Language of document : ECLI:EU:T:2023:520

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Nona Secção)

6 de setembro de 2023 (*)

«Função pública — Funcionários — Pensão de aposentação — Direitos a pensão adquiridos antes da entrada ao serviço da União — Transferência para o regime da União — Duração do serviço inferior a dez anos — Morte — Recusa de restituição do capital correspondente aos direitos a pensão nacionais transferidos e aos direitos de pensão adquiridos no RPIUE — Artigo 11.o, n.o 1, e artigo 12.o, n.o 1, alínea b), do anexo VIII do Estatuto — Enriquecimento sem causa»

No processo T‑171/22,

OR,

OS,

representados por N. de Montigny, advogada,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada por T. Bohr, M. Brauhoff e G. Niddam, na qualidade de agentes,

recorrida,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção),

composto por: L. Truchot (relator), presidente, H. Kanninen e T. Perišin, juízes,

secretário: L. Ramette, administrador,

vistos os autos,

após a audiência de 11 de maio de 2023,

profere o presente

Acórdão

1        Por meio do seu recurso interposto ao abrigo do artigo 270.o TFUE, os recorrentes, OR e OS, na qualidade de sucessores de A (a seguir «A» ou «funcionário falecido»), pedem, em primeiro lugar, a anulação da Decisão do Serviço de «Gestão e Liquidação dos Direitos Individuais» (PMO) da Comissão Europeia, de 12 de julho de 2021, que indeferiu o seu pedido de restituição do capital correspondente aos direitos a pensão nacionais adquiridos pelo pai antes da sua entrada ao serviço da União Europeia e transferido para o Regime de Pensões das Instituições da União (a seguir «RPIUE»), por um lado, e do capital correspondente às contribuições dessa pessoa para o RPIUE antes da sua morte, por outro, bem como, na medida em que se considere que constitui um complemento de fundamentação, da Decisão de 22 de dezembro de 2021 pela qual a sua reclamação foi indeferida e, em segundo lugar, a restituição dos montantes pedidos, acrescidos de juros à taxa fixada pelo Banco Central Europeu (BCE) para as principais operações de refinanciamento, acrescida de 2 pontos percentuais.

 Antecedentes do litígio

2        A entrou ao serviço da União em 16 de julho de 2003, como agente contratual auxiliar. A partir de 16 de julho de 2004, exerceu funções na Comissão, na qualidade de agente temporário, e tornou‑se funcionário em 16 de abril de 2006.

3        Nos termos do artigo 11.o, n.o 2, do anexo VIII do Estatuto dos Funcionários da União Europeia (a seguir «Estatuto»), A mandou transferir, em setembro de 2005, para o RPIUE o capital correspondente aos direitos a pensão nacionais adquiridos antes da sua entrada ao serviço da União (a seguir «transferência “in”»). O pagamento desse capital ao RPIUE deu lugar ao reconhecimento de uma bonificação de anuidades com uma certa duração.

4        Em seguida, A requereu e obteve uma licença sem vencimento para o período compreendido entre 17 de setembro de 2008 e 16 de setembro de 2013, a fim de poder entrar ao serviço da Organização Internacional de Energia de Fusão ITER (a seguir «ITER»), com sede em Saint‑Paul‑lez‑Durance (França). Esta licença sem vencimento foi renovada até à sua demissão, apresentada em 1 de julho de 2020 e que se tornou efetiva em 16 de setembro de 2020.

5        Assim, A pagou contribuições para o RPIUE de 16 de julho de 2003 a 16 de setembro de 2008, ou seja, durante um período de cinco anos e dois meses.

6        Por mensagem de correio eletrónico de 1 de julho de 2020, dia da apresentação da sua demissão à Comissão, A interrogou o PMO sobre o procedimento a seguir para beneficiar de uma transferência, na aceção do artigo 11.o, n.o 1, do anexo VIII do Estatuto (a seguir «transferência “out”»), dos direitos à pensão adquiridos no RPIUE para outro regime de pensões. Na mesma mensagem de correio eletrónico, A precisava que não tinha cumprido os dez anos de serviço efetivo exigidos para poder beneficiar de uma pensão de aposentação.

