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CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

PAOLO MENGOZZI

apresentadas em 30 de maio de 2018 (1)

Processo C120/17

Administratīvā rajona tiesa

contra

Ministru kabinets

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Latvijas Republikas Satversmes tiesa (Tribunal Constitucional da Letónia)]

«Reenvio prejudicial — Regulamento (CE) n.o 1257/1999 relativo ao apoio do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA) ao desenvolvimento rural — Agricultura — Apoio ao desenvolvimento rural — Apoio à reforma antecipada — Possibilidade de um Estado‑Membro adotar uma disposição prevendo o direito de herdar o apoio — Aprovação pela Comissão Europeia — Mudança posterior da posição da Comissão — Confiança legítima»






1.        O Latvijas Republikas Satversmes tiesa (Tribunal Constitucional, Letónia), no presente processo, convida, antes do mais, o Tribunal de Justiça a fornecer esclarecimentos sobre o alcance dos artigos 10.o a 12.o do Regulamento (CE) n.o 1257/1999 do Conselho, de 17 de maio de 1999, relativo ao apoio do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA) ao desenvolvimento rural e que altera e revoga determinados regulamentos (2) (a seguir «Regulamento n.o 1257/1999») e, em especial, a questão de saber se essas disposições permitem aos Estados‑Membros adotar, no âmbito da aplicação do referido regulamento, uma medida que prevê a transmissão por via sucessória do apoio à reforma antecipada.

2.        Em caso de resposta negativa, o Tribunal de Justiça é chamado a pronunciar‑se sobre os limites do princípio da proteção da confiança legítima. Em particular, o Tribunal de Justiça é convidado a esclarecer o valor que deve ser conferido à decisão pela qual a Comissão Europeia aprova um plano de desenvolvimento rural, em conformidade com o artigo 44.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1257/1999, no âmbito da apreciação relativa ao surgimento dessa confiança, bem como o valor que deve ser atribuído a conclusões posteriores do Comité do Desenvolvimento Rural (3) junto da mesma instituição no âmbito da apreciação relativa à sua supressão.

I.      Quadro jurídico

A.      Direito da União

3.        A aplicação da política de desenvolvimento rural da União Europeia assenta no princípio de uma gestão partilhada entre a União e os Estados‑Membros, por força do qual o direito da União fixa um quadro jurídico geral a ser completado pelos direitos nacionais. Neste contexto, o Regulamento n.o 1257/1999 estabelece as regras gerais para o apoio ao desenvolvimento rural financiado pelo FEOGA.

4.        Segundo o considerando 23 do Regulamento n.o 1257/1999, «é conveniente incentivar a reforma antecipada na atividade agrícola, tendo em conta a experiência adquirida com a aplicação do Regulamento (CEE) n.o 2079/92» (4).

5.        O título II («Medidas de Desenvolvimento Rural»), do Regulamento n.o 1257/1999 contém os artigos 10.o a 12.o O artigo 10.o, n.o 1, deste regulamento dispõe:

«O apoio à reforma antecipada na agricultura contribuirá para os seguintes objetivos:

–        proporcionar um rendimento aos agricultores idosos que decidam cessar as suas atividades agrícolas,

–        favorecer a substituição desses agricultores idosos por agricultores que possam, sempre que necessário, melhorar a viabilidade económica das restantes explorações,

–        reafetar terras agrícolas a utilizações não agrícolas quando a sua afetação a fins agrícolas não seja possível em condições satisfatórias de viabilidade económica».

6.        O artigo 11.o, n.o 1 e 5, do referido regulamento prevê:

«1.      O cedente de uma exploração agrícola deve:

–        cessar definitivamente qualquer atividade agrícola comercial, podendo, no entanto, continuar a praticar a agricultura para fins não comerciais e conservar a utilização dos edifícios onde continue a habitar,

–        ter uma idade não inferior a 55 anos, sem ter atingido a idade normal da reforma no momento da cessão,

e

–        ter exercido a atividade agrícola nos 10 anos anteriores à cessão.

5.      As condições previstas no presente artigo serão aplicáveis durante todo o período em que o cedente receba o apoio à reforma antecipada».

7.        Nos termos do artigo 12.o, n.o 2, do mesmo regulamento:

«A duração do apoio à reforma antecipada não excederá um período total de 15 anos para o cedente e de 10 anos para o trabalhador agrícola. A duração desse apoio não continuará após o septuagésimo quinto aniversário de um cedente, nem após a idade normal de reforma de um trabalhador.

Quando, no caso de um cedente, o Estado‑Membro pague uma pensão de reforma normal, o apoio à reforma antecipada será concedido a título de complemento, tendo em conta o montante da pensão nacional de reforma».

8.        Os artigos 35.o a 50.o do Regulamento n.o 1257/1999 fazem parte do título III, intitulado «Princípios gerais e disposições administrativas e financeiras». Nos termos do artigo 39.o do regulamento:

«1.      Os Estados‑Membros tomarão todas as medidas necessárias para garantir a compatibilidade e a coerência das medidas de apoio ao desenvolvimento rural nos termos do presente capítulo.

2.      Os planos de desenvolvimento rural apresentados pelos Estados‑Membros incluirão uma avaliação da compatibilidade e da coerência das medidas de apoio ao desenvolvimento rural previstas e uma indicação das medidas tomadas para garantir a compatibilidade e a coerência.

3. Se necessário, as medidas de apoio serão revistas posteriormente para garantir a sua compatibilidade e coerência».

9.        O artigo 44.o, n.o 2, prevê:

«A Comissão avaliará os planos propostos para determinar a sua coerência com o presente regulamento. A Comissão aprovará, com base nesses planos, nos seis meses seguintes à sua apresentação, documentos de programação em matéria de desenvolvimento rural nos termos do n.o 2 do artigo 50.o do Regulamento (CE) n.o 1260/1999 (5)».

B.      Direito letão

10.      O Ministru kabineta noteikumi 2004. gada 30. Novembra Nr. 1002 — «Kārtība, kādā ieviešams programmdokuments “Latvijas Lauku attīstības plāns Lauku attīstības programmas īstenošanai 2004.‑2006.gadam”» (Decreto n.o 1002 do Conselho de Ministros, de 30 de novembro de 2004, que estabelece as modalidades de aplicação do documento de programação «Plano de desenvolvimento rural (a seguir «Plano de desenvolvimento rural») da Letónia para a execução do programa de desenvolvimento rural 2004‑2006», a seguir «Decreto n.o 1002»,), aprovou o documento de programação. O Decreto n.o 1002 entrou em vigor em 7 de dezembro de 2004.

11.      O n.o 9.3 do Plano de desenvolvimento rural prevê a possibilidade de os proprietários idosos de explorações agrícolas entregarem, venderem ou darem a sua exploração ou parte desta a um terceiro recebendo um apoio à reforma antecipada (a seguir designado «apoio à reforma antecipada»), cujas condições de admissão correspondem, em larga medida, às do artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1257/1999.

12.      A alínea a) da secção intitulada «Reforma Antecipada» do n.o 12.3.2 do Plano de desenvolvimento rural previa, nomeadamente, que, no caso de morte do beneficiário do apoio durante o período em que um contrato administrativo relativo à concessão de uma pensão de reforma antecipada esteja em vigor, a pensão mensal de reforma antecipada para o período remanescente continuará a ser paga à pessoa cujos direitos sucessórios foram consagrados nos termos do direito nacional.

13.      Com base nesse Plano de desenvolvimento rural, o Lauku atbalsta dienests (Serviço de Apoio ao Mundo Rural, Letónia) celebrou o referido contrato administrativo com os agricultores que pretendiam beneficiar de apoio à reforma antecipada.

