Language of document : ECLI:EU:C:2018:946

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

HENRIK SAUGMANDSGAARD ØE

apresentadas em 22 de novembro de 2018(1)

Processo C578/17

Oy Hartwall Ab

Outra parte:

Patentti- ja rekisterihallitus

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo, Finlândia)]

«Reenvio prejudicial — Marcas — Diretiva 2008/95/CE — Artigo 2.o — Artigo 3.o, n.o 1, alínea b), e n.o 3 — Motivos de recusa ou de nulidade — Caráter distintivo — Caráter distintivo adquirido pelo uso — Caráter distintivo intrínseco — Representação gráfica — Marca de cor ou marca figurativa — Marca de cor apresentada como marca figurativa — Requisitos de registo — Categorias de marcas — Tipos de marca — Contradições no pedido de marca»






I.      Introdução

1.        Pelo presente pedido de decisão prejudicial, o Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo, Finlândia) submeteu ao Tribunal de Justiça várias questões prejudiciais relativas à interpretação do requisito da representação gráfica, previsto no artigo 2.o, e do requisito do caráter distintivo, previsto no artigo 2.o e no artigo 3.o, n.o 1, alínea b), e n.o 3, da Diretiva 2008/95/CE (2).

2.        O pedido de decisão prejudicial tem por origem um litígio que opõe a sociedade Oy Hartwall Ab ao Patentti‑ ja rekisterihallitus (Instituto da Propriedade Intelectual, Finlândia). Este último indeferiu um pedido de registo de uma marca de cor apresentado pela Oy Hartwall, com fundamento na falta do caráter distintivo, que é exigido a uma marca de cor, na marca pedida. No referido pedido, a marca de cor era representada graficamente sob a forma de uma figura.

3.        O presente processo coloca assim a questão de saber como se deve interpretar, no âmbito de um eventual registo de uma marca de cor, o requisito da representação gráfica e o requisito do caráter distintivo previstos pela Diretiva 2008/95. Com as suas questões, o órgão jurisdicional de reenvio pretende, mais especificamente, saber se os artigos 2.o e 3.o da diretiva se opõem ao registo de uma marca de cor que foi representada graficamente sob a forma de uma figura no pedido de marca.

4.        Exporei nas presentes conclusões as razões pelas quais considero, por um lado, que o artigo 2.o e o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), e n.o 3, desta diretiva devem ser interpretados no sentido de que é relevante saber se o registo de uma marca é pedido como marca figurativa ou como marca de cor para efeitos de interpretação do requisito do caráter distintivo e, por outro lado, que o artigo 2.o se opõe ao registo de uma marca na qual, como no caso em apreço, a representação gráfica reveste a forma de uma figura, enquanto o requerente solicita o seu registo como marca de cor.

II.    Quadro jurídico

A.      Diretiva 2008/95 (3)

5.        O artigo 2.o, com a epígrafe «Sinais suscetíveis de constituir uma marca», tem a seguinte redação:

«Podem constituir marcas todos os sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente as palavras, incluindo os nomes de pessoas, desenhos, letras, números, a forma do produto ou da respetiva embalagem, na condição de que tais sinais sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas.»

6.        O artigo 3.o, n.o 1, alínea b), e n.o 3, referente aos motivos de recusa ou de nulidade, dispõe:

«1.      Será recusado o registo ou ficarão sujeitos a declaração de nulidade, uma vez efetuados, os registos relativos:

[…]

b)      A marcas desprovidas de caráter distintivo;

[…]

3.      Não será recusado o registo de uma marca ou este não será declarado nulo nos termos das alíneas b), c) ou d) do n.o 1 se, antes da data do pedido de registo e após o uso que dele foi feito, a marca adquiriu um caráter distintivo. Os Estados‑Membros podem prever, por outro lado, que o disposto no primeiro período se aplicará também no caso em que o caráter distintivo tiver sido adquirido após o pedido de registo ou o registo.»

B.      Direito finlandês

7.        A Diretiva 2008/95 foi transposta para o direito finlandês pela Lei n.o 7/1964, de 10 de janeiro de 1964, sobre as marcas, relativamente à versão aplicável no caso em apreço, pela Lei n.o 56/2000.

8.        Nos termos do disposto no artigo 1.o, n.o 2, da Lei sobre as marcas (alterada pela última vez, relativamente à versão aplicável no caso em apreço, pela Lei n.o 39/1993), podem constituir marcas todos os sinais suscetíveis de representação gráfica que sejam adequados a distinguir os produtos colocados no mercado dos produtos de um terceiro. Esta disposição determina, em seguida, que uma marca pode, designadamente, ser constituída por uma palavra, incluindo o nome de uma pessoa, um desenho, uma letra, um número, a forma do produto ou a sua embalagem.

9.        Nos termos do artigo 13.o da Lei sobre as marcas (alterada pela última vez, relativamente à versão aplicável no caso em apreço, pela Lei n.o 56/2000), a marca a registar deve ser adequada a distinguir os produtos do titular da marca dos de um terceiro. Um sinal que indica, exclusiva ou unicamente, através de alterações mínimas ou de complementos, o tipo, a natureza a quantidade, o destino, o preço, o local ou a data de fabrico do produto, não deve ser considerado, por si só, como tendo caráter distintivo. Na apreciação do caráter distintivo de um sinal, há que tomar em consideração, nos termos deste artigo, todas as circunstâncias do processo e, em especial, o tempo de utilização da marca e a sua importância.

III. Litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

10.      Em 20 de setembro de 2012, a sociedade Oy Hartwall requereu ao Instituto da Propriedade Intelectual o registo do sinal a seguir reproduzido. Segundo a representação gráfica do sinal, o mesmo é composto por uma banda azul com uma borda fina cinzenta. O registo do sinal foi pedido como marca de cor para os produtos «águas minerais» abrangidos pela classe 32. No que se refere a cor, a Oy Hartwall indicou o seguinte: as cores do sinal são o azul (PMS 2748, PMS CYAN) e o cinzento (PMS 877).

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11.      No âmbito do seu pedido, a Oy Hartwall apresentou ao Instituto da Propriedade Intelectual um estudo de mercado, em que a marca pedida tinha sido apresentada aos participantes, e um atestado emitido por dois dos seus funcionários relativo à utilização da marca na identificação dos seus produtos.

12.      Na sequência de uma decisão interlocutória do Instituto da Propriedade Intelectual, a Oy Hartwall esclareceu que pedia o registo da marca como marca de cor e não como marca figurativa.

