Language of document : ECLI:EU:T:2006:296

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

10 de Outubro de 2006 (*)

«Marca comunitária – Pedido de marca nominativa comunitária map&guide – Motivos absolutos de recusa – Carácter descritivo – Falta de carácter distintivo – Artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento (CE) n.° 40/94»

No processo T‑302/03,

PTV Planung Transport Verkehr AG, com sede em Karlsruhe (Alemanha), representada por F. Nielsen, advogado,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos), representado por B. Müller e G. Schneider, na qualidade de agentes,

recorrido,

que tem por objecto um recurso interposto da decisão da Segunda Secção de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) de 1 de Julho de 2003 (processo R 1046/2001‑2), relativa a um pedido de registo da marca nominativa map&guide como marca comunitária,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Segunda Secção),

composto por: J. Pirrung, presidente, A. W. H. Meij e I. Pelikánová, juízes,

secretário: I. Natsinas, administrador,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 4 de Setembro de 2003,

vista a contestação entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 26 de Novembro de 2003,

após a audiência de 7 de Dezembro de 2005,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 15 de Fevereiro de 2001, a recorrente apresentou um pedido de registo de marca comunitária ao Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (a seguir «Instituto»), nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), modificado.

2        A marca cujo registo foi pedido é o sinal nominativo map&guide.

3        Os produtos e os serviços para os quais o registo foi pedido integram as classes 9, 41 e 42 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, tal como revisto e alterado, e correspondem, para cada uma dessas classes, à seguinte descrição:

–        «software», incluído na classe 9;

–        «realização de cursos de formação em informática», incluída na classe 41;

–        «elaboração de programas informáticos», incluída na classe 42.

4        Por decisão de 19 de Outubro de 2001, o examinador recusou o pedido de registo como marca comunitária para o «software» e para os serviços de «elaboração de programas informáticos», por força do artigo 38.° do Regulamento n.° 40/94, com o fundamento de que a marca pedida era descritiva dos produtos e serviços em questão na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 e estava desprovida de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94. Contrariamente ao que tinha inicialmente ponderado fazer, não recusou o pedido de registo para os serviços de «realização de cursos de formação em informática».

5        Em 19 de Dezembro de 2001, a recorrente interpôs recurso para o Instituto, nos termos dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.° 40/94, contra a decisão do examinador.

6        Por decisão de 1 de Julho de 2003 (a seguir «decisão impugnada»), notificada à recorrente em 4 de Julho de 2003, a Segunda Secção de Recurso negou provimento ao recurso com o fundamento de que a marca pedida era desprovida de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, especificando que não era necessário pronunciar‑se sobre a existência do motivo absoluto de recusa do registo assente no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94.

 Pedidos das partes

7        A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        condenar o Instituto nas despesas.

8        O Instituto conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

 Argumentos das partes

9        A recorrente invoca um fundamento único, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

10      Em apoio da sua pretensão, começa por sustentar que resulta da redacção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, que refere as «marcas desprovidas de carácter distintivo», que basta um pequeno grau de carácter distintivo para afastar o motivo absoluto de recusa que esta disposição prevê.

11      Alega, seguidamente, que decorre do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 3 de Julho de 2003, Best Buy Concepts/IHMI (BEST BUY) (T‑122/01, Colect., p. II‑2235, n.° 21), que uma marca é distintiva na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 se for imediatamente percebida como uma indicação da origem comercial dos produtos ou serviços em causa, a fim de permitir que o público em causa distinga, sem confusão possível, os produtos ou serviços do titular da marca daqueles que têm outra proveniência comercial. No caso em apreço, o sinal map&guide preenche esta função, pois permite indicar a proveniência comercial do «software» e dos serviços de «elaboração de programas informáticos».

12      A este respeito e em primeiro lugar, a recorrente sustenta que foi erradamente que o Instituto considerou que o sinal map&guide mantém nexos directos e concretos com o «software» e com os serviços de «elaboração de programas informáticos».