14.      O n.o 1 do Ministru kabineta 2015. gada 14. aprīla noteikumi Nr. 187 «Grozījmus Ministru kabineta 2004. Gada 30. Novembra noteikumos Nr. 1002 Kārtība, kādā ieviešams programmdokuments “Latvijas Lauku attīstības plāns Lauku attīstības programmas īstenošanai 2004.‑2006.gadam”» (Decreto n.o 187 do Conselho de Ministros, de 14 de abril de 2015, que altera o Decreto n.o 1002 (a seguir, «Decreto n.o 187»), suprimiu da alínea a) a possibilidade de transmissão sucessória desse apoio. Segundo o seu n.o 2, o Decreto n.o 187 entrou em vigor em 30 de abril de 2015.

II.    Quadro factual do litígio no processo principal, questões prejudiciais e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

15.      Por decisão de 30 de julho de 2004, a Comissão Europeia aprovou o documento de programação «Plano de desenvolvimento rural da Letónia para a execução do programa de desenvolvimento rural 2004‑2006», que previa a transmissão sucessória do apoio à reforma antecipada.

16.      O Administratīvā rajona tiesa (Tribunal Administrativo de Primeira Instância, Letónia), onde os particulares interpuseram um pedido de verificação da validade do referido contrato administrativo de concessão de uma pensão de reforma antecipada num contexto em que o Serviço de Apoio ao Mundo Rural, Letónia deixou de respeitar os compromissos assumidos face a esses particulares com base no Decreto n.o 187.

17.      Considerando que o n.o 1 do Decreto n.o 187 não era conforme com o artigo 105.o da Latvijas Republikas Satversme (Constituição da República da Letónia), que consagra o direito de propriedade, o Administratīvā rajona tiesa (Tribunal Administrativo de Primeira Instância, Letónia) interpôs recurso para o Latvijas Republikas Satversmes tiesa (Tribunal Constitucional, Letónia).

18.      A este respeito, o Administratīvā rajona tiesa (Tribunal Administrativo de Primeira Instância, Letónia) considera que a celebração de um contrato relativo à concessão de uma pensão de reforma antecipada fez surgir no cedente agrícola e nos seus herdeiros uma confiança legítima de que estes poderiam herdar o apoio se os compromissos assumidos em virtude do contrato continuassem a ser respeitados.

19.      Pelo contrário, o Ministru kabinets (Conselho de Ministros) entende que o Decreto n.o 187, de que é autor, está em conformidade com o artigo 105.o da Constituição da República da Letónia. A este respeito, nota que, na sua reunião de 19 de outubro de 2011, o Comité do Desenvolvimento Rural da Comissão concluiu que o financiamento do FEOGA não se aplicava à transmissão sucessória do apoio à reforma antecipada. Assim, entende que esta não corresponde ao objetivo fixado pelo Regulamento n.o 1257/1999 e conduz a um desperdício das finanças da União e da República da Letónia.

20.      Por outro lado, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se o Regulamento n.o 1257/1999 proíbe a inclusão no direito letão de uma disposição relativa à transmissão sucessória do apoio à reforma antecipada. Sublinha que, se fosse o caso, o direito de os herdeiros do cedente receberem o apoio ao abrigo do Decreto n.o 1002 não poderia ser considerado um direito de propriedade, pelo que o Decreto n.o 187 não poderia dar lugar a uma restrição do referido direito.

21.      Considerando que o Decreto n.o 1002 constitui a aplicação de um regulamento, a resposta depende, segundo o órgão jurisdicional de reenvio, da questão de saber se o referido regulamento deixou uma margem de apreciação aos Estados‑Membros. A este respeito, o tribunal de reenvio salienta que as condições de obtenção do apoio à reforma antecipada que figuram nos artigos 10.o a 12.o do Regulamento n.o 1257/1999 implicariam a natureza pessoal do direito correspondente, isto é, apenas a pessoa que tivesse cedido a sua exploração a um terceiro teria o direito de receber essa ajuda. Por conseguinte, os Estados‑Membros não poderiam preencher as referidas condições prevendo que o direito a receber o apoio à reforma antecipada fosse transmitido aos herdeiros do cedente de uma exploração agrícola, uma vez que estes últimos não são partes no contrato administrativo relativo à concessão de uma pensão de reforma antecipada.

22.      A esse respeito, o órgão jurisdicional de reenvio observa que, no domínio da agricultura, o Tratado estabeleceu uma competência partilhada entre a União e os Estados‑Membros. A Comissão salienta o facto de o artigo 41.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1257/1999 obrigar os Estados‑Membros a apresentar à Comissão planos de desenvolvimento rural e de esta os analisar para determinar se estão em conformidade com este regulamento. Se o plano for aprovado, o órgão jurisdicional de reenvio recorda que deve ser considerado definitivo, de modo a que o Estado‑Membro em causa tenha o direito de o adotar. Ora, a Comissão decidiu aprovar, em 30 de julho de 2004, um documento de programação em matéria de desenvolvimento rural da Letónia para o período de programação 2004‑2006, que incluía, nomeadamente, a disposição relativa à transmissão sucessória do apoio à reforma antecipada.

23.      O órgão jurisdicional de reenvio realça também que dúvidas acerca da interpretação dos artigos 10.o a 12.o do Regulamento n.o 1257/1999 resultam da carta dirigida ao Conselho de Ministros pela Comissão em 11 de maio de 2015, segundo a qual deve ser claro para todos os Estados‑Membros que os pagamentos ao abrigo do apoio à reforma antecipada não se transmitem aos herdeiros do cedente de uma exploração agrícola e que já não é possível invocar uma confiança legítima desde 19 de outubro de 2011, devendo esta data ser considerada uma data limite para a assinatura de um novo contrato de apoio com uma cláusula legítima de herança. Além disso, questiona‑se sobre se o processo que lhe foi submetido é um caso em que a prática de um Estado‑Membro não conforme com o direito da União pôde produzir efeitos jurídicos, uma vez que, aquando da assinatura do contrato relativo à concessão de uma pensão, os agricultores em causa não podiam ter conhecimento de um eventual erro do Estado‑Membro e da Comissão sobre a possibilidade de transmitir o apoio em causa por sucessão.

24.      Nestas circunstâncias, o órgão jurisdicional de reenvio decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Tendo em conta as competências partilhadas entre a União Europeia e os Estados‑Membros no domínio da agricultura, devem as disposições do Regulamento n.o 1257/1999 ser interpretadas, à luz de um dos seus objetivos — que os agricultores participem na medida de reforma antecipada na atividade agrícola —, no sentido de que se opõem a que, no âmbito das medidas de aplicação do referido regulamento, um Estado‑Membro adote uma legislação que permita que se herde o apoio à reforma antecipada na atividade agrícola?

2)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão prejudicial, isto é, saber se as disposições do Regulamento n.o 1257/1999 excluem a possibilidade de se herdar o apoio à reforma antecipada na atividade agrícola, é possível que tenha sido adquirido um direito subjetivo a herdar o apoio concedido no âmbito da medida de reforma antecipada na atividade agrícola, numa situação em que uma norma jurídica de um Estado‑Membro tenha sido considerada conforme com as disposições do Regulamento n.o 1257/1999, pela Comissão Europeia, observando o procedimento adequado, e os agricultores tenham beneficiado da referida medida de acordo com a prática nacional?

3)      Em caso de resposta afirmativa à segunda questão prejudicial, isto é, saber se é possível que tenha sido adquirido o direito subjetivo referido, pode considerar‑se que a conclusão da reunião do Comité de Desenvolvimento Rural da Comissão […], de 19 de outubro de 2011, segundo a qual o apoio à reforma antecipada na atividade agrícola não pode ser transmitido aos herdeiros do cedente da exploração agrícola, constitui um fundamento para a extinção antecipada do direito subjetivo adquirido anteriormente referido?»