13.      Por decisão de 5 de junho de 2013, o Instituto da Propriedade Intelectual indeferiu o pedido com fundamento na falta de caráter distintivo da marca pedida. Na fundamentação da sua decisão, o Instituto da Propriedade Intelectual refere, nomeadamente, que, de acordo com a sua prática corrente, não pode ser conferido um direito exclusivo ao registo de determinadas cores, se não for apresentada prova consolidada de que as cores cujo registo é pedido adquiriram caráter distintivo para os produtos solicitados, devido a uma utilização duradoura e abrangente.

14.      A decisão do Instituto da Propriedade Intelectual refere que o estudo de mercado estabelece a notoriedade da marca figurativa e não das cores por si só. Segundo a referida decisão, não ficou demonstrado que a combinação de cores pedida fosse utilizada para identificar os produtos propostos pela requerente há tempo suficiente e de modo suficientemente abrangente para adquirir na Finlândia, à data do pedido, caráter distintivo devido a essa utilização.

15.      O Markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos) negou provimento ao recurso interposto pela Oy Hartwall contra a referida decisão.

16.      Na fundamentação da sua decisão, aquele tribunal declarou que a Oy Hartwall pediu o registo de uma combinação de cores. Considerou, nomeadamente, que a representação gráfica do sinal no pedido não continha nenhuma configuração sistemática que associasse as cores em causa de forma previamente determinada e constante. Deduziu daí que a marca de cor pedida não preenchia os requisitos de representação gráfica, aplicáveis ao abrigo do artigo 1.o, n.o 2, da Lei n.o 39/1993 sobre as marcas, para que uma marca possa ser registada.

17.      A Oy Hartwall interpôs recurso da decisão do Markkinaoikeus (Tribunal dos Assuntos Económicos) perante o Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo), o órgão jurisdicional de reenvio.

18.      Este último é chamado a decidir se a marca da Oy Hartwall pode ser registada como marca de cor. A este respeito, interroga‑se sobre a importância a dar, para efeitos de eventual registo da marca, à qualificação de marca de cor constante do pedido.

19.      Por decisão de 28 de setembro de 2017, o Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Para efeitos da interpretação da condição relativa ao caráter distintivo de uma marca, nos termos do artigo 2.o e do artigo 3.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas, é [pertinente] o facto de o registo da marca ser pedido para uma marca figurativa ou para uma marca de cor?

2)      Caso a qualificação da marca como marca de cor ou como marca figurativa seja [pertinente] para efeitos da apreciação do seu caráter distintivo, deve a marca ser registada como marca de cor de acordo com o pedido de registo, apesar da sua representação [sob a forma de] imagem, ou apenas pode ser registada como marca figurativa?

3)      Caso seja possível registar, como marca de cor, uma marca representada [sob a forma de] imagem no pedido de registo, é necessário, para registar como marca de cor uma marca que foi representada graficamente no pedido de registo com a precisão exigida pela jurisprudência do Tribunal de Justiça relativamente ao registo como marca de cor (sem que se trate do registo de uma cor, [em si mesma], como marca, de maneira abstrata, sem forma nem contornos), apresentar prova consolidada de [um uso], como [o exigido] pelo Instituto da Propriedade Intelectual, ou qualquer tipo de prova?»

20.      Foram apresentadas observações escritas pela Oy Hartwall, pelo Governo finlandês e pela Comissão Europeia. O Governo finlandês e a Comissão participaram na audiência realizada em 6 de setembro de 2018.

IV.    Análise

A.      Palavras introdutórias

21.      A questão da competência do Tribunal de Justiça no caso em apreço foi suscitada durante a audiência. A este respeito, indicarei brevemente que o Tribunal de Justiça é competente para responder às questões submetidas. Conforme a minha resposta às questões submetidas irá demonstrar, o presente processo não tem por objeto a interpretação do direito finlandês, mas a interpretação do artigo 2.o e do artigo 3.o da Diretiva 2008/95. Resulta, sem dúvida, do considerando 6 da diretiva que os Estados‑Membros deverão continuar a ter toda a liberdade para fixar as disposições processuais relativas ao registo das marcas. Conforme também referiu o Governo finlandês na audiência, as regras processuais dos Estados‑Membros devem, porém, ser fixadas e aplicadas de modo a assegurar o respeito dos requisitos, em matéria de registo de marcas, que foram harmonizados pela diretiva. Por outras palavras, as autoridades nacionais devem, nomeadamente, zelar pelo respeito dos requisitos exigidos pela diretiva e, em especial, dos requisitos previstos pelos seus artigos 2.o e 3.o, nos termos dos quais todas as marcas devem, para poderem ser registadas, ser suscetíveis de representação gráfica e possuir caráter distintivo.

B.      Quanto às questões prejudiciais

1.      Quanto à relevância de o registo da marca ser pedido como marca figurativa ou como marca de cor para efeitos de interpretação do requisito do caráter distintivo previsto no artigo 2.o e no artigo 3.o, n.o 1, alínea b), e n.o 3, da Diretiva 2008/95 (primeira questão)

22.      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se, para efeitos de interpretação do artigo 2.o da Diretiva 2008/95 e do requisito relativo ao caráter distintivo de uma marca na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea b), da referida diretiva, é relevante saber se o registo da marca é pedido como marca figurativa ou como marca de cor (4).

23.      A título preliminar, saliente‑se que o Governo finlandês indicou na audiência que as autoridades finlandesas têm apenas o poder de se pronunciar sobre se a marca pedida pode ser registada como marca de cor. Conforme foi indicado, isso resulta de, nos termos do direito finlandês, as autoridades finlandesas não poderem modificar a escolha do tipo de marca que foi efetuada no pedido de marca. Tendo a Oy Hartwall requerido o registo de uma marca de cor (5), as autoridades finlandesas não podem, portanto, verificar se a marca poderia, pelo contrário ‑ ou igualmente ‑ ser registada como marca figurativa (6).

24.      Por conseguinte, considerarei, nos desenvolvimentos seguintes, que o objeto da marca pedida é uma marca de cor. Não será assim abordada a questão de saber se a Oy Hartwall pretendia também registar esta marca como marca figurativa (7).

25.      Para analisar a primeira questão, é necessário, como indica a Comissão, responder às duas seguintes questões: em primeiro lugar, a questão de saber se o facto de o registo ter sido pedido como marca figurativa ou como marca de cor é relevante para efeitos da determinação do objeto do sinal para o qual a proteção é requerida (a) e, em segundo lugar, a questão de saber qual é a relevância do pedido de registo como marca figurativa ou como marca de cor na apreciação do caráter distintivo do sinal (b).

a)      Quanto à relevância para efeitos da determinação do objeto do sinal para o qual a proteção é requerida.

