Language of document : ECLI:EU:C:2014:2260

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 8 de outubro de 2014 (1)

Processo C‑523/13

Walter Larcher

contra

Deutsche Rentenversicherung Bayern Süd

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundessozialgericht (Alemanha)]

«Reenvio prejudicial — Segurança social dos trabalhadores migrantes — Artigo 45.° TFUE — Artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento (CEE) n.° 1408/71 — Prestação de velhice — Princípio da não discriminação — Trabalhador colocado, num Estado‑Membro, em regime de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho antes da passagem à reforma — Tomada em consideração para efeitos da aquisição do direito às prestações noutro Estado‑Membro»





I –    Introdução

1.        Com o presente reenvio prejudicial, o Bundessozialgericht (Tribunal Federal de Contencioso Social, Alemanha) pretende saber, em primeiro lugar, se o princípio da igualdade de tratamento se opõe a uma disposição nacional que prevê que uma pensão de velhice após um período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho só pode ser concedida se essa pré‑reforma tiver fundamento nas disposições nacionais do Estado‑Membro que concede a pensão, e não nas do Estado‑Membro em cujo território o período de pré‑reforma foi cumprido. Em segundo lugar e no caso de resposta afirmativa à primeira questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o princípio da igualdade de tratamento impõe a realização de uma análise comparativa dos requisitos exigidos pelas disposições dos dois Estados‑Membros em causa e, nesse caso, que grau de semelhança ou de identidade deve haver entre os referidos requisitos ou, mais genericamente, entre os regimes de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho desses dois Estados.

2.        Estas questões inscrevem‑se no quadro de um processo que opõe W. Larcher e o Deutsche Rentenversicherung Bayern Süd. W. Larcher, cidadão austríaco, trabalhou durante um período de mais de 29 anos na Alemanha, depois voltou a trabalhar na Áustria, onde decidiu, depois de ter trabalhado a tempo inteiro, beneficiar de uma pré‑reforma progressiva com redução do seu tempo de trabalho normal em 60%, em conformidade com o direito austríaco (2).

3.        Pelos diversos períodos trabalhados ao longo da sua carreira profissional, W. Larcher recebe, desde 2006, uma pensão de reforma austríaca, denominada «pensão antecipada de reforma por velhice para beneficiários com longa carreira contributiva» e, desde 2009, uma pensão de reforma alemã, denominada «pensão de reforma por velhice para beneficiários com longa carreira contributiva». Estas duas pensões não são objeto do litígio no processo principal.

4.        Em contrapartida, o litígio no processo principal tem por objeto a pensão de velhice concedida após um período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, pedida por W. Larcher em 2006 às autoridades alemãs em questão.

5.        Este pedido foi indeferido pelo Deutsche Rentenversicherung Bayern Süd, pelo facto de o período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, que decorreu entre 1 de março de 2004 e 30 de setembro de 2006, na Áustria, não ter sido cumprido com fundamento nas disposições alemãs. Tendo a sua reclamação administrativa sido indeferida, W. Larcher recorreu para os órgãos jurisdicionais alemães. No entanto, o pedido que deduziu foi julgado improcedente quer em primeira, quer em segunda instância. Para negar provimento ao recurso o Bayrisches Landessozialgericht (Tribunal Superior de Contencioso Social da Baviera, Alemanha) apoiou‑se no facto de o recorrente no processo principal não cumprir o requisito relativo à redução do tempo de trabalho, previsto pela lei alemã sobre a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho (Altersteilzeitgesetz) (3), isto é, que o tempo de trabalho seja reduzido a metade do até então cumprido, visto que W. Larcher diminuiu o seu tempo de trabalho em 60%, ou seja, mais que os 50% exigidos pela legislação alemã.

6.        Consequentemente, W. Larcher decidiu interpor recurso de «Revista» no Bundessozialgericht.

7.        Na fundamentação do seu recurso sustenta que o tribunal de recurso violou as disposições do direito alemão relativas à redução do tempo de trabalho, ao interpretá‑las em desconformidade com o direito da União. De acordo com o recorrente no processo principal, a interpretação feita pelo tribunal de recurso é contrária à proibição de discriminação em razão da nacionalidade e ao princípio da livre circulação. Apoiando‑se no acórdão Öztürk (4), W. Larcher considera que, neste caso, há efetivamente uma discriminação indireta injustificada.

8.        Por seu lado, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que as questões suscitadas no âmbito do litígio no processo principal não podem ser tratadas apenas com fundamento na jurisprudência existente. No entanto, constata que quando um trabalhador aceita um emprego noutro Estado‑Membro, é provável que seja penalizado, no momento da sua passagem à reforma, por causa das diferenças existentes entre as legislações que lhe são aplicáveis, em comparação com os reformados que tenham efetuado a totalidade da sua carreira profissional num único Estado‑Membro. O órgão jurisdicional de reenvio considera que os artigos 45.° TFUE a 48.° TFUE, bem como o Regulamento (CEE) n.° 1408/71 do Conselho, de 14 de junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e atualizada pelo Regulamento (CE) n.° 1992/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de dezembro de 2006 (5), deviam impedir os obstáculos à livre circulação de trabalhadores migrantes. Na sua opinião, pode haver um obstáculo dessa natureza no caso em apreço. Por fim, no âmbito da análise da justificação desse obstáculo, o órgão jurisdicional de reenvio, inclinado a proceder a uma comparação dos regimes de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho nos dois Estados‑Membros em causa, questiona‑se sobre os elementos a ter em consideração para esse fim.