25.      Estas questões foram objeto de observações escritas apresentadas pelo Governo letão e pela Comissão Europeia. Estas partes interessadas também foram ouvidas em alegações na audiência de 17 de janeiro de 2018 (6).

III. Análise jurídica

A.      Quanto à primeira questão prejudicial

26.      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 10.o a 12.o do Regulamento n.o 1257/1999 se opõem a que os Estados‑Membros, no âmbito da aplicação destas disposições, adotem uma medida que permita a transmissão por via sucessória do apoio à reforma antecipada.

27.      A título preliminar, creio que é necessário recordar as condições em que a jurisprudência do Tribunal de Justiça impõe a adoção de medidas de aplicação de um regulamento pelos Estados‑Membros.

28.      Segundo o Tribunal de Justiça, os Estados‑Membros podem adotar as referidas medidas, desde que não interfiram com a aplicabilidade direta do regulamento em questão, não dissimulem a sua natureza comunitária e especifiquem a margem de apreciação que lhes é conferida, respeitando os limites das suas disposições (7).

29.      É, portanto, necessário fazer referência às disposições pertinentes do Regulamento n.o 1257/1999, interpretadas à luz dos seus objetivos, a fim de determinar, em primeiro lugar, se estas proíbem, impõem ou permitem aos Estados‑Membros adotar medidas que prevejam a transmissão por via sucessória do apoio à reforma antecipada e, neste último caso, se a medida de aplicação efetivamente adotada pela República da Letónia se inscreve na margem de apreciação reconhecida a cada Estado‑Membro (8).

30.      Saliento que as disposições do Regulamento n.o 1257/1999 não abordam a questão da transmissão sucessória. Em especial, não autorizam nem proíbem expressamente que o apoio à reforma antecipada possa ser transmitido aos herdeiros dos agricultores cedentes.

31.      Em contrapartida, a questão de saber se essas disposições devem ser interpretadas no sentido de que permitem aos Estados‑Membros adotar tal medida de aplicação parece‑me muito menos evidente.

32.      A este respeito, entendo ser necessário observar que o regime de apoio à reforma antecipada, tal como é definido pelo regulamento em causa, não se opõe, à primeira vista, a uma interpretação no sentido de que uma disposição nacional que preveja a transmissão do apoio por via sucessória é suscetível de permanecer dentro dos limites da margem de apreciação de que os Estados‑Membros dispõem na aplicação do regulamento.

33.      Vários elementos são suscetíveis, com efeito, de permitir tal conclusão (9).

34.      Em primeiro lugar, pode ser o resultado de uma interpretação teleológica. Se tivermos em conta o objetivo do mecanismo do apoio à reforma antecipada, este constitui, como recorda a própria Comissão, um «incentivo económico» aos agricultores, que visa, em última análise, melhorar a viabilidade das explorações agrícolas (10). Nestas condições, a medida de apoio só pode, contudo, exercer o seu efeito de incentivo, contribuindo, deste modo, para a realização do objetivo de melhoria da viabilidade, se for suficientemente atrativa para os agricultores que preencham os requisitos estabelecidos nos artigos 11.o e 12.o do Regulamento n.o 1257/1999.

35.      Ora, não tenho a menor dúvida de que uma legislação nacional que atribui aos agricultores a possibilidade de transmitir o apoio aos seus próprios herdeiros contribuiria para atingir esse objetivo. Até se poderia supor que esta possibilidade teria uma influência importante ou mesmo determinante nos Estados‑Membros com um determinado tecido económico e social, sobre a escolha dos agricultores de cessarem a sua atividade agrícola antes de atingir a idade da reforma para beneficiarem do apoio em questão. Por conseguinte, esta abordagem interpretativa poderia levar os Estados‑Membros a considerar que uma legislação nacional que prevê esta possibilidade não é incompatível com as disposições do Regulamento n.o 1257/1999.

36.      O artigo 12.o do Regulamento n.o 1257/1999 poderia também levar os Estados‑Membros a tirar essa conclusão. Em primeiro lugar, o seu n.o 1 impõe limites ao montante da ajuda comunitária, através de uma remissão para os limites máximos fixados no anexo (11). A este respeito, parece‑me que a ausência de uma proibição expressa de transmissão do apoio aos herdeiros, conjugada com a presença dos limites, pode ser interpretada no sentido de que estes limites máximos constituem o único instrumento necessário para assegurar a proteção do interesse geral de uma utilização eficaz dos recursos da União, enquanto o legislador da União deixou aos Estados‑Membros a faculdade de consagrar ou não a transmissão do apoio por via sucessória (12).

37.      O artigo 12.o, n.o 2, que impõe limites à duração do pagamento do apoio poderia também ser considerado suscetível de fundamentar uma decisão de compatibilidade da transmissão por via sucessória do apoio, por via do Regulamento n.o 1257/1999. Com efeito, embora seja verdade que um dos dois limites que esse regulamento impõe é baseado na idade do agricultor cedente («o apoio não continuará após o septuagésimo quinto aniversário de um cedente […]»), pelo que não se presta a ser aplicada aos seus herdeiros, não é menos verdade que o outro não faz referência a nenhuma característica inerente à pessoa do agricultor cedente («[a] duração do apoio à reforma antecipada não excederá um período total de 15 anos para o cedente»). Ora, se o primeiro limite é apenas aplicável aos agricultores cedentes, o segundo poderia ser entendido pelos Estados‑Membros como sendo aplicável aos seus herdeiros (13).

38.      O último e mais importante elemento, que milita fortemente a favor de uma conclusão de que a norma nacional letã não é incompatível com o regulamento em causa, é que o Plano de desenvolvimento rural incluindo a disposição que introduz a transmissão por via sucessória do apoio à reforma antecipada, a saber, o Decreto n.o 1002, foi objeto de uma decisão de aprovação da Comissão nos termos do artigo 44.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1257/1999, que visa, como já foi declarado (14), o conteúdo desse plano.

39.      Não obstante as considerações desenvolvidas até este momento, a interpretação segundo a qual estas disposições permitem aos Estados‑Membros, na aplicação do Regulamento n.o 1257/1999, prever a transmissão sucessória do apoio à reforma antecipada, por muito fundada que seja, não me convence.

40.      A este respeito, faço notar que, nas suas observações, tanto o Governo letão como a Comissão consideram que esta questão requer uma resposta negativa.

41.      O raciocínio jurídico que levou a Comissão a esta conclusão tem o meu acordo. Por isso, recordo‑o em seguida.

42.      Em primeiro lugar, a Comissão observa que resulta da leitura do artigo 10.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1257/1999, bem como do seu considerando 23, que o objetivo do regime de apoio à reforma antecipada no setor agrícola é proporcionar um rendimento aos agricultores idosos que decidam cessar as suas atividades agrícolas e favorecer a substituição desses agricultores por outros que possam, sempre que necessário, melhorar a viabilidade económica das restantes explorações. Por outras palavras, o apoio à reforma antecipada constitui, como recorda a Comissão, um incentivo económico para incentivar os agricultores idosos a cessarem definitivamente a sua atividade agrícola mais cedo do que o fariam em circunstâncias normais e, deste modo, facilitar a transformação estrutural do setor agrícola, com vista a assegurar a viabilidade das explorações. Para esse efeito, as disposições do regulamento relativas ao apoio à reforma antecipada destinam‑se a identificar, atrair e fazer beneficiar do apoio apenas os verdadeiros agricultores, que praticam a agricultura a título profissional e já sejam idosos. Por conseguinte, as condições previstas por essas disposições para beneficiar do apoio, na opinião da Comissão, têm uma natureza pessoal e estão assim indissociavelmente ligadas ao agricultor, o que é partilhado pela República da Letónia.

