Language of document : ECLI:EU:T:2003:37

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

25 de Fevereiro de 2003 (1)

«Empreitadas de obras públicas - Directiva 93/37/CEE - Caderno de encargos - Critérios de adjudicação - Fundamentação da decisão de adjudicação - Erros manifestos de apreciação - Responsabilidade extracontratual da Comunidade»

No processo T-4/01,

Renco SpA, com sede em Milão (Itália), representada por D. Philippe e F. Apruzzi, advogados, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

Conselho da União Europeia, representado por F. van Craeyenest e M. Arpio Santacruz, na qualidade de agentes, assistidos por J. Stuyck, advogado,

demandado,

que tem por objecto um pedido de reparação do prejuízo alegadamente sofrido pela demandante na sequência da decisão do Conselho de não lhe adjudicar a empreitada para a realização de trabalhos de acondicionamento e de manutenção gerais dos edifícios do Conselho, que foi objecto do concurso público n.° 107865 de 30 de Julho de 1999 (JO S 146), por este último aberto,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção),

composto por: J. D. Cooke, presidente, R. García-Valdecasas e P. Lindh, juízes,

secretário: D. Christensen, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 7 de Fevereiro de 2002,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    A adjudicação de empreitadas públicas pelo Conselho rege-se pelas disposições contidas na primeira secção do título IV (artigos 56.° a 64.°-A) do Regulamento Financeiro, de 21 de Dezembro de 1977, aplicável ao orçamento geral das Comunidades Europeias (JO L 356, p. 1; EE 01 F2 p. 90), alterado pela última vez antes da propositura da presente acção pelo Regulamento (CE, CECA, Euratom) n.° 2673/1999 do Conselho, de 13 de Dezembro de 1999 (JO L 326, p. 1).

2.
    Segundo o artigo 56.° do Regulamento Financeiro, «cada instituição deve respeitar as mesmas obrigações que incumbem às entidades dos Estados-Membros» por força das directivas em matéria de empreitadas de obras públicas quando o montante da empreitada atinja ou ultrapasse os limiares previstos nas referidas directivas.

3.
    No caso vertente, a regulamentação de referência é constituída pela Directiva 93/37/CEE do Conselho, de 14 de Junho de 1993, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas (JO L 199, p. 54), na redacção dada pela Directiva 97/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de Outubro de 1997 (JO L 328, p. 1).

4.
    O artigo 8.° da Directiva 93/37, na redacção dada pela Directiva 97/52, dispõe:

«No prazo de 15 dias a contar da data de recepção de um pedido escrito, a entidade adjudicante comunicará aos candidatos ou proponentes não aceites os motivos da recusa da sua candidatura ou proposta e, aos proponentes que tiverem apresentado uma proposta admissível, as características e vantagens relativas da proposta seleccionada, bem como o nome do adjudicatário.

[...]».

5.
    O artigo 18.° da Directiva 93/37, alterada, prevê:

«A atribuição do contrato far-se-á com base nos critérios previstos [nos artigos 30.° a 32.° da presente directiva] [...]».

6.
    O artigo 30.° da Directiva 93/37 estabelece:

«1. Os critérios que a entidade adjudicante tomará como base para a adjudicação de contratos são os seguintes:

a)    Ou unicamente o preço mais baixo;

b)    Ou, quando a adjudicação se fizer à proposta economicamente mais vantajosa, vários critérios que variam consoante o contrato em questão: por exemplo, o preço, o prazo de execução, o custo de utilização, a rentabilidade e o valor técnico.

2. No caso referido no n.° 1, alínea b), as entidades adjudicantes mencionarão, no caderno de encargos ou no anúncio do concurso, todos os critérios de adjudicação que tencionam aplicar, se possível por ordem decrescente da importância que lhes é atribuída.

3. [...]

4. Se, em relação a um determinado contrato, as propostas parecerem anormalmente baixas em relação à prestação em causa, a entidade adjudicante solicitará por escrito, antes de rejeitar essas propostas, esclarecimentos sobre os elementos constitutivos das propostas que considere relevantes e verificará esses elementos tendo em conta as explicações recebidas.

A entidade adjudicante pode tomar em consideração justificações inerentes à economia do processo de construção, às soluções técnicas adoptadas, às condições excepcionalmente favoráveis de que o proponente dispõe para executar os trabalhos ou à originalidade do projecto do proponente.

[...]».

Factos na origem do litígio

7.
    No anúncio de concurso n.° 107865 publicado em 30 de Julho de 1999 (JO S 146), o secretariado-geral do Conselho lançou um procedimento de concurso público restrito para os trabalhos de acondicionamento e de manutenção gerais dos edifícios do Conselho em Bruxelas; esse anúncio substituiu outro de 4 de Junho de 1999 (JO S 107). O procedimento deveria conduzir à celebração de um contrato-quadro com uma duração de cinco anos, com a possibilidade de prorrogação por períodos de doze meses. Precisava-se também no anúncio que, «[e]m 1998, o custo dos trabalhos de acondicionamento e de manutenção gerais foi da ordem dos 5 000 000 EUR».

8.
    O caderno de encargos relativo à empreitada de obras públicas previa, no ponto IV.5 intitulado «Critérios de selecção»:

«a) O [secretariado-geral do Conselho] escolherá de entre as propostas recebidas a que considere mais vantajosa tendo em conta as informações fornecidas pela empresa. Serão designadamente considerados critérios preponderantes:

-    a conformidade da proposta;

-    o montante da proposta;

-    a experiência e a capacidade da equipa permanente para a execução de prestações idênticas às descritas no caderno de encargos;

-    a experiência e a capacidade técnica da empresa;

-    a proposta feita em matéria de coordenador-segurança;

-    a qualidade dos eventuais subempreiteiros e fornecedores propostos;

-    a qualidade técnica dos equipamentos materiais propostos;

-    as medidas propostas para cumprimento dos prazos de execução.

[...]».

9.
    O caderno de encargos precisava que a empreitada constituía um contrato-quadro que vincularia as duas partes quanto às matérias gerais de ordem administrativa e técnica bem como às modalidades de fixação dos preços, qualidades e prazos.

10.
    O caderno de encargos previa três tipos de prestações. Em primeiro lugar, o empreiteiro estava obrigado a criar uma equipa permanente de dezasseis pessoas com composição polivalente. O respectivo papel era, por um lado, o da preparação, gestão e coordenação dos trabalhos de acondicionamento e manutenção e, por outro, a execução de parte desses trabalhos. Os proponentes estavam obrigados a indicar na parte A de um recapitulativo de medições o preço unitário à hora de cada membro da equipa permanente, bem como o montante global das prestações da equipa permanente baseado numa quantidade presumida de 1 800 horas por membro. A empreitada compreendia, além disso, designadamente dois tipos de projectos. O primeiro tipo de projecto abrangia os trabalhos de acondicionamento e de manutenção ainda não definidos pelo Conselho. Relativamente a esses trabalhos, os proponentes eram obrigados a indicar, na parte B do recapitulativo de medições, a respectiva proposta de preço para cada rubrica de uma lista exemplificativa de prestações de mão-de-obra e de fornecimento de materiais. O segundo tipo de projecto compreendia sete rubricas de trabalhos já definidos pelo Conselho no momento do concurso, mas cuja execução viria ainda a ser posteriormente decidida ou não pelo Conselho. Os proponentes estavam obrigados a fixar um preço para esses trabalhos na parte C do recapitulativo de medições.

11.
    De acordo com o caderno de encargos, as prestações da equipa permanente seriam remuneradas ao preço estabelecido pela aplicação das tarifas contratuais às durações efectivas das prestações, sendo que as prestações relativas aos diversos projectos da parte B e C do recapitulativo de medições seriam remuneradas de acordo com os preços da proposta. Nos três casos acima referidos, os proponentes estavam obrigados a fixar as respectivas tarifas e preços atendendo ao facto de que seria aplicado na facturação um coeficiente de majoração ou um factor de multiplicação pelas «despesas gerais de sede da empresa».

