Language of document : ECLI:EU:T:2017:48

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção alargada)

1 de fevereiro de 2017 (*)

«Responsabilidade extracontratual — Precisão da petição — Admissibilidade — Artigo 47.° da Carta dos Direitos Fundamentais — Prazo razoável de julgamento — Danos materiais — Juros sobre o montante da coima não paga — Despesas com a garantia bancária — Danos morais — Nexo de causalidade»

No processo T‑479/14,

Kendrion NV, com sede em Zeist (Países Baixos), representada inicialmente por P. Glazener e T. Ottervanger e, em seguida, por T. Ottervanger, advogados,

demandante,

contra

União Europeia, representada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, representado inicialmente por A. Placco e, em seguida, por J. Inghelram e E. Beysen, na qualidade de agentes,

demandada,

apoiada por:

Comissão Europeia, representada por T. Christoforou, S. Noë e P. van Nuffel, na qualidade de agentes,

interveniente,

que tem por objeto um pedido, com base no artigo 268.° TFUE, de reparação dos danos alegadamente sofridos pela demandante por causa da duração do processo no Tribunal Geral, que deu origem ao acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667),

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção alargada),

composto por: S. Papasavvas, presidente, I. Labucka, E. Bieliūnas (relator), V. Kreuschitz e I. S. Forrester, juízes,

secretário: G. Predonzani, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 20 de julho de 2016,

profere o presente

Acórdão

I.      Antecedentes do litígio

1        Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 22 de fevereiro de 2006, a demandante, Kendrion NV, interpôs recurso da Decisão C(2005) 4634 da Comissão, de 30 de novembro de 2005, relativa a um processo de aplicação do artigo [101.° TFUE] (Processo COMP/F/38.354 — Sacos industriais) (a seguir «Decisão C(2005) 4634»). Na sua petição, pediu, em substância, ao Tribunal Geral, a título principal, que anulasse, total ou parcialmente, essa decisão ou, a título subsidiário, que anulasse a coima que lhe tinha sido aplicada pela referida decisão ou que reduzisse o respetivo montante.

2        Por acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667), o Tribunal Geral negou provimento ao referido recurso.

3        Por petição entrada em 26 de janeiro de 2012, a demandante interpôs recurso do acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667).

4        Por acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão (C‑50/12 P, EU:C:2013:771), o Tribunal de Justiça negou provimento ao referido recurso.

II.    Tramitação processual e pedidos das partes

5        Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 26 de junho de 2014, a demandante propôs a presente ação contra a União Europeia, representada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

6        Por requerimento separado, entrado na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de setembro de 2014, o Tribunal de Justiça da União Europeia deduziu uma exceção de inadmissibilidade nos termos do artigo 114.°, n.° 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral de 2 de maio de 1991.

7        Por despacho de 6 de janeiro de 2015, Kendrion/União Europeia (T‑479/14, não publicado, EU:T:2015:2), o Tribunal Geral julgou improcedente a exceção de inadmissibilidade deduzida pelo Tribunal de Justiça da União Europeia e reservou para final a decisão quanto às despesas.

8        Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 17 de fevereiro de 2015, o Tribunal de Justiça da União Europeia interpôs recurso, registado sob a referência C‑71/15 P, do despacho de 6 de janeiro de 2015, Kendrion/União Europeia (T‑479/14, não publicado, EU:T:2015:2).

9        Por despacho de 2 de março de 2015, o presidente da Terceira Secção do Tribunal Geral, a pedido do Tribunal de Justiça da União Europeia, suspendeu a instância no presente processo até à decisão do Tribunal de Justiça que ponha termo à instância no processo C‑71/15 P, Tribunal de Justiça/Kendrion.

10      Por despacho de 18 de dezembro de 2015, Tribunal de Justiça/Kendrion (C‑71/15 P, não publicado, EU:C:2015:857), o processo foi cancelado no registo do Tribunal de Justiça.

11      Retomada a instância no presente processo, a Comissão Europeia, por requerimento entrado na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de janeiro de 2016, pediu para intervir em apoio dos pedidos do Tribunal de Justiça da União Europeia.

12      Em 16 de fevereiro de 2016, o Tribunal de Justiça da União Europeia apresentou a contestação.

13      Em 17 de fevereiro de 2016, o Tribunal Geral remeteu o presente processo à Terceira Secção alargada.

14      Em 2 de março de 2016, o Tribunal Geral decidiu que não era necessária uma segunda troca de articulados. Além disso, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.° do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, convidou o Tribunal de Justiça da União Europeia a indicar se tinha solicitado e obtido a autorização da demandante e da Comissão para poder apresentar determinados documentos que figuravam nos anexos da contestação e que eram referentes ao processo que deu origem ao acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667) (a seguir «processo T‑54/06»).

15      Por despacho de 15 de março de 2016, Kendrion/União Europeia (T‑479/14, não publicado, EU:T:2016:196), o presidente da Terceira Secção alargada do Tribunal Geral deferiu o pedido de intervenção apresentado pela Comissão em apoio dos pedidos do Tribunal de Justiça da União Europeia e especificou que os direitos da Comissão seriam os previstos no artigo 116.°, n.° 6, do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991.

16      Em 18 de março de 2016, o Tribunal de Justiça da União Europeia respondeu à pergunta mencionada no n.° 14, supra. Concluiu pedindo ao Tribunal Geral que se dignasse considerar, a título principal, que o Tribunal de Justiça não tinha de pedir nem de obter a autorização da demandante ou da Comissão para poder produzir os documentos referentes ao processo T‑54/06 e, a título subsidiário, que essa autorização tinha sido dada implicitamente pela demandante e pela Comissão. A título muito subsidiário, o Tribunal de Justiça da União Europeia pediu que a sua resposta fosse tratada como um pedido de medida de organização do processo destinado a que o Tribunal Geral ordenasse a produção, no âmbito da presente ação, dos documentos constitutivos dos autos do processo T‑54/06 e, em particular, dos documentos anexos à contestação.

17      Em 4 de abril de 2016, o presidente da Terceira Secção alargada do Tribunal Geral decidiu, em primeiro lugar, retirar dos autos os documentos que figuravam nos anexos à contestação apresentada no presente processo, referentes ao processo T‑54/06. Essa decisão teve por base o facto de o Tribunal de Justiça da União Europeia, por um lado, não ter solicitado nem obtido a autorização das partes no processo T‑54/06 para poder apresentar os referidos documentos e, por outro, não ter pedido o acesso aos autos do referido processo ao abrigo do artigo 38.°, n.° 2, do Regulamento de Processo. Em segundo lugar, o presidente da Terceira Secção alargada do Tribunal Geral decidiu, em aplicação do artigo 88.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, convidar a demandante a tomar posição sobre o pedido de medida de organização do processo formulado a título muito subsidiário pelo Tribunal de Justiça da União Europeia na sua resposta de 18 de março de 2016, mencionada no n.° 16, supra.

18      Em 12 de abril de 2016, a demandante concluiu pedindo ao Tribunal Geral que decidisse segundo a equidade, tendo em conta os interesses de ambas as partes e a complexidade processual do pedido formulado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia.

19      Em 11 de maio de 2016, o Tribunal Geral constatou que a preparação e a solução do presente processo careciam, atendendo ao seu objeto, da disponibilização dos autos do processo T‑54/06. Assim, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.° do Regulamento de Processo, o Tribunal Geral decidiu verter para os autos do presente processo os autos do processo T‑54/06.

20      Em 17 de junho de 2016, o Tribunal de Justiça da União Europeia solicitou que os autos no processo T‑54/06 lhe fossem notificados.

21      Em 28 de junho de 2016, o Tribunal Geral solicitou à demandante que apresentasse determinados documentos e fez‑lhe uma pergunta para ser respondida na audiência de alegações.

22      Na audiência de 20 de julho de 2016, foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas orais feitas pelo Tribunal Geral.

