Language of document : ECLI:EU:T:2003:53

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

5 de Março de 2003 (1)

«Marca comunitária - Marca tridimensional - Forma de um produto para máquina de lavar louça - Pastilha oval - Motivo absoluto de recusa de registo - Artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T-194/01,

Unilever N V , com sede em Roterdão (Países Baixos), representada por V. von Bomhard e A. Renck, advogados,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por F. López de Rego e J. F. Crespo Carrillo, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objecto um recurso interposto da decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 22 de Maio de 2001 (processo R 1086/2000-1),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

composto por: R. M. Moura Ramos, presidente, J. Pirrung e A. W. H. Meij, juízes,

secretário: D. Christensen, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 13 de Novembro de 2002,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes do litígio

1.
    Em 9 de Dezembro de 1999, a recorrente apresentou um pedido de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (a seguir «Instituto»), nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), na versão alterada.

2.
    A marca tridimensional cujo registo foi pedido é a seguinte:

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Não foi reivindicada nenhuma cor.

3.
    Os produtos para os quais foi pedido o registo da marca enquadram-se na classe 3 do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e Serviços, para efeitos de registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, na versão revista e alterada, e correspondem à seguinte descrição: «Detergentes; preparações e substâncias para a lavagem de roupa; preparações amaciadoras dos tecidos; preparações para branquear; preparações para limpar, polir, desengordurar e raspar; produtos para lavagem de loiça; sabões; perfumaria; óleos essenciais; cosméticos; cremes cosméticos; loções para os cabelos; desodorizantes para uso pessoal; pedras de alume; pedra para polir; pedra-pomes; pedras para a barba (anti-sépticas); tripoli para o polimento; sais de banho; sais para branquear; antitranspirantes; dentífricos; produtos de maquilhagem; produtos para desmaquilhagem; produtos de toilette.»

4.
    Por decisão de 7 de Setembro de 2000, o examinador recusou o pedido de registo ao abrigo do artigo 38.° do Regulamento n.° 40/94, em virtude de a marca pedida ser desprovida de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

5.
    Em 7 de Novembro de 2000, a recorrente interpôs recurso para o Instituto, ao abrigo do artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94, contra a decisão do examinador.

6.
    Por decisão de 22 de Maio de 2001 (a seguir «decisão recorrida»), notificada à recorrente em 5 de Junho de 2001, a Câmara de Recurso anulou a decisão do examinador, na medida em que recusou o pedido de registo para os seguintes produtos: «perfumaria, óleos essenciais, cosméticos, loções para os cabelos, desodorizantes, antitranspirantes e dentífricos». Foi negado provimento ao recurso quanto ao restante.

7.
    No essencial, a Câmara de Recurso considerou que a marca cujo registo foi pedido era desprovida de carácter distintivo em relação aos detergentes sólidos e produtos conexos. Observou que a forma oval irregular da marca em causa não é significativamente diferente da forma discal tradicionalmente apresentada pelo sabão ou detergente normal, embora não seja exactamente idêntica. O mosqueado presente na pastilha também é comum. As pastilhas, como as da recorrente, constituem um conceito fundamental de acondicionamento de detergentes e um vasto leque de produtos similares. A pastilha em questão não apresenta características arbitrárias que a possam distinguir de outras formas similares presentes no mercado.

Processo e pedidos das partes

8.
    A recorrente interpôs o presente recurso por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 14 de Agosto de 2001. Em 13 de Novembro de 2001, o Instituto apresentou a contestação. A recorrente não pediu autorização para apresentar réplica ao abrigo do artigo 135.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

9.
    Como medida de organização do processo, o Tribunal convidou as partes a responderem a uma questão. O Tribunal solicitou ainda à recorrente a apresentação de alguns documentos. Na sequência destes pedidos, a recorrente apresentou uma resposta acompanhada de anexos. O Tribunal tomou nota da resposta da recorrente e dos documentos apresentados em conformidade com o seu pedido. Nestes termos, essa resposta, explanada nos n.os 1 a 13, 35 e 36 do articulado apresentado, e o seu anexo 20 foram juntos aos autos. O Tribunal recusou, por outro lado, o registo da referida resposta e dos demais anexos, que foram devolvidos à recorrente.

10.
    Na petição, a recorrente concluiu pedindo que o Tribunal se digne:

-    reformar a decisão recorrida, de modo a permitir o registo da marca;

-    em alternativa, anular a decisão recorrida;

-    condenar o Instituto nas despesas.

11.
    Na audiência, a recorrente declarou pretender limitar a lista de produtos para os quais o registo foi pedido no sentido de que o pedido de marca passasse unicamente a ter por objecto as preparações para máquinas de lavar louça. Em resposta a uma questão do Tribunal, a recorrente precisou que essa declaração implica a sua desistência no que respeita ao segundo fundamento, assente na violação do dever de fundamentação relativamente a uma parte dos produtos em relação aos quais a Câmara de Recurso confirmou a decisão do examinador, e que se limita doravante a pedir a anulação da decisão recorrida com base em violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. A este respeito, a recorrente deseja que o carácter distintivo da marca seja apreciado apenas em relação às preparações para máquinas de lavar louça.

