Language of document : ECLI:EU:T:2002:225

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

25 de Setembro de 2002 (1)

«Marca comunitária - Cores (verde e cinzento) - Motivo absoluto de recusa - Carácter distintivo - Artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T-316/00,

Viking-Umwelttechnick GmbH, com sede em Kufstein (Áustria), representada por S. Völker, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. von Mühlendahl, E. Joly e S. Bonne, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objecto um recurso da decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 28 de Julho de 2000 (processo R 558/1999-1), que recusa o registo como marca comunitária de uma justaposição das cores verde e cinzenta,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: M. Vilaras, presidente, V. Tiili e P. Mengozzi, juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 9 de Outubro de 2000,

vista a contestação entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 4 de Janeiro de 2001,

após a audiência de 27 de Fevereiro de 2002,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes do litígio

1.
    Em 30 de Janeiro de 1997, a recorrente apresentou um pedido de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), com as alterações nele introduzidas.

2.
    A marca cujo registo é pedido é uma justaposição de duas cores, como tal, representada por um rectângulo verde, correspondente à referência de cor Pantone 369c, encimando um rectângulo cinzento, correspondente à referência de cor Pantone 428u.

3.
    Os produtos para os quais o registo da marca foi pedido integram-se na classe 7 do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e Serviços, para efeitos do registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, tal como revisto e alterado e correspondem à descrição seguinte: «Máquinas de cortar e triturar para jardim, motoenxadas, máquinas de cortar relva, motogadanheiras frontais, máquinas de cortar relva equipadas com assento, arejadores de prados, cortadores de relva, tesouras de aparar sebes, varredouras mecânicas, limpa-neves, charruas, motoserras, serras para cortar troncos baixos e arbustos, máquinas de lavagem de alta pressão, todos os aparelhos a motor, com peças, peças sobresselentes e acessórios», inseridos na classe 7.

4.
    Por decisão de 23 de Julho de 1999, o examinador indeferiu o pedido nos termos do artigo 38.° do Regulamento n.° 40/94 pelo facto de a combinação das cores verde e cinzenta ser desprovida de carácter distintivo e descritivo para os produtos designados, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do mesmo regulamento.

5.
    Em 31 de Agosto de 1999, a recorrente interpôs recurso para o IHMI da decisão do examinador, nos termos do artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94.

6.
    Por decisão de 28 de Julho de 2000 (a seguir «decisão impugnada»), que foi notificada à recorrente em 7 de Agosto de 2000, a Primeira Câmara de Recurso confirmou a recusa de registo da marca pedida. Essencialmente, considerou que o sinal pedido está desprovido de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

Pedidos das partes

7.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão impugnada;

-    condenar o IHMI nas despesas.

8.
    O IHMI conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    negar provimento ao recurso;

-    condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

9.
    A recorrente invoca dois fundamentos baseados em violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), e do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

10.
    Há que salientar que, embora a Câmara de Recurso tenha desenvolvido considerações que podem ser ligadas à noção de carácter descritivo, concluiu, todavia, pela recusa do sinal pedido, no n.° 24 da decisão impugnada, com base no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Por conseguinte, o fundamento baseado em violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), é inoperante.

11.
    Em consequência, há apenas que examinar o fundamento baseado em violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

Argumentos das partes

12.
    A recorrente recorda que, em princípio, as cores podem ser protegidas, como tais, por uma marca, tal como prevê a definição de sinais susceptíveis de constituírem uma marca comunitária dada pelo artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94. A recorrente considera que esta definição corresponde a uma concepção moderna das marcas, que são cada vez mais constituídas por sinais não tradicionais tais como os sons, as cores ou as embalagens.

13.
    A recorrente alega que a utilização de cores como meio de identificação, e não como elemento decorativo, permite ao público identificar à distância a gama de produtos de uma empresa de entre um conjunto mais vasto, ao passo que outros elementos, tais como uma marca nominativa, permitem a identificação final do produto.

14.
    A recorrente considera que há interesse comercial em proteger as cores, abstractamente, independentemente da sua forma, uma vez que elas são utilizadas em proporções variáveis em diferentes tipos de suportes ou nos próprios produtos.

15.
    A recorrente explica que a caracterização de um produto pela combinação de cores pedida se efectua, designadamente para pequenos aparelhos, por uma repartição do verde e do cinzento na caixa em plástico.

16.
    A recorrente afirma que não se pode concluir que combinação cromática é muito inabitual para provar o seu carácter distintivo. Com efeito, este critério é inadequado, na medida em que, se uma empresa utiliza desde há muito tempo esta combinação, esta deixou de ser inabitual. Do mesmo modo, se uma empresa passa a utilizar esta combinação após a ter registado como marca, a referida combinação deixa de ser muito inabitual a partir do momento em que conheça um certo sucesso.

