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Processos T‑227/01 a T‑229/01, T‑265/01, T‑266/01 e T‑270/01

Territorio Histórico de Álava – Diputación Foral de Álava e o.

contra

Comissão das Comunidades Europeias

«Auxílios de Estado – Benefícios fiscais concedidos por uma entidade territorial de um Estado‑Membro – Crédito fiscal de 45% do montante dos investimentos – Decisões que declaram os sistemas de auxílios incompatíveis com o mercado comum e que ordenam a recuperação dos auxílios pagos – Associação profissional – Admissibilidade – Qualificação dos auxílios como novos ou existentes – Princípio da protecção da confiança legítima – Princípio da segurança jurídica – Princípio da proporcionalidade»

Sumário do acórdão

1.      Tramitação processual – Intervenção – Admissibilidade – Reexame após um despacho anterior de admissibilidade

(Estatuto do Tribunal de Justiça, artigo 40.°, segundo parágrafo)

2.      Tramitação processual – Intervenção – Pessoas interessadas – Associação representativa que tem por objecto a protecção dos seus membros – Admissibilidade em processos que suscitam questões de princípio susceptíveis de afectar os ditos membros

(Estatuto do Tribunal de Justiça, artigos 40.°, segundo parágrafo, e 53.°, primeiro parágrafo)

3.      Tramitação processual – Pedido de intervenção – Requisitos de forma

(Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 116.°, n.° 4, segundo parágrafo)

4.      Recurso de anulação – Pessoas singulares ou colectivas – Actos que lhes dizem directa e individualmente respeito – Decisão da Comissão que declara a incompatibilidade de um regime de auxílios com o mercado comum – Recurso de uma associação profissional de defesa e representação dos seus membros

(Artigo 230.°, quarto parágrafo, CE)

5.      Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Concessão pelas autoridades públicas de uma isenção fiscal a certas empresas – Inclusão

(Artigo 87.°, n.° 1, CE)

6.      Auxílios concedidos pelos Estados – Exame das denúncias – Obrigações da Comissão – Fundamentação

(Artigos 87.°, n.° 2, CE e 253.° CE)

7.      Auxílios concedidos pelos Estados – Afectação das trocas entre Estados‑Membros – Violação da concorrência – Critérios de apreciação – Exame de um regime de auxílios considerado na sua globalidade

(Artigo 87.° CE)

8.      Auxílios concedidos pelos Estados – Afectação das trocas entre Estados‑Membros – Prejuízo para a concorrência – Auxílios de reduzida importância – Auxílios temporários – Irrelevância

(Artigo 87.°, n.° 1, CE)

9.      Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Carácter selectivo da medida – Regulamentação nacional que institui um crédito fiscal

(Artigo 87.°, n.° 1, CE)

10.    Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Auxílios concedidos por entidades regionais ou locais – Inclusão

(Artigo 87.°, n.° 1, CE)

11.    Auxílios concedidos pelos Estados – Conceito – Medida fiscal específica – Carácter selectivo da medida – Justificação assente na natureza ou na economia do sistema fiscal – Exclusão

(Artigo 87.°, n.° 1, CE)

12.    Auxílios concedidos pelos Estados – Proibição – Derrogações – Auxílios que podem ser considerados compatíveis com o mercado comum – Poder de apreciação da Comissão

(Artigo 87.°, n.° 3, CE)

13.    Auxílios concedidos pelos Estados – Auxílios existentes e auxílios novos – Qualificação de auxílio existente – Critérios – Medida de alteração substancial de um regime de auxílios existente – Exclusão

[Artigos 87.° CE e 88.° CE; Regulamento n.° 659/1999 do Conselho, artigo 1.°, alínea b), ii)]

14.    Auxílios concedidos pelos Estados – Auxílios existentes e auxílios novos – Qualificação de auxílio existente – Critérios – Evolução do mercado comum

[Artigos 87.° CE e 88.° CE; Regulamento n.° 659/1999 do Conselho, artigo 1.°, alínea b), v)]

15.    Auxílios concedidos pelos Estados – Procedimento administrativo – Direito de os interessados apresentarem as suas observações

