Language of document : ECLI:EU:C:2020:696

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

MACIEJ SZPUNAR

apresentadas em 10 de setembro de 2020 (1)

Processo C392/19

VG BildKunst

contra

Stiftung Preußischer Kulturbesitz

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal Federal, Alemanha)]

«Reenvio prejudicial — Propriedade intelectual — Direito de autor e direitos conexos na sociedade de informação — Diretiva 2001/29/CE — Artigo 3.o, n.o 1 — Conceito de “comunicação ao público” — Inserção de uma obra protegida pelo direito de autor através do procedimento de transclusão (framing) — Obra livremente acessível com autorização do titular do direito de autor no sítio Internet de um detentor de licença — Artigo 6.o — Medidas eficazes de caráter tecnológico — Diretiva 2014/26/UE — Gestão coletiva do direito de autor e dos direitos conexos — Artigo 16.o — Condições de concessão de licenças — Cláusula do contrato de exploração que exige que o detentor de licença introduza medidas eficazes de caráter tecnológico contra a transclusão»






 Introdução

1.        Os heróis da saga cinematográfica de George Lucas Star Wars eram capazes de se deslocar no «hiperespaço» a velocidade superlumínica com ajuda da «hiperpropulsão». De modo semelhante, os utilizadores da Internet podem «viajar» pelo «ciberespaço» através de hiperligações. Embora essas hiperligações não desafiem as leis da física como fazia a hiperpropulsão das naves espaciais da Star Wars, apresentam, no entanto, vários desafios do ponto de vista da lei, e em especial dos direitos de autor. Estes desafios já foram parcialmente identificados, entre outros, na jurisprudência do Tribunal de Justiça. O presente processo dará a oportunidade de rever e completar essa jurisprudência.

2.        Ao pensar na Internet, é habitual fazer referência, na realidade, a uma única funcionalidade desta rede, provavelmente a mais utilizada: a World Wide Web, por outras palavras, a «Web» (rede) ou «rede mundial». Esta rede é formada por unidades de informação e recursos contidos em páginas Internet (web page). Uma página Internet é um documento escrito em linguagem HTML (HyperText Markup Language) e pode eventualmente conter outros recursos anexos, designadamente imagens ou ficheiros audiovisuais ou de texto. Um conjunto estruturado de páginas Internet e de outros publicados por um proprietário e alojados em um ou vários servidores constitui um sítio Internet (website).

3.        Aquando da consulta de um sítio Internet, o computador cria uma conexão com o ou os servidores em que esse sítio se encontra alojado, pedindo as informações que constituem o sítio. Uma cópia dessas informações é então enviada e registada (provisoriamente) na memória intermédia ou «memória cache» do computador. Estas informações podem ser lidas e visualizadas no ecrã do computador através de um software especial, um navegador Internet.

4.        Cada recurso na Web, isto é, cada ficheiro, página e sítio Internet, possui um identificador único denominado URL (Uniform Resource Locator), que constitui uma espécie de «endereço Internet» (2). A página para a qual remete o endereço de um sítio Internet é denominada página inicial (home page). Existem duas formas de aceder a um recurso na Web ao utilizar o endereço URL. A primeira forma consiste em inserir esse endereço na janela do endereço do navegador e o segundo, que está em causa no presente processo, em utilizar uma hiperligação.

5.        O que «tece a Web» (webbing the Web) são as ligações ou hiperligações (hypertext links). Permitem aceder, a partir de um sítio Internet, diretamente aos recursos presentes noutro sítio. São, de facto, as hiperligações que constituem a própria essência da Web e a diferenciam, por exemplo, da Biblioteca de Alexandria. O Tribunal de Justiça reconheceu na sua jurisprudência a importância das hiperligações para o funcionamento da Web e a liberdade de expressão para a qual esta contribui (3).

6.        Uma hiperligação é uma instrução que o navegador recebe para ir procurar recursos noutro sítio Internet. A hiperligação exprime em linguagem HTML o endereço URL do recurso alvo e o texto ou a imagem que simboliza a hiperligação na página Internet original (4), bem como, eventualmente, outros elementos, como a maneira de abrir o recurso alvo no ecrã. Geralmente, uma hiperligação necessita de ser ativada (clicada) para funcionar.

7.        Uma ligação simples contém unicamente o endereço URL do sítio para o qual remete, isto é, da sua página inicial. Depois de clicar na ligação, esta página abre‑se quer em lugar da página onde se encontrava a hiperligação quer numa nova janela. O endereço URL do novo sítio aparece na janela de endereços, de modo que o utilizador tem consciência de ter mudado de sítio. No entanto, existem, outros tipos de ligações.

8.        A ligação denominada profunda (deep link) não remete para a página inicial do sítio alvo, mas para outra página desse sítio, isto é, para um recurso específico contido nessa página, por exemplo um ficheiro gráfico ou de texto (5). Com efeito, cada página e cada recurso têm um endereço URL que pode ser utilizado na ligação em vez do único endereço principal do sítio. Uma ligação profunda ignora a suposta ordem da navegação no sítio alvo, contornando a sua página inicial. No entanto, na medida em que o endereço URL de uma página Internet contém normalmente o nome do sítio, o utilizador é constantemente informado do sítio que está a consultar.

9.        Uma página Internet pode conter outros recursos além de texto, nomeadamente ficheiros gráficos ou audiovisuais. Estes ficheiros não são partes integrantes do documento HTML que constitui a página, mas a estão ligados ao mesmo. A inserção (embedding) desses recursos é feita com base em instruções específicas que existem na linguagem HTML para esse fim. Por exemplo, para incorporar uma imagem, existe a etiqueta «imagem» («<img>») (6). Normalmente, esta etiqueta é utilizada para inserir numa página Internet um ficheiro gráfico armazenado no mesmo servidor que esta página (ficheiro local). No entanto, basta substituir no atributo «fonte» da etiqueta «imagem», o endereço de um ficheiro local («URL relativo») pela de um ficheiro contido noutro sítio Internet («URL absoluto») para o inserir, sem ter de o reproduzir, na sua própria página Internet (7).

10.      Esta técnica utiliza a funcionalidade de uma hiperligação, isto é que o elemento, por exemplo uma imagem, é exibido no navegador a partir do seu local de origem (o sítio Internet alvo), pelo que, não é reproduzido no servidor do sítio em que aparece. No entanto, o elemento inserido é automaticamente exibido, sem que seja necessário clicar em qualquer ligação. Do ponto de vista do utilizador, o efeito é idêntico ao de um ficheiro contido na mesma página em que aparece. Esta prática é conhecida sob a denominação de inline linking ou de hotlinking.

11.      O framing é uma técnica que permite dividir o ecrã em várias partes, de modo que cada uma delas pode mostrar, autonomamente, uma página ou um recurso Internet diferente. Assim, numa parte do ecrã pode visualizar‑se a página Internet original e, na outra, uma página ou outro recurso proveniente de outro sítio. Esta outra página não é reproduzida no servidor do sítio em que se visualiza, mas é consultada diretamente através de uma ligação profunda. O endereço URL da página alvo dessa ligação é frequentemente dissimulado, pelo que o utilizador pode ter a impressão de consultar uma única página Internet, quando, de facto, consulta duas (ou mais).

12.      O framing é atualmente considerado obsoleto e não se utiliza na última versão da linguagem HTLM (HTML5). Foi substituído pelo inline frame (8), que permite colocar um recurso externo, como um sítio Internet, uma página, ou mesmo um elemento de uma página Internet proveniente de outro sítio num quadro cujas dimensões e localização são livremente definidas pelo autor da página Internet em questão. O inline frame apresenta‑se como um elemento integrante dessa página, uma vez que esta técnica, ao contrário do framing clássico, não é uma técnica de divisão do ecrã, mas um meio de inserção (embedding) de recursos externos numa página da Internet.

13.      Para complicar ainda mais as coisas, o inline frame pode ser definido como o lugar de abertura de uma hiperligação (9). Desta forma, após a ativação da hiperligação (com um clique), o recurso alvo abre‑se num quadro (cujas margens podem ser ou não visíveis no ecrã), que se encontra num local definido pelo autor da página que contém a ligação (10).

14.      Pode parecer que estas manipulações são complexas e que exigem conhecimentos aprofundados em informática, mas os numerosos serviços de criação de sítios Internet e as plataformas de partilha de conteúdo automatizam esses processos, permitindo facilmente criar páginas Internet, inserir conteúdos e criar hiperligações sem ter esses conhecimentos.

15.      Resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que as hiperligações para obras protegidas pelos direitos de autor, colocadas à disposição do público em livre acesso na Internet com a autorização do titular desses direitos, não constituem um ato que requeira uma autorização do referido titular (11). Contudo, uma jurisprudência mais recente requer que este acervo jurisprudencial seja analisado sob um prisma ligeiramente diferente. Assim, há que determinar se o facto de um titular dos direitos de autor utilizar meios técnicos destinados a evitar a utilização da sua obra sob a forma de hiperligações e através do framing altera a apreciação do ponto de vista dos direitos de autor. Na minha opinião, será igualmente necessário rever o problema ligado à inserção em páginas Internet de obras provenientes de outros sítios (inline linking).

 Quadro jurídico

 Direito da União

16.      O artigo 3.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação (12), dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros devem prever a favor dos autores o direito exclusivo de autorizar ou proibir qualquer comunicação ao público das suas obras, por fio ou sem fio, incluindo a sua colocação à disposição do público por forma a torná‑las acessíveis a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido.

[…]

3.      Os direitos referidos nos n.os 1 e 2 não se esgotam por qualquer ato de comunicação ao público ou de colocação à disposição do público, contemplado no presente artigo.»

17.      Nos termos do artigo 6.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 2001/29:

«1.      Os Estados‑Membros assegurarão proteção jurídica adequada contra a neutralização de qualquer medida eficaz de caráter tecnológico por pessoas que saibam ou devam razoavelmente saber que é esse o seu objetivo.

[…]

3.      Para efeitos da presente diretiva, por ‘medidas de caráter tecnológico’ entende‑se quaisquer tecnologias, dispositivos ou componentes que, durante o seu funcionamento normal, se destinem a impedir ou restringir atos, no que se refere a obras ou outro material, que não sejam autorizados pelo titular de um direito de autor ou direitos conexos previstos por lei ou do direito sui generis previsto no capítulo III da Diretiva 96/9/CE [(13)]. As medidas de caráter tecnológico são consideradas ‘eficazes’ quando a utilização da obra ou de outro material protegido seja controlada pelos titulares dos direitos através de um controlo de acesso ou de um processo de proteção, como por exemplo a codificação, cifragem ou qualquer outra transformação da obra ou de outro material protegido, ou um mecanismo de controlo da cópia, que garanta a realização do objetivo de proteção.»

18.      O artigo 16.o, n.o 1, e n.o 2, primeiro parágrafo, da Diretiva 2014/26/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa à gestão coletiva do direito de autor e direitos conexos e à concessão de licenças multiterritoriais de direitos sobre obras musicais para utilização em linha no mercado interno (14), dispõe:

«1.      Os Estados‑Membros asseguram que as organizações de gestão coletiva e os usuários conduzam de boa‑fé as negociações para a concessão de licenças de direitos. As organizações de gestão coletiva e os usuários devem prestar‑se reciprocamente todas as informações necessárias.

2.      As condições da concessão de licenças devem basear‑se em critérios objetivos e não discriminatórios. Na concessão de licenças de direitos, as organizações de gestão coletiva não devem ser obrigadas a utilizar como precedente para outros serviços em linha as condições de concessão de licenças acordadas com um usuário, quando o usuário presta um novo tipo de serviço em linha que está disponível ao público na União há menos de três anos.

