Language of document : ECLI:EU:T:2002:44

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

27 de Fevereiro de 2002 (1)

«Marca comunitária - Vocábulo ELLOS - Motivo absoluto de recusa - Carácter descritivo - Artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T-219/00,

Ellos AB, com sede em Borås (Suécia), representada por G. Bergqvist, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por F. López de Rego e J. F. Crespo Carrillo, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objecto um recurso da decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 15 de Junho de 2000 (processo R 385/1999-1), que recusa o registo do vocábulo ELLOS como marca comunitária,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: P. Mengozzi, presidente, V. Tiili e R. M. Moura Ramos, juízes,

secretário: D. Christensen, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 18 de Agosto de 2000,

vista a contestação entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 9 de Novembro de 2000,

após a audiência de 20 de Junho de 2001,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes do litígio

1.
    Em 1 de Abril de 1996, a recorrente apresentou ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (a seguir «Instituto») um pedido de marca comunitária, nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), com as alterações que lhe foram introduzidas.

2.
    A marca cujo registo foi pedido é o vocábulo ELLOS.

3.
    Os produtos e serviços para os quais foi pedido o registo pertencem às classes 24, 25 e 35 do Acordo de Nice, de 15 de Junho de 1957, relativo à classificação internacional de produtos e serviços para o registo de marcas, conforme revisto e alterado e correspondem, relativamente a cada uma das classes, à seguinte descrição:

classe 24:    «Tecidos e produtos têxteis não compreendidos noutras classes; coberturas de cama e de mesa»;

classe 25:    «Vestuário, calçado e chapelaria»;

classe 35:    «Serviços aos clientes para vendas postais».

4.
    Por decisão de 8 de Junho de 1999, o examinador recusou parcialmente o pedido, nos termos do artigo 38.° do Regulamento n.° 40/94, por o vocábulo estar desprovido de carácter distintivo e ser meramente descritivo em relação aos produtos e serviços pertencentes às classes 25 e 35 da classificação de Nice.

5.
    Em 9 de Julho de 1999, a recorrente interpôs recurso da decisão do examinador no Instituto, nos termos do artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94.

6.
    Foi negado provimento ao recurso por decisão de 15 de Junho de 2000 (a seguir «decisão impugnada»), com base no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), e n.° 2 do Regulamento n.° 40/94.

7.
    A Câmara de Recurso considerou essencialmente que o vocábulo ELLOS era meramente descritivo em Espanha, dado que ELLOS é a terceira pessoa do plural do pronome pessoal em espanhol e é frequentemente utilizado como termo colectivo para designar todos os membros do sexo masculino. A Câmara de Recurso concluiu, assim, que o vocábulo ELLOS não podia ser registado como marca para designar o «vestuário, calçado e chapelaria», pertencente à classe 25 da classificação de Nice, pois designa a espécie ou o destino de tais produtos. Por seu turno, os serviços aos clientes para vendas postais, pertencentes à classe 35 da classificação de Nice, podem dizer respeito à venda de vestuário, pelo que o registo da marca solicitado deve igualmente ser recusado, pelas razões invocadas em relação aos produtos pertencentes à classe 25 da classificação de Nice.

Pedidos das partes

8.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão impugnada e ordenar ao Instituto que registe a marca ELLOS para todos os produtos e serviços que figuram no pedido;

-    a título subsidiário, ordenar ao Instituto que registe a marca ELLOS para os produtos e serviços pertencentes às classes 24 e 35 da classificação de Nice;

-    adoptar todas as outras medidas que o Tribunal repute necessárias;

-    condenar o Instituto nas despesas.

9.
    O Instituto conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    negar provimento ao recurso;

-    condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

Quanto aos pedidos de que seja ordenado ao Instituto que registe a marca ELLOS para todos os produtos e serviços que figuram no pedido de marca e, a título subsidiário, para os que pertencem às classes 24 e 35 da classificação de Nice

Argumentos das partes

10.
    A recorrente pede ao Tribunal que ordene ao Instituto que registe a marca ELLOS para todos os produtos e serviços que figuram no pedido de marca e, a título subsidiário, para os que pertencem às classes 24 e 35 da classificação de Nice.