12.
    O Instituto conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    negar provimento ao recurso;

-    condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

Quanto ao alcance dos pedidos da recorrente

13.
    No que se refere às declarações proferidas pela recorrente na audiência, importa recordar que o requerente de uma marca comunitária pode, a qualquer momento, dirigir ao Instituto um pedido no sentido de limitar a lista de produtos e serviços, nos termos do artigo 44.° do Regulamento n.° 40/94 e da regra 13 do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de Dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento n.° 40/94 (JO L 303, p. 1). Resulta destas disposições que a limitação da lista dos produtos ou serviços designados num pedido de marca comunitária deve ser realizada segundo determinadas regras específicas. Dado que o pedido formulado verbalmente na audiência pela recorrente não obedece a essas regras, não pode ser considerado um pedido de alteração na acepção das disposições já referidas.

14.
    Em contrapartida, essa declaração deve ser interpretada no sentido de que a recorrente desistiu do seu recurso, na medida em que pediu a anulação da decisão recorrida para os produtos que não sejam preparações para máquinas de lavar louça.

15.
    Tal desistência parcial não é, enquanto tal, contrária à proibição, resultante do artigo 135.°, n.° 4, do Regulamento de Processo do Tribunal, de alterar, perante o Tribunal, o objecto do litígio apresentado perante a Câmara de Recurso. Com efeito, ao limitar o seu pedido de anulação apenas à parte da decisão recorrida relativa às preparações para máquinas de lavar louça, a recorrente não pede ao Tribunal que decida sobre pretensões diferentes das submetidas à Câmara de Recurso. Ao renunciar ao pedido de anulação da decisão recorrida na medida em que diz respeito a uma série de outros produtos da classe 3 do Acordo de Nice, a recorrente centrou o recurso nos produtos visados a título principal pelo seu pedido de registo de marca, ou seja, uma determinada categoria de produtos detergentes sólidos.

16.
    No que se refere ao pedido da recorrente no sentido de que o carácter distintivo da marca seja apreciado apenas em relação aos produtos para máquinas de lavar louça, importa todavia precisar que a sua desistência parcial não afecta o princípio de que compete ao Tribunal, no presente contencioso, fiscalizar a legalidade da decisão da Câmara de Recurso. Esta fiscalização deve ser efectuada por referência ao quadro factual e jurídico do litígio apresentado à Câmara de Recurso. Daqui decorre que uma parte não pode, renunciando parcialmente às suas pretensões, alterar os elementos factuais e jurídicos que serviram de base ao exame da legalidade da decisão da Câmara de Recurso.

17.
    Tendo em conta as declarações da recorrente na audiência, verifica-se que esta pede agora a anulação da decisão recorrida apenas na medida em que esta nega provimento ao recurso no que se refere às preparações para máquinas de lavar louça e a condenação do Instituto nas despesas.

Quanto à legalidade da decisão recorrida

Argumentos das partes

18.
    Tendo a recorrente desistido do segundo fundamento, assente numa violação do dever de fundamentação, aquela invoca, em apoio do seu recurso, um fundamento único, assente na violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Este fundamento está articulado em quatro partes. Em primeiro lugar, a recorrente entende que a Câmara de Recurso procedeu a uma interpretação errada do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, ao aplicar critérios mais estritos às marcas tridimensionais do que às outras marcas. Em segundo lugar, a recorrente alega que a Câmara de Recurso não tomou em consideração a situação no mercado em causa e os hábitos dos consumidores. Em terceiro lugar, a recorrente censura à Câmara de Recurso não ter tido em conta o facto de a marca se distinguir suficientemente das formas correntes de pastilhas para máquinas de lavar louça para poder ter carácter distintivo. Em quarto lugar, a recorrente invoca a jurisprudência existente em determinados Estados-Membros e a prática dos organismos nacionais das marcas que, na sua opinião, apoiam a tese de que as formas de pastilhas para máquinas de lavar louça que são diferentes das formas de base correntes podem ser protegidas como marcas comunitárias.

19.
    Pela primeira parte do fundamento, a recorrente censura à Câmara de Recurso ter cometido uma discriminação entre marcas tridimensionais e marcas tradicionais, contrária ao artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Alega que, segundo o Regulamento n.° 40/94, a possibilidade de registar é a regra, sendo a existência de um motivo de recusa ao abrigo do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94 a excepção. Assim, o ónus da prova da existência de um motivo absoluto de recusa incumbia ao Instituto. A Câmara efectuou uma inversão da relação entre a regra e a excepção e uma inversão do ónus da prova, no que respeita às marcas tridimensionais, designadamente às pastilhas para máquinas de lavar louça. A recorrente lembra que um carácter distintivo mínimo basta para justificar o registo de uma marca.

20.
    A recorrente considera errada a concepção de que os consumidores não têm, em princípio, uma percepção das formas como indicação da origem do produto. No seu entender, os consumidores não reflectem sobre a origem dos produtos de consumo quotidiano, que nem sequer conhecem, só prestando atenção à distinção entre os próprios produtos. As marcas não têm, assim, a função de indicadores de origem, mas antes a de indicadores do produto. Para distinguir os produtos entre si, os consumidores apoiam-se numa série de sinais, incluindo a embalagem, a cor e a forma do produto, dos quais o nome do produto não é o mais importante.