7        Na sua resposta, enviada por correio eletrónico em 2 de julho de 2020, o PMO indicou a A o procedimento a seguir para realizar uma transferência «out». O PMO precisou igualmente a A que, tendo cumprido menos de dez anos de serviço, era obrigado a transferir o equivalente atuarial dos seus direitos à pensão adquiridos no RPIUE.

8        A faleceu em 5 de janeiro de 2021.

9        Por mensagem de correio eletrónico de 14 de janeiro de 2021, a mãe dos recorrentes, ex‑mulher do funcionário falecido, informou o PMO do falecimento deste. No mesmo dia, o PMO respondeu‑lhe, nomeadamente, que, uma vez que o funcionário falecido não tinha apresentado um pedido de transferência «out» antes do seu falecimento, tal transferência já não era possível.

10      Em 18 de março de 2021, os recorrentes, filhos e únicos herdeiros do funcionário falecido, apresentaram, na sua qualidade de sucessores, um pedido, nos termos do artigo 90.o, n.o 1, do Estatuto, destinado a obter o pagamento, por um lado, do capital representativo dos direitos a pensão nacionais adquiridos pelo pai antes da sua entrada ao serviço da União e transferido para o RPIUE e, por outro, do capital correspondente aos direitos a pensão adquiridos por este último no RPIUE antes do seu falecimento.

11      Por Decisão de 12 de julho de 2021 (a seguir «decisão impugnada»), o PMO indeferiu o pedido dos recorrentes.

12      Em especial, o PMO indicou, na decisão impugnada, que, uma vez que o funcionário falecido esteve ao serviço durante menos de dez anos, não podia beneficiar de uma pensão da União, pelo que nem a sua viúva nem os seus órfãos podiam beneficiar das prestações estatutárias de reversão. O PMO indicou igualmente que nenhuma disposição estatutária permitia o reembolso do capital representativo dos direitos a pensão adquiridos no RPIUE, incluindo os direitos transferidos para o RPIUE por um antigo funcionário ou agente falecido, e explicou que um pedido de transferência «out» era um direito individual concedido apenas aos antigos funcionários e agentes, que o funcionário falecido não utilizou na sequência da produção de efeitos da sua demissão.

13      Em 20 de setembro de 2021, os recorrentes apresentaram, ao abrigo do artigo 90.o, n.o 2, do Estatuto, uma reclamação contra a decisão impugnada.

14      Por decisão de 22 de dezembro de 2021 (a seguir «decisão de indeferimento da reclamação»), a reclamação dos recorrentes foi indeferida.

 Pedidos das partes

15      Os recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada e, na medida em que se considere que fornece uma fundamentação complementar, a decisão de indeferimento da reclamação;

–        ordenar à Comissão que restitua os montantes pedidos, acrescidos de juros à taxa fixada pelo BCE para as principais operações de refinanciamento, acrescida de 2 pontos percentuais;

–        condenar a Comissão nas despesas.

16      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar os recorrentes nas despesas.

 Questão de direito

 Quanto ao objeto do recurso

17      Resulta dos pedidos de anulação que os recorrentes solicitam ao Tribunal Geral que anule não só a decisão impugnada mas igualmente, na medida em que se considere que constitui uma fundamentação complementar, a decisão de indeferimento da reclamação.

18      Segundo jurisprudência constante, os pedidos de anulação formalmente dirigidos contra a decisão de indeferimento de uma reclamação, sempre que aquela decisão seja desprovida de conteúdo autónomo, têm por efeito submeter à apreciação do Tribunal Geral o ato contra o qual foi apresentada a reclamação (Acórdão de 13 de julho de 2018, Curto/Parlamento, T‑275/17, EU:T:2018:479, n.o 63; v., igualmente, neste sentido, Acórdão de 6 de abril de 2006, Camós Grau/Comissão, T‑309/03, EU:T:2006:110, n.o 43).