[…]»

 Direito alemão

19.      O direito de comunicação ao público, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29, encontra‑se coberto, no direito alemão, pelo § 19a «colocação à disposição») e pelo § 15, n.o 2 («direito não definido» de comunicação ao público), da Gesetz über Urheberrecht und verwandte Schutzrechte — Urheberrechtsgesetz (Lei relativa aos Direitos de Autor e Direitos Conexos), de 9 de setembro de 1965 (15) (a seguir «UrhG»).

20.      O artigo 6.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 foi transposto para o direito alemão pelo § 95a da UrhG.

21.      Por último, nos termos do § 34, n.o 1, primeiro período, da Gesetz über die Wahrnehmung von Urheberrechten und verwandten Schutzrechten durch Verwertungsgesellschaften — Verwertungsgesellschaftengesetz (Lei relativa à Gestão de Direitos de Autor e Direitos Conexos pelas Sociedades Gestoras), de 24 de maio de 2016 (16) (a seguir «VGG»), que transpôs o artigo 16.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2014/26, as sociedades de gestão coletiva têm a obrigação de conceder em condições razoáveis a qualquer pessoa que o solicite, uma licença de utilização dos direitos cuja gestão lhes tenha sido confiada.

 Factos do processo principal, tramitação processual e questão prejudicial

22.      A Verwertungsgesellschaft Bild‑Kunst (a seguir «VG Bild‑Kunst») é uma sociedade de gestão coletiva de direitos de autor no domínio das artes visuais na Alemanha. A Stiftung Preußischer Kulturbesitz (a seguir «SPK») é uma fundação de direito alemão.

23.      A SPK é a entidade que explora a Deutsche Digitale Bibliothek (a seguir «DDB»), uma biblioteca digital dedicada à cultura e ao saber, que coloca em rede instituições culturais e científicas alemãs.

24.      O sítio Internet da DDB contém hiperligações para conteúdos digitalizados armazenados nos portais Internet das instituições participantes. A própria DDB, enquanto «montra digital», só armazena miniaturas (thumbnails), a saber, versões de imagens cujo tamanho é reduzido em relação ao seu tamanho original. Quando o utilizador clica num dos resultados da busca, é reencaminhado para a página do objeto no sítio da DDB, que contém uma versão ampliada da imagem (440 x 330 pixéis). Ao clicar nessa imagem ou ao utilizar a função «lupa», uma versão ampliada da miniatura, com uma resolução máxima de 800 x 600 pixéis, é exibida numa lightbox. Além disso, o botão «exibir o objeto no sítio de origem» contém uma ligação direta para o sítio Internet da instituição que fornece o objeto (quer uma ligação simples para a sua página inicial, quer uma ligação profunda para a página do objeto). A DDB utiliza as obras com a autorização dos titulares dos direitos de autor sobre essas obras.

25.      A VG Bild‑Kunst subordina a celebração, com a SPK, de um contrato de licença de utilização do seu catálogo de obras sob a forma de miniaturas à inclusão de uma disposição segundo a qual o titular da licença se compromete a aplicar, quando da utilização das obras e dos objetos protegidos previstos no contrato, medidas eficazes de caráter tecnológico contra o framing, por terceiros, das miniaturas dessas obras ou desses objetos protegidos, visualizados no sítio Internet da DDB.

26.      Considerando que essa disposição contratual não era razoável do ponto de vista dos direitos de autor, a SPK intentou uma ação declarativa no Landgericht (Tribunal Regional, Alemanha) pedindo que fosse declarado que a VG Bild‑Kunst estava obrigada a conceder‑lhe a licença em questão sem que essa licença estivesse subordinada à aplicação dessas medidas de caráter tecnológico. Esta ação foi inicialmente julgada improcedente pelo Landgericht (Tribunal Regional). A sentença deste último foi anulada, em sede de recurso interposto pela SPK, pelo Kammergericht (Tribunal Regional Superior, Alemanha). No seu recurso de «Revision», a VG Bild‑Kunst pede que a ação da SPK seja julgada improcedente.

27.      O Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal Federal, Alemanha) precisa, por um lado, que, em conformidade com o § 34, n.o 1, primeiro período, da VGG, as sociedades de gestão coletiva têm a obrigação de conceder em condições razoáveis a qualquer pessoa que o solicite, uma licença de utilização dos direitos cuja gestão lhes foi confiada. O órgão jurisdicional de reenvio indica, por outro lado, que, segundo a sua jurisprudência aplicável ao caso em apreço, as sociedades de gestão coletiva podem, a título excecional, derrogar a sua obrigação e recusar conceder uma licença, desde que essa recusa não constitua um abuso de monopólio e sob reserva de se poder opor ao pedido de licença interesses legítimos superiores. A este respeito, para determinar a existência de uma exceção objetivamente justificada, há que ponderar os interesses das partes tendo em conta a finalidade da lei e o objetivo subjacente a esta obrigação de princípio das sociedades de gestão coletiva.

28.      O desfecho do recurso de «Revision» depende da questão de saber se a inserção mediante framing num sítio Internet de um terceiro de uma obra disponível, com o consentimento do titular dos direitos, num sítio Internet como o da DDB, constitui uma comunicação da obra ao público na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 quando neutraliza as medidas de proteção contra o framing adotadas pelo titular dos direitos ou impostas por este a um detentor de licença. Se assim fosse, os direitos dos membros da VG Bild‑Kunst seriam afetados e esta poderia validamente pedir a inclusão da obrigação de aplicar medidas de caráter tecnológico contra o framing no contrato de licença celebrado com a SPK.

29.      Tendo dúvidas quanto à resposta a dar a esta questão, à luz da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à prática das hiperligações na Internet, o Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«A inserção de uma obra, disponível [num sítio] Internet livremente acessível com o consentimento do titular do direito de autor, [no sítio] Internet de um terceiro pela técnica [denominada “transclusão”] [framing] constitui uma comunicação da obra ao público na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da [Diretiva 2001/29], quando é feita neutralizando as medidas de proteção contra o framing [adotadas ou impostas pelo] titular do direito?»

30.      O pedido de decisão prejudicial deu entrada no Tribunal de Justiça em 21 de maio de 2019. Apresentaram observações escritas as partes no processo principal, o Governo francês e a Comissão Europeia. As mesmas partes estiveram representadas na audiência que se realizou em 25 de maio de 2020.

 Análise

31.      Com a sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta ao Tribunal de Justiça se o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que a inserção, mediante framing, no sítio Internet de um terceiro, de uma obra que está disponível num sítio Internet livremente acessível com o consentimento do titular dos direitos de autor, constitui uma comunicação dessa obra ao público na aceção da referida disposição quando essa inserção é feita neutralizando as medidas de proteção contra o framing adotadas ou impostas pelo referido titular.

32.      Tanto o órgão jurisdicional de reenvio como as partes que apresentaram observações sugerem respostas a esta questão que decorrem, na sua opinião, da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa à apreciação das hiperligações do ponto de vista dos direitos de autor. No entanto, a sua análise desta jurisprudência leva‑os a resultados contraditórios. Com efeito, o órgão jurisdicional de reenvio, a VG Bild‑Kunst, o Governo francês e a Comissão propõem que se responda afirmativamente à questão prejudicial, ao passo que a SPK desenvolve argumentos sérios a favor de uma resposta negativa.

33.      Partilho da opinião segundo a qual a resposta à questão prejudicial pode ser parcialmente deduzida da jurisprudência do Tribunal de Justiça. Parece‑me, no entanto, que esta jurisprudência necessita de ser precisada na sequência de uma análise que tenha em conta a jurisprudência recente que não se refere diretamente às hiperligações.

 Jurisprudência relativa às hiperligações

34.      A colocação à disposição do público de obras protegidas pelos direitos de autor na Internet é abrangida pelo direito exclusivo da comunicação ao público previsto no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 (17). Este direito engloba «qualquer comunicação ao público das suas obras, por fio ou sem fio, incluindo a sua colocação à disposição do público por forma a torná‑las acessíveis a qualquer pessoa a partir do local e no momento por ela escolhido». Embora a comunicação «clássica» esteja igualmente presente, é a colocação à disposição do público que desempenha um papel importante na Internet (18).

35.      Por conseguinte, a questão que se coloca acerca das hiperligações é a de saber se o facto de incluir numa página Internet uma ligação para uma obra de outrem igualmente disponível na Internet (na Web, mais precisamente) constitui uma comunicação ao público na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29, ou seja, se a inclusão dessa ligação é abrangida pelo direito exclusivo do titular dos direitos de autor sobre essa obra.

36.      No Acórdão Svensson e o. (19), o Tribunal de Justiça respondeu a esta questão, em princípio, em sentido negativo. O Tribunal de Justiça constatou, em primeiro lugar, que uma hiperligação constituía efetivamente um ato de comunicação, uma vez que oferece aos utilizadores um acesso direto à obra (20). Esta comunicação dirige‑se a um público composto por um número indeterminado e bastante elevado de pessoas, ou seja, um público (21).

37.      Em segundo lugar, porém, o Tribunal de Justiça declarou que, no caso de uma obra já disponível em livre acesso num sítio Internet, o público visado pela hiperligação colocada noutro sítio Internet não constituía um público novo relativamente ao público da comunicação inicial. Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou que o público‑alvo da comunicação inicial era constituído por todos os potenciais visitantes de um sítio Internet em livre acesso, ou seja, todos os utilizadores da Internet. Assim, todos estes utilizadores deviam ser tomados em consideração pelo titular dos direitos de autor aquando da comunicação inicial (22). Logicamente, a hiperligação não poderia dar acesso à obra a um círculo mais amplo de utilizadores.

38.      Ora, no caso de uma comunicação secundária efetuada pelo mesmo meio técnico que a comunicação inicial (o que sucede em todas as comunicações na Web), a jurisprudência do Tribunal de Justiça exige a existência de um público novo para que essa comunicação secundária seja abrangida pelo direito exclusivo de comunicação ao público previsto no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 (23).

39.      Por conseguinte, o Tribunal de Justiça concluiu que o facto de se colocar num sítio Internet uma ligação sobre a qual se pode clicar (uma «hiperligação», nos termos do referido acórdão) para uma obra protegida pelo direito de autor que já se encontra livremente acessível na Internet não necessita de autorização do titular dos direitos de autor sobre essa obra (24). Só não seria assim na hipótese de a hiperligação permitir neutralizar as medidas restritivas do acesso à obra no sítio de origem, caso em que essa hiperligação tem por efeito ampliar o público da comunicação inicial e dar acesso à mesma a um público novo (25).

40.      Esta análise foi rapidamente confirmada no que respeita às hiperligações que utilizam o framing (26).

41.      Em seguida, o Tribunal de Justiça precisou que a análise acima descrita só se aplicava quando a comunicação inicial da obra tivesse sido feita com a autorização do titular dos direitos de autor (27).

42.      No que diz respeito às hiperligações para sítios Internet nos quais são colocadas obras à disposição do público sem autorização dos titulares dos direitos de autor, o Tribunal de Justiça considerou que constituíam uma comunicação ao público na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 se o utilizador que colocou a hiperligação sabia ou devia saber que a mesma dá acesso a uma obra colocada à disposição do público sem a autorização exigida pelo direito de autor (28). Quando esse utilizador age com um fim lucrativo, esse conhecimento de causa deve presumir‑se de forma ilidível (29).

43.      Resumindo, a jurisprudência relativa às hiperligações: quando a hiperligação dá acesso a uma obra já colocada à disposição do público com a autorização do titular dos direitos de autor e em livre acesso, essa ligação não é considerada uma comunicação ao público na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 porque, embora constituindo um ato de comunicação, a referida hiperligação dirige‑se a um público que já foi tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor no momento da colocação inicial à disposição, a saber, todos os utilizadores da Internet.