9.        Neste contexto, o Bundessozialgericht decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O princípio da igualdade [de tratamento] consagrado no artigo 39.°, n.° 2, CE (atual artigo 45.°, n.° 2, TFUE) e no artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento [n.° 1408/71] é contrário a uma disposição nacional segundo a qual a concessão de uma pensão de reforma por velhice após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho pressupõe que a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho tenha tido lugar nos termos das disposições legais desse Estado‑Membro, mas não das de outro Estado‑Membro?

2)      Em caso de resposta afirmativa, quais as exigências que o princípio da igualdade de tratamento, consagrado no artigo 39.°, n.° 2, CE […] e no artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento […] n.° 1408/71, estabelece para a equivalência da passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho nos termos das disposições legais do outro Estado‑Membro, enquanto pressuposto para a aquisição do direito à pensão de reforma por velhice nacional:

a)      É necessária uma análise comparativa dos pressupostos [da pré‑reforma com redução da prestação de trabalho]?

b)      Na afirmativa, é suficiente que, em ambos os Estados‑Membros, a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho tenha, na sua essência, a mesma configuração, em termos de função e estrutura?

c)      Ou devem os pressupostos para a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho ter uma configuração idêntica em ambos os Estados‑Membros?»

10.      Estas questões foram objeto de observações escritas por parte de W. Larcher, do Governo alemão e da Comissão Europeia.

II – Análise

A –    Quanto aos regimes de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho em geral e quanto à primeira questão prejudicial

11.      Perante a constatação do envelhecimento acelerado da população europeia, a União Europeia e os Estados‑Membros incluíram nos objetivos das diversas estratégias para o emprego lançadas desde o início dos anos 2000 (6), medidas destinadas a encorajar os trabalhadores ditos «mais velhos» a prolongar a sua vida ativa, contribuindo também para tentar assegurar a viabilidade dos sistemas de saúde, de segurança social e dos regimes de reforma (7).

12.      Foi em especial neste contexto que alguns Estados‑Membros da União adotaram regimes de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho (8).

13.      Estes regimes têm como ponto comum permitir a transição gradual da vida ativa para a reforma através de uma redução do tempo de trabalho (9). Assim, trabalhadores que tenham atingido uma determinada idade podem reduzir o seu tempo de trabalho, passando, por exemplo, de um emprego a tempo inteiro para um emprego a tempo parcial durante o período que os separa da sua reforma, sendo a perda de remuneração compensada geralmente por uma pensão ou subsídios concedidos pela sua entidade patronal ou por um fundo para o emprego (10). Alguns desses regimes prosseguem também outros objetivos, como a estabilidade do sistema nacional de segurança social ou, à semelhança dos regimes alemão e austríaco, na origem do litígio do processo principal, a luta contra o desemprego, na medida em que o tempo de trabalho libertado pelo beneficiário da pré‑reforma com redução da prestação de trabalho permite recrutar uma pessoa (jovem) à procura de emprego ou um aprendiz (11).

14.      Na Alemanha, onde W. Larcher solicitou, sem sucesso, o pagamento da pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, essa pensão está sujeita ao preenchimento dos requisitos previstos no § 237.° do Código da Segurança Social, Livro VI (Sozialgesetzbuch Sechstes Buch, a seguir «SGB VI»), entre os quais constam os requisitos de acesso à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, incluindo o relativo à redução em 50% do tempo de trabalho semanal efetuado até à data.

15.      Resulta dos elementos que constam do pedido de decisão prejudicial, por um lado, que W. Larcher preenche todos os requisitos previstos no § 237.° do SGB VI, exceto o da redução do tempo de trabalho em 50% durante o período da pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, na medida em que, como já referido, W. Larcher reduziu o seu tempo de trabalho para 40%, em conformidade com a legislação austríaca, e, por outro, que um período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho efetuado noutro Estado‑Membro não constitui um obstáculo ao pagamento, pela segurança social alemã, da pensão de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, prevista pelo SGB VI, desde que os respetivos requisitos estejam preenchidos.

16.      O objeto da primeira questão prejudicial reside precisamente em saber se, mais que o princípio da igualdade de tratamento, a livre circulação de trabalhadores, conforme prevista pelo artigo 45.° TFUE, se opõe a que um Estado‑Membro exija, para conceder uma pensão de reforma após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, que todos os requisitos que conferem o direito à referida pensão previstos pela sua legislação nacional estejam preenchidos.

17.      W. Larcher e a Comissão propõem que seja dada uma resposta afirmativa a esta questão, pelo facto de esta legislação constituir uma discriminação indireta dos trabalhadores migrantes e, em todo o caso, de os dissuadir de aceitar a sua pré‑reforma com redução da prestação de trabalho noutros Estados‑Membros. No essencial, referindo‑se ao processo que deu origem ao acórdão Öztürk (EU:C:2004:232) e, mais genericamente, à jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à equiparação dos factos, estas partes interessadas consideram que um Estado‑Membro não pode exigir, sem violar o direito à livre circulação, que, para conceder a um trabalhador migrante uma pensão de reforma após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, os requisitos que regem a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho no outro Estado‑Membro sejam concebidos de maneira idêntica aos do Estado‑Membro ao qual a pensão é solicitada.

