Language of document : ECLI:EU:T:2003:49

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

27 de Fevereiro de 2003 (1)

«Pesca - Contribuição financeira comunitária - Suspensão da contribuição - Acção de indemnização»

No processo T-61/01,

Vendedurías de Armadores Reunidos, SA, com sede em Huelva (Espanha), representada por J.-R. García-Gallardo Gil-Fournier e D. Domínguez Pérez, advogados,

demandante,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por S. Pardo Quintillán, na qualidade de agente, assistida por J. Guerra Fernández, advogado,

demandada,

que tem por objecto um pedido de indemnização pelo prejuízo causado pela suspensão ilegal da contribuição atribuída ao projecto de sociedade mista no sector da pesca SM/ESP/18/93,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, J. Azizi e M. Jaeger, juízes,

secretário: J. Palacio González, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 7 de Novembro de 2002,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento regulamentar

1.
    Em 18 de Dezembro de 1986, o Conselho adoptou o Regulamento (CEE) n.° 4028/86 relativo a acções comunitárias para o melhoramento e a adaptação das estruturas do sector da pesca e da aquicultura (JO L 376, p. 7). Este regulamento, alterado, sucessivamente, pelo Regulamento (CEE) n.° 3944/90 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1990 (JO L 380, p. 1), pelo Regulamento (CEE) n.° 2794/92 do Conselho, de 21 de Setembro de 1992 (JO L 282, p. 3), e pelo Regulamento (CEE) n.° 3946/92 do Conselho, de 19 de Dezembro de 1992 (JO L 401, p. 1), prevê, no Título VI-A (artigos 21.°-A a 21.°-D), a possibilidade de a Comissão conceder aos projectos de sociedades mistas de pesca diferentes tipos de contribuições financeiras, de montante variável em função da tonelagem e idade dos navios em causa, desde que esses projectos respeitem as condições nele fixadas.

2.
    A «sociedade mista» está definida no artigo 21.°-A do Regulamento n.° 4028/86 do seguinte modo:

«Para efeitos do disposto no presente título, entende-se por sociedade mista uma sociedade de direito privado que abranja um ou vários armadores comunitários e um ou vários parceiros de um país terceiro com o qual a Comunidade mantenha relações, ligados por uma convenção de sociedade mista destinada a explorar e, eventualmente, valorizar os recursos haliêuticos situados nas águas sob soberania e/ou jurisdição daqueles países terceiros, numa perspectiva de abastecimento prioritário do mercado da Comunidade.»

3.
    O artigo 21.°-D, n.os 1 e 2, do Regulamento n.° 4028/86 estabelece as regras relativas à apresentação de um pedido de contribuição e ao procedimento para a sua concessão. No n.° 3 do mesmo artigo, indica-se que, relativamente aos projectos que tenham beneficiado da contribuição financeira, o beneficiário deve transmitir à Comissão e ao Estado-Membro um relatório periódico sobre a actividade da sociedade mista.

4.
    O artigo 44.° do Regulamento n.° 4028/86 dispõe:

«1. Durante todo o período de intervenção comunitária, a autoridade ou o organismo designado para o efeito pelo Estado-Membro em causa transmitirá à Comissão, a pedido desta, todos os justificativos e todos os documentos que comprovem que foram cumpridas as condições financeiras ou outras impostas para cada projecto. A Comissão pode decidir suspender, reduzir ou suprimir o apoio, de acordo com o procedimento previsto no artigo 47.°:

-    se o projecto não for executado como previsto, ou

-    se não forem cumpridas algumas das condições impostas, ou

-    [...].

A decisão será notificada ao Estado-Membro em causa bem como ao beneficiário.

A Comissão procederá à recuperação dos montantes cujo pagamento não tenha sido ou não for justificado.

2. As regras de execução do presente artigo serão adoptadas pela Comissão de acordo com o procedimento previsto no artigo 47.°»

5.
    O artigo 47.° do Regulamento n.° 4028/86 determina:

«1. No caso de ser feita referência ao procedimento referido no presente artigo, o presidente do Comité Permanente das Estruturas da Pesca [...] submeterá o assunto ao comité, quer por iniciativa própria quer a pedido do representante de um Estado-Membro.

2. O representante da Comissão apresentará um projecto de medidas a tomar. O comité formulará o seu parecer num prazo que o presidente pode fixar em função da urgência das questões. [...]

3. A Comissão adoptará as medidas que são de aplicação imediata. Todavia, se essas medidas não estiverem em conformidade com o parecer do comité, a Comissão comunica-as imediatamente ao Conselho; nesse caso, a Comissão pode diferir a sua aplicação por um mês, no máximo, a contar desta comunicação. O Conselho, deliberando por maioria qualificada, pode adoptar medidas diferentes no prazo de um mês.»

6.
    Em 20 de Abril de 1988, a Comissão adoptou o Regulamento (CEE) n.° 1116/88 relativo às regras de execução das decisões de concessão de apoio financeiro para projectos relativos a acções comunitárias para o melhoramento e a adaptação das estruturas do sector da pesca, da aquicultura e do ordenamento da faixa costeira (JO L 112, p. 1).