 Análise crítica da jurisprudência relativa às hiperligações

44.      As soluções jurisprudenciais que acabo de recordar nem sempre são evidentes à primeira vista e podem suscitar dúvidas, designadamente em relação a três pontos principais: a qualificação das hiperligações como «atos de comunicação» (de colocação à disposição), a introdução do critério subjetivo do conhecimento de causa na definição do conceito de «comunicação ao público» e a aplicação à Internet do critério do novo público (30).

 Qualificação das hiperligações como «atos de comunicação»

45.      Como recordei no n.o 36 das presentes conclusões, o Tribunal de Justiça considerou, no Acórdão Svensson e o. (31), que uma hiperligação para uma obra protegida acessível na Internet constituía um ato de comunicação desta obra para efeitos da aplicação do direito de comunicação ao público regido pelo artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29. Contudo, no plano técnico, esta afirmação está longe de ser evidente (32).

46.      É certo que não partilho a opinião manifestada a este respeito, segundo a qual cada ato de comunicação deve necessariamente envolver uma transmissão ou retransmissão da obra (33). Designadamente, a forma mais difundida de comunicação na Web, que consiste na colocação à disposição do público de obras por forma a torná‑las acessíveis a qualquer pessoa partir do local e no momento por ela escolhido, não pressupõe nenhuma transmissão. Em tal situação, a obra é colocada à disposição do público, ou seja, é armazenada no servidor que alberga o sítio Internet em questão, podendo o público aceder a esse sítio através do respetivo endereço URL. Uma forma de transmissão da obra só ocorre quando um membro do público acede ao referido servidor, uma vez que este acesso desencadeia uma reprodução temporária da página Internet consultada no seu computador cliente.

47.      Ora, o Tribunal de Justiça recordou que, para que haja ato de comunicação, basta que uma obra seja posta à disposição do público, sem que seja determinante que os membros do público acedem efetivamente à mesma (34). Por outras palavras, o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 entra em jogo a partir do momento em que a obra é colocada à disposição do público, ainda antes de haver lugar a uma transmissão efetiva da obra.

48.      Dito isto, no caso de uma hiperligação para uma obra já livremente acessível na Internet, a colocação à disposição do público efetua‑se no sítio Internet de origem. A ligação, por sua vez, mais não é do que uma instrução dada ao navegador Internet de aceder à referida obra através do endereço URL que faz parte da ligação. O utilizador é, portanto, reencaminhado para outro sítio Internet. A conexão (e, portanto, a transmissão da obra) é então feita diretamente entre o computador cliente do utilizador e o servidor (por vezes vários servidores) no qual se encontra alojado o sítio alvo da hiperligação, sem nenhuma intermediação do sítio que contém essa hiperligação (35). Além disso, o endereço URL para o qual essa hiperligação remete aparece habitualmente ao clicar com o botão do lado direito na hiperligação (right click). É então possível copiar essa hiperligação na janela do endereço do navegador para aceder ao mesmo local que o visado pela hiperligação. A ligação mais não faz do que automatizar este processo, ao permitir aceder a outro sítio Internet «com um clique».

49.      No entanto, o Tribunal de Justiça foi além desta análise puramente técnica ao considerar que uma hiperligação constitui um ato de comunicação na medida em que dá «um acesso direto» à obra contida noutro sítio Internet (36).

50.      Na minha opinião, esta abordagem funcional tem em conta outros elementos além da mera automatização do estabelecimento da conexão com o sítio Internet visado. O que é bem mais importante, e onde reside a força das hiperligações como eixo da arquitetura da Web, é que a hiperligação contém o endereço URL da página Internet visada, dispensando o utilizador de procurar esse endereço (ou então, a hiperligação é o resultado de uma pesquisa efetuada pelo utilizador, como é normalmente o caso nos motores de busca na Internet). Com efeito, um recurso pode estar disponível na Internet, mas só ser acessível com o auxílio do seu endereço URL. Sem o conhecimento deste endereço por parte dos utilizadores, a sua disponibilidade é puramente teórica. Ora, o meio mais eficaz de transmitir o endereço URL de uma página Internet é criar uma hiperligação para essa página. Não é por acaso que as «listas telefónicas» da Web que mais não são que os motores de busca, utilizam a técnica das hiperligações.

51.      Por conseguinte, é esta capacidade técnica de dar acesso direto a uma obra especificada pelo seu endereço URL (ou pelo endereço da página Internet que contém essa obra) que justifica, na minha opinião, a qualificação das hiperligações como «atos de comunicação» para efeitos da aplicação do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29.

 Elemento subjetivo na comunicação ao público

52.      Recorde‑se que a regra jurisprudencial estabelecida pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Svensson e o. (37), segundo a qual uma hiperligação para uma obra livremente acessível na Internet não constitui uma comunicação ao público na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29, só é aplicável quando a obra em questão tenha sido colocada à disposição do público com a autorização do titular dos direitos de autor.

53.      No caso contrário, isto é, quando a obra foi colocada à disposição sem a autorização do referido titular, a situação jurídica que decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça é muito mais complexa. Com efeito, o Tribunal de Justiça declarou que, nessa situação, a existência de uma comunicação ao público depende do facto de saber se o utilizador que colocou a hiperligação sabia ou devia saber que a obra visada por essa hiperligação foi colocada à disposição do público sem a autorização do titular dos direitos de autor. No caso das hiperligações fornecidas com fins lucrativos, deve presumir‑se o conhecimento de causa, sendo esta presunção ilidível (38).

54.      O Tribunal de Justiça fez esta distinção com o objetivo legítimo de manter um justo equilíbrio entre, por um lado, os interesses dos titulares dos direitos de autor e, por outro, a proteção dos interesses e dos direitos fundamentais dos utilizadores de objetos protegidos (39). Contudo, esta solução é pouco ortodoxa do ponto de vista das regras gerais do direito de autor, designadamente na medida em que introduz um critério subjetivo (o conhecimento de causa) na definição de um elemento objetivo, a saber, o alcance dos atos sujeitos ao direito exclusivo do autor (40).

 Critério do público novo

55.      Embora a aplicação do critério do público novo para efeitos da apreciação da existência de uma comunicação ao público de obras protegidas pelo direito de autor tenha sido considerada mesmo antes da entrada em vigor da Diretiva 2001/29 (41), foi apenas a partir da entrada em vigor desta diretiva que este critério foi retomado pelo Tribunal de Justiça, desde logo no contexto da retransmissão de emissões televisivas (42). De acordo com a formulação atual deste critério, uma comunicação secundária de uma obra protegida efetuada segundo a mesma técnica que a utilizada para a comunicação inicial deve visar um público novo, isto é, um público que não tenha sido tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor aquando da comunicação inicial, para poder ser qualificada de «comunicação ao público», na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29, e, assim, ser sujeita ao direito exclusivo do referido titular (43).

56.      Aplicado à Internet, este critério parte do postulado, que é uma espécie de ficção jurídica (44), de que uma obra, desde a sua colocação à disposição do público em livre acesso na Web, pode ser consultada por qualquer utilizador da Internet e que se deve considerar, por conseguinte, que o titular dos direitos de autor teve em consideração todos esses utilizadores como público aquando da colocação à disposição inicial (45). Se falo em ficção jurídica é porque esta afirmação, apesar de em teoria ser verdadeira, omite o facto de que o ciberespaço constituído pela Web é simplesmente demasiado vasto para que alguém possa ter conhecimento de, e ainda menos aceder a, todos os seus recursos.

57.      Ora, não só este postulado se baseia numa premissa artificialmente concebida e fictícia, como também, levado ao extremo, resulta no esgotamento do direito de comunicação ao público, expressamente excluído pelo artigo 3.o, n.o 3, da Diretiva 2001/29. Como demonstrarei em seguida, este postulado parece agora ser obsoleto na jurisprudência do Tribunal de Justiça.

 Nova interpretação da jurisprudência relativa às hiperligações

58.      Esta análise da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às hiperligações leva‑me, sem a pôr em causa, a propor uma interpretação evolutiva da mesma, na linha da jurisprudência mais recente do Tribunal de Justiça.

59.      Embora o Tribunal de Justiça opere no âmbito do aparelho terminológico clássico do direito de autor, ao definir os atos sujeitos ao direito exclusivo do autor e distinguindo‑os dos que não lhe estão sujeitos, não faz uma construção teórica do direito de autor. Chamado a interpretar o direito da União, no caso em apreço a Diretiva 2001/29, ainda que de forma abstrata, portanto aplicável erga omnes, mas com fundamento num litígio concreto que lhe é submetido por um órgão jurisdicional nacional, o Tribunal de Justiça deve dar uma resposta que permita a esse órgão jurisdicional determinar a responsabilidade de uma parte por violação de um direito de autor. Deve, portanto, estabelecer as condições dessa responsabilidade, o que vai muito além da simples definição dos contornos do ato abrangido pelo monopólio do autor. Uma abordagem mais restritiva poderia pôr em perigo o efeito útil da harmonização efetuada pela Diretiva 2001/29, deixando à apreciação forçosamente heterogénea dos órgãos jurisdicionais nacionais os elementos decisivos dessa responsabilidade (46).

60.      Deste modo, o Tribunal de Justiça pôde declarar que tanto a colocação à disposição e a gestão, na Internet, de uma plataforma de partilha de obras protegidas no âmbito de uma rede descentralizada (peertopeer) como a venda de um leitor multimédia no qual foram pré‑instaladas hiperligações que remetem para sítios Internet livremente acessíveis ao público, nos quais foram colocadas à disposição do público obras protegidas pelo direito de autor sem a autorização dos titulares desse direito, se enquadram no conceito de «comunicação ao público», na aceção do artigo 3.o, n.o 1, de la Diretiva 2001/29 (47), ainda que em ambos os casos a verdadeira colocação à disposição do público das obras tinha ocorrido numa fase anterior. O Tribunal de Justiça baseou‑se, ainda assim, no papel incontornável e no pleno conhecimento de causa do utilizador em questão quando faculta o acesso efetivo a essas obras (48).

61.      Esta abordagem pode igualmente conduzir à atenuação da responsabilidade. Num domínio do direito de autor diferente (mais precisamente, no domínio dos direitos conexos), o Tribunal de Justiça declarou que o direito de o produtor de fonogramas autorizar ou proibir a reprodução do seu fonograma, reconhecido no artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2001/29, não lhe permite opor‑se à utilização por um terceiro de uma amostra sonora do seu fonograma para efeitos da inclusão dessa amostra noutro fonograma, se essa amostra nela estiver incluída numa forma alterada e não reconhecível (49), embora, obviamente, qualquer utilização de uma amostra de um fonograma exija uma reprodução do mesmo.

62.      No que diz respeito às hiperligações, a abordagem do Tribunal de Justiça centrada na delimitação das condições da responsabilidade por violação dos direitos de autor explica, nomeadamente, a introdução do elemento subjetivo na análise do ato que pode ser a fonte dessa violação (50).

63.      Na minha opinião, o critério do público novo, que, como recordei, permitiu ao Tribunal de Justiça considerar que as hiperligações não exigiam, em princípio, a autorização do titular dos direitos de autor (51), deve ser entendido na mesma lógica.

64.      Recorde‑se que, segundo este critério, uma comunicação secundária de uma obra ao público, que utilize a mesma técnica e que se dirija ao mesmo público que foi tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor aquando da comunicação inicial, não requer uma nova autorização (52). Tal é o caso das hiperligações que, através da mesma técnica, a saber, a Web, se dirigem ao mesmo público que o da comunicação inicial, a saber, o conjunto dos utilizadores da Internet, se a referida comunicação tiver sido feita sem restrições de acesso.