13      Em seu entender, o Instituto não teve suficientemente em conta o facto de que os produtos e os serviços a que se refere o pedido de marca comunitária não consistem em mapas de cidades ou guias turísticos, mas sim em «software» e serviços de «elaboração de programas informáticos» que podem abranger toda e qualquer temática. Por conseguinte, o nexo entre estes últimos e o sinal map&guide é necessariamente geral e hipotético. Assim e diversamente de um guia turístico na forma de um livro que todos estão de acordo em qualificar de guia turístico, ninguém falará do «map&guide» para designar um «sofware». O sinal map&guide também não proporciona qualquer indicação directa sobre o serviço de «elaboração de programas informáticos». Portanto, o público em questão percebe o sinal map&guide como uma expressão de fantasia que proporciona uma indicação sobre a proveniência comercial. Não existe, pois, um nexo entre o sinal map&guide e os serviços e produtos em questão, enquanto tais. Os nexos entre o conteúdo semântico do sinal map&guide, por um lado, e o «software» e os serviços de «elaboração de programas informáticos», por outro, resultam, em rigor, de uma operação de raciocínio intelectual dedutivo. Por conseguinte, não está preenchido o requisito prévio para se negar ao sinal map&guide qualquer aptidão a ser protegido com fundamento na falta de carácter distintivo.

14      A recorrente alega ainda que a abordagem seguida na decisão impugnada tem como consequência não poder ser aposta no «software» ou nos serviços de «elaboração de programas informáticos» qualquer marca constituída por um «termo concreto», pois é sempre possível estabelecer um nexo entre o conteúdo semântico veiculado por este termo – por exemplo, «leão» ou «águia» – e o objecto ou o âmbito de aplicação do produto ou do serviço em questão.

15      Em segundo lugar, a recorrente alega que o sinal em causa, tomado na sua globalidade e em relação com os produtos e serviços reivindicados, deve ser considerado distintivo.

16      Em terceiro lugar, a recorrente sustenta que o sinal map&guide possui necessariamente um certo grau de carácter distintivo, uma vez que o examinador, que se dispunha inicialmente a recusar o pedido de marca para o serviço de «realização de cursos de formação em informática», aceitou posteriormente o registo do sinal em causa para este serviço. Ora, se o sinal map&guide fosse completamente destituído de carácter distintivo, o examinador não teria podido alterar a sua apreciação inicial.

17      Em quarto lugar, alega que, mesmo devendo cada caso ser apreciado de modo autónomo e não assumindo os registos anteriores de outras marcas pertinência para se apreciar se uma marca pode ser protegida, o Instituto deveria, contudo, zelar por uma aplicação uniforme do direito. Daí resulta, essencialmente, que nada há que permita justificar a decisão impugnada, dado que certas marcas puderam ser registadas para produtos ou serviços com os quais mantêm relações mais estreitas do que as existentes entre, por um lado, o sinal map&guide e, por outro, o «software» e os serviços de «elaboração de programas informáticos». A título de exemplo, a recorrente refere o registo das marcas LEICHT (fácil) para móveis de cozinha embutidos, PRO CARE para produtos de higiene corporal e de beleza, POLY COLOR para produtos capilares, champôs e colorantes para cabelo, GOLDEN CARE para seguros e negócios financeiros, Safetytech para instalações destinadas à indústria de embalagem ou ainda RAPID para berbequins.

18      Por último, na sua petição, a recorrente remeteu de um modo geral para as suas alegações oferecidas no quadro do procedimento perante o Instituto. Porém, indicou na audiência que prescindia de invocar as alegações apresentadas ao Instituto no quadro dos presentes autos.

19      O Instituto sustenta que o sinal map&guide é desprovido de carácter distintivo e contesta os argumentos da recorrente.

20      Em primeiro lugar, alega essencialmente que o carácter distintivo de uma marca pedida, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, reside na aptidão concreta desta marca para identificar, enquanto indicação da origem comercial, os produtos e os serviços especificados no pedido. A este respeito, resulta da jurisprudência que o elemento determinante a tomar em conta reside na percepção presumida de um consumidor médio, normalmente informado e razoavelmente atento e avisado, que faça parte do público em causa (acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Junho de1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C‑342/97, Colect., p. I‑3819, n.° 26).