7.
    O artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88 tem a seguinte redacção:

«Antes de iniciar os processos de suspensão, de redução ou de supressão do apoio financeiro previstos no n.° 1 do artigo 44.° do Regulamento (CEE) n.° 4028/86, a Comissão:

-    informa o Estado-Membro em cujo território o projecto deverá ser executado, que pode tomar posição a esse respeito,

-    consulta a autoridade competente incumbida de transmitir os documentos comprovativos,

-    convida o ou os beneficiários a exprimirem, por intermédio da autoridade ou do organismo, os motivos do incumprimento das condições previstas.»

8.
    Em 21 de Junho de 1991, a Comissão adoptou o Regulamento (CEE) n.° 1956/91 que estabelece normas de execução do Regulamento (CEE) n.° 4028/86 no que diz respeito às acções de incentivo à constituição de sociedades mistas (JO L 181, p. 1).

9.
    O artigo 5.° do Regulamento n.° 1956/91 dispõe que o pagamento da contribuição financeira comunitária apenas será efectuado após a sociedade mista ter sido constituída no país terceiro em causa e os navios transferidos terem sido definitivamente cancelados do registo comunitário e registados num porto do país terceiro em que esteja sediada a sociedade mista. Acrescenta que, no caso de a contribuição comunitária consistir, total ou parcialmente, numa subvenção em capital, esta subvenção pode, sem prejuízo das referidas condições, ser objecto de um primeiro pagamento que não deverá exceder 80% do montante total da subvenção concedida. O pedido de pagamento relativo ao saldo da subvenção deve ser acompanhado do primeiro relatório periódico respeitante às actividades da sociedade mista. Este pedido não deve ser apresentado antes dos doze meses que seguem a data de execução do primeiro pagamento.

10.
    Nos termos do artigo 6.° do Regulamento n.° 1956/91, o relatório periódico referido no artigo 21.°-D, n.° 3, do Regulamento n.° 4028/86 deve ser enviado à Comissão por períodos de doze meses durante três anos consecutivos e deve incluir os dados mencionados no Anexo III do Regulamento n.° 1956/91 e ser apresentado sob a forma prevista nesse anexo.

11.
    A parte B do Anexo I do Regulamento n.° 1956/91 contém uma nota, intitulada «IMPORTANTE», assim redigida:

«Recorda-se ao(s) requerente(s) que, para que uma sociedade mista possa beneficiar de um prémio no âmbito do Regulamento (CEE) n.° 4028/86, alterado pelo Regulamento (CEE) n.° 3944/90, esta deve nomeadamente:

-    dizer respeito a navios com um comprimento entre perpendiculares superior a 12 metros, tecnicamente adequados às operações de pesca previstas, em actividade há mais de cinco anos, arvorando pavilhão comunitário e registados num porto da Comunidade, mas que serão transferidos definitivamente para o país terceiro a que diz respeito a sociedade mista [...]

-    ter como objectivo a exploração e, eventualmente, a valorização dos recursos haliêuticos situados nas águas sob soberania e/ou jurisdição do país terceiro em causa,

-    ter como objectivo o abastecimento prioritário do mercado da Comunidade,

-    basear-se numa convenção de sociedade mista.»

12.
    Com a adopção do Regulamento (CEE) n.° 2080/93 do Conselho, de 20 de Julho de 1993, que estabelece as regras de execução do Regulamento (CEE) n.° 2052/88 no que respeita ao instrumento financeiro de orientação das pescas (JO L 193, p. 1), e do Regulamento (CE) n.° 3699/93 do Conselho, de 21 de Dezembro de 1993, que define os critérios e condições das intervenções comunitárias com finalidade estrutural no sector das pescas, da aquicultura e da transformação e comercialização dos seus produtos (JO L 346, p. 1), a gestão e o financiamento das sociedades mistas foram integrados no instrumento financeiro de orientação das pescas (IFOP).

13.
    Tal como é resumido no Relatório Especial n.° 18/98 do Tribunal de Contas das Comunidades Europeias sobre as acções comunitárias de incentivo à constituição de sociedades mistas no sector da pesca, acompanhado das respostas da Comissão (JO C 393, p. 1, n.° 16), as consequências mais importantes da integração da política de apoio às sociedades mistas no IFOP são as seguintes:

«[O]s Estados-Membros são agora responsáveis pela selecção dos projectos a financiar dentro dos limites das suas dotações globais, fixadas nos respectivos programas operacionais. Os Estados-Membros são igualmente responsáveis pela gestão e controlo dos projectos, pelos pagamentos aos beneficiários e pelo acompanhamento dos projectos aprovados. Uma vez os programas operacionais aprovados, a Comissão limita-se a participar nos comités de acompanhamento e a pagar adiantamentos globais aos Estados-Membros, com base nos planos financeiros aprovados e nas declarações dos Estados-Membros.»

14.
    O Regulamento n.° 2080/93 revogou, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1994, os Regulamentos n.° 4028/86 e n.° 1116/88. Nos termos do artigo 9.°, n.° 1, segundo parágrafo, primeiro travessão, do Regulamento n.° 2080/93, o Regulamento n.° 4028/86 e as respectivas disposições de aplicação mantêm-se, contudo, aplicáveis aos pedidos de contribuição apresentados antes de 1 de Janeiro de 1994.