23      A demandante conclui pedindo ao Tribunal Geral que se digne:

–        condenar a União no pagamento, pelos danos materiais, de uma quantia no montante de 2 308 463,98 euros ou, no mínimo, de um montante que considere razoável;

–        condenar a União no pagamento, pelos danos morais, de uma quantia no montante de 11 050 000 euros, a título principal, ou, subsidiariamente, de um montante de 1 700 000 euros ou, pelo menos, a título mais subsidiário, de um montante fixado pelas partes em conformidade com as regras definidas pelo Tribunal Geral ou, de qualquer modo, de um montante razoável determinado pelo próprio Tribunal Geral;

–        a partir de 26 de novembro de 2013, acrescer a cada um dos montantes atribuídos juros moratórios a uma taxa que considere razoável;

–        condenar a União nas despesas.

24      O Tribunal de Justiça da União Europeia, apoiado pela Comissão, conclui pedindo ao Tribunal Geral que se digne:

–        a título principal, julgar improcedente e inadmissível o pedido de indemnização dos danos materiais alegados e, em todo o caso, julgar improcedente o pedido de indemnização dos danos morais alegados;

–        a título subsidiário, julgar improcedente o pedido de indemnização dos danos materiais alegados e atribuir à demandante uma indemnização pelos danos morais alegados, no montante máximo de 5 000 euros;

–        condenar a demandante nas despesas.

III. Questão de direito

A.      Quanto à admissibilidade

25      O Tribunal de Justiça da União Europeia sustenta que a petição carece de clareza e de precisão no que diz respeito à natureza e à extensão dos danos morais alegados. Com efeito, em seu entender, a descrição dos danos morais é particularmente vaga e assenta numa confusão entre danos materiais e danos morais.

26      Por força do disposto no artigo 21.°, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, em conjugação com o artigo 53.°, primeiro parágrafo, do mesmo Estatuto, e do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, a petição deve conter a indicação do objeto do litígio e uma exposição sumária dos fundamentos invocados. Essa indicação deve ser suficientemente clara e precisa para permitir ao demandado preparar a sua defesa e ao Tribunal Geral decidir o recurso, se for o caso, sem outras informações. A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que uma ação seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que esta se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do texto da própria petição. Mais concretamente, para satisfazer estes requisitos, uma petição destinada a obter a reparação de danos alegadamente causados por uma instituição da União deve conter os elementos que permitam identificar o comportamento que a demandante censura à instituição, as razões pelas quais considera que existe um nexo de causalidade entre o comportamento e o dano que alega ter sofrido, bem como o caráter e a extensão desse dano (v. acórdão de 7 de outubro de 2015, Accorinti e o./BCE, T‑79/13, EU:T:2015:756, n.° 53 e jurisprudência referida).

27      No caso vertente, em primeiro lugar, importa sublinhar que a argumentação da demandante é, sem dúvida, sumária no que diz respeito à natureza dos danos morais que alega. Contudo, essa argumentação afigura‑se suficiente à luz de todas as explicações e referências que constam da petição.

28      Com efeito, por um lado, a demandante sublinha, nomeadamente, que é «uma empresa cotada na bolsa, cujos êxitos e vicissitudes são atentamente seguidos não só pelos seus próprios trabalhadores mas também pela imprensa, por investidores e pelos seus clientes». A demandante alega que a sua reputação foi desnecessariamente prejudicada.

29      Por outro lado, a demandante sustenta, em substância, que os anos suplementares de incerteza tiveram um impacto negativo na gestão, nos investimentos, na atratividade e na estratégia da empresa. Acrescenta que essa incerteza causou também um dano moral pessoal aos seus trabalhadores e aos seus dirigentes, sujeitos a grande tensão.

30      Por último, a ambiguidade denunciada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia no que se refere à relação estabelecida entre os danos morais alegados e eventuais danos materiais está abrangida pela apreciação do fundamento do pedido de indemnização dos danos morais alegados, designadamente, dos critérios de avaliação e de reparação destes últimos.

31      Em segundo lugar, no que diz respeito à extensão dos danos morais alegados, a demandante sublinha com razão que, por definição, os danos morais que invoca não se prestam a um cálculo exato. Além disso, recorda que se deve ter em conta o contexto e, portanto, a natureza do processo e da empresa em causa para determinar os danos morais alegados. Por último, a demandante avalia os seus danos segundo um método cuja pertinência depende da apreciação do mérito da ação.

32      Deste modo, a petição é suficientemente clara e precisa e a demandante apresentou elementos suficientes para apreciar a natureza e a extensão dos seus alegados danos morais. Esses elementos permitiram, assim, ao Tribunal de Justiça da União Europeia assegurar a sua defesa e permitem que o Tribunal Geral se pronuncie sobre o objeto da presente ação.

33      Tendo em conta o que precede, a exceção de inadmissibilidade suscitada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia deve ser rejeitada.

B.      Quanto ao mérito

34      Por força do artigo 340.°, segundo parágrafo, TFUE, em matéria de responsabilidade extracontratual, a União deve reparar, em conformidade com os princípios gerais comuns aos direitos dos Estados‑Membros, os danos causados pelas suas instituições ou pelos seus agentes no exercício das suas funções.

35      Segundo jurisprudência constante, resulta do artigo 340.°, segundo parágrafo, TFUE que a responsabilidade extracontratual da União e o exercício do direito ao ressarcimento do prejuízo sofrido estão subordinados à reunião de um conjunto de requisitos, a saber, a ilegalidade do comportamento censurado às instituições, a realidade do dano e a existência de nexo de causalidade entre esse comportamento e o dano invocado (acórdãos de 29 de setembro de 1982, Oleifici Mediterranei/CEE, 26/81, EU:C:1982:318, n.° 16, e de 9 de setembro de 2008, KYDEP/Conselho e Comissão, C 120/06 P e C 121/06 P, EU:C:2008:476, n.° 106).

36      Caso não esteja preenchido um desses requisitos, deve a ação ser julgada improcedente na sua totalidade, sem que seja necessário examinar os restantes requisitos da responsabilidade extracontratual da União (acórdão de 14 de outubro de 1999, Atlanta/Comunidade Europeia, C‑104/97 P, EU:C:1999:498, n.° 65; v. igualmente, neste sentido, acórdão de 15 de setembro de 1994, KYDEP/Conselho e Comissão, C‑146/91, EU:C:1994:329, n.° 81). Além disso, o juiz da União não é obrigado a examinar estes requisitos por uma ordem determinada (acórdão de 18 de março de 2010, Trubowest Handel e Makarov /Conselho e Comissão, C‑419/08 P, EU:C:2010:147, n.° 42; v. igualmente, neste sentido, acórdão de 9 de setembro de 1999, Lucaccioni/Comissão, C‑257/98 P, EU:C:1999:402, n.° 13).

37      No presente caso, a demandante sustenta, em primeiro lugar, que a duração do processo T‑54/06 violou as exigências ligadas à observância de um prazo razoável de julgamento (a seguir «prazo razoável de julgamento»). Em segundo lugar, alega que esta violação lhe causou danos que devem ser reparados.

1.      Quanto à alegada violação do prazo razoável de julgamento no processo T54/06

38      A demandante afirma, em primeiro lugar, que, no acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão (C‑50/12 P, EU:C:2013:771), o Tribunal de Justiça já decidiu que a condição relativa à existência de uma violação suficientemente caracterizada de uma regra de direito que tem por objetivo conferir direitos aos particulares estava preenchida no que diz respeito ao prazo de julgamento do processo T‑54/06. Não é, por conseguinte, necessário examinar mais aprofundadamente os critérios de apreciação do caráter razoável de um prazo de julgamento nem a sua aplicação ao presente caso.