18.      O Governo alemão recorda, antes de mais, que o trabalhador que usufrui da sua liberdade de circulação, deve ter em conta os inconvenientes da disparidade das legislações de segurança social dos Estados‑Membros. Contudo, considera que, estando em causa o recebimento de uma pensão, um Estado‑Membro não deve, desde logo, excluir que o período de emprego em pré‑reforma com redução da prestação de trabalho possa ser cumprido noutro Estado‑Membro que também tenha um regime de pré‑reforma desse tipo. Nesse caso, o trabalhador deve ter a possibilidade de preencher os requisitos exigidos pelo Estado‑Membro ao qual a pensão é solicitada.

19.      No que me diz respeito, penso que se deve circunscrever a resposta a dar às relações entre o requisito controvertido no processo principal, a saber, a redução do tempo de trabalho em 50%, prevista no § 237.° do SGB VI, e a livre circulação de trabalhadores, sendo que me parece que este requisito deve ser qualificado de obstáculo a esta liberdade e ser considerado desproporcionado em relação aos objetivos prosseguidos pelo legislador alemão.

20.      Antes de mais, contrariamente ao que defendem W. Larcher e a Comissão, a primeira questão prejudicial não pode, na minha opinião, ser resolvida pela aplicação da jurisprudência relativa à equiparação dos factos, em especial pelo acórdão Öztürk (EU:C:2004:232).

21.      O conceito de equiparação dos factos elaborado por esta jurisprudência visa, no essencial, que as situações ocorridas num Estado‑Membro sejam valoradas do mesmo modo por que o seriam se se tivessem verificado no Estado em que devem produzir efeitos (12).

22.      Desenvolvida em grande parte no contexto da interpretação do artigo 45.° TFUE e/ou do Regulamento n.° 1408/71, esta jurisprudência impõe, em princípio, que cada Estado‑Membro que sujeite a concessão de prestações sociais ao cumprimento, exclusivamente no seu território, por um trabalhador, de um período de seguro ou de um dado período de referência, reconheça os períodos equivalentes cumpridos por esse mesmo trabalhador no território de outros Estados‑Membros.

23.      Essa foi a solução especificamente adotada pelo Tribunal de Justiça no referido processo Öztürk. Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou nesse processo que um Estado‑Membro, no caso concreto a República da Áustria, não podia fazer depender a aquisição do direito a uma pensão antecipada de velhice por motivo de desemprego do preenchimento do requisito de o interessado (no caso concreto, um trabalhador de nacionalidade turca que tinha trabalhado parcialmente na Áustria e na Alemanha, antes de se encontrar numa situação de desemprego neste último Estado‑Membro) ter beneficiado, durante um determinado período anterior ao pedido de pensão, de prestações de seguro de desemprego unicamente do primeiro Estado‑Membro (13).

24.      Do mesmo modo, anteriormente, o Tribunal de Justiça declarou que a livre circulação de trabalhadores se opunha a que uma legislação de um Estado‑Membro que permite, em determinadas condições, a prorrogação do período de referência para a aquisição de um direito de pensão de invalidez, não preveja uma possibilidade de prorrogação, quando os factos ou circunstâncias correspondentes aos que permitem a prorrogação ocorram noutro Estado‑Membro (14), ou quando um Estado‑Membro recuse tomar em consideração, para a aquisição do direito à pensão, períodos de trabalho que uma pessoa sujeita a um regime especial de funcionários ou de pessoal equiparado (no caso, um médico do setor público grego, sujeito a um regime especial na aceção do Regulamento n.° 1408/71) cumpriu em estabelecimentos hospitalares públicos de outro Estado‑Membro, quando a legislação nacional autoriza que esses períodos sejam tidos em conta se tiverem sido cumpridos no território nacional em estabelecimentos análogos (15).

25.      O Tribunal de Justiça também considerou, em diversos casos, que é contrário aos Tratados o facto de um Estado‑Membro não tomar em consideração, para efeitos da concessão de uma pensão de velhice, os períodos consagrados à educação de um filho, cumpridos noutro Estado‑Membro, como se esses períodos tivessem sido cumpridos no território do primeiro Estado‑Membro (16).

26.      Esta linha de jurisprudência poderia ser transposta para o processo principal se este, por exemplo, dissesse respeito à hipótese de ser recusada a W. Larcher, apesar de satisfazer todos os requisitos impostos pela legislação alemã, incluindo o da redução do tempo de trabalho em 50%, a concessão da pensão de reforma após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, pelo facto de esse período de pré‑reforma não ter sido cumprido em território alemão.

27.      Todavia, como já sublinhei, pelo menos formalmente, por um lado, a legislação alemã não exige, para efeitos de concessão da pensão, que a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho tenha sido cumprida na Alemanha e, por outro, W. Larcher não preencheu o requisito, previsto pela legislação alemã, de reduzir o seu tempo de trabalho em 50%, durante a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho cumprida na Áustria.

28.      Por conseguinte, a questão essencial levantada pelo presente processo não respeita à equiparação de situações ou de circunstâncias que tenham decorrido num Estado‑Membro, como se essas situações e circunstâncias tivessem ocorrido no território do Estado‑Membro ao qual uma prestação social é solicitada, para efeitos do preenchimento dos requisitos previstos pela legislação do referido Estado‑Membro.

29.      Respeita, sobretudo, à eventual obrigação de um Estado‑Membro, para efeitos de concessão de uma pensão de reforma após um período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, reconhecer como equiparáveis aos seus próprios requisitos, os requisitos jurídicos previstos por outro Estado‑Membro que permitem completar um mesmo período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho.