(Artigo 88.° CE; Regulamento n.° 659/1999 do Conselho, artigo 6.°, n.° 1)

16.    Tramitação processual – Intervenção – Petição que tem por objecto apoiar pedidos de uma das partes

(Estatuto do Tribunal de Justiça, artigo 40.°, quarto parágrafo; Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, artigo 116.°, n.° 3)

17.    Auxílios concedidos pelos Estados – Exame pela Comissão – Processo de intervenção anterior à entrada em vigor do Regulamento n.° 659/1999 – Não sujeição a prazos específicos – Limite – Respeito das exigências da segurança jurídica – Obrigação de proceder num prazo razoável a uma investigação prévia aberta na sequência de uma denúncia

(Artigo 88.° CE; Regulamento n.° 659/1999 do Conselho)

18.    Auxílios concedidos pelos Estados – Recuperação de um auxílio ilegal – Auxílio concedido em violação das regras de procedimento do artigo 88.° CE – Eventual confiança legítima dos beneficiários – Protecção – Condições e limites

(Artigo 88.°, n.° 2, primeiro parágrafo, CE)

19.    Auxílios concedidos pelos Estados – Projectos de auxílios – Exame pela Comissão – Fase preliminar e fase contraditória – Respeito de um prazo razoável

(Artigo 88.°, n.os 2 e 3, CE)

20.    Auxílios concedidos pelos Estados – Recuperação de um auxílio ilegal – Violação do princípio da proporcionalidade – Inexistência

(Artigo 88.°, n.° 2, primeiro parágrafo, CE)

1.      O facto de o Tribunal de Primeira Instância ter admitido, por despacho anterior uma intervenção em apoio do pedido de uma parte não impede que se proceda a uma nova apreciação da admissibilidade dessa intervenção.

(cf. n.° 81)

2.      A interpretação ampla do direito de intervenção de associações representativas que têm por objecto a protecção dos seus membros em processos que suscitem questões de princípio susceptíveis de os afectar tem por objectivo permitir apreciar melhor o enquadramento dos processos, evitando, simultaneamente, uma multiplicidade de intervenções individuais que comprometeriam a eficácia e a regular tramitação do processo.

Tem interesse em intervir em recursos de anulação interpostos de decisões da Comissão que declaram certos regimes de isenção fiscal ilegais e incompatíveis com o mercado comum e que ordenam a recuperação dos auxílios pagos a eese título uma organização profissional confederativa intersectorial que tem por objectivo, designadamente, a representação e a representação de empresas, algumas das quais beneficiárias efectivas de auxílios concedidos no âmbito dos referidos sistemas fiscais e que, além disso, participou no procedimento administrativo que levou à adopção dessas decisões.

(cf. n.os 83‑90)

3.      O pedido de intervenção, que deve conter, em conformidade com o artigo 116.°, n.° 4, segundo parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, uma exposição sumária dos fundamentos e argumentos invocados pelo interveniente, deve, tal como a petição inicial, ser suficientemente claro e preciso para permitir que o demandado prepare a sua defesa e que o Tribunal decida a causa, sem mais informações se for caso disso.

A fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, tal como na petição inicial, que os elementos essenciais de facto e de direito em que o pedido de intervenção se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de forma coerente e compreensível, do seu próprio texto. A este respeito, ainda que o corpo da petição possa ser escorado e completado, em pontos específicos, por remissões para passagens de documentos que a ela foram anexados, uma remissão global para outros documentos, mesmo anexos à petição, não pode suprir a ausência dos elementos essenciais da argumentação jurídica, os quais devem constar da petição. Além disso, não compete ao Tribunal procurar e identificar, nos anexos, os elementos que possa considerar constituírem o fundamento da petição, uma vez que os anexos têm uma função puramente probatória e instrumental.

(cf. n.os 94‑97, 100‑101)

Não preenche estes requisitos o pedido de intervenção que faz uma remissão global para petições apresentadas nos processos apensos ao processo em que é exercida a intervenção, sem que resulte do próprio pedido de intervenção, ainda que de forma sumária ou na parte essencial nenhum dos elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia.

