Language of document : ECLI:EU:T:2002:42

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

27 de Fevereiro de 2002 (1)

«Marca comunitária - Vocábulo LITE - Respeito do direito de defesa - Fundamento inoperante - Motivo absoluto de recusa - Artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T-79/00,

Rewe Zentral AG, com sede em Colónia (Alemanha), representada por M. Kinkeldey, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), inicialmente representado por V. Melgar e P. von Kapff, e em seguida por V. Melgar e G. Schneider, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objecto um recurso da decisão da Terceira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 27 de Janeiro de 2000 (processo R 275/1999-3) relativo ao registo do vocábulo LITE como marca comunitária,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quarta Secção),

composto por: P. Mengozzi, presidente, V. Tiili e R. M. Moura Ramos, juízes,

secretário: D. Christensen, administradora,

vista a petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 4 de Abril de 2000,

vista a resposta apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 27 de Junho de 2000,

após a audiência de 5 de Julho de 2001,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes do litígio

1.
    Em 29 de Março de 1996, a recorrente apresentou, nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 29 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), alterado, um pedido de marca nominativa comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (a seguir «Instituto»). A data de apresentação do pedido foi fixada em 1 de Abril de 1996.

2.
    A marca cujo registo foi pedido é o vocábulo LITE.

3.
    Os produtos e serviços para os quais foi pedido o registo da marca enquadram-se nas classes 5, 29, 30, 32, 33 e 42 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e Serviços, para efeitos de registo demarcas, de 15 de Junho de 1957, como revisto e alterado, e correspondem, relativamente a cada uma das classes, à seguinte descrição:

«Classe 5:    Alimentos dietéticos e preparações alimentares, adjuvantes dietéticos para os cuidados de saúde, em especial vitaminas, sais minerais e suplementos alimentares revitalizantes; alimentos para bebés.

Classe 29:    Carne, peixe, aves, caça, moluscos e crustáceos (processados), os produtos atrás referidos também preparados; enchidos, produtos à base de carne, de aves e de peixe, caviar; saladas à base de carne, de peixe, de aves e de caça; pastéis de carne, de aves, de caça e de peixe, extractos de carne; frutos, legumes e leguminosas (processados); polpa de frutos e de legumes; saladas finas (gourmet) à base de legumes ou alface; todo o tipo de produtos à base de batata, nomeadamente batatas fritas, croquetes, batatas salteadas, batatas pré-cozinhadas, Kartofellpuffer (bolinhos de batata), Kartoffelklöße (bolas de batata), Rösti (prato tradicional suíço à base de batatas salteadas), bolinhas de batata, batatas fritas de pacote às rodelas, batatas fritas de pacote em palitos; refeições semiconfeccionadas e pré-confeccionadas, nomeadamente sopas (incluindo sopas instantâneas), refeições cujos ingredientes foram todos cozidos no mesmo recipiente, refeições pré-confeccionadas com ou sem adição de água, essencialmente constituídas por um ou mais dos seguintes produtos; carne, peixe, legumes, frutos preparados, queijo, massas alimentares ou arroz; geleias de carne, de frutas e de legumes, doces, ovos, leite e produtos lácteos, em especial leite pasteurizado, leite acidificado, leitelho, iogurte, iogurte de fruta, iogurte com adição de chocolate ou de cacau, bebidas lácteas sem álcool, quefir, natas, queijo fresco batido, sobremesas à base de queijo fresco batido com frutas e ervas aromáticas, sobremesas, essencialmente constituídas por leite e aromatizantes com gelatina e/ou amido enquanto espessantes, manteiga, banha de manteiga, queijo e preparações à base de queijo; gelatinas; óleos e gorduras comestíveis; frutos de casca rija e outros aperitivos, com sal e sem sal, compreendidos na classe 29; todos os produtos atrás referidos (eventualmente) também ultracongelados, conservados, esterilizados ou homogeneizados.