26.      Para responder a esta questão, há que descrever o objeto de uma marca de cor e o de uma marca figurativa e, nomeadamente, indicar em que consiste a diferença entre os dois tipos de marca.

27.      Neste contexto, saliente‑se, antes de mais, que a Diretiva 2008/95 assenta na premissa clara calde que existem diferentes tipos de marca.

28.      Nos termos do artigo 2.o da diretiva, com a epígrafe «Sinais suscetíveis de constituir uma marca», podem constituir marcas todos os sinais suscetíveis de representação gráfica, na condição de que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas. Esta disposição enumera, a título de exemplo, «as palavras, incluindo os nomes de pessoas, desenhos, letras, números, a forma do produto ou da respetiva embalagem» (8). Apesar de este artigo não estabelecer uma verdadeira categorização dos diferentes tipos de marca, os sinais enumerados indicam que as marcas podem tomar diferentes formas.

29.      Verifique‑se depois que as marcas figurativas e as marcas de cor podem ambas constituir marcas na aceção do referido artigo 2.o Relativamente às marcas figurativas, estas correspondem na realidade ao exemplo dos «desenhos» constante do artigo 2.o Em contrapartida, as marcas de cor não constam dos exemplos enumerados no artigo 2.o (9), mas o Tribunal de Justiça declarou, nos dois principais acórdãos em matéria de marcas de cor, Acórdão Libertel (10) e Acórdão Heidelberger Bauchemie (11), que marcas de cor podem constituir marcas na aceção do artigo 2.o (12).

30.      Isto leva à questão central, que é a de saber o que se deve entender, especificamente, por «marca de cor» e por «marca figurativa» e em que consiste a diferença entre os dois tipos de marca.

31.      Uma marca de cor é um sinal que consiste numa cor ou numa combinação de cores por si só, sem forma e sem contornos (13).

32.      A particularidade do registo de uma marca de cor reside no facto de a proteção ser concedida à cor ou à combinação de cores por si só. A título de exemplo de marca de cor, refira‑se o recente Acórdão Louboutin e Christian Louboutin (14). O processo refere‑se a uma marca Benelux constituída pela cor vermelha aplicada na sola de um sapato de salto alto. Os contornos do sapato não fazem parte da marca registada (15). No acórdão, o Tribunal de Justiça confirma que o facto de a cor ser aplicada num produto, que constitui assim, na prática, uma delimitação da cor no espaço, não faz com que a forma seja uma parte da marca (16). Por outras palavras, a sola não fazia parte da marca, ainda que a cor registada estivesse delimitada no espaço quando era aplicada na sola de um sapato de salto alto.

33.      Conforme referido pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Libertel, o registo de marcas de cor confere uma proteção muito larga. Com efeito, o número reduzido de cores efetivamente disponíveis tem como resultado que um pequeno número de registos como marcas para serviços ou produtos determinados poderia esgotar toda a paleta de cores disponíveis (17).

34.      Em contrapartida, no que se refere às marcas figurativas, estas são constituídas por um elemento figurativo. No registo das marcas figurativas, é ao elemento figurativo, tal como aparece na representação gráfica da marca, que é concedida proteção. Se a marca figurativa for de cor, é a marca figurativa tal como é representada, nas cores indicadas, que beneficia de proteção a contar do registo (18).

35.      Resulta do acima exposto que as duas categorias de marcas são diferentes, na medida em que uma marca de cor protege o direito de utilizar uma determinada cor ou combinação de cores por si só, isto é, sem contornos, enquanto uma marca figurativa protege o direito de utilizar a marca figurativa, especificamente, tal como é representada graficamente, com contornos e eventuais cores.

b)      Quanto à relevância, para efeitos de apreciação do caráter distintivo do sinal, do pedido de registo como marca figurativa ou como marca de cor.

36.      A questão que se coloca, em seguida, é a de saber se o facto de o requerente pedir a proteção de uma marca de cor ou de uma marca figurativa tem relevância para efeitos da aplicação do requisito do caráter distintivo. A meu ver, a resposta a esta questão resulta da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que exporei a seguir.

37.      Para que uma marca possa ser registada, é essencial, nos termos do artigo 2.o e 3.o, n.o 1, alínea b), e n.o 3, que seja provida de caráter distintivo. A presença do caráter distintivo significa que esta é adequada para identificar o produto ou serviço que visa como sendo proveniente de uma empresa determinada e, assim, para distinguir esse produto ou serviço dos das outras empresas (19). Com efeito, a função essencial da marca é garantir ao consumidor a identidade de origem do produto ou serviço designado pela marca, permitindo‑lhe distinguir, sem confusão possível, este produto ou serviço de outros que tenham proveniência diversa (20).

38.      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o caráter distintivo de uma marca, seja intrínseco [artigo 3.o, n.o 1, alínea b)] ou adquirido pelo uso (artigo 3.o, n.o 3), deve ser apreciado relativamente a dois parâmetros: por um lado, os produtos ou serviços abrangidos por essa marca e, por outro, a presumível perceção dos meios interessados (21).

39.      O Tribunal de Justiça especificou como deve ser determinado na prática o caráter distintivo adquirido pelo uso. A autoridade competente deve efetuar uma análise concreta e apreciar globalmente os elementos que demonstrem que a marca se tornou apta a identificar o produto ou o serviço em causa como sendo proveniente de uma determinada empresa em relação aos meios interessados. Estes elementos devem, além disso, referir‑se a um uso da marca (22). No âmbito desta apreciação, os seguintes elementos podem, designadamente, ser considerados: a quota de mercado detida pela marca em causa, a intensidade, a dimensão geográfica e a duração do uso dessa marca, a importância dos investimentos feitos pela empresa para a promover, a proporção dos meios interessados que identifica o produto ou serviço como sendo proveniente de uma determinada empresa graças à referida marca e as declarações de câmaras de comércio e de indústria ou de outras associações profissionais (23).

40.      Mais, relativamente à questão de saber qual é a correlação entre a aplicação do requisito do caráter distintivo e o facto de o registo de uma marca ser pedido como marca de cor ou como marca figurativa, o Tribunal de Justiça já declarou que nem o artigo 2.o, nem o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), e n.o 3, da Diretiva 2008/95 distinguem as categorias de marcas. Os critérios de apreciação do caráter distintivo das marcas de cor, incluindo aquele que foi adquirido pelo uso, são, assim, em princípio, os mesmos que são aplicáveis às outras categorias de marcas, tais como as marcas figurativas (24). Por conseguinte, não é possível fixar critérios mais estritos, que substituam ou derroguem a aplicação do critério do caráter distintivo para determinados tipos de marcas (25).