21.
    A recorrente defende que a aplicação de critérios mais estritos às marcas tridimensionais não pode ser justificada pela consideração de que as formas devem permanecer disponíveis para poderem ser utilizadas por todos os operadores económicos. Por um lado, alega que este «imperativo de manutenção à disposição» não é um motivo autónomo de recusa. Por outro lado, refere que o registo de marcas tridimensionais não visa monopolizar a venda de um determinado produto mas sim proteger a apresentação específica de um produto. Além disso, a recorrente considera que os critérios mais estritos para as marcas tridimensionais não podem ser justificados por considerações ligadas à protecção dos desenhos e modelos.

22.
    Pela segunda parte do fundamento, a recorrente critica a consideração da Câmara de Recurso de que os consumidores não têm a percepção da apresentação das pastilhas detergentes como uma indicação de origem, pelo facto de apenas se basear em considerações abstractas e não em factos e elementos de prova. Segundo a recorrente, a Câmara de Recurso não tomou em consideração todas as circunstâncias do caso em apreço, nomeadamente no que respeita à situação do mercado, para as quais a recorrente chamou a atenção.

23.
    Relativamente à situação do mercado, a recorrente expõe que os fabricantes europeus de pastilhas de detergente utilizam a sua forma e apresentação para distinguir os seus produtos dos de outros operadores. Para a recorrente, os consumidores sempre foram capazes de distinguir as diferentes pastilhas de detergente segundo as suas formas e cores e sempre o fizeram. A recorrente entende que, em todo o caso, os consumidores foram «condicionados» a fazê-lo. Sublinha que o efeito desse «condicionamento» deve distinguir-se do carácter distintivo obtido.

24.
    A recorrente alega que os produtores de pastilhas de detergente têm o mais profundo conhecimento do mercado. Como tal, o facto de terem escolhido formas e cores diferentes para distinguir os seus produtos detergentes sólidos dos dos seus concorrentes e o facto de tentarem protegê-los enquanto marcas devem considerar-se a prova, ou pelo menos um indício importante, de que os consumidores têm uma percepção das características das pastilhas e que recorrem a elas, e não só aos nomes dos produtos, para se orientarem no mercado.

25.
    Pela terceira parte do fundamento, a recorrente contesta a consideração do Instituto de que a forma e o aspecto da pastilha aqui em causa são correntes. Reconhece que as pastilhas redondas ou rectangulares com uma ou duas camadas coloridas tornaram-se usuais no mercado dos produtos detergentes, podendo assim considerar-se que são desprovidas de carácter distintivo.

26.
    A recorrente sublinha que a forma em apreço no caso concreto é oval irregular com os bordos achatados e um mosqueado grande e profundo, assemelhando-se a um seixo. A recorrente lembra que os consumidores europeus prestam atenção à forma e às cores das pastilhas de detergentes. Daí deduz que o público em causa certamente distinguirá a forma de «seixo» das formas das pastilhas redondas ou rectangulares geralmente utilizadas no mercado em causa. A recorrente insiste no facto de esta forma ser única no mercado e que nenhum operador a utilizou para os produtos em causa. Afirma que no mercado só existem pastilhas redondas ou rectangulares e apresenta exemplos que o demonstram. Acrescenta que o mosqueado grande e perfeitamente visível presente na pastilha difere do aspecto de outras pastilhas de detergente no mercado, uma vez que o mosqueado presente nestas últimas é bastante mais pequeno e não pode ser percebido enquanto tal. A recorrente entende que a Câmara de Recurso deveria ter recolhido provas a este respeito para poder afirmar que a forma em apreço é corrente. Em resposta a uma questão do Tribunal, indica que ela própria não comercializa actualmente uma pastilha para máquinas de lavar louça com a forma da marca pedida, de modo que não pode apresentar um exemplo tridimensional dessa marca.

27.
    A recorrente observa que, na decisão recorrida, a Câmara de Recurso reconheceu que a forma cujo registo foi pedido no caso em apreço tem uma forma oval irregular que não é idêntica à forma corrente dos produtos detergentes. A recorrente opina que a Câmara de Recurso exigiu erradamente que a marca devesse distinguir-se de maneira significativa das formas correntes e apresentar características arbitrárias, para poder ser registada.

28.
    Na audiência, a recorrente acrescentou que, no que se refere a preparações para máquinas de lavar louça, só a forma rectangular é usual no mercado, dado que esta forma corresponde à dos recipientes das máquinas a que se destinam esses produtos. Daí deduz que, para os produtos para máquinas de lavar louça, só a forma rectangular está desprovida de carácter distintivo. O mesmo já não se aplica, segundo a recorrente, à forma de «seixo», ora em apreço. Afirma que esta forma é única e distingue-se de maneira significativa das formas de base correntes, até agora utilizadas no mercado. Além disso, ainda que se considerasse que essa forma se assemelha à de uma pastilha redonda, usual no mercado dos produtos para máquinas de lavar roupa, não se poderia considerar que não existe carácter distintivo em relação aos produtos para máquinas de lavar louça.