Classe 30:    Pizzas; molhos, molhos para saladas, molhos à base de fruta, ketchup, rábano, alcaparras; café, chá, cacau; chocolate, produtos de chocolate, bebidas em pó contendo cacau; maçapão, nogado, produtos à base de maçapão e de nogado; produtos para barrar o pão, essencialmente constituídos por açúcar, cacau, nogado, leite e/ou gorduras; bombons, incluindo os recheados; açúcar, doçarias, rebuçados, em especial rebuçados de caramelo, de hortelã-pimenta, de fruta, gomas, chupas-chupas, pastilhas elásticas (não medicinais); arroz, tapioca,sucedâneos do café; farinhas e preparações à base de cereais, cereais integrais descascados, nomeadamente arroz, trigo, aveia, cevada, centeio, milho miúdo, milho e trigo sarraceno, os produtos atrás referidos também sob a forma de misturas e outras preparações, em especial farelo de trigo, gérmen de trigo, farinha de milho, sêmola de milho, linhaça, muesli e barras de muesli (essencialmente constituídos por flocos de cereais, frutos secos, frutos de casca rija), cereais, pipocas; pão, pãezinhos, pastelaria e confeitaria; massas alimentares e massas alimentares integrais, em especial talharim; gelados, sorvetes; mel e xarope de melaço; levedura e fermento em pó; sal; mostarda; vinagre; especiarias, condimentos, pimenta em grão; biscoitos salgados, rodelas finas de cereais, aperitivos, compreendidos na classe 30; bebidas à base de chocolate, pudins; todos os produtos atrás referidos (eventualmente) também ultracongelados, conservados, esterilizados ou homogeneizados.

Classe 32:    Cervejas; águas minerais e gasosas e outras bebidas não alcoólicas; bebidas de fruta e sumos de fruta, xaropes e outras preparações para fazer bebidas; bebidas à base de soro de leite, pós para a preparação de bebidas instantâneas.

Classe 33:    Bebidas alcoólicas, em especial vinho, vinhos espumantes, espirituosos e licores.

Classe 42:    Alojamento temporário e restaurantes (alimentação).»

4.
    Em 26 de Maio de 1998, o examinador informou a recorrente que lhe parecia que o vocábulo LITE não podia ser registado porque desprovido de carácter distintivo, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, para os produtos e serviços em causa. A recorrente apresentou as suas observações por carta de 24 de Julho de 1998. Por decisão de 29 de Março de 1999, o examinador recusou o pedido, ao abrigo do artigo 38.° do Regulamento n.° 40/94, pelo motivo indicado na sua comunicação de 26 de Maio de 1998. A decisão do examinador baseia-se, designadamente, numa análise semântica do sinal em causa, segundo a qual este corresponde foneticamente ao termo usual inglês «light». Segundo o examinador, o vocábulo LITE é, por esta razão, directamente descritivo dos produtos e serviços designados no pedido e, por isso, desprovido de carácter distintivo.

5.
    Em 20 de Maio de 1999, a recorrente interpôs recurso no Instituto, ao abrigo do artigo 59.° do Regulamento n.° 40/94, da decisão do examinador.

6.
    Por decisão de 27 de Janeiro de 2000, notificada à recorrente em 4 de Fevereiro de 2000, a Câmara de Recurso confirmou a recusa do examinador, salvo no que diz respeito ao serviço «alojamento temporário», porque o vocábulo LITE era desprovido de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), doRegulamento n.° 40/94, e porque era exclusivamente descritivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento (a seguir «decisão impugnada»).

7.
    Essencialmente, a Câmara de Recurso teceu antes de mais as considerações seguintes. Existe um imperativo geral de disponibilidade das indicações puramente descritivas, na medida em que os concorrentes têm um interesse legítimo em utilizar livremente indicações deste género. Os sinais descritivos só podem ser excluídos da protecção na medida em que a sua monopolização seja contrária a uma necessidade legítima do público, em especial a de livre utilização pelos concorrentes. Este imperativo concreto de disponibilidade deve existir para os produtos e serviços para os quais o registo da marca é pedido. Finalmente, só os sinais e indicações puramente descritivos são susceptíveis de não ser protegidos (n.os 13 a 16 da decisão impugnada). A Câmara de Recurso sublinhou, em seguida, que o vocábulo em causa é exclusivamente composto pelo termo «LITE», que faz referência a uma das características essenciais dos produtos em causa, ou seja, que se trata de produtos de baixas calorias. LITE é, com efeito, uma denominação geral de géneros alimentícios, cujos ingredientes indesejáveis são parcialmente retirados a fim de suscitar o interesse dos consumidores preocupados com a sua alimentação. Daí a Câmara de Recurso deduziu que o vocábulo em causa constitui uma indicação descritiva essencial dos produtos e do serviço em causa, pelo menos na parte anglófona da Comunidade. Por outro lado, em sua opinião, os concorrentes da recorrente devem ter o direito absoluto de utilizar o termo LITE. Por fim, a Câmara de Recurso considerou que o vocábulo em causa é igualmente desprovido do carácter distintivo mínimo requerido, visto que, no comércio em questão, é entendido como uma simples indicação da qualidade especial dos produtos.

