Language of document : ECLI:EU:C:2022:559

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

14 de julho de 2022 (*)

«Reenvio prejudicial — Artigos 49.o e 56.o TFUE — Situação puramente interna — Serviços no mercado interno — Diretiva 2006/123/CE — Âmbito de aplicação — Artigo 2.o, n.o 2, alínea j) — Adjudicação de contratos públicos — Diretiva 2014/24/UE — Conceito de “contratos públicos” — Artigos 74.o a 77.o — Prestação de serviços sociais de assistência às pessoas — Acordos de ação concertada com instituições privadas de iniciativa social — Exclusão de operadores que prosseguem fins lucrativos — Local de implantação da instituição como critério de seleção»

No processo C‑436/20,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Tribunal Superior de Justicia de la Comunidad Valenciana (Tribunal Superior de Justiça da Comunidade Valenciana, Espanha), por Decisão de 3 de setembro de 2020, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 16 de setembro de 2020, no processo

Asociación Estatal de Entidades de Servicios de Atención a Domicilio (ASADE)

contra

Consejería de Igualdad y Políticas Inclusivas,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: C. Lycourgos (relator), presidente de secção, S. Rodin, J.‑C. Bonichot, L. S. Rossi e O. Spineanu‑Matei, juízes,

advogada‑geral: L. Medina,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Asociación Estatal de Entidades de Servicios de Atención a Domicilio (ASADE), por A. Martínez Gradoli, procuradora, e Y. Puiggròs Jiménez de Anta, abogada,

–        em representação da Consejería de Igualdad y Políticas Inclusivas, por I. Sánchez Lázaro, abogada,

–        em representação do Governo espanhol, por S. Jiménez García e J. Rodríguez de la Rúa Puig, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por S. L. Vitale, avvocato dello Stato,

–        em representação do Governo neerlandês, por M. K. Bulterman, H. S. Gijzen e J. Langer, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por L. Armati, M. Jáuregui Gómez, P. Ondrůšek, E. Sanfrutos Cano e G. Wils, na qualidade de agentes,

–        em representação do Governo norueguês, por J. T. Kaasin e H. Røstum, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 3 de fevereiro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação dos artigos 49.o e 56.o TFUE, dos artigos 76.o e 77.o da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos e que revoga a Diretiva 2004/18/CE (JO 2014, L 94, p. 65), conjugados com o artigo 74.o e com o anexo XIV desta, bem como do artigo 15.o, n.o 2, da Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (JO 2006, L 376, p. 36).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um recurso interposto pela Asociación Estatal de Entidades de Servicios de Atención a Domicilio (ASADE) (Associação Estatal de Instituições de Prestação de Serviços de Cuidados ao Domicílio) a respeito da legalidade do Decreto 181/2017 del Consell, por el que se desarrolla la acción concertada para la prestación de servicios sociales en el ámbito de la Comunitat Valenciana por entidades de iniciativa social (Decreto 181/2017, de 17 de novembro, do Conselho da Comunidade de Valência, que desenvolve a ação concertada para a prestação de serviços sociais no âmbito da Comunidade Valenciana por instituições de iniciativa social) (a seguir «Decreto 181/2017»).

 Quadro jurídico

 Direito da União

 Protocolo n.o 26

3        O artigo 1.o do Protocolo (n.o 26) relativo aos serviços de interesse geral, anexo ao Tratado FUE (a seguir «Protocolo n.o 26»), dispõe:

«Os valores comuns da União no que respeita aos serviços de interesse económico geral, na aceção do artigo 14.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, incluem, em especial:

–        o papel essencial e o amplo poder de apreciação das autoridades nacionais, regionais e locais para prestar, mandar executar e organizar serviços de interesse económico geral de uma forma que atenda tanto quanto possível às necessidades dos utilizadores,

–        a diversidade dos variados serviços de interesse económico geral e as diferenças nas necessidades e preferências dos utilizadores que possam resultar das diversas situações geográficas, sociais ou culturais,

–        um elevado nível de qualidade, de segurança e de acessibilidade de preços, a igualdade de tratamento e a promoção do acesso universal e dos direitos dos utilizadores.»

 Diretiva 2014/24

4        Os considerandos 4, 6 e 114 da Diretiva 2014/24 enunciam:

«(4)      […] [A]s situações em que todos os operadores que preenchem determinadas condições são autorizados a executar determinada tarefa, sem qualquer seletividade, como nas situações de livre escolha do cliente e os sistemas de cheques‑serviço, não deverão ser equiparadas à contratação pública, mas antes consideradas simples regimes de autorização (por exemplo, licenças para medicamentos ou serviços médicos).

[…]

(6)      Convém ainda recordar que a presente diretiva não deverá afetar a legislação dos Estados‑Membros em matéria de segurança social, nem deverá abordar a liberalização dos serviços de interesse económico geral reservados a entidades públicas ou privadas, nem a privatização de entidades públicas prestadoras de serviços.

Recorde‑se igualmente que os Estados‑Membros são livres de organizar a prestação dos serviços sociais obrigatórios ou de outros serviços, como os serviços postais, quer como serviços de interesse económico geral quer como serviços de interesse geral sem caráter económico, ou ainda como uma combinação de ambos. Convém esclarecer que os serviços de interesse geral sem caráter económico não deverão ser abrangidos pela presente diretiva.

[…]

(114)      Determinadas categorias de serviços continuam, pela sua própria natureza, a ter uma dimensão transfronteiras limitada, nomeadamente os chamados “serviços à pessoa”, como certos serviços sociais, de saúde e de educação, prestados num contexto particular que varia muito entre os Estados‑Membros devido às diferenças de tradições culturais. Assim, deverá ser criado um regime específico para os contratos públicos referentes a esses serviços com um limiar mais elevado do que o limiar que se aplica a outros serviços.

Os serviços à pessoa de valor inferior a este limiar não terão, em condições normais, interesse para os prestadores de serviços de outros Estados‑Membros, salvo se existirem indicações concretas em contrário, nomeadamente um financiamento da União para projetos transfronteiriços.

Os contratos relativos a serviços à pessoa de montante superior a este limiar deverão cumprir regras de transparência definidas a nível da União. Atendendo à importância do contexto cultural e à sensibilidade destes serviços, os Estados‑Membros deverão dispor de um amplo poder de apreciação para organizarem a escolha dos prestadores de serviços da forma que considerem mais adequada. As regras da presente diretiva têm em conta esse imperativo, impondo apenas a observância dos princípios fundamentais de transparência e igualdade de tratamento e assegurando que as autoridades adjudicantes possam aplicar critérios de qualidade específicos para a escolha dos prestadores de serviços, como os critérios definidos no quadro voluntário europeu de qualidade dos serviços sociais, adotado pelo Comité de Proteção Social da União Europeia. Ao determinarem os procedimentos a utilizar para a adjudicação de contratos de serviços à pessoa, os Estados‑Membros deverão ter em consideração o artigo 14.o TFUE e Protocolo n.o 26. Ao fazê‑lo, os Estados‑Membros deverão igualmente prosseguir os objetivos de simplificação e redução da carga administrativa para as autoridades adjudicantes e os operadores económicos; deverá ser especificado que fazê‑lo também poderá implicar o recurso a regras aplicáveis a contratos de serviços não abrangidos pelo regime específico.

Os Estados‑Membros e as autoridades públicas continuam a ter liberdade para prestarem eles próprios estes serviços ou para organizar os serviços sociais de uma forma que não implique a celebração de contratos públicos, por exemplo através do simples financiamento desses serviços ou da concessão de licenças ou autorizações a todos os operadores económicos que cumpram as condições previamente fixadas pela autoridade adjudicante, sem quaisquer limites ou quotas, desde que esse sistema assegure uma publicidade suficiente e cumpra os princípios da transparência e da não discriminação.»

5        O artigo 1.o desta diretiva prevê:

«1.      A presente diretiva estabelece as regras aplicáveis aos procedimentos de contratação adotados por autoridades adjudicantes relativamente a contratos públicos e a concursos de conceção cujo valor estimado não seja inferior aos limiares definidos no artigo 4.o

[…]

5.      A presente diretiva não afeta o modo como os Estados‑Membros organizam os seus sistemas de segurança social.

[…]»

6        O artigo 2.o da referida diretiva dispõe:

«1.      Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

5.      “Contratos públicos”, contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre um ou mais operadores económicos e uma ou mais autoridades adjudicantes, que tenham por objeto a execução de obras, o fornecimento de produtos ou a prestação de serviços;

[…]

9.      “Contratos públicos de serviços”, contratos públicos que tenham por objeto a prestação de serviços distintos daqueles a que se refere o ponto 6;

10.      “Operador económico”, qualquer pessoa singular ou coletiva, entidade pública ou agrupamento de tais pessoas e/ou entidades, incluindo agrupamentos temporários de empresas, que realize empreitadas e/ou obras, forneça produtos ou preste serviços no mercado;

[…]»

7        Nos termos do artigo 10.o da Diretiva 2014/24, sob a epígrafe «Exclusões específicas para os contratos de serviços»:

«A presente diretiva não se aplica aos contratos públicos de serviços destinados:

[…]

h)      Aos serviços de defesa civil, proteção civil e prevenção de riscos que sejam prestados por organizações ou associações sem fins lucrativos e que sejam abrangidos pelos seguintes códigos CPV: 75250000‑3, 75251000‑0, 75251100‑1, 75251110‑4, 75251120‑7, 75252000‑7, 75222000‑8; 98113100‑9; 85143000‑3 exceto serviços de ambulância de transporte de doentes;

[…]»

8        O título III desta diretiva, designado «Regimes especiais de contratação pública», contém, nomeadamente, um capítulo I, relativo aos «[s]erviços sociais e [aos] outros serviços específicos», no qual figuram os artigos 74.o a 77.o da referida diretiva.