11.
    O Instituto alega que o recurso é inadmissível no que se refere a tais pedidos, na medida em que o Regulamento n.° 40/94 prevê um procedimento para o registo que deve ser respeitado. Com efeito, de acordo com o Instituto, ainda que a decisão impugnada viesse a ser anulada pelo Tribunal, a marca só poderia ser registada depois de concluídos os procedimentos previstos nos artigos 40.°, 41.° e 42.° do Regulamento n.° 40/94.

12.
    Além disso, o Instituto recorda que o Tribunal de Primeira Instância já afirmou que não cabe ao Tribunal dirigir injunções ao Instituto [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Julho de 1999, Procter & Gamble/OHMI (BABY-DRY), T-163/98, Colect., p. II-2383, n.° 53].

13.
    Por último, o Instituto considera que o recurso é ainda inadmissível por a Câmara de Recurso não ter proferido decisão relativamente aos produtos da classe 24, em relação aos quais o examinador não levantou qualquer objecção.

Apreciação do Tribunal

14.
    Em conformidade com o disposto no artigo 63.°, n.° 6, do Regulamento n.° 40/94, o Instituto deve tomar as medidas necessárias à execução da decisão do juiz comunitário. Por isso, não cabe ao Tribunal dirigir ao Instituto injunções. Com efeito, incumbe a este tirar as consequências do dispositivo e dos fundamentos do presente acórdão [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, Mitsubishi HiTec Paper Bielefeld/OHMI (Giroform), T-331/99, Colect., p. II-433, n.° 33]. Os presentes pedidos são, por conseguinte, inadmissíveis.

15.
    De qualquer forma, como o Instituto sublinha com razão, uma marca só pode ser registada no final do procedimento de registo, o qual não fica concluído com o exame dos motivos absolutos de recusa.

16.
    Além disso, em relação aos «tecidos e produtos têxteis não compreendidos noutra classe; coberturas de cama e de mesa» pertencentes à classe 24 da classificação de Nice, o pedido da recorrente está desprovido de objecto, pois a decisão do examinador de recusa parcial do pedido de marca comunitária ELLOS não abrange tais produtos, que não constituem, assim, objecto da decisão impugnada.

Quanto ao pedido de anulação da decisão impugnada

17.
    A recorrente invoca três fundamentos: o primeiro consiste na violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94; o segundo na falta de cumprimento pelo Instituto da sua obrigação de harmonizar, na Comunidade, o direito das marcas, ao não considerar as marcas anteriormente registadas em Espanha, e o terceiro na violação da obrigação do Instituto de aceitar as limitações dos produtos e serviços para os quais se pede o registo.

Quanto ao primeiro fundamento baseado em violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94

Argumentos das partes

18.
    A recorrente sustenta que o vocábulo ELLOS possui um carácter «distintivo» suficiente para se tornar uma marca comunitária. Segundo a recorrente, ainda que o termo «ellos» seja a terceira pessoa do plural do pronome pessoal em espanhol, ele não está, em si próprio, totalmente desprovido de carácter «distintivo».

19.
    A recorrente alega que resulta claramente da fundamentação da decisão impugnada que o vocábulo ELLOS não é um termo empregue no comércio de vestuário ou na venda por correspondência. A recorrente afirma que criou esta marca especialmente para este sector e que, mesmo para o consumidor de língua espanhola, a marca tem apenas conotações semânticas vagas.

20.
    Por outro lado, a recorrente defende que, ainda que o Tribunal considere que o sinal em causa está desprovido de carácter «distintivo» para os produtos pertencentes à classe 25 da classificação de Nice, essa análise não pode aplicar-se aos «serviços aos clientes para vendas postais» pertencentes à classe 35 da classificação de Nice, pois a terceira pessoa do plural do pronome pessoal em espanhol não faz qualquer sentido em relação a tais serviços. Por último, a recorrente sustenta que a parte do pedido relativa aos serviços da classe 35 da classificação de Nice e a parte relativa aos produtos da classe 25 dessa mesma classificação devem ser apreciadas separadamente.

21.
    O Instituto observa que, em relação aos produtos e serviços que figuram no pedido, o vocábulo ELLOS evocará directamente nos consumidores de língua espanhola uma referência ao «vestuário, calçado e chapelaria», ou aos «serviços aos clientes para vendas postais» destinados a uma clientela masculina.