12.
    Com efeito, o caderno de encargos mencionava não estarem compreendidas nos preços e tarifas relativas às partes A, B e C do recapitulativo de medições «as prestações efectuadas na sede do empreiteiro ou com esta relacionadas, tais como [designadamente]: os custos indirectos do pessoal na medida em que tais custos não estejam incluídos nas tarifas; a administração do pessoal; os custos gerais de funcionamento; a contabilidade geral; o seguro contra todos os riscos do estaleiro e o seguro de responsabilidade civil; a garantia de bom fim dos trabalhos; a remuneração dos directores de empresa; os encargos com a formação do pessoal; os impostos [e] os lucros da empresa». As «despesas gerais de sede», tal como acima enumeradas, seriam remuneradas por um coeficiente único de majoração ou um factor de multiplicação a ser fixado pelos proponentes quando da apresentação das respectivas propostas, o qual seria aplicado aos preços e tarifas das prestações abrangidas nas partes A, B e C do recapitulativo de medições. Além disso, decorre do processo que, caso o proponente escolhido contratasse subempreiteiros para efectuar os trabalhos, tinha o direito de acrescentar ao preço dos subempreiteiros o coeficiente de majoração indicado na sua proposta. Os trabalhos em causa podiam ser tanto os previstos no caderno de encargos como trabalhos não previstos.

13.
    Cabe precisar que os preços propostos para as partes A e B representavam apenas o custo aproximativo das prestações em causa durante um ano, sendo que o preço proposto para a parte C era o de determinados projectos identificados no caderno de encargos a executar durante o prazo do contrato.

14.
    Os candidatos, oito no total, foram informados, em 28 de Outubro de 1999, de terem sido escolhidos para participarem no concurso limitado. Desses oito candidatos, três apresentaram uma proposta conforme, a saber, a Strabag Benelux NV (a seguir «Strabag»), a sociedade Entreprises Louis De Waele (a seguir «De Waele») e a demandante.

15.
    Em 11 de Janeiro de 2000, a demandante apresentou uma proposta no montante de 3 946 745,49 euros por ano. Essa proposta foi considerada conforme às disposições do caderno de encargos.

16.
    Após um primeiro exame da proposta da demandante, o Conselho considerou que determinados preços dela constantes pareciam «anormalmente baixos» e que outros «não [cobriam] sequer o mero fornecimento de materiais e equipamentos». Por carta de 20 de Janeiro de 2000, convidou a demandante a verificar os seus cálculos, precisando-lhe as rubricas em causa. Salientou também que a proponente omitira fornecer determinados preços de equipamentos culinários.

17.
    Por carta de 24 de Janeiro de 2000 dirigida ao Conselho, a demandante confirmou os seus preços, contestando serem estes anormalmente baixos e precisando:

«[...] avaliámos e preparámos a nossa proposta com extremo cuidado e nela implicámos os nossos fornecedores habituais (com os quais trabalhámos intensamente durante inúmeros anos) no estabelecimento dos nossos preços; a este respeito, a nossa proposta foi feita com o objectivo de sermos extremamente competitivos (respeitando todas as especificações técnicas) no intuito de obtermos finalmente a adjudicação do contrato».

18.
    Por carta de 1 de Fevereiro de 2000 dirigida à demandante, o Conselho solicitou informações sobre determinados preços omitidos na sua proposta. Referiu também que, apesar de a demandante ter confirmado na carta de 24 de Janeiro de 2000 os preços para as rubricas consideradas pelo Conselho anormalmente baixas, tal carta não fornecia qualquer justificação de tais preços, dos quais alguns, designadamente no sector sanitário, nem sequer cobriam o fornecimento do material. O Conselho pediu em seguida informações complementares relativamente a cerca de uma centena de rubricas.

19.
    Os representantes da demandante e do Conselho reuniram-se em Bruxelas em 9 de Fevereiro de 2000 para esclarecerem determinados aspectos da proposta. Na sequência dessa reunião, a demandante respondeu formalmente, por carta de 11 de Fevereiro de 2000, à carta do Conselho de 1 de Fevereiro de 2000, tendo em geral mantido os preços constantes da proposta de 11 de Janeiro de 2000 e justificando-os pelo facto de a globalização das rubricas permitir a compensação dos diferentes preços. Precisou designadamente que:

«A nossa política consistiu em avaliar cada projecto com base num preço global, cindindo os custos para as diversas rubricas de forma nem sempre homogénea, mas que permitia ganhar tempo na preparação da proposta. Além disso, tal não se aplica exclusivamente aos custos, mas também aos lucros previstos na proposta. No caso vertente, confirmámos o nosso compromisso de executar os trabalhos, integral ou parcialmente, de acordo com a nossa proposta e as vossas exigências. Calculámos os riscos inerentes à nossa decisão.»

20.
    Por decisão de 12 de Abril de 2000, tomada com base num parecer da Comissão Consultiva de Aquisições e Contratos de 5 de Abril de 2000 (a seguir «CCAC») e de um relatório da mesma data a esta transmitido (a seguir «relatório à CCAC»), o Conselho adjudicou a empreitada à De Waele, cuja proposta se elevava a 4 088 938,10 euros por ano. Esta decisão foi objecto do anúncio n.° 054869 publicado em 29 de Abril de 2000 (JO S 84).

21.
    Por carta de 14 de Abril de 2000, o Conselho informou a demandante de a sua proposta ter sido rejeitada.

22.
    Por carta de 26 de Abril de 2000, a demandante pediu ao Conselho que lhe transmitisse «a fundamentação oficial adoptada pela autoridade comunitária para [a excluir] da referida empreitada no prazo de oito dias». Por carta de 10 de Maio de 2000, a demandante reiterou esse pedido.

23.
    Por carta de 11 de Maio de 2000, o Conselho respondeu ao pedido da demandante nos seguintes termos:

«De acordo com as disposições da Directiva 93/37/CEE do Conselho, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de empreitadas de obras públicas, os critérios de atribuição da empreitada foram retomados no caderno de encargos do concurso público [...].

Em consequência, as três propostas recebidas em 11 de Janeiro de 2000 foram analisadas e comparadas à luz desses critérios. Daí resultou ter a empreitada sido adjudicada à De Waele, que apresentara a proposta economicamente mais vantajosa.

Para vossa informação, acrescento que a proposta da Renco não foi classificada em melhor posição do que a da De Waele em nenhum dos oito critérios mencionados no caderno de encargos.»

24.
    Por carta de 15 de Maio de 2000, a demandante, após salientar que, em sua opinião, a sua proposta era mais vantajosa do que a da De Waele, solicitou informações complementares ao Conselho quanto à rejeição da sua proposta.

25.
    Por telecópia de 24 de Maio de 2000, a demandante solicitou resposta à carta de 15 de Maio de 2000 e, por carta de 2 de Junho de 2000, reiterou o pedido contido na carta de 26 de Abril de 2000. Solicitou também «cópia das actas redigidas pela comissão de avaliação das propostas apresentadas no âmbito do referido concurso».

26.
    Por carta de 14 de Junho de 2000, o Conselho respondeu às cartas da demandante de 15 de Maio e 2 de Junho de 2000, fornecendo-lhe os elementos complementares quanto à rejeição da respectiva proposta. Referiu a classificação da proposta da demandante relativamente às da De Waele e Strabag à luz de cada um dos oito critérios de atribuição. No que se refere mais especificamente ao montante da proposta, precisou que a proposta da demandante se encontrava em terceira posição tendo em conta «o muito elevado número de preços anormalmente baixos para os quais [a demandante] não forneceu justificação adequada [...], o elevado factor de multiplicação relativo às despesas gerais [e] o montante mais elevado da empreitada se se considerar a duração contratual de cinco anos». O Conselho concluía que:

«Apesar de a proposta [da demandante] parecer ser a mais baixa a curto prazo, não foi acolhida, por um lado em virtude do montante da proposta pelo prazo de cinco anos e das inúmeras questões quanto aos seus preços, por outro por, à luz de outros critérios de avaliação, não ter sido melhor classificada do que a da De Waele.»