9        O artigo 74.o da Diretiva 2014/24 enuncia:

«Os contratos públicos para serviços sociais e outros serviços específicos enumerados no anexo XIV são adjudicados em conformidade com o presente capítulo quando o valor dos contratos for igual ou superior ao limiar indicado no artigo 4.o, alínea d).»

10      O artigo 75.o desta diretiva prevê:

«1.      As autoridades adjudicantes que pretendam celebrar um contrato público para os serviços referidos no artigo 74.o dão a conhecer a sua intenção por um dos seguintes meios:

a)      Através de um anúncio de concurso do qual constam as informações referidas no anexo V, parte H, em conformidade com os formulários normalizados a que se refere o artigo 51.o; ou

b)      Através de um anúncio de pré‑informação que é publicado de modo contínuo e do qual constam as informações referidas no anexo V, parte I. O anúncio de pré‑informação menciona especificamente os tipos de serviços que serão objeto dos contratos a adjudicar. Indica que os contratos serão adjudicados sem nova publicação e convida os operadores económicos interessados a manifestar‑se por escrito.

No entanto, o primeiro parágrafo não se aplica nos casos em que teria sido possível utilizar, em conformidade com o artigo 32.o, um procedimento por negociação sem publicação prévia de anúncio de concurso para a adjudicação de um contrato público de serviços.

2.      As autoridades adjudicantes que tenham adjudicado um contrato público para os serviços referidos no artigo 74.o dão a conhecer os resultados do concurso por meio de um anúncio de adjudicação de contrato do qual constam as informações referidas no anexo V, parte J, em conformidade com os formulários‑tipo a que se refere o artigo 51.o. Podem, contudo, agrupar esses anúncios por trimestre. Nesse caso, enviam os anúncios agrupados o mais tardar 30 dias após o fim de cada trimestre.

3.      A Comissão estabelece os formulários referidos nos n.os 1 e 2 do presente artigo por meio de atos de execução. Os referidos atos de execução são adotados pelo procedimento consultivo a que se refere o artigo 89.o, n.o 2.

4.      Os anúncios referidos no presente artigo são publicados em conformidade com o artigo 51.o»

11      O artigo 76.o da referida diretiva dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros devem instituir regras nacionais para a adjudicação dos contratos abrangidos pelo presente capítulo, a fim de assegurar que as autoridades adjudicantes respeitem os princípios da transparência e da igualdade de tratamento dos operadores económicos. Os Estados‑Membros são livres de fixar as normas processuais aplicáveis, desde que essas regras permitam às autoridades adjudicantes atender às especificidades dos serviços em questão.

2.      Os Estados‑Membros devem assegurar que as autoridades adjudicantes possam ter em conta a necessidade de garantir uma elevada qualidade, continuidade, acessibilidade, inclusive em termos de custos, disponibilidade e exaustividade dos serviços, as necessidades específicas das diferentes categorias de utilizadores, incluindo os grupos desfavorecidos e vulneráveis, o envolvimento e a capacitação dos utilizadores e a inovação. Os Estados‑Membros podem também estabelecer que a escolha do prestador de serviços seja feita com base no critério da proposta que apresente a melhor relação qualidade/preço mas tendo igualmente em conta os critérios de qualidade e sustentabilidade para os serviços sociais.»

12      Nos termos do artigo 77.o da mesma diretiva:

«1.      Os Estados‑Membros podem prever que as autoridades adjudicantes possam reservar o direito de as organizações participarem em procedimentos de adjudicação de contratos públicos exclusivamente aos serviços de saúde, serviços sociais e serviços culturais referidos no artigo 74.o, abrangidos pelos códigos CPV 75121000‑0, 75122000‑7, 75123000‑4, 79622000‑0, 79624000‑4, 79625000‑1, 80110000‑8, 80300000‑7, 80420000‑4, 80430000‑7, 80511000‑9, 80520000‑5, 80590000‑6, 85000000‑9 a 85323000‑9, 92500000‑6, 92600000‑7, 98133000‑4, 98133110‑8.

2.      As organizações a que se refere o n.o 1 devem preencher todas as seguintes condições:

a)      Têm por objetivo a prossecução de uma missão de serviço público ligada à prestação dos serviços a que se refere o n.o 1;

b)      Os lucros são reinvestidos com vista à consecução do objetivo da organização. Caso os lucros sejam distribuídos ou redistribuídos, tal deve basear‑se em considerações de natureza participativa;

c)      As estruturas de gestão ou propriedade da organização que executa o contrato baseiam‑se na participação dos trabalhadores no capital social ou em princípios participativos, ou requerem o envolvimento ativo dos trabalhadores, utilizadores ou partes interessadas;

d)      A autoridade adjudicante em causa não adjudicou à organização nenhum contrato para os serviços em causa, nos termos do presente artigo, durante os últimos três anos.

3.      O período de vigência do contrato não pode ser superior a três anos.

4.      O convite à apresentação de propostas deve fazer referência ao presente artigo.

5.      Não obstante o disposto no artigo 92.o, a Comissão deve avaliar os efeitos do presente artigo e apresentar um relatório nessa matéria ao Parlamento Europeu e ao Conselho até 18 de abril de 2019.»

 Diretiva 2006/123

13      O considerando 27 da Diretiva 2006/23 enuncia:

«A presente diretiva não deverá abranger os serviços sociais no setor da habitação, da assistência à infância e os serviços dispensados às famílias e pessoas necessitadas que são prestados pelo Estado a nível nacional, regional ou local por prestadores especialmente mandatados pelo Estado para tal ou por instituições de solidariedade social reconhecidas pelo Estado enquanto tais com o objetivo de assegurar apoio aos que estão temporária ou permanentemente mais necessitados, seja porque auferem um rendimento familiar insuficiente ou porque são total ou parcialmente dependentes, e aos que correm o risco de serem marginalizados. Estes serviços são essenciais para garantir os direitos fundamentais da dignidade e da integridade humanas e são uma manifestação dos princípios da coesão e da solidariedade social, não devendo ser prejudicados pela presente diretiva.»

14      O artigo 2.o desta diretiva prevê:

«1.      A presente diretiva é aplicável aos serviços fornecidos pelos prestadores estabelecidos num Estado‑Membro.

2.      A presente diretiva não se aplica às seguintes atividades:

a)      Serviços de interesse geral sem caráter económico;

[…]

f)      Serviços de cuidados de saúde, prestados ou não no âmbito de uma estrutura de saúde, e independentemente do seu modo de organização e financiamento a nível nacional e do seu caráter público ou privado;

[…]

i)      Atividades relacionadas com o exercício da autoridade pública, como previsto no artigo 45.o do Tratado;

j)      Serviços sociais no setor da habitação, da assistência à infância e serviços dispensados às famílias e às pessoas permanente ou temporariamente necessitadas, prestados pelo Estado, por prestadores mandatados pelo Estado ou por instituições de solidariedade social reconhecidas pelo Estado enquanto tais;

[…]»

 Direito espanhol

 Lei Orgânica 5/1982

15      Ao abrigo do artigo 49.o, n.o 1, ponto 24, da Ley Orgánica 5/1982, de Estatuto de Autonomía de la Comunidad Valenciana (Lei Orgânica 5/1982, Relativa ao Estatuto de Autonomia da Comunidade Valenciana), de 1 de julho de 1982 (BOE n.o 164, de 10 de julho de 1982), na versão aplicável aos factos do processo principal, a Comunidade Valenciana exerce uma competência exclusiva em matéria de serviços sociais e de instituições públicas de proteção e de assistência aos menores, aos jovens, aos migrantes, à terceira idade, a pessoas portadoras de deficiência e a outros grupos ou setores que careçam de proteção social.

 Lei 5/1997

16      As competências da Comunidade Valenciana em conformidade com a Lei Orgânica 5/1982 foram implementadas pela Ley 5/1997 de la Generalitat Valenciana por la cual se regula el Sistema de Servicios Sociales en el ambito de la Comunidad Valenciana (Lei 5/1997 do Governo da Comunidade Valenciana que Regula o Sistema de Serviços Sociais no Âmbito da Comunidade Valenciana), de 26 de junho de 1997 (BOE n.o 192, de 12 de agosto de 1997, p. 24405).