15.
    Em 22 de Dezembro de 1994, a Comissão, com base no Regulamento n.° 3699/93, adoptou uma decisão relativa à aprovação do programa comunitário para as intervenções comunitárias no sector da pesca e da aquicultura assim como da transformação e comercialização dos seus produtos em Espanha (objectivo n.° 5-A não incluído no objectivo n.° 1 - período de 1994-1999) (JO L 364, p. 54). Decorre do artigo 5.° desta decisão que as acções aprovadas em 1994 ao abrigo do Regulamento n.° 4028/86 são financiadas pelo IFOP.

Factos na origem do litígio

16.
    Em 13 de Agosto de 1993, a sociedade Vendedurías de Armadores Reunidos, SA (a seguir «demandante»), apresentou à Comissão, por intermédio das autoridades espanholas, um pedido de contribuição financeira com base no Regulamento n.° 4028/86, no âmbito de um projecto de constituição de uma sociedade de pesca hispano-mauritana. Este projecto previa a transferência, com vista a actividades de pesca, dos navios Ydalsan e Yolanda de la Cinta para a sociedade mista Leminepeche, constituída pela demandante e por um sócio mauritano, Mohamed Lemine Ould Cheigue.

17.
    Por decisão de 7 de Setembro de 1994 (a seguir «decisão de concessão»), a Comissão concedeu ao projecto referido no número anterior (projecto SM/ESP/18/93, a seguir «projecto») uma contribuição comunitária num montante máximo de 1 698 440 ecus. Esta decisão previa que o Reino de Espanha completaria a contribuição comunitária com uma ajuda de 339 688 ecus.

18.
    Em Outubro de 1996, a demandante recebeu 80% da contribuição concedida ao projecto.

19.
    Em 8 de Janeiro de 1997, foi realizada uma assembleia geral extraordinária da Leminepeche no decurso da qual, atendendo às dificuldades comerciais e financeiras sentidas pela sociedade, ficou decidida a transferência dos navios Leminepeche 6 e Leminepeche 7 - antigos Ydalsan e Yolanda de la Cinta - para a República dos Camarões e a sua cedência à sociedade Peix Camerún SA.

20.
    Numa nota de 22 de Setembro de 1997, dirigida às autoridades espanholas, a demandante expôs as alterações introduzidas no projecto e solicitou às referidas autoridades que as comunicassem à Comissão para que esta autorizasse a alteração do destino dos dois navios em causa.

21.
    Em 16 de Fevereiro de 1998, as autoridades espanholas dirigiram à Comissão a nota referida no número anterior.

22.
    Em 11 de Setembro de 1998, a demandante dirigiu às autoridades espanholas um pedido de pagamento do saldo da contribuição. A esse pedido anexou um relatório de actividades referente ao período entre 4 de Agosto de 1997 e 24 de Agosto de 1998.

23.
    Em 2 de Dezembro de 1998, a Comissão procedeu a um controlo do projecto na sede da demandante em Huelva. Este controlo revelou que os navios da sociedade mista possuíam licenças de pesca emitidas pelas autoridades da Costa do Marfim para o período de 20 de Maio de 1998 a 19 de Maio de 1999.

24.
    Em 13 de Janeiro de 1999, a demandante dirigiu à Comissão, por intermédio das autoridades espanholas, uma série de informações complementares a respeito, nomeadamente, da sociedade Peix Camerún SA.

Procedimento pré-contencioso

25.
    Numa carta de 4 de Junho de 1999 dirigida à demandante, A. Cavaco, director-geral da Direcção-Geral «Pesca» da Comissão (DG XIV), comunicou-lhe que, segundo as informações que possuía, o saldo da contribuição referente ao projecto financiado pelo IFOP tinha sido pago em 15 de Outubro de 1998 na sequência da apresentação do primeiro relatório de actividade, relativo ao período entre 4 de Agosto de 1997 e 24 de Agosto de 1998. Após ter recordado os termos da decisão de concessão e o conteúdo da nota da demandante de 22 de Setembro de 1997, indicou que o controlo no local efectuado em 2 de Dezembro de 1998 revelara que a transferência dos navios em causa pelo projecto da Mauritânia para os Camarões era justificado, mas que também se tinha verificado, nesse controlo, que os referidos navios exerciam as suas actividades nas águas da Costa do Marfim com base numa licença de pesca emitida para o período entre 20 de Maio de 1998 e 19 de Maio de 1999, o que, para a Comissão, constituía um incumprimento dos Regulamentos n.° 4028/86 e n.° 1956/91, os quais prevêem, com efeito, que o objecto da sociedade mista deve ser a exploração dos recursos haliêuticos do país terceiro mencionado na decisão de concessão da contribuição. Comunicou que, nos termos do artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4028/86, a Comissão tinha decidido, por conseguinte, reduzir a contribuição inicialmente concedida ao projecto, tendo em conta o período de actividade efectiva dos navios acima referidos nas águas da Mauritânia e dos Camarões. Para este efeito, solicitou à demandante que lhe comunicasse as informações relativas a esse período, advertindo-a de que, se não as recebesse no prazo de trinta dias, se veria obrigado a ordenar aos seus serviços que continuassem o processo de redução no pressuposto de que os navios nunca tinham pescado na Mauritânia e nos Camarões.

26.
    No mesmo dia, foi enviada uma cópia da carta de 4 de Junho de 1999 a Almécija Cantón, director-geral das estruturas e dos mercados de pesca no secretariado-geral da pesca marítima do Ministério da Agricultura, da Pesca e da Alimentação espanhol.