27.
    Por carta de 21 de Junho de 2000, a demandante solicitou novamente ao Conselho que lhe remetesse cópia do processo administrativo. Por carta de 4 de Julho de 2000, o Conselho recusou-se a deferir tal pedido.

28.
    Por requerimento entregue no Tribunal de Primeira Instância em 3 de Agosto de 2000, registado sob o número T-205/00, a demandante interpôs recurso de anulação da decisão do Conselho de 4 de Julho de 2000 que indeferiu o pedido de acesso ao processo administrativo relativo à avaliação das propostas.

29.
    Por carta entregue na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 5 de Fevereiro de 2001, a demandante informou o Tribunal de que desistia do recurso no processo T-205/00, por o Conselho lhe ter finalmente transmitido, através do secretariado, o processo administrativo de avaliação das propostas quando da entrega da contestação em 12 de Outubro de 2000.

Tramitação processual e pedidos das partes

30.
    Por requerimento entregue na Secretaria do Tribunal em 5 de Janeiro de 2001, a demandante intentou a presente acção.

31.
    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância (Quinta Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo. No âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, o Tribunal colocou questões escritas às partes, convidando o Conselho a comunicar determinadas informações, o que foi cumprido nos prazos estabelecidos.

32.
    As alegações das partes e as respostas às questões do Tribunal foram apresentadas na audiência de 7 de Fevereiro de 2000.

33.
    A demandante conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    declarar a acção admissível e procedente;

-    condenar o Conselho no pagamento do montante de 26 063 000 euros a título de indemnização por perdas e danos acrescida de juros de mora contados a partir de 12 de Abril de 2000;

-    condenar o Conselho nas despesas.

34.
    O Conselho conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    julgar a acção improcedente;

-    condenar a demandante nas despesas.

Questão de direito

35.
    A demandante pede o pagamento do montante de 26 063 000 euros a título de indemnização de perdas e danos pelo prejuízo sofrido em virtude da ilegalidade do comportamento do Conselho no processo de adjudicação da empreitada em causa. Argumenta que o Conselho violou os limites da sua competência, tornando-se culpado de falta manifesta de diligência na gestão do referido processo. O incumprimento imputável ao Conselho decorre:

-    da referência no caderno de encargos a critérios de selecção vagos que permitem uma margem de apreciação demasiado grande à luz do objecto da empreitada;

-    da utilização, na escolha final do contratante, de critérios não especificados no caderno de encargos, com violação designadamente do artigo 18.° da Directiva 93/37, defraudando assim as legítimas expectativas da demandante;

-    da falta de fundamentação da rejeição da sua proposta.

36.
    O Conselho considera, a título principal, ser improcedente o pedido da demandante e, a título subsidiário, ser excessivo o montante da indemnização pedida. Alega que não incorreu em qualquer das formas de incumprimento de que é acusado e que, em qualquer caso, tal «incumprimento não constitui violação suficientemente caracterizada» na acepção da jurisprudência. Recorda, a este respeito, que segundo o acórdão do Tribunal de Justiça de 4 de Julho de 2000, Bergaderm e Goupil/Comissão (C-352/98 P, Colect., p. I-5291), só quando a instituição em causa dispõe de uma margem de apreciação consideravelmente reduzida, ou mesmo inexistente, é que a simples infracção ao direito comunitário pode bastar para provar a existência de uma violação suficientemente caracterizada, susceptível de gerar a responsabilidade extracontratual da Comunidade na acepção do artigo 288.° CE. Além disso, é jurisprudência assente que o Conselho dispõe, à semelhança das outras instituições, de um amplo poder de apreciação quanto aos elementos a ter em conta para a tomada de uma decisão de adjudicação de um contrato com base num concurso e que o controlo do juiz comunitário se deve limitar a verificar a inexistência de erro grave e manifesto (acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Novembro de 1978, Agence européenne d'interims/Comissão, 56/77, Recueil, p. 2215, Colect. 1978, p. 761, n.° 20; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 8 de Maio de 1996, Adia interim/Comissão, T-19/95, Colect., p. II-321, n.° 49; de 17 de Dezembro de 1998, Embassy Limousines & Services/Parlamento, T-203/96, Colect., p. II-4239, n.° 56, e de 6 de Julho de 2000, AICS/Parlamento, T-139/99, Colect., p. II-2849).

Argumentos das partes

Quanto à acusação baseada na utilização de critérios de selecção vagos

37.
    A demandante acusa o Conselho de ter utilizado no caderno de encargos critérios de selecção demasiado vagos. Afirma que «resulta com efeito do caderno de encargos que devem ser considerados preponderantes [...] elementos atinentes às capacidades do empreiteiro ou dos subempreiteiros, sendo quase inexistentes os critérios relativos à proposta - com exclusão da sua ‘conformidade’ e do seu ‘montante’» ao passo que «só elementos objectivos, relacionados com a execução da empreitada, e portanto a proposta, [tinham sido] susceptíveis de manter a igualdade dos proponentes, evitando assim juízos de valor dificilmente justificáveis». Além disso, o artigo 30.°, n.° 1, alínea b), da Directiva 93/37, relativo à «proposta economicamente mais vantajosa», apenas enumerava elementos relativos à própria proposta, dentro dos quais não cabem, no caso vertente, determinados critérios do caderno de encargos como a experiência e a capacidade técnica da empresa e a qualidade dos eventuais subempreiteiros e fornecedores, critérios dificilmente apreciáveis.

38.
    O Conselho entende não poder ser seguido este ponto de vista. O anúncio de concurso precisava claramente os oito critérios com base nos quais devia ser adoptada a decisão de adjudicação da empreitada (v. supra, n.° 8). Decorre claramente destes critérios que a conformidade e o montante da proposta não eram os únicos elementos a considerar, sendo que a atribuição seria feita «à proposta economicamente mais vantajosa» na acepção da alínea b) do n.° 1 do artigo 30.° da Directiva 93/37 (v. supra, n.° 6). O Conselho considera que esta disposição apenas contém uma lista exemplificativa dos critérios susceptíveis de serem tomados em conta, podendo estes variar consoante a empreitada em causa. No caso vertente, o anúncio de concurso precisava claramente oito critérios, entre os quais a experiência e a capacidade técnica da empresa e a qualidade dos eventuais subempreiteiros e fornecedores propostos. O Conselho acrescenta que a demandante não demonstrou que o Conselho ultrapassou grave e manifestamente a margem de apreciação de que dispõe ao enumerar os referidos critérios. Salienta decorrer, além disso, tanto da correspondência com a demandante como do relatório ao CCAC ter examinado, de forma objectiva, as três propostas recebidas à luz dos oito critérios do caderno de encargos.

Quanto à acusação baseada na utilização de critérios não especificados no caderno de encargos

39.
    A demandante pretende que o Conselho não fundou a escolha do proponente nos critérios mencionados no caderno de encargos. Argumenta que a sua proposta era conforme com o caderno de encargos, que preenchia de forma suficiente os demais critérios previstos e que o seu montante era largamente inferior ao das demais propostas. Assim, aplicando outros critérios, não levados ao conhecimento da demandante, o Conselho defraudou a legítima confiança que esta podia ter na natureza regular do processo de adjudicação da empreitada e no respeito das condições impostas, violando o princípio geral de diligência e rigor imposto às instituições pela jurisprudência (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Março de 1997, Oliveira/Comissão, T-73/95, Colect., p. II-381). O Conselho rejeitou a proposta da demandante invocando principalmente preços anormalmente baixos, um factor de multiplicação demasiado elevado e preços globais demasiado importantes quando considerada a duração total de cinco anos da empreitada. Ora, a demandante explicou suficientemente a forma de determinar cada um desses elementos, demonstrando assim que os critérios efectivamente aplicados para guiar a escolha do Conselho eram injustificados e haviam defraudado as suas legítimas expectativas. A demandante acrescenta que, se o Conselho se tivesse baseado no caderno de encargos, a sua exclusão de forma alguma se justificaria.