17      Esta lei foi alterada pela Ley 13/2016, de medidas fiscales, de gestión administrativa y financiera, y de organización de la Generalitat (Lei 13/2016 da Comunidade Valenciana, Relativa a Medidas Fiscais, de Gestão Administrativa e Financeira e de Organização da Comunidade Valenciana), de 29 de dezembro de 2016 (BOE n.o 34, de 9 de fevereiro de 2017, p. 8694), antes de ser revogada pela Ley 3/2019 de servicios sociales inclusivos de la Comunitat Valenciana (Lei 3/2019 da Comunidade Valenciana, Relativa aos Serviços Sociais de Inclusão da Comunidade Valenciana), de 18 de fevereiro de 2019 (BOE n.o 61, de 12 de março de 2019, p. 23249) (a seguir «Lei 3/2019»).

18      O artigo 44.o‑A da Lei 5/1997, conforme alterada pela Lei 13/2016 (a seguir «Lei 5/1997»), sob a epígrafe «Modalidades de fornecimento das prestações do sistema público de serviços sociais», dispõe:

«1.      As Administrações Públicas que fazem parte do sistema público de serviços sociais prestam às pessoas os serviços previstos na lei ou no Catálogo de Serviços Sociais, nas seguintes modalidades:

a)      Mediante gestão direta ou recurso a meios próprios, que constitui a modalidade de prestação preferencial.

b)      Mediante gestão indireta em conformidade com uma das formas estabelecidas na legislação em matéria de contratos públicos.

c)      Mediante acordos de ação concertada celebrados com instituições privadas de iniciativa social.

2.      A prestação de serviços sociais públicos por centros ou serviços de uma Administração diferente da Administração competente é efetuada segundo uma das formas de colaboração e de cooperação entre Administrações Públicas previstas na lei.»

19      O artigo 53.o dessa lei, sob a epígrafe «Concertação com instituições privadas de iniciativa social», prevê:

«1.      As Administrações Públicas competentes em matéria de serviços sociais podem adjudicar a instituições privadas de iniciativa social o fornecimento das prestações previstas no Catálogo de Serviços Sociais mediante acordos de ação concertada, desde que essas instituições disponham de acreditação administrativa adequada e estejam inscritas como tal no Registo das Instituições, Centros e Serviços Sociais correspondentes.

2.      Nos termos do disposto na lei, o regime jurídico é estabelecido por lei para cada setor de ação específico, fixando as condições de atuação dos centros privados convencionados que participem no sistema de serviços sociais de responsabilidade pública, determinando as condições de acesso, as condições do serviço, os procedimentos de seleção, a duração máxima e as causas de cessação do acordo, bem como as obrigações das partes.

3.      O acordo celebrado entre a Administração e a instituição privada fixa os direitos e as obrigações de cada parte no que respeita ao seu regime económico, duração, prorrogação e extinção bem como, se aplicável, ao número e tipo de unidades objeto de concertação, e a outras condições legais.

4.      O acesso aos lugares objeto de concertação com instituições privadas de iniciativa social ocorre sempre por intermédio da Administração que adjudicou o acordo.

5.      São instituições de iniciativa social as fundações, associações, organizações de voluntariado e outras instituições sem fins lucrativos que realizem atividades de serviço social. São consideradas instituições de iniciativa social, em particular, as sociedades cooperativas qualificadas de instituições sem fins lucrativos em conformidade com a sua legislação específica.»

20      O artigo 56.o da referida lei, sob a epígrafe «Concertação», enuncia, nos seus n.os 1 e 2:

«1.      A Generalitat [(Governo da Comunidade Valenciana)] contribui financeiramente para o desenvolvimento e para a melhoria das competências das entidades locais, bem como para o apoio de programas de conteúdo social realizados por instituições sem fins lucrativos.

2.      Do mesmo modo, a Generalitat afeta anualmente nos orçamentos correspondentes os montantes necessários ao financiamento dos acordos de ação concertada com instituições privadas de iniciativa social.»

21      Os artigos 62.o a 66.o desta lei figuram no título VI desta, intitulado «Ação concertada».

22      Segundo o artigo 62.o da Lei 5/1997, sob a epígrafe «Conceito, regime geral e princípios da ação concertada»:

«1.      Os acordos de ação concertada são instrumentos organizativos de natureza extracontratual por meio dos quais as Administrações competentes podem organizar a prestação de serviços às pessoas de caráter social cujo financiamento, acesso e controlo sejam da sua competência, de acordo com o procedimento e os requisitos previstos na presente lei e na legislação setorial aplicável.

2.      As Administrações Públicas asseguram que a sua ação concertada com terceiros para efeitos de prestação de serviços sociais às pessoas é conforme com os seguintes princípios:

a)      Princípio da subsidiariedade, por força do qual a ação concertada com instituições privadas sem fins lucrativos está previamente subordinada à utilização otimizada dos recursos próprios.

b)      Princípio da solidariedade, ao incentivar o envolvimento das instituições do terceiro setor da ação social na prestação de serviços sociais às pessoas.

c)      Princípio da igualdade, ao garantir que a ação concertada proporciona aos utentes uma atenção idêntica à que é dispensada aos utentes servidos diretamente pela Administração.

d)      Princípio da publicidade, ao prever que os convites à apresentação de candidaturas para ações concertadas são publicados no jornal oficial  da Generalitat Valenciana.

e)      Princípio da transparência, ao difundir no portal de transparência os acordos de ação concertada em vigor num dado momento.

f)      Princípio da não discriminação, ao fixar condições de acesso à ação concertada que garantam a igualdade entre as entidades que nela optam participar.

g)      Princípio da eficácia orçamental, ao prever que as contrapartidas económicas que as instituições concertadas podem cobrar em conformidade com as tarifas máximas ou com os módulos em vigor são limitadas aos custos variáveis, fixos e permanentes de prestação do serviço, sem incluir lucros comerciais.»

23      O artigo 63.o desta lei, sob a epígrafe «Âmbito material e requisitos da ação concertada», prevê:

«1.      No domínio dos serviços sociais, os serviços às pessoas suscetíveis de ser objeto de uma ação concertada são determinados por lei entre os serviços previstos no catálogo de serviços.

2.      Podem ser objeto de uma ação concertada:

a)      A reserva e ocupação de lugares com vista à sua ocupação pelos utentes do sistema público de serviços sociais, cujo acesso é autorizado pelas Administrações Públicas competentes em conformidade com os critérios estabelecidos pela presente lei.

b)      A gestão integral de prestações, serviços ou centros em conformidade com as disposições estabelecidas por lei.

3.      Sempre que a prestação do serviço implicar procedimentos que exijam diferentes tipos de intervenções em diferentes centros ou serviços, a Administração competente pode adjudicar a várias entidades um único acordo de ação concertada que imponha mecanismos imperativos de coordenação e de colaboração.

4.      Podem aceder ao regime de ação concertada as instituições privadas de iniciativa social prestadoras de serviços sociais que disponham de acreditação administrativa e que estejam inscritas no Registo das Instituições, Centros e Serviços Sociais correspondente.

5.      O regime da ação concertada é incompatível com a concessão de subvenções económicas para o financiamento das atividades ou dos serviços objeto de concertação.»

24      Nos termos do artigo 64.o da referida lei, sob a epígrafe «Procedimentos de concertação e critérios preferenciais»:

«1.      A legislação setorial regula os procedimentos para que as entidades que cumprem os requisitos estabelecidos possam aderir ao regime de ação concertada em conformidade com os princípios gerais estabelecidos no artigo 62.o da presente lei.

2.      Para efeitos de adoção dos acordos de ação concertada, a legislação setorial estabelece os critérios de seleção das instituições quando essa seleção for necessária em função dos limites orçamentais ou do número e das características das prestações suscetíveis de ser concertadas.

3.      A seleção das instituições pode basear‑se nos seguintes critérios:

a)      a implantação na localidade onde o serviço é prestado;

[…]»

25      O artigo 65.o da mesma lei, sob a epígrafe «Formalização e efeitos da ação concertada», prevê:

«1.      Os acordos de ação concertada são formalizados mediante documentos administrativos de concertação cujo conteúdo é estabelecido pela legislação setorial aplicável.

2.      Os acordos de ação concertada impõem à entidade de concertação que preste às pessoas os serviços de caráter social nas condições estabelecidas pela legislação setorial aplicável e pelo acordo de ação concertada adotado em conformidade com esta última.

3.      Além das taxas previstas, não pode ser cobrado nenhum montante aos utentes pelos serviços concertados.

4.      A cobrança aos utentes de qualquer retribuição pela prestação de serviços complementares, bem como o respetivo montante, são previamente autorizados pela Administração que adjudica o acordo de ação concertada.»

26      O artigo 66.o da Lei 5/1997, sob a epígrafe «Financiamento da ação concertada», enuncia:

«1.      Cada convite à apresentação de candidaturas fixa o montante dos módulos económicos correspondentes a cada prestação suscetível de ser objeto da ação concertada.

2.      As taxas máximas ou os módulos económicos suportam, no máximo, os custos variáveis, fixos e permanentes das prestações, garantindo a neutralidade económica para a prestadora, sem incluir lucros comerciais.

3.      Os montantes decorrentes da ação concertada são pagos após a apresentação da fatura correspondente pela instituição parte no acordo de ação concertada, por imposição sobre a rubrica orçamental destinada ao financiamento das despesas correntes da administração.»