29.
    Ainda na audiência, a recorrente acrescentou que a variedade das formas que as pastilhas detergentes podem apresentar é limitada, dado que consistem em pó detergente comprimido que, se as formas fossem demasiado elaboradas, corriam o risco de se esboroar. No caso destas pastilhas, a recorrente deduz que bastam divergências pouco importantes em relação às formas de base para se reconhecer o carácter distintivo de uma forma.

30.
    Pela quarta parte do fundamento, a recorrente invoca a jurisprudência e a prática nalguns Estados-Membros e a prática do próprio Instituto para demonstrar que os critérios aplicados no caso concreto são demasiado estritos. Por um lado, faz referência a decisões jurisdicionais proferidas na Alemanha, nos Países Baixos e em Itália. A recorrente retira desta jurisprudência que alguns órgãos jurisdicionais nacionais consideram que as pastilhas detergentes cujas características se distinguem, ainda que ligeiramente, da forma usual destes produtos apresentam um carácter distintivo suficiente para a sua aparência ser protegida como marca. A recorrente considera que, por maioria de razão, a forma em causa no caso em apreço pode ser protegida.

31.
    Em seguida, a recorrente alega que as autoridades nacionais de vários Estados-Membros registaram diferentes formas de pastilhas detergentes, sem exigir que estas apresentassem diferenças marcantes em relação às formas correntes preexistentes. Considera que a forma da pastilha em questão no caso em apreço distingue-se mais das formas correntes do que as marcas que foram registadas a nível nacional.

32.
    Por último, a recorrente invoca a prática do Instituto em matéria de registo de marcas tridimensionais relativas a pastilhas detergentes. Em primeiro lugar, faz referência a dois pedidos de marcas que foram publicados, os pedidos n.os 809 830 e 924 829. A recorrente reconhece que estes pedidos não deram lugar a registos, mas refere que os examinadores consideraram que, aparentemente, apresentavam carácter distintivo suficiente. Segundo a recorrente, isto ocorreu, porém, antes de o Instituto tomar a decisão de princípio de que as pastilhas detergentes não podem ser registadas, a menos que apresentem diferenças marcantes em relação às pastilhas habituais. A recorrente alega, a seguir, que o Instituto registou um determinado número de formas de pastilhas detergentes. Considera que esses registos, comparados com a recusa verificada no caso em apreço, revelam a existência, no Instituto, de incertezas quanto aos critérios aplicáveis ao registo das marcas para pastilhas detergentes.

33.
    A recorrente considera que a aceitação dessas marcas pelo Instituto estaria em conformidade com o objectivo do Regulamento n.° 40/94 e com a prática dos organismos nacionais, desde que tenham um mínimo de carácter distintivo. Defende que a marca em questão no caso em apreço apresenta esse carácter distintivo mínimo. A recorrente admite que essa abordagem afecta o alcance da protecção das marcas em causa. Considera, porém, que é útil que os órgãos jurisdicionais competentes em matéria de contrafacção definam esse alcance caso a caso.

34.
    O Instituto responde à primeira parte do fundamento afirmando que os critérios aplicados pela Câmara de Recurso não originam uma discriminação entre as marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto e as outras marcas. Afirma que a Câmara de Recurso efectuou uma simples aplicação do artigo 7.° do Regulamento n.° 40/94, tendo em conta as características específicas dos produtos em causa e as circunstâncias em que esses produtos são comercializados.

35.
    No que respeita à segunda parte do fundamento, o Instituto observa que a recorrente não teve suficientemente em conta a importância dos nomes dos produtos na escolha exercida pelos consumidores. Além disso, critica a análise que a recorrente faz do mercado, uma vez que esta não examina o preço nem a qualidade dos produtos. Segundo o Instituto, do facto de as representações das pastilhas figurarem na embalagem dos produtos não se pode deduzir que essas pastilhas tenham carácter distintivo. Considera que a afirmação da recorrente de que os consumidores podem distinguir as diferentes pastilhas de detergente segundo as suas formas e cores e que foram condicionados a fazê-lo é uma simples suposição não demonstrada pelas provas relativas às formas de base ou correntes e às suas variações que vêm naturalmente à mente.

36.
    Quanto à terceira parte do fundamento, o Instituto afirma que as diferenças entre a forma cujo registo é pedido e as formas de base das pastilhas de detergente redondas ou rectangulares não são susceptíveis de ser notadas pelo consumidor. Em primeiro lugar, compara a representação gráfica da marca com a de uma pastilha redonda similar. Observa que, quando se representa a pastilha em litígio de seis lados diferentes, quatro dessas representações são idênticas às de uma pastilha redonda, enquanto a forma oval só aparece em duas das representações. Em seguida, o Instituto refere que, quando as pastilhas detergentes estão representadas numa embalagem, são normalmente representadas em grupo e/ou em perspectiva. Para o Instituto, não é possível, nestas duas situações, ter a percepção de qualquer diferença entre a forma oval em questão e uma forma redonda. No que diz respeito ao mosqueado na superfície da marca, o Instituto invoca os acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Setembro de 2001, em matéria de marca tridimensional, [Henkel/IHMI (Pastilha rectangular vermelha e branca), T-335/99, Colect., p. II-2581; (Pastilha rectangular verde e branca), T-336/99, Colect., p. II-2589; (Pastilha redonda vermelha e branca), T-337/99, Colect., p. II-2597; Procter & Gamble/IHMI (Pastilha quadrada branca e verde pálido), T-117/00, Colect., p. II-2723; (Pastilha quadrada branca, com manchas verdes e verde pálido), T-118/00, Colect., p. II-2731; (Pastilha quadrada branca, com manchas amarelas e azuis), T-119/00, Colect., p. II-2761; (Pastilha quadrada branca, com manchas azuis), T-120/00, Colect., p. II-2769; (Pastilha quadrada branca, com manchas verdes e azuis), T-121/00, Colect., p. II-2777; (Pastilha quadrada com incrustações), T-128/00, Colect., p. II-2785; (Pastilha rectangular com incrustações), T-129/00, Colect., p. II-2793]. Nos termos destes acórdãos, a presença do mosqueado não é suficiente para que o aspecto de uma pastilha detergente possa ser percebido como uma indicação da origem do produto. O Instituto afirma que a marca cujo registo é pedido não é susceptível de distinguir os produtos em causa dos que têm uma origem diferente. Salienta que a forma em causa é corrente ou é, em todo o caso, uma variação da forma standard, redonda, quadrada ou rectangular, que vem naturalmente à mente.

