Language of document : ECLI:EU:T:2015:235

Processo T‑10/13

Bank of Industry and Mine

contra

Conselho da União Europeia

«Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas adotadas contra o Irão com o objetivo de impedir a proliferação nuclear — Congelamento de fundos — Recurso de anulação — Prazo de recurso — Admissibilidade — Exceção de ilegalidade — Erro de direito — Proporcionalidade — Direito de propriedade — Competência do Conselho — Dever de fundamentação — Direitos de defesa — Reapreciação das medidas restritivas adotadas — Direito a uma proteção jurisdicional efetiva — Erro de apreciação»

Sumário — Acórdão do Tribunal Geral (Primeira Secção) de 29 de abril de 2015

1.      Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas contra o Irão — Decisão de congelamento de fundos — Fiscalização jurisdicional da legalidade — Alcance — Artigo 20.°, n.° 1, alínea c), da Decisão 2010/413, e artigo 1.°, n.° 8, da Decisão 2012/635 — Exclusão

(Artigo 29.° TUE; artigos 263.°, quarto parágrafo, TFUE e 275.°, segundo parágrafo, TFUE; Decisões do Conselho 2010/413/PESC, artigo 20.°, n.° 1, alínea c), e 2012/635/PESC, artigo 1.°, n.° 8)

2.      Recurso de anulação — Requisitos de admissibilidade — Interesse em agir — Pessoas singulares ou coletivas — Atos que lhes dizem direta e individualmente respeito — Recurso interposto contra um ato que impõe medidas restritivas ao recorrente — Entidade pública que invoca a proteção e as garantias associadas aos direitos fundamentais — Questão que não afeta a admissibilidade do fundamento, mas a sua justeza

(Artigos 263.°, quarto parágrafo, TFUE e 275.°, segundo parágrafo, TFUE; Decisão 2012/635/PESC do Conselho; Regulamento n.° 945/2012 do Conselho)

3.      Direito da União Europeia — Direitos fundamentais — Âmbito de aplicação pessoal — Pessoas coletivas que são emanações de Estados terceiros — Inclusão — Responsabilidade do Estado terceiro pelo respeito dos direitos fundamentais no seu próprio território — Irrelevância

Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigos 17.°, 41.° e 47      .°)

4.      União Europeia — Fiscalização jurisdicional da legalidade dos atos das instituições — Medidas restritivas contra o Irão — Medidas adotadas no âmbito da luta contra a proliferação nuclear — Alcance da fiscalização — Fiscalização limitada pelas regras gerais — Fiscalização que se estende à apreciação dos factos e à verificação das provas relativas aos atos aplicáveis a entidades específicas

[Artigo 29.° TUE; artigos 215.°, n.° 2, TFUE e 275.°, segundo parágrafo, TFUE; Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigo 47.°; Decisão 2010/413/PESC do Conselho, artigo 20.°, n.° 1, alínea c); Regulamento n.° 267/2012 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2, alínea d)]

5.      União Europeia — Fiscalização jurisdicional da legalidade dos atos das instituições — Medidas restritivas contra o Irão — Medidas adotadas no âmbito da luta contra a proliferação nuclear — Alcance da fiscalização — Fiscalização limitada pelas regras gerais — Critérios de adoção das medidas restritivas — Apoio ao Governo do Irão — Alcance — Respeito do princípio da segurança jurídica, que exige clareza, precisão e previsibilidade dos efeitos das normas jurídicas

[Decisões do Conselho 2010/413/PESC, artigo 20.°, n.° 1, alínea c), e 2012/35/PESC, considerando 13; Regulamento n.° 267/2012 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2, alínea d)]

6.      Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas contra o Irão — Congelamento dos fundos de pessoas, entidades ou organismos que participam ou que apoiam a proliferação nuclear — Restrição do direito de propriedade e do direito ao livre exercício de uma atividade económica — Violação do princípio da proporcionalidade — Inexistência

[Decisões do Conselho 2010/413/PESC, artigo 20.°, n.° 1, alínea c), 2012/35/PESC, considerando 13, e 2012/635/PESC, artigo 1.°, n.° 8; Regulamento n.° 267/2012 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2, alínea d)]