65.      Ora, antes de mais, o próprio Tribunal de Justiça já observou que esta solução podia ser justificada não tanto pela inexistência de um ato de comunicação, uma vez que, em seu entender, essa comunicação existe, mas pelo facto de que, conhecendo a arquitetura da Internet (ou, mais precisamente, da Web), se considera que, ao autorizar a colocação à disposição do público sem restrições da obra, o titular dos direitos de autor autorizou igualmente a disponibilização de hiperligações para essa obra. Com efeito, o Tribunal de Justiça declarou que, embora todos os atos sujeitos a um direito exclusivo do autor devam ter o seu consentimento prévio, a Diretiva 2001/29 não exige que esse consentimento seja necessariamente dado de forma expressa (53).

66.      Seguidamente, o Tribunal de Justiça constatou, fazendo referência expressa ao Acórdão Svensson e o. (54), que, «num processo em que era interrogado a propósito do conceito de “público novo”, o Tribunal considerou que, numa situação em que um autor tinha autorizado, de maneira prévia, explícita e desprovida de reservas, a publicação dos seus artigos no sítio Internet de um editor de imprensa, sem recorrer a medidas técnicas de limitação do acesso a essas obras a partir de outros sítios Internet, se podia concluir que, em substância, esse autor tinha autorizado a comunicação das referidas obras a todos os internautas» (55).

67.      Há ainda que analisar se esse consentimento implícito do titular dos direitos de autor pode efetivamente dizer respeito a «todos os internautas». Parece‑me que não.

68.      Com efeito, as limitações deste postulado foram salientadas no processo que deu origem ao Acórdão Renckhoff (56). Nesse processo, não se tratava de uma hiperligação para uma obra protegida, mas de uma obra que tinha sido descarregada a partir de um sítio Internet no qual tinha sido colocada à disposição do público com a autorização do autor e colocada em linha noutro sítio Internet sem a sua autorização.

69.      Ora, se o critério do público novo devesse ser aplicado à letra (57), o referido ato não estaria abrangido pelo direito exclusivo do titular dos direitos de autor, uma vez que, enquanto a obra em questão estivesse acessível com a autorização do referido titular no primeiro sítio Internet (ou em qualquer outro sítio, não necessariamente o sítio a partir do qual a obra foi copiada), a colocação à disposição no segundo sítio Internet não visava um público novo, uma vez que qualquer utilizador da Internet foi tido em conta no momento da primeira colocação à disposição. Assim, o titular dos direitos de autor perderia o controlo sobre a difusão da sua obra, o que, como o Tribunal de Justiça reconheceu no seu acórdão, teria por resultado o esgotamento do seu direito exclusivo (58).

70.      Por conseguinte, o Tribunal de Justiça considerou que havia que limitar o alcance do critério do público novo, alterando a definição de público que supostamente foi tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor no momento da colocação à disposição inicial da obra. Consequentemente, o Tribunal de Justiça declarou que esse público era constituído apenas pelos utilizadores do sítio Internet no qual essa colocação à disposição inicial ocorreu «e não por utilizadores da página Internet em que a obra foi depois publicada sem a autorização do referido titular, ou por outros utilizadores» (59).

71.      Assim, na sequência do Acórdão Renckhoff (60), a ficção jurídica segundo a qual qualquer colocação à disposição do público de uma obra protegida na Internet em livre acesso visa todos os utilizadores (efetivos e potenciais) da Internet, também já não é sustentável no contexto das hiperligações. Não só dá lugar a um esgotamento de facto do direito de comunicação ao público na Internet como é logicamente inconciliável com esse acórdão.

72.      Com efeito, imaginemos as implicações do Acórdão Svensson e o. (61) numa situação como a do processo que deu origem ao Acórdão Renckhoff. Segundo este último acórdão, o facto de ter descarregado a obra protegida a partir de um sítio Internet no qual tinha sido colocada à disposição do público com a autorização do titular dos direitos de autor e de a colocar noutro sítio Internet viola os direitos do referido titular. No entanto, o facto de colocar no segundo sítio da Internet uma hiperligação para a mesma obra disponível no primeiro sítio, mesmo utilizando o framing, de modo que a obra aparece como se tivesse sido colocada no segundo sítio, não estaria sujeito ao monopólio do autor e, portanto, não violaria esse monopólio (62). Ora, o público da colocação à disposição inicial seria, em ambos os casos, o mesmo: todos os utilizadores da Internet!

73.      Por conseguinte, há que considerar, como o Tribunal de Justiça fez no Acórdão Renckhoff (63), que o público que foi tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor quando da colocação à disposição de uma obra num sítio Internet é constituído pelo público que consulta o referido sítio. Esta definição de público tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor reflete bem, na minha opinião, a realidade da Internet. Com efeito, embora um sítio Internet livremente acessível possa, em teoria, ser visitado por qualquer utilizador da Internet, na prática, o número de utilizadores potenciais que podem aceder ao mesmo é, sem dúvida, maior ou menor, mas determina‑se aproximadamente. O titular dos direitos de autor tem em conta a extensão deste círculo de utilizadores potenciais ao autorizar a colocação à disposição da sua obra. Isto é importante, designadamente, quando esta colocação à disposição se efetua ao abrigo de uma licença, uma vez que o número potencial de visitantes estimado pode constituir um fator importante na determinação do preço da licença.

74.      Ora, é possível aceder ao referido sítio Internet, como acontece na maioria dos casos de acesso, através de uma hiperligação. O público do sítio que contém a hiperligação torna‑se, assim, o público do sítio alvo da ligação, ou seja, o público visado pelo referido titular dos direitos de autor.

75.      Em resumo, a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às hiperligações, ou, mais em geral, à comunicação das obras ao público na Internet, deve ser entendida, na minha opinião, no sentido de que, ao autorizar a colocação à disposição do público da sua obra numa página Internet em livre acesso, o titular dos direitos de autor tem em consideração todo o público suscetível de aceder a essa página Internet, incluindo através das hiperligações. Por conseguinte, estas hiperligações, embora constituam atos de comunicação, uma vez que dão acesso direto à obra, estão, em princípio, abrangidas pela autorização que o titular dos direitos de autor deu no momento da colocação à disposição inicial e não exigem uma autorização adicional.

 Aplicação nos casos de inserção das obras em páginas Internet a partir de outros sítios Internet

 Alcance da questão prejudicial

76.      Recorde‑se que, com a sua questão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se a inserção mediante framing num sítio Internet de uma obra protegida colocada à disposição do público, com a autorização do titular dos direitos de autor, em livre acesso noutro sítio Internet constitui uma comunicação ao público na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29, quando é feita neutralizando as medidas de proteção contra o framing adotadas ou impostas pelo referido titular no segundo sítio Internet.

77.      Antes de mais, importa clarificar certos aspetos terminológicos. A terminologia relativa à Internet não está estabelecida com uma clareza cartesiana e os termos framing, inline linking e embedding são por vezes utilizados como sinónimos. Aliás, o Tribunal de Justiça adotou na sua jurisprudência o termo francês «transclusion» («transclusão») que parece poder designar todas essas técnicas. Embora o órgão jurisdicional de reenvio se refira, na sua questão, ao framing, pode‑se, na minha opinião, presumir razoavelmente que o problema no litígio no processo principal diz respeito, ou pode dizer respeito, a todas as formas de inserir numa página Internet um recurso proveniente de outro sítio Internet.

78.      Ora, as técnicas que permitem obter esse resultado não se limitam ao framing, que consiste em dividir o ecrã em várias partes, podendo cada uma delas mostrar o conteúdo de outro sítio Internet. Mais especificamente, o inline linking permite inserir um elemento, habitualmente um ficheiro gráfico ou audiovisual, numa página Internet a partir de outro sítio Internet (64). O elemento inserido aparece então automaticamente no ecrã, sem que o utilizador tenha necessidade de clicar na hiperligação. Este automatismo parece‑me muito mais importante do ponto de vista do direito de autor do que a utilização ou não do framing. A seguir desenvolverei esta ideia mais detalhadamente.

79.      Existem medidas de caráter tecnológico de proteção contra estes tipos de hiperligações. Estas medidas consistem, designadamente, na introdução, no código HTML da página Internet protegida, de instruções que impedem a hiperligação de funcionar, que impedem a abertura da página num quadro (frame) exigindo uma nova janela ou separador ou ainda que, em vez do elemento desejado, enviam uma outra imagem como, por exemplo, uma advertência sobre os direitos de autor.

80.      Por conseguinte, a questão prejudicial deve ser entendida no sentido de que tem por objeto a questão de saber se o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que a inserção de uma obra colocada à disposição do público, com o consentimento do titular dos direitos de autor, em livre acesso num sítio Internet, noutro sítio Internet com o auxílio de hiperligações, de modo que a obra apareça no segundo sítio Internet como se fizesse parte integrante desse segundo sítio, constitui uma comunicação ao público na aceção desta disposição, quando essa inserção é feita neutralizando as medidas de proteção contra essa utilização da obra.

 Hiperligações

81.      Como recordei, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o facto de colocar uma hiperligação para uma obra protegida pelo direito de autor colocada à disposição do público em livre acesso noutro sítio Internet com o consentimento do titular dos direitos de autor constitui um ato de comunicação dessa obra na aceção do artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29.

82.      Por esta razão, não partilho da análise da SPK segundo a qual decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que as hiperligações para obras protegidas, incluindo as que utilizam o framing ou técnicas semelhantes, estão fora do âmbito dos direitos exclusivos dos titulares dos direitos de autor, pelo que nunca há comunicação ao público, não obstante a eventual aplicação por esses titulares de medidas de proteção contra a utilização dessas hiperligações.

83.      Com efeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a colocação da hiperligação é efetivamente um ato pertinente do ponto de vista do direito de autor, na medida em que dá um acesso direto à obra. Todavia, este ato não dá lugar a uma autorização suplementar pelo titular dos direitos de autor, uma vez que, ao visar o público que já foi tido em conta por este no momento da colocação à disposição inicial, está abrangido pela autorização que foi dada pelo referido titular no momento dessa comunicação inicial.

84.      No que diz respeito à definição do público que foi tomado em consideração pelo referido titular, proponho que se considere, à luz de toda a jurisprudência pertinente do Tribunal de Justiça, que este é composto pelo público, incluindo o público potencial, do sítio Internet no qual ocorreu a colocação à disposição inicial (65).

85.      Esse público pode aceder ao referido sítio de diferentes maneiras, designadamente através de hiperligações. Esta conclusão não coloca problemas no caso das ligações simples, que reencaminham para a página inicial do sítio Internet. O mesmo acontece, na minha opinião, no caso de ligações profundas para páginas concretas de um sítio Internet. De facto, ninguém pode esperar que a sua obra seja sempre lida ou vista começando pela página de rosto ou genérico de abertura. Além disso, não é tanto o problema do acesso a obras propriamente dito, mas das circunstâncias que envolvem esse acesso, como a omissão da publicidade eventualmente associada à obra e que confere rendimentos ao titular dos direitos de autor. Isto não deve, no entanto, determinar o âmbito dos direitos exclusivos do referido titular.

86.      A utilização do framing e, mais particularmente, do inline frame suscita questões mais delicadas. Com efeito, nesse caso, é difícil determinar se se deve considerar que o público que acede desta maneira a um sítio Internet a partir de outro sítio Internet foi tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor no momento da colocação à disposição inicial da obra no primeiro sítio Internet.