43.      A este respeito, a Comissão observa que o artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1257/1999 prevê que, para poder beneficiar do apoio, o cedente de uma exploração agrícola deve ter uma idade não inferior a 55 anos, ter exercido a atividade agrícola comercial durante os dez anos anteriores à cessão da exploração e, posteriormente, cessar esta atividade. Para além disso, o n.o 5 do artigo 11.o do mesmo regulamento precisa que a aplicação dessas condições está ligada ao período em que o «cedente agrícola», e não o seu herdeiro, beneficia do apoio. Do mesmo modo, o caráter pessoal das obrigações impostas ao cedente agrícola resulta do artigo 12.o, n.o 2, do regulamento em causa, na medida em que estabelece que o direito ao apoio e a obrigação de o pagar terminam quando o cedente da exploração atinja os 75 anos e que o montante do apoio será reduzido em função da pensão normal que lhe é paga pelo Estado.

44.      Tendo em conta estas considerações, a Comissão conclui que o caráter pessoal do apoio à reforma antecipada, como resulta dos artigos 11.o e 12.o do Regulamento n.o 1257/1999, não permite a adoção de uma legislação nacional, como o Decreto n.o 1002, que prevê a transmissão do apoio por via sucessória.

45.      Esta interpretação, baseada no caráter estritamente pessoal dos requisitos previstos nas disposições do Regulamento n.o 1257/1999, parece‑me convincente.

46.      Por conseguinte, ainda que as disposições do Regulamento n.o 1257/1999 relativas ao apoio à reforma antecipada não me pareçam inequívocas no que respeita à possibilidade de os Estados‑Membros preverem, aquando da aplicação dessas disposições, a transmissão do apoio por via sucessória, considero, pelas mesmas razões que foram enunciadas pela Comissão e pela República da Letónia, que essa transmissão é incompatível com as referidas disposições desse regulamento.

B.      Quanto à segunda e terceira questão prejudiciais

47.      Com a sua segunda questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se, no caso de se responder à primeira questão no sentido de que a possibilidade de transmitir o apoio à reforma antecipada por via sucessória não é compatível com o Regulamento n.o 1257/1999, uma situação de facto pela qual uma norma nacional que permita essa transmissão foi validamente aprovada pela Comissão em conformidade com o Regulamento n.o 1257/1999 — e com base na qual alguns agricultores participaram numa medida de reforma antecipada — pôde fazer surgir uma confiança legítima nos herdeiros dos agricultores. Em caso de resposta afirmativa, com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a conclusão mencionada na ata da reunião do Comité do Desenvolvimento Rural da Comissão de 19 de outubro de 2011, nos termos da qual o apoio à reforma antecipada não é transmissível por via sucessória, pode ser considerada supressora da confiança legítima dos herdeiros dos agricultores que participaram numa medida de reforma antecipada (15).

48.      Na medida em que estas questões requerem uma interpretação do princípio da proteção da confiança legítima, parece‑me oportuno fazer algumas observações preliminares para definir o âmbito de aplicação material do referido princípio.

49.      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o princípio da proteção da confiança legítima inscreve‑se entre os princípios fundamentais da União (16) e, como tal, deve ser observado quer pelos órgãos da União, quer pelos Estados‑Membros na aplicação das normas da União (17).

50.      Tendo em conta que visa manter as situações jurídicas existentes, o princípio da proteção da confiança legítima entra necessariamente em conflito com outros princípios fundamentais do direito da União, nomeadamente com o princípio da legalidade. O seu teor é, por conseguinte, definido pela ponderação dos interesses privados subjacentes à manutenção das situações jurídicas, por um lado, e do interesse público materializado pelo princípio da legalidade, por outro (18).

51.      Por outras palavras, no âmbito da apreciação do respeito do princípio da proteção da confiança legítima, o Tribunal de Justiça é chamado a determinar, através de uma análise específica das circunstâncias de facto próprias de cada caso, se as expectativas dos particulares em causa devem prevalecer sobre a aplicação efetiva do direito da União.

52.      A proteção da confiança legítima é, portanto, oponível se um particular puder demonstrar que se encontra numa posição especial que deve ser considerada digna de proteção num Estado de direito.

53.      Por conseguinte, coloca‑se a questão de saber se a situação dos herdeiros dos agricultores (19) que tenham celebrado com o Serviço de Apoio ao Mundo Rural um contrato administrativo relativo à concessão de uma pensão de reforma antecipada que contém uma cláusula relativa à herança do referido apoio, com base num Plano de desenvolvimento rural, aprovado pela Comissão e aplicado pelo Decreto n.o 1002, constitui uma situação digna de proteção, uma vez que o Serviço de Apoio ao Mundo Rural, Letónia, deixou de efetuar os pagamentos devidos a título dos ditos contratos em resultado da supressão da possibilidade de transmissão por via sucessória através do Decreto n.o 187.

54.      A título preliminar, parece‑me importante precisar que o órgão jurisdicional de reenvio não pretende saber se pode ser invocada uma confiança legítima contra os efeitos da alteração legislativa sobre os pagamentos futuros aos herdeiros dos agricultores signatários dos contratos administrativos, mas contra os pagamentos efetuados antes da sua entrada em vigor. Por conseguinte, a jurisprudência clássica, recordada pela República da Letónia nas suas observações escritas, segundo a qual os operadores económicos não têm fundamento para depositar a sua confiança legítima na manutenção de uma situação existente que pode ser alterada no âmbito do poder de apreciação das instituições da União (20) (ou das autoridades nacionais que aplicam o direito da União) não é, em meu entender, aplicável ao caso em apreço. Pela mesma razão, é irrelevante no caso presente o facto de a escolha de suprimir as disposições relativas à transmissão por via sucessória resultar da margem de apreciação que o artigo 39.o do Regulamento n.o 1257/1999 confere aos Estados‑Membros, também este invocado pela República da Letónia.

55.      Dito isto, examinarei agora os dados factuais do presente processo à luz da jurisprudência relevante para determinar se a situação em apreço é suscetível de justificar que se faça prevalecer a proteção da confiança legítima sobre a aplicação efetiva do direito da União.

56.      De acordo com a jurisprudência, a existência de uma situação digna de proteção pressupõe a reunião de três condições cumulativas. Em primeiro lugar, deve existir um comportamento objetivo das autoridades administrativas. Em segundo lugar, o particular deve estar de boa‑fé. Em terceiro lugar, o comportamento da Administração deve estar em conformidade com as normas aplicáveis (21).

57.      No sentido de assegurar a coerência do raciocínio, é oportuno começar pela análise da terceira condição. Com efeito, se fosse entendida no sentido de que uma prática nacional não conforme com o direito da União como a que está em causa no presente caso, isto é, a celebração pelo Serviço de Apoio ao Mundo Rural, Letónia, dos contratos administrativos com uma cláusula de herança, não pode fazer surgir uma confiança legítima, seria forçoso observar‑se, em razão da falta desta última condição, que a segunda questão prejudicial submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio apelaria a uma resposta negativa, sem que a análise das outras condições se revelasse necessária.

58.      De resto, a corrente jurisprudencial respeitante aos erros ou faltas de um serviço ou de uma autoridade nacional na aplicação do direito da União poderia ser interpretada neste sentido. Nesta jurisprudência, o Tribunal de Justiça rejeitou várias vezes os fundamentos baseados na violação do princípio da proteção da confiança legítima ao considerar que «[este princípio] não pode ser invocado contra uma disposição precisa de um preceito do direito da União e o comportamento de uma autoridade nacional encarregada de aplicar o direito da União, que está em contradição com este último, não pode criar, na esfera jurídica de um operador económico, confiança legítima em que pode beneficiar de um tratamento contrário ao direito da União» (22).