19      No caso em apreço, uma vez que a decisão de indeferimento da reclamação se limita a confirmar a decisão impugnada, especificando as razões em apoio da mesma, há que concluir que o pedido de anulação da decisão de indeferimento da reclamação é desprovido de conteúdo autónomo e que não há, portanto, que decidir especificamente sobre o mesmo. Todavia, na apreciação da legalidade da decisão impugnada, deve ser tomada em consideração a fundamentação constante da decisão de indeferimento da reclamação, uma vez que essa fundamentação deve coincidir com a da decisão impugnada (v., neste sentido, Acórdão de 30 de abril de 2019, Wattiau/Parlamento, T‑737/17, EU:T:2019:273, n.o 43 e jurisprudência referida).

 Quanto ao mérito

 Quanto ao pedido de anulação da decisão recorrida

20      Em apoio dos seus pedidos de anulação, os recorrentes invocam um único fundamento, relativo ao enriquecimento sem causa da União.

21      Em substância, os recorrentes sustentam que o orçamento da União enriqueceu com o capital correspondente, por um lado, aos direitos a pensão nacionais adquiridos pelo funcionário falecido antes da sua entrada ao serviço da União e transferidos para o RPIUE e, por outro, às contribuições pagas pelo funcionário falecido ao RPIUE a título das suas funções ao serviço da União.

22      Em especial, em primeiro lugar, os recorrentes alegam que a decisão impugnada não assenta em nenhuma base legal ou interpretação jurisprudencial.

23      A este respeito, num primeiro momento, os recorrentes alegam que a Comissão considerou erradamente que o artigo 11.o do anexo VIII do Estatuto permitia à União conservar o capital acumulado pelo funcionário falecido no RPIUE.

24      Por um lado, os recorrentes contestam o caráter irrevogável da transferência «in». Em seu entender, resulta do artigo 8.o, n.o 5, das disposições gerais de execução dos artigos 11.o e 12.o do anexo VIII do Estatuto, adotadas pela Decisão C(2011) 1278 da Comissão, de 3 de março de 2011, publicada nas Informações Administrativas n.o 17‑2011, de 28 de março de 2011 (a seguir «DGE»), que a decisão de um funcionário ou de um agente de proceder à transferência «in» do capital correspondente aos direitos a pensão nacionais adquiridos antes da sua entrada ao serviço da União para o RPIUE só é irrevogável na medida em que o referido funcionário ou agente beneficie posteriormente de prestações pagas no âmbito desse regime. Os recorrentes acrescentam, a título subsidiário, que, se esta disposição dever ser interpretada no sentido de que a transferência «in» é irrevogável em qualquer caso, a sua aplicação deve ser afastada na medida em que viola o princípio do enriquecimento sem causa.

25      Por outro lado, no que respeita à transferência «out», os recorrentes alegam que a situação do caso em apreço não foi prevista pelo Estatuto nem pelas DGE. Consideram que, no caso em apreço, a falta de diligências concretas para efeitos dessa transferência «out» não é o resultado de uma negligência ou de uma abstenção voluntária do funcionário falecido, mas resulta unicamente da ocorrência súbita, imprevisível e irresistível da sua morte, menos de quatro meses após a sua demissão de funções na Comissão.

26      Além disso, os recorrentes sublinham que nenhuma disposição estatutária impõe um prazo para apresentar um pedido de transferência «out», pelo que o facto de não ter solicitado formalmente essa transferência não pode ser interpretado como uma renúncia por parte do funcionário falecido a transferir os montantes controvertidos para outro regime de pensões. Salientam igualmente que, ao interrogar o PMO, em 1 de julho de 2020, sobre as diligências a empreender para esse efeito (v. n.o 6, supra), o funcionário falecido manifestou sem ambiguidade a sua vontade de proceder à referida transferência «out».

27      Num segundo momento, os recorrentes alegam que, embora exista um fundamento jurídico para o pagamento de contribuições pelo funcionário falecido no RPIUE, estas foram pagas por este sem contrapartida e, portanto, sem causa. Com efeito, as contribuições acumuladas pelo funcionário falecido para o RPIUE em razão quer do exercício de funções ao serviço da União quer da transferência «in» a que mandou proceder em 2005 acabaram por não criar nenhum direito em seu benefício ao abrigo do referido RPIUE, na medida em que trabalhou menos de dez anos ao serviço da União, duração mínima prevista pelo Estatuto para pedir a concessão de uma pensão de aposentação.