39      Em segundo lugar, a demandante alega que, no processo T‑54/06, um prazo de 2 anos e 6 meses era um prazo adequado de julgamento pelo facto de o Tribunal Geral ser uma instância internacional, o que implica uma certa complexidade, devida, nomeadamente, ao regime linguístico. Ora, no presente processo, não há justificação para um prazo de julgamento superior a 2 anos e 6 meses. Deste modo, uma vez que a duração do processo T‑54/06 foi de 5 anos e 9 meses, esta ultrapassou em 3 anos e 3 meses o prazo razoável de julgamento.

40      O Tribunal de Justiça da União Europeia replica que os argumentos da demandante devem ser rejeitados.

41      Em primeiro lugar, recorda que, segundo o acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão (C‑50/12 P, EU:C:2013:771), compete ao Tribunal Geral pronunciar‑se sobre ações como a do caso vertente e verificar se os requisitos para a existência de responsabilidade extracontratual da União se encontram preenchidos.

42      Em segundo lugar, a alegação da demandante segundo a qual, nos processos que dizem respeito à aplicação do direito da concorrência, a duração do processo só é razoável se não ultrapassar um período de 2 anos e 6 meses não apresenta nenhuma relação com a realidade dos processos perante o Tribunal Geral, como demonstra a duração média dos processos nesta jurisdição, observada entre 2006 e 2015 neste tipo de processos. De igual modo, no processo T‑54/06, o tempo que decorreu entre o fim da fase escrita do processo e a abertura da sua fase oral excedeu em apenas 16 meses a duração média desta fase processual, observada entre 2007 e 2010 nos processos que diziam respeito à aplicação do direito da concorrência.

43      Em terceiro lugar, e sobretudo, o caráter razoável de um prazo de julgamento deve ser apreciado em função das circunstâncias específicas de cada processo e, em especial, tendo em conta a eventual existência de um período de inatividade anormalmente longo. Deste modo, no processo T‑54/06, a duração total da tramitação e a duração compreendida entre o fim da fase escrita do mesmo e a abertura da sua fase oral são justificadas pelo caráter volumoso dos processos que dizem respeito à aplicação do direito da concorrência, pela circunstância de terem sido interpostos quinze recursos paralelos, em seis línguas diferentes, contra a Decisão C(2005) 4634 e pelo ambiente multilingue em que opera o Tribunal de Justiça da União Europeia. Além disso, é necessário ter em conta a duração limitada do mandato dos juízes e a doença prolongada de um dos membros da secção à qual o processo T‑54/06 tinha sido atribuído.

44      A este respeito, sublinhe‑se que o artigo 47.°, segundo parágrafo, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia dispõe nomeadamente que «[t]oda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente e imparcial, previamente estabelecido por lei».

45      O referido direito, cuja existência já tinha sido afirmada antes da entrada em vigor da Carta dos Direitos Fundamentais como princípio geral de direito da União, foi considerado aplicável no âmbito de um recurso jurisdicional de uma decisão da Comissão (v. acórdão de 16 de julho de 2009, Der Grüne Punkt — Duales System Deutschland/Comissão, C‑385/07 P, EU:C:2009:456, n.° 178 e jurisprudência referida).

46      No caso presente, decorre de um exame pormenorizado dos autos do processo T‑54/06 que, tal como foi acertadamente sublinhado pelo Tribunal de Justiça no acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão (C‑50/12 P, EU:C:2013:771), a duração do processo T‑54/06, que foi de cerca de 5 anos e 9 meses, não pode ser justificada por nenhuma das circunstâncias específicas do referido processo.

47      Em primeiro lugar, importa salientar que o processo T‑54/06 dizia respeito a um litígio sobre a existência de uma infração às regras de concorrência e que, segundo a jurisprudência, a exigência fundamental da segurança jurídica de que os operadores económicos devem beneficiar assim como o objetivo de garantir que a concorrência não seja falseada no mercado interno revestem um interesse considerável não apenas para o próprio recorrente e para os seus concorrentes mas também para os terceiros, em razão do elevado número de pessoas interessadas e dos interesses financeiros em jogo (acórdão de 16 de julho de 2009, Der Grüne Punkt — Duales System Deutschland/Comissão, C‑385/07 P, EU:C:2009:456, n.° 186).

48      Em segundo lugar, importa constatar que, no processo T‑54/06, decorreu um período de cerca de 3 anos e 10 meses, ou seja, 46 meses, entre o fim da fase escrita do processo marcado pela apresentação da tréplica da Comissão, em 19 de fevereiro de 2007, por um lado, e a abertura, em 30 de novembro de 2010, da fase oral do processo, por outro.

49      Nesse período de tempo, procede‑se, nomeadamente, à síntese dos argumentos das partes, à preparação dos processos, a uma análise da matéria de facto e das questões de direito dos litígios e à preparação da fase oral do processo. Assim, a duração desse período depende, em particular, da complexidade do litígio, do comportamento das partes e da ocorrência de incidentes processuais.

50      No que se refere à complexidade do litígio, antes de mais, deve recordar‑se que o processo T‑54/06 dizia respeito a um recurso interposto contra uma decisão da Comissão relativa a um processo de aplicação do artigo 101.° TFUE.

51      Ora, como decorre dos autos do processo T‑54/06, as ações que tenham por objeto a aplicação do direito da concorrência pela Comissão revelam um grau de complexidade superior a outros tipos de processos, tendo em conta, nomeadamente, a extensão da decisão impugnada, o volume dos autos e a necessidade de fazer uma apreciação pormenorizada dos factos numerosos e complexos, muitas vezes dispersos no tempo e no espaço.

52      Assim, o prazo de 15 meses entre o fim da fase escrita do processo e a abertura da sua fase oral constitui, em princípio, um prazo adequado para tratar os processos relativos à aplicação do direito da concorrência, como o processo T‑54/06.

53      Em seguida, é preciso ter em conta a circunstância de terem sido interpostos vários recursos da Decisão C(2005) 4634.

54      Com efeito, recursos interpostos de uma mesma decisão adotada pela Comissão em aplicação do direito da concorrência da União requerem, em princípio, um tratamento paralelo, inclusive quando esses recursos não sejam apensados. O referido tratamento paralelo justifica‑se, nomeadamente, pela conexão entre esses recursos e pela necessidade de assegurar coerência na análise dos mesmos e na resposta que lhes deva ser dada.

55      Assim, o tratamento paralelo de processos conexos pode justificar o prolongamento por um mês, por processo adicional conexo, do período compreendido entre o fim da fase escrita do processo e a abertura da sua fase oral.

56      No presente caso, foram interpostos quinze recursos contra a Decisão C(2005) 4634. No entanto, por um lado, uma recorrente desistiu do seu recurso contra esta decisão (despacho de 6 de julho de 2006, Cofira‑Sac/Comissão, T‑43/06, não publicado, EU:T:2006:192). Por outro lado, dois dos recursos interpostos contra a Decisão C(2005) 4634 deram origem aos acórdãos de 13 de setembro de 2010, Trioplast Wittenheim/Comissão (T‑26/06, não publicado, EU:T:2010:387), e de 13 de setembro 2010, Trioplast Industrier/Comissão (T‑40/06, EU:T:2010:388).

57      Nestas condições, o tratamento dos doze restantes processos relativos a recursos interpostos da Decisão C(2005) 4634 justificou o prolongamento, por mais 11 meses, no processo T‑54/06.

58      Consequentemente, o prazo de 26 meses (15 meses mais 11 meses) entre o fim da fase escrita do processo e a abertura da sua fase oral era adequado para tratar o processo T‑54/06.

59      Por último, o grau de complexidade factual, jurídica e processual do processo não justifica que, neste caso, seja de admitir uma maior duração. A este respeito, deverá, em especial, referir‑se que, entre o fim da fase escrita do processo e a abertura da sua fase oral, no processo T‑54/06, a tramitação não foi interrompida nem atrasada pela adoção, pelo Tribunal Geral, de qualquer medida de organização do mesmo.

60      No que se refere ao comportamento das partes e à ocorrência de incidentes processuais no processo T‑54/06, o tempo que decorreu entre o fim da fase escrita e a abertura da fase oral no processo T‑54/06 não foi, de modo nenhum, influenciado por tal comportamento ou pela ocorrência de tais incidentes processuais.