37.
    Por último, em relação à quarta parte do fundamento, o Instituto alega que a abordagem seguida pelos órgãos jurisdicionais nacionais referidos pela recorrente deixou de ser válida após os acórdãos do Tribunal de 19 de Setembro de 2001 (referidos, supra, no n.° 36). Recorda a jurisprudência segundo a qual os registos já efectuados nos Estados-Membros apenas constituem um elemento que, sem ser determinante, só pode ser tomado em consideração para efeitos de registo de uma marca comunitária. Considera que os exemplos de registo apresentados pela recorrente demonstram que o Instituto seguiu uma prática coerente quando se trata do registo das marcas de pastilhas de detergente.

Apreciação do Tribunal

38.
    Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, é recusado o registo a «marcas desprovidas de carácter distintivo».

39.
    Como resulta da jurisprudência, as marcas a que o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 se refere são, designadamente, aquelas que, do ponto de vista do público pertinente, são comummente utilizadas, no comércio, para a apresentação dos produtos e dos serviços em causa ou a respeito dos quais existem, pelo menos, indícios concretos que permitam concluir que são susceptíveis de ser utilizadas desta maneira [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 2 de Julho de 2002, SAT.1/IHMI (SAT.2), T-323/00, Colect., p. II-2839, n.° 37]. Com efeito, tais marcas não permitem ao consumidor que adquire o produto ou o serviço designado pela marca fazer, quando de uma posterior aquisição, a mesma escolha se a experiência for positiva ou outra escolha se a experiência for negativa [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 2002, Rewe-Zentral/IHMI (LITE), T-79/00, Colect., p. II-705, n.° 26].

40.
    Por conseguinte, o carácter distintivo de uma marca apenas pode ser apreciado, por um lado, por referência aos produtos ou serviços relativamente aos quais o registo foi solicitado e, por outro, por referência à percepção que dele tem o público destinatário (acórdãos LITE, já referido no número anterior, n.° 27, e SAT.2, já referido no número anterior, n.° 37).

41.
    No que respeita aos produtos visados pelo presente recurso, a saber, as preparações para máquinas de lavar louça incluídas na classe 3 do Acordo de Nice, importa precisar que a marca cujo registo é pedido é constituída pela aparência do próprio produto.

42.
    As pastilhas para máquinas de lavar louça que são objecto do presente recurso, assim como os outros produtos incluídos na classe 3 do Acordo de Nice visados pelo pedido de registo de marca original e pela decisão recorrida, são bens de consumo largamente difundidos. O público ao qual respeitam estes produtos é constituído por todos os consumidores. Há assim que apreciar o carácter distintivo da marca pedida tendo em consideração a presumível expectativa de um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Julho de 1998, Gut Springenheide e Tusky, C-210/96, Colect., p. I-4657, n.os 30 a 32). Importa assim igualmente recordar que a percepção da marca pelo público em causa, neste caso, o consumidor médio, é influenciada pelo seu nível de atenção, que é susceptível de variar em função da categoria de produtos ou serviços em causa (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C-342/97, Colect., p. I-3819, n.° 26).

43.
    Além disso, não é necessário que uma marca transmita uma informação precisa quanto à identidade do fabricante do produto ou do prestador de serviços. Basta que a marca permita ao público em causa distinguir o produto ou serviço que ela designa dos que têm outra origem comercial e concluir que todos os produtos ou serviços que designa foram fabricados, comercializados ou fornecidos sob controlo do titular dessa marca, ao qual pode ser atribuída a responsabilidade da sua qualidade (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 1998, Canon, C-39/97, Colect., p. I-5507, n.° 28).

44.
    No que se refere à primeira parte do fundamento, assente numa discriminação entre as marcas tridimensionais e as outras marcas, recorde-se que o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 não distingue entre as diferentes categorias de marcas. Os critérios de apreciação do carácter distintivo das marcas tridimensionais compostas pela aparência do próprio produto não são diferentes dos aplicáveis às outras categorias de marcas [acórdãos Pastilha rectangular com incrustações, referido, supra, no n.° 36, n.° 50; v., igualmente, no que respeita ao artigo 2.° da Primeira Directiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de Dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados-Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), acórdão do Tribunal de Justiça de 18 de Junho de 2002, Philips, C-299/99, Colect., p. I-5475, n.° 48, e, no que respeita ao artigo 3.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 89/104, as conclusões do advogado-geral D. Ruiz-Jarabo Colomer de 24 de Outubro de 2002, nos processos apensos C-53/01 a C-55/01, Linde e o., ainda não publicadas na Colectânea, n.° 13].