22.
    O Instituto afirma que o carácter «distintivo» deve ser apreciado de modo idêntico em relação aos produtos e serviços pertencentes ao mesmo sector e que essa abordagem foi confirmada pelo Tribunal de Primeira Instância no seu acórdão de 26 de Outubro de 2000, Harbinger/OHMI (TRUSTEDLINK), (T-345/99, Colect., p. II-3525, n.° 39).

23.
    Acresce ainda, segundo o Instituto, que o carácter descritivo de uma marca não depende apenas da questão de saber se o termo que constitui o sinal cujo registo se pede comporta um ou mais significados.

24.
    O Instituto sustenta que o vocábulo ELLOS, quando utilizado em relação aos produtos e serviços indicados pela recorrente no seu pedido, informa imediatamente os consumidores de língua espanhola, sem necessidade de qualquer outra reflexão ou raciocínio, de que esses produtos e serviços são especialmente concebidos para homens.

Apreciação do Tribunal

25.
    A título preliminar, cumpre recordar que, na decisão impugnada, a recusa de registo do vocábulo pedido se baseia apenas no carácter descritivo deste. Assim, apesar de a recorrente utilizar o termo distintivo, o fundamento invocado deve ser entendido como dizendo respeito ao carácter descritivo do vocábulo pedido.

26.
    Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo de «marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes». Por outro lado, o artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 estipula que «[o] n.° 1 é aplicável mesmo que os motivos de recusa apenas existam numa parte da Comunidade»

27.
    O artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 obsta a que os sinais ou indicações nele contemplados sejam reservados a uma única empresa com base no seu registo como marca. Esta disposição prossegue, portanto, um fim de interesse geral, que exige que esses sinais ou indicações possam ser livremente utilizadas por todos (v., nesse sentido, o acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Maio de 1999, Windsurfing Chiemsee, C-108/97 e C-109/97, Colect., p. I-2779, n.° 25).

28.
    Por outro lado, os sinais contemplados no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 são considerados incapazes de exercer a função essencial da marca, a saber, a de identificar a origem comercial do produto ou do serviço,a fim de assim permitir ao consumidor que adquire o produto ou serviço designado pela marca fazer, aquando de uma ulterior aquisição, a mesma escolha se a experiência se revelar positva, ou fazer outra escolha se se revelar negativa.

29.
    O carácter descritivo de uma marca deve ser apreciado, por um lado, em relação aos produtos ou serviços para os quais é pedido o registo do sinal [v. acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, Taurus-Film/OHMI (Cine Action), T-135/99, Colect., p. II-379, n.° 25, e Taurus-Film/OHMI (Cine Comedy), T-136/99, Colect., p. II-397, n.° 25] e, por outro lado, em relação à percepção de um público-alvo, constituído pelo consumidor desses produtos ou serviços.

30.
    No caso concreto, presume-se que o público-alvo é o consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C-342/97, Colect., p. I-3819, n.° 26, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Junho de 2001, DKV/OHMI (Euro-Health), T-359/99, Colect., p. II-1645, n.° 27]. Com efeito, dada a natureza dos produtos e serviços em causa (vestuário e serviços de venda postal), estes destinam-se ao consumo geral.

31.
    Por outro lado, é pacífico que a existência do motivo absoluto de recusa visado no caso concreto apenas se invoca em relação a uma parte da Comunidade, ou seja, a Espanha (n.° 18 da decisão impugnada). Assim, nos termos do artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, o público-alvo pertinente, em relação ao qual importa apreciar o motivo absoluto de recusa, é o consumidor de língua espanhola.

32.
    Nestas circunstâncias, cumpre determinar, no contexto da aplicação do motivo absoluto de recusa enunciado no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, se existe para esse público-alvo um nexo directo e concreto entre o vocábulo ELLOS e o «vestuário, calçado e chapelaria» ou os «serviços aos clientes para vendas postais».

33.
    Quanto à questão de saber se existe para o público-alvo um nexo directo e concreto entre o sinal em causa e o «vestuário, calçado e chapelaria», importa salientar que a Câmara de Recurso considerou, com razão, que o vocábulo ELLOS, como terceira pessoa do plural do pronome pessoal em espanhol, pode servir, na zona de língua espanhola da Comunidade, para designar o destino de tais produtos, a saber, «vestuário, calçado e chapelaria» para uma clientela do sexo masculino.