41.      No entanto, saliente‑se que resulta igualmente da jurisprudência que é necessário, para determinados tipos de marcas que têm uma natureza específica, considerar as características específicas desses tipos de marcas. É, designadamente, o caso das marcas de cor, relativamente às quais deduzo da jurisprudência do Tribunal de Justiça acima referida que devem ser considerados dois aspetos, devido às suas características específicas.

42.      Em primeiro lugar, o Tribunal de Justiça julgou assim que, salvo em circunstâncias excecionais, nomeadamente quando os mercados são muito específicos, uma marca de cor não tem caráter distintivo ab initio (26). As marcas de cor têm muito raramente caráter distintivo ab initio devido ao facto de os consumidores não terem, geralmente, por hábito presumir a origem dos produtos com base, unicamente, na respetiva cor ou na da sua embalagem. Por conseguinte, a perceção do público relevante não é necessariamente a mesma no caso de uma marca de cor e no caso de uma marca nominativa ou figurativa (27).

43.      Em segundo lugar, o Tribunal de Justiça já declarou que existe um interesse geral em não restringir indevidamente a disponibilidade das cores para os restantes operadores que oferecem produtos ou serviços do tipo daqueles para os quais é pedido o registo (28). Por conseguinte, para apreciar o caráter distintivo de uma marca de cor, há também que verificar se o registo da marca não é contrário a esse interesse geral (29).

44.      Conforme acima exposto, devido às características específicas de uma marca, pode, portanto, ser mais difícil, na prática, provar o caráter distintivo das marcas de determinadas categorias do que o de outras categorias (30). Porém, saliente‑se que o Tribunal de Justiça também sublinhou que tal facto não dispensa os Institutos de marcas de procederem, caso a caso, a um exame in concreto do caráter distintivo da marca pedida (31).

45.      Pelas razões acima expostas, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à primeira questão prejudicial que o artigo 2.o e o artigo 3.o, n.o 1, alínea b), e n.o 3, da Diretiva 2008/95, devem ser interpretados no sentido de que é relevante saber se o registo da marca é pedido como marca figurativa ou como marca de cor, para efeitos de aplicação do requisito do caráter distintivo, na medida em que resulte das características específicas das marcas de cor que estas devem ser consideradas no âmbito da apreciação do caráter distintivo de uma marca de cor. A este respeito, há que ter em conta o facto de, por um lado, uma marca de cor ter raramente caráter distintivo ab initio e, por outro, existir um interesse geral em não restringir indevidamente a disponibilidade das cores para os restantes operadores que oferecem produtos ou serviços do tipo daqueles para os quais é pedido o registo.

2.      Quanto à forma como deve ser registada uma marca quando existe uma discrepância entre a representação gráfica da marca e a escolha da categoria de marca (segunda questão)

46.      Entendo a segunda questão no sentido de que o órgão jurisdicional de reenvio se interroga, em substância, sobre a forma como deve ser registada uma marca quando existe uma discrepância entre a representação gráfica da marca, que reveste a forma de uma figura, e a escolha da categoria de marca que foi efetuada no pedido, que qualifica a marca como marca de cor.

47.      Exporei a seguir a razão pela qual considero que, na hipótese de tal discrepância, a marca não pode ser registada, nem como marca de cor, nem como marca figurativa ao abrigo do direito da união. A este respeito, explicarei, inicialmente, a razão pela qual importa, para efeitos de registo de uma marca, que o seu objeto exato possa ser determinado (a) e exporei, depois, as consequências das contradições que pode conter um pedido, como no caso vertente (b).

a)      Quanto à necessidade de determinar o objeto da marca

48.      É necessário determinar o objeto exato da marca pedida, uma vez que, nos termos do artigo 2.o da Diretiva 2008/95, é essencial, para poder registar uma marca, que esta constitua um sinal suscetível de representação gráfica. O requisito constante do artigo 2.o, nos termos do qual todos os sinais devem ser suscetíveis de representação gráfica, tem por objetivo determinar o objeto exato da marca para a qual o requerente pede proteção. Conforme referido no Acórdão Sieckmann, a representação gráfica da marca deve, para que esta cumpra a sua função, ser, em especial, clara, precisa, completa por si própria, facilmente acessível, inteligível, duradoura e objetiva (32).

49.      O Tribunal de Justiça explicou no referido acórdão a razão de tal interpretação ser exigida para o bom funcionamento do sistema de registo das marcas (33). Por um lado, as autoridades competentes devem conhecer com clareza e precisão a natureza dos sinais constitutivos de uma marca, de maneira a poderem cumprir as suas obrigações relativas ao exame prévio dos pedidos de registo bem como à publicação e à manutenção de um registo adequado e preciso das marcas. Por outro lado, os operadores económicos devem poder certificar‑se com clareza e precisão dos registos efetuados ou dos pedidos de registo formulados pelos seus concorrentes atuais ou potenciais e beneficiar, assim, de informações pertinentes sobre os direitos de terceiros (34).

50.      Por conseguinte, é em função da determinação do objeto exato de uma marca que todos os outros requisitos do eventual registo da marca e, nomeadamente, o do seu caráter distintivo, devem ser apreciados.

51.      Se é fundamentalmente exigido, para todas as marcas, que sejam suscetíveis de representação gráfica (35), saliente‑se que o objeto exato de certos tipos de marcas não pode, na prática, ser determinado apenas com base na reprodução gráfica da marca pedida. Se a reprodução gráfica de uma marca figurativa a cores indica seguramente de forma precisa o elemento cuja proteção é requerida, ou seja, a marca figurativa a cores, não é esse o caso das marcas de cor.

52.      No Acórdão Libertel, que versa sobre a possibilidade de registar uma marca de cor constituída por uma única cor, o Tribunal de Justiça declarou, assim, que uma simples amostra de uma cor não preenche por si só o requisito da representação gráfica previsto no artigo 2. o da diretiva, designadamente, porque uma amostra de uma cor pode alterar‑se com o tempo (por exemplo, pode desbotar). Uma amostra de uma cor não permite, assim, determinar o objeto exato de uma marca de cor. Em contrapartida, o requisito previsto no artigo 2. o pode mostrar‑se preenchido se a amostra de uma cor for completada por uma descrição verbal da marca de cor, desde que a descrição seja clara e precisa, ou por um código de identificação internacionalmente reconhecido, dado que estes códigos são considerados precisos (36).