87.      Na minha opinião, é bastante claro que a resposta deve ser positiva quando o objeto do framing consiste num sítio Internet no seu todo ou numa página inteira desse sítio. É verdade que essa utilização de um sítio Internet de outrem pode constituir um abuso e provocar determinados problemas do ponto de vista dos direitos morais do autor, do direito das marcas ou ainda da concorrência leal. No entanto, do ponto de vista do acesso à obra e, portanto, do direito de comunicação ao público, esta situação não é diametralmente oposta à das ligações clássicas. Os utilizadores acedem efetivamente ao sítio Internet alvo da hiperligação e, embora esta seja exibida no interior da página que contém a hiperligação, constituem o público desse sítio, ou seja, o público que foi tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor no momento da colocação à disposição da obra no referido sítio Internet.

88.      O caso das hiperligações que remetem para elementos específicos de uma página Internet (por exemplo, imagens ou ficheiros audiovisuais) é mais problemático, nomeadamente quando o elemento surge como parte integrante de outro sítio através do framing ou do inline frame. No entanto, também nesta situação, ao clicar na hiperligação, o utilizador estabelece uma conexão com o sítio de origem do elemento ligado provocando assim uma transmissão desse elemento. Por conseguinte, deve considerar‑se que esse utilizador faz parte do público desse sítio, ou seja, do público que foi tido em consideração pelo titular dos direitos de autor quando autorizou a colocação à disposição da sua obra no referido sítio.

89.      Além disso, a necessidade de ativar uma hiperligação assinala ao utilizador que está a aceder a um conteúdo que não faz parte integrante da página Internet que contém essa ligação. Embora a autoria desse conteúdo possa ser dissimulada em maior ou menor medida, o utilizador razoavelmente informado sobre as modalidades de funcionamento da Internet deve esperar que o conteúdo da hiperligação possa ter origem numa fonte diferente da página Internet que está a consultar. O titular dos direitos de autor pode então invocar os direitos morais, ou mesmo, se for caso disso, direitos de outros domínios da propriedade intelectual, como o direito das marcas, para lutar contra eventuais abusos (66).

90.      Parece‑me, aliás, difícil traçar aqui uma linha divisória nítida, uma vez que as situações podem ser muito variadas: framing dos sítios ou das páginas Internet cujo único conteúdo significativo é constituído por obras protegidas ou que constituem, eles mesmos, tais obras, ligações profundas para objetos protegidos que abrem numa janela separada do navegador com ou sem indicação do endereço do sítio de origem, ligações simples para sítios cuja página principal ou o próprio sítio constituem obras protegidas, etc. A análise destas diferentes situações requer apreciações factuais casuísticas, com resultados aleatórios. Ora, o círculo de pessoas que podem aceder à sua obra que o titular dos direitos de autor é suposto ter tomado em consideração no momento da sua colocação à disposição não pode depender de tais apreciações factuais (67).

91.      Por conseguinte, sou da opinião de que, no caso de obras protegidas por direitos de autor colocadas à disposição do público em livre acesso na Internet com a autorização do titular dos direitos de autor, se deve considerar que o público que acede a tais obras através de hiperligações utilizando o framing, incluindo o inline frame, faz parte do público que foi tido em consideração por esse titular aquando da colocação à disposição inicial das suas obras (68). Evidentemente, esta apreciação não se aplica nos casos em que as hiperligações são feitas neutralizando as medidas de restrição de acesso ou em que as hiperligações dão acesso a obras colocadas à disposição do público sem a autorização do titular dos direitos de autor — nestes casos, aplicam‑se as soluções apresentadas, respetivamente, nos Acórdãos Svensson e o. (69) e GS Media (70).

 Inserção (embedding)

92.      Vou agora analisar a situação em que obras protegidas pelo direito de autor contidas noutros sítios Internet são inseridas numa página da Internet de tal forma que nela são visualizadas automaticamente ao abrir essa página, sem nenhuma ação adicional por parte do utilizador (inline links). Qualificarei esta técnica de «ligações automáticas». A situação destas ligações automáticas é, na minha opinião, diferente, em vários aspetos, da das hiperligações, incluindo as que utilizam o framing (71).

–       Ligações automáticas como comunicação ao público

93.      Uma ligação automática mostra o recurso como um elemento que faz parte integrante da página Internet que contém essa ligação. Para o utilizador, não há, portanto, nenhuma diferença entre uma imagem inserida numa página Internet a partir do mesmo servidor e uma imagem inserida a partir de outro sítio Internet. Se, no processo que deu origem ao Acórdão Renckhoff (72), o proprietário do sítio no qual tinha ocorrido a comunicação secundária tivesse colocado uma ligação automática para a imagem em causa, em vez de a ter reproduzido e colocado em linha a partir do seu próprio servidor, o resultado para o público teria sido idêntico. É só «nos bastidores» que o modus operandi difere.

94.      Por conseguinte, as ligações automáticas permitem explorar sem autorização uma obra de outrem na Internet de um modo que equivale, na prática, a uma reprodução e a uma colocação à disposição do público autónoma. Ao mesmo tempo, a cobertura da utilização da tecnologia da hiperligação dá a essa prática uma aparência de legalidade, sendo a obra colocada em linha, tecnicamente falando, a partir do único servidor que alberga o sítio de origem (73).

95.      No entanto, no caso de uma ligação automática, o público que desfruta da obra não pode, em caso algum, ser considerado o público do sítio de origem dessa obra. Com efeito, para o público, já não há nenhuma relação com o sítio de origem, tudo se passa no sítio que contém a ligação. Por conseguinte, é o público deste último sítio que beneficia da obra. Na minha opinião, não se pode presumir que o titular dos direitos de autor tenha tomado em consideração esse público ao dar a sua autorização para a colocação à disposição inicial, salvo se voltarmos à construção do público constituído por todos os utilizadores da Internet (74), o que é contrário ao Acórdão Renckhoff (75). Ora, na medida em que o efeito de uma ligação automática é o mesmo que o de uma reprodução colocada à disposição do público de forma autónoma, não vejo motivos para os tratar de forma diferente. Tal diferença de tratamento privaria de efeito útil tanto a jurisprudência estabelecida no Acórdão Renckhoff como o direito exclusivo do autor, de natureza preventiva, se fosse possível, em vez de reproduzir uma obra e colocá‑la em linha, incorpora‑la simplesmente no seu próprio sítio Internet com o auxílio de uma ligação automática (76).

96.      Isto é tanto mais assim porque a situação de uma ligação automática difere da de uma hiperligação também do ponto de vista da conceção do direito de comunicação ao público conforme regulado pelo artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29.

97.      Recorde‑se que esse direito exclusivo engloba os atos de colocação da obra à disposição do público, de modo que qualquer pessoa a possa aceder quando e onde quiser. É o modo habitual de comunicação ao público na Web. A obra é então colocada à disposição num sítio Internet, de modo que os utilizadores desencadeiam a transmissão da mesma quando acedem a esse sítio. No caso das hiperligações, é o facto de ativar a ligação e, portanto, a ação do utilizador que desencadeia essa transmissão.

98.      No caso de uma ligação automática, a transmissão, a partir do sítio de origem da obra, é desencadeada pelo automatismo inscrito no código HTML do sítio que contém a hiperligação. Este sítio está, portanto, na origem da comunicação. Assim, o seu proprietário desempenha um papel decisivo na comunicação da obra objeto da hiperligação a um público que não foi tido em consideração pelo titular dos direitos de autor aquando da colocação à disposição inicial, a saber, o público do seu próprio sítio Internet (77). Deste modo, realiza um ato de comunicação complementar (ato de transmissão), independente tanto da colocação à disposição da obra ao público, que ocorre no sítio Internet original, como do ato de dar acesso direto à obra que constitui o facto de colocar uma hiperligação. Este ato suplementar requer uma autorização do titular dos direitos de autor da obra em questão.

99.      É verdade que, no caso da ligação automática, diferentemente da situação existente no processo que deu origem ao Acórdão Renckhoff, o titular dos direitos de autor mantém, em princípio, o controlo derradeiro sobre a comunicação da obra, uma vez que pode retirar essa obra do sítio de origem, tornando assim obsoleta qualquer hiperligação que remeta para o mesmo (78).

100. No entanto, em primeiro lugar, como sublinha com razão o Governo francês, colocar o titular dos direitos de autor perante a alternativa forçada de tolerar a utilização não autorizada da obra por outrem ou renunciar à sua utilização por si próprio iria contra toda a ideia do direito de autor. Com efeito, o objetivo do direito de autor é permitir ao titular escolher livremente a forma de explorar a obra e daí retirar rendimentos, sem que essa exploração possa traduzir‑se numa utilização subsequente não autorizada da obra em questão.

101. Em segundo lugar, o titular dos direitos de autor nem sempre está em condições de retirar a obra de um sítio Internet, uma vez que a sua utilização pode ser objeto de um contrato de licença (79). Por conseguinte, este titular será obrigado a revogar o seu consentimento para a exploração da obra, com todas as consequências jurídicas e financeiras daí decorrentes.

102. Por último, em terceiro lugar, a perda de controlo do titular dos direitos de autor sobre a sua obra não é de modo algum uma condição da existência de um ato abrangido pelo monopólio do titular e, portanto, de uma violação desse monopólio quando esse ato é realizado sem a sua autorização. Designadamente, no caso da comunicação ao público, a comunicação secundária pode constituir um ato desta natureza e, ao mesmo tempo, depender da comunicação inicial efetuada pelo titular dos direitos de autor ou com a sua autorização (80).

103. Por conseguinte, este controlo teórico exercido pelo titular dos direitos de autor sobre a colocação inicial da obra à disposição não pode, na minha opinião, determinar a apreciação, do ponto de vista do direito de autor, da utilização subsequente desta obra sob a forma de uma ligação automática.

104. O mesmo se diga do facto de ser relativamente fácil tornar obsoleta uma ligação automática, alterando o endereço URL da obra em questão ao alterar, por exemplo, o nome do ficheiro que contém essa obra. Por um lado, o titular dos direitos de autor nem sempre tem o controlo da colocação inicial da obra à disposição, designadamente quando esta é efetuada no sítio Internet de um detentor de licença. Por conseguinte, nem sempre é livre de alterar o endereço da obra, tal como não o pode retirar do sítio Internet. Por outro lado, esta medida só é possível depois de detetada a utilização da obra sob a forma de uma ligação automática, ao passo que os direitos exclusivos do autor têm caráter preventivo, como sublinha o Tribunal de Justiça na sua jurisprudência (81).

105. Por estas razões, em minha opinião, há que fazer uma distinção entre as hiperligações, a que se refere a jurisprudência do Tribunal de Justiça, e as ligações automáticas, que fazem aparecer automaticamente o recurso para o qual remete a ligação na página Internet que contém essa ligação, sem que o utilizador tenha necessidade de empreender alguma ação. Com efeito, quando essas ligações automáticas visam obras protegidas pelo direito de autor, existe, tanto do ponto de vista técnico como funcional, um ato de comunicação da obra dirigida a um público que não foi tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor aquando da sua colocação à disposição inicial, a saber, o público de um sítio Internet diferente daquele em que ocorreu a colocação à disposição inicial.

–       A situação dos titulares dos direitos de autor

106. Tal interpretação daria aos titulares dos direitos de autor instrumentos jurídicos de proteção contra a exploração não autorizada das suas obras na Internet. Assim, isto reforçaria a sua posição negocial para a concessão de licenças de utilização dessas obras. Com efeito, quem aceitaria pagar um preço adequado pela utilização de uma obra na Internet, se fosse possível e perfeitamente legal colocar gratuitamente uma ligação automática para o sítio Internet do autor ou para qualquer outro sítio no qual a obra em questão seja colocada à disposição do público?