45.
    Há, no entanto, que ter em conta, no quadro da aplicação destes critérios, o facto de a percepção do público visado não ser necessariamente a mesma no caso de uma marca tridimensional constituída pela aparência do próprio produto e no caso de uma marca nominativa, figurativa ou tridimensional, que não seja constituída por essa aparência. Com efeito, se é certo que o público está habituado a apreender imediatamente estas últimas marcas como sinais identificadores do produto, já o mesmo não acontece necessariamente quando o sinal se confunde com a aparência do próprio produto (acórdão Pastilha rectangular com incrustações, referido, supra, no n.° 36, n.° 51, e conclusões do advogado-geral D. Ruiz-Jarabo Colomer, referidas, supra, no n.° 44, n.° 12).

46.
    Decorre da decisão recorrida, nomeadamente dos n.os 14 e 15, que a Câmara de Recurso examinou a marca pedida em conformidade com as considerações precedentes. Daí resulta que a Câmara de Recurso não aplicou às marcas tridimensionais constituídas pela forma do produto critérios mais estritos do que às outras marcas. Por conseguinte, a primeira parte do fundamento da recorrente não procede.

47.
    No que concerne à segunda parte do fundamento, assente na não tomada em consideração, pela Câmara de Recurso, da situação no mercado em causa, resulta do n.° 7 da decisão recorrida que a Câmara de Recurso tomou conhecimento dos argumentos da recorrente relativamente à situação no mercado dos produtos detergentes. No entanto, não aceitou a tese da recorrente segundo a qual os consumidores distinguem os diferentes produtos detergentes que se apresentam em forma de pastilhas em função das formas e cores destes últimos. Baseou esta apreciação, designadamente, na utilização de marcas convencionais pelos fabricantes de tais pastilhas, que traduz, segundo a Câmara de Recurso, as dúvidas destes mesmos fabricantes em relação à capacidade da aparência dos produtos em agir como indicador da origem comercial.

48.
    A este respeito, não se pode acolher a tese da recorrente segundo a qual compete ao Instituto demonstrar, com base em elementos de prova concretos, que os consumidores não têm a percepção da apresentação das pastilhas detergentes como indicação de origem. Com efeito, estamos perante produtos de consumo quotidiano que são habitualmente vendidos em embalagens com o nome destes produtos e nas quais se vê, por vezes, marcas nominativas ou figurativas ou outros elementos figurativos entre os quais pode constar a imagem do produto. No que diz respeito aos produtos comercializados dessa maneira, a experiência revela, regra geral, que o nível de atenção do consumidor médio em relação à sua aparência não é elevado. Nestas condições, compete ao requerente de uma marca demonstrar que os hábitos dos consumidores no mercado em causa são diferentes, não sendo de exigir ao Instituto que proceda a uma análise económica do mercado, ou mesmo a inquéritos junto dos consumidores, para provar em que medida estes últimos prestam atenção à aparência dos produtos de uma determinada categoria. Dado o conhecimento profundo do mercado, invocado pela própria recorrente, um requerente de uma marca está em melhores condições de prestar indicações concretas e sustentadas a este respeito.

49.
    A recorrente alega, nomeadamente, que os consumidores foram «condicionados» a distinguir várias pastilhas detergentes segundo as suas formas e cores. Neste contexto, os acórdãos do Tribunal de 19 de Setembro de 2001, referidos, supra, no n.° 36 (em especial, acórdão Pastilha rectangular com incrustações, n.° 61), referem que a eventualidade de os consumidores adquirirem o hábito de reconhecer esse produto com base na sua aparência não basta para afastar o motivo de recusa baseado no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, uma vez que essa evolução na percepção do sinal pelo público só pode ser tomada em conta, se for provada, no quadro do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94. A este respeito, há que precisar que o «condicionamento» invocado pela recorrente não equivale ao carácter distintivo adquirido na acepção do artigo 7.°, n.° 3, do Regulamento n.° 40/94. Com efeito, a argumentação da recorrente não diz respeito à questão de saber se a forma específica de um produto tem um carácter distintivo, visando antes obter que o Tribunal tenha em conta o significado que o público pertinente associa, em geral, à aparência de uma determinada categoria de produtos.

50.
    O simples facto de a recorrente e os seus concorrentes terem escolhido formas e cores diferentes para os seus detergentes sólidos e de se esforçarem para protegê-los enquanto marcas não é, contudo, suficiente para concluir que a aparência desses produtos é normalmente apreendida pelo público em causa como uma indicação da sua origem comercial.

51.
    Ora, na Câmara de Recurso, a recorrente não apresentou elementos de prova concretos que demonstrem que a forma e as cores das pastilhas detergentes têm um papel importante na escolha do consumidor entre diversos produtos. Nestas condições, não se pode censurar à Câmara de Recurso não ter tomado em consideração a situação do mercado em causa.