61      Por conseguinte, tendo em conta as circunstâncias do processo T‑54/06, o período de 46 meses que decorreu entre o fim da fase escrita e a abertura da fase oral revela um período de inatividade injustificada de 20 meses neste processo.

62      Em terceiro lugar, o exame dos autos do processo T‑54/06 não revelou nenhuma circunstância que permita concluir pela existência de um período de inatividade injustificada, por um lado, entre a data de entrega da petição e a data de entrega da tréplica e, por outro, entre a abertura da fase oral do processo e a prolação do acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667).

63      Decorre daqui que a tramitação seguida no processo T‑54/06 e que terminou com a prolação do acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667), violou o artigo 47.°, segundo parágrafo, da Carta dos Direitos Fundamentais, na medida em que ultrapassou em 20 meses o prazo razoável de julgamento, o que constitui uma violação suficientemente caracterizada de uma regra de direito da União que tem por objetivo conferir direitos aos particulares.

2.      Quanto aos alegados danos e ao eventual nexo de causalidade

64      Segundo jurisprudência constante, os danos cujo ressarcimento é pedido no âmbito de uma ação por responsabilidade extracontratual da União devem ser reais e certos, cabendo ao demandante a respetiva prova (v. acórdão de 9 de novembro de 2006, Agraz e o./Comissão, C‑243/05 P, EU:C:2006:708, n.° 27 e jurisprudência referida). Compete a este último apresentar provas concludentes tanto da existência como da extensão dos danos que invoca (v. acórdão de 16 de setembro de 1997, Blackspur DIY e o./Conselho e Comissão, C‑362/95 P, EU:C:1997:401, n.° 31 e jurisprudência referida).

65      Ainda segundo jurisprudência constante, o requisito relativo ao nexo de causalidade estabelecido no artigo 340.°, segundo parágrafo, TFUE refere‑se à existência de um nexo de causa e efeito suficientemente direto entre o comportamento das instituições e os danos (acórdãos de 18 de março de 2010, Trubowest Handel e Makarov/Conselho e Comissão, C‑419/08 P, EU:C:2010:147, n.° 53, e de 14 de dezembro de 2005, Beamglow/Parlamento e o., T‑383/00, EU:T:2005:453, n.° 193; v. igualmente, neste sentido, acórdão de 4 de outubro de 1979, Dumortier e o./Conselho, 64/76, 113/76, 167/78, 239/78, 27/79, 28/79 e 45/79, EU:C:1979:223, n.° 21). Cabe ao demandante fazer prova da existência de um nexo de causalidade entre o comportamento censurado e o prejuízo invocado (v. acórdão de 30 de setembro de 1998, Coldiretti e o./Conselho e Comissão, T‑149/96, EU:T:1998:228, n.° 101 e jurisprudência referida).

66      No presente caso, a demandante sustenta que a violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 lhe causou danos materiais e morais.

a)      Quanto aos alegados danos materiais e ao eventual nexo de causalidade

67      A demandante sustenta que sofreu danos materiais que consistem em encargos financeiros adicionais que teve de suportar ao longo do período compreendido entre 26 de agosto de 2010, data em que o Tribunal de Justiça deveria ter proferido o seu acórdão, e 26 de novembro de 2013, data em que o Tribunal de Justiça efetivamente proferiu o seu acórdão Kendrion/Comissão (C‑50/12 P, EU:C:2013:771). Segundo a demandante, o montante desses encargos ascende a 2 308 463,98 euros. Esse montante é calculado de acordo com o seguinte método. Numa primeira fase, é necessário adicionar, por um lado, as despesas com a garantia bancária que apresentou para não pagar imediatamente o montante da coima que lhe foi aplicada pela Decisão C(2005) 4634 (a seguir «despesas com a garantia bancária») e, por outro, os juros pagos sobre o montante da coima (a seguir «juros sobre o montante da coima»). Numa segunda fase, é necessário deduzir do resultado desta adição as despesas que a demandante teria suportado se tivesse sido obrigada a pagar a coima em 26 de agosto de 2010.

68      O Tribunal de Justiça da União Europeia alega, em primeiro lugar, que não existe um nexo de causalidade suficientemente direto entre os danos materiais relativos às despesas com a garantia bancária e aos juros sobre o montante da coima, por um lado, e a violação do prazo razoável de julgamento, por outro. Em seu entender, com efeito, antes de mais, estes danos materiais resultam da própria escolha da demandante. Além disso, a existência de um nexo de causalidade não pode ser determinada apenas com base na constatação de que, se o prazo razoável de julgamento não tivesse sido ultrapassado, a demandante não se teria visto na obrigação de pagar despesas com a garantia bancária e juros sobre o montante da coima durante o período em que esse prazo foi ultrapassado.

69      Em segundo lugar, os juros que a demandante teve de pagar não podem, em seu entender, ser qualificados de danos. Com efeito, esses juros representam a compensação pelo facto de a Comissão não ter podido dispor de uma quantia da qual tinha o direito de dispor, e a demandante beneficiaria de um enriquecimento sem causa se lhe fosse concedida uma indemnização de montante equivalente a esses juros. A título subsidiário, o Tribunal de Justiça da União Europeia sustenta que os quadros apresentados em anexo à petição não provam os danos materiais que a demandante sofreu. Precisa que a existência e a extensão dos danos materiais não podem ser determinadas simplesmente segundo critérios de equidade.

1)      Observações preliminares

70      Importa sublinhar que o artigo 2.° da Decisão C(2005) 4634 previa que as coimas aplicadas por esta decisão deviam ser pagas no prazo de três meses a contar da sua notificação. Em aplicação do artigo 86.° do Regulamento (CE, Euratom) n.° 2342/2002 da Comissão, de 23 de dezembro de 2002, que estabelece as normas de execução do Regulamento (CE, Euratom) n.° 1605/2002 do Conselho, que institui o Regulamento Financeiro aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO 2002, L 357, p. 1), o artigo 2.° desta decisão precisava que, no termo desse prazo de três meses, seriam automaticamente devidos juros à taxa aplicada pelo Banco Central Europeu (BCE) às suas operações principais de refinanciamento no primeiro dia do mês em que a referida decisão foi adotada, majorados de três pontos e meio de percentagem, o que corresponde a uma taxa de 5,56%.

71      Nos termos do artigo 299.°, primeiro parágrafo, TFUE, a Decisão C(2005) 4634 constituía título executivo, uma vez que continha, no seu artigo 2.°, uma obrigação pecuniária a cargo da demandante. Por outro lado, a interposição do recurso de anulação desta decisão, ao abrigo do artigo 263.° TFUE, não pôs em causa o caráter executório da referida decisão, na medida em que, nos termos do artigo 278.° TFUE, os recursos interpostos para o Tribunal de Justiça da União Europeia não têm efeito suspensivo.

72      Por carta datada de 13 de dezembro de 2005, a Comissão notificou a Decisão C(2005) 4634 à demandante. Nessa ocasião, a Comissão assinalou que, se a demandante intentasse um processo no Tribunal Geral ou no Tribunal de Justiça, não seriam tomadas medidas de cobrança enquanto o processo estivesse pendente, desde que fossem respeitadas duas condições, antes da data do termo do prazo de pagamento. Em aplicação do artigo 86.°, n.° 5, do Regulamento n.° 2342/2002, essas duas condições eram as seguintes: em primeiro lugar, o crédito da Comissão devia vencer juros a partir da data do termo do prazo de pagamento à taxa de 3,56%; em segundo lugar, antes da data‑limite de pagamento, devia ser prestada uma garantia bancária aceitável pela Comissão, que cobrisse não só a dívida mas também os juros ou majorações da dívida.

73      A demandante decidiu não pagar imediatamente o montante da coima que lhe tinha sido aplicada e apresentar uma garantia bancária, mediante o pagamento de juros à taxa de 3,56%.