34.
    Ora, atendendo às diferenças normalmente existentes entre o vestuário para homem e os mesmos produtos para mulher, a informação de que os produtos de vestuário se destinam a uma clientela masculina representa uma característica essencial dos produtos em causa, que o público-alvo tem em consideração.

35.
    Do exposto resulta que o vocábulo ELLOS permite ao público-alvo estabelecer imediatamente e sem qualquer outra reflexão um nexo concreto e directo entre esse sinal e o «vestuário, calçado e chapelaria» para uma clientela masculina, compreendido na categoria «vestuário, calçado e chapelaria» visada pelo pedido de registo controvertido.

36.
    Tendo a recorrente pedido o registo do sinal em causa para toda a categoria «vestuário, calçado e chapelaria», sem distinção, deve confirmar-se a apreciação da Câmara de Recurso relativamente a toda essa categoria (v., nesse sentido, acórdão EuroHealth, já referido, n.° 33).

37.
    Nestas condições, o nexo existente entre o vocábulo ELLOS, por um lado, e o «vestuário, calçado e chapelaria», por outro, afigura-se suficientemente estreito para cair na alçada da proibição constante do artigo 7.° , n.° 1, alínea c), e n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 [v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, Sunrider/OHMI (VITALITE), T-24/00, Colect., p. II-449, n.° 24].

38.
    Quanto à questão de saber se existe para o público-alvo um nexo directo e concreto entre o sinal em causa e os «serviços aos clientes para vendas postais», a Câmara de Recurso considerou que estes serviços não excluem expressamente a venda de vestuário, pelo que a possibilidade de existir um nexo entre eles e a sua venda deve poder presumir-se. Do exposto resulta, segundo a Câmara de Recurso, que os motivos para recusar o registo de vestuário pertencente à classe 25 da classificação de Nice são igualmente válidos para os «serviços aos clientes para vendas postais» da classe 35 da classificação de Nice (n.° 20 da decisão impugnada).

39.
    Assim, a Câmara de Recurso deduziu, essencialmente, o carácter descritivo do vocábulo ELLOS em relação aos serviços pertencentes à classe 35 da classificação de Nice do facto de o vocábulo ser descritivo em relação aos produtos pertencentes à classe 25 da classificação de Nice. Da contestação apresentada pelo Instituto e das explicações que forneceu na audiência resulta igualmente que ele considera que os serviços em causa possuem um carácter acessório relativamente aos produtos em causa.

40.
    Importa, antes de mais, precisar que a questão do carácter descritivo do vocábulo em relação aos «serviços aos clientes para vendas postais» que figuram no pedido e a questão relativa ao «vestuário, calçado e chapelaria» devem ser apreciadas em separado.

41.
    Com efeito, no exame de um pedido de marca comunitária, não existem categorias de produtos ou de serviços subordinados ou acessórios de outros. A este respeito, o facto de um pedido de marca comunitária poder ser limitado a posteriori, em relação à lista de produtos ou serviços nele contida, por força do artigo 44.° do Regulamento n.° 40/94, ou de uma marca poder ser transferida para uma parte dosprodutos ou serviços por força do artigo 17.° do mesmo regulamento, confirma que cada produto ou serviço ou categoria destes deve ser analisado autonomamente.

42.
    Cumpre, em seguida, salientar que o público-alvo não estabelecerá imediatamente e sem qualquer outra reflexão um nexo concreto e directo entre os «serviços aos clientes para vendas postais» e o vocábulo ELLOS. Com efeito, em relação aos produtos ou serviços que figuram no pedido de marca, o sexo da clientela a que se destinam os serviços em causa não constitui um elemento pertinente ou uma característica essencial destes.

43.
    Ora, a evocação dos «serviços aos clientes para vendas postais», ou de uma das suas características, que o sinal em causa pudesse causar no público-alvo é, quando muito, indirecta e não permite a esse público perceber imediatamente, e sem outra reflexão, uma descrição dos serviços em causa ou de uma das suas características, nomeadamente o seu destino.

44.
    Assim, o nexo entre o vocábulo ELLOS e os «serviços aos clientes para vendas postais», tal como apresentado pela Câmara de Recurso na decisão impugnada, é demasiado vago e indeterminado para cair sob a alçada da proibição estabelecida no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

45.
    Resulta do exposto que a Câmara de Recurso não teve razão ao considerar que o vocábulo ELLOS é exclusivamente descritivo em relação aos «serviços aos clientes para vendas postais», pelo que o presente fundamento deve, nessa medida, ser acolhido.