52.
    Importa acrescentar que a recorrente também não apresentou os elementos de prova numa fase posterior do processo, sem que no presente caso seja necessário que o Tribunal se pronuncie sobre a questão de saber se pode tomar em consideração, no âmbito de um recurso ao abrigo do artigo 63.° do Regulamento n.° 40/94, elementos que não foram apresentados na Câmara de Recurso. É certo que entende ter apresentado ao Tribunal alguns documentos a este respeito quando apresentou, em resposta às medidas de organização do processo adoptadas pelo Tribunal, um articulado equivalente a uma réplica, acompanhado de alguns anexos. Ao proceder assim, a recorrente não respeitou, no entanto, as condições nas quais, nos termos do artigo 135.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, se pode apresentar um articulado adicional, de maneira que os elementos que não sejam respostas às medidas de organização do processo, que entende ter apresentado ao Tribunal através desse articulado, não puderam, de qualquer forma, ser tomados em consideração.

53.
    Daqui resulta que a segunda parte do fundamento não procede.

54.
    Para verificar, no âmbito da terceira parte do fundamento, se a Câmara de Recurso não tomou em consideração o carácter distintivo da marca pedida, há que analisar a impressão de conjunto produzida pela aparência da pastilha em causa (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Novembro de 1997, SABEL, C-251/95, Colect., p. I-6191, n.° 23), o que não é incompatível com o exame sucessivo dos diferentes elementos da apresentação utilizados.

55.
    A forma tridimensional cujo registo foi pedido apresenta-se, vista de perfil ou de cima, como um rectângulo de bordos longos convexos. Neste ponto, não se distingue, portanto, de outras formas de pastilhas convexas, quer sejam redondas ou quadrangulares. Vista de frente, a pastilha em causa tem uma forma oval irregular, ou ovóide, com a extremidade inferior alargada e achatada, apresentando uma semelhança mais distante com uma forma trapezóide, com os cantos fortemente arredondados.

56.
    Esta forma não faz parte, por si só, das formas geométricas de base, apresentando uma combinação das características de diferentes formas arredondadas e inspirando-se igualmente nalgumas formas quadrangulares. É, assim, bastante próxima de algumas formas de pastilhas comummente utilizadas para produtos detergentes, designadamente da de pastilhas redondas e ovais e, em menor escala, da de pastilhas rectangulares.

57.
    Tal como o Instituto acertadamente referiu, as diferenças da forma pedida em relação àquelas outras formas não são facilmente perceptíveis. A forma pedida é uma variante das formas de base comummente utilizadas, delas não se distinguindo suficientemente, de modo a permitir ao público em causa reconhecê-la e repetir, numa posterior aquisição, a experiência da compra, se for positiva, ou evitá-la, se for negativa.

58.
    O mosqueado presente na pastilha não é susceptível de conferir um carácter distintivo à marca pedida. Com efeito, o mosqueado faz parte das soluções que mais naturalmente vêm à mente quando se trata de combinar diferentes substâncias num produto detergente (v., nomeadamente, acórdão Pastilha rectangular com incrustações, referido, supra, no n.° 36, n.° 58). Além disso, o mosqueado é comum no aspecto dos produtos detergentes sólidos. O facto de o mosqueado presente no aspecto da pastilha pedida ser relativamente grande não é susceptível de influenciar de forma significativa o carácter distintivo da marca pedida. Com efeito, o aspecto mosqueado é o que apresenta um pó, composto de partículas claras e escuras, quando é comprimido em forma de pastilhas, e as variações do tamanho do mosqueado é facilmente explicável pelo tamanho das partículas que compõem esse pó.

59.
    Por conseguinte, a Câmara de Recurso considerou acertadamente que a aparência da pastilha pedida é desprovida de carácter distintivo.

60.
    O argumento da recorrente segundo o qual, no mercado dos produtos para máquinas de lavar louça, só as pastilhas rectangulares são comummente utilizadas, pelo que qualquer outra forma tem um carácter distintivo, não é susceptível de infirmar esta conclusão. Desde logo, como já foi referido, supra, nos n.os 15 e 16, a desistência parcial da recorrente não pode levar o Tribunal a sair do quadro da fiscalização da legalidade da decisão recorrida, examinando o carácter distintivo da marca pedida com base em factos diferentes dos que foram apresentados na Câmara de Recurso.

61.
    Em seguida, mesmo supondo que a Câmara de Recurso deveria ter examinado em separado o carácter distintivo da marca pedida em relação aos produtos para máquinas de lavar louça, e mesmo supondo que se tivesse provado que só a forma rectangular é actualmente utilizada para esses produtos, a conclusão de que a aparência da pastilha pedida é desprovida de carácter distintivo permaneceria válida. Com efeito, as outras formas geométricas de base, como as pastilhas redondas, ovais, quadradas ou cilíndricas, e as suas variantes, são igualmente susceptíveis de ser comummente utilizadas para esses produtos, uma vez que todas essas formas vêm naturalmente à mente quando se trata de comprimir um pó para o apresentar numa forma sólida.

62.
    O facto de, no mercado vizinho dos produtos para máquinas de lavar roupa, existirem pastilhas redondas, quadradas e ovais constitui um indício concreto que permite concluir que estas diferentes formas são igualmente susceptíveis de serem comummente utilizadas para produtos para máquinas de lavar louça.