40.
    No que se refere aos preços considerados anormalmente baixos, tal se explica pelo facto «de os preços assim mencionados serem preços globais e não unitários, pelo que certos preços baixos podiam ser compensados por outros preços altos» (v. designadamente n.os 17 e 19, supra). Além disso, na carta de 24 de Janeiro de 2000 (v. supra, n.° 17), a demandante informara das relações privilegiadas que mantinha com os seus fornecedores habituais. Além disso, o n.° 4 do artigo 30.° da Directiva 93/37 não obriga a entidade adjudicatária a rejeitar qualquer preço anormalmente baixo. Apenas a obriga a solicitar precisões quanto à composição das propostas que se revelem demasiado baixas. A indicação de preços unitários anormalmente baixos, sendo que os preços globais das diferentes rubricas não o eram, não pode, em consequência, justificar a decisão do Conselho.

41.
    No que se refere ao factor de multiplicação relativo às despesas gerais, a demandante admira-se de que o Conselho tenha considerado elevado um coeficiente igual a 20%, não se surpreendendo, pelo contrário, que a De Waele e a Strabag tenham utilizado um coeficiente multiplicador de 6% a 8%, quando, à luz do caderno de encargos, tal coeficiente devia abranger todos os custos referidos no n.° 12 supra. A demandante aplicou o coeficiente de 20% tendo em conta os princípios da boa gestão de uma empresa. À luz de tais princípios, é impossível conter os novos custos referidos numa margem de 6% a 8%. Além disso, o caderno de encargos em caso algum recomendava que tal coeficiente fosse o menos elevado possível.

42.
    Quanto ao cálculo do montante das propostas relativamente à duração total de cinco anos da empreitada, o Conselho concluiu erradamente que a proposta da demandante era a menos concorrencial a longo prazo. A demandante salienta que este critério não consta do caderno de encargos e que esse método de cálculo era, pois, imprevisível na altura do anúncio de concurso. Sustenta também ser errado esse modo de cálculo visto conduzir a um preço global que não pode corresponder ao custo real durante esse prazo. É incontestável que determinados preços podem variar e que outros apenas são devidos uma vez.

43.
    Além disso, a demandante argumenta ter sido a única a conformar-se com o caderno de encargos e a ter repartido a sua margem de lucro na «parte A» do preço - como exigiam os documentos oficiais que regiam o concurso -, sendo que a Strabag e a De Waele apenas o haviam repartido pelas partes B e C. Assim, seria inevitável que a globalização exclusiva da parte A fosse prejudicial à demandante e que a sua proposta fosse mais elevada sobre esse ponto do que as entregues pelas duas outras sociedades (v. n.os 10 a 13, supra). Além disso, o Conselho não devia ter tomado em consideração cumulativamente o factor de multiplicação relativo às despesas gerais e a duração contratual, visto esses dois elementos formarem, na realidade, um único.

44.
    A demandante considera também não ter sido descrita nem ser clara a lógica adoptada pelo Conselho para avaliação do critério da experiência e da capacidade técnica da empresa.

45.
    O Conselho sustenta que os argumentos da demandante não podem ser aceites. Baseou a sua escolha final nos critérios mencionados no anúncio de concurso e no caderno de encargos, tendo examinado cuidadosamente a conformidade das três propostas com cada um desses critérios.

46.
    O Conselho refere que a análise que fez da proposta da demandante conduziu às seguintes conclusões:

«-    conformidade: igualdade dos três candidatos [...];

-    montante da proposta: [a demandante] em terceiro lugar;

-    critérios qualitativos: relativamente aos três critérios [a demandante] está colocada em último lugar, relativamente a um critério exaequo em segundo lugar e relativamente a dois critérios as três proponentes estão exaequo

47.
    Para o Conselho, o critério da conformidade da proposta é um critério absoluto, no sentido de que a empresa que não o cumpre fica logo excluída sem que seja necessário examinar a proposta. O critério do montante da proposta é um critério objectivo na medida em que permite estabelecer uma ordem entre as propostas. O Conselho salienta que a proposta mais baixa é a que reveste maior interesse para si, na condição contudo de preencher os critérios qualitativos. Todos os demais critérios são de ordem qualitativa, permitindo apreciar a qualidade e capacidade da empresa, da equipa e dos meios propostos. São todos eles, contudo, menos importantes do que a conformidade e o preço, visto que tais critérios qualitativos foram parcialmente já objecto de exame quando da primeira fase do concurso com base no dossier de apresentação.

48.
    No que se refere aos preços anormalmente baixos, o Conselho argumenta estar obrigado, nos termos do n.° 4 do artigo 30.° da Directiva 93/37, a rejeitar qualquer preço anormalmente baixo que não possa ser justificado. Acrescenta que esta disposição lhe permite pedir esclarecimentos sobre os preços anormalmente baixos e rejeitar a proposta se os esclarecimentos não forem conclusivos. Nos termos dessa disposição, o Conselho interrogou a demandante por duas vezes sobre o elevado número de preços anormalmente baixos, sendo que esta apenas prestou explicações vagas sobre tais preços, limitando-se a afirmar que eram justos (v. designadamente n.os 16 a 19, supra). O Conselho acrescenta que a forma «global» de responder a um anúncio de concurso utilizada pela demandante está próxima da especulação, não podendo pois ser aceite.

49.
    No que se refere ao factor de multiplicação relativo às despesas gerais, o Conselho argumenta que é um elemento importante na organização da empreitada. Para o Conselho, esse factor deve ser aplicado aos preços «secos» de qualquer prestação e, constituindo um elemento do critério «montante da empreitada», constava, assim, do caderno de encargos (v. n.os 11 e 12, supra). Salienta que esse coeficiente era muito elevado na proposta da demandante, sendo nitidamente mais baixo e conforme com as práticas do mercado nas outras duas propostas. A elevada percentagem proposta pela demandante teria, em consequência, constituído um risco financeiro para o Conselho se a demandante tivesse de recorrer a subempreiteiros para trabalhos não previstos entre as prestações especificadas no recapitulativo das medições. Em tal situação, o custo efectivo para o Conselho seria, com efeito, constituído pelo preço da subempreitada ou do fornecimento acrescido do referido coeficiente. O custo efectivo para o Conselho seria, pois, nitidamente mais elevado no caso da demandante do que no das duas outras proponentes. Caberia, pois, à demandante provar que o Conselho ultrapassou grave e manifestamente a sua margem de apreciação ao considerar que o coeficiente de 20% por ela proposto constituía um risco financeiro para aquela instituição. Além disso, a demandante não carreou qualquer elemento em apoio da alegação de que seria impossível conter os novos custos referidos no caderno de encargos (v. n.° 12, supra) dentro de uma margem de 6% a 8%, margem esta conforme com as práticas do mercado.

50.
    O Conselho argumenta também que era do seu interesse comparar o montante das propostas não apenas relativamente a um ano, mas também relativamente a todo o período contratual. Considera que, uma vez que o caderno de encargos precisava que o contrato de empresa seria celebrado por um prazo de cinco anos, era normal, e no seu interesse, examinar o custo das diversas propostas relativamente a este período. O Conselho acrescenta que, com base nessa comparação, a proposta da demandante não era economicamente a mais vantajosa em virtude do elevado coeficiente de majoração. Precisa que os trabalhos da parte C da proposta (projectos predefinidos) só podiam ser efectuados uma única vez, sendo que as prestações das partes A e B podiam sê-lo durante toda a duração do contrato. O Conselho analisou as propostas dos candidatos no plano financeiro socorrendo-se de critérios objectivos e idênticos. «Esses dois critérios [decorrem] claramente do caderno de encargos:

-    o volume teórico de trabalhos num ano (= montante da proposta), ou seja: A + B + 50% C;

-    o volume teórico de trabalhos durante os cinco anos (= duração do contrato), ou seja: 5A + 5B + 100% C.»

51.
    O Conselho declara não compreender o alcance do argumento da demandante relativo ao cúmulo, feito pelo Conselho, de um elevado factor de multiplicação e da duração contratual (v. n.° 43, supra).