59.      No acórdão a proferir, o Tribunal de Justiça deve, em meu entender, tomar, antes de mais, posição sobre a interpretação desta jurisprudência.

60.      Pela minha parte, entendo que o Tribunal não deve concluir daí que uma confiança digna de proteção, não possa, em caso algum, resultar de uma prática nacional incompatível com o direito da União. Com efeito, parece‑me que a ideia subjacente à jurisprudência em questão é mais a de que esta questão deve ser resolvida à luz do texto do direito da União em que a prática ilegal das autoridades nacionais se baseia. Mais especificamente, a proteção da confiança legítima não pode basear‑se numa prática nacional que ignora uma disposição «precisa» de um texto do direito da União (23).

61.      Recordo que o texto em questão no caso em apreço é o Regulamento n.o 1257/1999, nomeadamente os seus artigos 10.o a 12.o Ora, como foi exposto na análise da primeira questão prejudicial, estas disposições são, em princípio, suscetíveis de interpretações divergentes e, por conseguinte, não são de uma clareza tal que os herdeiros dos agricultores que tenham celebrado com o Serviço de Apoio ao Mundo Rural contratos administrativos com uma cláusula de herança não devam confiar na legalidade dessa cláusula.

62.      Esta leitura da jurisprudência parece‑me ainda corroborada pela versão em língua alemã («klare Bestimmung») e ainda mais com a versão em língua inglesa («unambiguous provision») do texto dos acórdãos em análise.

63.      Não ignoro que, nas suas observações escritas, a Comissão concluiu que não podia surgir uma confiança legítima nomeadamente a nível do direito da União, com base num obiter dictum do Tribunal Geral da União Europeia no Acórdão Polónia/Comissão (T‑257/13, não publicado, EU:T:2015:111), segundo o qual «a aceitação pela Comissão do Plano de desenvolvimento rural não confere a esse documento de programação um valor jurídico superior ao do Regulamento n.o 1257/1999 […]» (24). No entanto, considero que a ideia subjacente a esta afirmação do Tribunal Geral era que a norma em causa, a saber, o artigo 11.o, n.o 1, primeiro travessão, do regulamento («[O cedente de uma exploração agrícola deve] […] cessar definitivamente qualquer atividade agrícola comercial» […]), não deixava lugar a qualquer dúvida razoável quanto à obrigação que incumbia aos Estados‑Membros de verificar se os agricultores tinham exercido a atividade agrícola com fins comerciais no período precedente à cessação da referida atividade, e devia, por conseguinte, ser qualificada de «disposição precisa», o que, tal como referi, não é aqui o caso.

64.      Em qualquer caso, se a decisão da Comissão não pode, por si só, fazer surgir, no caso em apreço, uma confiança legítima nos herdeiros, deveria, na minha opinião, ser tomada em consideração na apreciação da «precisão» do texto em causa do direito da União. Com efeito, no caso de estas considerações não serem consideradas suficientes para demonstrar que os artigos 10.o, 11.o, n.o 1, segundo e terceiro travessões, e 12.o do regulamento não são «disposições precisas», recordo que o Decreto n.o 1002, isto é, a base jurídica da cláusula de herança que figura nos contratos administrativos entre o (Serviço de Apoio ao Mundo Rural e os agricultores, foi adotada na sequência da aprovação pela Comissão do Plano de desenvolvimento rural 2004‑2006 da República da Letónia, que contém a cláusula de herança na alínea a) da secção «Reforma Antecipada» do seu n.o 12.3.2. Ora, se mesmo a interpretação dada pela Comissão (25) aos artigos 10.o, 11.o e 12.o do Regulamento n.o 1257/1999 admite a possibilidade de transmitir o apoio à reforma antecipada por via sucessória, muito embora esta possibilidade seja incompatível com os referidos artigos, não vejo como se poderiam qualificar de «disposições precisas» na aceção da jurisprudência.

65.      Assim, a prática da Administração nacional que consiste na celebração de contratos administrativos incluindo uma cláusula de herança do apoio à reforma antecipada é suscetível de fazer surgir uma confiança legítima, ainda que seja incompatível com os artigos 10.o a 12.o do Regulamento n.o 1257/1999, em razão do facto destas disposições não serem precisas na aceção da jurisprudência do Tribunal de Justiça.

66.      Nestas condições, a fim de determinar se surgiu uma confiança legítima nos herdeiros dos agricultores signatários dos contratos administrativos, importa verificar se as primeiras duas condições enumeradas no n.o 56 das presentes conclusões estão também preenchidas, ou seja, se a confiança legítima assenta num comportamento das autoridades administrativas e se o beneficiário dessa confiança legítima estava de boa‑fé.

67.      No que respeita à primeira condição, a confiança legítima do particular deve decorrer de um comportamento das autoridades administrativas. Mais especificamente, é necessário que o comportamento, tendo em conta as suas características objetivas, seja suscetível de fazer surgir uma expectativa razoável no particular.

68.      A este respeito, questiono‑me sobre a questão de saber se o comportamento que terá feito surgir a confiança legítima dos herdeiros no processo principal foi o da Comissão (a decisão de aprovação do Plano de desenvolvimento rural da República da Letónia) ou o da Administração nacional letã (a celebração com os agricultores dos contratos administrativos relativos à concessão de uma pensão de reforma antecipada) (26). A resposta que se impõe é, na minha opinião, que a confiança legítima dos herdeiros no seu direito de receber o montante relativo ao apoio à reforma antecipada resulta dos compromissos assumidos em relação aos agricultores nos contratos administrativos pela Administração nacional. Ora, é evidente, na minha opinião, que se deve considerar que o comportamento da Administração nacional da Letónia cumpre as exigências impostas pela jurisprudência.

69.      Com efeito, não se pode negar que os compromissos assumidos no âmbito dos contratos administrativos emanam de uma autoridade competente e investida do poder de decisão. Sendo o organismo público designado pelo Estado letão para administrar o regime nacional de apoio à reforma antecipada, em cumprimento das obrigações assumidas por esse Estado nos termos do artigo 38.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 1260/99, o Serviço de Apoio ao Mundo Rural, Letónia, é autorizado a vincular a Administração nacional no que respeita à concessão do referido apoio (27).

70.      Da mesma forma, é evidente que o comportamento material adotado por este organismo, ou seja, a celebração de contratos administrativos com os agricultores incluído uma cláusula de herança, era suscetível de permitir aos herdeiros destes criar expectativas legítimas de que os compromissos assumidos pelo Lauku atbalsta dienests (Serviço de Apoio ao Mundo Rural, Letónia) seriam respeitados, ou seja, todos os pagamentos do apoio seriam devidamente efetuados.

71.      Quanto à segunda condição, a existência da boa‑fé só pode ser declarada se a alteração ocorrida na situação jurídica do particular não fosse previsível (28) à luz do modelo do «operador prudente e avisado» (29). O conceito de previsibilidade não é, no entanto, puramente objetivo, mas depende em grande medida de uma apreciação caso a caso, tendo em conta a posição subjetiva individual do particular (30).

72.      Em circunstâncias como as do caso em apreço, em que a situação jurídica do particular era regulada por uma disposição nacional que foi substituída por uma nova em razão da sua incompatibilidade com o direito da União, a previsibilidade desta alteração traduz‑se, em minha opinião, pela perceção da ilegalidade da disposição em questão. Com efeito, é evidente que um particular não pode confiar na legalidade de uma disposição nacional cuja incompatibilidade com o direito da União é manifesta.

73.      Por conseguinte, há que verificar se a incompatibilidade da prática nacional com o Regulamento n.o 1257/1999 da prática nacional que consiste na inclusão de uma cláusula de herança de apoio à reforma antecipada nos contratos administrativos era percetível para os herdeiros dos agricultores signatários dos ditos contratos, o que excluiria a existência da sua boa‑fé.