7.      Política externa e de segurança comum — Decisão adotada no âmbito do Tratado UE — Requisitos processuais impostos pelo artigo 215.°, n.° 2, TFUE — Inaplicabilidade

(Artigo 29.° TUE; artigo 215.°, n.° 2, TFUE; Decisão 2012/635/PESC do Conselho)

8.      Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas contra o Irão — Congelamento dos fundos de pessoas, entidades ou organismos que participam ou que apoiam a proliferação nuclear — Poder do Conselho, em matéria de medidas restritivas baseadas no artigo 215.° TFUE, de recorrer ao processo previsto no artigo 291.°, n.° 2, TFUE

(Artigos 215.° TFUE e 291.°, n.° 2, TFUE; Regulamento n.° 267/2012 do Conselho, artigo 23.°, n.° 2)

9.      Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas contra o Irão — Medidas adotadas no âmbito da luta contra a proliferação nuclear — Processo de inscrição na lista de pessoas e entidades sujeitas a medidas de congelamento de fundos e de recursos económicos — Escolha da base jurídica — Regulamento n.° 267/2012 — Respeito das condições previstas no artigo 291.° TFUE

(Artigos 24.°, n.° 1, segundo parágrafo, TUE, 29.° TUE e 31.°, n.° 1, TUE; artigos 215.° TFUE e 291.°, n.° 2, TFUE; Decisão 2010/413/PESC do Conselho, anexo II; Regulamento n.° 267/2012 do Conselho, artigos 23.°, n.° 2, e 46.°, n.° 2)

10.    Atos das instituições — Fundamentação — Dever — Alcance — Medidas restritivas contra o Irão — Congelamento dos fundos de pessoas, entidades ou organismos que participam ou que apoiam a proliferação nuclear — Decisão que se inscreve num contexto conhecido do interessado, que lhe permite compreender o alcance da medida adotada a seu respeito. — Admissibilidade de uma fundamentação sumária

(Artigo 296.°, segundo parágrafo, TFUE; Decisão 2012/635/PESC do Conselho; Regulamento n.° 945/2012 do Conselho)

11.    Direito da União Europeia  — Princípios — Direitos de defesa — Medidas restritivas contra o Irão — Congelamento dos fundos de pessoas, entidades ou organismos que participam ou que apoiam a proliferação nuclear — Direito de acesso aos documentos — Direito subordinado a um pedido nesse sentido ao Conselho

(Decisão 2012/635/PESC do Conselho; Regulamento n.° 945/2012 do Conselho)

12.    Direito da União Europeia  — Princípios — Direitos de defesa — Direito a uma proteção jurisdicional efetiva — Medidas restritivas contra o Irão — Congelamento dos fundos das pessoas, entidades ou organismos que prestam apoiam ao Governo do Irão — Obrigação de comunicação dos elementos incriminatórios — Alcance

Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, artigo 47.°; Decisão 2012/635/PESC do Conselho; Regulamento n.° 945/2012 do Conselho)

13.    Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas contra o Irão — Congelamento dos fundos de pessoas, entidades ou organismos que participam ou que apoiam a proliferação nuclear — Obrigação do Conselho de reapreciar estas medidas em intervalos regulares — Violação — Falta de incidência na validade das medidas — Requisitos — Respeito do objetivo da obrigação de reapreciação e inexistência de efeitos nefastos na situação da entidade em causa

(Decisão 2010/413/PESC do Conselho, artigo 26.°, n.° 3; Regulamento n.° 267/2012 do Conselho, artigo 46.°, n.° 6)

1.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 27‑30)

2.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 48, 49)

3.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 53, 55, 57, 58)

4.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 74, 75, 170‑173)