21      No caso em apreço, será o ponto de vista de um consumidor anglófono que importa tomar em consideração a fim de apreciar o carácter distintivo da marca pedida. Com efeito e por um lado, o sinal map&guide está composto por palavras da língua inglesa e, por outro, resulta do artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94 que não é possível o registo de um sinal como marca comunitária quando seja desprovido de carácter distintivo numa única das línguas utilizadas pelo público no território da Comunidade [acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 30 de Março de 2000, Ford Motor/IHMI (OPTIONS), T‑91/99, Colect., p. II‑1925, n.os 25 e segs.].

22      Em segundo lugar, o Instituto sustenta que, contrariamente ao alegado pela recorrente, existe um nexo directo e concreto entre o sinal map&guide e os produtos e serviços para os quais o registo deste sinal é pedido, o que retira ao referido sinal todo o carácter distintivo no tocante aos produtos e serviços em questão.

23      A este respeito, alega que, como entendeu a Câmara de Recurso, as palavras «map» e «guide», que significam respectivamente mapa ou mapa de cidade e guia ou guia de viagem, são ambas desprovidas de carácter distintivo, na medida em que designam unicamente o próprio objecto do produto designado «software» e do serviço denominado «elaboração de programas informáticos». Como salienta a decisão impugnada, o consumidor médio da categoria dos produtos ou serviços em questão compra os programas informáticos com vista a explorar os dados que contêm e compreende, sem construção intelectual ou dedução, que o programa informático ou o serviço conexo cria mapas geográficos, mapas de cidade ou guias de viagem.

24      Ao que acresce, como indica a decisão impugnada, que a simples combinação das palavras «map» e «guide» em « map&guide » mais não representa do que a soma destes elementos desprovidos de carácter distintivo. A ligação entre os dois termos pelo sinal tipográfico «&», que significa «e», nada tem de inusitado no plano gramatical. A construção do sinal map&guide não apresenta, pois, um afastamento perceptível relativamente à terminologia utilizada na linguagem corrente que lhe possa conferir um carácter distintivo na acepção do acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 2001, Procter & Gamble/IHMI (C‑383/99 P, Colect., p. I‑6251). Confrontado com o sinal map&guide no contexto do software e da elaboração de programas informáticos, o consumidor apreende o seu significado imediatamente e estabelece sem esforço intelectual um nexo concreto e directo entre o referido sinal e os produtos e serviços que deve designar.

25      Além disso, o examinador determinou adequadamente o ponto de vista do público em causa com base em exemplos. Referiu também que o software apresentado na forma de um mapa geográfico com um guia e que oferece certas possibilidades, como a elaboração de um itinerário individual, que excedem o âmbito de um guia impresso em suporte de papel, são correntes no mercado, em especial, na forma de CD‑ROM. A recorrente não contesta estas constatações factuais.

26      Quanto ao argumento da recorrente de que ninguém designará um software através da expressão «map&guide», ao passo que um guia de viagem na forma de um livro será designado pelos termos «guia de viagem», o Instituto alega, essencialmente, que um software pode substituir um livro, na medida em que existem, nas regiões anglófonas da Comunidade, obras de referência que são apresentadas tanto na forma de livros como na de CD‑ROM. Acrescenta que um consumidor confrontado com a inscrição «map&guide» num livro pensa imediatamente num guia de viagens acompanhado de mapas geográficos ou de mapas de cidade e que, portanto, os termos «guia de viagem», «map», «guide» ou ainda «map&guide» não podem ser objecto de protecção no respeitante às publicações incluídas na classe 16. Por conseguinte, o mesmo vale para o correspondente software.