74      É à luz destas observações que devem ser examinados os danos materiais alegados e o suposto nexo de causalidade entre esses danos e a violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06.

2)      Quanto ao pagamento de juros sobre o montante da coima

75      Em primeiro lugar, importa observar que, em virtude da aplicação conjugada do artigo 299.°, primeiro parágrafo, TFUE e do artigo 278.° TFUE, referidos no n.° 71, supra, era devido à Comissão o montante da coima aplicada pela Decisão C(2005) 4634, apesar da interposição de um recurso de anulação da referida decisão. Deste modo, os juros sobre o montante da coima, cuja taxa era de 3,56%, devem ser qualificados de juros de mora.

76      Em segundo lugar, há que sublinhar que, ao longo da tramitação do processo T‑54/06, a demandante não pagou o montante da coima nem os juros de mora. Assim, ao longo da tramitação do referido processo, a demandante usufruiu da quantia correspondente ao montante dessa coima acrescida dos juros de mora.

77      Ora, a demandante não apresenta elementos que permitam demonstrar que, durante o período que excedeu o prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06, o montante dos juros de mora, pagos posteriormente à Comissão, foi superior à vantagem de que ela pôde beneficiar devido à fruição da quantia, equivalente ao montante da coima acrescida dos juros de mora. Por outras palavras, a demandante não demonstra que os juros sobre o montante da coima que correram durante o período que corresponde à ultrapassagem do prazo razoável de julgamento eram superiores à vantagem que ela pôde retirar do não pagamento da coima, acrescida dos juros que se encontravam vencidos à data em que ocorreu a violação do prazo razoável de julgamento e dos juros que se venceram enquanto essa violação prosseguia.

78      Esta apreciação não é posta em causa pelo método de cálculo proposto pela demandante, que consistiu em deduzir do montante do dano alegado os custos de financiamento que a mesma teria suportado, no âmbito do financiamento por parte de um banco, se tivesse sido obrigada a pagar a coima em 26 de agosto de 2010.

79      Com efeito, na petição, a demandante não sustenta, em nenhum momento, nem, a fortiori, demonstra, que foi obrigada a recorrer a um financiamento por terceiros, a fim de pagar o montante da coima aplicada na Decisão C(2005) 4634.

80      Tendo em conta o acima exposto, não ficou comprovado que, durante o período que excedeu o prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06, a demandante sofreu danos reais e certos, resultantes do pagamento de juros de mora sobre o montante da coima não paga. O pedido de indemnização pelos pretensos danos que sofreu por esse motivo deve, portanto, ser rejeitado, sem que seja necessário apreciar a existência do nexo de causalidade invocado.

3)      Quanto ao pagamento de despesas com a garantia bancária

81      Em primeiro lugar, no que se refere aos danos, resulta dos autos que a demandante prestou uma garantia bancária e que pagou, sob a forma de comissões trimestrais, despesas com a garantia bancária durante a tramitação no processo T‑54/06.

82      Decorre daqui que a demandante demonstra que sofreu danos reais e certos devido ao pagamento de despesas com a garantia bancária durante o período que excedeu o prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06.

83      Em segundo lugar, no que diz respeito ao nexo de causalidade, importa salientar, por um lado, que, se a tramitação do processo T‑54/06 não tivesse ultrapassado o prazo razoável de julgamento, a demandante não teria sido obrigada a pagar despesas com a garantia bancária durante o período que corresponde a essa ultrapassagem.

84      Deste modo, existe um nexo de causa e efeito entre a violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 e a ocorrência do dano que a demandante suportou em virtude do pagamento, por ela, de despesas com a garantia bancária durante o período que ultrapassou esse prazo razoável de julgamento.

85      Por outro lado, importa salientar que é verdade que o comportamento censurado deve ser a causa determinante do prejuízo (despacho de 31 de março de 2011, Mauerhofer/Comissão, C‑433/10 P, não publicado, EU:C:2011:204, n.° 127, e acórdão de 10 de maio de 2006, Galileo International Technology e o./Comissão, T‑279/03, EU:T:2006:121, n.° 130; v. igualmente, neste sentido, acórdão de 18 de março de 2010, Trubowest Handel e Makarov/Conselho e Comissão, C‑419/08 P, EU:C:2010:147, n.° 61). Por outras palavras, mesmo no caso de uma eventual contribuição das instituições para o prejuízo cuja indemnização é pedida, essa contribuição pode ser demasiado remota devido à responsabilidade que incumbe a outras pessoas, sendo caso disso, à demandante (acórdão de 18 de março de 2010, Trubowest Handel e Makarov/Conselho e Comissão, C‑419/08 P, EU:C:2010:147, n.° 59, e despacho de 31 de março de 2011, Mauerhofer/Comissão, C‑433/10 P, não publicado, EU:C:2011:204, n.° 132).

86      Por outro lado, já foi declarado que um prejuízo alegado, que consiste em despesas com a garantia bancária em que incorreu uma empresa sancionada por uma decisão da Comissão anulada posteriormente pelo Tribunal Geral, não resultava diretamente da ilegalidade dessa decisão, dado que esse prejuízo resultava da própria escolha dessa empresa de constituir uma garantia bancária para não cumprir a obrigação de pagar a coima no prazo fixado pela decisão controvertida [v., neste sentido, acórdão de 21 de abril de 2005, Holcim (Deutschland)/Comissão, T‑28/03, EU:T:2005:139, n.° 123, e despacho de 12 de dezembro de 2007, Atlantic Container Line e o./Comissão, T‑113/04, não publicado, EU:T:2007:377, n.° 38].

87      Contudo, neste caso, importa salientar, em primeiro lugar, que, na data em que a demandante interpôs o seu recurso no processo T‑54/06, em 22 de fevereiro de 2006, e na data em que constituiu uma garantia bancária, a violação do prazo razoável de julgamento era imprevisível. Além disso, a demandante podia legitimamente esperar que o seu recurso fosse tratado num prazo razoável.

88      Em segundo lugar, o prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 foi excedido posteriormente à escolha inicial da demandante de constituir uma garantia bancária.

89      Assim, os factos do presente processo diferem substancialmente dos que foram constatados no acórdão de 21 de abril de 2005, Holcim (Deutschland)/Comissão (T‑28/03, EU:T:2005:139), e no despacho de 12 de dezembro de 2007, Atlantic Container Line e o./Comissão (T‑113/04, não publicado, EU:T:2007:377), referidos no n.° 86, supra. O nexo entre o facto de ter sido excedido o prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 e o pagamento das despesas com a garantia bancária durante o período em que o prazo foi ultrapassado não pode, portanto, contrariamente ao que o Tribunal de Justiça da União Europeia afirma, ter sido quebrado pela escolha inicial da demandante de não pagar imediatamente a coima que lhe foi aplicada pela Decisão C(2005) 4634 e de constituir uma garantia bancária.

90      Decorre daqui que existe um nexo de causalidade suficientemente direto entre a violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 e os danos que a demandante sofreu, em consequência do pagamento de despesas com a garantia bancária durante o período que excedeu o referido prazo.

91      Em terceiro lugar, a demandante afirma que sofreu um dano material que consistiu em encargos financeiros adicionais que teve de suportar durante o período compreendido entre 26 de agosto de 2010 e 26 de novembro de 2013, data em que o Tribunal de Justiça proferiu o seu acórdão Kendrion/Comissão (C‑50/12 P, EU:C:2013:771) (v. n.° 67, supra).

92      A este respeito, antes de mais, há que assinalar que, no seu recurso, a demandante invoca uma violação do prazo razoável de julgamento apenas no processo T‑54/06. Por conseguinte, não invoca, uma violação do prazo razoável de julgamento em razão da duração total do processo T‑54/06 com o processo que deu origem ao acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão (C‑50/12 P, EU:C:2013:771).