27.
    Numa carta com data de 3 de Junho de 1999 e dirigida por telecópia à Comissão no dia 7 do mesmo mês, as autoridades espanholas alegaram que a documentação comunicada à Comissão na sequência do controlo de Dezembro de 1998 configurava prova bastante de que o projecto tinha sido executado como previsto. Sublinharam que era urgente que o saldo da contribuição fosse pago e pediram à Comissão que lhes indicasse, sendo esse o caso, as razões que impediam esse pagamento para poderem dar essa informação aos interessados e esclarecer as dúvidas que eventualmente subsistissem.

28.
    Por telecópia de 26 de Agosto de 1999, os advogados da demandante solicitaram à Comissão a prorrogação, até 10 de Setembro de 1999, do prazo de apresentação de observações sobre a carta de 4 de Junho de 1999.

29.
    Por carta dos seus advogados de 5 de Outubro de 1999, a demandante dirigiu à Comissão os seus comentários sobre a carta de 4 de Junho de 1999. No essencial, alegava que as licenças de pesca emitidas pelas autoridades da Costa do Marfim nunca tinham sido utilizadas. Por outro lado, solicitou a realização de uma reunião com os serviços da Comissão a fim de poder fornecer a esta última os esclarecimentos susceptíveis de permitir a resolução do caso. Esta reunião teve lugar em 22 de Outubro de 1999.

30.
    Em 21 de Dezembro de 1999, os advogados da demandante dirigiram à Comissão cópias das cadernetas de pesca referentes ao período entre Maio de 1998 e Abril de 1999, das quais decorria que os navios da sociedade mista tinham, no decurso desse período, exercido as suas actividades na zona de pesca dos Camarões e não da Costa do Marfim.

31.
    Por decisão de 15 de Junho de 2000, a Comissão alterou a decisão de concessão, substituindo, no título do projecto, os termos «sociedade mista hispano-mauritana» pelos termos «sociedade mista hispano-camaronesa» e, no que diz respeito ao sócio do país terceiro, Mohamed Lemine Ould Cheigue pela sociedade Peix Camerún SA.

32.
    Por carta de 17 de Julho de 2000, D. Bruyninckx, chefe de unidade na DG Pesca, indicou a Angel Barrios, do secretariado-geral espanhol da pesca marítima, que, à luz das suas verificações e da análise da documentação fornecida pela demandante, os seus serviços consideravam que o pagamento do saldo da contribuição podia ser efectuado. Comunicou-lhe igualmente a adopção pela Comissão da decisão de 15 de Junho de 2000.

33.
    Uma cópia da carta referida no número anterior foi enviada à demandante e aos seus advogados.

34.
    Em 25 de Setembro de 2000, a direcção-geral do Tesouro espanhol pagou à demandante o saldo da contribuição.

Tramitação processual

35.
    Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 15 de Março de 2001, a demandante propôs a presente acção.

36.
    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Terceira Secção) decidiu dar início à fase oral do processo. No âmbito das medidas de organização do processo, convidou as partes a apresentar determinados documentos e a responder a certas questões. As partes satisfizeram esses pedidos dentro dos prazos fixados.

37.
    Na audiência de 7 de Novembro de 2002, as partes apresentaram as suas alegações e responderam às questões que o Tribunal de Primeira Instância lhes submeteu oralmente.

Pedidos das partes

38.
    A demandante conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    declarar a acção admissível;

-    condenar a Comissão, ao abrigo da sua competência de plena jurisdição e segundo a forma que é proposta na petição, a pagar à demandante uma indemnização pelo prejuízo sofrido em consequência do atraso no pagamento de uma parte da contribuição;

-    condenar a Comissão nas despesas.

39.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    declarar a acção manifestamente improcedente;

-    condenar a demandante nas despesas.

Quanto ao mérito

40.
    Cabe recordar que, segundo jurisprudência constante, a verificação da responsabilidade extracontratual da Comunidade pressupõe que o demandante prove que estão reunidas uma série de condições cumulativas que têm a ver com a ilegalidade do comportamento reprovado à instituição em causa, a realidade do prejuízo sofrido e a existência de um nexo de causalidade entre o comportamento contestado e o prejuízo alegado (v., nomeadamente, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 1982, Oleifici Mediterranei/CEE, 26/81, Recueil, p. 3057, n.° 16; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Julho de 1996, International Procurement Services/Comissão, T-175/94, Colect., p. II-729, n.° 44, e de 29 de Janeiro de 1998, Dubois et Fils/Conselho e Comissão, T-113/96, Colect., p. II-125, n.° 54).

41.
    A demandante alega que as várias condições referidas estão reunidas no presente caso.

42.
    O Tribunal de Primeira Instância considera que importa apreciar, em primeiro lugar, a tese da demandante relativa à existência de um comportamento ilegal da Comissão.

43.
    Após recordar as disposições dos artigos 44.° e 47.° do Regulamento n.° 4028/86 e do artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88, e sublinhar a importância de que, por força da jurisprudência (acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de Outubro de 1999, Le Canne/Comissão, C-10/98 P, Colect., p. I-6831, n.° 25), se reveste o cumprimento dessas disposições, a demandante sustenta que, no caso em apreço, a Comissão as violou duplamente.