30.      Por outras palavras, o órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se, não sobre a equiparação de situações factuais, mas sobre a comparação de requisitos jurídicos.

31.      Feito este esclarecimento, é facto assente, neste processo, que a pensão de velhice após a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho constitui uma prestação de velhice na aceção do artigo 4.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71 e que, como admitiu o Tribunal de Justiça, na falta de harmonização ao nível da União, compete à legislação de cada Estado‑Membro determinar os requisitos que dão direito a prestações em matéria de segurança social (17).

32.      Todavia, essa competência deve ser exercida no respeito do direito da União, em especial das disposições relativas à livre circulação dos trabalhadores (18).

33.      Importa, portanto, verificar se o requisito exigido pela legislação alemã, de que um trabalhador tenha reduzido o seu tempo de trabalho em 50% durante o período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, cumprido num Estado‑Membro diferente da República Federal da Alemanha, para obter posteriormente uma pensão de velhice após a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho neste último Estado‑Membro, é incompatível com o artigo 45.° TFUE, dado que é facto assente que esse requisito se aplica independentemente da nacionalidade do trabalhador em causa.

34.      De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, disposições que impedem ou dissuadem um cidadão de um Estado‑Membro de sair do seu Estado de origem e, assim, exercer o seu direito de livre circulação, constituem obstáculos a essa liberdade, mesmo que se apliquem independentemente da nacionalidade dos trabalhadores em causa (19).

35.      É verdade que, como defendeu o Governo alemão fazendo referência ao referido acórdão von Chamier‑Glisczinski, no estado atual de evolução do direito da União, a livre circulação de trabalhadores não abrange as simples disparidades das legislações nacionais de segurança social, cujos inconvenientes devem ser suportados pelas pessoas que decidiram usufruir da sua liberdade de circulação (20).

36.      Todavia, o presente processo é diferente daquele que deu origem ao acórdão von Chamier‑Glisczinski.

37.      Com efeito, naquele acórdão, o Tribunal de Justiça constatou, por um lado, que a situação em que P. von Chamier‑Glisczinski se encontrava, resultava da aplicação conjugada de duas legislações de segurança social, no sentido de que esta cidadã alemã residia na Áustria e pedia uma prestação de dependência em espécie às autoridades alemãs uma vez que não havia essa prestação na Áustria e, por outro, que essa situação teria sido diferente se a legislação austríaca tivesse possibilitado a concessão dessa prestação em espécie, de forma a que a mesma fosse paga à interessada pelas autoridades austríacas (21).

38.      Em contrapartida, no presente processo, não só não há nenhum elemento nos autos que permita deduzir que W. Larcher pediu às autoridades alemãs o pagamento da pensão de reforma após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho pelo facto de não haver essa pensão na Áustria, mas, além disso, nenhum elemento sugere que a situação de W. Larcher teria sido diferente se a legislação austríaca tivesse sido alterada.

39.      Na realidade, o requisito controvertido, a saber, a redução do tempo de trabalho em 50% durante o período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, refere‑se menos a um problema de coordenação ou de disparidade das legislações de segurança social relativas às prestações de velhice, que ao exercício da atividade profissional transitória antes do início da reforma.

40.      Ora, a propósito dos requisitos relativos ao exercício da atividade profissional, o Tribunal de Justiça já declarou que constituem obstáculos à livre circulação de trabalhadores, e não simples inconvenientes, as disposições nacionais que «condicionem o acesso dos trabalhadores ao mercado de trabalho» (22), incluindo os que digam respeito às modalidades de exercício dessa atividade (23).

41.      No caso dos autos, não há dúvida que uma medida nacional que impõe a um trabalhador reduzir a sua atividade profissional para metade do seu tempo de trabalho anterior, a fim de poder beneficiar, em seguida, de uma pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, constitui tanto uma modalidade de exercício dessa atividade, como, tratando‑se muito em especial de trabalhadores idosos, um requisito para aceder e permanecer no mercado de trabalho.

42.      Consequentemente, parece‑me que esta medida pode enquadrar‑se no conceito de obstáculo, na aceção do artigo 45.° TFUE, conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça.

43.      Parece‑me também suscetível de constituir um obstáculo à livre circulação dos trabalhadores.

44.      Com efeito, uma pessoa que, à semelhança de W. Larcher, fez o essencial da sua carreira profissional na Alemanha e que queira beneficiar de uma pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, é dissuadida de deixar esse Estado‑Membro se só puder cumprir o período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho diminuindo o seu tempo de trabalho em 50%, sem poder, consequentemente, responder a ofertas de emprego, mesmo melhor remuneradas, noutros Estados‑Membros com um regime similar, mas nos quais, como na Áustria, a redução do tempo de trabalho em pré‑reforma com redução da prestação de trabalho pode variar, legalmente, entre 40% e 60% do tempo de trabalho normal.

45.      Da mesma forma, o requisito controvertido pode dissuadir um empregador estabelecido num Estado‑Membro diferente da República Federal da Alemanha, dotado de um regime de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, de empregar um cidadão deste último Estado‑Membro segundo modalidades de redução do tempo de trabalho diferentes das exigidas na Alemanha.

46.      Por conseguinte, nesta fase, trata‑se de verificar se, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, este obstáculo pode, no entanto, ser justificado pela prossecução de um objetivo de interesse geral, considerando‑se que deve ser adequado para garantir a realização do objetivo em causa e não ultrapassar o necessário para atingir esse objetivo (24).