93      Consequentemente, no presente caso, foi unicamente constatado que a tramitação no processo T‑54/06 violou o prazo razoável de julgamento (v. n.° 63, supra).

94      Seguidamente, a violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 cessou com a prolação do acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667).

95      Deste modo, a partir de 16 de novembro de 2011, a demandante estava em condições de avaliar a existência de uma violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 e o dano que tinha sofrido em consequência do pagamento de despesas com a garantia bancária durante o período que excedeu o referido prazo.

96      Além disso, no recurso que interpôs em 26 de janeiro de 2012 contra o acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667), a demandante alegou que a morosidade excessiva da tramitação no processo T‑54/06 tinha tido consequências danosas para ela e, por esta razão, pediu a redução do montante da coima que lhe tinha sido aplicada.

97      Por último, a Decisão C(2005) 4634, que aplicou uma coima à demandante, só se tornou definitiva em 26 de novembro de 2013, e a possibilidade oferecida pela Comissão de constituir uma garantia bancária terminou nessa data, devido à escolha da demandante de interpor recurso do acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667).

98      Segue‑se que o pagamento de despesas com a garantia bancária depois da prolação do acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667), que pôs fim à violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06, não apresenta um nexo de causalidade suficientemente direto com essa violação, uma vez que o pagamento dessas despesas decorre da escolha pessoal e autónoma da demandante, posterior à referida violação, de não pagar a coima, de não pedir a suspensão da execução da Decisão C(2005) 4634 e de interpor recurso do acórdão acima referido.

99      Resulta do que precede que existe um nexo de causalidade suficientemente direto entre, por um lado, a violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 e, por outro, os danos que a demandante sofreu antes da prolação do acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T‑54/06, não publicado, EU:T:2011:667), e que consistem no pagamento de despesas com a garantia bancária durante o período que excedeu esse prazo razoável.

4)      Quanto à avaliação dos danos materiais sofridos

100    Em primeiro lugar, importa recordar que a duração do processo T‑54/06 excedeu em 20 meses o prazo razoável de julgamento neste processo (v. n.° 63, supra).

101    Em segundo lugar, por um lado, a demandante precisa, na sua petição, que os danos materiais que sofreu consistem em «encargos financeiros adicionais que teve de suportar no decurso do período considerado, ou seja, o período compreendido entre 26 de agosto de 2010 e 26 de novembro de 2013» (v. n.° 67, supra). Além disso, em apoio do seu pedido de indemnização, fornece informações sobre as despesas com a garantia bancária pagas por si durante esse período.

102    Assim, lido à luz dos fundamentos da petição, o pedido de indemnização formulado pela demandante na primeira das suas pretensões corresponde às despesas em que incorreu a partir de 26 de agosto de 2010.

103    Ora, decorre das normas que regulam o processo perante os órgãos jurisdicionais da União, nomeadamente o artigo 21.° do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e o artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, que o litígio é, em princípio, determinado e circunscrito pelas partes e que o juiz da União não pode conhecer ultra petita (acórdãos de 10 de dezembro de 2013, Comissão/Irlanda e o., C‑272/12 P, EU:C:2013:812, n.° 27, e de 3 de julho de 2014, Electrabel/Comissão, C‑84/13 P, não publicado, EU:C:2014:2040, n.° 49).

104    Deste modo, o Tribunal Geral não se pode desviar do pedido da demandante e decidir oficiosamente ressarcir um dano sofrido antes de 26 de agosto de 2010, ou seja, um dano sofrido durante um período cronologicamente diferente daquele em que a mesma alega ter sofrido um dano.

105    Por outro lado, as despesas com a garantia bancária pagas pela demandante posteriormente a 16 de novembro de 2011 não apresentam um nexo de causalidade suficientemente direto com a violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 (v. n.° 98, supra).

106    Por conseguinte, no presente caso, o dano que pode ser ressarcido corresponde às despesas com a garantia bancária pagas pela demandante entre 26 de agosto de 2010 e 16 de novembro de 2011.

107    Em terceiro lugar, resulta dos documentos apresentados pela demandante que as despesas com a garantia bancária foram pagas trimestralmente. Esses documentos mostram igualmente que, entre 26 de agosto de 2010 e 31 de dezembro de 2011, as despesas com a garantia bancária pagas pela demandante foram as seguintes:

Período

Despesas

26.8.2010 ‑ 31.12.2010


175 709,87


31.12.2010 ‑ 14.3.2011


81 382,15


14.3.2011 ‑ 31.3.2011


18 983,87


31.3.2011 ‑ 30.6.2011


102 533,99


30.6.2011 ‑ 30.9.2011


104 603,82


30.9.2011 ‑ 31.12.2011


105 555,48


Total

588 769,18


108    Decorre daqui que as despesas com a garantia bancária pagas pela demandante durante o período compreendido entre 26 de agosto de 2010 e 16 de novembro de 2011 ascenderam a 588 769,18 euros.

109    Tendo em conta o que precede, deve ser concedida à demandante uma indemnização no montante de 588 769,18 euros, a título de reparação dos danos materiais que lhe foram causados pela violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 e que consistem no pagamento de despesas adicionais com a garantia bancária.

b)      Quanto aos alegados danos morais e ao eventual nexo de causalidade

110    A demandante alega, em primeiro lugar, que, segundo a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, existe uma presunção forte, embora ilidível, segundo a qual a duração excessiva de um processo provoca danos morais. Além disso, a demandante era «uma empresa cotada na bolsa, cujos êxitos e vicissitudes eram atentamente seguidos não só pelos seus próprios trabalhadores mas também pela imprensa, por investidores e pelos seus clientes». Assim, a reputação da demandante foi desnecessariamente prejudicada. Por último, os anos adicionais de incerteza tiveram um impacto negativo na gestão, nos investimentos, na atratividade e na estratégia da empresa. Afirma que, além disso, a incerteza prolongada causou igualmente um dano moral pessoal aos trabalhadores e aos dirigentes da demandante.

111    Em segundo lugar, a demandante sublinha que é difícil fazer uma avaliação precisa dos danos morais alegados, devido à natureza desses danos. Contudo, refere que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem insiste na importância dos processos semelhantes, quando avalia os danos. Deste modo, a melhor referência para avaliar os danos morais sofridos no presente caso são os processos em que o Tribunal Geral ou o Tribunal de Justiça declararam uma violação do prazo razoável e reduziram, a título de «reparação equitativa», a coima aplicada por uma decisão da Comissão por infração às regras de concorrência da União.

112    Nestas condições, a demandante pede, a título principal, uma indemnização no montante de 11 050 000 euros pelo período compreendido entre 26 de agosto de 2010 e 26 de novembro de 2013, o que corresponde à aplicação da taxa de 10%, por cada ano de atraso, ao montante da coima que lhe foi aplicada pela Decisão C(2005) 4634. A título subsidiário, a demandante pede uma indemnização no montante de 1 700 000 euros, que corresponde a 5% do montante da coima que lhe foi aplicada pela Decisão C(2005) 4634. A demandante pede, a título mais subsidiário, uma indemnização num montante fixado pelas partes de acordo com as regras definidas pelo Tribunal Geral ou, a título ainda mais subsidiário, num montante razoável determinado pelo próprio Tribunal Geral.

113    O Tribunal de Justiça da União Europeia responde, em primeiro lugar, que a demandante não faz prova da existência de danos morais. Recorda que incumbe à demandante apresentar prova dos danos por ela alegados. Ora, os danos alegados estão descritos de maneira extremamente vaga, assentam numa confusão entre danos materiais e danos morais e não são apoiados por nenhum elemento de prova. A demandante reclama, ainda, indemnização de caráter punitivo.