74.      Em meu entender, é provável, com base nas informações que resultam dos autos do processo principal, que essa ilegalidade não era percetível.

75.      É certo que o padrão do operador económico prudente e avisado poderia impor aos herdeiros obrigações rigorosas em termos de diligência, em conformidade com o princípio nemo censiturignorare legem, que poderiam, em princípio, ir ao ponto de exigir desses herdeiros o conhecimento da incompatibilidade da cláusula de herança com o Regulamento n.o 1257/1999. Contudo, não se pode descurar uma das peças centrais do quadro factual do presente processo, ou seja, a transmissão por via sucessória do apoio à reforma antecipada tal como estava incluída no Plano de desenvolvimento rural, foi objeto de uma decisão expressa de autorização da Comissão. Em presença desta decisão de aprovação, parece‑me que mesmo um operador económico extremamente cauteloso confiaria na compatibilidade da cláusula de herança com o direito da União (31).

76.      A este respeito, o facto, sublinhado pela República da Letónia nas suas observações escritas, de, como declarou o Tribunal de Justiça no Acórdão de 19 de setembro de 2002, Huber (C‑336/00, EU:C:2002:509, n.o 40), a aprovação de um Plano de desenvolvimento rural pela Comissão não lhe conferir a natureza de ato de direito da União não me parece suscetível de influenciar o peso que se deve reconhecer neste caso à decisão de aprovação da Comissão.

77.      Não há dúvida, com efeito, que, ao adotar a decisão de aprovação do Plano de desenvolvimento rural proposto pelo Estado‑Membro em causa, a Comissão pronunciou‑se igualmente sobre a legalidade da cláusula de herança, como recordei no n.o 39 das presentes conclusões.

78.      A existência da boa‑fé entre os herdeiros, em minha opinião, é ainda mais evidente considerando que a tomada de posição em sentido contrário da Comissão que só foi adotada na reunião do Comité de Desenvolvimento Rural de 19 de outubro de 2011, cerca de sete anos após a adoção da referida decisão de aprovação (32).

79.      Por conseguinte, nenhum elemento do processo sugere que estes herdeiros não podiam depositar a sua boa‑fé na manutenção da sua situação jurídica, ou seja, no facto de o Serviço de Apoio ao Mundo Rural cumprir as obrigações de pagamento que lhe incumbia por força dos referidos contratos administrativos.

80.      Em conclusão, as três condições necessárias ao surgimento de uma confiança legítima dos herdeiros relativamente à legalidade da transmissão por via sucessória do apoio à reforma antecipada estão, em minha opinião, preenchidas no caso em apreço.

81.      Consequentemente, os herdeiros em questão teriam, em princípio, o direito de receber todos os pagamentos relativos aos apoios concedidos com base nos contratos administrativos entre as datas de entrada em vigor do Decreto n.o 1002 (7 de dezembro de 2004) e do Decreto n.o 187 (30 de abril de 2015). Eliminando a fonte da transmissão sucessória do apoio à reforma antecipada, este último suprime igualmente a justificação da confiança legítima dos herdeiros.

82.      Neste contexto, com a terceira questão prejudicial, o tribunal de reenvio pede ao Tribunal de Justiça para determinar se essa confiança legítima não deveria ser considerada eliminada numa data anterior à da adoção do decreto n.o 187, a saber, a data da adoção de conclusões do Comité do Desenvolvimento Rural da Comissão na sua 52.a reunião. Estas conclusões enunciavam que a transmissão sucessória do apoio à reforma antecipada não estava em conformidade com o Regulamento (CE) n.o 1698/2005 do Conselho, de 20 de setembro de 2005, relativo ao apoio ao desenvolvimento rural pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (Feader) (33), que substituiu o Regulamento n.o 1257/1999 e as medidas de desenvolvimento rural para o período 2007‑2013.

83.      Esta questão reclama, em meu entender, uma resposta negativa.

84.      Tal não depende do facto de as conclusões em causa não terem por objeto o Regulamento n.o 1257/1999 mas o Regulamento n.o 1698/2005. O teor do artigo 23.o do Regulamento n.o 1698/2005 é, evidentemente, análogo em tudo ao dos artigos 10.o a 12.o do Regulamento n.o 1257/1999.

85.      Esta resposta justifica‑se mais, em minha opinião, pelo facto de as condições para a existência da confiança legítima não deixarem de ser cumpridas em virtude da adoção das ditas conclusões.

86.      Embora seja verdade que se pode argumentar que estas conclusões têm o efeito de excluir a realização da segunda condição, a saber, a relativa à boa‑fé dos herdeiros, considero que tal interpretação seria, apesar disso, errada.

87.      A fim de a refutar, abordarei brevemente a referida interpretação.

88.      Para recordar, nos n.os 75 a 77 das presentes conclusões, referi que a decisão da Comissão que aprova o Plano de desenvolvimento rural apresentado pela República da Letónia para o período 2004‑2006, que incluía uma disposição que permitia a transmissão sucessória do apoio à reforma antecipada é um elemento determinante para concluir que os herdeiros dos agricultores signatários dos contratos administrativos relativos à concessão de uma pensão de reforma antecipada não estavam em condições de perceber a ilegalidade da cláusula de herança, e estavam, por conseguinte, de boa‑fé. Esta decisão é, com efeito, suscetível de reduzir os requisitos elevados para a existência da boa‑fé decorrentes da aplicação da norma do operador económico prudente e avisado.

89.      Nestas circunstâncias, poderia considerar‑se que as conclusões do Comité do Desenvolvimento Rural da Comissão, segundo as quais a transmissão sucessória do apoio à reforma antecipada não é conforme ao direito da União, são suscetíveis de eliminar os efeitos sobre a boa‑fé produzidos pela decisão de aprovação da mesma instituição. Se tal fosse o caso, o comportamento dos herdeiros deveria ser avaliado com base na versão puramente objetiva do padrão do operador económico prudente e informado, e a ilegalidade da cláusula de herança seria assim considerada percetível pelos herdeiros.

90.      Não partilho o cerne deste raciocínio.

91.      Na minha opinião, as conclusões do Comité do Desenvolvimento Rural não podem ser tidas em conta no âmbito da apreciação da existência da boa‑fé dos herdeiros no caso em apreço.

92.      Isso deve‑se ao facto de esses particulares não terem conhecimento do conteúdo da ata da reunião do Comité do Desenvolvimento Rural. Com efeito, resulta das informações que constam dos autos que o conteúdo do referido relatório não tinha sido transmitido aos herdeiros. Por outro lado, o dever de diligência destes últimos não implica que estes devessem ser informados desse conteúdo. Parece‑me evidente que não se pode impor aos herdeiros as mesmas exigências quanto à sua obrigação de se informarem como as que são impostas às grandes empresas no domínio do direito da concorrência (34).

93.      Considerando que as conclusões do Comité do Desenvolvimento Rural não eram nem conhecidas nem acessíveis pelos herdeiros, é evidente que essas conclusões não são suscetíveis de excluir a existência da sua boa‑fé.

94.      Por conseguinte, essas conclusões não podem servir de fundamento à supressão da confiança legítima dos herdeiros no direito de receber o apoio à reforma antecipada com base na cláusula de herança que figura nos contratos administrativos relativos ao período 2004‑2006. Esta confiança legítima deve, portanto, ser considerada demonstrada até à data de entrada em vigor do Decreto n.o 187, a saber, 30 de abril de 2015.