5.      O Conselho dispõe de um amplo poder de apreciação no que respeita à definição geral e abstrata dos critérios jurídicos e das modalidades de adoção das medidas restritivas. A este respeito, com a sua formulação muito ampla, o critério de apoio ao Governo do Irão confere um poder de apreciação ao Conselho. Contudo, este poder não é exorbitante ou arbitrário. Com efeito, em primeiro lugar, o princípio da segurança jurídica, que é um princípio geral do direito da União e que exige, designadamente, que as regras de direito sejam claras, precisas e previsíveis quanto aos seus efeitos, em especial quando possam comportar consequências desfavoráveis para os indivíduos e as empresas é, efetivamente, aplicável no que respeita às medidas restritivas como as que estão em causa no caso em apreço, que afetam fortemente os direitos e liberdades das pessoas e entidades em causa. Em segundo lugar, o critério de apoio ao Governo do Irão inscreve‑se num quadro jurídico claramente delimitado pelos objetivos prosseguidos pela legislação que regula as medidas restritivas contra o Irão, nomeadamente o considerando 13 da Decisão 2012/35, a qual inseriu esse critério no artigo 20.°, n.° 1, da Decisão 2010/413, que impõe medidas restritivas contra o Irão. Como resulta desse considerando 13 da Decisão 2012/35, o referido critério visa de forma individualizada e seletiva as atividades próprias à pessoa ou à entidade em causa e que, mesmo que estas não tenham enquanto tal nenhuma ligação direta ou indireta com a proliferação nuclear, são, no entanto, suscetíveis de a favorecer, ao fornecerem ao Governo do Irão os recursos ou facilidades de ordem material, financeira ou logística que lhe permite prosseguir as atividades de proliferação.

O critério não visa, portanto, todas as formas de apoio ao Governo do Irão, mas as que, pela sua importância quantitativa ou qualitativa, contribuem para a prossecução das atividades nucleares iranianas. Define, assim, de forma objetiva uma categoria limitada de pessoas e de entidades suscetíveis de ser objeto de medidas de congelamento de fundos. Consequentemente, é suscetível de ser aplicado a qualquer entidade que preste apoio, nomeadamente sob a forma de um apoio financeiro, ao Governo do Irão. Em contrapartida, não visa a totalidade das entidades detidas pelo Governo do Irão ou com ligações a este último, ou mesmo todos contribuintes iranianos.

(cf. n.os 75‑80, 83, 84, 88)

6.      Tendo em atenção a importância primordial da manutenção da paz e da segurança internacionais, o Conselho pode considerar, sem ultrapassar os limites do seu poder de apreciação, que as violações ao direito de propriedade resultantes da aplicação do critério de apoio ao Governo do Irão previsto no considerando 13 da Decisão 2012/35, que altera a Decisão 2010/413 e no artigo 20.°, n.° 1, da Decisão 2010/413, que impõe medidas restritivas contra o Irão, com vista a impor a determinadas pessoas e entidades públicas que prestam apoio esse apoio o congelamento dos seus fundos são adequadas e necessárias para exercer pressão sobre o Governo do Irão a fim de forçá‑lo a cessar as suas atividades de proliferação nuclear. Por conseguinte, esse critério, é compatível com o princípio da proporcionalidade e não confere ao Conselho um poder exorbitante.

(cf. n.os 78, 91, 92, 195‑199)

7.      A adoção prévia de uma decisão em conformidade com o capítulo 2 do título V do Tratado UE constitui uma condição necessária para que o Conselho possa adotar medidas restritivas ao abrigo dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 215.°, n.° 2, TFUE. Contudo, esta constatação não implica que a adoção de uma decisão em conformidade com o capítulo 2 do título V do Tratado UE esteja mais sujeita às exigências processuais impostas pelo artigo 215.°, n.° 2, TFUE do que às exigências impostas pelo próprio artigo 29.° TUE. Ora, este último autoriza o Conselho a agir sozinho para adotar as decisões aí previstas.

