360.

405    Todavia, a este respeito, cabe observar que a primeira recorrente não teria podido apresentar um pedido de revisão caso não existisse o Despacho de 12 de setembro de 2017, Fursin e o./BCE (T‑247/16, não publicado, EU:T:2017:623), e que este foi anulado pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 5 de novembro de 2019, BCE e o./Trasta Komercbanka e o. (C‑663/17 P, C‑665/17 P e C‑669/17 P, EU:C:2019:923). Por conseguinte, na verdade, a referida recorrente beneficiou de possibilidades, como o processo de revisão, que é um instrumento adicional em relação ao recurso judicial, e de um acesso ao processo de que não deveria ter beneficiado.

406    Nestas circunstâncias especiais e insuscetíveis de se voltarem a reproduzir, porque o Despacho de 12 de setembro de 2017, Fursin e o./BCE (T‑247/16, não publicado, EU:T:2017:623), em que a CRNA se baseou, foi anulado pelo Tribunal de Justiça, e dada a falta de legitimidade da primeira recorrente para interpor o presente recurso, na medida em que tem por objeto o pedido de anulação da Decisão de 17 de julho de 2018, conforme resulta do acima exposto no n.o 100, bem como da falta de legitimidade da segunda recorrente para as invocar, pois não foi parte no processo de revisão, ao optar por não apresentar o pedido, embora tivesse direito de o fazer, há que julgar inadmissíveis os fundamentos baseados na violação dos direitos de defesa no âmbito do processo de revisão.

407    Seja como for, admitindo que estes fundamentos fossem julgados admissíveis, não poderiam conduzir à anulação da Decisão de 17 de julho de 2018, dado que, não se verificando essas eventuais irregularidades processuais, a decisão podia não ter conduzido a um resultado diferente (v., neste sentido, Acórdão de 14 de fevereiro de 1990, França/Comissão, C‑301/87, EU:C:1990:67, n.o 31), o que é confirmado pela análise acima exposta nos n.os 105 a 389.

9.      Quanto ao fundamento 25, invocado em apoio do pedido de anulação da decisão sobre as despesas, baseado na ilegalidade da Decisão de 17 de julho de 2018

408    O fundamento 25, apresentado em apoio do pedido de anulação da decisão sobre as despesas, é relativo à ilegalidade da Decisão de 17 de julho de 2018.

409    O BCE, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos das recorrentes.

410    No presente caso, nenhum dos fundamentos apresentados no processo T‑584/18 permite concluir pela ilegalidade da Decisão de 17 de julho de 2018.

411    Por conseguinte, o presente fundamento deve ser rejeitado.

10.    Quanto ao pedido de diligências de instrução

412    As recorrentes solicitam ao Tribunal Geral, reiteradamente nos seus articulados, que proceda a diversas diligências de instrução: em primeiro lugar, ordenar ao BCE e à FSA que apresentem documentos, entre os quais as decisões FOLTF; em segundo lugar, ordenar a apresentação dos atos que demonstram que o BCE tomou uma decisão em matéria de liquidação por iniciativa própria e o testemunho dos funcionários do BCE em causa; em terceiro lugar, ordenar ao BCE e à República da Estónia que divulguem as conclusões relativas à infração à legislação em matéria de LBC/FT e o testemunho do presidente da FSA e dos funcionários do BCE em causa e, em quarto lugar, ordenar ao BCE que indique em concreto as declarações enganadoras das recorrentes e divulgue os documentos que demonstram que o BCE e a FSA debateram o problema da sucursal na Letónia, que continuava a ser um problema não resolvido pelo acordo administrativo a que se chegou na Letónia, bem como notificar o presidente da FSA e os funcionários do BCE para testemunhar.

413    O BCE opõe‑se ao pedido de diligências de instrução apresentado pelas recorrentes, pois as diligências requeridas não preenchem os requisitos impostos pela jurisprudência e pelo artigo 88.o do Regulamento de Processo, relativos, nomeadamente, à pertinência e necessidade das informações solicitadas para apurar certos factos e decidir o litígio.