28      A este título, os recorrentes consideram que a circunstância de o Estatuto prever expressamente a possibilidade de um antigo funcionário ou agente transferir o capital correspondente aos seus direitos a pensão adquiridos no RPIUE para outro regime de pensões, bem como o pagamento de uma compensação por cessação de funções, demonstra que o referido capital não pertence ao orçamento da União. Por outro lado, os recorrentes alegam que o argumento segundo o qual o equilíbrio atuarial do RPIUE poderia ser posto em causa pelo reembolso das quantias pagas por antigos funcionários ou agentes não elegíveis para beneficiar de uma pensão de aposentação não está demonstrado. Além disso, os recorrentes sustentam que o princípio da solidariedade, no qual assenta o referido equilíbrio, deve poder beneficiar o antigo funcionário ou antigo agente que para ele contribuiu, sob pena de a referida solidariedade estar na origem de um empobrecimento sem causa.

29      Em segundo lugar, os recorrentes alegam que o seu empobrecimento resultante do enriquecimento da União é real e certo.

30      A este respeito, os recorrentes sustentam que, na falta de transferência «out» do capital correspondente aos direitos a pensão adquiridos pelo funcionário falecido, não puderam beneficiar de direitos adicionais correspondentes ao referido capital, apesar de essa transferência «out» para o fundo de pensões associado ao último emprego do funcionário falecido no ITER lhes ter permitido, enquanto sucessores deste último, beneficiar de uma indemnização de um montante mais elevado do que aquela de que já beneficiam, dependendo o montante desta última do montante total acumulado no referido fundo.

31      Os recorrentes acrescentam que, caso o funcionário falecido não tivesse mandado proceder a uma transferência «in», teriam igualmente podido beneficiar de uma pensão ou de um capital pago pelo regime nacional de que aquele dependia antes da sua entrada ao serviço da União.

32      A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

33      A título preliminar, importa recordar que, segundo a jurisprudência, uma ação de restituição fundada em enriquecimento sem causa da União exige, para ser acolhida, a reunião de duas condições, a saber, a prova, por um lado, de um enriquecimento sem base legal válida da União e, por outro, de um empobrecimento do demandante ligado ao referido enriquecimento (v. Acórdão de 3 de julho de 2018, Transtec/Comissão, T‑616/15, EU:T:2018:399, n.o 156 e jurisprudência referida).

34      Quanto à primeira condição mencionada no n.o 33, supra, segundo a qual o direito à restituição por parte da pessoa enriquecida está subordinado à falta de base legal válida do enriquecimento em questão, há que salientar o seguinte.

35      Há que observar que, com a sua argumentação, os recorrentes não põem em causa a existência de uma base legal válida relativa ao pagamento de contribuições pelo funcionário falecido para o RPIUE. Com efeito, embora lamentem que as diferentes contribuições efetuadas pelo funcionário falecido para o RPIUE, quer se trate das contribuições resultantes das suas funções ao serviço da União quer das que decorrem da transferência «in» que mandou proceder em 2005 (v. n.o 3, supra), o foram «sem contrapartida e sem causa» e sem «que tenha sido criado qualquer direito à pensão», os recorrentes reconhecem, todavia, sem ambiguidade nos seus articulados, que «existe um fundamento jurídico para o pagamento da contribuição[ões] para o RPI [UE]». Além disso, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral na audiência, a representante dos recorrentes confirmou que a sua argumentação incidia sobre a falta de base jurídica válida «para reter [as] quantias» correspondentes às contribuições pagas pelo funcionário falecido ao RPIUE.

36      Assim, com a sua argumentação, os recorrentes convidam apenas o Tribunal Geral a declarar que a conservação, pela Comissão, de todas as contribuições efetuadas pelo funcionário falecido para o RPIUE constitui, na sequência do falecimento deste último, um enriquecimento da União sem base legal válida.

37      Uma vez que o funcionário falecido pagou contribuições para o RPIUE na qualidade de agente contratual auxiliar, em seguida na qualidade de agente temporário e, por último, na de funcionário, as disposições relativas aos seus direitos à pensão nas condições previstas no título V, capítulo 3, do Estatuto e no anexo VIII do Estatuto eram‑lhe aplicáveis, na sequência da sua demissão. A este respeito, importa referir o seguinte.