IV.    Conclusão

95.      Tendo em conta estas considerações, proponho ao Tribunal de Justiça que responda do seguinte modo ao pedido de decisão prejudicial submetido pelo Latvijas Republikas Satversmes tiesa (Tribunal Constitucional, Letónia):

1)      Os artigos 10.o a 12.o do Regulamento (CE) n.o 1257/1999 do Conselho, de 17 de maio de 1999, relativo ao apoio do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA) ao desenvolvimento rural e que altera e revoga determinados regulamentos, opõem‑se a que os Estados‑Membros, no âmbito da aplicação destas disposições, adotem uma medida que permita a transmissão por via sucessória do apoio à reforma antecipada.

2)      Uma situação de facto em que uma norma nacional que permite a transmissão por via sucessória do apoio à reforma antecipada foi validamente aprovada pela Comissão Europeia como sendo conforme com o Regulamento n.o 1257/1999 — com base na qual alguns agricultores participaram numa medida de reforma antecipada — pode fazer surgir para os herdeiros desses agricultores, com base no direito da União, uma confiança legítima.

3)      As conclusões da reunião do Comité do Desenvolvimento Rural da Comissão de 19 de outubro de 2011 não podem servir de fundamento a uma supressão antecipada da confiança legítima, na medida em que, não sendo conhecidas nem acessíveis pelos herdeiros, não são suscetíveis de excluir a existência da sua boa‑fé.


1      Língua original: francês.


2      JO 1999, L 160, p. 80.


3      Este comité foi criado nos termos do artigo 84.o do Regulamento (UE) n.o 1305/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2013, relativo ao apoio ao desenvolvimento rural pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (Feader) e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1698/2005 do Conselho (JO 2013, L 347, p. 487).


4      Regulamento (CEE) n.o 2079/92 do Conselho, de 30 de junho de 1992, que institui um regime comunitário de ajudas à reforma antecipada na agricultura (JO 1992, L 215, p. 91).


5      Regulamento (CE) n.o 1260/1999 do Conselho de 21 de junho de 1999 que estabelece disposições gerais sobre os Fundos estruturais (JO 1999, L 161, p. 1).


6      A este respeito, parece‑me essencial salientar um aspeto do processo no Satversmes tiesa (Tribunal Constitucional, Letónia). Com efeito, resulta da leitura da Satversmes tiesas likums (Lei do Tribunal Constitucional) que as partes no processo pendente no administratīvā rajona tiesa (tribunal administrativo de distrito), com exceção da autoridade pública que adotou o ato impugnado, só têm o direito de apresentar observações no procedimento de legitimidade constitucional quando o Staversmes tiesa (Tribunal Constitucional, Letónia) considera que estas podem contribuir para um julgamento exaustivo e objetivo do processo (artigo 22.o, n.o 3, da Lei do Tribunal Constitucional). Uma vez que não são «partes necessárias» para este processo, não são autorizadas a apresentar observações no quadro dos processos prejudiciais no Tribunal de Justiça (artigo 96.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça). É por esta razão que não existem, no caso em apreço, observações das partes no processo principal.


7      Acórdão de 15 de maio de 2014, Szatmári Malom (C‑135/13, EU:C:2014:327, n.o 55).


8      V. Acórdão de 25 de outubro de 2012, Ketelä (C‑592/11, EU:C:2012:673, n.o 37).


9      O argumento desenvolvido pela República da Letónia nas suas observações escritas segundo o qual uma tal conclusão não poderia ser acolhida uma vez que o artigo 37.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1257/1999 não permitiria aos Estados‑Membros prever que as condições «complementares ou mais restritivas» em matéria de concessão de apoio da União ao desenvolvimento rural, e não poderia, por isso, conceder condições mais favoráveis aos agricultores beneficiários do apoio em questão, não me parece pertinente no caso em apreço. Não subsistem dúvidas, com efeito, que a transmissão por via sucessória não pode ser qualificada como «condição» de concessão de apoio à reforma antecipada.


10      O Tribunal de Justiça indicou claramente que o objetivo de proporcionar um rendimento aos agricultores não é um objetivo autónomo, mas tem por função servir o objetivo macroeconómico de melhorar a viabilidade das explorações agrícolas. V., a este respeito, Acórdãos de 11 de abril de 2013, Soukupová (C‑401/11, EU:C:2013:223, n.os 24 a 25), e de 25 de fevereiro de 2015, Polónia/Comissão (T‑257/13, não publicado, EU:T:2015:111, n.os 47 a 49). V., também, o n.o 32 das Conclusões do advogado‑geral N. Jääskinen no processo Soukupova (C‑401/11, EU:C:2012:658), que tem a seguinte redação: «O apoio à reforma antecipada não se destina a fornecer um suplemento à pensão de reforma por motivos sociais. Também não tem como objetivo direto oferecer um rendimento adicional aos agricultores idosos. Estas consequências são inerentes ao Regulamento n.o 1257/1999 enquanto meio de alcançar o objetivo primário do regime do apoio à reforma antecipada que é o de criar um incentivo económico para a cessação antecipada da atividade pelos agricultores de idade mais avançada, e em circunstâncias em que estes normalmente não o fariam» (o sublinhado é meu).


11      Resulta da leitura do anexo, intitulado «Quadro de montantes» que o limite por cedente e por ano é de 15 000 EUR e o máximo total por cedente ascende a 150 000 EUR. Além disso, o limite máximo anual pode ser aumentado até ao dobro, sob reserva do respeito do limite máximo total, tendo em conta a estrutura económica das explorações nos territórios e o objetivo de um ajustamento mais rápido das estruturas agrícolas.


12      Nesta perspetiva, os Estados‑Membros teriam, assim, o direito de permitir aos cedentes de transmitir o benefício do apoio aos seus próprios herdeiros bem como modular o montante do apoio proposto a cada cedente nos limites fixados pelos tetos. No caso em que a legislação nacional concedesse a possibilidade de ser transmitido por via sucessória, o montante do apoio deve, inevitavelmente, ser inferior ao que poderia ser atribuído na ausência dessa possibilidade.


13      De igual modo, o 12.o, n.o 2, segundo parágrafo do Regulamento n.o 1257/1999 («[q]uando, no caso de um cedente, o Estado‑Membro pague uma pensão de reforma normal, o apoio à reforma antecipada será concedido a título de complemento, tendo em conta o montante da pensão nacional de reforma […]») poderia simplesmente ser entendido como não sendo aplicável aos herdeiros.


14      O sublinhado é meu. V., em especial, Acórdão de 19 de setembro de 2002, Huber (C‑336/00, EU:C:2002:509, n.o 39). Nesse processo, o Tribunal de Justiça respondeu à segunda questão prejudicial, especificando que a decisão da Comissão que aprova um programa nacional de auxílios no âmbito do Regulamento (CEE) n.o 2078/1992 do Conselho, de 30 de junho de 1992, relativo a métodos de produção agrícola compatíveis com as exigências da proteção do ambiente e à preservação do espaço natural (JO 1992, L 215, p. 85) visava o conteúdo dos ditos programas, dado que esta decisão só podia ocorrer após a Comissão se ter assegurado da sua conformidade com o regulamento e ter determinado a natureza das ações «cofinanciáveis» e o montante total das despesas ligadas ao seu financiamento. Tendo em conta que a leitura conjugada dos artigos 44.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1257/1999 e 48.o do Regulamento (CE) n.o 817/2004 da Comissão, de 29 de abril de 2004, que estabelece as regras de execução do Regulamento (CE) n.o 1257/1999 (JO 2004, L 153, p. 30) prevê um exame com as mesmas características, esta conclusão parece‑me aplicável ao caso em apreço.