107. Esta solução permite igualmente a flexibilidade necessária nos casos em que os titulares dos direitos de autor desejem autorizar ligações automáticas para as suas obras. Com efeito, alguns autores publicam as suas obras na Internet com vista a uma distribuição possível o mais ampla possível das mesmas, sem querer daí obter diretamente rendimentos. Esses autores poderiam então acompanhar a colocação à disposição das suas obras na Internet de uma licença que especifique os modos de utilização autorizados (por exemplo, utilização comercial ou não) e as condições dessa utilização (por exemplo, a indicação do nome do autor), à semelhança do sistema das licenças «Creative Commons» (82). As plataformas de partilha de conteúdos na Internet já regulam esta questão nas suas políticas relativas à reutilização do conteúdo descarregado pelos utilizadores, conferindo a estes últimos maior ou menor liberdade a esse respeito (83). Embora por vezes surja polémica sobre a questão de saber se estas licenças cobrem as ligações automáticas ou o framing, a sua origem reside na incerteza subjacente ao estatuto destas técnicas do ponto de vista dos direitos de autor. Uma vez eliminada essa incerteza, as plataformas estarão em condições de adaptar as suas condições de utilização em consequência (84).

108. Além disso, certas ligações automáticas para obras colocadas à disposição do público na Internet poderiam, sem dúvida, ser abrangidas por uma das exceções ao direito de comunicação ao público previstas artigo 5.o, n.o 3, da Diretiva 2001/29. Penso, designadamente, nas exceções para a citação, a caricatura, a paródia e o pastiche [respetivamente, artigo 5.o, n.o 3, alíneas d) e k), da Diretiva 2001/29], suscetíveis de cobrir uma boa parte das práticas correntes na Internet. Essas utilizações devem, evidentemente, preencher as condições de aplicação das referidas exceções.

–       Despacho BestWater International

109. Por último, pode parecer que a interpretação acima proposta não é inteiramente conforme com a solução adotada no Despacho BestWater International (85). Contudo, devo formular as seguintes ressalvas quanto a esse despacho.

110. O referido despacho baseia‑se na afirmação, contida no acórdão Svensson e o., segundo a qual a conclusão de que uma hiperligação não constitui uma comunicação da obra a um público novo «não pode ser posta em causa se o órgão jurisdicional de reenvio concluir […] que, quando os internautas clicam na hiperligação em causa, a obra aparece dando a impressão de que está apresentada a partir do sítio Internet onde essa ligação se encontra, quando, na realidade, provém de outro sítio Internet» (86). No Despacho BestWater International, esta situação foi equiparada «em substância» à de um inline link (87).

111. No entanto, como já expus nos n.os 93 a 105 das presentes conclusões, existe uma diferença substancial entre a incorporação de um recurso por meio de uma técnica do tipo inline linking e as hiperligações, mesmo quando utilizam o framing. Ora, o Acórdão Svensson e o. (88) só se refere às hiperligações. Por conseguinte, este acórdão não podia validamente servir de fundamento a um despacho relativo ao inline linking. Aliás, o litígio no processo principal nesse processo dizia respeito a uma hiperligação. O dispositivo do Despacho BestWater International não menciona o inline linking, mas apenas o framing (89).

112. Além disso, tanto o órgão jurisdicional de reenvio, na formulação da questão no processo que deu origem ao Despacho BestWater International (90), como, em seguida, este despacho, não tiveram em conta certas circunstâncias de facto que, se o tivessem sido, deveriam ter conduzido à adoção de uma solução diferente nesse processo. Em primeiro lugar, esse processo dizia respeito à incorporação num sítio Internet de uma obra audiovisual colocada em linha na plataforma YouTube. Ora, como referi (91), as condições de utilização desta plataforma contêm uma licença expressa para a utilização por terceiros dos conteúdos colocados em linha nessa plataforma. Tanto quanto é do meu conhecimento, era o caso já na época dos factos no litígio principal no processo em questão. Em segundo lugar, a obra em causa tinha sido colocada à disposição do público na referida plataforma sem a autorização do titular dos direitos de autor (92). Por conseguinte, é possível que o processo devesse ter sido julgado de acordo com os princípios identificados posteriormente pelo Tribunal de Justiça no seu Acórdão GS Media (93).

113. Por conseguinte, considero que o Despacho BestWater International (94) não deve ser considerado um precedente vinculativo no que diz respeito à apreciação das ligações automáticas à luz do direito de comunicação ao público conforme previsto no artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29.

–       Equilíbrio entre os diferentes interesses em jogo

114. A diferença de tratamento que proponho aplicar, por um lado, às hiperligações que utilizam o framing e, por outro, às ligações automáticas tal como as defini supra pode não parecer manifestamente justificada. Com efeito, depois de o utilizador clicar na hiperligação, o resultado destas duas técnicas é, do seu ponto de vista, semelhante: o objeto da hiperligação apresenta‑se como parte integrante da página Internet que contém a hiperligação. Poder‑se‑ia então legitimamente perguntar se as hiperligações que utilizam o framing não deveriam, à semelhança das ligações automáticas, ser consideradas atos de comunicação ao público quando dão acesso a obras protegidas pelo direito de autor.

115. No entanto, além das diferenças técnicas e funcionais entre estes dois tipos de ligações descritos nos n.os 93 a 98 das presentes conclusões, quer‑me parecer que esta distinção permite realizar melhor um dos objetivos da Diretiva 2001/29, designadamente o de assegurar um justo equilíbrio entre os interesses dos titulares dos direitos de autor e os dos utilizadores (95). Com efeito, será frequentemente difícil para o utilizador saber com certeza se o objeto para o qual criou uma hiperligação na sua página Internet constitui uma obra protegida pelo direito de autor. Mesmo uma ligação simples não está livre de qualquer risco, uma vez que a página inicial de um sítio Internet ou este sítio inteiro pode constituir uma obra desse tipo. Esta dificuldade teria por efeito desencorajar os utilizadores da Internet, numa medida do meu ponto de vista desproporcionada relativamente aos interesses legítimos dos titulares dos direitos de autor, de recorrerem ao framing, apesar de difundido na Internet e bem útil ao seu funcionamento e à atratividade de numerosos sítios Internet.

116. Em contrapartida, há que salientar, por um lado, que a distinção entre hiperligações e ligações automáticas é facilmente percetível para qualquer utilizador da Internet e não deve criar qualquer incerteza. Aliás, é raro que as ligações automáticas sejam utilizadas para inserir páginas ou mesmo sítios Internet inteiros. Esta técnica serve normalmente para inserir ficheiros gráficos e audiovisuais.

117. Por outro lado, embora o Tribunal de Justiça tenha sublinhado que as hiperligações contribuem para o bom funcionamento da Internet ao permitir a difusão de informações nesta rede (96), o mesmo é certamente verdade para as hiperligações clicáveis (97). No entanto, não penso que o mesmo argumento possa ser invocado relativamente às ligações automáticas. Pelo contrário, estas ligações «aspiram» o conteúdo presente na Web, dispensando os utilizadores de «surfar» entre os diferentes sítios Internet. Contribuem, assim, para a monopolização da Web e para a concentração da informação num número restrito de serviços que dominam o mercado e que pertencem a um número ainda mais restrito de sociedades.

118. Parece‑me, portanto, que o equilíbrio entre os diferentes interesses em jogo justifica uma diferença de tratamento entre as hiperligações, incluindo as que utilizam o framing, e as ligações automáticas. Com efeito, embora se possa presumir que os titulares dos direitos de autor tiveram em conta as primeiras ao autorizar a colocação à disposição na Internet das suas obras, não se lhes pode exigir que tolerem as segundas.

119. Assim, proponho que se declare que o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que constitui uma comunicação ao público na aceção desta disposição o facto de inserir numa página Internet obras protegidas pelo direito de autor colocadas à disposição do público em livre acesso com a autorização do titular dos direitos de autor noutros sítios Internet de tal modo que essas obras aparecem automaticamente ao abrir essa página, sem nenhuma ação adicional do utilizador.

120. Esta consideração aplica‑se independentemente do facto de a obra ser eventualmente inserida sob a forma de miniatura (thumbnail) ou de, como no processo principal, a fonte da inserção ser uma miniatura da obra original. Com efeito, a modificação do tamanho não tem qualquer relevância na apreciação da existência de um ato de comunicação ao público, desde que os elementos originais da obra sejam percetíveis (98). Além disso, o tamanho de uma imagem numa página Internet é relativo, uma vez que depende da resolução da imagem e do tamanho do ecrã no qual é visualizada. O tamanho da visualização é adaptado não só ao design da página Internet mas também, habitualmente, ao tamanho do ecrã do aparelho em que se abre essa página. Em contrapartida, as imagens raramente são visualizadas na sua dimensão real, uma vez que esta ultrapassa frequentemente, no que toca aos ficheiros modernos, a dimensão de um ecrã standard de um computador. Por conseguinte, é difícil determinar o que constitui uma miniatura, uma vinheta ou o tamanho «normal» da imagem.

 Medidas de proteção

121. A interpretação que proponho que seja dada a respeito das ligações automáticas não responde, porém, completamente à questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio. Com efeito, o facto de considerar as ligações automáticas como atos de comunicação ao público não resolve o problema, suscitado na questão prejudicial, de saber se a utilização do framing no caso das hiperligações também não deve ser considerada uma comunicação ao público quando essas hiperligações são feitas neutralizando as medidas de caráter tecnológico de proteção contra o framing.

122. Segundo a VG Bild‑Kunst, o Governo francês e a Comissão, há que responder afirmativamente a esta questão. Esta é igualmente a posição do órgão jurisdicional de reenvio.

123. Devo confessar que, à primeira vista, esta solução pareceu surpreendente. Tem certamente o mérito de ser clara. Como observa o Governo francês, a utilização de medidas de caráter tecnológico de proteção indica claramente a vontade do titular dos direitos de autor de não permitir o acesso do público à sua obra através de hiperligações que utilizam o framing. Esta manifestação de vontade delimitaria certamente o círculo de pessoas tido em conta pelo referido titular no momento da colocação à disposição inicial da obra.

124. Penso, no entanto, que tal interpretação colide com vários argumentos importantes.

125. Em primeiro lugar, em muitas situações de colocação de obras protegidas à disposição do público na Internet (ou, mais precisamente, na Web), o titular dos direitos de autor não está em condições de decidir sobre a utilização das medidas de caráter tecnológico de proteção. É este o caso, designadamente, das obras colocadas em linha sob licença, ou seja, não pelo próprio titular dos direitos de autor, mas por um terceiro com a sua autorização (99). É igualmente o caso das obras colocadas em linha em diferentes plataformas de partilha, cujos utilizadores não controlam nem a política de proteção de conteúdos nem a utilização das medidas de caráter tecnológico para efeitos dessa proteção. Por último, o presente processo demonstra que as organizações de gestão coletiva dos direitos de autor podem exigir a utilização de tais medidas de proteção, sem estarem expressamente mandatadas pelos seus membros.

126. Em todas estas situações, não vejo como seria possível considerar que a utilização, ou não, de medidas de caráter tecnológico de proteção reflete uma qualquer vontade do titular dos direitos de autor no que respeita ao acesso à sua obra através das hiperligações que utilizam o framing.

127. Em segundo lugar, a solução proposta basear‑se‑ia numa analogia com a solução estabelecida pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Svensson e o., segundo a qual «na hipótese de uma hiperligação permitir aos utilizadores do sítio Internet em que se encontra essa ligação contornarem as medidas restritivas que foram tomadas pelo sítio Internet onde se encontra a obra protegida para restringir o acesso do público aos seus assinantes, constituindo, assim, uma intervenção sem a qual os referidos utilizadores não poderiam beneficiar das obras difundidas, há que considerar todos esses utilizadores como um público novo, que não foi tido em conta pelos titulares do direito de autor quando autorizaram a comunicação inicial, de modo que essa comunicação ao público está sujeita a autorização dos titulares» (100). Por outras palavras, uma hiperligação só exige uma autorização do titular dos direitos de autor quando amplia o círculo do público com acesso à obra em relação ao público que foi tomado em consideração aquando da colocação à disposição inicial, designadamente ao contornar as medidas de restrição de acesso implementadas no momento dessa colocação à disposição inicial.