53.      Relativamente às marcas de cor constituídas por uma combinação de cores, o Tribunal de Justiça declarou, ademais, no Acórdão Heidelberger Bauchemie, que ‑ para satisfazer o requisito de clareza previsto no artigo 2.o ‑ um pedido de registo de uma combinação de cor deve ainda comportar uma disposição sistemática que associe as cores em causa de forma predeterminada e constante (37). A disposição sistemática visa determinar de forma precisa a combinação exata das cores (38).

54.      Acrescente‑se, a este respeito, que, antes de poder pronunciar‑se sobre a questão de saber se o objeto de uma marca de cor pedida pode ser determinado com a clareza exigida pelos Acórdãos Libertel (39) e Heidelberger Bauchemie (40), uma autoridade deve, naturalmente, poder determinar se se trata ou não de uma marca de cor.

55.      No caso vertente, o pedido da Oy Hartwall parece, neste ponto, contraditório, o que é, aliás, referido na segunda questão do órgão jurisdicional de reenvio. Com efeito, se a representação gráfica da marca pedida é a de uma marca com contornos na forma de uma figura (uma banda azul com uma borda fina cinzenta), a Oy Hartwall indicou, na descrição que juntou (que especificava os códigos internacionais das cores utilizadas) e na qualificação, que se tratava de uma marca de cor.

56.      Relativamente à representação gráfica da marca de cor pedida, saliento que, em princípio, é, na verdade, possível representar graficamente uma marca de cor com contornos. Assim é quando a representação gráfica ilustra a forma como será aplicada a marca de cor nos produtos ou serviços da empresa em causa. A título de exemplo, remeto para o Acórdão Louboutin e Christian Louboutin, acima referido (41). A representação gráfica da marca de cor em causa, reproduzida no n.o 8 do acórdão, é constituída pelo desenho de um sapato de salto alto em cuja sola é aplicada a cor vermelha em causa. Foi especificado na descrição da marca de cor que os contornos do sapato não faziam parte da marca e serviam unicamente para evidenciar o local da marca. Por conseguinte, apesar da representação gráfica da marca ter contornos (a forma de um sapato, incluindo a forma da sua sola), esses contornos não faziam parte da marca, o que, aliás, foi confirmado no acórdão pelo Tribunal de Justiça, conforme referi no n.o 32 das presentes conclusões.

57.      Se a marca pedida, no caso em apreço, fosse objeto de uma representação gráfica análoga, a representação gráfica deveria ilustrar, neste caso, a forma como é aposta a marca de cor pedida nos produtos da Oy Hartwall que são, no presente processo, garrafas de água. Ora, conforme foi também salientado pela Comissão e pelo Governo finlandês, a representação gráfica da marca é a ilustração não de uma garrafa, mas de uma fita. Isso leva‑me a concluir que o pedido de marca da Oy Hartwall é contraditório na medida em que os contornos utilizados nem sequer são suscetíveis de ilustrar a maneira como a marca de cor deve ser utilizada nos produtos indicados.

b)      Consequências das contradições no pedido de registo

58.      Considero, como também foi sustentado pela Comissão e pelo Governo finlandês, que o artigo 2.o da Diretiva 2008/95 se opõe a que uma marca possa ser registada como marca de cor quando haja uma discrepância como a do caso vertente.

59.      Com efeito, o pedido de marca não permite determinar se o objeto exato do pedido é uma marca de cor ou uma marca figurativa. Por conseguinte, não há certeza no que se refere ao objeto em função do qual devem ser apreciados os outros requisitos materiais previstos na referida diretiva, nomeadamente o requisito do caráter distintivo. Acresce o facto de os poderes públicos consultarem os registos das marcas utilizando as diferentes categorias de marcas do registo. Também assim é no registo das marcas finlandesas, em que pude constatar que é possível apresentar pedidos para diferentes categorias de marcas e, nomeadamente, para a categoria das marcas figurativas e para a das marcas de cor.

60.      Neste contexto, se uma marca fosse registada como marca de cor, embora tendo, na sua representação gráfica, a aparência de uma marca figurativa, tal constituiria uma fonte de confusão para os poderes públicos e para as empresas concorrentes. Subsistiria, assim, uma dúvida quanto à questão de saber qual o elemento ‑ a marca de cor ou a marca figurativa ‑ que é protegido pelo registo. Assim, partilho da opinião da Comissão e do Governo finlandês segundo a qual o objetivo prosseguido pelo requisito da representação gráfica previsto no artigo 2.o, que é, conforme especificado no Acórdão Sieckmann (42), que o objeto da marca possa ser determinado de forma clara e precisa, não pode, portanto, ser atingido no caso de um pedido como o do caso vertente.

61.      Esta interpretação do artigo 2.o é também corroborada pelo Acórdão do Tribunal de Justiça no processo Shield Mark (43). Este processo incide, nomeadamente, sobre a questão de saber quais os requisitos necessários para que uma marca sonora (44) seja suscetível de representação gráfica na aceção do artigo 2.o da diretiva. O Tribunal de Justiça declarou, designadamente, neste acórdão, que um sinal cuja representação gráfica é constituída por notas musicais ou linguagem escrita não pode ser registado como marca sonora quando o requerente não precisou, no seu pedido, que o sinal apresentado se deve entender como um sinal sonoro. Efetivamente, conforme referido pelo Tribunal de Justiça, em tal situação, a autoridade competente e o público têm razão em considerar, devido ao registo da marca, que se trata de uma marca nominativa ou figurativa, tal como representada graficamente no pedido (45).

62.      Pelas razões expostas nos n.os 59 e 60 das presentes conclusões, as mesmas considerações valem, a meu ver, para um pedido de marca em que a representação gráfica reveste a forma de uma figura, mas que indica, na qualificação e descrição que o acompanham, que a marca é uma marca de cor. Apesar de o Acórdão Shield Mark ter por objeto uma imprecisão no pedido e não uma verdadeira contradição, a conclusão constante desse mesmo acórdão vale a fortiori em caso de contradição (46).

63.      Se as autoridades nacionais devem determinar o objeto exato de uma marca pedida e se o requerente pretende solicitar a proteção de uma marca de cor, é, por conseguinte, essencial que o pedido de marca seja concordante, isto é, que o registo da marca ‑ em conformidade com a sua representação gráfica, incluindo a qualificação da marca e a descrição junta ‑ seja pedido como marca de cor. Com efeito, só assim as autoridades e o público podem, por um lado, saber que o requerente solicita a proteção de uma marca de cor e não de uma marca figurativa e, por outro, determinar o objeto exato da marca de cor.