(cf. n.os 99, 101)

8.      V. texto da decisão.

(cf. n.os 105‑107)

9.      Os regulamentos, como o Regulamento n.° 267/2012, que altera a Decisão 2010/413, que impõe medidas restritivas contra o Irão que preveem medidas restritivas com base no artigo 215.° TFUE se destinam a implementar no âmbito de aplicação do Tratado FUE decisões adotadas ao abrigo do artigo 29.° TUE, no domínio da PESC. Consequentemente, o Regulamento n.° 267/2012 inscreve‑se na prossecução dos objetivos e na implementação das ações da União no domínio da política externa e de segurança comum (PESC). Em especial, devido à sua finalidade, à sua natureza e ao seu objeto, as medidas restritivas adotadas nos termos do artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 267/2012, que têm por objetivo pressionar a República Islâmica do Irão para que ponha termo à proliferação nuclear, estão mais estreitamente ligados à implementação da PESC do que ao exercício das competências conferidas à União pelo Tratado FUE.

Ora, no âmbito do Tratado UE, resulta da conjugação do artigo 24.°, n.° 1, segundo parágrafo, TUE, do artigo 29.° TUE e do artigo 31.°, n.° 1, TUE que, regra geral, o Conselho exerce o poder decisório no domínio da PESC, decidindo por unanimidade. Em especial, é o Conselho, agindo sozinho, que decide da inscrição do nome de uma pessoa ou de uma entidade no anexo II da Decisão 2010/413. Ora, procede‑se, justamente, a esta inscrição, no âmbito de aplicação do Tratado FUE, mediante a adoção de uma medida de congelamento de fundos nos termos do artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 267/2012.

Nestas circunstâncias, tendo em conta a especificidade das medidas adotadas nos termos do artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 267/2012, a necessidade de assegurar a coerência entre a lista que figura no anexo II da Decisão 2010/413 e a que figura no Anexo IX do referido regulamento, e o facto de que a Comissão não tem acesso aos dados dos serviços de informações dos Estados‑Membros que podem ser necessários para a implementação das referidas medidas, o Conselho pode considerar, corretamente, que a execução do artigo 23.°, n.° 2, do Regulamento n.° 267/2012, relativo ao congelamento de fundos, constitui um caso específico na aceção do artigo 291.°, n.° 2, TFUE, e que, portanto, pode reservar para si a competência de execução do artigo 46.°, n.° 2, do referido regulamento.

No que respeita à questão de saber se a existência de um caso específico foi devidamente justificada, a justificação da reserva de execução efetuada a favor do Conselho, no artigo 46.°, n.° 2, do Regulamento n.° 267/2012, decorre da leitura conjugada das considerações e das disposições do referido regulamento, no contexto da articulação das disposições pertinentes do Tratado UE e do Tratado FUE em matéria de congelamento de fundos.

Assim, há que concluir que as exigências impostas no artigo 291.°, n.° 2, TFUE, para que as competências de execução possam ser atribuídas ao Conselho, foram respeitadas relativamente ao artigo 46.°, n.° 2, do Regulamento n.° 267/2012, o que implica que o Conselho não pode ser acusado de qualquer violação do artigo 215.° TFUE.

(cf. n.os 109‑114, 119)

10.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 122‑127, 133‑139)

11.    V. texto da decisão.

(cf. n.° 144)

12.    V. texto da decisão.

(cf. n.os 149, 151)

13.    Nos termos do artigo 26.°, n.° 3, da Decisão 2010/413, que impõe medidas restritivas contra o Irão, e o artigo 46.°, n.° 6, do Regulamento n.° 267/2012, que impõe medidas restritivas contra o Irão, o Conselho estava efetivamente obrigado a rever as medidas restritivas relativas ao recorrente, no prazo de doze meses a contar da adoção da Decisão 2012/635 e do Regulamento de Execução n.° 945/2012 que aplica o Regulamento n.° 267/2012.

Contudo, a violação da obrigação de reapreciar as medidas restritivas adotadas não justifica a anulação dos atos em virtude dos quais foram adotadas tendo em conta que o objetivo das disposições que preveem a reapreciação periódica das medidas restritivas foi respeitado, ainda que tardiamente, e que a violação do prazo de reapreciação pelo Conselho não produz, assim, efeitos nefastos na situação do recorrente. Esse objetivo da obrigação em causa é assegurar uma verificação regular de que as medidas restritivas adotadas ainda se justificam.

(cf. n.os 155‑157, 160‑162, 164, 165)