27      Nos termos do artigo 67.o desta lei, sob a epígrafe «Duração dos acordos de ação concertada»:

«A duração dos acordos de concertação não pode exceder quatro anos. Sempre que estejam expressamente previstas no acordo de ação concertada, as eventuais prorrogações podem elevar a duração total do acordo de ação concertada para dez anos. Findo este período, a Administração competente pode celebrar um novo acordo de ação concertada.»

 Lei 181/2017

28      O Decreto 181/2017, que foi adotado em execução da Lei 5/1997, tem por objeto, segundo o seu artigo 1.o, regular os requisitos, os procedimentos de seleção, o conteúdo e as condições de base para a criação, execução e desenvolvimento dos acordos de ação concertada, como modo de gestão de serviços sociais por instituições privadas de iniciativa social a fim de prestar às pessoas os serviços sociais previstos na lei e no Catálogo dos Serviços Sociais, ou nos seus diplomas de execução.

29      O artigo 3.o, alínea e), deste decreto reconhece a qualidade de instituições privadas de iniciativa social às «fundações, associações, organizações de voluntariado e outras instituições sem fins lucrativos que realizem atividades de serviço social», bem como às sociedades cooperativas qualificadas de instituições sem fins lucrativos em conformidade com a sua legislação específica.

30      Apesar de a Lei 5/1997 ter sido revogada pela Lei 3/2019, o Decreto 181/2017 mantém‑se em vigor, por força da única disposição revogatória desta última lei.

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

31      A ASADE interpôs no Tribunal Superior de Justicia de la Comunidad Valenciana (Tribunal Superior de Justiça da Comunidade Valenciana, Espanha) um recurso de anulação do Decreto 181/2017, no qual alega que o artigo 44.o‑A, n.o 1, alínea c), o artigo 53.o, o artigo 56.o, n.o 2, e o título VI da Lei 5/1997, cuja execução é assegurada pelo referido decreto, são contrários ao direito da União pelo facto de excluírem as instituições com fins lucrativos da possibilidade de prestarem determinados serviços sociais de assistência às pessoas no âmbito de uma ação concertada, permitindo simultaneamente que as instituições sem fins lucrativos, e não só as organizações de voluntariado, prestem esses serviços contra remuneração sem terem de passar por um procedimento de concurso transparente que assegure a igualdade de tratamento entre os operadores económicos em causa.

32      O órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas sobre a conformidade do recurso com os acordos de ação concertada, conforme regulado na Lei 5/1997, com os artigos 49.o e 56.o TFUE, com os artigos 76.o e 77.o da Diretiva 2014/24 e com o artigo 15.o, n.o 2, da Diretiva 2006/123. Sublinha que continua a ser necessária uma interpretação destas disposições do direito da União, não obstante a revogação da Lei 5/1997 pela Lei 3/2019, posto que esta última lei não alterou o regime da ação concertada para a prestação de serviços sociais. Além disso, para apreciar a legalidade deste decreto, é necessário verificar se a Lei 5/1997, cuja execução assegura, é ou não conforme com o direito da União.

33      Nestas circunstâncias, o Tribunal Superior de Justicia de la Comunidad Valenciana (Tribunal Superior de Justiça da Comunidade Valenciana) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Devem os artigos 49.o TFUE e 76.o e 77.o (em conjugação com o artigo 74.o e o anexo XIV) da Diretiva [2014/24] ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que permite às autoridades adjudicantes recorrerem a acordos com instituições privadas sem fins lucrativos — não apenas associações de voluntariado — para a prestação de qualquer tipo de serviços sociais às pessoas contra o reembolso dos custos, sem aplicar os procedimentos previstos [por essa] diretiva e independentemente do valor previsto, apenas através da qualificação prévia destas figuras como não contratuais?

2)      Em caso de resposta negativa e, por conseguinte, caso tal possibilidade exista: devem os artigos 49.o TFUE e 76.o e 77.o (em conjugação com o artigo 74.o e o anexo XIV) da Diretiva [2014/24] ser interpretados no sentido de que permite[m] às autoridades adjudicantes recorrer a acordos com instituições privadas sem fins lucrativos (não apenas as [associações] de voluntariado) para a prestação de qualquer tipo de serviços sociais às pessoas contra o reembolso dos custos sem aplicar os procedimentos previstos pela diretiva e independentemente do valor previsto, simplesmente através da qualificação prévia destas figuras como não contratuais quando, além disso, essa legislação nacional não prevê, explicitamente, os requisitos estabelecidos no artigo 77.o da diretiva, remetendo para posterior implementação por via regulamentar, e sem incluir expressamente, nas orientações que essa aplicação por via regulamentar deve seguir, os requisitos estabelecidos no artigo 77.o da referida diretiva?

3)      Ainda em caso de resposta negativa e, por conseguinte, caso tal possibilidade exista: devem os artigos 49.o e 56.o TFUE, 76.o e 77.o (em conjugação com o artigo 74.o e o anexo XIV) da Diretiva [2014/24] e 15.o, n.o 2, da Diretiva [2006/123] ser interpretados no sentido de que permitem às autoridades adjudicantes, para efeitos da seleção da instituição sem fins lucrativos (não apenas as associações de voluntariado) com a qual acordam a prestação de qualquer tipo de serviços sociais às pessoas — além dos estabelecidos no artigo 2.o, n.o 2, alínea j) da referida diretiva –, incluírem nos critérios de seleção a implantação na localidade onde o serviço virá a ser prestado?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à admissibilidade

34      A título preliminar, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, as questões relativas ao direito da União gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só se pode recusar pronunciar sobre um pedido apresentado por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas [Acórdãos de 15 de dezembro de 1995, Bosman, C‑415/93, EU:C:1995:463, n.os 59 e 61, e de 25 de novembro de 2021, État luxembourgeois (Informações sobre um grupo de contribuintes), C‑437/19, EU:C:2021:953, n.o 81].

35      A necessidade de obter uma interpretação do direito da União que seja útil ao juiz nacional exige que este defina o quadro factual e regulamentar em que se inserem as questões que submete ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que essas questões assentam. Além disso, a decisão de reenvio deve indicar as razões precisas que levaram o juiz nacional a interrogar‑se sobre a interpretação do direito da União e a considerar necessário submeter questões prejudiciais ao Tribunal de Justiça [Acórdão de 10 de março de 2022, Commissioners for Her Majesty’s Revenue and Customs (Cobertura extensa de seguro de doença), C‑247/20, EU:C:2022:177, n.o 75 e jurisprudência referida].

36      É à luz destas observações preliminares que cumpre apreciar a admissibilidade das questões prejudiciais.

 Quanto à revogação da Lei 5/1997

37      A recorrida no processo principal assinala que as questões prejudiciais são inadmissíveis, visto que a Lei 5/1997, cuja conformidade com o direito da União é contestada a título incidental no recurso no processo principal, foi revogada pela Lei 3/2019.

38      A este respeito, resulta claramente do pedido de decisão prejudicial que o órgão jurisdicional de reenvio é chamado a pronunciar‑se sobre a legalidade do Decreto 181/2017 à data da sua adoção. Ora, nessa data, é ponto assente que a Lei 5/1997, cuja execução é assegurada por este decreto, ainda estava em vigor. Além disso, não é controvertido que a referida lei, por um lado, impedia as instituições com fins lucrativos de celebrarem acordos de ação concertada e, por outro, permitia o recurso ao critério da implantação local no âmbito da adjudicação desse acordo.

39      Neste contexto, as questões prejudiciais mantêm uma relação com o objeto do litígio no processo principal.

 Quanto à Diretiva 2014/24

40      Os Governos espanhol, italiano e neerlandês têm dúvidas quanto à aplicabilidade da Diretiva 2014/24 aos acordos de ação concertada previstos pela legislação nacional em causa no processo principal.

41      A este respeito, há que recordar que, quando, como no presente processo, não for manifesto que a interpretação de uma disposição do direito da União não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, a objeção relativa à inaplicabilidade dessa disposição no processo principal não se refere à admissibilidade do pedido de decisão prejudicial, mas enquadra‑se na apreciação de mérito das questões (Acórdãos de 12 de dezembro de 2019, Slovenské elektrárne, C‑376/18, EU:C:2019:1068, n.o 29, e de 28 de outubro de 2021, Komisia za protivodeystvie na koruptsiyata i za otnemane na nezakonno pridobitoto imushtestvo, C‑319/19, EU:C:2021:883, n.o 25).

 Quanto à Diretiva 2006/123

42      Nos termos do seu artigo 2.o, n.o 2, alínea j), a Diretiva 2006/123 não se aplica aos serviços sociais no setor da habitação social, da assistência à infância e serviços dispensados às famílias e às pessoas permanente ou temporariamente necessitadas, prestados, nomeadamente, por prestadores mandatados pelo Estado ou por instituições de solidariedade social reconhecidas pelo Estado enquanto tais.

43      Ora, por um lado, como foi salientado pela advogada‑geral, em substância, nos n.os 145 a 150 das suas conclusões, os autos de que dispõe o Tribunal de Justiça não permitem apurar se os serviços sociais de assistência às pessoas abrangidos pela legislação nacional em causa no processo principal não figuram entre os serviços excluídos do âmbito de aplicação da Diretiva 2006/123 por força do seu artigo 2.o, n.o 2, alínea j), conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça nos n.os 42 a 49 do Acórdão de 11 de julho de 2013, Femarbel (C‑57/12, EU:C:2013:517).