114    Em segundo lugar, e a título subsidiário, o Tribunal de Justiça da União Europeia sustenta que a demandante não apresenta prova da existência de um nexo de causalidade entre os alegados danos morais e a alegada inobservância do prazo razoável de julgamento. Com efeito, os alegados danos morais resultam unicamente da infração às regras de concorrência cometida pela demandante. O alegado prazo irrazoável de julgamento não agravou as consequências imateriais da constatação da infração efetuada pela Comissão, na medida em que o Tribunal Geral confirmou essa constatação da existência de infração e o montante da coima aplicada.

115    Em terceiro lugar, e a título ainda mais subsidiário, o Tribunal de Justiça da União Europeia alega que os danos morais reparáveis deveriam ser avaliados em 5 000 euros, no máximo.

116    Há que apreciar, em primeiro lugar, os danos morais alegadamente sofridos pelos dirigentes e pelos trabalhadores da demandante e, em segundo, os danos morais alegadamente sofridos pela própria demandante.

1)      Quanto aos danos morais alegadamente sofridos pelos dirigentes e pelos trabalhadores da demandante

117    Importa salientar que os pedidos formulados na petição se referem apenas aos interesses próprios da demandante e não aos interesses pessoais dos seus dirigentes ou dos seus trabalhadores. Além disso, a demandante não invoca uma cessão de direitos ou um mandato explícito que a habilitasse a apresentar um pedido de indemnização dos danos sofridos pelos seus dirigentes e pelos seus trabalhadores.

118    Deste modo, o pedido de reparação dos prejuízos morais alegadamente sofridos pelos dirigentes e pelos trabalhadores da demandante deve ser julgado inadmissível, pelo facto de não resultar do processo que a demandante estava habilitada, pelos referidos dirigentes e trabalhadores, a apresentar um pedido de indemnização em nome destes (v., neste sentido, despacho de 12 de maio de 2010, CPEM/Comissão, C‑350/09 P, não publicado, EU:C:2010:267, n.° 61, e acórdão de 30 de junho de 2009, CPEM/Comissão, T‑444/07, EU:T:2009:227, n.os 39 e 40).

119    De qualquer modo, a existência de danos sofridos pelos dirigentes ou pelos trabalhadores da demandante não ficou demonstrada. Com efeito, por um lado, a demandante faz simples afirmações e não apresenta nenhum elemento concreto suscetível de demonstrar a angústia e os transtornos suportados pelos seus dirigentes e pelos seus trabalhadores, por causa da violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06. Por outro lado, a demandante não demonstra que os seus dirigentes e os seus trabalhadores sofreram danos pessoais, diretos e distintos dos que ela teria pessoalmente sofrido.

120    Assim sendo, o pedido de indemnização dos danos morais alegadamente sofridos pelos dirigentes e pelos trabalhadores da demandante deve ser julgado inadmissível e, em todo o caso, improcedente.

2)      Quanto aos danos morais alegadamente sofridos pela demandante

121    Decorre da jurisprudência que, na medida em que um demandante não adianta nenhum elemento suscetível de demonstrar a existência do seu prejuízo moral ou imaterial e de determinar a respetiva extensão, incumbe‑lhe, no mínimo, fazer prova de que o comportamento imputado era, pela sua gravidade, suscetível de lhe causar tal prejuízo (v., neste sentido, acórdãos de 16 de julho de 2009, SELEX Sistemi Integrati/Comissão, C‑481/07 P, não publicado, EU:C:2009:461, n.° 38; de 28 de janeiro de 1999, BAI/Comissão, T‑230/95, EU:T:1999:11, n.° 39; e de 16 de outubro de 2014, Evropaïki Dynamiki/Comissão, T‑297/12, não publicado, EU:T:2014:888, n.os 31, 46 e 63).

122    Em primeiro lugar, recorde‑se que a demandante invoca que a sua reputação foi prejudicada, nomeadamente perante os investidores e os seus clientes.

123    No entanto, a argumentação da demandante não é apoiada por elementos de prova suscetíveis de demonstrar que, pela sua gravidade, a violação do prazo razoável de julgamento podia ter um impacto na sua reputação, para além do impacto causado pela Decisão C(2005) 4634.

124    Nestas condições, deverá concluir‑se que a demandante não demonstra que a violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 era suscetível de prejudicar a sua reputação.

125    De qualquer modo, no presente caso, a declaração de violação do prazo razoável de julgamento efetuada no n.° 63, supra, tendo em conta o objeto e a gravidade dessa violação, era suficiente para reparar os danos causados à reputação, alegados pela demandante.

126    Em segundo lugar, a circunstância de a demandante ter sido colocada numa situação de incerteza, nomeadamente quanto ao êxito do seu recurso da Decisão C(2005) 4634, é inerente a qualquer processo judicial. Além disso, a demandante estava necessariamente ciente de que o processo T‑54/06 apresentava um certo grau de complexidade e de que essa complexidade resultava, por um lado, do número de recursos paralelos sucessivamente interpostos no Tribunal Geral, em diferentes línguas de processo, da Decisão C(2005) 4634 e, por outro, da necessidade de este órgão jurisdicional proceder a uma instrução aprofundada de processos volumosos e, em especial, da necessidade de apurar os factos e de proceder a um exame material do litígio.

127    No entanto, a duração total do processo T‑54/06, de 5 anos e 9 meses, excedeu a duração previsível que a demandante podia esperar, nomeadamente no momento em que interpôs o seu recurso. Além disso, a tramitação do processo T‑54/06 revela um período de 3 anos e 10 meses, compreendido entre o fim da fase escrita do mesmo e a abertura da respetiva fase oral. Esses atrasos não são minimamente justificados pela adoção de medidas de organização do processo, de medidas de instrução ou pela ocorrência de incidentes processuais. Por último, a demandante não contribuiu de modo algum, com o seu comportamento, para o prazo de julgamento verificado. Pelo contrário, a demandante manifestou as suas expectativas ao Tribunal Geral, pelo menos em duas ocasiões, e pediu que o processo T‑54/06 fosse tramitado com urgência.

128    Nestas condições, a inobservância do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 era suscetível de colocar a demandante numa situação de incerteza que excedeu a incerteza habitualmente provocada por um processo judicial. Esse estado de incerteza prolongado teve, necessariamente, influência no planeamento das decisões a tomar na gestão dessa empresa e constituiu, portanto, um dano moral.

129    Em terceiro lugar, nas circunstâncias do caso em apreço, os danos morais sofridos pela demandante, devido ao estado de incerteza prolongado em que se viu, não se encontram inteiramente reparados pela declaração da violação do prazo razoável de julgamento.

130    A este respeito, em primeiro lugar, saliente‑se que a indemnização, pedida pela demandante e referida no n.° 112, supra, se destina a obter a reparação de diversos danos morais, designadamente a ofensa à reputação, que não foi demonstrada e que, de qualquer forma, está suficientemente reparada pela declaração da violação do prazo razoável de julgamento (v. n.os 122 a 125, supra).

131    Em segundo lugar, o Tribunal de Justiça afirmou que, tendo em conta a necessidade de fazer respeitar as regras de concorrência do direito da União, o Tribunal de Justiça não pode permitir, unicamente por ter sido violado o prazo razoável de julgamento, que a recorrente ponha em causa o mérito ou o montante de uma coima, quando todos os fundamentos dirigidos contra as conclusões a que se chegou a propósito do montante dessa coima e dos comportamentos que a mesma se destina a punir foram improcedentes (acórdão de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão, C‑50/12 P, EU:C:2013:771, n.° 87; v. igualmente, neste sentido, acórdãos de 16 de julho de 2009, Der Grüne Punkt — Duales System Deutschland/Comissão, C‑385/07 P, EU:C:2009:456, n.° 194, e de 8 de maio de 2014, Bolloré/Comissão, C‑414/12 P, não publicado, EU:C:2014:301, n.° 105).