38      Em primeiro lugar, o artigo 36.o do anexo VIII do Estatuto dispõe:

«Toda e qualquer perceção de vencimentos ou de um subsídio de invalidez está sujeita à contribuição para o [RPIUE].»

39      Nos termos do artigo 38.o do anexo VIII do Estatuto, «[a]s contribuições regularmente cobradas não podem ser reclamadas».

40      O artigo 83.o, n.o 2, do Estatuto, dispõe:

«Os funcionários contribuem para o financiamento da terça parte do [RPIUE]. Esta contribuição é fixada em 10,3 % do vencimento‑base do interessado, sem ter em conta os coeficientes de correção previstos no artigo 64.o Tal contribuição é deduzida mensalmente do vencimento do interessado […]»

41      Assim, resulta destas disposições e, nomeadamente, do artigo 36.o do anexo VIII do Estatuto e do artigo 83.o, n.o 2, do Estatuto que existe uma obrigação de os funcionários e agentes da União contribuírem financeiramente para o RPIUE.

42      Em segundo lugar, o artigo 77.o do Estatuto, que figura no título V, capítulo 3, do Estatuto, dispõe:

«O funcionário que tiver completado no mínimo dez anos de serviço tem direito a uma pensão de aposentação. Todavia, o funcionário tem direito à referida pensão, independentemente do tempo de serviço, se tiver ultrapassado a idade de aposentação, se não pôde ser reintegrado no decurso de um período na disponibilidade, ou em caso de afastamento do lugar no interesse do serviço […]

O direito à pensão de aposentação adquire‑se aos 66 anos de idade.»

43      Nos termos do artigo 11.o, n.o 2, do anexo VIII do Estatuto, o funcionário ou agente que entre ao serviço da União após ter cessado as suas atividades junto de uma administração, de uma organização nacional ou internacional ou após ter exercido uma atividade assalariada ou não assalariada tem a faculdade, entre o momento da sua titularização e o momento em que obtém o direito a uma pensão na aceção do artigo 77.o do Estatuto, de mandar transferir para a União o capital, atualizado na data da transferência efetiva, correspondente aos direitos de pensão que adquiriu a título das referidas atividades.

44      Nos termos do artigo 11.o, n.o 1, do anexo VIII do Estatuto:

«O funcionário que cesse as suas funções para:

–        entrar ao serviço de uma administração, de uma organização nacional ou internacional que tenha celebrado um acordo com a União,

–        exercer uma atividade assalariada ou não assalariada ao abrigo da qual adquire direitos à pensão num regime cujos organismos de gestão tenham celebrado um acordo com a União,

tem direito a fazer transferir o equivalente atuarial, atualizado na data de transferência efetiva, dos seus direitos à pensão de antiguidade, que adquiriu junto da União, para a caixa de pensões dessa administração ou dessa organização ou, ainda, para a caixa junto da qual o funcionário adquire direitos à pensão de antiguidade ao abrigo da sua atividade assalariada ou não assalariada.»

45      Nos termos do artigo 12.o, n.o 1, do anexo VIII do Estatuto:

«O funcionário de idade inferior à idade de aposentação, cujas funções cessem por motivo diferente de morte ou invalidez e que não possa beneficiar de uma pensão de aposentação imediata ou diferida, tem direito, à data da cessação de funções:

[…]

b)      […] aos benefícios previstos no artigo 11.o, n.o 1, ou ao pagamento do respetivo equivalente atuarial a uma empresa privada de seguros ou a um fundo de pensões à sua escolha, que garanta:

i)      que o capital não será reembolsado,

ii)      o pagamento de uma renda mensal a partir da idade de 60 anos, no mínimo, e de 66 anos, no máximo,

iii)      a inclusão de disposições em matéria de reversão ou de pensão de sobrevivência;

iv)      que a transferência para outro seguro ou outro fundo só seja autorizada em condições idênticas às descritas nas subalíneas i), ii) e iii).»