Pedidos das partes

8.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão impugnada;

-    condenar o Instituto nas despesas.

9.
    O Instituto conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    negar provimento ao recurso;

-    condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

10.
    A recorrente invoca três fundamentos, baseados em violação, respectivamente, do seu direito de defesa, do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 e do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do mesmo regulamento.

Quanto à violação do direito de defesa

Argumentos das partes

11.
    A recorrente observa que a Câmara de Recurso não a convidou a apresentar as suas observações sobre o motivo de recusa a que se refere o artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 e que não se pôde, pois, pronunciar sobre a eventual existência de um imperativo geral de disponibilidade do vocábulo LITE.

12.
    O Instituto considera que este fundamento é improcedente uma vez que as razões que permitem basear uma recusa no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 e no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento são coincidentes. Sublinha, além disso, que existe uma diferença fundamental, tanto no plano jurídico como factual, entre as circunstâncias do caso em apreço e as do processo que deu lugar ao acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 16 de Fevereiro de 2000, Procter & Gamble/IHMI (Forma de um sabão) (T-122/99, Colect., p. II-265, n.os 39 a 42).

Apreciação do Tribunal

13.
    Saliente-se, à partida, que o princípio da protecção do direito de defesa é consagrado pelo artigo 73.° do Regulamento n.° 40/94, segundo o qual as decisões do Instituto só se podem basear em motivos a respeito dos quais as partes tenham podido pronunciar-se.

14.
    Além disso, o respeito do direito de defesa constitui um princípio geral de direito comunitário, por força do qual os destinatários das decisões das autoridades públicas que afectem, como no caso em apreço, de forma sensível os seus interesses devem ter a possibilidade de dar a conhecer em tempo útil o seu ponto de vista (acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Outubro de 1974, Transocean Marine Paint/Comissão, 17/74, Recueil, p. 1063, n.° 15; Colect., p. 463).

15.
    Por fim, resulta da jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância que as Câmaras de Recurso violam o direito de defesa da parte recorrente, ao não lhe darem a oportunidade de se pronunciar sobre os motivos absolutos de recusa que oficiosamente tiveram em consideração (acórdão Forma de um sabão, já referido, n.° 47).

16.
    No caso em apreço, é pacífico que a decisão impugnada se baseia nos dois motivos absolutos de recusa previstos no artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94, ou seja, a ausência de carácter distintivo e a natureza exclusivamente descritiva do vocábulo LITE, ao passo que a decisão do examinador só se baseava num destes motivos, a saber, a ausência de carácter distintivo do vocábulo em causa.

17.
    Em seguida, na decisão impugnada, a Câmara de Recurso afirma que existe um imperativo de disponibilidade das indicações descritivas em geral e do vocábulo LITE em particular (v., supra, n.° 7). Ora, este argumento, que fundamenta exclusivamente a aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, não era mencionado na decisão do examinador.

18.
    Mesmo admitindo que os elementos susceptíveis de fundamentar os motivos absolutos de recusa referidos pelo artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 40/94 possam sobrepor-se em certa medida, não é menos verdade que estes motivos têm cada um um domínio de aplicação próprio [v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Junho de 2001, DKV/IHMI (EuroHealth), T-359/99, Colect., p. II-1645, n.° 48].

19.
    A Câmara de Recurso cometeu, portanto, uma violação do direito de defesa da recorrente na medida em que teve oficiosamente em consideração o motivo absoluto de recusa referido pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 com base num imperativo de disponibilidade das indicações descritivas em geral e do vocábulo LITE em particular, sem lhe dar a possibilidade de se pronunciar sobre a aplicação, no caso em apreço, deste motivo absoluto de recusa e sobre o raciocínio seguido para tal.