52.
    No que se refere aos critérios qualitativos, o Conselho refere também a inexistência de resposta válida da demandante quanto ao quinto critério (relativo ao coordenador-segurança) e à natureza insatisfatória da resposta da demandante sobre o sexto critério (relativo aos subempreiteiros).

Quanto à acusação baseada em falta de fundamentação

53.
    A demandante argumenta que o Conselho violou de forma flagrante as disposições do artigo 8.° da Directiva 93/37, que lhe impunham que lhe comunicasse, no prazo de quinze dias contados do pedido, os fundamentos da rejeição da sua proposta. Sustenta que o Conselho violou também as disposições nacionais (lei belga de 24 de Dezembro de 1993 relativa às empreitadas públicas e a determinadas empreitadas de obras, de fornecimento e de serviços) aplicáveis em matéria de adjudicação de empreitadas públicas. Tais regras prevêem a obrigação de fundamentação das decisões das entidades adjudicantes, bem como a proibição de técnicas discriminatórias. Ora, no caso vertente, o Conselho limitou-se a considerações vagas, que de forma alguma permitiam à demandante apreciar as suas hipóteses efectivas de adjudicação da empreitada nem a justificação da decisão tomada.

54.
    A demandante entende que a aplicação da lei belga não pode ser afastada com o fundamento de que só a Directiva 93/37 rege a transparência e o dever de fundamentação da entidade adjudicante comunitária. Com efeito, o caderno de encargos, na página 32, precisou que, «sob reserva de disposições específicas aplicáveis às Comunidades Europeias, o direito belga é aplicável à empreitada». A demandante declara também que, ao desistir do recurso no processo T-205/00 (v. n.os 28 e 29, supra), não renunciou ao seu direito, mas apenas à instância. Esse recurso apenas tinha por objecto a decisão do Conselho de lhe fornecer o processo administrativo solicitado e não a validade da decisão de rejeição da proposta pelo Conselho. A demandante pretende continuar a poder, seja como for, impugnar esta última decisão no que se refere à sua fundamentação à luz do artigo 8.° da Directiva 93/37.

55.
    A demandante argumenta que a carta do Conselho de 11 de Maio de 2000 (v. n.° 23, supra), que constitui a primeira resposta ao seu pedido de transmissão da «fundamentação oficial adoptada pela autoridade comunitária para a excluir da empreitada», não pode consubstanciar a comunicação dos fundamentos da rejeição exigida pela Directiva 93/37, visto tal carta não enunciar qualquer fundamento. Acrescenta que a carta do Conselho de 14 de Junho de 2000 (v. n.° 26, supra) também não pode consubstanciar a fundamentação exigida visto, por um lado, datar de mais de um mês e meio após o seu primeiro pedido e um mês após o pedido de esclarecimento de 15 de Maio de 2000 (v. n.° 24, supra) e, por outro, se limitar a transmitir a classificação dos três candidatos à luz dos oito critérios, mas sem qualquer justificação, excepto quanto ao critério do montante, cuja aplicação é contestada.

56.
    O Conselho considera que a acusação da demandante baseada em falta de transparência é destituída de qualquer fundamento. Argumenta que a lei belga de 24 de Dezembro de 1993 não é aplicável no caso em apreço, visto que o Conselho está obrigado, enquanto entidade adjudicante de uma empreitada de obras públicas, «ao cumprimento da Directiva 93/37, única que rege a transparência e dever de fundamentação da entidade adjudicante comunitária».

57.
    O Conselho salienta que a demandante interpôs o recurso de anulação, com fundamento no n.° 1 do artigo 8.° dessa directiva, da sua decisão de indeferir o pedido de obtenção do «processo administrativo», tendo desistido desse recurso por, na pendência do recurso para o Tribunal, o Conselho lhe ter transmitido aquele processo. Considera dever deduzir-se dessa desistência que a demandante deixou de contestar, no que se refere à fundamentação da decisão de rejeição, a legalidade de tal decisão.

58.
    O Conselho afirma ter cumprido a obrigação de fundamentação imposta pela Directiva 93/37 na medida em que, antes de mais, por carta de 14 de Abril de 2000, informou a demandante da rejeição da sua proposta, tendo depois, por carta de 11 de Maio de 2000, respondido ao pedido expresso de 26 de Abril e 10 de Maio de 2000, de lhe ser comunicada «a fundamentação oficial adoptada pela autoridade comunitária» para a excluir da empreitada. Na carta de 11 de Maio de 2000, o Conselho comunicou à demandante o procedimento adoptado, os fundamentos da rejeição da sua proposta, bem como aqueles pelos quais a De Waele fora escolhida.

Apreciação do Tribunal

59.
    O artigo 288.°, segundo parágrafo, CE estabelece que, em matéria de responsabilidade extracontratual, a Comunidade deve indemnizar, de acordo com os princípios gerais comuns dos Estados-Membros, os danos causados pelas suas instituições ou pelos seus agentes no exercício das suas funções.

60.
    A responsabilidade extracontratual da Comunidade pressupõe que esteja reunido um certo número de requisitos relativos à ilegalidade do comportamento de que as instituições são acusadas, à realidade do prejuízo e à existência de um nexo de causalidade entre o comportamento alegado e o prejuízo invocado. No que respeita ao primeiro requisito, a jurisprudência exige que seja provada uma violação suficientemente caracterizada de uma regra de direito que tenha por objecto proteger os particulares (v., neste sentido, acórdão Bergaderm e Goupil/Comissão, já referido, n.° 42, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Janeiro de 2002, Biret e Cie/Conselho, T-210/00, Colect., p. II-47, n.° 52). Quando uma destas condições não está preenchida, o pedido deve ser julgado improcedente na sua totalidade, sem ser necessário apreciar os outros pressupostos da referida responsabilidade (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Setembro de 1994, KYDEP/Conselho e Comissão, C-146/91, Colect., p. I-4199, n.° 19).

61.
    No caso vertente, tratando-se da condição atinente à ilegalidade do comportamento a Comunidade, a demandante acusa o Conselho de ter violado as disposições da Directiva 93/37, ao violar os limites do seu poder e ao pecar manifestamente por falta de diligência na gestão do procedimento de adjudicação da empreitada, em virtude dos incumprimentos enunciados no n.° 35 supra.

62.
    Recorde-se a este respeito que, segundo jurisprudência assente, o Conselho dispõe de um amplo poder de apreciação quanto aos elementos a ter em conta para a tomada de uma decisão de adjudicação de um contrato com base num concurso (acórdãos Agence européenne d'interims/Comissão, já referido, n.° 20 Adia Intérim/Comissão, já referido, n.° 49, e Embassy Limousines & Services/Parlamento, já referido, n.° 56).

63.
    Quando a instituição dispõe de uma margem de apreciação, o critério decisivo para considerar que existe uma violação do direito comunitário suficientemente caracterizada é o da violação manifesta e grave, por essa instituição, dos limites que se impõem ao seu poder de apreciação (v., neste sentido, acórdãos Brasserie du pêcheur e Factortame e o., C-46/93 e C-48/93, Colect., p. I-1029, n.° 55; de 8 de Outubro de 1996, Dillenkofer e o., C-178/94, C-179/94 e C-188/94 a C-190/94, Colect., p. I-4845, n.° 25, e Bergaderm e Goupil/Comissão, já referido, n.° 43). Daqui decorre que a primeira condição de existência de responsabilidade extracontratual da Comunidade apenas está preenchida se se provar que o Conselho é culpado dos erros e incumprimentos enunciados no n.° 35 supra e que estes constituem violação manifesta e grave dos limites impostos ao seu poder de apreciação em matéria de concurso público.