44.
    Em primeiro lugar, a demandante afirma ter apresentado o seu pedido de pagamento do saldo da contribuição em 11 de Setembro de 1998 e que este pedido foi completado pelo envio das informações complementares solicitadas pela Comissão quando do seu controlo no local em Dezembro de 1998. No seguimento disto, a Comissão apenas se manifestou em 4 de Junho de 1999, data na qual dirigiu à demandante uma carta em que mencionava a sua intenção de continuar o processo de redução em curso. Todavia, não informou previamente as autoridades espanholas e a demandante da sua intenção de iniciar um processo de suspensão ou de redução da contribuição, o que constitui uma violação do artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88.

45.
    Em segundo lugar, a demandante alega que deve entender-se que as cartas em que a Comissão lhe indicou a prossecução do processo de redução da contribuição contêm uma decisão implícita de suspensão desta, na acepção do n.° 1 do artigo 44.° do Regulamento n.° 4028/86. Ora, a decisão de suspender a contribuição devia ter sido adoptada nos termos dos artigos 44.° e 47.° do Regulamento n.° 4028/86 e do artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88 (acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Maio de 2000, Ca'Pasta/Comissão, C-359/98 P, Colect., p. I-3977, n.os 26 a 35).

46.
    A demandante não nega que a Comissão deve suspender e reduzir a contribuição em caso de dúvida quanto ao cumprimento dos objectivos definidos para o projecto. Também não contesta que as verificações impostas pelo facto de se terem levantado suspeitas de irregularidades eram susceptíveis de provocar um atraso no pagamento do saldo da contribuição. Sustenta, todavia, que, se na sequência das verificações que efectuou entre Setembro e Dezembro de 1998, a Comissão entendia que devia dispor de tempo para analisar detalhadamente as informações complementares que lhe tinham sido fornecidas em Dezembro de 1998 e Janeiro de 1999 a respeito da actividade dos navios da sociedade mista, deveria ter adoptado uma decisão de suspensão da contribuição em conformidade com as regras procedimentais e formais previstas para esse fim, no interesse financeiro tanto da Comunidade como da empresa beneficiária da contribuição, em vez de recorrer directamente a um processo de redução.

47.
    A demandante conclui que a Comissão suspendeu ilegalmente a contribuição entre Dezembro de 1998, altura em que devia ter sido adoptada uma decisão de suspensão da contribuição, e 25 de Setembro de 2000, momento em que lhe foi pago o saldo dessa contribuição.

48.
    O Tribunal deve sublinhar, a título preliminar, que as alegações produzidas pela demandante na fase escrita do processo consistem em duas arguições bem precisas, ou seja, por um lado, o facto de a Comissão ter dado início ao processo de redução da contribuição em violação do artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88 e, por outro lado, o facto de a Comissão ter decidido suspender o saldo da contribuição sem respeitar o procedimento previsto nos artigos 44.° e 47.° do Regulamento n.° 4028/86 e no artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88.

49.
    Na audiência, a demandante criticou a lentidão do procedimento administrativo instruído pela Comissão e a má gestão global do processo por parte desta. Imputou igualmente à Comissão a violação, no caso em apreço, das regras de conduta a que esta se submetia em matéria de prazos de pagamento. Todavia, essas alegações, que constituem um fundamento novo relativamente aos argumentos enunciados na petição, devem ser julgadas inadmissíveis, em conformidade com o artigo 48.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

50.
    Feitas estas precisões, importa apreciar o mérito das duas arguições formuladas pela demandante nos seus articulados em defesa da sua alegação relativa à existência, no caso em apreço, de um comportamento ilegal da Comissão.

51.
    A primeira arguição diz respeito ao facto de, por carta de 4 de Junho de 1999, a Comissão ter advertido a demandante e as autoridades espanholas de que estava em curso um processo de redução, quando estas não tinham sido previamente informadas da intenção da Comissão de iniciar esse processo ou um processo de suspensão da contribuição. Ao proceder dessa forma, a Comissão violou o artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88.

52.
    A este respeito, importa referir que, nos termos do artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88, antes de iniciar os processos de redução «previstos no n.° 1 do artigo 44.° do Regulamento [...] n.° 4028/86», a Comissão deve disso «informa[r] o Estado-Membro em cujo território o projecto deverá ser executado, que pode tomar posição a esse respeito», «consulta[r] a autoridade competente incumbida de transmitir os documentos comprovativos» e «convida[r] o ou os beneficiários a exprimirem, por intermédio da autoridade ou do organismo, os motivos do incumprimento das condições previstas» (v., supra, n.° 7). O artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4028/86 remete para «o procedimento previsto no artigo 47.°» (v., supra, n.° 4). Nos termos do artigo 47.°, n.° 1, do mesmo regulamento, «[n]o caso de ser feita referência ao procedimento referido no presente artigo, o presidente do Comité Permanente das Estruturas da Pesca submeterá o assunto ao comité, quer por iniciativa própria quer a pedido do representante de um Estado-Membro» (v., supra, n.° 5). O n.° 2 desse mesmo artigo estabelece que «[o] representante da Comissão apresentará um projecto de medidas a tomar» sobre o qual «[o] comité formulará o seu parecer num prazo que o presidente pode fixar em função da urgência das questões» (v., supra, n.° 5).