44      Por outro, a falta de esclarecimentos, a este respeito, na decisão de reenvio também não permite ao Tribunal de Justiça determinar se, admitindo que a exclusão prevista no artigo 2.o, n.o 2, alínea j), desta diretiva não se aplica a certos serviços sociais de assistência às pessoas abrangidos pela legislação nacional em causa no processo principal, estes serviços não se enquadram no âmbito de aplicação de outra exclusão prevista neste artigo 2.o, n.o 2, em particular nas suas alíneas f) e i).

45      Nestas condições, uma vez que o órgão jurisdicional de reenvio não ofereceu ao Tribunal de Justiça a possibilidade de verificar se a situação de facto em que se baseia a terceira questão prejudicial está efetivamente abrangida pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2006/123, esta questão é inadmissível na parte em que tem por objeto a interpretação do artigo 15.o, n.o 2, desta.

 Quanto aos artigos 49.o e 56.o TFUE

46      Por último, importa salientar que, embora o conjunto dos elementos do litígio no processo principal se circunscreva ao interior de um único Estado‑Membro, as questões prejudiciais têm por objeto, designadamente, a interpretação dos artigos 49.o e 56.o TFUE.

47      Neste contexto, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio indicar ao Tribunal de Justiça, em conformidade com o exigido pelo artigo 94.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, em que medida, apesar do seu caráter puramente interno, o litígio nele pendente revela um elemento de conexão com as disposições do direito da União relativas às liberdades fundamentais que torna a interpretação prejudicial solicitada necessária para a solução desse litígio (Acórdão de 15 de novembro de 2016, Ullens de Schooten, C‑268/15, EU:C:2016:874, n.o 55, e Despacho de 6 de maio de 2021, Ministero dell’Istruzione, dell’Università e della Ricerca e o., C‑571/20, não publicado, EU:C:2021:364, n.o 23).

48      Ora, o órgão jurisdicional de reenvio não esclarece em que medida, apesar do caráter puramente interno do litígio nele pendente, há que proceder à interpretação dos artigos 49.o e 56.o TFUE. Mais especificamente, este órgão jurisdicional não afirma expressamente que se encontra numa das hipóteses referidas nos n.os 50 a 53 do Acórdão de 15 de novembro de 2016, Ullens de Schooten (C‑268/15, EU:C:2016:874).

49      Além disso, embora, em conformidade com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a adjudicação dos contratos que, tendo em conta o seu valor, não são abrangidos pelo âmbito de aplicação das diretivas em matéria de adjudicação dos contratos públicos esteja, no entanto, sujeita às regras fundamentais e aos princípios gerais do Tratado FUE, em especial aos princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação em razão da nacionalidade, bem como à obrigação de transparência deles decorrente, desde que esses contratos apresentem um real interesse transfronteiriço, o órgão jurisdicional de reenvio não se pode limitar a submeter ao Tribunal de Justiça elementos que permitam não excluir a existência desse interesse, mas deve, pelo contrário, fornecer dados suscetíveis de provar a sua existência (v., neste sentido, Despacho de 12 de novembro de 2020, Novart Engineering, C‑170/20, não publicado, EU:C:2020:908, n.os 33 e 35). Ora, no caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio não forneceu estes dados ao Tribunal de Justiça.

50      Por conseguinte, as questões prejudiciais são inadmissíveis na parte em que têm por objeto a interpretação dos artigos 49.o e 56.o TFUE.

51      Resulta de todas as considerações precedentes que as questões prejudiciais são admissíveis, exceto na parte em que têm por objeto a interpretação dos artigos 49.o e 56.o TFUE e do artigo 15.o, n.o 2, da Diretiva 2006/123.

 Quanto à primeira e segunda questões

52      Com as suas duas primeiras questões prejudiciais, que importa examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 76.o e 77.o da Diretiva 2014/24 devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação nacional que reserva às instituições privadas sem fins lucrativos a faculdade de celebrarem acordos ao abrigo dos quais estas instituições prestam serviços sociais de assistência às pessoas, contra o reembolso dos custos que suportam, independentemente do valor previsto desses serviços, e sem que essa legislação exija que as referidas instituições cumpram os requisitos fixados nesse artigo 77.o

 Quanto à aplicabilidade da Diretiva 2014/24

53      Para responder a estas questões, importa, a título preliminar, determinar se acordos como os que estão em causa no processo principal são contratos públicos na aceção da Diretiva 2014/24.

54      A este respeito, em conformidade com o seu artigo 1.o, a Diretiva 2014/24 estabelece as regras aplicáveis aos procedimentos de contratação adotados por autoridades adjudicantes relativamente a contratos públicos e a concursos de conceção cujo valor estimado não seja inferior aos limiares definidos no artigo 4.o desta diretiva. O artigo 2.o, n.o 1, ponto 5, da referida diretiva define contratos públicos, para efeitos desta diretiva, como contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre um ou mais operadores económicos e uma ou mais autoridades adjudicantes, que tenham por objeto a execução de obras, o fornecimento de produtos ou a prestação de serviços.

55      Nesta perspetiva, importa realçar, em primeiro lugar, que, visto que o conceito de «contrato público» é um conceito de direito da União, a qualificação dada pelo direito espanhol aos acordos de ação concertada não tem pertinência [v., neste sentido, Acórdãos de 20 de outubro de 2005, Comissão/França, C‑264/03, EU:C:2005:620, n.o 36, e de 22 de abril de 2021, Comissão/Áustria (Locação de um edifício ainda não construído), C‑537/19, EU:C:2021:319, n.o 43].

56      Consequentemente, a precisão que figura no artigo 62.o, n.o 1, da Lei 5/1997, segundo a qual esses acordos constituem «instrumentos organizativos de natureza extracontratual», não é suficiente para que estes deixem de estar abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2014/24.

57      Além disso, ao contrário do que o Governo neerlandês sugere, não resulta do pedido de decisão prejudicial que esses acordos de ação concertada devam, de facto, ser equiparados a atos administrativos unilaterais que, por mera vontade das autoridades adjudicantes, vinculam as instituições privadas sem fins lucrativos que são parte nesse acordo (v., a este respeito, Acórdãos de 19 de abril de 2007, Asemfo, C‑295/05, EU:C:2007:227, n.os 52 a 55, e de 18 de dezembro de 2007, Asociación Profesional de Empresas de Reparto y Manipulado de Correspondencia, C‑220/06, EU:C:2007:815, n.os 51 a 55).

58      Em segundo lugar, para serem abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2014/24, os acordos de ação concertada em causa no processo principal devem consistir em contratos públicos de serviços, no sentido que lhe é dado pelo artigo 2.o, n.o 1, ponto 9, desta diretiva.

59      A este respeito, em primeiro lugar, o conceito de «serviços», na aceção desta disposição, deve ser interpretado à luz da livre prestação de serviços consagrada no artigo 56.o TFUE e cujo âmbito de aplicação está limitado às atividades económicas (v., neste sentido, Acórdãos de 29 de abril de 2010, Comissão/Alemanha, C‑160/08, EU:C:2010:230, n.os 73 e 74, e de 23 defevereiro de 2016, Comissão/Hungria, C‑179/14, EU:C:2016:108, n.o 154).

60      Mais especificamente, há que salientar que as prestações de serviços realizadas normalmente mediante remuneração constituem atividades económicas, entendendo‑se que a característica essencial da remuneração reside no facto de esta constituir a contrapartida económica da prestação em causa, sem que, no entanto, deva ser paga pelo beneficiário desta (Acórdão de 23 de fevereiro de 2016, Comissão/Hungria, C‑179/14, EU:C:2016:108, n.os 153 a 155). Por outro lado, decorre do artigo 62.o TFUE, conjugado com o artigo 51.o deste Tratado, que a livre prestação de serviços não abrange as atividades que, num Estado‑Membro, estejam ligadas, mesmo ocasionalmente, ao exercício da autoridade pública.

61      Como confirmado pelo considerando 6 da Diretiva 2014/24, só as atividades de natureza económica, na aceção do número anterior, podem, por conseguinte, ser objeto de um contrato público de serviços, na aceção do artigo 2.o, n.o 1, ponto 9, desta diretiva. Esta interpretação é, de resto, corroborada pelo artigo 2.o, n.o 1, ponto 10, da referida diretiva, por força do qual um operador económico, na aceção da mesma, se caracteriza pelo facto de realizar empreitadas e/ou obras, fornecer produtos ou prestar serviços no mercado.

62      Dito isto, a circunstância de o contrato ser celebrado com uma instituição que não prossegue fins lucrativos não exclui que a instituição possa exercer uma atividade económica, na aceção da Diretiva 2014/24, pelo que essa circunstância não tem pertinência para efeitos de aplicação das regras do direito da União em matéria de contratos públicos (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de junho de 2014, Centro Hospitalar de Setúbal e SUCH, C‑574/12, EU:C:2014:2004, n.o 33 e jurisprudência referida, e de 28 de janeiro de 2016, CASTA e o., C‑50/14, EU:C:2016:56, n.o 52).