4.      Uma associação encarregada de defender os interesses colectivos de empresas só pode, em princípio, interpor recurso de anulação de uma decisão final da Comissão em matéria de auxílios de Estado se essas empresas ou algumas delas tiverem legitimidade activa a título individual ou se essa associação puder fazer valer um interesse próprio.

Uma pessoa singular ou colectiva só pode invocar que o acto em causa lhe diz individualmente respeito se o mesmo acto a atingir em razão de determinadas qualidades que lhe são específicas ou em razão de uma situação de facto que a caracteriza em relação a qualquer outra pessoa e, por isso, a individualiza de modo análogo ao do destinatário. A este respeito, embora os potenciais beneficiários de um regime de auxílios não possam, apenas nessa qualidade, ser considerados individualmente afectados pela decisão da Comissão que declara a incompatibilidade daquele regime com o mercado comum, a situação de uma empresa à qual a decisão em causa não diz apenas respeito na qualidade de empresa potencialmente beneficiária do regime de auxílios em causa mas também na qualidade de beneficiária efectiva de um auxílio individual concedido ao abrigo desse regime de que a Comissão ordenou a recuperação é diferente. Além disso, uma vez que a decisão obriga o Estado‑Membro a adoptar as medidas necessárias para recuperar junto dos respectivos beneficiários os auxílios em causa, deve considerar‑se que essas decisões dizem directamente respeito às empresas que beneficiaram desses auxílios.

(cf. n.os 107‑118)

Por conseguinte, tem legitimidade para recorrer das decisões da Comissão que declaram a ilegalidade e a incompatibilidade com o mercado comum de sistemas de auxílios e que ordenam a anulação e a recuperação dos auxílios pagos, uma associação encarregada de defender os interesses de empresas que se demonstrou, mesmo na fase oral, serem beneficiárias efectivas de um auxílio individual, concedido no âmbito dos ditos sistemas, tendo, portanto, legitimidade activa para interpor recurso por elas próprias.

5.      O conceito de auxílio, na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, pode abarcar não apenas prestações positivas, como subvenções, mas também intervenções que, sob formas diversas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa, pelo que, não sendo subvenções na acepção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos.

Uma medida através da qual as autoridades públicas de um Estado‑Membro atribuem a certas empresas isenções fiscais que, embora não impliquem uma transferência de recursos do Estado, colocam os beneficiários numa situação mais favorável do que a dos outros contribuintes, constitui um auxílio de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

É esse o caso de créditos fiscais que se destinam a incentivar os investimentos que, ao proporcionarem às empresas beneficiárias uma redução dos respectivos encargos fiscais equivalente a uma percentagem do montante do investimento elegível, assim lhes permitindo não pagarem a totalidade do montante final do imposto devido, as coloca numa situação financeira mais favorável do que a dos outros contribuintes. O facto de os referidos créditos fiscais se destinarem a incentivar os investimentos, tendo por objectivo, a termo, gerar receitas, é indiferente a esse respeito, uma vez que o objectivo prosseguido por uma medida não impede que a mesma seja qualificada como auxílio de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE.

(cf. n.os 124‑126,130,184)

6.      A fundamentação exigida pelo artigo 253.° CE deve ser adaptada à natureza do acto em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, a argumentação da instituição autora do acto, por forma a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adoptada e ao órgão competente exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias de cada caso, designadamente do conteúdo do acto, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas a quem o acto diga directa e individualmente respeito possam ter em obter as explicações.

Uma decisão da Comissão que declara incompatível com o mercado comum um sistema de auxílios sob a forma de créditos fiscais contém uma fundamentação suficiente relativa aos efeitos dos referidos auxílios sobre as trocas comerciais e sobre a concorrência quando se verifique que, pelas características de abertura ao exterior e com grande tendência para a exportação da economia do Estado‑Membro em causa, por um lado, reforçam a posição das empresas beneficiárias em relação à de outras empresas concorrentes nas trocas intracomunitárias e afectam, portanto, essas trocas, e por outro, melhoram a rentabilidade dessas mesmas empresas beneficiárias devido ao aumento dos seus resultados líquidos (lucros depois de tributados) e as colocam em condições de competir com as empresas que não beneficiam dos referidos créditos fiscais.