Observações liminares

64.
    A título liminar, o Tribunal considera oportuno recordar determinadas características específicas da empreitada que era objecto do concurso público em causa. Em primeiro lugar, a adjudicação da empreitada em causa não seria feita à proposta de preços mais baixos mas à proposta economicamente mais vantajosa, o que implica a aplicação de diversos critérios variáveis consoante a empreitada em causa (v. designadamente n.° 65, infra). Em segundo lugar, o procedimento deveria conduzir à celebração de um contrato-quadro com o prazo de cinco anos, prorrogável por períodos de doze meses. Em terceiro lugar, a empreitada era de natureza mista, consistindo em três tipos de prestações diferentes em que divergiam os métodos de determinação do preço. Além disso, a parte B do contrato consistia numa quantidade importante de prestações a serem definidas e remuneradas apenas durante a execução do contrato. Tendo em conta as características específicas da empreitada em causa, a avaliação comparativa das propostas a ser efectuada pelo Conselho implicava necessariamente não apenas a verificação por este da exactidão e fiabilidade dos preços unitários indicados nas propostas, mas também uma estimativa do custo total dos tipos de prestações previstas na empreitada durante um período de cinco anos baseada nos termos do contrato e nos preços indicados nas propostas.

Quanto à acusação baseada na utilização de critérios de selecção vagos

65.
    No que se refere aos alegados critérios de adjudicação vagos, cabe salientar, antes de mais, que o Conselho, ao aplicar o n.° 1 do artigo 30.° da Directiva 93/37, não considerou no concurso público «unicamente o preço mais baixo» mas «a proposta economicamente mais vantajosa». A este respeito, a alínea b) do n.° 1 do artigo 30.° da Directiva 93/37, relativa à proposta economicamente mais vantajosa, estabelece que os critérios aplicáveis «variam consoante o contrato em questão: por exemplo, o preço, o prazo de execução, o custo de utilização, a rentabilidade e o valor técnico».

66.
    Decorre do n.° 2 do artigo 30.° da Directiva 93/37 que, quando a adjudicação de uma empreitada é feita à proposta economicamente mais vantajosa, devem ser mencionados no caderno de encargos todos os critérios de adjudicação que o Conselho tencione aplicar. Além disso, esta disposição confere ao Conselho a escolha dos critérios de adjudicação da empreitada que considere dever acolher na condição de os critérios escolhidos visarem identificar a proposta economicamente mais vantajosa. Com efeito, o Conselho deve poder adoptar uma decisão discricionária com base em critérios qualitativos e quantitativos variáveis consoante o concurso em questão a fim de determinar a proposta economicamente mais vantajosa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 28 de Maio de 1985, Comissão/Itália, 274/83, Recueil., p. 1077, n.° 25).

67.
    A este respeito, o Tribunal recorda que, no quadro de disposições análogas da Directiva 92/50/CEE do Conselho, de 18 de Junho de 1992, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos públicos de serviços (JO L 209, p. 1), o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 36.°, n.° 1, alínea a), dessa directiva não pode ser interpretado no sentido de que cada um dos critérios de adjudicação tomados em consideração pela entidade adjudicante a fim de identificar a proposta economicamente mais vantajosa tenha necessariamente que ser de natureza puramente económica, visto não se poder excluir que factores que não são puramente económicos possam afectar o valor de uma proposta no entender da referida entidade adjudicante (acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Setembro de 2002, Concordia Bus Finland, C-513/99, Colect., p. I-7213, n.° 55).

68.
    Daqui decorre que a alínea b) do n.° 1 do artigo 30.° da Directiva 93/37 não pode ser interpretada no sentido de que cada um dos critérios de adjudicação escolhidos pelo Conselho para identificar a proposta economicamente mais vantajosa deva ser necessariamente de natureza quantitativa ou exclusivamente orientado para os preços ou tarifas do recapitulativo de medições. Com efeito, diversos factores não puramente quantitativos podem influenciar a execução dos trabalhos e, em consequência, o valor económico de uma proposta. Assim, a experiência e a capacidade técnica de um proponente e da sua equipa, o hábito do tipo de projecto objecto da empreitada em causa e a qualidade dos subempreiteiros propostos são todos elementos qualitativos que, se não atingirem o nível exigido pela empreitada, podem gerar atrasos na execução dos trabalhos ou a necessidade de trabalhos suplementares. Daqui decorre que determinados critérios mencionados no caderno de encargos para a avaliação da capacidade de um proponente para executar os trabalhos, ainda que não expressos em termos quantitativos, podem ser aplicados de forma objectiva e uniforme para comparar as propostas, sendo claramente pertinentes para a identificação da proposta economicamente mais vantajosa.

69.
    No caso em apreço, como precisou o Conselho (v. n.° 47, supra), os oito critérios referidos no caderno de encargos são, com excepção do primeiro critério relativo à conformidade da proposta, de natureza qualitativa e quantitativa. Sendo o critério relativo à conformidade da proposta de ordem absoluta, a proposta deve ser rejeitada quando não conforme com o caderno de encargos. O segundo critério, a saber, o do montante da proposta, é de natureza quantitativa, servindo para fornecer uma base objectiva à comparação dos encargos, preços e tarifas respectivos das propostas. Os seis outros critérios são todos de natureza qualitativa, sendo sua função principal verificar que cada um dos proponentes possui as competências e aptidões essenciais para a execução dos trabalhos da empreitada. O Tribunal entende que esses seis critérios, entre os quais a experiência e a capacidade técnica da empresa e a qualidade dos eventuais subempreiteiros propostos, embora não absolutos ou quantitativos como os dois primeiros, não são todavia vagos, podendo ser avaliados de forma objectiva e concreta. Além disso, saliente-se que critérios como a experiência e a capacidade técnica da empresa e a qualidade dos eventuais subempreiteiros propostos são factores susceptíveis de afectar o valor de uma proposta, sendo adequada, contrariamente ao pretendido pela demandante, a sua presença entre os critérios do caderno de encargos.

70.
    Além disso, o Tribunal salienta que a demandante se limita a afirmar que os critérios de selecção mencionados no caderno de encargos não permitiam manter a igualdade dos proponentes sem carrear a mínima prova a este respeito e sem aliás invocar discriminação em seu prejuízo. Seja como for, decorre claramente do processo e do relatório à CCAC que as três propostas do caso vertente foram examinadas com todo o cuidado necessário e que os critérios de atribuição foram aplicados sem distinção.

71.
    Assim sendo, cabe declarar que os dois critérios de apreciação enumerados no caderno de encargos eram transparentes e pertinentes relativamente à natureza da empreitada e que visavam identificar a proposta economicamente mais vantajosa.

72.
    Resulta do que precede que o Conselho não violou os limites do seu poder de apreciação quando da formulação dos critérios de atribuição no caderno de encargos.

Quanto à acusação baseada na utilização de critérios não especificados no caderno de encargos

73.
    A demandante considera também que o Conselho não baseou a sua escolha do proponente nos critérios indicados no caderno de encargos, mas em função de outros critérios não levados ao seu conhecimento, defraudando assim a legítima confiança que a demandante podia ter na regularidade do procedimento de adjudicação da empreitada. O Conselho rejeitou a sua proposta invocando três fundamentos, a saber, a indicação na proposta de preços anormalmente baixos, um factor de multiplicação demasiado elevado e preços globais demasiado altos para a duração total de cinco anos da empreitada. Ora, a demandante, em sua opinião, explicou suficientemente a forma por que determinou cada um desses elementos, demonstrando assim que os critérios realmente aplicados para guiar a escolha do Conselho eram injustificados e haviam defraudado as suas legítimas expectativas.

74.
    No que se refere aos preços considerados pelo Conselho como anormalmente baixos, é pacífico que a demandante, em vez de fornecer preços individuais para cada rubrica indicada no caderno de encargos como era exigido, utilizou para determinadas rubricas preços globais e não unitários. De acordo com o relatório à CCAC, os preços de um proponente inferiores a metade dos preços dos outros proponentes e à estimativa efectuada por arquitectos foram considerados anormalmente baixos, o que implica que os preços em causa eram duvidosos. Decorre do processo que o Conselho pediu por diversas vezes esclarecimentos à demandante sobre um grande número de preços que, em sua opinião, nem sequer cobriam o fornecimento de materiais e equipamentos. Contudo, apesar de inúmeros contactos entre as partes a este respeito, a demandante continuou a manter os mesmos preços na proposta. Referiu que a sua prática consistia em globalizar os preços, o que lhe permitia ganhar tempo na preparação da proposta, tendo confirmado que os seus preços eram correctos. A demandante afirmou também ter preparado a sua proposta em ligação com alguns dos seus fornecedores habituais, confirmando o seu compromisso de executar os trabalhos de acordo com a sua proposta (v. designadamente n.° 17, supra).