132    Decorre daqui que a inobservância de um prazo de julgamento razoável, no quadro do exame de um recurso jurisdicional apresentado contra uma decisão da Comissão que aplica uma coima a uma empresa por violação das regras de concorrência do direito da União, não pode levar à anulação, total ou parcial, da coima aplicada por essa decisão (acórdãos de 26 de novembro de 2013, Groupe Gascogne/Comissão, C‑58/12 P, EU:C:2013:770, n.° 78, e de 26 de novembro de 2013, Kendrion/Comissão, C‑50/12 P, EU:C:2013:771, n.° 88; v. igualmente, neste sentido, acórdão de 8 de maio de 2014, Bolloré/Comissão, C‑414/12 P, não publicado, EU:C:2014:301, n.° 107).

133    Ora, um método de cálculo da reparação dos alegados danos morais causados pela inobservância do prazo razoável de julgamento, que consistisse, tal como pede a demandante, em aplicar uma certa percentagem ao montante da coima aplicada pela Comissão, teria por consequência pôr em causa a referida coima, embora não tenha sido determinado se a inobservância do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06 teve influência no montante dessa coima.

134    Os pedidos da demandante com vista à reparação dos alegados danos morais, mediante uma redução do montante da coima aplicada pela Decisão C(2005) 4634, devem, portanto, ser julgados improcedentes.

135    Em terceiro lugar, tendo em conta as apreciações feitas nos n.os 126 a 134, supra, e, em especial, a amplitude da inobservância do prazo razoável de julgamento, o comportamento da demandante e as expectativas que esta manifestou ao longo do processo, a necessidade de fazer respeitar as regras de concorrência da União e a eficácia da presente ação, deve decidir‑se ex aequo et bono que uma indemnização de 6 000 euros, concedida à demandante, constitui uma reparação adequada dos danos por ela sofridos em consequência do estado de incerteza prolongado em que se encontrou durante a tramitação do processo T‑54/06.

c)      Quanto aos juros

136    Na terceira das suas pretensões, a demandante pede ao Tribunal Geral que acresça ao montante da reparação, que lhe poderá ser atribuída, os juros de mora que começariam a vencer a partir de 26 de novembro de 2013.

137    Decorre da jurisprudência que a obrigação de pagar juros de mora nasce, em princípio, a partir do acórdão que estabelece a obrigação de indemnizar os danos (v., neste sentido, acórdão de 26 de junho de 1990, Sofrimport/Comissão, C‑152/88, EU:C:1990:259, n.° 32 e jurisprudência aí referida).

138    Para efeitos da fixação da taxa dos juros de mora, há que ter em conta o artigo 83.°, n.° 2, alínea b), e o artigo 111.°, n.° 4, alínea a), do Regulamento Delegado (UE) n.° 1268/2012 da Comissão, de 29 de outubro de 2012, sobre as normas de execução do Regulamento (UE, Euratom) n.° 966/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, relativo às disposições financeiras aplicáveis ao orçamento geral da União (JO 2012, L 362, p. 1). Em aplicação destas disposições, a taxa de juro a aplicar a créditos não reembolsados no prazo é a taxa aplicada pelo BCE às suas operações principais de refinanciamento, tal como publicada na série C do Jornal Oficial da União Europeia, em vigor no primeiro dia de calendário do mês de vencimento, majorada de três pontos e meio de percentagem.

139    No presente caso, as indemnizações referidas nos n.os 109 e 135, supra, devem ser acrescidas de juros de mora, a contar da prolação do presente acórdão e até integral pagamento.

140    A taxa dos juros de mora será a fixada pelo BCE para as suas operações principais de refinanciamento, majorada de três pontos e meio de percentagem.

d)      Conclusão quanto ao montante das indemnizações e quanto aos juros

141    Tendo em conta tudo o que precede, a presente ação deve ser julgada parcialmente procedente na parte em que se pede a reparação dos danos sofridos pela demandante em razão da violação do prazo razoável de julgamento no processo T‑54/06.

142    A indemnização devida à demandante a título de reparação dos danos por ela sofridos em consequência do pagamento de despesas adicionais com a garantia bancária ascende a 588 769,18 euros.

143    A indemnização devida à demandante a título de reparação dos seus danos morais ascende ao montante de 6 000 euros.

144    O montante das indemnizações referidas nos n.os 142 e 143, supra, será acrescido de juros de mora, nas condições previstas nos n.os 139 e 140, supra.

145    A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

IV.    Quanto às despesas

146    Nos termos do artigo 134.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Ora, no despacho de 6 de janeiro de 2015, Kendrion/União Europeia (T‑479/14, não publicado, EU:T:2015:2), a exceção de inadmissibilidade deduzida pelo Tribunal de Justiça da União Europeia foi julgada improcedente, tendo a decisão quanto às despesas sido reservada para final. Há, portanto, que condenar a União, representada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela demandante e que são referentes à exceção de inadmissibilidade que deu origem ao despacho de 2 de janeiro de 2015, Kendrion/União Europeia (T‑479/14, não publicado, EU:T:2015:2).

147    Nos termos do artigo 134.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas, se as partes obtiverem vencimento parcial. No entanto, se tal se afigurar justificado tendo em conta as circunstâncias do caso, o Tribunal Geral pode decidir que, além das suas próprias despesas, uma parte suporte uma fração das despesas da outra parte.

148    Neste caso, a demandante obteve vencimento parcial nos seus pedidos quanto ao mérito. Contudo, foi vencida, em grande medida, no seu pedido de indemnização. Nestas condições, e tendo em conta as circunstâncias do caso, deve decidir‑se que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

149    Segundo o artigo 138.°, n.° 1, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no processo devem suportar as suas próprias despesas. Deve, portanto, decidir‑se que a Comissão suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção alargada)

decide:

1)      A União Europeia, representada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, é condenada a pagar à Kendrion NV uma indemnização de 588 769,18 euros pelos danos materiais sofridos por esta empresa em consequência da violação do prazo razoável de julgamento no processo que deu origem ao acórdão de 16 de novembro de 2011, Kendrion/Comissão (T54/06, não publicado, EU:T:2011:667).

2)      A União, representada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, é condenada a pagar à Kendrion uma indemnização de 6 000 euros pelos danos morais sofridos por esta empresa em consequência da violação do prazo razoável de julgamento no processo T54/06.

3)      Cada uma das indemnizações referidas nos n.os 1) e 2), supra, será acrescida de juros de mora, a contar da prolação do presente acórdão e até integral pagamento, à taxa fixada pelo Banco Central Europeu (BCE) para as suas operações principais de refinanciamento, majorada de três pontos e meio de percentagem.

4)      A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

5)      A União, representada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas que foram efetuadas pela Kendrion e que são referentes à exceção de inadmissibilidade que deu origem ao despacho de 6 de janeiro de 2015, Kendrion/União Europeia (T479/14, não publicado, EU:T:2015:2).

6)      A Kendrion, por um lado, e a União, representada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, por outro, suportarão as suas próprias despesas referentes à ação que deu origem ao presente acórdão.

7)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas.

Papasavvas

Labucka

Bieliūnas

Kreuschitz

 

Forrester

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 1 de fevereiro de 2017.

Assinaturas


Índice


I. Antecedentes do litígio

II. Tramitação processual e pedidos das partes

III. Questão de direito

A. Quanto à admissibilidade

B. Quanto ao mérito

1. Quanto à alegada violação do prazo razoável de julgamento no processo T54/06

2. Quanto aos alegados danos e ao eventual nexo de causalidade

a) Quanto aos alegados danos materiais e ao eventual nexo de causalidade

1) Observações preliminares

2) Quanto ao pagamento de juros sobre o montante da coima

3) Quanto ao pagamento de despesas com a garantia bancária

4) Quanto à avaliação dos danos materiais sofridos

b) Quanto aos alegados danos morais e ao eventual nexo de causalidade

1) Quanto aos danos morais alegadamente sofridos pelos dirigentes e pelos trabalhadores da demandante

2) Quanto aos danos morais alegadamente sofridos pela demandante

c) Quanto aos juros

d) Conclusão quanto ao montante das indemnizações e quanto aos juros

IV. Quanto às despesas


*      Língua do processo: neerlandês.