64.      Proponho, assim, ao Tribunal de Justiça que responda à segunda questão prejudicial que artigo 2.o da Diretiva 2008/95 deve ser interpretado no sentido de que esta disposição se opõe a que uma marca possa ser registada, sempre que não seja possível, devido a contradições no pedido, determinar o objeto exato da proteção solicitada pelo requerente. Tal acontece, por exemplo, num pedido de registo de marca como marca de cor quando esta é representada graficamente como uma marca figurativa.

3.      Quanto à prática do Instituto da Propriedade Intelectual (terceira questão)

65.      Entendo a terceira questão no sentido de que o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância ‑ em caso de resposta afirmativa à segunda questão e, portanto, caso seja possível, em princípio, registar a marca em causa como marca de cor ‑, se a jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de caráter distintivo das marcas de cor se aplica a tal marca e, se for o caso, se a prática do Instituto da Propriedade Intelectual está conforme a esta jurisprudência.

66.      Tendo em conta que proponho ao Tribunal de Justiça que seja dada uma resposta negativa à segunda questão, não é, a meu ver, necessário responder à terceira questão. Na eventualidade de o Tribunal de Justiça responder afirmativamente à segunda questão, exponho, contudo, as considerações seguintes a título subsidiário.

67.      A presente questão tem por objeto a apreciação, pelo Instituto da Propriedade Intelectual, do caráter distintivo adquirido pelo uso da marca pedida. Resulta, a este respeito, da decisão de reenvio que o Instituto da Propriedade Intelectual refere, na fundamentação da sua decisão de indeferimento do pedido, que «de acordo com a sua prática corrente, não pode ser conferido um direito exclusivo ao registo de determinadas cores, se não for apresentada prova consolidada de que as cores, cujo registo é pedido, adquiriram caráter distintivo para os produtos solicitados, devido a uma utilização duradoura e abrangente» (47).

68.      Para responder a esta questão, é necessário verificar, em primeiro lugar, se a jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de caráter distintivo das marcas de cor (Acórdãos Libertel (48) e Heidelberger Bauchemie (49)) é aplicável a tal marca.

69.      Tendo em conta que a questão parte da hipótese de que a marca é uma marca de cor e que se presume, assim, que o objeto da marca é uma cor ou combinação de cores sem contornos, há que lhe dar uma resposta afirmativa, conforme foi também referido pelo Governo finlandês e pela Comissão.

70.      Isto significa concretamente que se deve, para efeitos de apreciação do caráter distintivo da marca de cor, ter em conta as características específicas das marcas de cor. Conforme referi nos n.os 42 e 43 das presentes conclusões, isto implica, por um lado, que se deve considerar o facto de uma marca de cor raramente ter um caráter distintivo intrínseco e, por outro, que há que ter em conta o interesse geral em não restringir indevidamente a disponibilidade das cores para os restantes operadores (50).

71.      Em segundo lugar, deve‑se verificar se a prática do Instituto da Propriedade Intelectual é conforme à jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de marcas de cor.

72.      Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio decidir esta questão de forma definitiva, tendo em conta, por um lado, os ensinamentos retirados da jurisprudência do Tribunal de Justiça, expostos nos n.os 38 a 44 das presentes conclusões, e, por outro, todas os elementos factuais pertinentes relativos à prática do Instituto da Propriedade Intelectual (51).

73.      Em relação ao caráter distintivo adquirido pelo uso, há que sublinhar que o Instituto deve proceder a uma análise concreta e global de todos os elementos que demonstrem que a marca se tornou apta a identificar o produto ou serviço em causa como sendo proveniente de uma determinada empresa (52). Neste contexto, resulta do Acórdão Oberbank que é contrário à Diretiva 2008/95 basear‑se unicamente no resultado de uma sondagem de opinião para apreciar se uma marca adquiriu caráter distintivo pelo uso. O Tribunal de Justiça declarou neste acórdão que, ainda que uma sondagem de opinião possa ser um dos elementos desta apreciação, o resultado dessa sondagem de opinião não constitui o único elemento determinante (53).

74.      Proponho, assim, ao Tribunal de Justiça, a título subsidiário, que responda à questão prejudicial submetida que, se o registo de uma marca for pedido como marca de cor, há que ter em conta, para efeitos de apreciação do caráter distintivo da marca pedida, as características específicas das marcas de cor. A este respeito, há que ter em conta o facto de, por um lado, uma marca de cor raramente ter caráter distintivo ab initio e, por outro, existir um interesse geral em não restringir indevidamente a disponibilidade das cores para os restantes operadores que oferecem produtos ou serviços do tipo daqueles para os quais é pedido o registo. Se as autoridades competentes considerarem que a marca de cor pedida tem um caráter distintivo intrínseco, a prova do uso da marca não é necessária. Pelo contrário, se a marca de cor não tiver um caráter distintivo intrínseco, há que verificar se adquiriu caráter distintivo pelo uso. No âmbito desta apreciação, há que proceder a uma análise concreta dos elementos que demonstrem que a marca se tornou apta a identificar o produto ou serviço em causa como sendo proveniente de uma determinada empresa. Estes elementos devem, além disso, referir‑se a um uso da marca e, no âmbito dessa apreciação, os seguintes elementos podem, designadamente, ser considerados: a quota de mercado detida pela marca em causa, a intensidade, a dimensão geográfica e a duração do uso dessa marca, a importância dos investimentos feitos pela empresa para a promover, a proporção dos meios interessados que identifica o produto ou serviço como sendo proveniente de uma determinada empresa graças à referida marca e as declarações de câmaras de comércio e de indústria ou de outras associações profissionais.

V.      Conclusão

75.      À luz das considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda do seguinte modo às questões submetidas pelo Korkein hallinto‑oikeus (Supremo Tribunal Administrativo, Finlândia):

1)      Para efeitos de interpretação do artigo 2.o da Diretiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (versão codificada) e do requisito relativo ao caráter distintivo de uma marca na aceção do artigo 3.o, n.o 1, alínea b), e n.o 3, da referida diretiva, é relevante saber se o registo da marca é pedido como marca figurativa ou como marca de cor, na medida em que resulte das características específicas das marcas de cor que estas devem ser consideradas no âmbito da apreciação do caráter distintivo de uma marca de cor. A este respeito, há que ter em conta o facto de, por um lado, uma marca de cor ter raramente caráter distintivo ab initio e, por outro, existir um interesse geral em não restringir indevidamente a disponibilidade das cores para os restantes operadores que oferecem produtos ou serviços do tipo daqueles para os quais é pedido o registo.