Quanto ao segundo fundamento baseado em falta de cumprimento pelo Instituto da sua obrigação de harmonizar, na Comunidade, o direito das marcas, ao não considerar as marcas anteriormente registadas em Espanha

Argumentos das partes

46.
    De acordo com a recorrente, o Instituto não teve em consideração o facto de estarem registadas em Espanha marcas constituídas pelo termo «ellos», ou que o incluem, pelo que não cumpriu a sua obrigação de harmonizar na Comunidade o direito das marcas. A este propósito, a recorrente refere dois registos espanhóis: a marca n.° 728769, ELLOS, para produtos pertencentes à classe 25 da classificação de Nice, e a marca n.° 1617871, Q-ELLOS, para serviços pertencentes à classe 35 da classificação de Nice.

47.
    A recorrente afirma que o examinador devia ter prestado especial atenção às marcas nacionais registadas nos Estados-Membros que aplicam um sistema de exame baseado em motivos absolutos de recusa análogos aos do Regulamento n.° 40/94. A recorrente sustenta que a Ley de marcas 32/1988, de 10 de Novembro de 1988 (lei espanhola das marcas), consagra motivos absolutos de recusa análogosaos do Regulamento n.° 40/94. Por outro lado, a recorrente sublinha que os argumentos utilizados pela Câmara de Recurso, para não ter em consideração as marcas supramencionadas, carecem de todo e qualquer fundamento.

48.
    Por último, a recorrente recorda que, segundo a decisão da Primeira Câmara de Recurso de 2 de Dezembro de 1998, LEICHT (R 120/1998-1), o Instituto deve ter em consideração as decisões dos serviços nacionais de marcas, sempre que tenha dúvidas quanto à possibilidade de uma marca comunitária ser registada, por possuir um significado específico numa língua utilizada no território onde a marca nacional está registada.

49.
    O Instituto sustenta que os registos nos Estados-Membros são meramente indicativos quanto à aptidão de uma marca comunitária para ser registada e que não constituem um factor decisivo para o examinador.

50.
    No que diz respeito às marcas espanholas mencionadas pela recorrente, o Instituto observa o seguinte:

-    a marca espanhola n.° 728769, ELLOS, foi registada em 1977, antes da adopção da Ley de marcas 32/1988, com base numa regulamentação, o Estatuto sobre Propiedad Industrial, de 26 de Julho de 1929, texto refundido de 30 de Abril de 1930 (estatuto espanhol da propriedade industrial), que não utilizava critérios de motivos absolutos de recusa semelhantes aos previstos no Regulamento n.° 40/94. Por outro lado, trata-se de uma marca mista (figurativa e verbal) apenas registada para «calçado»;

-    a marca espanhola n.° 1617871, Q-ELLOS, foi registada em 1993 para serviços a empresas e serviços de publicidade pertencentes à classe 35 da classificação de Nice, é uma marca mista (figurativa e verbal) e que constitui uma forma original de escrever a palavra espanhola «cuellos» («colarinhos»).

51.
    Por último, o Instituo defende que a decisão impugnada está em perfeita concordância com a decisão da Câmara de Recurso de 2 de Dezembro de 1998, LEICHT, uma vez que não existe, no caso concreto, qualquer decisão de um órgão de recurso do serviço espanhol de patentes e marcas, nem uma fundamentação pormenorizada que justifique a decisão de registar as marcas espanholas em causa e que a Câmara de Recurso teve seriamente em conta esses dois registos nacionais prévios.

Apreciação do Tribunal

52.
    Antes de mais, importa referir que a Câmara de Recurso teve em consideração os registos nacionais precedentes, tendo constatado que as duas marcas espanholasalegadamente anteriores não coincidem com o pedido de marca comunitária em causa (n.° 19 da decisão impugnada).

53.
    Em seguida, cumpre recordar que, por força do carácter unitário da marca comunitária, o regime comunitário das marcas é um sistema autónomo constituído por um conjunto de regras e prosseguindo objectivos que lhe são específicos, sendo a sua aplicação independente de qualquer sistema nacional [neste sentido, v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Dezembro de 2000, Messe München/OHMI (electrónica), T-32/00, Colect., p. II-3829, n.° 47). Por conseguinte, a validade das decisões das Câmaras de Recurso deve ser examinada apenas com base na regulamentação comunitária pertinente.