47.      Como já realcei no n.° 13 destas conclusões e como sublinhou o Governo alemão nas suas observações escritas, a redução do tempo de trabalho em 50% durante o período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, visa, por um lado, permitir uma transição do trabalhador para a reforma e, por outro, prosseguir um objetivo de promoção da contratação de desempregados ou de aprendizes durante o tempo de trabalho deixado disponível pela pessoa que beneficia do regime de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho.

48.      Por si só, a prossecução destes dois objetivos não é criticável. No que respeita, em especial, à promoção da contratação, o Tribunal de Justiça já admitiu que a mesma constitui um objetivo legítimo de política social (25).

49.      Em contrapartida, sem que seja necessário apreciar a aptidão do requisito controvertido para alcançar os objetivos prosseguidos, não se pode deixar de constatar que este requisito é desproporcionado, como aliás admitiu o Governo alemão nas suas observações escritas.

50.      Com efeito, numa situação como a do processo principal, a aplicação rígida do requisito de redução do tempo de trabalho em 50% equivale a proibir um trabalhador em pré‑reforma com redução da prestação de trabalho noutro Estado‑Membro, que tenha libertado mais de 50% do seu anterior tempo de trabalho para permitir a contratação de um jovem desempregado ou de um aprendiz e que preencha, além disso, todos os outros requisitos impostos pela legislação alemã, de beneficiar do pagamento da «pensão de reforma após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho».

51.      Como referem o órgão jurisdicional de reenvio e o Governo alemão nas suas observações escritas, neste caso, o objetivo do legislador alemão também é, por conseguinte, alcançável com uma redução do tempo de trabalho de 60%, uma vez que esta liberta uma parte ainda maior do posto de trabalho (26).

52.      O requisito de redução do tempo de trabalho em 50% imposto pela legislação alemã e aplicado de maneira rígida no processo principal, quer pela administração alemã quer pelos tribunais de primeira instância e de recurso, parece‑me, por conseguinte, exceder o necessário para alcançar o objetivo de política social que constitui a promoção da contratação de jovens desempregados ou de aprendizes durante o tempo libertado pela pessoa que beneficia do regime de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho.

53.      Por outro lado, o facto de um Estado‑Membro que prossiga um tal objetivo de política social dever, por força do direito da União, admitir uma redução do tempo de trabalho superior a 50% durante um período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho cumprido num outro Estado‑Membro, não acarreta consequências orçamentais graves (27).

54.      É verdade que, nos Estados‑Membros que introduziram um regime de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, a perda de salário da pessoa que beneficia desse regime e que reduziu o seu tempo de trabalho é compensada, quer diretamente pelos poderes públicos quer, de uma maneira ou doutra, pela entidade patronal, a qual, regra geral, beneficia, por sua vez, da assunção pelo Estado, sob diversas formas, do encargo dos custos suplementares (28).

55.      Todavia, a compensação salarial oferecida a W. Larcher durante o período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho cumprido na Áustria, incluindo, evidentemente, a redução suplementar do tempo de trabalho em 10% face à exigida pela legislação alemã, foi inteiramente suportada, não pela República Federal da Alemanha, mas pela República da Áustria. Acresce que essa redução suplementar do tempo de trabalho em 10% não afeta de maneira significativa o valor da pensão de reforma após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho paga pelas autoridades alemãs, relativamente ao montante que seria pago a um trabalhador que tivesse diminuído o seu tempo de trabalho em 50% durante um período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho cumprido em território alemão ou no território de outro Estado‑Membro, como a República da Áustria.

56.      Atendendo a todas estas considerações, sugiro que se responda à primeira questão no sentido de que o artigo 45.° TFUE se opõe a que um Estado‑Membro faça depender o pagamento de uma pensão de reforma após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho do requisito de que, durante o período dessa pré‑reforma, o trabalhador tenha reduzido o seu tempo de trabalho em 50%, na medida em que, à luz do objetivo de promover a contratação de jovens desempregados ou de aprendizes prosseguido pelo referido Estado‑Membro, uma redução superior do tempo de trabalho, cumprida legalmente no âmbito de uma pré‑reforma com redução da prestação de trabalho no território de outro Estado‑Membro, acarrete automaticamente a recusa do direito de obter o pagamento da referida pensão.

B –    Quanto à segunda questão prejudicial

57.      Com a sua segunda questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se, para garantir o respeito do princípio da igualdade de tratamento, é necessário fazer uma análise comparada dos requisitos previstos pelas legislações nacionais dos dois Estados‑Membros em causa, relativos à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho. Em caso de resposta afirmativa, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre o grau de semelhança ou de identidade que deve haver entre os referidos requisitos ou, mais genericamente, entre os regimes de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho desses Estados‑Membros.

58.      A resposta a esta questão não me parece estritamente necessária, tendo em conta a resposta que proponho dar à primeira questão prejudicial, a qual permite ao órgão jurisdicional de reenvio resolver definitivamente o litígio do processo principal.

59.      Assim sendo, e a título subsidiário, a resposta à primeira questão já fornece diversos elementos que também permitem dar uma resposta, pelo menos parcial, à segunda.

60.      Efetivamente, como transparece dos desenvolvimentos precedentes, parece‑me que se impõe uma análise comparativa dos requisitos essenciais previstos pelas legislações dos dois Estados‑Membros em causa, à luz do ou dos objetivos prosseguidos pelo Estado‑Membro no qual foi requerida a pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho.