(cf. n.os 136‑138)

7.      Quando um auxílio concedido por um Estado através de recursos estatais reforça a posição de uma empresa relativamente às demais empresas concorrentes nas trocas comerciais intracomunitárias, deve entender‑se que tais trocas comerciais são influenciadas pelo auxílio, mesmo que a empresa beneficiária não participe ela própria nas exportações. Não é necessário que a Comissão demonstre que o auxílio tem uma incidência real sobre as trocas comerciais entre Estados‑Membros e que há uma distorção efectiva da concorrência, mas apenas que verifique se o auxílio é susceptível de afectar essas trocas e de falsear a concorrência.

Quando está em causa um sistema de auxílios, a Comissão pode limitar‑se a estudar as características gerais do sistema em causa, não sendo obrigada a analisar cada caso específico de aplicação, esclarecendo-se que quando esse sistema não foi notificado, não é necessário que a fundamentação a esse respeito contenha uma apreciação actualizada dos seus efeitos sobre a concorrência e sobre as transacções comerciais entre Estados‑Membros.

(cf. n.os 142‑143)

8.      O facto de benefícios fiscais serem temporários, de a sua influência ser reduzida e não determinante, ou ainda de não serem o único elemento a levar em conta não põe em causa a sua qualificação como auxílio de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, uma vez que a jurisprudência não exige que a distorção da concorrência ou a ameaça de que se verifique uma distorção da concorrência e o facto de as transacções comunitárias serem afectadas sejam sensíveis ou substanciais.

(cf. n.° 148)

9.      A especificidade de uma medida estatal, a saber, a sua natureza selectiva, constitui uma das características do conceito de auxílio de Estado, na acepção do n.° 1 do artigo 87.° CE. A este título, cabe verificar se a medida implica ou não benefícios em favor exclusivo de determinadas empresas ou de determinados sectores de actividade.

Constituem uma vantagem selectiva, «a favor de certas empresas», na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, os sistemas fiscais que concedem vantagens sob a forma de créditos fiscais que beneficiam só as empresas que realizem investimentos que ultrapassem um determinado limite e que disponham, portanto, de recursos financeiros significativos, com exclusão de todas as outras empresas, mesmo quando investem, e que além disso confiram um poder discricionário à administração que lhe permita adaptar o montante ou os requisitos de concessão do benefício fiscal em função das características dos projectos de investimento submetidos à sua apreciação.

(cf. n.os 158‑162, 166‑168)

10.    O facto de uma entidade intra‑estatal dispor de autonomia fiscal reconhecida e protegida pela Constituição de um Estado‑Membro não dispensa, no entanto, esta entidade do dever de observância das disposições do Tratado em matéria de auxílios de Estado. O artigo 87.°, n.° 1, CE, ao mencionar os auxílios concedidos pelos «Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam», visa todos os auxílios financiados por fundos públicos. Daqui resulta que as medidas tomadas por entidades intra‑estatais (descentralizadas, federadas, regionais ou outras) dos Estados‑Membros, independentemente do seu estatuto jurídico e da sua designação, são abrangidas, ao mesmo título que as medidas tomadas pelo poder federal ou central, pelo âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE, se os requisitos previstos nesta disposição estiverem preenchidos.

(cf. n.° 178)

11.    No âmbito da apreciação de uma medida estatal enquanto auxílio de Estado, o seu carácter selectivo pode, em certas condições, ser justificado «pela natureza ou economia do sistema». Se é esse o caso, a medida escapa à aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE. Assim, uma medida fiscal específica que seja justificada pela lógica interna do sistema fiscal – como a progressividade do imposto que é justificada pela respectiva lógica redistributiva – ficará de fora do âmbito de aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE

O facto de as medidas fiscais se basearem em critérios objectivos e serem de natureza horizontal não basta para pôr em causa a natureza selectiva e permitir considerar que constituem medidas justificadas pela lógica interna do sistema fiscal em causa, uma vez que só beneficiam as empresas que realizem investimentos que ultrapassem um determinado limite, e que disponham, portanto, de recursos financeiros significativos, com exclusão de todas as outras empresas, mesmo quando investem. Do mesmo modo, o objectivo prosseguido pelas medidas em causa não pode permitir que estas não sejam qualificadas como auxílios de Estado na acepção do artigo 87.°, n.° 1, CE, sem o que bastaria que as autoridades públicas invocassem a legitimidade dos objectivos prosseguidos através da adopção de uma medida de auxílio para que esta pudesse ser considerada uma medida geral, escapando assim à aplicação do artigo 87.°, n.° 1, CE. Ora, esta disposição não faz qualquer distinção em função das causas ou dos objectivos das intervenções estatais, antes as definindo em função dos respectivos efeitos.

(cf. n.os 179‑180, 184‑185)

12.    A Comissão dispõe de um amplo poder de apreciação no domínio do artigo 87.°, n.° 3, CE. A fiscalização exercida pelo juiz comunitário deve, portanto, limitar‑se à verificação da observância das regras de processo e do dever de fundamentação, bem como da exactidão material dos factos, da inexistência de erros manifestos de apreciação e de desvio de poder. Não compete ao Tribunal substituir a apreciação efectuada pela Comissão pela sua própria apreciação económica.

Em matéria de sistemas de auxílios, a Comissão pode limitar‑se a estudar as características gerais do regime em causa, não sendo obrigada a analisar cada caso particular de aplicação.

(cf. n.os 198‑199)

13.    O Tratado institui procedimentos distintos consoante os auxílios sejam existentes ou novos. Ao passo que os auxílios novos, nos termos do artigo 88.°, n.° 3, CE, devem ser notificados previamente à Comissão e não podem ser executados antes que tenha sido adoptada uma decisão final no âmbito do respectivo procedimento, os auxílios existentes, nos termos do artigo 88.°, n.° 1, CE, podem ser regularmente executados enquanto a Comissão não tiver declarado a respectiva incompatibilidade. Por conseguinte, os auxílios existentes só podem ser objecto, se for caso disso, de uma decisão de incompatibilidade que produz efeitos para o futuro.

Por força do artigo 1.°, alínea b), i) do Regulamento n.° 659/1999, que estabelece as regras de execução do artigo 88.° CE, constitui um auxílio existente, designadamente, «qualquer auxílio que já existisse antes da entrada em vigor do Tratado no respectivo Estado‑Membro, isto é, os regimes de auxílio e os auxílios individuais em execução antes da data de entrada em vigor do Tratado e que continuem a ser aplicáveis depois dessa data».

Não pode ser qualificado como auxílio existente, na acepção destas disposições, um sistema fiscal de créditos de imposto instituído depois da entrada em vigor do Tratado no Estado‑Membro em causa, cujas condições de aplicação e, portanto, o círculo de beneficiários, a matéria colectável e a percentagem bem como a duração são modificações substanciais de um sistema existente antes dessa entrada em vigor.

(cf. n.os 228‑234)

14.    O conceito de «evolução do mercado comum» que consta do artigo 1.°, alínea b), v), do Regulamento n.° 659/1999, que estabelece as regras de execução do artigo 88.° CE, pode ser interpretado como uma alteração do contexto económico e jurídico no sector em que foi aplicada a medida em causa. Tal alteração pode resultar, concretamente, da liberalização de um mercado inicialmente fechado à concorrência.

Em contrapartida, este conceito não abrange os casos em que a Comissão muda a sua apreciação apenas com base numa aplicação mais rigorosa das regras do Tratado em matéria de auxílios de Estado.

Daí resulta que, mesmo admitindo demonstrado que a Comissão mudou de doutrina posteriormente à adopção da medida em causa, em relação aos critérios de selectividade aplicados na sua apreciação da referida medida na perspectiva do artigo 87.°, n.° 1, CE, isso não permite demonstrar uma «evolução do mercado comum» na acepção do artigo 1.°, alínea b), v), do Regulamento n.° 659/1999.