75.
    O Tribunal considera que a demandante não pode acusar o Conselho de ter verificado um grande número dos preços referidos na sua proposta. Com efeito, decorre da redacção do n.° 4 do artigo 30.° da Directiva 93/37 que incumbe ao Conselho, primeiro, identificar as propostas suspeitas, segundo, permitir às empresas em causa demonstrarem a sua seriedade, solicitando-lhes os esclarecimentos que julgue adequados, terceiro, apreciar a pertinência das explicações dadas pelos interessados e, quarto, decidir admitir ou rejeitar as propostas em questão (acórdão do Tribunal de Justiça de 27 de Novembro de 2001, Lombardini e Mantovani, C-285/99 e C-286/99, Colect., p. I-9233, n.° 55). O Tribunal observa, por exemplo, que o Conselho, na contestação, referiu ter interrogado a demandante sobre um número muito elevado de preços anormalmente baixos, a saber, o preço de 319 artigos do recapitulativo das medições num total de 1 020. Além disso, pediu esclarecimentos à demandante sobre um conjunto de anomalias muito flagrantes e, designadamente, sobre o preço das portas, idênticos quer se tratasse de portas simples, duplas ou envidraçadas. A demandante não forneceu, nem na réplica nem na audiência, justificação credível para tais anomalias.

76.
    Saliente-se, a este respeito, que o Conselho, apesar de não ser obrigado, nos termos do n.° 4 do artigo 30.° da Directiva 93/37, a verificar cada um dos preços referidos em cada proposta, deve, contudo, examinar a fiabilidade e a seriedade das propostas que lhe pareçam suspeitas em termos globais, o que implica necessariamente que solicite, sendo caso disso, esclarecimentos sobre preços individuais que lhe pareçam duvidosos, a fortiori quando forem numerosos. Além disso, o facto de a proposta da demandante ter sido considerada conforme com o caderno de encargos não isenta o Conselho da obrigação, resultante do mesmo artigo, de verificar os preços de uma proposta caso surjam dúvidas quanto à respectiva fiabilidade no decurso do exame das propostas e após a avaliação inicial da respectiva conformidade.

77.
    O Tribunal considera que o Conselho seguiu correctamente o procedimento estabelecido no n.° 4 do artigo 30.° da Directiva 93/37 e, em especial, satisfez as exigências inerentes à natureza contraditória de tal procedimento, fornecendo à demandante, por diversas vezes, a possibilidade de demonstrar a seriedade da sua proposta. A este respeito, decorre da correspondência entre as partes e, designadamente, das cartas da demandante de 24 de Janeiro e 11 de Fevereiro de 2000 dirigidas ao Conselho (v. n.os 17 e 19, supra) que a demandante, não obstante os pedidos precisos do Conselho, se limitou a confirmar de forma geral a seriedade dos preços referidos na proposta sem avançar o menor elemento de prova pertinente susceptível de comprovar a fiabilidade dos preços individuais.

78.
    Cabe considerar que o Conselho não violou de forma manifesta e grave os limites impostos ao seu poder de apreciação na matéria ao tomar em consideração, quando da avaliação da proposta da demandante, a indicação de inúmeros preços anormalmente baixos, mantendo-se a ausência de explicação convincente após o procedimento contraditório previsto no n.° 4 do artigo 30.° da Directiva 93/37.

79.
    Assim, há que rejeitar a argumentação da demandante relativa aos preços anormalmente baixos.

80.
    A demandante entende que o Conselho considerou erradamente elevado o factor de multiplicação de 20% incluído na sua proposta para as «despesas gerais de sede» enumeradas no n.° 12 supra. Sustenta ser impossível conter despesas numa margem de 6% a 8% como fazem a De Waele e a Strabag nas suas propostas.

81.
    Cabe declarar que a demandante se limita a afirmar que tal era impossível sem apresentar o menor elemento de prova ou indício a tal respeito.

82.
    Além disso, deve referir-se que o factor de multiplicação para as «despesas gerais de sede» proposto pela demandante era nitidamente mais elevado que o das outras proponentes, representando, segundo o Conselho, um risco financeiro para si se a demandante tivesse de recorrer a subempreiteiros para realização de trabalhos não previstos nas prestações especificadas no recapitulativo de medições do caderno de encargos. Em resposta a uma questão escrita colocada pelo Tribunal antes da audiência visando estabelecer a existência do alegado risco financeiro, o Conselho fez uma extrapolação, baseada nos trabalhos efectuados num dos seus edifícios durante o primeiro ano do contrato com a De Waele, a partir dos números e do factor de multiplicação indicados pela demandante na sua proposta, a fim de determinar o custo de tais trabalhos se tivessem sido efectuados por esta. O Conselho comparou em seguida o custo desses trabalhos com o dos trabalhos realizados pela De Waele, no período de um ano bem como no de cinco anos da duração prevista do contrato. Sendo que uma parte significativa dos trabalhos em causa foi efectuada por subempreiteiros, resulta dessa simulação que o Conselho deveria ter pago, sendo caso disso, à demandante uma soma nitidamente mais elevada do que a paga à De Waele pela realização dos mesmos trabalhos. Daqui decorre que foi com razão que o Conselho, quando da avaliação visando obter a proposta economicamente mais vantajosa no decurso dos cinco anos da duração do contrato, tomou em consideração o efeito potencial da diferença entre o factor de multiplicação de 20% proposto pela demandante e o proposto pelas outras proponentes.

83.
    O Tribunal considera, pois, que a demandante não provou que o Conselho cometeu um erro manifesto e grave de apreciação ao considerar, na avaliação da sua proposta, que o factor de multiplicação de 20% representava um risco financeiro. Além disso, não é pertinente o facto de o Conselho não ter recomendado, no caderno de encargos, que esse factor fosse o menos elevado possível, uma vez que o próprio objectivo do recapitulativo de medições consiste em obrigar os proponentes a indicar todos os seus preços, incluindo o factor de multiplicação, quer sejam elevados ou não, e que, se for o caso, vincularão as partes.

84.
    Cabe, pois, rejeitar a argumentação da demandante quanto ao factor de multiplicação relativo às «despesas gerais de sede».

85.
    No que se refere ao cálculo do montante das propostas para o prazo de cinco anos feita pelo Conselho quando da respectiva avaliação, a demandante considera que o Conselho concluiu erradamente que a sua proposta era a menos concorrencial a longo prazo. Salienta, designadamente, que «a fórmula» de «5A + 5B + C» utilizada pelo Conselho não constava do caderno de encargos e que esse método de cálculo era imprevisível no momento do concurso público. Além disso, sustenta que esse método de cálculo é errado, visto conduzir à obtenção de um preço global que pode não corresponder ao custo real dos trabalhos no prazo de cinco anos.

86.
    O Tribunal recorda, a título liminar, que, relativamente a esta questão, o Conselho dispunha de um amplo poder de apreciação e que o controlo do Tribunal se deve limitar a verificar a inexistência de erro grave e manifesto. Saliente-se, antes demais, que, embora o caderno de encargos não contivesse a fórmula em causa, o anúncio de concurso e o caderno de encargos especificavam claramente que a duração do contrato seria normalmente de cinco anos (v. designadamente n.° 7, supra). A aplicação da fórmula em causa permitiu, com efeito, uma extrapolação, a partir dos termos das propostas dos três proponentes, do custo total da empreitada para o Conselho durante cinco anos, tendo em consideração as diferentes características das prestações das partes A, B e C do recapitulativo de medições. Sendo que o montante da proposta de 3 946 745,49 euros anuais apresentada pela demandante (v. n.° 15, supra) era inferior ao montante anual das duas outras propostas, a extrapolação feita pelo Conselho permitiu-lhe comparar as vantagens económicas globais das três propostas à luz da duração da empreitada durante cinco anos e das características específicas das prestações previstas nas partes A, B e C do recapitulativo de medições. Ao fazê-lo, o Conselho pôde chegar à conclusão de que a proposta da demandante era a mais cara a longo prazo. O Tribunal considera que, apesar de a fórmula referida no n.° 85 supra não se encontrar no caderno de encargos, a utilização de tal fórmula era, contudo, previsível e razoável à luz, designadamente, da duração do contrato no caso vertente.