17.
    No que diz respeito à cor cinzenta, a recorrente recorda que se trata de um cinzento específico (Pantone 428u), que não é geralmente utilizado para o plástico, e que importa conhecer a definição de uma cor para apreciar o seu carácter distintivo.

18.
    Quanto à cor verde, a recorrente sublinha que os produtos dos seus concorrentes se apresentam em cores variadas. Esta cor não desempenha, para os produtos em causa, qualquer papel específico e a sua associação eventual com a natureza é pouco decisiva para a apreciação do seu carácter distintivo, nomeadamente porque ela é constituída de uma variante particular em justaposição com uma outra tonalidade.

19.
    Finalmente, a recorrente salienta que a justaposição particular de tonalidades precisas dá aos produtos uma aparência visual específica e um carácter próprio que os distingue dos outros produtos, o que confere à marca o grau mínimo exigido de poder distintivo.

20.
    O IHMI recusa a argumentação da recorrente. Considera que o sinal pedido deve cumprir não apenas as exigências do artigo 4.° do Regulamento n.° 40/94, mas também das disposições do artigo 7.°, n.° 1, do referido regulamento. A este respeito, considera que as cores devem permitir ao público distinguir os produtos da recorrente dos dos seus concorrentes e não serem percebidas como um simples elemento ornamental corrente ou como uma referência a uma característica ou a uma qualidade do produto.

21.
    O IHMI afirma que certas categorias de marcas estão intrinsecamente desprovidas de carácter distintivo, nomeadamente quando os círculos interessados não estabelecem qualquer relação entre o sinal e uma empresa em especial. Assim sucede com as cores quando a configuração de um produto não é reivindicada.

22.
    Finalmente, o IHMI considera que a justaposição das cores verde e cinzenta dá impressão de uma nuance verde, cor largamente espalhada e valorizadora dos produtos em causa, aposta num fundo de nuance cinzento claro, cor que não tem vocação para chamar a atenção do público na medida em que é parecida com a cor do metal e habitual em numerosos suportes. Assim, a combinação verde e cinzento não será percebida pelos círculos interessados como uma indicação de origem.

Apreciação do Tribunal

23.
    Há que salientar, antes de mais, que as cores ou as combinações de cores, como tais, são susceptíveis de constituir marcas comunitárias, na medida em que sejam adequadas para distinguir os produtos ou os serviços de uma empresa dos de uma outra empresa.

24.
    No entanto, a aptidão geral de uma categoria de sinais para constituírem uma marca não implica que os sinais pertencentes a esta categoria possuam necessariamente um carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 em relação a um produto ou a um serviço determinado.

25.
    Os sinais a que se refere o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 são considerados incapazes de desempenhar a função essencial da marca, ou seja, a de identificar a origem comercial do produto ou do serviço a fim de que o consumidor que adquire o produto ou o serviço que a marca designa possa, em posterior aquisição, efectuar a mesma escolha, se a experiência se revelar positiva, ou fazer outra escolha, se aquela se revelar negativa.

26.
    O carácter distintivo de uma marca só pode ser apreciado, por um lado, em relação aos produtos ou aos serviços para os quais o registo é pedido e, por outro, em relação à percepção que dele tem o público pertinente.

27.
    Além disso, há que salientar que o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 não faz distinção entre os sinais de diferentes naturezas. No entanto, a percepção do público pertinente não é necessariamente a mesma no caso de um sinal constituído por uma cor ou uma combinação de cores, como tais, que no caso de uma marca nominativa ou figurativa que consiste num sinal independente do aspecto dos produtos que designa. Com efeito, embora o público tenha o hábito de perceber, imediatamente, as marcas nominativas ou figurativas como sinais identificadores da origem comercial do produto, assim não sucede necessariamente quando um sinal se confunde com o aspecto do produto para o qual o sinal é pedido.

28.
    Há que salientar, em primeiro lugar, que os produtos designados no pedido de registo se destinam a todos os consumidores e, por conseguinte, a consumidores não especializados. Consequentemente, pressupõe-se que o público pertinente é o consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado. No entanto, há que tomar em conta a circunstância de que o consumidor médio deve confiar na imagem imperfeita que deles conservou na memória. Importa igualmente tomar em consideração o facto de o nível de atenção do consumidor médio ser susceptível de variar em função da categoria de produtos em causa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C-342/97, Colect., p. I-3819, n.° 26).