(cf. n.os 245, 247, 250)

15.    O artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999, que estabelece as regras de execução do artigo 88.° CE, prevê que, no âmbito do procedimento formal de investigação, os interessados têm a possibilidade de apresentar as suas observações à Comissão. Esta disposição precisa que essas observações devem ser apresentadas num determinado prazo que pode ser prorrogado em casos devidamente justificados, mas não prevê a possibilidade de um interessado apresentar na Comissão, por sua própria iniciativa e depois de expirado o prazo previsto para o efeito, novas observações.

Daí resulta que o facto de a Comissão não ter levado em consideração as observações complementares de uma parte interessada por terem sido recebidas fora de prazo e essa parte nunca ter apresentado um pedido de prorrogação do prazo fixado nos termos do artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999 não pode, na falta de garantias claras de que as observações complementares, apesar de extemporâneas, seriam levadas em consideração sem ter sido apresentado um pedido de prorrogação do prazo, constituir uma violação dos princípios da protecção da confiança legítima ou da boa administração.

Com efeito, o direito de invocar o princípio da protecção da confiança legítima estende-se a qualquer particular que se encontre numa situação da qual resulte que a administração comunitária lhe criou expectativas fundadas, e ninguém pode invocar uma violação deste princípio na falta de garantias precisas dadas pela administração.

Por outro lado, o princípio da boa administração é uma das garantias conferidas pelo ordenamento jurídico comunitário no âmbito dos procedimentos administrativos, princípio que cria a obrigação de a instituição competente analisar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos pertinentes do caso concreto. O artigo 6.°, n.° 1, do Regulamento n.° 659/1999 constitui uma tradução, no âmbito do procedimento de controlo dos auxílios de Estado, desses princípios. No âmbito do procedimento de controlo dos auxílios de Estado, os interessados não podem exigir um debate contraditório com a Comissão, como aquele a que tem direito o Estado‑Membro responsável pela concessão do auxílio, e não podem invocar direitos tão extensos como os direitos de defesa enquanto tais. Os princípios gerais de direito, como o princípio da boa administração, não permitem ao juiz comunitário ampliar os direitos processuais conferidos aos interessados pelo Tratado e pelo direito derivado no âmbito dos procedimentos de controlo dos auxílios de Estado.

(cf. n.os 259‑272)

16.    Embora o artigo 40.°, quarto parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça, aplicável ao Tribunal de Primeira Instância por força do artigo 53.° do referido Estatuto, e o artigo 116.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância não se oponham a que um interveniente apresente argumentos diferentes dos da parte que apoia, apenas o permitem na condição de que não alterem o objecto do litígio e de que a intervenção tenha sempre por objectivo apoiar os pedidos apresentados por esta última.

É admissível um fundamento invocado pelo interveniente que, apesar de ser diferente dos invocados pelo recorrente, está relacionado com o objecto do litígio tal como foi definido por este e não tem, assim, por efeito mudar o respectivo enquadramento.

(cf. n.os 292‑294)

17.    Embora até à data em que o Regulamento n.° 659/1999, que estabelece as regras de execução do artigo 88.° CE, entrou em vigor, a Comissão não estivesse sujeita a prazos específicos no exame das medidas de auxílio, devia, no entanto, fazer com que o exercício das suas competências não fosse indefinidamente protelado, de forma a respeitar a exigência fundamental da segurança jurídica.

Com efeito, na medida em que tem competência exclusiva para apreciar a compatibilidade de um auxílio de Estado com o mercado comum, a Comissão é obrigada, no interesse de uma boa administração das regras fundamentais do Tratado relativas aos auxílios de Estado, a proceder a um exame diligente e imparcial da denúncia da existência de um auxílio incompatível com o mercado comum. Por conseguinte, a Comissão não pode prolongar indefinidamente a análise preliminar de medidas estatais que tenham sido objecto de uma denúncia. O carácter razoável da duração da análise de uma denúncia deve apreciar‑se em função das circunstâncias próprias de cada processo, nomeadamente do contexto deste, das diferentes etapas processuais que a Comissão deve seguir e da complexidade do processo.