87.
    O Tribunal considera não compreensíveis os argumentos da demandante expostos no n.° 43 supra. As respostas da demandante às questões que lhe foram colocadas antes e durante a audiência não permitiram ao Tribunal ser esclarecido sobre tais argumentos. Estes devem, pois, ser rejeitados nos termos do artigo 44.°, n.° 7, alínea c), do Regulamento de Processo (v. despacho do Tribunal de Primeira Instância de 21 de Maio de 1999, T-154/98, Asia Motor France e o./Comissão, Colect., p. II-1703, n.° 49).

88.
    Resulta do que precede que a demandante não provou que o Conselho cometeu um erro manifesto e grave na apreciação do montante das propostas relativamente à duração do contrato. Em consequência, cabe rejeitar a argumentação da demandante sobre a avaliação dos preços das propostas.

Quanto à acusação baseada em falta de fundamentação

89.
    No que se refere à alegada violação da obrigação de fundamentação no caso vertente, o Tribunal salienta que o pedido de indemnização do montante de 26 063 000 euros apresentado pela demandante (v. n.° 33, supra) abrange, designadamente, um pedido de 24 000 000 euros pela reparação do prejuízo resultante da perda da possibilidade de obter a adjudicação da empreitada em causa. Observe-se que mesmo que venha a ser considerado que o Conselho não fundamentou suficientemente a rejeição da proposta da demandante, tal não provaria que a adjudicação da empreitada à De Waele constitui um erro nem que existe um nexo de causalidade entre esse facto e a perda invocada pela demandante.

90.
    Quanto aos argumentos do Conselho expostos no n.° 57 supra, o Tribunal verifica que o recurso interposto pela demandante no processo T-205/00 visava a anulação da decisão do Conselho que rejeitou conceder-lhe acesso ao processo administrativo relativo à avaliação das propostas, tendo sido, pois, interposto de uma decisão distinta da decisão controvertida. Tendo a demandante desistido do referido recurso, tal recurso não tem qualquer consequência na presente acção.

91.
    No que se refere ao argumento da demandante exposto no n.° 54 supra relativo às disposições de direito belga em matéria de concursos públicos, o Tribunal considera que a referência no n.° 26, alínea a), do caderno de encargos de que «o direito belga é aplicável à empreitada» visava submeter a eventual celebração do contrato de empreitada e a execução das prestações abrangidas pela empreitada às disposições aplicáveis do direito belga. Em contrapartida, não abrange os procedimentos anteriores à celebração da empreitada, que se regem exclusivamente pelas disposições da Directiva 93/37. Em consequência, cabe determinar o alcance da obrigação de fundamentação que incumbe ao Conselho para com o proponente não escolhido no âmbito do procedimento de adjudicação de uma empreitada nos termos do artigo 8.°, n.° 1, da Directiva 93/37, na redacção dada pela Directiva 97/52.

92.
    Resulta desta última disposição e do acórdão Adia interim/Comissão, já referido, que o Conselho cumpre a obrigação de fundamentação se se limitar, antes de mais, a informar imediatamente os proponentes afastados da rejeição da respectiva proposta por mera comunicação não fundamentada, fornecendo, em seguida, aos proponentes que o pedirem expressamente as características e vantagens relativas da proposta acolhida bem como o nome do adjudicatário no prazo de quinze dias contados da recepção de um pedido escrito.

93.
    Este modo de proceder é conforme com a finalidade da obrigação de fundamentação inscrita no artigo 253.° CE, segundo a qual há que demonstrar de uma forma clara e inequívoca o raciocínio do autor do acto, de forma a, por um lado, permitir aos interessados conhecer as razões da medida tomada a fim de poderem defender os seus direitos e, por outro, permitir ao Tribunal exercer o seu controlo (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 14 de Julho de 1995, Koyo Seiko/Conselho, T-166/94, Colect., p. II-2129, n.° 103, e Adia interim/Comissão, já referido, n.° 32).

94.
    Em consequência, para determinar se o Conselho cumpriu a obrigação de fundamentação, o Tribunal considera que há que examinar a carta de 11 de Maio de 2000 remetida à demandante em resposta ao seu pedido expresso de 26 de Abril de 2000.

95.
    Importa concluir que, na carta de 11 de Maio de 2000, o Conselho forneceu uma fundamentação suficientemente pormenorizada das razões pelas quais rejeitou a proposta da demandante, expondo as características e as vantagens relativas da proposta da De Waele. Esta carta refere claramente o procedimento adoptado quando da apreciação das propostas dos três proponentes e o facto de a proposta da De Waele ter sido escolhida, visto ser a economicamente mais vantajosa. O Tribunal considera que a demandante podia identificar imediatamente o motivo exacto da rejeição da sua proposta, a saber, o facto de ser economicamente menos vantajosa do que a da De Waele. O Conselho acrescentou que a proposta da demandante não estava classificada, à luz dos oito critérios referidos no caderno de encargos, em melhor posição do que a da De Waele.

96.
    Seja como for, e contrariamente ao pretendido pela demandante (v. n.° 55, supra), a carta do Conselho de 14 de Junho de 2000 pode também ser tomada em consideração para examinar se a fundamentação no caso vertente era suficiente, visto a obrigação de fundamentação dever ser apreciada em função dos elementos de informação de que a demandante dispunha no momento da propositura da acção. Caso, como sucede no caso em apreço, a demandante peça à instituição em causa explicações suplementares sobre uma decisão antes de intentar a acção, mas após a data prevista no artigo 8.°, n.° 1, da Directiva 93/37, recebendo essas explicações, não se pode pedir ao Tribunal que não as tome em consideração quando da avaliação da natureza suficiente da fundamentação, entendendo-se, contudo, que a instituição não pode substituir a fundamentação inicial por uma fundamentação totalmente nova, o que não sucede no caso vertente. Com efeito, na carta de 14 de Junho de 2000, o Conselho, completando a carta de 11 de Maio de 2000, forneceu explicações mais pormenorizadas, mas que correspondem às explicações dadas nesta última quanto à rejeição da proposta da demandante. Além disso, o Tribunal considera que a natureza mais completa da informação prestada na carta de 14 de Junho de 2000 não põe em causa a natureza suficiente da fundamentação contida na carta de 11 de Maio de 2000.

97.
    Daqui decorre que a demandante não pode fundar a sua acção na alegada violação da obrigação de fundamentação.

98.
    Resulta das considerações precedentes que a demandante não provou que o Conselho violou os limites impostos ao seu poder de apreciação nem, portanto, cometeu uma violação do direito comunitário suficientemente caracterizada.

99.
    Não se encontrando satisfeita a primeira condição para que haja responsabilidade da Comunidade, ou seja, a ilegalidade do comportamento censurado à instituição em causa, há que julgar improcedente o pedido de indemnização da demandante, sem que seja necessário examinar se estão preenchidas as outras condições.

Quanto às despesas

100.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a demandante sido vencida e tendo o Conselho requerido a sua condenação nas despesas, há que condená-la nas suas próprias despesas e nas despesas do Conselho.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção)

decide:

1.
    A acção é julgada improcedente.

2.
    A demandante suportará as suas próprias despesas e as despesas do Conselho.

Cooke
García-Valdecasas
Lindh

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 25 de Fevereiro de 2003.

O secretário

O presidente

H. Jung

R. García-Valdecasas


1: Língua do processo: francês.