29.
    No que concerne à cor verde, deve dizer-se que ela é habitualmente utilizada para os produtos em causa e, por conseguinte, não constitui um elemento susceptível de ser percebido e memorizado, de imediato, como indicador de origem comercial. De resto, a nuance de verde usada na justaposição cujo registo foi pedido não apresenta uma diferença suficientemente perceptível em relação às nuances de verde comummente utilizadas no sector dos produtos designados.

30.
    No que diz respeito à cor cinzenta, é forçoso dizer que ela não apresenta qualquer particularidade que permita ao consumidor pensar que ela não é a cor natural do material ou que se trata de uma simples variante de cor deste material ou da embalagem.

31.
    Na medida em que o sinal, para o qual o registo foi pedido, é constituído pela justaposição das duas cores acima analisadas, há que apreciar, portanto, o carácter distintivo do conjunto constituído pela sua justaposição.

32.
    A este respeito, há que, em primeiro lugar, considerar que, de facto, tal como resulta dos exemplos apresentados na contestação do IHMI, estas duas cores ou nuances similares são, em conjunto, comummente utilizadas para produtos de jardinagem.

33.
    Além disso, há que salientar que a simples justaposição das cores verde e cinzenta, tal como representada no pedido de registo, apresenta um carácter abstracto e impreciso em relação aos produtos em causa e não uma combinação consistente num arranjo determinado das referidas cores. A este respeito, a Câmara de Recurso declarou, justamente, que não foi reivindicado qualquer arranjo de cores.

34.
    Por conseguinte este sinal não poderá ser percebido e reconhecido na medida em que uma repartição desordenada das cores nos produtos pode levar a numerosos arranjos diferentes que não permitem ao consumidor apreender e memorizar uma combinação especial, que ele possa utilizar para reiterar uma experiência de compra de modo imediato e certo.

35.
    Esta apreciação é, de resto, confirmada à luz dos exemplos retirados do catálogo apresentados pela recorrente na audiência, pelo facto de os produtos, com as cores reivindicadas, se apresentarem sob formas diferentes que não permitem associar as cores de modo homogéneo e, portanto, aplicar o sinal de modo uniforme em conformidade com um arranjo determinado, numa certa ordem, dos dois elementos presentes na justaposição. Além disso, resulta do mesmo catálogo que, em relação a certos produtos, a justaposição do verde e do negro é mais incisiva.

36.
    Finalmente, no que se refere ao argumento da recorrente de que as cores utilizadas podem permitir ao consumidor identificar à distância produtos pertencentes a uma mesma gama, basta salientar que, ao adiantar este argumento, a recorrente admite, igualmente, que a identificação final de origem comercial do produto é realizada por outros elementos característicos, nomeadamente por uma marca nominativa.

37.
    Por conseguinte, o consumidor não perceberá na justaposição do verde e do cinzento um sinal que indique que os produtos provêm de uma mesma empresa, antes a perceberá como um simples elemento de acabamento dos produtos em causa.

38.
    Consequentemente, há que concluir que o sinal pedido não permitirá ao consumidor pertinente reconhecer esse sinal como sinal distintivo quando esse consumidor for levado a fazer a sua escolha no momento de uma aquisição posterior dos produtos em causa.

39.
    Esta conclusão não pode ser infirmada pelos argumentos da recorrente de que o critério ligado ao carácter inabitual da combinação cromática é inadequado na medida em que, se uma empresa utilizar esta combinação durante muito tempo, esta última deixa de ser inabitual e, se esta combinação puder ser registada como marca, deixa também de ser inabitual a partir do momento em que tenha algum sucesso. Com efeito, por um lado, a autorização de uma combinação cromática durante um certo tempo, antes do seu eventual registo, por uma empresa, não implica automaticamente que esta combinação seja utilizada para os produtos referidos no pedido, por outras empresas. Por outro lado, após o registo desta combinação, na hipótese de a marca ter um certo sucesso, o seu titular mantém o direito de garantir a defesa da exclusividade que está ligada à marca dentro dos limites estabelecidos pelo Regulamento n.° 40/94.

40.
    Segue-se que, ao declarar o carácter habitual das cores e a sua falta de arranjo concreto, a Câmara de Recurso decidiu, correctamente, que a justaposição das cores verde e cinzenta não é distintiva para os produtos em causa na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

Quanto às despesas

41.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal, a parte vencida deve ser condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas do IHMI, em conformidade com o pedido deste.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1.
    É negado provimento ao recurso.

2.
    A recorrente é condenada nas despesas.

Vilaras
Tiili
Mengozzi

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 25 de Setembro de 2002.

O secretário

O presidente

H. Jung

M. Vilaras


1: Língua do processo: alemão.