53.
    Infere-se das indicações reproduzidas no número anterior que o procedimento previsto no artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88 corresponde ao que se inicia com a apresentação, para efeitos da obtenção de um parecer, ao Comité Permanente das Estruturas da Pesca, pelo seu presidente, do projecto das medidas a tomar pela Comissão. O cumprimento deste artigo implica, portanto, que a Comissão cumpra as obrigações aí prescritas antes de, eventualmente, submeter a questão ao referido comité.

54.
    Dos articulados da demandante resulta que as suas críticas têm por objecto o facto de a Comissão, no caso vertente, contrariamente ao exigido no primeiro e terceiro travessões do artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88, não ter avisado o Estado-Membro em causa, no caso concreto, o Reino de Espanha, da sua intenção de iniciar o processo de redução, e não ter convidado a demandante, antes do início do referido processo, a explicar, por intermédio das autoridades espanholas, as razões do alegado incumprimento das condições previstas na decisão de concessão. A demandante não contesta, em contrapartida, que a Comissão cumpriu a obrigação prevista no segundo travessão do artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88, tendo consultado, em tempo útil, a autoridade competente incumbida de transmitir os documentos justificativos.

55.
    Importa, por conseguinte, apreciar a justeza das críticas da demandante baseadas na alegada violação pela Comissão das obrigações previstas nos primeiro e terceiro travessões do artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88.

56.
    A este propósito, o Tribunal observa, perante a leitura do ofício de 4 de Junho de 1999 (v., supra, n.° 25), que a Comissão, em virtude de elementos verificados quando da inspecção no local de 2 de Dezembro de 1998, que levavam a crer que os navios da sociedade mista pescavam em águas da Costa do Marfim em violação da regulamentação aplicável, informou a demandante de que tinha decidido reduzir, nos termos do artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4028/86, a contribuição inicialmente concedida ao projecto. A Comissão solicitou à demandante a apresentação, no prazo de 30 dias, para efeitos de cálculo da redução prevista, das indicações relativas ao período de actividade efectiva dos navios acima referidos nas zonas de pesca da Mauritânia e dos Camarões, sob pena de ser obrigada a continuar o processo de redução. Uma cópia desta carta foi enviada a Almécija Cantón, alto funcionário do Ministério da Agricultura, da Pesca e da Alimentação espanhol, responsável pelas estruturas e mercados de pesca, cujo papel, no âmbito do processo em causa, de autoridade do «Estado-Membro em cujo território o projecto deverá ser executado», na acepção do artigo 7.°, primeiro travessão, do Regulamento n.° 1116/88, não é contestado pela demandante.

57.
    Após ter solicitado um prazo suplementar, a demandante, numa carta dos seus advogados de 5 de Outubro de 1999, enviou à Comissão as suas observações sobre a carta de 4 de Junho de 1999, em que referia, no essencial, que as licenças de pesca emitidas pela Costa do Marfim nunca tinham sido utilizadas (v., supra, n.° 29). Por outro lado, a pedido da demandante, teve lugar uma reunião entre ela e os serviços da Comissão (v., supra, n.° 29). Na sequência dessa reunião, a demandante, por intermédio dos seus advogados, enviou à Comissão, em 21 de Dezembro de 1999, documentos relativos às actividades dos navios da sociedade mista, que revelavam que estes nunca tinham pescado nas águas da Costa do Marfim (v., supra, n.° 30).

58.
    Face aos elementos mencionados nos dois números anteriores, importa referir que, embora efectivamente, tal como a demandante assinala nos seus articulados, a Comissão se refira, na carta de 4 de Junho de 1999, ao «processo de redução em curso», a demandante não contesta, no entanto, que não foi apresentado ao Comité Permanente das Estruturas da Pesca um projecto de medidas da Comissão quando do envio da carta de 4 de Junho de 1999 a Almécija Cantón e à demandante, da comunicação à Comissão das observações da demandante sobre essa carta, da reunião de 22 de Outubro de 1999 entre a demandante e os serviços da Comissão e do envio à Comissão, em 21 de Dezembro de 1999, de informações complementares sobre as actividades dos navios da sociedade mista.

59.
    Há que reconhecer, portanto, que as autoridades espanholas foram avisadas em tempo útil da intenção da Comissão de reduzir a contribuição ao abrigo do artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento n.° 4028/86. Foi igualmente em tempo útil que a demandante teve oportunidade de prestar esclarecimentos sobre os elementos, mencionados na carta de 4 de Junho de 1999, que levavam a Comissão a pensar que as actividades dos navios da sociedade mista não cumpriram a regulamentação aplicável. Isto é, de resto, confirmado pelo facto de o Comité Permanente das Estruturas da Pesca não ter sido chamado a decidir no processo em causa e de a contribuição não ter sido reduzida, tendo a Comissão considerado, efectivamente, tal como revela a sua carta de 17 de Julho de 2000 dirigida às autoridades espanholas, à demandante e aos seus advogados, que, atendendo, nomeadamente, à «documentação transmitida pelo beneficiário», havia que pagar o saldo da contribuição.

60.
    Face à análise precedente (n.os 52 a 59), há que julgar improcedente a arguição da demandante segundo a qual a Comissão violou o artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88 por não ter avisado as autoridades espanholas e a demandante, previamente ao envio da carta de 4 de Junho de 1999, da sua intenção de iniciar um processo de redução da contribuição.