128. No entanto, existe uma diferença fundamental entre as medidas de restrição de acesso em causa nesse acórdão e as medidas de proteção contra o framing. As medidas de restrição de acesso limitam efetivamente o círculo de pessoas suscetíveis de ter acesso à obra em questão. As pessoas que acedem a essas medidas contornando essas medidas constituem, portanto, um público novo, ou seja, um público que não foi tomado em consideração pelo titular dos direitos de autor no momento da colocação à disposição da sua obra. Embora seja verdade que o referido titular nem sempre tem controlo sobre a utilização dessas medidas, essa utilização constitui normalmente um elemento da negociação do preço da licença de utilização, uma vez que determina o rendimento esperado dessa utilização e, portanto, o valor da licença. O titular dos direitos de autor tem, portanto, em conta estas medidas de restrição quando aceita o preço da licença. No que diz respeito aos casos em que são os próprios titulares dos direitos de autor que colocam à disposição obras, estes têm normalmente um certo grau de controlo sobre o círculo de pessoas que têm acesso às mesmas. É o caso, nomeadamente, dos sítios Internet criados «à medida», mas também das plataformas de partilha que permitem, habitualmente, pelo menos especificar se a colocação em linha tem um caráter «público» ou «privado». Assim, na minha opinião, é possível considerar que a escolha efetuada a este respeito pelo titular dos direitos de autor reflete efetivamente, em todo o caso na maior parte das situações, a sua vontade quanto ao público que tomou em consideração no momento da colocação inicial da obra à disposição.

129. A situação é muito diferente no caso das medidas de proteção contra o framing. Com efeito, essas medidas não restringem o acesso à obra, nem sequer uma via de acesso à mesma, mas unicamente uma forma de a visualizar no ecrã. Essas medidas traduzem‑se frequentemente numa recusa do navegador em abrir a página alvo da hiperligação num quadro que, em seguida, propõe a abertura dessa página para uma nova janela ou a abre automaticamente no lugar da página que contém a hiperligação. A hiperligação apresenta‑se então como uma hiperligação standard. Por conseguinte, em caso algum de pode falar aqui de um público novo, uma vez que o público continua o mesmo: o do sítio Internet alvo da hiperligação. Consequentemente, não há analogia com as medidas de restrição de acesso à obra no que respeita à apreciação da existência do público novo. Assim, além do facto de a utilização de tais medidas só raramente refletir a vontade do titular dos direitos de autor, estas medidas não determinam o círculo de pessoas que foram tidas em conta como público potencial da colocação à disposição da obra. O seu eventual contorno não alarga, portanto, esse círculo e não pode, por conseguinte, constituir um ato de comunicação ao público em virtude da teoria do público novo.

130. Por último, em terceiro lugar, considero que a solução que consiste em associar o âmbito dos direitos exclusivos de autor à aplicação não de medidas de caráter tecnológico de restrição de acesso, mas de medidas de caráter tecnológico de proteção contra certas práticas na Internet, faria com que o direito de autor da União tomasse uma direção perigosa. Com efeito, essa solução converteria a aplicação de medidas de proteção técnica numa condição prévia para a proteção jurídica conferida pelo direito de autor e seria contrária ao princípio segundo o qual a proteção conferida pelo direito de autor é incondicional (101). O Tribunal de Justiça já rejeitou expressamente a ideia de que a proteção conferida pelo direito de comunicação ao público possa ser condicionada pelo facto de o titular do direito de autor não ter restringido as possibilidades de utilização da obra pelos internautas (102).

131. Na minha opinião, é preferível delimitar de forma segura o âmbito dos direitos exclusivos de autor e permitir soluções optout, como as descritas no n.o 107 das presentes conclusões, em vez de transformar o sistema do direito de autor, no que concerne às utilizações em linha, num sistema optin condicionado pela aplicação de medidas de caráter tecnológico de proteção. Os objetivos da Diretiva 2001/29 que visam, por um lado, instituir um elevado nível de proteção dos titulares dos direitos e, por outro, assegurar um justo equilíbrio entre os interesses dos referidos titulares e os dos utilizadores (103), serão, assim, mais bem alcançados.

132. Por todas as razões que acabo de expor, proponho que se responda à questão prejudicial que o artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29 deve ser interpretado no sentido de que não constitui uma comunicação ao público, na aceção desta disposição, a inserção através do framing no sítio Internet de um terceiro de uma obra colocada à disposição em livre acesso num sítio Internet, com o consentimento do titular dos direitos, quando essa inserção é feita neutralizando as medidas de proteção contra o framing adotadas ou impostas pelo titular dos direitos de autor.

 Artigo 6.o da Diretiva 2001/29

133. Poderia ainda ser pertinente, para a solução do litígio no processo principal, analisar se as medidas de caráter tecnológico de proteção contra a inserção em páginas Internet de obras contidas noutros sítios Internet podem elas próprias beneficiar da proteção, jurídica desta vez, ao abrigo do artigo 6.o da Diretiva 2001/29.

134. Nos termos deste artigo, os Estados‑Membros têm a obrigação de assegurar uma proteção jurídica contra a neutralização, efetuada com conhecimento de causa, de qualquer medida de proteção eficaz. As medidas de proteção na aceção desta disposição são, designadamente, as tecnologias destinadas a impedir ou a restringir os atos não autorizados pelos titulares dos direitos de autor. Consideram‑se eficazes quando conferem aos referidos titulares o controlo da utilização da obra através de, designadamente, qualquer transformação da obra.

135. Parece que as medidas de proteção contra a inserção das obras a partir de outros sítios Internet preenchem, em princípio, essas condições. Com efeito, trata‑se de tecnologias que, graças a uma transformação da obra, ou seja, do código da página Internet que contém essa obra, conferem ao titular dos direitos de autor o controlo sobre a utilização da obra sob a forma da sua inserção noutro sítio Internet. Embora essas medidas não sejam capazes de impedir completamente essa utilização, uma vez que existem «contramedidas», podem certamente limitá‑la.

136. Contudo, o Tribunal de Justiça declarou que a proteção jurídica prevista no artigo 6.o da Diretiva 2001/29 se aplica unicamente para proteger o titular dos direitos de autor relativamente a atos que carecem da sua autorização (104). Ora, como proponho concluir, a inserção de obras provenientes de outros sítios Internet através de hiperligações que utilizam o framing não requer a autorização do titular dos direitos de autor, uma vez que se considera que este a concedeu no momento da colocação à disposição inicial da obra. As medidas de proteção contra esses atos, ainda que legais, não beneficiam, portanto, da proteção ao abrigo do artigo 6.o da Diretiva 2001/29.

137. Em contrapartida, a inserção das obras provenientes de outros sítios Internet através das ligações automáticas (inline linking) exige, segundo a minha proposta, a autorização do titular dos direitos de autor. As medidas de caráter tecnológico de proteção contra essa inserção são, portanto, abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 6.o da Diretiva 2001/29.

138. Por conseguinte, proponho que se considere que as medidas de caráter tecnológico de proteção contra a inserção numa página Internet das obras protegidas pelo direito de autor colocadas à disposição do público em livre acesso com a autorização do titular dos direitos de autor noutros sítios Internet, de tal forma que essas obras aparecem automaticamente ao abrir a essa página, sem qualquer ação adicional do utilizador, constituem medidas de proteção eficazes na aceção do artigo 6.o da Diretiva 2001/29.

 Conclusão

139. Tendo em conta o que precede, proponho que o Tribunal de Justiça responda à questão prejudicial submetida pelo Bundesgerichtshof (Tribunal Federal de Justiça, Alemanha) do seguinte modo:

1)      O artigo 3.o, n.o 1, da Diretiva 2001/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2001, relativa à harmonização de certos aspetos do direito de autor e dos direitos conexos na sociedade da informação, deve ser interpretado no sentido de que constitui uma comunicação ao público, na aceção desta disposição, o facto de inserir numa página Internet obras protegidas pelo direito de autor colocadas à disposição do público em livre acesso com a autorização do titular dos direitos de autor noutros sítios Internet, de tal forma que essas obras aparecem automaticamente ao abrir essa página, sem nenhuma ação adicional do utilizador.

2)      Este artigo deve ser interpretado no sentido de que não constitui uma comunicação ao público, na aceção desta disposição, a inserção, através de uma hiperligação que utiliza a técnica do framing, no sítio Internet de um terceiro de uma obra que foi colocada à disposição do público em livre acesso num sítio Internet, com o consentimento do titular dos direitos, quando essa inserção é feita neutralizando as medidas de proteção contra o framing adotadas ou impostas pelo titular dos direitos de autor.

3)      As medidas de caráter tecnológico de proteção contra a inserção numa página Internet das obras protegidas pelo direito de autor colocadas à disposição do público em livre acesso com a autorização do titular dos direitos de autor noutros sítios Internet, de tal forma que essas obras aparecem automaticamente ao abrir a essa página, sem nenhuma ação adicional do utilizador, constituem medidas de proteção eficazes na aceção do artigo 6.o da Diretiva 2001/29.


1      Língua original: francês.


2      Para encontrar os recursos na Internet, esses endereços URL devem ser convertidos, com a ajuda dos servidores DNS (Domain Name Server), em endereços IP (Internet Protocol) dos servidores que alojem esses recursos. Esta operação é irrelevante do ponto de vista dos direitos de autor.


3      Acórdão de 8 de setembro de 2016, GS Media (C‑160/15, EU:C:2016:644, n.o 45).


4      Uma hiperligação é normalmente formulada da seguinte forma: “<a href=“[endereço URL do recurso alvo]”>[a descrição da ligação na página de origem]</a>“. A etiqueta (“tag”) <a> indica que se trata de uma ligação e o lugar da página ao qual a ligação está «ancorada».


5      As referências à jurisprudência do Tribunal de Justiça nas presentes conclusões (em versão eletrónica) são exemplos de ligações profundas.


6      Existem outras etiquetas para incorporar outros tipos de ficheiros, como «<audio>», «<video>», «<object>» ou «<embed>».


7      Nesse caso, a instrução tem a seguinte forma: «<img src=“[endereço URL absoluto do ficheiro gráfico]”>».


8      Etiqueta «<iframe>».


9      Dando o nome do inline frame como valor do atributo «alvo» (target) na descrição da hiperligação na linguagem HTML («a href = “ [endereço URL da hiperligação] ” target=“ [nome do iFrame] ”> [descrição visível da hiperligação] </a>»).


10      Para as informações técnicas relativas às diferentes funcionalidades da linguagem HTML, remeto, nomeadamente, para os sítios https://developer.mozilla.org e https://www.w3schools.com/html.


11      V., designadamente, Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 1 da parte decisória).


12      JO 2001, L 167, p. 10.


13      Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 1996, relativa à proteção jurídica das bases de dados (JO 1996, L 77, p. 20).


14      JO 2014, L 84, p. 72.


15      BGBl. 1965 I, p. 1273.


16      BGBl. 2016 I, p. 1190.


17      Nas presentes conclusões referir‑me‑ei, por uma questão de simplicidade, ao direito que os autores têm sobre as suas obras. No entanto, a mesma análise se aplica, mutatis mutandis, aos outros objetos protegidos, designadamente aos enumerados no artigo 3.o, n.o 2, da Diretiva 2001/29.


18      É o caso, designadamente, das rádios em linha (web radio).