54.
    Daí resulta que as marcas nacionais invocadas pela recorrente, apesar de registadas na zona linguística visada pela decisão impugnada, constituem elementos que não vinculam o Instituto. De qualquer modo, conforme defendido pelo Instituto na sua contestação, elas apresentam características diferentes das da marca comunitária para a qual é pedido o registo no presente caso.

55.
    Quanto à alegação da recorrente relativa à omissão do Instituto de cumprimento da sua obrigação de harmonizar, na Comunidade, o direito das marcas, ao não considerar as marcas nacionais invocadas, importa sublinhar que o direito comunitário das marcas não deve ser harmonizado através da aceitação pelo Instituto dos registos nacionais existentes em cada Estado-Membro.

56.
    Por último, no que diz respeito às afirmações da recorrente segundo as quais a decisão impugnada não é conforme com a decisão da Primeira Câmara de Recurso de 2 de Dezembro de 1998, LEICHT, basta observar que a recorrente não demonstrou que se tratava, nesta última decisão, de uma situação comparável à do caso presente (acórdão TRUSTEDLINK, já referido, n.° 40). De qualquer forma, cumpre salientar que o Instituto não se encontra vinculado pelas suas decisões internas, pois cada caso deve ser apreciado à luz das circunstâncias e características que lhe são próprias.

57.
    Daqui decorre que o presente fundamento deve ser rejeitado.

Quanto ao terceiro fundamento, baseado em violação da obrigação do Instituto de aceitar as limitações dos produtos e serviços

Argumentos das partes

58.
    A recorrente alega que propôs retirar a classe 25 do pedido de registo, mas que a Câmara de Recurso não teve em consideração essa proposta de retirada, violando assim o artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94.

59.
    De acordo com o Instituto, o Regulamento n.° 40/94 não impõe qualquer obrigação de considerar as propostas condicionais de limitação de produtos ou serviços, como alega a recorrente, pelo que tais retiradas condicionais não podem ser aceites, dado não constituírem retiradas reais.

Apreciação do Tribunal

60.
    Nos termos do artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, o requerente pode, em qualquer momento, retirar o seu pedido de marca comunitária ou limitar a lista de produtos ou serviços nele contida.

61.
    Por conseguinte, a faculdade de limitar a lista de produtos e serviços pertence apenas ao requerente de uma marca comunitária, o qual pode, a todo o momento, dirigir ao Instituto um pedido nesse sentido. Neste contexto, a retirada, total ou parcial, de um pedido de marca comunitária deve ser feita de forma expressa e não condicional.

62.
    No caso concreto, a recorrentes propôs-se retirar os produtos da classe 25 do pedido de marca comunitária ELLOS caso a Câmara de Recurso tencionasse rejeitar esse pedido (n.° 13 da decisão impugnada). Contudo, a recorrente não efectuou a retirada de forma expressa e não condicional. Assim, não pode considerar-se que a recorrente tenha efectuado uma retirada parcial do pedido de marca comunitária em causa.

63.
    Daqui decorre que o presente fundamento deve ser rejeitado.

64.
    Com base nas considerações precedentes, a decisão impugnada deve ser anulada na parte em que incide em «serviços aos clientes para vendas postais» (classe 35 da classificação de Nice), devendo ser negado provimento ao recurso quanto ao mais.

Quanto às despesas

65.
    Por força do disposto no n.° 3 do artigo 87.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas. No caso em apreço, dado que a decisão impugnada deve ser parcialmente anulada, há que decidir que cada parte suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1)    A decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 15 de Junho de 2000 (processo R 385/1999-1) é anulada na parte em que incide em serviços pertencentes à classe 35 do acordo de Nice, correspondentes à seguinte descrição: «serviços aos clientes para vendas postais».

2)    É negado provimento ao recurso quanto ao mais.

3)    Cada parte suportará as suas próprias despesas.

Mengozzi
Tiili
Moura Ramos

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de Fevereiro de 2002.

O secretário

O presidente

H. Jung

P. Mengozzi


1: Língua do processo: inglês.