46      Resulta destas disposições que o artigo 11.o, n.o 2, do anexo VIII do Estatuto prevê a faculdade de o funcionário ou agente que entra ao serviço da União após ter cessado as suas atividades junto de uma administração ou de uma organização nacional ou internacional, ou após ter exercido uma atividade assalariada ou não assalariada, mandar proceder à transferência «in», para o RPIUE, dos direitos a pensão adquiridos ao abrigo das suas atividades profissionais anteriores. Por outro lado, o artigo 11.o, n.o 1, do anexo VIII do Estatuto, lido em conjugação com o artigo 12.o, n.o 1, alínea b), do anexo VIII do Estatuto, prevê a faculdade de o funcionário ou agente que cesse as suas funções ao serviço da União mandar proceder à transferência «out» dos direitos a pensão adquiridos na União para outro fundo de pensões ou para um seguro privado que apresente certas garantias especiais.

47      Em terceiro lugar, resulta igualmente destas disposições que as contribuições para o RPIUE por parte dos funcionários e agentes da União, quer se trate das contribuições resultantes de funções ao serviço da União quer das que decorrem de uma transferência «in», têm por finalidade financiar o RPIUE, com vista a uma liquidação futura de uma pensão de aposentação, em conformidade com as disposições do Estatuto e das DGE. Estas disposições não visam, portanto, constituir um capital de que o funcionário ou o agente em questão possa dispor. Assim, contrariamente ao que os recorrentes sustentaram na audiência, os funcionários e agentes não são «titulares» das quantias correspondentes à sua contribuição financeira para o RPIUE.

48      No caso em apreço, importa sublinhar que o enriquecimento da União na sequência do pagamento pelo funcionário falecido de contribuições para o RPIUE cuja restituição é pedida, quer se trate das contribuições resultantes das suas funções ao serviço da União quer das que decorrem da transferência «in» a que mandou proceder em 2005 (v. n.o 3, supra), não é desprovido de base legal válida, na medida em que essas contribuições foram efetuadas, com vista à liquidação futura de uma pensão de aposentação, em conformidade com as disposições do Estatuto e das DGE.

49      Além disso, há que observar que, uma vez que o funcionário falecido não cumpriu dez anos de serviço antes da sua demissão nem atingiu 66 anos de idade, sendo estes dois requisitos cumulativos por força das disposições do artigo 77.o do Estatuto, recordadas no n.o 42, supra, não podia pretender beneficiar de uma pensão de aposentação.

50      Com efeito, resulta do conjunto das disposições recordadas nos n.os 38 a 45, supra, que, na sequência da demissão das suas funções ao serviço da União, o funcionário falecido apenas podia pedir a transferência «out» do equivalente atuarial dos seus direitos à pensão de aposentação adquiridos no RPIUE, parte dos quais resultava da transferência «in» realizada em 2005, quer para a caixa de pensões junto da qual adquiria direitos devido às suas funções junto do ITER, quer para um seguro privado ou um fundo de pensões à sua escolha que satisfizesse a lista de critérios definidos no artigo 12.o, n.o 1, alínea b), do anexo VIII do Estatuto.

51      Por outro lado, há que salientar que nenhuma disposição do Estatuto, dos seus anexos ou das DGE prevê a faculdade ou a obrigação de restituir, em caso de demissão do funcionário ou do agente após mais de um ano de serviço, mas antes de ter cumprido dez anos de serviço, a totalidade ou parte das contribuições correspondentes aos direitos a pensão adquiridos no RPIUE ao antigo funcionário ou agente ou, em caso de morte, aos seus sucessores, uma vez que as contribuições em causa não são equiparáveis a um capital de que o antigo funcionário ou agente possa dispor. A única obrigação que se impõe à administração, em tais circunstâncias, está enunciada no artigo 3.o, n.o 1, das DGE e consiste, no momento em que o funcionário ou agente cesse definitivamente as suas funções, em comunicar‑lhe o montante do equivalente atuarial correspondente à totalidade dos direitos à pensão que adquiriu nesse momento no RPIUE.