61.      Não pode ser acolhida a tese defendida por W. Larcher perante o órgão jurisdicional de reenvio, e que este acertadamente julgou improcedente, segundo a qual, no essencial, o Estado‑Membro no qual é requerida a pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, devia reconhecer, de forma automática, as condições em que essa pré‑reforma foi cumprida num outro Estado‑Membro.

62.      Com efeito, essa proposta, além de negligenciar o facto de que os Estados‑Membros continuam a ser competentes para estabelecer os requisitos de pagamento das prestações sociais, comporta riscos elevados de «forum shopping», ao permitir aos cidadãos da União cumprir num Estado‑Membro à sua escolha um período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, sem que o Estado‑Membro sobre o qual impende o encargo de conceder a pensão subsequente a esse período tenha a possibilidade de se opor ao seu pagamento.

63.      Pode ainda deduzir‑se da resposta dada à primeira questão, e como acertadamente sustenta o órgão jurisdicional de reenvio, que, deve também ser rejeitada a argumentação da parte recorrida no processo principal, concretamente, o Deutsche Rentenversicherung Bayern Süd ˗ argumentação, aliás, igualmente defendida pelo Governo alemão nas suas observações escritas apresentadas no Tribunal de Justiça ˗ nos termos da qual a pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho paga na Alemanha devia depender da circunstância de os requisitos dos sistemas de pré‑reforma desses Estados‑Membros serem idênticos.

64.      Como já salientei, esta tese pode prejudicar a livre circulação de trabalhadores, porquanto exigir que, para efeitos da concessão de uma pensão, os requisitos para beneficiar de uma pré‑reforma com redução da prestação de trabalho sejam análogos em todos os aspetos aos que regem a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho alemã, pode ser desproporcionado face aos objetivos prosseguidos pelo referido sistema de pré‑reforma na Alemanha.

65.      Como sugere o próprio órgão jurisdicional de reenvio, a resposta à segunda questão não se encontra, por conseguinte, nas propostas diametralmente opostas das partes no processo principal. A solução está, antes, numa resposta intermédia. Assim, na minha opinião, importa verificar se os requisitos impostos no Estado‑Membro no qual a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho foi cumprida, permitem alcançar os objetivos prosseguidos pelo Estado‑Membro no qual é pedida a pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho. Efetivamente, esses objetivos podem ser alcançados mesmo nos casos em que os requisitos da pré‑reforma com redução da prestação de trabalho diferem entre o Estado‑Membro onde a pensão é pedida e aquele em que o período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho foi cumprido.

66.      Esta solução preserva o princípio de que os Estados‑Membros são competentes para determinar os requisitos de concessão das prestações sociais, assegurando, ao mesmo tempo, que, no caso de trabalhadores migrantes, a sua livre circulação dentro da União possa ser respeitada.

67.      Na análise dos requisitos que dão acesso à pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, podem ser identificadas três categorias.

68.      Antes de mais, a primeira dessas categorias compreende os requisitos que, na minha opinião, não têm influência na obtenção da pensão e que não deveriam constituir obstáculos ao pagamento dessa pensão a um cidadão de um Estado‑Membro que tenha cumprido a sua pré‑reforma com redução da prestação de trabalho noutro Estado‑Membro. Entre esses requisitos figuram, em meu entender, os relacionados com as modalidades de financiamento do sistema de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho.

69.      Como já indiquei, a perda de salário da pessoa que beneficia de um regime nacional de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho e que reduziu o seu tempo de trabalho é compensada, direta ou indiretamente, pelos poderes públicos.

70.      Apesar da variedade dos sistemas de financiamento dos regimes de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho implementados nos Estados‑Membros e da importância deste requisito do ponto de vista do direito nacional, o mesmo não me parece, de maneira nenhuma, essencial para a análise do direito à obtenção de uma pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho no caso dos trabalhadores migrantes. Com efeito, recusar esta pensão a um trabalhador migrante que cumpriu a sua pré‑reforma com redução da prestação de trabalho num Estado‑Membro que tenha modalidades de financiamento diferentes das do Estado‑Membro no qual a pensão é reclamada, constitui um obstáculo à livre circulação dos trabalhadores que, do meu ponto de vista, não é justificável. Em especial, o Estado‑Membro no qual a pensão é pedida não pode legitimamente invocar razões atinentes ao equilíbrio do seu sistema de segurança social, uma vez que, como já realcei, esse Estado‑Membro não suportará os encargos resultantes do período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho.

71.      Em seguida, surgem os requisitos que menos problemas suscitam, pelo facto de o seu regime ser tomado em consideração no Regulamento n.° 1408/71. Figuram nesta categoria os requisitos relativos aos períodos de contribuições necessários para a obtenção da pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho. Com efeito, o artigo 45.°, n.° 1, daquele regulamento prevê que os períodos de contribuições pagas num Estado‑Membro devem ser tidos em conta no Estado‑Membro que for competente para pagar a pensão «como se se tratasse de períodos cumpridos ao abrigo da legislação que aplica». Aliás, o órgão jurisdicional de reenvio aplicou este artigo no processo principal, uma vez que reconheceu que W. Larcher preenchia os requisitos relacionados com os períodos de seguro obrigatórios (29) impostos pelo direito alemão. Ora, embora o requisito previsto pelo direito alemão, relativo aos períodos de contribuições, esteja efetivamente preenchido no caso vertente, tal deve‑se à contabilização dos períodos de seguro austríacos e não alemães (30).