63      Além disso, podem ser consideradas atividades económicas os serviços prestados contra remuneração que, sem se enquadrarem no exercício das prerrogativas do poder público, são assegurados no interesse público, não têm fins lucrativos e estão em concorrência com os serviços propostos por operadores que prosseguem fins lucrativos (v., por analogia, Acórdão de 6 de setembro de 2011, Scattolon, C‑108/10, EU:C:2011:542, n.o 44 e jurisprudência referida).

64      Em segundo lugar, no que respeita, mais especificamente, às prestações de serviços que, como no caso em apreço, têm um objetivo social, é certo que o artigo 1.o, n.o 5, da Diretiva 2014/24 precisa que esta diretiva não afeta o modo como os Estados‑Membros organizam os seus sistemas de segurança social. Além disso, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as atividades dos organismos que gerem um regime de segurança social não constituem, em princípio, atividades económicas quando assentam no princípio da solidariedade e estão sujeitas ao controlo do Estado (v., neste sentido, Acórdão de 11 de junho de 2020, Comissão e República Eslovaca/Dôvera zdravotná poist’ovňa, C‑262/18 P e C‑271/18 P, EU:C:2020:450, n.o 31 e jurisprudência referida).

65      Dito isto, não é necessariamente esse o caso das prestações sociais específicas fornecidas por operadores privados e cujo custo é assumido quer pelo próprio Estado, quer por esses organismos de segurança social. Com efeito, resulta igualmente da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a prossecução de uma finalidade social ou a tomada em consideração do princípio da solidariedade no âmbito de uma prestação de serviços não impede, enquanto tal, que se considere essa prestação como uma atividade económica (v., neste sentido, Acórdãos de 29 de novembro de 2007, Comissão/Itália, C‑119/06, não publicado, EU:C:2007:729, n.os 36 a 41, e de 12 de setembro de 2000, Pavlov e o., C‑180/98 a C‑184/98, EU:C:2000:428, n.o 118).

66      No presente caso, como foi salientado pela advogada‑geral nos n.os 55 a 61 das conclusões, afigura‑se que, pelo menos, alguns serviços sociais de assistência às pessoas abrangidos pelo âmbito de aplicação da legislação nacional em causa no processo principal são prestados contra remuneração e não se enquadram no exercício da autoridade pública, pelo que se pode considerar que essas atividades têm natureza económica e, por conseguinte, constituem serviços, na aceção da Diretiva 2014/24.

67      Em terceiro lugar, o caráter oneroso de um contrato público pressupõe que cada uma das partes se comprometa a realizar uma prestação em contrapartida de outra, sem, contudo, excluir que a contrapartida da autoridade adjudicante possa consistir apenas no reembolso dos custos suportados para fornecer o serviço acordado (v., neste sentido, Acórdão de 10 de setembro de 2020, Tax‑Fin‑Lex, C‑367/19, EU:C:2020:685, n.os 25 e 26 e jurisprudência referida). Por conseguinte, um contrato não deixa de estar abrangido pelo conceito de «contrato público de serviços» pelo simples facto de, como parece ser o caso na situação em apreço, a remuneração prevista se limitar ao reembolso dos custos suportados para prestar o serviço acordado (Acórdão de 28 de janeiro de 2016, CASTA e o., C‑50/14, EU:C:2016:56, n.o 52).

68      Em quarto lugar, como confirmado pelo considerando 4 e pelo considerando 114, último parágrafo, da Diretiva 2014/24, os procedimentos através dos quais a autoridade adjudicante renuncia à obrigação de comparar e classificar as propostas admissíveis e de designar um ou mais operadores económicos aos quais é adjudicado o contrato em regime de exclusividade não estão abrangidos pelo âmbito de aplicação desta diretiva (v., neste sentido, Acórdãos de 2 de junho de 2016, Falk Pharma, C‑410/14, EU:C:2016:399, n.os 37 a 42, e de 1 de março de 2018, Tirkkonen, C‑9/17, EU:C:2018:142, n.os 29 a 35).

69      Dito isto, resulta das respostas da ASADE, do Governo espanhol e da recorrida no processo principal às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça que a adjudicação de um acordo de ação concertada é, na prática, precedida de uma seleção entre as instituições privadas sem fins lucrativos que manifestaram interesse em prestar os serviços sociais de assistência às pessoas, objeto desse acordo, o que cabe, todavia, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

70      Em quinto lugar, resulta expressamente da primeira questão prejudicial que a legislação nacional em causa no processo principal se aplica a todos os acordos de ação concertada, independentemente do seu valor previsto. Como tal, não se pode excluir que esta legislação, cuja conformidade com o direito da União o órgão jurisdicional é chamado a fiscalizar, tenha por objeto acordos de ação concertada cujo valor previsto é igual ou superior aos limiares previstos no artigo 4.o da Diretiva 2014/24.

71      Com base no que precede, a legislação em causa no processo principal parece regular, pelo menos em parte, a adjudicação de contratos públicos sujeitos à Diretiva 2014/24.

72      Por último, importa acrescentar que, por muito lamentável que seja, a falta de enumeração, no pedido de decisão prejudicial, das categorias específicas de serviços sociais de assistência às pessoas abrangidas pela legislação nacional em causa no processo principal não impede o Tribunal de Justiça, contrariamente ao que o Governo italiano parece sustentar, de verificar se a interpretação da Diretiva 2014/24 não é completamente desprovida de relação com o objeto do litígio no processo principal.

73      Com efeito, por um lado, resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que, pelo menos, uma parte dos serviços sociais de assistência às pessoas, suscetíveis de ser objeto de um acordo de ação concertada, está abrangida pelos serviços enumerados no anexo XIV da Diretiva 2014/24 e, por outro, que as questões prejudiciais têm por objeto a interpretação não das disposições desta diretiva geralmente aplicáveis aos procedimentos de adjudicação de contratos públicos, mas apenas dos artigos 74.o a 77.o da referida diretiva, que instituem em específico um regime simplificado de adjudicação de contratos públicos abrangidos por este anexo.

74      Por conseguinte, há que examinar estas questões apenas à luz dos artigos 74.o a 77.o da Diretiva 2014/24.

 Quanto aos requisitos decorrentes da Diretiva 2014/24

75      Para verificar se os artigos 74.o a 77.o da Diretiva 2014/24 se opõem a uma legislação como a que está em causa no processo principal, há que salientar, em primeiro lugar, que o regime simplificado de adjudicação de contratos públicos previsto nestes artigos se justifica, como aponta o considerando 114 da Diretiva 2014/24, pela dimensão transfronteiriça limitada dos serviços referidos no anexo XIV da referida diretiva, bem como pelo facto de esses serviços serem prestados num contexto particular que varia muito entre os Estados‑Membros devido às diferenças de tradições culturais.

76      Em segundo lugar, o artigo 77.o da Diretiva 2014/24 prevê que, relativamente a certos serviços referidos no anexo XIV desta diretiva, os Estados‑Membros podem permitir às autoridades adjudicantes reservar às «organizações», como definidas no n.o 2 deste artigo, o direito de participarem nos procedimentos de adjudicação de contratos públicos que tenham por objeto a prestação desses serviços.

77      O artigo 77.o, n.o 2, da Diretiva 2014/24 especifica os requisitos estritos mediante os quais um operador económico pode ser considerado uma «organização», na aceção deste artigo. Assim, é exigido que esse operador económico tenha por objetivo a prossecução de uma missão de serviço público ligada à prestação dos serviços sociais ou especiais a que se refere esse artigo, que os lucros do referido operador económico sejam reinvestidos com vista à consecução desse objetivo e que, quando esses lucros sejam distribuídos ou redistribuídos, essa operação se deve basear em considerações de natureza participativa. Além disso, as estruturas de gestão ou propriedade desse operador económico devem basear‑se na participação dos trabalhadores ou em princípios participativos, ou requerer o envolvimento ativo dos trabalhadores, utilizadores ou partes interessadas.

78      Por outro lado, resulta do artigo 77.o, n.o 2, alínea d), e n.o 3, da Diretiva 2014/24 que uma autoridade adjudicante só pode adjudicar um contrato público a uma «organização» com base no procedimento previsto nesse artigo por um período não superior a três anos e na condição de essa autoridade adjudicante não ter já adjudicado a essa «organização» um contrato relativo aos serviços previstos no referido artigo durante os últimos três anos.

79      No caso em apreço, como confirma a redação da primeira questão prejudicial, a legislação nacional em causa no processo principal impõe que seja reservada às instituições privadas sem fins lucrativos a faculdade de participarem nos procedimentos de adjudicação dos acordos de ação concertada, sem exigir que estas instituições cumpram todos os requisitos previstos no artigo 77.o da Diretiva 2014/24.

80      Dito isto, não se pode retirar desta circunstância que essa legislação seja necessariamente incompatível com o regime simplificado previsto nos artigos 74.o a 77.o da Diretiva 2014/24.

81      Com efeito, o artigo 77.o desta diretiva tem um alcance muito específico, posto que garante expressamente aos Estados‑Membros a possibilidade, relativamente a certos serviços que são objeto deste regime simplificado, de autorizarem as autoridades adjudicantes a reservar, de pleno direito, somente aos operadores económicos que preencham todos os requisitos previstos neste artigo a faculdade de participarem nos procedimentos de adjudicação de contratos públicos que tenham por objeto esses serviços.