61.
    A questão de saber se a Comissão violou o artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88 pelo facto de o envio da carta de 4 de Junho de 1999 não ter sido precedido da comunicação do início de um processo de suspensão da contribuição deve ser apreciada conjuntamente com a argumentação desenvolvida pela demandante no âmbito da segunda arguição, invocada em defesa da sua tese relativa à existência de um comportamento ilegal da Comissão, segundo a qual esta última, no caso em apreço, suspendeu a contribuição sem respeitar o procedimento indicado.

62.
    No âmbito da segunda arguição, a demandante alega que nas várias cartas que comunicavam início do processo de redução da contribuição a Comissão adoptou uma decisão implícita de suspensão da contribuição. Ora, uma decisão de suspensão de uma contribuição inicialmente concedida apenas pode ser adoptada em conformidade com os artigos 44.° e 47.° do Regulamento n.° 4028/86 e o artigo 7.° do Regulamento n.° 1116/88, o que a Comissão não cumpriu, no presente processo.

63.
    A este respeito, importa sublinhar que, embora a contribuição tenha sido concedida com base no Regulamento n.° 4028/86, o financiamento do projecto, aprovado em 1994, proveio, em conformidade com o artigo 5.° da Decisão da Comissão de 22 de Dezembro de 1994 (v., supra, n.° 15), do IFOP, tal como é confirmado pela indicação, constante da carta da Comissão de 4 de Junho de 1999 (v., supra, n.° 25), de que o projecto era «financiado pelo IFOP».

64.
    Tal como foi referido no n.° 13, supra, a integração da gestão e do financiamento do projecto no IFOP significa que o pagamento da contribuição era da responsabilidade das autoridades espanholas no âmbito da dotação global fixada para o Estado-Membro em causa ao abrigo do programa comunitário de intervenção estrutural no sector das pescas. O documento, junto ao processo pelo demandante, que atesta o pagamento do saldo da contribuição em 25 de Setembro de 2000, menciona, além disso, que foi a direcção-geral do Tesouro espanhol que emitiu a ordem de pagamento.

65.
    Os elementos referidos nos dois números anteriores distinguem, portanto, o presente processo do processo em que foi proferido o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 17 de Outubro de 2002, Astipesca/Comissão (T-180/00, ainda não publicado na Colectânea), ao qual se referiu a demandante na audiência, e no qual a contribuição, que foi aprovada em 1993 e não dizia respeito ao IFOP, era gerida directamente pela Comissão, no sentido de que esta última era responsável pelo pagamento à empresa beneficiária (v., neste sentido, o n.° 9 do relatório do Tribunal de Contas, referido, supra, no n.° 13).

66.
    No contexto do presente processo, tal como definido nos n.os 63 e 64, supra, para que a decisão de suspensão da contribuição pela Comissão seja declarada ilegal, é necessário, em primeiro lugar, que a demandante prove que a Comissão decidiu suspender a contribuição do IFOP correspondente ao projecto ou intimou as autoridades espanholas a suspender o pagamento do saldo da contribuição concedida a esse projecto. Sendo esse o caso, competirá, em seguida, verificar se essa suspensão ou intimação para suspender ocorreu em violação das regras de procedimento previstas para esse efeito.

67.
    Nos seus articulados, a demandante sustenta que «deve considerar-se que as cartas em que a Comissão a informou da prossecução do processo de redução da contribuição contêm uma decisão implícita de suspensão da contribuição financeira comunitária.»

68.
    O Tribunal verificou, contudo, que entre os elementos juntos aos articulados da demandante, apenas a carta de 4 de Junho de 1999 faz alusão ao processo de redução. Ora, essa mesma carta também contém as indicações seguintes:

«Segundo as informações que possuímos, o projecto, que é financiado pelo IFOP, foi objecto de um pagamento do respectivo saldo em 15 de Outubro de 1998, na sequência da apresentação do primeiro relatório de actividades correspondente ao período de 4.8.97 a 24.8.98».

69.
    Tal como a Comissão sublinha na sua contestação, decorre do extracto da carta de 4 de Junho de 1999 reproduzido no número anterior que a Comissão pensava nesse momento que o saldo da contribuição tinha sido pago. Por conseguinte, este excerto impede que se considere que a Comissão tinha anteriormente decidido suspender a referida contribuição. Impede também que a carta de 4 de Junho de 1999 possa ser interpretada no sentido de que contém uma decisão implícita de suspensão desta contribuição. Contrariamente à tese defendida pela demandante na audiência, a carta acima referida distingue-se nesse aspecto da carta, com a mesma data, enviada pela Comissão à empresa recorrente no processo em que foi proferido o acórdão Astipesca/Comissão, já referido no n.° 65, supra, e que o Tribunal de Primeira Instância considerou que continha uma decisão de suspensão da contribuição pelo facto de dela resultar que, tendo comunicado a sua intenção de reduzir a contribuição inicial, a Comissão, directamente responsável pelo pagamento da contribuição nesse caso, tinha decidido congelar o pagamento do saldo da contribuição na expectativa da aceitação pela demandante da proposta de redução da contribuição feita nessa carta.