2)      O artigo 2.o da Diretiva 2008/95 deve ser interpretado no sentido de que esta disposição se opõe ao registo de uma marca, sempre que não seja possível, devido a contradições no pedido, determinar o objeto exato da proteção solicitada pelo requerente. Tal acontece, por exemplo, num pedido de registo de marca como marca de cor quando esta é representada graficamente como uma marca figurativa.


1      Língua original: dinamarquês.


2      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 2008, L 299, p. 25) (a seguir «Diretiva 2008/95»).


3      A Diretiva 2008/95 revogou e substituiu a Diretiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1). O artigo 2.o e o artigo 3.o da Diretiva 2008/95, cuja interpretação é pedida no presente processo, reproduzem integralmente o artigo 2.o e o artigo 3.o da Diretiva 89/104. Por conseguinte, a jurisprudência referente à Diretiva 89/104 é relevante no caso em apreço. A Diretiva 2008/95 foi substituída pela nova diretiva em matéria de marcas, a Diretiva (UE) 2015/2436 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2015, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 2015, L 336, p. 1), cujo prazo de transposição termina em 14 de janeiro de 2019.


4      Na formulação da sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio indica apenas o requisito do caráter distintivo que resulta do artigo 2.o e do artigo 3.o, n.o 1, alínea b), da diretiva, isto é, o caráter distintivo dito «intrínseco». Uma vez que o caráter distintivo adquirido pelo uso (artigo 3.o, n.o 3, da diretiva) está também no centro do litígio nacional que deu origem à questão prejudicial, alegando a Oy Hartwall que a marca pedida possui, simultaneamente, um caráter distintivo intrínseco e um caráter distintivo adquirido pelo uso, incluo, também, o artigo 3.o, n.o 3, na minha resposta.


5      V. n.os 10 e 12 das presentes conclusões.


6      Mais, resulta apenas da decisão de reenvio que o órgão jurisdicional de reenvio deve, no caso em apreço, decidir se a marca pedida «representada sob a forma de um desenho de cor deve ser registada como marca de cor».


7      Tal poderia ser deduzido pelo facto de — apesar do registo da marca ter sido requerido como marca de cor — resultar da decisão de reenvio que a Oy Hartwall alega, por um lado, que não reivindicou a proteção apenas «para as cores azuis ou cinzentas de todas as formas possíveis» e, por outro, que «a proteção da marca só é reivindicada para a representação gráfica tal como consta do pedido de marca, e não para a variação infinita de cores que contém».


8      O facto de os sinais enumerados no artigo 2.o constituírem apenas exemplos e a lista não ser, portanto, exaustiva, é corroborado não só pela redação do artigo 2.o, como também pelo considerando 8 da diretiva. Este considerando enuncia que «[a] realização dos objetivos prosseguidos pela aproximação pressupõe que a aquisição e a conservação do direito sobre a marca registada sejam, em princípio, subordinadas às mesmas condições» e que «[p]ara o efeito, convém elaborar uma lista ilustrativa dos sinais suscetíveis de constituir uma marca desde que sejam adequados a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas». O artigo 2.o da diretiva contém a lista ilustrativa prevista no considerando 8.


9      Saliento que as cores são explicitamente indicadas, a título de exemplo de marca, no artigo 3.o da nova diretiva em matéria de marcas, a Diretiva 2015/2436.


10      Acórdão de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244).


11      Acórdão de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie (C‑49/02, EU:C:2004:384).


12      O Tribunal de Justiça julgou nesses acórdãos que uma marca de cor deve, para o efeito, preencher três requisitos. Em primeiro lugar, deve constituir um sinal. O Tribunal de Justiça declarou que no domínio do comércio, as cores são geralmente utilizadas pelo seu poder atrativo ou decorativo, sem veicular qualquer significado, mas que não se exclui que as cores ou combinações de cores possam, em relação a um produto ou serviço, constituir um sinal (v. Acórdãos de 6 de maio de 2003, Libertel, C‑104/01, EU:C:2003:244, n.o 27, e de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie, C‑49/02, EU:C:2004:384, n.o 23). Em segundo lugar, este sinal deve ser suscetível de representação gráfica. Em terceiro lugar, deve ser adequado a distinguir os produtos ou serviços de uma empresa dos de outras empresas (v. Acórdãos de 6 de maio de 2003, Libertel, C‑104/01, EU:C:2003:244, n.o 23, e de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie, C‑49/02, EU:C:2004:384, n.o 22). No que se refere à aplicação destes dois últimos requisitos às marcas de cor, remeto para a resposta que nas presentes conclusões dou às questões prejudiciais, que incide, especificamente, sobre esses requisitos.


13      V., por exemplo, os n.os 14 e 21 do Acórdão de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244), que descrevem uma marca de cor como uma cor por si só, sem delimitação no espaço, e o n.o 15 do Acórdão 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie (C‑49/02, EU:C:2004:384), que se refere às cores ou combinações de cores, designadas de forma abstrata e sem contornos. Esta mesma definição é aliás utilizada para efeitos de registo das marcas da União Europeia [v. Regulamento de Execução (UE) 2018/626 da Comissão, de 5 de março de 2018, que estabelece as regras de execução de determinadas disposições do Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho sobre a marca da União Europeia e que revoga o Regulamento de Execução (UE) 2017/1431, JO 2018, L 104, p. 37]. Este regulamento que se aplica ao registo das marcas da União Europeia desde 14 de maio de 2018, descreve, no artigo 3.o, n.o 3, alínea f), uma marca de cor como uma marca que consiste exclusivamente numa só cor, sem contornos ou numa combinação de cores, sem contornos.


14      Acórdão de 12 de junho de 2018, Louboutin e Christian Louboutin (C‑163/16, EU:C:2018:423).


15      Acórdão de 12 de junho de 2018, Louboutin e Christian Louboutin (C‑163/16, EU:C:2018:423, n.os 7 a 10).


16      Acórdão de 12 de junho de 2018, Louboutin e Christian Louboutin (C‑163/16, EU:C:2018:423, n.o 24).


17      Acórdão de 6 de maio de 2003 (C‑104/01, EU:C:2003:244, n.o 54).


18      V., neste sentido, a definição das marcas figurativas no artigo 3.o, n.o 3, alínea b), do Regulamento de Execução 2018/626 da Comissão, nos termos da qual uma marca figurativa é uma marca que utiliza carateres, uma estilização ou uma formatação não normalizados, ou uma característica gráfica ou uma cor, incluindo as marcas constituídas exclusivamente por elementos figurativos ou por uma combinação de elementos verbais e figurativos.