20.
    Nesta medida, cabe acolher o fundamento baseado em violação do direito de defesa.

21.
    Tendo a Câmara de Recurso violado o direito de defesa da recorrente no que respeita ao motivo absoluto de recusa previsto no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, não há que examinar a procedência do mesmo. É, contudo, necessário, verificar se a Câmara de Recurso considerou acertadamente que o vocábulo LITE era desprovido de carácter distintivo.

Quanto à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94

Argumentos das partes

22.
    A recorrente recorda que o Instituto considera que o carácter distintivo pode existir mesmo num grau extremamente reduzido e que toda e qualquer possibilidade, mesmo que muito reduzida, de uma marca indicar a origem dos produtos basta, portanto, para superar o motivo de recusa do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

23.
    Em sua opinião, a função distintiva da marca deve ser apreciada por referência a cada produto concretamente designado no pedido, tendo em conta o tipo de consumidor a que se destina e a natureza do produto. No caso vertente, a recorrente considera que os consumidores pensarão que a marca LITE constitui uma indicação de proveniência comercial.

24.
    O Instituto considera que o sinal LITE é desprovido de carácter distintivo, com base no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, pelas mesmas razões que as referentes ao artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do mesmo regulamento, uma vez que, segundo o Instituto, estes dois motivos absolutos de recusa se sobrepõem.

Apreciação do Tribunal

25.
    Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 é recusado o registo de «marcas desprovidas de carácter distintivo». Por outro lado, o artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 dispõe que «o n.° 1 é aplicável mesmo que os motivos de recusa apenas existam numa parte da Comunidade».

26.
    Considera-se que os sinais a que faz referência o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 são incapazes de exercer a função essencial da marca, isto é, identificar a origem do produto ou do serviço, para assim permitir que o consumidor que adquire o produto ou o serviço que a marca designa faça, no momento de uma aquisição posterior, a mesma escolha se a experiência for positiva ou outra escolha se a experiência for negativa.

27.
    O carácter distintivo de uma marca deve ser analisado, por um lado, relativamente aos produtos ou aos serviços em relação aos quais é pedido o registo do sinal [v. acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 26 de Outubro de 2000, Harbinger/IHMI (TRUSTEDLINK), T-345/99, Colect., p. II-3525, n.° 32] e, por outro lado, relativamente à percepção de um público-alvo que é constituído pelo consumidor destes produtos ou serviços.

28.
    Por fim, resulta da letra do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 que um mínimo de carácter distintivo basta para que o motivo de recusa definido neste artigo não seja aplicável.

29.
    No caso em apreço, a Câmara de Recurso considerou que a marca pedida era desprovida do carácter distintivo mínimo requerido dado que, no mercado em causa, só podia ser entendida como uma simples indicação da qualidade particular dos produtos em causa, e não como uma indicação da origem comercial destes produtos. Além disso, a Câmara de Recurso afirmou que, dada a ausência de elementos de identificação suplementares, à marca pedida faltava também imaginação.

30.
    No que respeita a esta última apreciação, cabe salientar que resulta da jurisprudência do Tribunal de Primeira Instância que a falta de natureza distintiva não pode resultar da ausência de um acréscimo de fantasia [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Abril de 2001, Bank für Arbeit und Wirtschaft/IHMI (EASYBANK), T-87/00, Colect., p. II-1259, n.° 39] ou de um toque mínimo de imaginação [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Janeiro de 2001, Taurus-Film/IHMI (Cine Action), T-135/99, Colect., p. II-379, n.° 31, e Taurus-Film/IHMI (Cine Comedy), T-136/99, Colect., p. II-397, n.° 31]. Com efeito,uma marca comunitária não resulta necessariamente de uma criação e não se baseia num elemento de originalidade ou de imaginação, mas na capacidade de individualizar produtos ou serviços no mercado, relativamente aos produtos ou aos serviços do mesmo género oferecidos pelos concorrentes.

31.
    No caso vertente, há que determinar se o vocábulo LITE permite ao público-alvo individualizar os produtos e o serviço em causa relativamente aos produtos e aos serviços com outra origem comercial.