414    A título preliminar, importa sublinhar que o pedido das recorrentes constitui um pedido de diligências de instrução, na aceção do artigo 91.o, alínea b) a d), do Regulamento de Processo, apresentado ao abrigo do artigo 88.o, n.o 1, do referido regulamento.

415    Resulta do n.o 2 do artigo 88.o deste Regulamento de Processo que o pedido referido no n.o 1 deste mesmo artigo deve indicar com precisão o objeto das medidas ou das diligências solicitadas e as razões que as justificam. Além disso, a referida disposição também refere que, quando este pedido é formulado depois da primeira troca de articulados, a parte que apresenta o pedido deve expor as razões pelas quais não pôde apresentá‑lo anteriormente.

416    No presente caso, em primeiro lugar, a maior parte dos pedidos de diligências de instrução, com exceção do relativo à apresentação das «decisões FOLTF», foi apresentado pela primeira vez na fase da réplica. As recorrentes não explicam de modo nenhum, no seu pedido, as razões que justificam este atraso. Por conseguinte, devem ser julgados inadmissíveis.

417    Seja como for, há que constatar que os pedidos de diligências de instrução não são suficientemente precisos quanto ao seu objeto e à pertinência dos testemunhos e documentos a apresentar.

418    Com efeito, cabe sublinhar, à semelhança do BCE e da Comissão, por um lado, que os pontos sobre os quais as recorrentes pretendem ouvir os testemunhos não se destinam a proceder a uma determinação de factos, mas a confirmar uma série de simples alegações não fundamentadas das recorrentes. Ora, essas alegações, admitindo que seriam confirmadas, não são pertinentes para a resolução do litígio. Além disso, há que constatar que o pedido de audição das testemunhas também é parcialmente impreciso em relação à identificação das pessoas a ouvir.

419    Por outro lado, no que respeita ao pedido de apresentação de documentos, em primeiro lugar, no que respeita às «decisões FOLTF» (único pedido de diligências de instrução apresentado na fase da petição inicial e, portanto, não intempestivo), deve ser rejeitado ao abrigo das considerações acima expostas no n.o 181. Em segundo lugar, conforme foi acima declarado no n.o 279, a Decisão de 17 de julho de 2018 é suficientemente clara no que respeita às constatações de violação da legislação em matéria de LBC/FT. Em terceiro lugar, resulta do acima indicado no n.o 267 que determinar se a questão relativa à questão da sucursal na Letónia ainda estava ou não em aberto para a FSA e o BCE não é um elemento necessário para a resolução do litígio.

420    Decorre do que precede que os pedidos de diligências de instrução devem ser rejeitados por serem intempestivos e parcialmente improcedentes ou, a título subsidiário, integralmente improcedentes.

421    Atendendo a tudo o que precede, há que negar provimento ao recurso no processo T‑584/18 na integralidade.

 Quanto às despesas

422    Nos termos do artigo 137.o do Regulamento de Processo, se não houver lugar a decisão de mérito, o Tribunal decide livremente sobre as despesas.

423    Atendendo às considerações que levaram o Tribunal a declarar que já não havia que conhecer do mérito no processo T‑351/18, será feita uma justa apreciação das circunstâncias do caso decidindo que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

424    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. No presente caso, tendo as recorrentes sido vencidas no processo T‑584/18, há que condená‑las a suportar as suas próprias despesas, bem como as que foram efetuadas pelo BCE, nos termos do pedido deste.

425    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. A Comissão suportará assim as suas próprias despesas no processo T‑584/18.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção alargada)

decide:

1)      Os processos T351/18 e T584/18 são apensos para efeitos do acórdão.

2)      Não há que conhecer do mérito no processo T351/18.

3)      É negado provimento ao recurso no processo T584/18.

4)      No processo T351/18, a Ukrselhosprom PCF LLC, a Versobank AS, o Banco Central Europeu (BCE) e a Comissão Europeia suportarão, cada um, as suas próprias despesas.

5)      No processo T584/18, a Ukrselhosprom PCF e a Versobank são condenadas a suportar, além das suas próprias despesas, as que foram suportadas pelo BCE.

6)      No processo T584/18, a Comissão suportará as suas próprias despesas.

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 6 de outubro de 2021.

Assinaturas


Índice




*      Língua do processo: inglês.