27      No tocante à crítica da recorrente segundo a qual, a seguir‑se o critério da decisão impugnada, nenhum nome concreto, como «leão» ou «águia», poderá ser objecto de protecção no que respeita ao software ou os serviços conexos, o Instituto contrapõe, essencialmente, que é o ponto de vista do consumidor que prevalece e que este ponto de vista é caracterizado de modo determinante pela prática concreta do sector em questão. Ora, não escapa ao grande público, que no caso em apreço é o público em questão, que os mapas geográficos ou os mapas de cidade acompanhados de um guia são comercializados na forma de software. Portanto e como a Câmara de recurso concluiu no presente caso, confrontado com a inscrição «map&guide» numa embalagem de software ou no contexto de um serviço correspondente, o consumidor médio, vista a prática do mercado, pensa num software na forma de um guia de viagem electrónico acompanhado de mapas de cidade ou de mapas geográficos. Em contrapartida, o Instituto entende que, confrontado com um software com a denominação de «leão» ou de «águia» (ou de «apple»), o público pertinente não considerará que se trata da designação do conteúdo do software, mais perceberá esta denominação como uma marca.

28      O Instituto acrescenta ainda que, se a recorrente pretendesse comercializar ao abrigo da marca map&guide software que não tivesse por objecto mapas geográficos e guias, poderia ter limitado a lista dos produtos e serviços para os quais pediu o registo, como lhe permite o artigo 44.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94. No caso em apreço, o pedido de registo abrangia o conjunto da categoria não diferenciada de produtos denominada «software» e a categoria não diferenciada de serviços denominada «elaboração de programas informáticos». Nestas condições, há que confirmar a apreciação da Câmara de Recurso respeitante ao conjunto destas categorias [acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 7 de Junho de 2001, DKV/IHMI (EuroHealth), T‑359/99, Colect., p. II‑1645, n.° 33, e de 27 de Fevereiro de 2002, Ellos/IHMI (ELLOS), T‑219/00, Colect., p. II‑753, n.° 36].

29      Em terceiro lugar, o Instituto alega que o facto de o examinador ter retirado as objecções que tinha inicialmente formulado contra a marca pedida, na medida em que esta abrangia o serviço de «realização de cursos de formação em informática» incluído na classe 41, é irrelevante no caso em apreço.

30      Em quarto lugar, o Instituto sustenta que a alegação de que aceitou no passado registar marcas que apresentavam um nexo consideravelmente mais estreito com os produtos e serviços que abrangiam do que o existente entre o sinal map&guide e os produtos e serviços controvertidos é irrelevante no quadro do presente litígio. A este respeito, alega que, na sequência do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Fevereiro de 2002, Streamserve/IHMI (STREAMSERVE) (T‑106/00, Colect., p. II‑723, n.os 66 e 67), a recorrente não pode argumentar com o erro que o Instituto tenha eventualmente cometido ao registar marcas comparáveis noutros casos.

31      Decorre do conjunto das precedentes considerações que o sinal map&guide não pode servir de indicação da origem do «software» e dos serviços de «elaboração de programas informáticos».

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

32      Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94, será recusado o registo, por força da alínea b) dessa disposição, das marcas desprovidas de carácter distintivo e, por força da alínea c) dessa mesma disposição, das marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes.

33      Cada um dos motivos de recusa de registo enumerados no artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 40/94 é independente dos outros e exige uma análise separada. Além disso, há que interpretar os referidos motivos de recusa à luz do interesse geral que está na base de cada um deles. O interesse geral tomado em consideração na análise de cada um desses motivos de recusa pode, ou mesmo deve, reflectir considerações diferentes, consoante o motivo de recusa em causa (v. acórdãos de 29 de Abril de 2004, Henkel/IHMI, C‑456/01 P e C‑457/01 P, Colect., p. I‑5089, n.os 45 e 46, de 16 de Setembro de 2004, SAT.1/IHMI, C‑329/02, Colect., p. I‑8317, n.° 25, e de 15 de Setembro de 2005, BioID/IHMI, C‑37/03 P, Colect., p. I‑7975, n.° 59).