Um prazo de 38 meses entre o momento em que a Comissão teve conhecimento dos sistemas de auxílios e a abertura do procedimento formal de investigação, prevista no artigo 88.°, n.° 2, CE, não constitui, no contexto em que os referidos sistemas se inscrevem, um prazo não razoável que fira o procedimento prévio de investigação de violação do princípio da segurança jurídica, ou, portanto, do princípio da boa administração, uma vez que, por um lado, as medidas em causa exigiam uma análise aprofundada da legislação nacional em causa e, por outro, a duração do processo é, pelo menos em parte, imputável às autoridades nacionais, que pediram prorrogações do prazo fixado para responder aos pedidos de informações da Comissão.

(cf. n.os 296‑309)

18.    Uma confiança legítima na regularidade de um auxílio só pode ser invocada se esse auxílio tiver sido concedido com observância do procedimento previsto no artigo 88.° CE. Com efeito, uma autoridade regional e um operador económico diligentes devem, em princípio, poder garantir que esse procedimento foi observado. Estes princípios são aplicáveis inclusivamente quando estiverem em causa sistemas de auxílios, uma vez que o artigo 88.° CE não faz qualquer distinção consoante estejam em causa sistemas de auxílios ou auxílios individuais.

No entanto, não pode ser excluída a possibilidade de os beneficiários de um auxílio ilegal, por não ter sido notificado, invocarem circunstâncias excepcionais que tenham legitimamente originado a sua confiança na regularidade desse auxílio para se oporem ao respectivo reembolso.

(cf. n.os 310‑314)

19.    A razoabilidade da duração do procedimento de controlo em matéria de auxílios de Estado, quer se trate da fase de investigação preliminar quer da fase do procedimento formal de investigação, é apreciada em função das circunstâncias próprias de cada processo, nomeadamente, do respectivo contexto, das diversas etapas processuais que a Comissão seguiu, do comportamento das partes durante o procedimento, da complexidade e das potenciais consequências do processo para as diversas partes interessadas.

Um procedimento de investigação que durou de 5 anos e 1 mês no seu todo, incluindo 38 meses para a fase de investigação preliminar e 23 meses para o procedimento formal de investigação, não tem, tendo em conta o contexto, a complexidade das medidas em causa e as potenciais consequências do processo e tendo em conta que as autoridades nacionais contribuíram, pelo menos em parte, através do seu comportamento, para o prolongamento do procedimento de investigação, um carácter não razoável. Esta duração não constitui uma circunstância excepcional susceptível de gerar uma confiança legítima na regularidade dos auxílios.

(cf. n.os 336‑342, 347)

20.    A supressão de um auxílio ilegal mediante recuperação é a consequência lógica da declaração da respectiva ilegalidade. Por conseguinte, a recuperação de um auxílio de Estado ilegalmente concedido com vista ao restabelecimento da situação anterior não pode, em princípio, ser considerada uma medida desproporcionada relativamente aos objectivos das disposições do Tratado em matéria de auxílios de Estado.

Através da restituição do auxílio, o beneficiário perde a vantagem de que tinha usufruído no mercado relativamente aos seus concorrentes, e a situação anterior ao pagamento do auxílio é reposta. Resulta também desta função da recuperação que, regra geral, salvo circunstâncias excepcionais, a Comissão não ignora o seu poder discricionário quando pede ao Estado‑Membro que recupere os montantes concedidos a título de auxílios ilegais, uma vez que apenas restabelece a situação anterior.

É certo que o princípio da proporcionalidade impõe que os actos das instituições comunitárias não ultrapassem os limites do adequado e necessário para a realização do objectivo pretendido, entendendo‑se que, quando houver possibilidade de escolher entre várias medidas adequadas, se deve recorrer à menos restritiva.

Todavia, a recuperação de auxílios ilegais, uma vez que tem por objectivo o restabelecimento da situação anterior, não pode, em princípio, ser considerada uma medida desproporcionada relativamente aos objectivos das disposições do Tratado em matéria de auxílios de Estado. Tal medida, ainda que aplicada muito tempo depois da concessão dos auxílios em causa, não constitui uma sanção não prevista pelo direito comunitário.

(cf. n.os 372‑375)