19      V. Acórdão de 19 de junho de 2014, Oberbank (C‑217/13 e C‑218/13, EU:C:2014:2012, n.o 38 e jurisprudência referida).


20      V. Acórdão de 26 de abril de 2007, Alcon/IHMI (C‑412/05 P, EU:C:2007:252, n.o 53 e jurisprudência referida).


21      V. Acórdão de 19 de junho de 2014, Oberbank (C‑217/13 e C‑218/13, EU:C:2014:2012, n.o 39 e jurisprudência referida).


22      V. Acórdão de 19 de junho de 2014, Oberbank (C‑217/13 e C‑218/13, EU:C:2014:2012, n.o 40 e jurisprudência referida).


23      V. Acórdão de 19 de junho de 2014, Oberbank (C‑217/13 e C‑218/13, EU:C:2014:2012, n.o 41 e jurisprudência referida).


24      V., neste sentido, Acórdão de 19 de junho de 2014, Oberbank (C‑217/13 e C‑218/13, EU:C:2014:2012, n.o 46 e jurisprudência referida).


25      V. Acórdão de 19 de junho de 2014, Oberbank (C‑217/13 e C‑218/13, EU:C:2014:2012, n.o 47 e jurisprudência referida).


26      V. Acórdãos de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244, n.o 66), e de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie (C‑49/02, EU:C:2004:384, n.o 39).


27      V. Acórdãos de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244, n.o 65), e de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie (C‑49/02, EU:C:2004:384, n.o 38).


28      V. Acórdão de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244, n.os 54 a 59).


29      V. Acórdão de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244, n.o 60).


30      V. Acórdãos de 12 de julho de 2012, Smart Technologies/IHMI (C‑311/11 P, EU:C:2012:460, n.o 26 e jurisprudência referida), e de 9 de setembro de 2010, IHMI/Borco‑Marken‑Import Matthiesen (C‑265/09 P, EU:C:2010:508, n.o 33 e jurisprudência referida).


31      V. Acórdão de 9 de setembro de 2010, IHMI/Borco‑Marken‑Import Matthiesen (C‑265/09 P, EU:C:2010:508, n.o 37).


32      V. Acórdãos de 12 de dezembro de 2002, Sieckmann (C‑273/00, EU:C:2002:748, n.os 48 a 55), e de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244, n.o 29).


33      V. Acórdão de 12 de dezembro de 2002, Sieckmann (C‑273/00, EU:C:2002:748, n.o 47).


34      V. Acórdão de 12 de dezembro de 2002, Sieckmann (C‑273/00, EU:C:2002:748, n.os 50 e 51). V., igualmente, Acórdão de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie (C‑49/02, EU:C:2004:384, n.os 26 a 30).


35      Saliente‑se que o requisito da representação gráfica já não consta da nova diretiva em matéria de marcas, a Diretiva 2015/2436. O artigo 3.o, alínea b), desta diretiva, que é referente aos sinais que são suscetíveis de constituir uma marca e corresponde ao artigo 2.o da diretiva atual, dispõe agora que o sinal pedido deve ser representado no registo das marcas de uma forma que permita às autoridades competentes e ao público determinar, de forma clara e precisa, o objeto claro e preciso da proteção conferida ao seu titular A razão desta modificação é indicada no considerando 13 da diretiva. Este último enuncia que ‑ no intuito de cumprir os objetivos do sistema de registo das marcas, a saber, garantir a segurança jurídica e uma boa gestão administrativa ‑ é essencial estabelecer que o sinal possa ser representado de forma clara, precisa, autónoma, facilmente acessível, inteligível, duradoura e objetiva. Mais, é indicado que deverá ser permitido representar o sinal sob qualquer forma adequada, utilizando uma tecnologia geralmente disponível, e, portanto, não necessariamente por meios gráficos, desde que a representação ofereça garantias satisfatórias para esse efeito.


36      V. Acórdão de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244, n.os 31 a 37).


37      V. Acórdão de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie (C‑49/02, EU:C:2004:384, n.o 33).


38      V. Acórdão de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie (C‑49/02, EU:C:2004:384, n.o 34).


39      Acórdão de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244).


40      Acórdão de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie (C‑49/02, EU:C:2004:384).


41      Acórdão de 12 de junho de 2018, Louboutin e Christian Louboutin (C‑163/16, EU:C:2018:423).


42      Acórdão de 12 de dezembro de 2002, Sieckmann (C‑273/00, EU:C:2002:748, n.os 48 a 51).


43      Acórdão de 27 de novembro de 2003, Shield Mark (C‑283/01, EU:C:2003:641).


44      Uma marca sonora é uma marca constituída exclusivamente por um som ou combinação de sons [v., por exemplo, a definição constante do artigo 3.o, n.o 3, alínea b), do Regulamento de Execução 2018/626 da Comissão].


45      V. Acórdão de 27 de novembro de 2003, Shield Mark (C‑283/01, EU:C:2003:641, n.o 58).


46      A este respeito, refira‑se, igualmente, o Acórdão de 14 de junho de 2012, Seven Towns/IHMI (Representação de sete quadrados em cores diferentes) (T‑293/10, não publicado, EU:T:2012:302). Neste processo, o Tribunal Geral considerou que uma marca da União Europeia não podia ser registada como marca de cor pelo facto de ter sido representada graficamente não como uma marca de cor, mas como uma marca figurativa ou uma marca tridimensional. O Tribunal Geral decidiu que, neste caso, existia uma contradição inerente em relação à verdadeira natureza do sinal em causa, que impedia o registo do mesmo (v. n.o 66 do acórdão).


47      V., a este respeito, n.o 13 das presentes conclusões.


48      Acórdão de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244).


49      Acórdão de 24 de junho de 2004, Heidelberger Bauchemie (C‑49/02, EU:C:2004:384).


50      V. Acórdão de 6 de maio de 2003, Libertel (C‑104/01, EU:C:2003:244, n.os 60, 65 e 66).


51      Esclareça‑se que o próprio Tribunal de Justiça não dispõe destes elementos.


52      V. Acórdão de 19 de junho de 2014, Oberbank (C‑217/13 e C‑218/13, EU:C:2014:2012, n.o 40 e jurisprudência referida).


53      Acórdão de 19 de junho de 2014, Oberbank (C‑217/13 e C‑218/13, EU:C:2014:2012, n.o 48).