34      Porém, existe uma sobreposição evidente dos âmbitos de aplicação respectivos dos motivos enunciados nas alíneas b) a d) da referida disposição (acórdãos do Tribunal de Justiça de 12 de Fevereiro de 2004, Campina Melkunie, C‑265/00, Colect., p. I‑1699, n.° 18, e Koninklijke KPN Nederland, C‑363/99, Colect., p. I‑1619, n.° 67). Em especial, resulta da jurisprudência que uma marca nominativa que seja descritiva das características de produtos ou de serviços, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 é, por esse facto, necessariamente desprovida de carácter distintivo relativamente a esses mesmos produtos ou serviços, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do mesmo regulamento (v. acórdãos Campina Melkunie, já referido, n.° 19, e Koninklijke KPN Nederland, já referido, n.° 86).

35      Num caso como o presente, no qual a decisão impugnada recusou o registo da marca pedida em razão da existência do motivo absoluto de recusa previsto no artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94, há que examinar se o Instituto demonstrou que esta marca era desprovida de carácter distintivo.

36      A este respeito, há que recordar que o conceito de interesse geral subjacente ao artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 se confunde manifestamente com a função essencial da marca, que é garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade de origem do produto ou do serviço designado pela marca, permitindo‑lhe distinguir, sem confusão possível, este produto ou serviço de outros que tenham proveniência diversa (acórdãos SAT.1/IHMI, já referido no n.° 33, supra, n.os 23 e 27, e BioID/IHMI, já referido no n.° 33, supra, n.° 60).

37      Numa marca composta por palavras e por um sinal tipográfico, como a marca que constitui o objecto do presente litígio, um eventual carácter distintivo pode ser analisado, em parte, relativamente a cada um dos seus termos ou dos seus elementos, considerados separadamente, mas deve, em todo o caso, depender de uma análise do conjunto que eles compõem. Com efeito, a simples circunstância de cada um desses elementos, considerado separadamente, ser desprovido de carácter distintivo não exclui a possibilidade de a combinação que formam apresentar um carácter distintivo (acórdãos Campina Melkunie, já referido no n.° 34, supra, n.os 40 e 41, Koninklijke KPN Nederland, já referido no n.° 34, supra, n.os 99 e 100, e SAT.1/IHMI, já referido no n.° 33, supra, n.° 28).

38      Resulta da decisão impugnada que a Câmara de Recurso julgou o recurso improcedente com fundamento, nomeadamente, no facto de, relativamente ao «software» e à «elaboração de programas informáticos», o sinal map&guide ser seguramente percebido pelo consumidor apenas como uma indicação relativa aos próprios produtos e serviços, e não como uma indicação de origem que permita distinguir os produtos e os serviços de uma empresa dos de outra empresa.

39      Daí decorre que a Câmara de Recurso, apesar de ter indicado que não era necessário examinar o motivo absoluto de recusa respeitante ao carácter descritivo do sinal em causa, considerou, essencialmente, que o sinal map&guide não era distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 pela razão de ser percebido pelo público pertinente como descritivo dos produtos e serviços em causa.

40      Assim, há que de verificar se o nexo estabelecido pela Câmara de Recurso entre o teor semântico do sinal cujo registo foi pedido, por um lado, e os produtos e serviços em causa, por outro, é suficientemente concreto e directo para demonstrar que este sinal permite, no espírito do público em causa, uma identificação imediata destes produtos e serviços e que possui, assim, um carácter descritivo (ver, neste sentido, acórdão EuroHealth, já referido no n.° 28, supra, n.os 35 e 36).

41      A este respeito, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, o carácter descritivo de um sinal, tal como o seu carácter distintivo, deve ser apreciado, por um lado, relativamente aos produtos ou aos serviços para os quais o registo é pedido e, por outro, em relação à percepção que deles tem o público em causa (acórdão Procter & Gamble/IHMI, já referido no n.° 24, supra, n.° 39, e acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Outubro de 2004, IHMI/Erpo Möbelwerk, C‑64/02 P, Colect., p. I‑10031, n.° 43).