15      Com efeito, as duas questões submetidas pelo órgão jurisdicional de reenvio referem‑se a um «direito subjetivo» de herdar o apoio à reforma antecipada. No entanto, tal como resulta das observações do órgão jurisdicional de reenvio, o reconhecimento da existência deste direito aos herdeiros seria a consequência de uma resposta afirmativa quanto à possibilidade de invocar essa confiança legítima.


16      Acórdão de 14 de março de 2013, Agrargenossenschaft Neuzelle (C‑545/11, EU:C:2013:169, n.o 23).


17      Acórdãos de 11 de julho de 2002, Marks & Spencer (C‑62/00, EU:C:2002:435, n.o 44), e de 12 de maio de 2011, Enel Maritsa Iztok 3 (C‑107/10, EU:C:2011:298, n.o 29) e


18      V., em especial, Acórdão de 24 de abril de 1996, Industrias Pesqueras Campos e o./Comissão (T‑551/93 e T‑231/94 a T‑234/94, EU:T:1996:54, n.o 76).


19      No que respeita à identificação dos sujeitos beneficiários da confiança legítima, seguirei a formulação da segunda questão prejudicial, que se refere aos herdeiros dos agricultores, e não aos próprios agricultores. Por outro lado, o despacho do juiz do órgão jurisdicional de reenvio indica claramente que o processo submetido ao Administratīvā rajona tiesa (Tribunal Administrativo de Primeira Instância, Letónia), que enviou, ele próprio, o reenvio ao Latvijas Republikas Satversmes tiesa (Tribunal Constitucional), tem a sua origem no incumprimento por parte do Serviço de Apoio ao Meio Rural dos próprios compromissos em relação aos recorrentes, os quais foram assumidos por força dos contratos administrativos relativos à concessão de uma pensão de reforma antecipada. Ora, parece‑me que se pode deduzir sem dificuldade que a consequência do incumprimento das obrigações foi a supressão da possibilidade de transmitir por via sucessória, o que implica que os recorrentes no processo perante o Administratīvā rajona tiesa (Tribunal Administrativo de distrito) são os herdeiros.


20      V. Acórdãos de 7 de setembro de 2006, Espanha/Conselho (C‑310/04, EU:C:2006:521, n.o 81) e de 1 de junho de 2016, Hungria/Comissão (T‑662/14, EU:T:2016:328, n.o 55).


21      A formulação destas condições parece variar um pouco em função do domínio em causa. No domínio dos auxílios de Estado, v. Acórdão de 16 de outubro de 2014, Alcoa Trasformazioni/Comissão (T‑177/10, EU:T:2014:897). No domínio aduaneiro, v. Acórdão de 15 de dezembro de 2011, Afasia Knits Deutschland (C‑409/10, EU:C:2011:843, n.o 47).


22      Acórdão de 7 de abril de 2011, Sony Supply Chain Solutions (Europe) (C‑153/10, EU:C:2011:224, n.o 47). V., também, Acórdãos de 20 de junho de 2013, Agroferm (C‑568/11, EU:C:2013:407, n.o 52); de 16 de março de 2006, Emsland‑Stärke (C‑94/05, EU:C:2006:185, n.o 27), de 1 de abril de 1993, Lageder e o. (C‑31/91 a C‑44/91, EU:C:1993:132, n.o 35), de 26 de abril de 1988, Krücken (316/86, EU:C:1988:201, n.o 23).


23      Partilho, portanto, da interpretação feita nas Conclusões da advogada‑geral C. Stix‑Hackl nos processos apensos Elmeka (C‑181/04 a C‑183/04, EU:C:2005:730, n.os 43‑45). No mesmo sentido, v., também, Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Agroferm (C‑568/11, EU:C:2013:35, n.o 59).


24      Ver Acórdão Polónia/Comissão (T‑257/13, não publicado, EU:T:2015:111, n.os 53 a 55.


25      A interpretação da Comissão pode ser particularmente tomada em consideração na medida em que a redação dos artigos 10.o a 12.o na versão final do Regulamento n.o 1257/1999 é exatamente idêntica à das mesmas normas que a Comissão tinha inserido na proposta de regulamento que apresentara. V. proposta de regulamento (CE) do Conselho relativo ao apoio do Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola (FEOGA) ao desenvolvimento rural (JO 1998, C 170, p. 67).


26      A este respeito, faço notar que a jurisprudência mostra‑se sensivelmente mais maleável do que quando a fonte da confiança legítima é um ato de uma Administração nacional que aplica o direito da União. Com efeito, nos processos em que o Tribunal de Justiça é chamado a determinar se uma confiança legítima pode surgir de um comportamento de uma instituição europeia, aquele exige que o comportamento desta faça surgir «esperanças fundadas» no particular, que «[c]onstituem garantias suscetíveis de fazer surgir tais esperanças, qualquer que seja a forma como são comunicadas, as informações precisas, incondicionais e concordantes que emanam de fontes autorizadas e fiáveis». V. Acórdão de 14 de março de 2013, Agrargenossenschaft Neuzelle (C‑545/11, EU:C:2013:169, n.o 25 e jurisprudência referida). Em contrapartida, nos processos, como o do caso em apreço, em que a confiança legítima é reivindicada contra um ato de aplicação do direito da União adotado por uma autoridade nacional, o Tribunal de Justiça limita‑se a afirmar que esse ato deve criar uma «confiança razoável» no espírito do particular. V. Acórdão de 14 de setembro de 2006, Elmeka (C‑181/04 a C‑183/04, EU:C:2006:563, n.o 32).


27      A este respeito, o artigo 4.o, n.o 1, do atbalsta dienesta likums (Lei sobre o Serviço de Apoio ao Mundo Rural) prevê: «O Serviço de Apoio ao Mundo Rural administra o apoio do Estado e da União Europeia ao mundo rural, à agricultura, à silvicultura e à pesca [recebe e analisa os pedidos (projetos) para beneficiar de um apoio, toma a decisão relativa à concessão ou à recusa de concessão de financiamento, decide do pagamento ou da recusa de pagamento do apoio, mantém um inventário dos apoios e controla a sua utilização]».


28      V. Acórdão de 17 de março de 2011, AJD Tuna (C‑221/09, EU:C:2011:153, n.o 73 e jurisprudência aí referida). V., também, D. Simon, A confiança legítima no direito comunitário: para um princípio geral de limitação da vontade do autor do ato? in O papel da vontade nos atos jurídicos, Estudos em memória do Professor Alfred Rieg, Bruxelas, Bruylant, 2000, p. 740.


29      V., em matéria agrícola, Acórdão de 7 de setembro de 2006, Espanha/Conselho (C‑310/04, EU:C:2006:521, n.o 83). Em outros domínios, v., por exemplo, Acórdãos de 10 de setembro de 2009, Plantanol (C‑201/08, EU:C:2009:539), e de 7 de junho de 2005, VEMW e o. (C‑17/03, EU:C:2005:362, n.o 74).


30      V., por exemplo, Acórdão de 2 de julho de 2015, Demmer (C‑684/13, EU:C:2015:439, n.o 92).


31      Esta decisão de aprovação, que foi adotada nos termos do artigo 44.o, n.o 2, do regulamento, visa, com efeito, o teor do Plano de desenvolvimento rural. V., a este respeito, n.o 38 das presentes conclusões.


32      Quanto à tomada em consideração da falta de retificação rápida da Administração para efeitos da apreciação da boa‑fé, v. Conclusões da advogada‑geral C. Stix‑Hackl nos processos apensos Elmeka (C‑181/04 a C‑183/04, EU:C:2005:730, n.o 54).


33      JO 2005, L 277, p. 1.


34      V. Acórdão de 19 de setembro de 2002, Huber (C‑336/00, EU:C:2002:509, n.o 58), bem como as Conclusões do advogado‑geral S. Alber apresentadas no mesmo processo (C‑336/00, EU:C:2002:175, n.os 117 a 121).