32.
    Presume-se que o público-alvo é o consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C-342/97, Colect., p. I-3819, n.° 26, e acórdão EuroHealth, já referido, n.° 27). Com efeito, dada a natureza dos produtos e do serviço em causa (os géneros alimentícios e o serviço de restauração, referidos no n.° 3 supra), os mesmos destinam-se a todos os consumidores e, portanto, a consumidores não especializados. Por outro lado, o público-alvo relativamente ao qual cabe apreciar o motivo absoluto de recusa é o consumidor anglófono.

33.
    Verifica-se, em seguida, que o vocábulo LITE é, actualmente, uma denominação genérica, habitual ou comummente utilizada no sector dos produtos e do serviço em causa. Efectivamente, LITE é uma palavra criada a partir da transcrição fonética do vocábulo inglês «light». Assim, segundo a definição do dicionário de língua inglesa The New Shorter Oxford English Dictionary on Historical Principles, 1993, o termo LITE representa uma variante do vocábulo inglês «light» utilizado hoje, principalmente, nos meios comerciais. Ora, em língua inglesa, a pronúncia de «light» e a de LITE são idênticas.

34.
    Sublinhe-se também que os produtos e o serviço relativamente aos quais a natureza distintiva do vocábulo deve ser apreciada correspondem, os primeiros, a um número importante de substâncias (alimentos sólidos e bebidas) que podem ser reagrupados na categoria de géneros alimentícios e, o segundo, a uma prestação de preparação e de venda de alimentos e de pratos cozinhados.

35.
    A este respeito, verifica-se que o vocábulo LITE é comummente utilizado, na parte anglófona da União Europeia, enquanto termo corrente no sector dos produtos alimentares e da restauração para identificar ou caracterizar uma qualidade dos géneros alimentícios.

36.
    Como resulta da decisão impugnada, a Câmara de Recurso considerou, correctamente, que o termo LITE se limitava a informar o público-alvo sobre uma característica dos produtos e do serviço em causa, a saber, o baixo teor em calorias dos géneros alimentícios e dos pratos preparados e servidos pelo serviço de restauração. Com efeito, como o Instituto sublinhou na resposta, as substâncias e os produtos alimentares LITE serão considerados pelo público-alvo pobres em calorias, devido à diminuição da quantidade de gordura ou de açúcar, as bebidasLITE como tendo um fraco teor de álcool ou de açúcar e o serviço de restauração LITE como oferecendo pratos ou refeições que apresentam estas características.

37.
    Perante estes elementos, é necessário afirmar que, no sector alimentar, o vocábulo LITE só tem o significado descrito no número anterior. Assim, o público-alvo, confrontado com os produtos e com o serviço em causa, dará unicamente ao vocábulo LITE o sentido evidente exposto supra, sem pensar num segundo significado do vocábulo como marca.

38.
    Consequentemente, há que sublinhar que o vocábulo LITE não permitirá ao público-alvo distinguir os produtos e o serviço em causa de outros com outra origem comercial quando for chamado a fazer a sua escolha.

39.
    Resulta das considerações expostas que a Câmara de Recurso considerou, correctamente, que o vocábulo LITE era desprovido de carácter distintivo nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), e n.° 2, do Regulamento n.° 40/94.

40.
    Recorde-se que resulta do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 que basta que um dos motivos absolutos de recusa se aplique para que o sinal não possa ser registado como marca comunitária [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 26 de Outubro de 2000, Community Concepts/IHMI (Investorworld), T-360/99, Colect., p. II-3545, n.° 26].

41.
    Por conseguinte, como a Câmara de Recurso não considerou erradamente que o motivo absoluto de recusa referido pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 se aplicava no caso em apreço, o fundamento baseado em violação do direito de defesa é inoperante.

42.
    Daqui resulta que deve ser negado provimento ao recurso.

Quanto às despesas

43.
    Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo, se cada parte obtiver vencimento parcial, ou perante circunstâncias excepcionais, o Tribunal pode determinar que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas.

44.
    Embora, no caso em apreço, se deva negar provimento ao recurso, o Tribunal de Primeira Instância considera que cabe aplicar o artigo 87.°, n.° 3, primeiro parágrafo, do Regulamento de Processo e ordenar que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas, uma vez que o direito de defesa da recorrente foi violado.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quarta Secção)

decide:

1)    É negado provimento ao recurso.

2)    Cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

Mengozzi
Tiili
Moura Ramos

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de Fevereiro de 2002.

O secretário

O presidente

H. Jung

P. Mengozzi


1: Língua do processo: alemão.