72.      Por fim, como o presente processo ilustra, os requisitos mais problemáticos são os que dizem especificamente respeito à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, a saber, a idade de entrada na pré‑reforma e a taxa de redução do tempo de trabalho. Com efeito, estes requisitos variam de um Estado‑Membro para outro e os conflitos entre estes últimos não estão diretamente regulamentados num ato de direito derivado da União. Assim, os Estados‑Membros continuam a ser competentes para estabelecer os requisitos de concessão das prestações de segurança social, e podem, consequentemente, criar um conjunto de regras díspares que podem ser prejudiciais ao trabalhador migrante.

73.      Podem ser evocados diversos exemplos hipotéticos, mas suscetíveis de ocorrer no futuro.

74.      Em relação à idade de início da pré‑reforma com redução da prestação de trabalho, pode um Estado‑Membro recusar conceder total ou parcialmente a pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho a um trabalhador que tenha beneficiado num Estado‑Membro de uma pré‑reforma com redução da prestação de trabalho a partir dos 59 anos, enquanto o primeiro Estado‑Membro só autoriza a possibilidade de passar para essa pré‑reforma com redução da prestação de trabalho a partir dos 60 anos?

75.      Do mesmo modo, pode o beneficiário de uma pré‑reforma com redução da prestação de trabalho num Estado‑Membro, que reduziu o seu tempo de trabalho em 35% (e, consequentemente, continua a trabalhar 65% do seu anterior tempo de trabalho), obter o direito ao pagamento de uma pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho num Estado‑Membro no qual a redução do tempo de trabalho deve ser de 50% durante o cumprimento da pré‑reforma com redução da prestação de trabalho?

76.      No essencial, como a Comissão sugeriu nas suas observações escritas, a resolução destas questões parece‑me passar por uma análise concreta da situação específica, em função dos objetivos prosseguidos a nível nacional para respeitar o direito da União e, designadamente, o princípio da proporcionalidade. Por outras palavras, cabe, deste modo, à administração e ao juiz nacional o papel de verificar a importância dos requisitos controvertidos face aos objetivos nacionais prosseguidos.

77.      É no decurso dessa análise que a administração nacional e, se for caso disso, o juiz nacional, deverão analisar a importância ou não da idade ou da redução do tempo de trabalho face aos objetivos visados pelo direito nacional e verificar se a diferença entre o requisito previsto pelo direito nacional e o previsto pelo direito do Estado‑Membro no qual a pré‑reforma com redução da prestação de trabalho foi cumprida, pode ou não afetar a prossecução desses objetivos.

78.      Deste modo, no caso de uma redução do tempo de trabalho sem dimensão suficiente para permitir a contratação de um jovem à procura de emprego ou de um aprendiz, as autoridades nacionais do Estado‑Membro no qual este objetivo é prosseguido poderão recusar, na minha opinião, a concessão da pensão após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho requerida por um trabalhador que tenha cumprido o seu período de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho noutro Estado‑Membro.

79.      Este não é, todavia, o caso de W. Larcher. Com efeito, como pude demonstrar nos desenvolvimentos consagrados à resposta à primeira questão, tendo este reduzido o seu tempo de trabalho na pré‑reforma com redução da prestação de trabalho cumprida na Áustria numa medida que excede a exigência de redução em 50% prescrita pela lei alemã, o tempo de trabalho libertado permitia a contratação de um jovem à procura de emprego ou de um aprendiz, no respeito do objetivo prosseguido pelo legislador alemão, como reconheceu o Governo alemão nas suas observações escritas.

III – Conclusão

80.      Atendendo às considerações que antecedem, proponho ao Tribunal de Justiça que responda do seguinte modo às questões prejudiciais submetidas pelo Bundessozialgericht:

«O artigo 45.° TFUE opõe‑se a que um Estado‑Membro faça depender o pagamento de uma pensão de reforma após a passagem à pré‑reforma com redução da prestação de trabalho do requisito de que, durante o período dessa pré‑reforma, o trabalhador tenha reduzido o seu tempo de trabalho em 50%, na medida em que, à luz do objetivo de promover a contratação de jovens desempregados ou de aprendizes prosseguido pelo referido Estado‑Membro, uma redução superior do tempo de trabalho, cumprida legalmente no âmbito de uma pré‑reforma com redução da prestação de trabalho no território de outro Estado‑Membro, acarrete automaticamente a recusa do direito de obter o pagamento da referida pensão.»


1 —      Língua original: francês.


2 —      § 27, n.° 2, segundo parágrafo, da lei austríaca de 1977 sobre o seguro de desemprego (Arbeitslosenversicherungsgesetz 1977) na sua redação resultante da lei de alteração de 30 de dezembro de 2003, BGBl I, 128/2003, que prevê que a redução do tempo de trabalho em pré‑reforma com redução da prestação de trabalho pode situar‑se entre 40% e 60% do tempo de trabalho normal.


3 —      § 2, n.os 1 e 2, da lei, na sua versão resultante da Lei de 23 de abril de 2004 (BGBl. 2004 I 602).


4 —      C‑373/02, EU:C:2004:232.


5 —      JO L 392, p. 1, a seguir «Regulamento n.º 1480/71».


6 —      V. Estratégia de Lisboa para o crescimento e o emprego, adotada em 2000, a Estratégia Europa 2020, iniciada pela Comissão em 2010, bem como as orientações anuais adotadas pelo Conselho da União Europeia, para as políticas de emprego dos Estados‑Membros [v. Decisão n.° 2010/707/UE do Conselho de 21 de outubro de 2010 (JO L 308, p. 46) e por último, a Decisão n.° 2014/322/UE do Conselho de 6 de maio de 2014 (JO L 165, p. 49)].