42      A recorrente não contesta a apreciação da Câmara de Recurso de que o público em causa no que respeita aos produtos e serviços para os quais o registo da marca foi pedido é constituído pelo consumidor médio no seio do grande público. De resto e como alegou o Instituto, de acordo com o artigo 7.°, n.° 2, do Regulamento n.° 40/94, o público‑alvo em causa relativamente ao qual há que apreciar o motivo absoluto de recusa é o consumidor médio anglófono, uma vez que o sinal em causa é composto por elementos da língua inglesa.

43      A este propósito, a Câmara de Recurso indicou, sem impugnação da recorrente, que o sinal em causa é, designadamente, composto por dois substantivos da língua inglesa, «map» e «guide», cujo significado é, respectivamente, mapa ou mapa de cidade e guia ou guia de viagem.

44      Considerou ainda expressamente que a simples combinação dos termos «map» e «guide» através do sinal tipográfico «&», que significa «e», não era de forma alguma original no plano gramatical e que, por conseguinte, o sentido dos termos assim combinados se mantinha inalterado. Daí concluiu que o sinal cujo registo foi pedido, considerado no seu conjunto, não representava mais do que a soma dos elementos que o compõem.

45      Acrescente‑se também que, como alegou o Instituto, há que considerar que a construção do sinal map&guide, tomado no seu conjunto, não revela um afastamento perceptível relativamente à terminologia utilizada na linguagem corrente do público em causa que seja susceptível de lhe conferir um carácter distintivo na acepção do acórdão Procter & Gamble/IHMI, já acima referido no n.° 24 (n.° 40).

46      Há, pois, que concluir que foi correctamente que a Câmara de Recurso considerou, essencialmente, que o sinal tomado no seu conjunto significava «map and guide», isto é, mapa (de cidade) e guia (de viagem).

47      No tocante ao nexo existente entre o conteúdo semântico do sinal map&guide e os produtos e serviços em questão, foi com acerto que a Câmara de Recurso entendeu que este sinal se limitava a descrever o próprio objecto de certos produtos («software») e de certos serviços («elaboração de programas informáticos»). Com efeito, na zona linguística anglófona da Comunidade, este sinal pode servir para designar o software e os serviços de elaboração de programas informáticos cuja função consiste em proporcionar mapas (de cidade) e guias (de viagem). Daí decorre que o teor semântico do sinal map&guide permite ao público em causa estabelecer imediatamente e sem reflexão adicional um nexo directo e concreto com o software e com os serviços de elaboração de programas informáticos que desempenham a função de mapa (de cidade) e de guia (de viagem).

48      Uma vez que o pedido de registo versava sobre a categoria indiferenciada do «software» e sobre a categoria indiferenciada dos serviços de «elaboração de programas informáticos», há que confirmar a apreciação da Câmara de Recurso, na medida em que se refere ao conjunto destes produtos e serviços (ver, neste sentido, acórdão EuroHealth, já referido no n.° 28, supra, n.° 33).

49      Contrariamente ao sustentado pela recorrente, a circunstância de o «software» e os serviços de «elaboração de programas informáticos» poderem abranger toda e qualquer temática não se opõe à conclusão de que o conteúdo semântico do sinal em causa descreve o próprio objecto de alguns dos produtos e serviços visados pelo pedido de registo. Com efeito, ao alegar que os produtos e serviços a que este pedido respeita abrangem toda e qualquer temática, a recorrente admite implicitamente que, entre os incluídos no «software» e nos serviços de «elaboração de programas informáticos», alguns têm por função proporcionar mapas (de cidade) e guias (de viagem).

50      Há que referir ainda que uma abordagem como a seguida pela Câmara de Recurso não tem a consequência, como sustenta a recorrente, de deixar de ser permitido o registo de marcas constituídas por um «termo concreto» a respeito do «software» ou dos serviços de «elaboração de programas informáticos», pela razão de ser sempre possível estabelecer um nexo entre o conteúdo semântico do sinal e os produtos e serviços em questão. Na verdade, é unicamente na medida em que este nexo seja directo e concreto que o artigo 7.°, n.°1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94 se opõe ao registo de semelhante sinal.