63.
    O argumento da recorrente segundo o qual a forma rectangular das pastilhas destinadas às máquinas de lavar louça corresponde ao dos compartimentos que existem nessas máquinas para se colocar o produto não é suficiente para afastar esse indício. Com efeito, as pastilhas ovais ou cilíndricas e, segundo o seu tamanho, as pastilhas redondas ou quadradas podem ser introduzidas nesses compartimentos da mesma forma que as pastilhas rectangulares.

64.
    Deve igualmente afastar-se o argumento da recorrente segundo o qual, no caso em apreço, bastam diferenças mínimas da marca pedida em relação às formas de base para se verificar um carácter distintivo, dado que a variedade das formas que podem apresentar as pastilhas detergentes é, por razões técnicas, limitada. Supondo que esta afirmação é correcta, ela não pode, em todo o caso, justificar uma alteração dos critérios de apreciação do carácter distintivo.

65.
    Por um lado, não existe qualquer razão que permita concluir que a percepção da forma ou do aspecto de uma pastilha pelo público em causa e a atenção deste público em relação às diferenças mínimas entre as formas ou os aspectos de diferentes pastilhas sejam influenciadas pela possibilidade ou impossibilidade técnica de produzir formas bastante diferentes umas das outras.

66.
    Por outro lado, supondo que seja efectivamente difícil, por razões técnicas, produzir pastilhas cujas formas se distinguem significativamente umas das outras, o registo de formas bastante próximas das formas de base comummente utilizadas aumentaria o risco de conferir, através do direito das marcas, direitos exclusivos de um operador que poderiam entravar a concorrência no mercado dos produtos em causa. Ora, os motivos absolutos de recusa traduzem justamente a preocupação do legislador comunitário de evitar a criação de tais monopólios (acórdão Pastilha rectangular com incrustações, referido, supra, no n.° 36, n.° 69). Como tal, as circunstâncias susceptíveis de aumentar esse risco não podem ser invocadas para justificar o registo de um sinal que não é susceptível de desempenhar a função de uma marca, isto é, permitir ao público em causa distinguir esse produto dos que têm outra origem comercial.

67.
    Por conseguinte, a terceira parte do fundamento não procede.

68.
    No que diz respeito aos argumentos da recorrente no âmbito da quarta parte do fundamento, assentes na jurisprudência e na prática nalguns Estados-Membros e na prática do Instituto, recorde-se que os registos já efectuados em Estados-Membros só constituem elementos que, sem ser determinantes, só podem ser tomados em consideração para efeitos de registo de uma marca comunitária [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Fevereiro de 2000, Procter & Gamble/IHMI (Forma de um sabão), T-122/99, Colect., p. II-265, n.° 61; de 31 de Janeiro de 2001, Sunrider/IHMI (VITALITE), T-24/00, Colect., p. II-449, n.° 33, e Pastilha redonda, vermelha e branca, já referido no n.° 36, n.° 58]. As mesmas considerações são válidas para a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais dos Estados-Membros. Além disso, resulta de documentos apresentados pela recorrente em apoio dos seus argumentos que a prática dos organismos nacionais das marcas em relação às marcas tridimensionais, constituídas pelas aparências de pastilhas para máquinas de lavar roupa e máquinas de lavar louça, não é uniforme.

69.
    Importa acrescentar que a grande maioria das marcas visadas pela jurisprudência e pelos registos nacionais invocados pela recorrente têm características diferentes da marca pedida no caso em apreço. Entre os exemplos invocados pela recorrente, apenas duas marcas registadas em França apresentam alguma analogia com a marca pedida, na medida em que são tridimensionais, sendo constituídas por uma variante de formas geométricas de base e tendo sido apresentadas sem qualquer pedido de cor. Não se pode, todavia, deduzir destes exemplos isolados que a Câmara de Recurso não tenha tomado em consideração a prática dos organismos nacionais.

70.
    Por último, no que respeita à prática do Instituto, invocada pela recorrente, importa ter presente que uma fundamentação de facto ou de direito constante de uma decisão anterior pode, é certo, constituir um argumento a favor de um fundamento baseado em violação de uma disposição do Regulamento n.° 40/94. Porém, no presente caso, a recorrente não invocou, em relação a essas decisões, quaisquer fundamentos delas constantes susceptíveis de pôr em causa a apreciação da Câmara de Recurso quanto ao carácter distintivo da marca pedida.

71.
    Por conseguinte, a quarta parte do fundamento não procede.

72.
    Uma vez que o fundamento único da recorrente, assente numa violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, não procede, deve ser negado provimento ao recurso.

Quanto às despesas

73.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal, a parte vencida é condenada nas despesas se tal tiver sido requerido. Tendo a recorrente sido vencida nos seus pedidos, há que condená-la nas despesas do recorrido, em conformidade com o pedido do Instituto.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1.
    É negado provimento ao recurso.

2.
    A recorrente é condenada nas despesas.

Moura Ramos
Pirrung
Meij

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 5 de Março de 2003.

O secretário

O presidente

H. Jung

R. M. Moura Ramos


1: Língua do processo: inglês.