82      Assim, atentas as especificidades do regime jurídico que institui e tendo em conta a economia dos artigos 74.o a 77.o da Diretiva 2014/24, não se pode considerar que o artigo 77.o desta abrange, de modo exaustivo, os casos em que os contratos públicos que têm por objeto a prestação de um serviço referido no anexo XIV da referida diretiva podem ser reservados a certas categorias de operadores económicos.

83      Em terceiro lugar, importa sublinhar que o artigo 76.o da Diretiva 2014/24 fixa as regras, em derrogação do regime geral, aplicáveis à adjudicação de todos os contratos públicos relativos aos serviços sociais e a outros serviços específicos enumerados no seu anexo XIV.

84      Este artigo 76.o obriga os Estados‑Membros, por um lado, a instituírem regras de adjudicação para que as autoridades adjudicantes respeitem os princípios da transparência e da igualdade de tratamento dos operadores económicos e, por outro, a garantirem que essas regras permitem às autoridades adjudicantes atender às especificidades dos serviços objeto desses procedimentos de adjudicação. A este respeito, os Estados‑Membros devem autorizar as autoridades adjudicantes a ter em conta a necessidade de garantir a qualidade, a continuidade, a acessibilidade, a disponibilidade e a exaustividade desses serviços, as necessidades específicas das diferentes categorias de utilizadores, o envolvimento, a capacitação dos utilizadores e a inovação.

85      Assim, como confirma o considerando 114 da Diretiva 2014/24, o regime jurídico estabelecido no artigo 76.o da mesma caracteriza‑se pelo amplo poder de apreciação de que dispõem os Estados‑Membros para organizarem, do modo que considerem mais adequado, a escolha dos prestadores de serviços enumerados no anexo XIV desta diretiva. Resulta ainda deste considerando que os Estados‑Membros devem igualmente ter em consideração o Protocolo n.o 26, que consagra, nomeadamente, o amplo poder de apreciação das autoridades nacionais para mandar executar serviços de interesse económico geral de um modo que atenda, tanto quanto possível, às necessidades dos utilizadores.

86      Consequentemente, há que examinar se os princípios da igualdade de tratamento e da transparência, conforme previstos no artigo 76.o da Diretiva 2014/24, se opõem a uma legislação nacional que reserva às instituições privadas sem fins lucrativos, incluindo quando não preenchem os requisitos previstos no artigo 77.o desta diretiva, o direito de participarem nos procedimentos de adjudicação dos contratos públicos que tenham por objeto a prestação de serviços sociais de assistência às pessoas, abrangidos pelo anexo XIV da referida diretiva.

87      No que se refere, em primeiro lugar, ao princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos, o facto de as instituições privadas com fins lucrativos estarem impedidas de participar nesses procedimentos de adjudicação de contratos públicos constitui uma diferença de tratamento entre os operadores contrária a esse princípio, a menos que essa diferença se justifique por circunstâncias objetivas (v., por analogia, Acórdãos de 11 de dezembro de 2014, Azienda sanitaria locale n.o 5 «Spezzino» e o., C‑113/13, EU:C:2014:2440, n.o 52, e de 28 de janeiro de 2016, CASTA e o., C‑50/14, EU:C:2016:56, n.o 56).

88      A este respeito, há que recordar que um Estado‑Membro pode, no âmbito da sua competência para organizar o seu sistema de segurança social, considerar que um regime de assistência social implica necessariamente, para atingir os seus objetivos, que a admissão de operadores privados a esse sistema na qualidade de prestadores de serviços de assistência social dependa da condição de não terem fim lucrativo (Acórdãos de 17 de junho de 1997, Sodemare e o., C‑70/95, EU:C:1997:301, n.o 32, e de 11 de dezembro de 2014, Azienda sanitaria locale n.o 5 «Spezzino» e o., C‑113/13, EU:C:2014:2440, n.o 58).

89      No caso em apreço, resulta da legislação nacional em causa no processo principal e das respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça que os acordos de ação concertada previstos por esta legislação devem ser conformes, nomeadamente, com os princípios da solidariedade e da eficácia orçamental. Em particular, por um lado, os serviços sociais de assistência às pessoas que podem ser objeto desses acordos devem ser oferecidos a todos, em princípio gratuitamente, e o montante da eventual taxa suscetível de ser cobrada a título complementar aos utentes depende da sua capacidade financeira. Por outro lado, as instituições privadas sem fins lucrativos abrangidas pelos referidos acordos só podem obter o reembolso dos custos variáveis, fixos e permanentes suportados a fim de prestarem os serviços sociais de assistência às pessoas que são objeto desses mesmos acordos, estando expressamente excluída a obtenção de lucros comerciais.

90      Assim, o recurso exclusivo a instituições privadas sem fins lucrativos a fim de assegurarem a prestação desses serviços sociais é suscetível de ser motivado tanto pelos princípios da universalidade e da solidariedade, específicos de um sistema de assistência social, como por razões de eficácia económica e de adequação, na medida em que permite que estes serviços de interesse geral sejam assegurados em condições de equilíbrio económico no plano orçamental, por entidades constituídas essencialmente tendo em vista servir o interesse geral e cujas decisões não são guiadas, como salienta o Governo espanhol, por considerações puramente comerciais (v., por analogia, Acórdão de 28 de janeiro de 2016, CASTA e o., C‑50/14, EU:C:2016:56, n.o 57).

91      Quando é motivada por considerações deste tipo, a exclusão das instituições privadas com fins lucrativos de procedimentos de adjudicação de contratos públicos que tenham por objeto a prestação desses serviços não é contrária ao princípio da igualdade, desde que tal exclusão contribua efetivamente para um fim social e para a prossecução de objetivos de solidariedade e de eficácia orçamental em que assenta este sistema (v., por analogia, Acórdãos de 11 de dezembro de 2014, Azienda sanitaria locale n.o 5 «Spezzino» e o., C‑113/13, EU:C:2014:2440, n.o 60, e de 28 de janeiro de 2016, CASTA e o., C‑50/14, EU:C:2016:56, n.o 63).

92      A este respeito, por um lado, o Tribunal de Justiça teve a oportunidade de esclarecer, em relação a contratos públicos para os quais a Diretiva 2014/24 ainda não era aplicável, que, para satisfazer esses requisitos, as entidades privadas às quais, por força da legislação do Estado‑Membro em causa, esses contratos estão reservados não podem prosseguir objetivos diferentes dos mencionados no número anterior nem quaisquer lucros, ainda que indiretos, com as suas prestações, independentemente do reembolso dos custos variáveis, fixos e permanentes, necessários para as efetuar. Também não podem proporcionar um qualquer benefício aos seus membros. Além disso, a aplicação desta legislação não pode ser alargada a ponto de abranger práticas abusivas dessas entidades ou dos seus membros. Assim, as referidas entidades só devem recorrer a trabalhadores dentro dos limites necessários ao seu normal funcionamento e no respeito dos requisitos impostos pela legislação nacional a seu respeito, sendo que os voluntários só podem, por seu turno, ser reembolsados dos custos efetivamente suportados com a atividade prestada, nos limites previamente estabelecidos pelas próprias entidades privadas (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de dezembro de 2014, Azienda sanitaria locale n.o 5 «Spezzino» e o., C‑113/13, EU:C:2014:2440, n.os 61 e 62, e de 28 de janeiro de 2016, CASTA e o., C‑50/14, EU:C:2016:56, n.os 64 e 65).

93      Por outro lado, resulta igualmente da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o princípio da igualdade de tratamento, aplicável no âmbito da liberdade de estabelecimento consagrada nos artigos 49.o a 55.o TFUE, não se opõe a que um Estado‑Membro reserve a qualidade de prestadores de serviços de assistência social aos operadores privados sem fins lucrativos, incluindo àqueles que não são estritamente voluntários (v., neste sentido, Acórdão de 17 de junho de 1997, Sodemare e o., C‑70/95, EU:C:1997:301, n.os 32 a 34).

94      Esta jurisprudência continua a ser pertinente para efeitos de interpretação do artigo 76.o da Diretiva 2014/24, que consagra atualmente de modo expresso a existência de um regime simplificado de adjudicação para os contratos públicos sociais.

95      Daqui resulta que o princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos, conforme está atualmente consagrado no artigo 76.o da Diretiva 2014/24, autoriza os Estados‑Membros a reservarem o direito de participarem no procedimento de adjudicação dos contratos públicos de serviços sociais de assistência às pessoas às instituições privadas sem fins lucrativos, incluindo as que não são estritamente voluntárias, desde que, por um lado, os eventuais lucros que resultam da execução desses contratos sejam reinvestidos por essas entidades com vista à consecução do objetivo social de interesse geral que prosseguem e, por outro, que todos os requisitos recordados nos n.os 90 e 91 do presente acórdão estejam preenchidos.