7 —      V., no contexto da Estratégia para a Europa 2020, designadamente, décimo primeiro considerando da Decisão n.° 940/2011/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de setembro de 2011, sobre o Ano Europeu do Envelhecimento Ativo e da Solidariedade entre as Gerações (2012) (JO L 246, p. 5), que promove a criação de uma cultura de envelhecimento ativo que contribua «para que as pessoas mais velhas participem mais no mercado de trabalho, se mantenham ativas na sociedade durante mais tempo, melhorem a sua qualidade de vida individual e reduzam a pressão sobre os sistemas de saúde, de ação social e de pensões».


8 —      Presentemente, oito Estados‑Membros (República Federal da Alemanha, República da Áustria, Reino da Dinamarca, República Italiana, Grão‑Ducado do Luxemburgo, Hungria, República Portuguesa e República da Finlândia) têm regimes deste tipo. A República Francesa e o Reino da Suécia também tiveram esses regimes, tendo‑os, no entanto, revogado.


9 —      Na Alemanha, esta característica é recordada no § 1.°, n.° 1 da lei da pré‑reforma com redução da prestação de trabalho.


10 —      De referir que, em relação à República Federal da Alemanha, o complemento de remuneração pago aos trabalhadores que beneficiam do regime de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho esteve na origem do litígio no processo principal que culminou com o acórdão Erny (C‑172/11, EU:C:2012:399).


11 —      Em relação à Alemanha, a prossecução desse objetivo era a questão central dos processos que deram origem aos acórdãos Kutz‑Bauer (C‑187/00, EU:C:2003:168) e Steinicke (C‑77/02, EU:C:2003:458) a propósito do acesso de trabalhadoras ao regime de pré‑reforma com redução da prestação de trabalho.


12 —      V. conclusões do advogado‑geral Ruiz‑Jarabo Colomer no processo Öztürk (C‑373/02, EU:C:2004:95, n.° 53).


13 —      Acórdão Öztürk (EU:C:2004:232, n.° 68 e parte decisória).


14 —      Acórdão Paraschi (C‑349/87, EU:C:1991:372, n.° 27). V. também, acórdão Duchon (C‑290/00, EU:C:2002:234, n.os 39 e 46).


15 —      Acórdão Vougioukas (C‑443/93, EU:C:1995:394, n.° 44).


16 —      V., acórdãos Elsen (C‑135/99, EU:C:2000:647, n.° 36); Kauer (C‑28/00, EU:C:2002:82, n.° 52) e Reichel‑Albert (C‑522/10, EU:C:2012:475, n.° 45).


17 —      V., nomeadamente, acórdãos von Chamier‑Glisczinski (C‑208/07, EU:C:2009:455, n.° 63) e da Silva Martins (C‑388/09, EU:C:2011:439, n.° 71).


18 —      V., nomeadamente, acórdão von Chamier‑Glisczinski (EU:C:2009:455, n.° 63 e jurisprudência referida).


19 —      V., acórdãos Bosman (C‑415/93, EU:C:1995:463, n.° 96); Comissão/Dinamarca (C‑464/02, EU:C:2005:546, n.° 35) e Comissão/Alemanha (C‑269/07, EU:C:2009:527, n.° 107).


20 —      V., neste sentido, designadamente, acórdãos Leyman (C‑3/08, EU:C:2009:595, n.° 45 e jurisprudência referida) e von Chamier‑Glisczinski (EU:C:2009:455, n.° 85).


21 —      Acórdão von Chamier‑Glisczinski (EU:C:2009:455, n.° 86).


22 —      Acórdãos Graf (C‑190/98, EU:C:2000:49, n.° 23) e Comissão/Dinamarca (EU:C:2005:546, n.° 36).


23 —      V. acórdão Comissão/Dinamarca (EU:C:2005:546, n.° 37).


24 —      Ibidem (n.° 53 e jurisprudência referida).


25 —      V. acórdãos ITC (C‑208/05, EU:C:2007:16, n.° 39) e Caves Krier Frères (C‑379/11, EU:C:2012:798, n.° 51). V. também, nomeadamente, em matéria de igualdade de tratamento entre trabalhadores de ambos os sexos, acórdão Kutz‑Bauer (EU:C:2003:168, n.° 56 e jurisprudência referida).


26 —      De notar que a legislação alemã não exige que o jovem trabalhador ou o aprendiz contratado para o tempo de trabalho libertado tenha nacionalidade alemã ou mesmo que esteja empregado em território alemão.


27 —      Aliás, o Governo alemão não deduziu nenhuma objeção no sentido de pôr em causa o equilíbrio orçamental do seu sistema de segurança social.


28 —      A República Federal da Alemanha, a República da Áustria e República Portuguesa fazem incidir o encargo financeiro sobre a entidade patronal, ao passo que o Reino da Dinamarca, a República Italiana e a República da Finlândia financiam as pré‑reformas com redução da prestação de trabalho por um pagamento direto dos organismos públicos. Por último, na Hungria e no Luxemburgo existe um sistema híbrido, uma vez que a entidade patronal paga as remunerações ao beneficiário, das quais é, em seguida, integralmente reembolsada pelos organismos públicos.


29 —      V. n.º 34 do pedido de decisão prejudicial.


30 —      Idem.