52      Além disso, no que respeita às contribuições correspondentes à transferência para o RPIUE do capital representativo dos direitos a pensão nacionais adquiridos pelo funcionário falecido antes da sua entrada ao serviço da União, resulta da redação clara e precisa do artigo 8.o, n.o 5, das DGE que qualquer decisão relativa a um procedimento de transferência «in», conforme descrito no n.o 43, supra, é, «pela sua natureza, irrevogável». Com efeito, só um pedido de transferência «out» permite ao funcionário ou ao agente que cessa definitivamente as suas funções ao serviço da União transferir o equivalente atuarial dos seus direitos à pensão de aposentação adquiridos no RPIUE para outro regime de pensões.

53      De resto, mesmo admitindo que se deva interpretar a argumentação dos recorrentes no sentido de que visa suscitar uma exceção de ilegalidade do artigo 8.o, n.o 5, das DGE (v. n.o 24, supra), há que salientar que esta argumentação foi suscitada pela primeira vez na fase da réplica e que não pode ser considerada uma ampliação de um fundamento já suscitado. Por conseguinte, constitui um fundamento novo que não se baseia em elementos de direito e de facto revelados durante o processo e que, por isso, deve ser julgado inadmissível, por força do artigo 84.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, que proíbe a dedução de novos fundamentos no decurso da instância.

54      No caso em apreço, não se contesta, não obstante o pedido de informações dirigido ao PMO a partir de 1 de julho de 2020 (v. n.o 6, supra), que o funcionário falecido não apresentou um pedido de transferência «out» antes do seu falecimento, com base nas disposições do artigo 11.o, n.o 1, do anexo VIII do Estatuto, apesar de esse pedido de informações ser suscetível de confirmar a hipótese de um projeto, formado por A, de mandar proceder a essa transferência «out».

55      Daqui resulta que, na falta de liquidação da pensão de aposentação do funcionário falecido e da apresentação, por este, de um pedido de transferência «out», a Comissão, que, em todo o caso, não retira de nenhuma disposição legal a faculdade de proceder à restituição aos sucessores da totalidade ou de parte do capital correspondente aos direitos a pensão adquiridos no RPIUE ou transferidos pelo funcionário falecido para o RPIUE antes do seu falecimento, não pode ser acusada de enriquecimento sem base legal válida devido à conservação, na sequência do falecimento do funcionário falecido, de todas as contribuições por este efetuadas para o RPIUE.

56      Resulta do exposto que não se pode considerar que o enriquecimento da União subsequente à conservação, na sequência do falecimento do funcionário, das suas contribuições para o RPIUE cuja restituição é pedida, quer se trate das contribuições resultantes das suas funções ao serviço da União quer das que decorrem da transferência «in» a que procedeu em 2005, é desprovido de base legal válida, pelo que o primeiro requisito de que depende a constatação da existência de um enriquecimento sem causa não está preenchido e que, por conseguinte, não há que examinar se o segundo requisito, acima referido no n.o 33, está preenchido.

57      Por conseguinte, há que julgar improcedente o fundamento único e negar provimento ao pedido de anulação da decisão impugnada.

 Quanto ao pedido de restituição das quantias pedidas

58      Com o seu segundo pedido, os recorrentes pedem ao Tribunal Geral que ordene a restituição, por um lado, dos direitos a pensão nacionais adquiridos pelo funcionário falecido antes da sua entrada ao serviço da União e transferidos para o RPIUE e, por outro, dos direitos à pensão adquiridos por este no RPIUE antes do seu falecimento.

59      No caso em apreço, tendo o Tribunal Geral concluído que o fundamento único invocado pelos recorrentes em apoio dos pedidos de anulação do presente recurso, relativo a um enriquecimento sem causa da União, era improcedente e devia ser julgado improcedente, os próprios pedidos pecuniários mencionados no n.o 58, supra, baseados na ilegalidade da decisão recorrida, só podem, consequentemente, ser julgados improcedentes.

60      Resulta de tudo o que precede que há que negar provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

61      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

62      Tendo os recorrentes sido vencidos, há que condená‑los nas despesas, em conformidade com os pedidos da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      OR e OS são condenados nas despesas.

Truchot

Kanninen

Perišin

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 6 de setembro de 2023.

Assinaturas


*      Língua do processo: francês.