96      Importa acrescentar que, em contrapartida, o artigo 76.o da Diretiva 2014/24 se opõe a que esses contratos públicos possam ser diretamente adjudicados, sem ser objeto de um concurso, a uma entidade sem fins lucrativos, que não seja uma instituição de voluntariado (v., a este respeito, Acórdão de 28 de janeiro de 2016, CASTA e o., C‑50/14, EU:C:2016:56, n.o 70). Pelo contrário, este artigo exige que, antes de proceder a essa adjudicação, a autoridade adjudicante compare e classifique as respetivas propostas das diferentes instituições sem fins lucrativos que manifestaram interesse, tendo nomeadamente em conta o preço dessas propostas, mesmo que esse preço seja constituído, como no caso em apreço, pela totalidade dos custos cujo reembolso a autoridade adjudicante deverá assegurar.

97      Em segundo lugar, quanto ao princípio da transparência, este exige, da parte da autoridade adjudicante, um grau de publicidade adequado, que permita, por um lado, uma abertura à concorrência e, por outro, o controlo da imparcialidade do procedimento de adjudicação, a fim de permitir a qualquer operador interessado decidir apresentar propostas com base em todas as informações pertinentes e garantir a inexistência de risco de favoritismo e de arbitrariedade por parte da autoridade adjudicante. O dever de transparência implica assim que todos os requisitos e modalidades do procedimento de adjudicação sejam formulados de modo claro, preciso e unívoco, a fim de, por um lado, permitir que todos os proponentes razoavelmente informados e normalmente diligentes compreendam o seu alcance exato e os interpretem da mesma maneira e, por outro, enquadrar o poder discricionário da autoridade adjudicante e permitir que esta verifique efetivamente se as propostas dos proponentes correspondem aos critérios que regem o procedimento em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 16 de fevereiro de 2012, Costa e Cifone, C‑72/10 e C‑77/10, EU:C:2012:80, n.o 73, e de 4 de abril de 2019, Allianz Vorsorgekasse, C‑699/17, EU:C:2019:290, n.os 61 e 62 e jurisprudência referida).

98      No caso em apreço, por um lado, não resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que a legislação nacional em causa no processo principal não ofereça garantias suficientes que permitam proteger as instituições privadas sem fins lucrativos contra o risco de favoritismo ou de arbitrariedade da autoridade adjudicante durante o procedimento de adjudicação de um acordo de ação concertada.

99      Por outro lado, o artigo 75.o da Diretiva 2014/24 especifica, a respeito dos procedimentos de adjudicação de contratos públicos abrangidos pelo regime simplificado estabelecido nos artigos 74.o a 77.o desta diretiva, os requisitos de publicidade exigidos pelo princípio da transparência, como foi recordado no n.o 97 do presente acórdão.

100    Ora, segundo este artigo 75.o, as autoridades adjudicantes que pretendam celebrar um contrato público para os serviços referidos no anexo XIV da Diretiva 2014/24 devem, em princípio, dar a conhecer a sua intenção através de um anúncio de concurso ou de um anúncio de pré‑informação publicado, em aplicação do artigo 51.o desta diretiva, pelo Serviço das Publicações da União Europeia ou, consoante o caso, no que respeita aos anúncios de pré‑informação, sobre os seus perfis de comprador.

101    No presente caso, como foi salientado pela advogada‑geral no n.o 116 das conclusões, parece decorrer da legislação nacional em causa no processo principal que a publicidade dos anúncios de concurso a que se refere é assegurada apenas pela publicação no Diari Oficial de la Generalitat Valenciana (Jornal Oficial do Governo da Comunidade Valenciana). Se assim for, o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, esta publicação não constitui uma medida de publicidade conforme ao artigo 75.o da Diretiva 2014/24.

102    Resulta de todas as considerações precedentes que os artigos 76.o e 77.o da Diretiva 2014/24 devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional que reserva às instituições privadas sem fins lucrativos a faculdade de celebrarem, através de concurso público, acordos ao abrigo dos quais estas instituições prestam serviços sociais de assistência às pessoas, contra o reembolso dos custos que suportam, independentemente do valor previsto desses serviços, mesmo que tais instituições não cumpram os requisitos previstos nesse artigo 77.o, desde que, por um lado, o quadro jurídico legal e contratual no qual é desenvolvida a atividade das referidas instituições contribua efetivamente para o fim social e para a prossecução de objetivos de solidariedade e de eficácia orçamental em que assenta essa legislação e, por outro, que o princípio da transparência, conforme é densificado, em particular, no artigo 75.o dessa diretiva, seja respeitado.

 Quanto à terceira questão

103    A título preliminar, há que salientar que, ao abrigo do artigo 64.o, n.o 3, da Lei 5/1997, a implantação das instituições privadas sem fins lucrativos na localidade onde o serviço é prestado constitui um dos critérios de seleção que podem ser utilizados pela autoridade adjudicante no âmbito da celebração de um acordo de ação concertada. Assim, e sem prejuízo da verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, parece que a autoridade adjudicante pode exigir, com base neste critério, que os proponentes estejam, desde o momento em que apresentam as suas propostas, implantados no território da localidade abrangida pelos serviços sociais a prestar.

104    Por conseguinte, com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 76.o e 77.o da Diretiva 2014/24 devem ser interpretados no sentido de que permitem, no âmbito da adjudicação de um contrato público de serviços sociais referido no anexo XIV desta diretiva, que a implantação do operador económico na localidade onde os serviços devem ser prestados constitua um critério de seleção dos operadores económicos, prévio ao exame das suas propostas.

105    Em primeiro lugar, há que recordar, como foi sublinhado no n.o 84 do presente acórdão, que o artigo 76.o da referida diretiva exige que esse critério de implantação seja compatível com o princípio da igualdade de tratamento dos operadores económicos.

106    Ora, este critério introduz uma diferença de tratamento entre os operadores económicos, consoante disponham ou não de uma implantação na localidade onde é prestado o serviço social em causa. Sendo a situação destes operadores comparável relativamente à adjudicação de um contrato público que tenha por objeto um serviço referido no anexo XIV da mesma diretiva, essa diferença de tratamento só é compatível com o princípio da igualdade na medida em que possa ser justificada por um objetivo legítimo.

107    Em segundo lugar, resulta das observações escritas apresentadas ao Tribunal de Justiça que o critério de seleção baseado na implantação do operador económico na localidade onde os serviços devem ser prestados se destina, nomeadamente, a assegurar a proximidade e a acessibilidade dos serviços sociais que são objeto de um acordo de ação concertada.

108    É certo que este objetivo constitui um objetivo legítimo à luz do direito da União e é, de resto, reconhecido tanto no artigo 1.o do Protocolo n.o 26 como no artigo 76.o da Diretiva 2014/24, uma vez que este último artigo impõe aos Estados‑Membros, como foi recordado no n.o 84 do presente acórdão, que as autoridades adjudicantes possam ter em conta a necessidade de garantir, designadamente, a acessibilidade e a disponibilidade dos serviços referidos no anexo XIV desta diretiva.

109    Dito isto, um critério que impõe, como no caso em apreço, que os proponentes estejam implantados, a partir do momento em que apresentam as suas propostas, no território da localidade na qual os serviços sociais serão prestados é manifestamente desproporcionado relativamente à realização desse objetivo (v., neste sentido, Acórdão de 27 de outubro de 2005, Contse e o., C‑234/03, EU:C:2005:644, n.o 43). Com efeito, mesmo admitindo que a implantação do operador económico no território da localidade em que deve prestar os serviços sociais em causa seja necessária para garantir a proximidade e a acessibilidade desses serviços, esse objetivo poderia, em todo o caso, ser realizado de maneira igualmente eficaz se se exigisse a esse operador económico que preenchesse esse requisito apenas na fase da execução do contrato público em causa.

110    Tendo em conta o que precede, importa responder à terceira questão prejudicial que o artigo 76.o da Diretiva 2014/24 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional segundo a qual, no âmbito da adjudicação de um contrato público de serviços sociais referido no anexo XIV desta diretiva, a implantação do operador económico na localidade onde os serviços devem ser prestados constitui um critério de seleção dos operadores económicos, prévio ao exame das suas propostas.

 Quanto às despesas

111    Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) declara:

1)      Os artigos 76.o e 77.o da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos públicos e que revoga a Diretiva 2004/18/CE, devem ser interpretados no sentido de que não se opõem a uma legislação nacional que reserva às instituições privadas sem fins lucrativos a faculdade de celebrarem, através de concurso público, acordos ao abrigo dos quais estas instituições prestam serviços sociais de assistência às pessoas, contra o reembolso dos custos que suportam, independentemente do valor previsto desses serviços, mesmo que tais instituições não cumpram os requisitos previstos nesse artigo 77.o, desde que, por um lado, o quadro jurídico legal e contratual no qual é desenvolvida a atividade das referidas instituições contribua efetivamente para o fim social e para a prossecução de objetivos de solidariedade e de eficácia orçamental em que assenta essa legislação e, por outro, que o princípio da transparência, conforme é densificado, em particular, no artigo 75.o dessa diretiva, seja respeitado.

2)      O artigo 76.o da Diretiva 2014/24 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional segundo a qual, no âmbito da adjudicação de um contrato público de serviços sociais referido no anexo XIV desta diretiva, a implantação do operador económico na localidade onde os serviços devem ser prestados constitui um critério de seleção dos operadores económicos, prévio ao exame das suas propostas.

Assinaturas


*      Língua do processo: espanhol.