70.
    A título de medida de organização do processo, o Tribunal solicitou à Comissão a apresentação de uma cópia de toda a correspondência trocada entre a demandante, as autoridades espanholas e a própria Comissão posteriormente a 4 de Junho de 1999, a fim de verificar a razão da tese da demandante a respeito da existência, no processo administrativo, das cartas a que se referia a passagem dos seus articulados reproduzida, supra, no n.° 67.

71.
    Questionada sobre este aspecto na audiência, a demandante admitiu que não existe entre os elementos apresentados pela Comissão no contexto dessa medida de organização do processo qualquer carta desta que contenha uma decisão de suspensão da contribuição do IFOP relativamente ao projecto ou uma intimação nesse sentido dirigida às autoridades espanholas.

72.
    A demandante alegou, contudo, que a carta de 17 de Julho de 2000 dirigida pela Comissão às autoridades espanholas, na qual esta indicava que, à luz das suas verificações e da análise da documentação fornecida pela demandante, considerava que o pagamento do saldo da contribuição podia ser efectuado, prova a existência de uma decisão anterior de suspensão da contribuição por parte da Comissão.

73.
    Importa referir, a este respeito, que, de acordo com os elementos apresentados pela Comissão no contexto da medida de organização do processo referida no n.° 70, supra, a carta de 17 de Julho de 2000 constitui a resposta da Comissão a uma carta das autoridades espanholas de 10 de Julho de 2000 na qual estas, atendendo a que, por decisão de 15 de Junho de 2000 (v., n.° 31, supra), a Comissão tinha alterado a decisão de concessão sem reduzir a contribuição, solicitaram à Comissão que confirmasse que este aspecto significava que a contribuição podia ser paga na sua totalidade, a fim de procederem, sendo esse o caso, ao pagamento do saldo da contribuição.

74.
    Nestas circunstâncias, e tendo em conta o contexto definido nos n.os 63 e 64, supra, a indicação reproduzida no n.° 72, supra, explica-se pelo facto de, tendo sido informadas pela Comissão, na carta de 4 de Junho de 1999, de que esta previa reduzir a contribuição, as autoridades espanholas, às quais competia o pagamento da contribuição, consideraram preferível suspender o pagamento do respectivo saldo na expectativa do resultado das verificações levadas a cabo pela Comissão. Na sequência do pedido de esclarecimento formulado pelas autoridades espanholas na carta de 10 de Julho de 2000, a Comissão entendeu informá-las que, uma vez que as verificações levadas a cabo pelos seus serviços tinham permitido concluir que o projecto fora correctamente executado, nada se opunha ao pagamento do saldo da contribuição.

75.
    Não pode, por conseguinte, considerar-se que a indicação, mencionada no n.° 72, supra, que figura na carta da Comissão de 17 de Julho de 2000, prova que a Comissão tinha anteriormente decidido suspender a contribuição relativa ao projecto ou intimado as autoridades espanholas para assim procederem.

76.
    Na audiência, a demandante referiu-se, de novo, à carta de 3 de Junho de 1999 dirigida pelas autoridades espanholas à Comissão (v., supra, n.° 27).

77.
    Todavia, na medida em que deve entender-se que a referência feita pela demandante à carta mencionada no número anterior tem como objectivo provar a existência de uma obrigação das autoridades espanholas de obterem a autorização prévia da Comissão, antes do pagamento das parcelas da contribuição concedida ao projecto, e deduzir da falta de reacção da Comissão a esta carta uma decisão implícita de suspensão da contribuição, importa referir que não decorre de qualquer disposição legal nem de qualquer elemento do processo que, no âmbito do IFOP, o pagamento das parcelas de uma contribuição pelas autoridades nacionais interessadas esteja subordinado à autorização das autoridades comunitárias. Nestas condições, a carta acima referida deve ser entendida como uma diligência das autoridades espanholas no sentido de obter, para efeitos da decisão que lhes compete a respeito do pagamento do saldo da contribuição, um esclarecimento da posição da Comissão sobre a regularidade da execução do projecto à luz da documentação transmitida na sequência do controlo no local de Dezembro de 1998, e não como um pedido de autorização prévia de tal pagamento. A falta de resposta expressa da Comissão a esta carta não pode, por conseguinte, ser vista como constituindo uma decisão implícita de suspensão da contribuição ou uma intimação implícita nesse sentido.

78.
    Face à análise constante dos nos n.os 63 a 77, supra, cabe concluir que a demandante não provou que a Comissão tenha suspendido a contribuição no caso em apreço. A alegação da demandante relativa à adopção pela Comissão de uma decisão ilegal de suspensão da contribuição deve, em consequência, ser considerada não provada à luz dos factos alegados. Deve, por conseguinte, ser julgada improcedente.

79.
    Resulta do que precede que a demandante não provou a existência de um comportamento ilegal da Comissão no caso em apreço.

80.
    Tendo em conta o carácter cumulativo das condições de verificação da responsabilidade extracontratual da Comunidade, a acção deve ser julgada improcedente sem que seja necessário apreciar os argumentos da demandante relativos ao prejuízo e ao nexo de causalidade.

Quanto às despesas

81.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a demandante sido vencida, há que condená-la nas despesas, em conformidade com o pedido da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

decide:

1.
    A acção é julgada improcedente.

2.
    A demandante é condenada nas despesas.

Lenaerts
Azizi
Jaeger

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de Fevereiro de 2003.

O secretário

O presidente

H. Jung

K. Lenaerts


1: Língua do processo: espanhol.