51      Resulta do exposto que foi correctamente que a Câmara de Recurso considerou que, para o público em causa composto pelo consumidor médio no seio do grande público anglófono, o sinal map&guide era descritivo dos produtos e serviços visados pelo pedido de registo. Portanto e em conformidade com a jurisprudência segundo a qual todos os sinais descritivos são necessariamente desprovidos de carácter distintivo (acórdãos Campina Melkunie, já referido no n.° 34, supra, n.° 19, e Koninklijke KPN Nederland, já referido no n.° 34 supra, n.° 86), foi com acerto que a Câmara de Recurso considerou que o sinal map&guide não era distintivo.

52      Há também que recordar, na medida em que a Câmara de Recurso decidiu fundamentar igualmente a decisão impugnada na consideração de que o sinal tomado no seu conjunto pode ser comummente utilizado no comércio para a apresentação dos produtos e serviços em questão (n.os 15 e 16 da referida decisão), que decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que este não é o critério à luz do qual o artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94 deve ser interpretado e que o interesse geral subjacente a esta disposição não exige que os sinais que tem por objecto possam ser livremente utilizados por todos (acórdão SAT.1/IHMI, já referido no n.° 33, supra, n.° 36).

53      Contudo e uma vez que a decisão impugnada assenta na apreciação correcta de que o sinal map&guide não é distintivo devido à existência de um nexo directo e concreto entre o seu conteúdo semântico e os produtos e serviços em questão, há que julgar que a Câmara de Recurso não cometeu qualquer erro ao concluir pela existência de um motivo absoluto de recusa do registo do sinal map&guide.

54      A isto acresce que resulta da jurisprudência acima referida no n.° 41 que o carácter distintivo de uma marca deve ser apreciado relativamente aos produtos e serviços para os quais o registo foi pedido. Portanto e contrariamente ao que sustenta a recorrente, a circunstância de o examinador ter aceite o carácter distintivo do sinal map&guide a respeito dos serviços de «realização de cursos de formação em informática» não releva para a apreciação do carácter distintivo deste sinal a respeito dos produtos e serviços diferentes que constituem o «software» e os serviços de «elaboração de programas informáticos».

55      Por último e contrariamente ao sustentado pela recorrente, mesmo que o Instituto alegadamente já tenha admitido o registo de marcas para produtos e serviços que apresentam com essas marcas nexos mais estreitos do que os tecidos pelo sinal map&guide com os produtos e serviços para os quais foi pedido o registo deste sinal, daí não resulta de forma alguma que a aplicação uniforme do Regulamento n.° 40/94 imponha que o referido sinal seja registado como marca comunitária para os produtos e serviços em questão. Com efeito, as decisões que as Câmaras de Recurso são chamadas a tomar por força do Regulamento n.° 40/94 a respeito do registo de um sinal como marca comunitária resultam do exercício de uma competência vinculada e não de um poder discricionário. Assim, a legalidade das decisões das Câmaras de Recurso só deve ser apreciada com base nesse regulamento, tal como interpretado pelo juiz comunitário, e não com base numa prática decisória anterior a estas (acórdão BioID/IHMI, já referido no n.° 33 supra, n.° 47, e a jurisprudência aí referida). De resto, as marcas invocadas e os produtos e serviços aos quais estão associadas não são análogos ao sinal em causa nem aos produtos e serviços a que diz respeito o caso em apreço. Por conseguinte e em obediência à jurisprudência acima recordada no n.° 41, o registo das marcas invocadas pela recorrente não releva para a apreciação do carácter distintivo do sinal map&guide relativamente aos produtos e serviços em causa nos presentes autos.

56      Visto o conjunto das precedentes considerações, há que concluir que foi correctamente que a Câmara de Recurso considerou que o sinal map&guide era desprovido de carácter distintivo, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 40/94.

57      Daí resulta que há que negar provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

58      Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com o pedido do recorrido.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Segunda Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A recorrente é condenada nas despesas.

Pirrung

Meij

Pelikánová

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 10 de Outubro de 2006.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      J. Pirrung


* Língua do processo: alemão.