19      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014 (C‑466/12, EU:C:2014:76).


20      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.os 18 a 20).


21      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 22).


22      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.os 25 a 27).


23      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 24 e jurisprudência aí referida).


24      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 27).


25      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 31).


26      Despacho de 21 de outubro de 2014, BestWater International (C‑348/13, não publicado, EU:C:2014:2315, parte decisória).


27      Acórdão de 8 de setembro de 2016, GS Media (C‑160/15, EU:C:2016:644, n.o 43).


28      Acórdão de 8 de setembro de 2016, GS Media (C‑160/15, EU:C:2016:644, n.o 49).


29      Acórdão de 8 de setembro de 2016, GS Media (C‑160/15, EU:C:2016:644, n.o 51).


30      Esta jurisprudência também tem sido objeto de numerosos comentários, mais ou menos críticos, por parte da doutrina. Contudo, esta doutrina está longe de ser unânime, designadamente no que diz respeito ao tratamento adequado que deve ser dado às hiperligações no contexto do direito de autor da União. A título de exemplo, mencionarei as posições adotadas em relação a este assunto por três associações de direitos de autor: Association littéraire et artistique internationale, ALAI Report and Opinion on a Bernecompatible reconciliation of hyperlinking and the communication to the public right on the internet, adotada em 17 de junho de 2015 (modificando a posição sobre o mesmo assunto adotada em 15 de setembro de 2013); European Copyright Society, Opinion on the Reference to the CJEU in Case C466/12 Svensson, de 18 de fevereiro de 2013, e International Association for the Protection of Intellectual Property, Resolution on Linking and Making Available on the Internet, de 20 de setembro de 2016. As conclusões divergentes destas posições demonstram que não existe uma solução única e evidente para o problema da qualificação das hiperligações do ponto de vista do direito da comunicação de obras ao público.


31      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014 (C‑466/12, EU:C:2014:76).


32      Para uma análise aprofundada deste aspeto, v. Conclusões do advogado‑geral M. Wathelet no processo GS Media (C‑160/15, EU:C:2016:221, n.os 48 a 60).


33      European Copyright Society, op.cit.


34      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 19).


35      A aparência do resultado pode ser diferente para o utilizador em função do modo de abertura da página Internet visada pela hiperligação: em vez da página inicial da hiperligação, numa nova janela do navegador ou num quadro na página inicial (hiperligação que utiliza o framing). Neste último caso, o utilizador pode ter a impressão de estar unicamente conectado à página inicial da ligação. No entanto, em todos estes casos o funcionamento técnico é o mesmo — é estabelecida uma conexão direta com o sítio alvo.


36      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 18).


37      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014 (C‑466/12, EU:C:2014:76).


38      Acórdão de 8 de setembro de 2016, GS Media (C‑160/15, EU:C:2016:644, parte decisória).


39      Acórdão de 8 de setembro de 2016, GS Media (C‑160/15, EU:C:2016:644, n.os 44 a 49).


40      Segundo a doutrina, esta solução pode, no entanto, ser necessária para atenuar os efeitos de uma aceção ampla adotada pelo Tribunal de Justiça no que respeita ao âmbito do direito exclusivo de comunicação ao público [v. Husovec, M., «How Europe Wants to Redefine Global Online Copyright Enforcement», em Synodinou, T.E. (éd.), Pluralism or Universalism in International Copyright Law, Wolters Kluwer, 2019, pp. 513 e segs., designadamente na p. 526].


41      V. Conclusões do advogado‑geral A. La Pergola no processo Egeda (C‑293/98, EU:C:1999:403, designadamente n.o 22).


42      Acórdão de 7 de dezembro de 2006, SGAE (C‑306/05, EU:C:2006:764, n.o 40).


43      V., recentemente, Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Nederlands Uitgeversverbond e Groep Algemene Uitgevers (C‑263/18, EU:C:2019:1111, n.o 70).


44      A expressão é de: Karapapa, S., «The requirement for a “new public” in EU copyright law», European Law Review, n.o 42/2017, p. 63, que o utiliza, no entanto, num contexto ligeiramente diferente.


45      V., no contexto das hiperligações, designadamente, Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.os 24 a 27).


46      Já formulei observações semelhantes nas minhas Conclusões no processo Stichting Brein (C‑610/15, EU:C:2017:99, n.o 3). V., neste sentido, Rosati, E., «When Does a Communication to the Public under EU Copyright Law Need to Be to a “New Public”?», SSRN (papers.ssrn.com), de 2 de julho de 2020. No entanto, v., também, sentido contrário, Conclusões do advogado‑geral Saugmandsgaard Øe apresentadas nos processos apensos YouTube e Cyando (C‑682/18 e C‑683/18, EU:C:2020:586, nomeadamente, n.os 94 a 106).


47      V., respetivamente, Acórdãos de 14 de junho de 2017, Stichting Brein (C‑610/15, EU:C:2017:456, parte decisória); de 26 de abril de 2017, Stichting Brein (C‑527/15, EU:C:2017:300, n.o 1 da parte decisória).


48      Acórdãos de 14 de junho de 2017, Stichting Brein (C‑610/15, EU:C:2017:456, n.o 37), e de 26 de abril de 2017, Stichting Brein (C‑527/15, EU:C:2017:300, n.o 50).


49      Acórdão de 29 de julho de 2019, Pelham e o. (C‑476/17, EU:C:2019:624, n.o 1 da parte decisória).


50      V. n.os 52 a 54 das presentes conclusões.


51      V. n.os 37 a 39 das presentes conclusões.


52      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 24 e jurisprudência aí referida).


53      Acórdão de 16 de novembro de 2016, Soulier e Doke (C‑301/15, EU:C:2016:878, n.os 33 a 35).


54      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014 (C‑466/12, EU:C:2014:76).


55      Acórdão de 16 de novembro de 2016, Soulier e Doke (C‑301/15, EU:C:2016:878, n.o 36). O sublinhado é meu.


56      Acórdão de 7 de agosto de 2018 (C‑161/17, EU:C:2018:634).


57      Como alegou, aliás, a recorrente naquele processo (v. Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff, C‑161/17, EU:C:2018:634, n.o 27).


58      Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634, n.o 33).


59      Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634, n.o 35). O sublinhado é meu.


60      Acórdão de 7 de agosto de 2018 (C‑161/17, EU:C:2018:634).


61      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014 (C‑466/12, EU:C:2014:76).


62      Nos termos do Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76).


63      Acórdão de 7 de agosto de 2018 (C‑161/17, EU:C:2018:634, n.o 35).


64      V. n.os 9 e 10, infra.


65      V. n.o 73 das presentes conclusões.


66      Tais como, por exemplo, a usurpação da autoria.


67      V., neste sentido, Acórdão de 16 de novembro de 2016, Soulier e Doke (C‑301/15, EU:C:2016:878, n.o 38).


68      Devo ainda especificar que o facto de ativar uma ligação através de um «clique» deve distinguir‑se das ações que o utilizador deve empreender na Internet para outros fins, por exemplo, para reproduzir um vídeo ou uma gravação sonora, e que necessita também de clicar. Estas ações são irrelevantes do ponto de vista do direito de comunicação ao público, uma vez que ocorrem depois de o utilizador ter tido acesso à obra.


69      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014 (C‑466/12, EU:C:2014:76).


70      Acórdão de 8 de setembro de 2016 (C‑160/15, EU:C:2016:644).


71      O postulado segundo o qual nem todas as categorias de hiperligações podem ser tratadas da mesma maneira pelo simples facto de o seu modo de funcionamento ser semelhante também se suscita, tanto na jurisprudência como na doutrina, nos Estados Unidos. As passagens que se seguem devem muito a Ginsberg, J.C. e Budiardjo, L.A., «Embedding Content or Interring Copyright: Does the Internet Need the “Server Rule”?», Columbia Journal of Law & the Arts, n.o 42/2019, p. 417, ainda que estes autores proponham que se considere que tanto o inline linking como o framing são abrangidos pelo direito exclusivo do autor.


72      Acórdão de 7 de agosto de 2018 (C‑161/17, EU:C:2018:634).


73      Deixo de lado outros efeitos indesejáveis das ligações automáticas que não estão compreendidos no âmbito dos direitos económicos do autor, como a violação de direitos morais, a privação de rendimentos publicitários relacionados com a exploração da obra, a concorrência desleal ou ainda o fenómeno do «roubo de largura de banda» (utilização da largura de banda do servidor do sítio Internet alvo da ligação em proveito do sítio que contém a hiperligação).


74      V. n.os 68 a 72 das presentes conclusões.


75      Acórdão de 7 de agosto de 2018 (C‑161/17, EU:C:2018:634).


76      V., neste sentido, Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634, n.o 30).


77      V., neste sentido, Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634, n.os 45 e 46).


78      Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634, n.os 30 e 44).


79      No processo que deu lugar ao Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634), a obra foi reproduzida a partir de um sítio Internet que não pertence ao titular dos direitos de autor, mas a um detentor de licença.


80      Por exemplo, a retransmissão do sinal de televisão nos quartos de um hotel, v. Acórdão de 7 de dezembro de 2006, SGAE (C‑306/05, EU:C:2006:764).


81      Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634, n.o 29).


82      As licenças Creative Commons constituem um conjunto de licenças que regem as condições de reutilização e de distribuição de obras, designadamente na Internet, elaborado por uma organização sem fins lucrativos epónimo estabelecida nos Estados Unidos. Este sistema prevê diferentes licenças em função de três critérios que podem ser livremente combinados pelo autor da obra aquando da sua colocação à disposição: utilizações comerciais ou não comerciais, caráter modificável ou inalterável da obra original e a eventual condição de distribuição da obra derivada sob a mesma licença. Um sistema de sinais, inseridos na obra através de códigos HTML, permite informar o público da licença aplicável.


83      Por exemplo, as condições de utilização do serviço YouTube estipulam: «Concede […] a cada utilizador do serviço uma licença ao nível mundial, não exclusiva e livre de direitos, que permita aceder ao vosso conteúdo através deste serviço, e de utilizar esse conteúdo (incluindo o direito de o reproduzir, difundir, modificar, exibir ou executar) conforme permitido pelas funcionalidades do serviço».


84      Essa polémica surgiu recentemente relativamente a outra plataforma de partilha de conteúdos, Instagram: https://arstechnica.com/tech‑policy/2020/06/instagram‑just‑threw‑users‑of‑its‑embedding‑api‑under‑the‑bus.


85      Despacho de 21 de outubro de 2014 (C‑348/13, não publicado, EU:C:2014:2315).


86      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 29). O sublinhado é meu.


87      Despacho de 21 de outubro de 2014, BestWater International (C‑348/13, não publicado, EU:C:2014:2315, n.o 17).


88      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014 (C‑466/12, EU:C:2014:76).


89      Despacho de 21 de outubro de 2014, BestWater International (C‑348/13, não publicado, EU:C:2014:2315, n.o 5 e parte decisória).


90      Despacho de 21 de outubro de 2014 (C‑348/13, não publicado, EU:C:2014:2315).


91      V. nota n.o 83 das presentes conclusões.


92      Despacho de 21 de outubro de 2014, BestWater International (C‑348/13, não publicado, EU:C:2014:2315, n.o 4, último período).


93      Acórdão de 8 de setembro de 2016 (C‑160/15, EU:C:2016:644).


94      Despacho de 21 de outubro de 2014 (C‑348/13, não publicado, EU:C:2014:2315).


95      Considerando 31 da Diretiva 2001/29.


96      Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634, n.o 40 e jurisprudência aí referida).


97      V. n.o 5 das presentes conclusões.


98      Em contrapartida, a inserção de uma miniatura de tamanho tão reduzido que os elementos originais da obra em causa não sejam percetíveis, por exemplo para marcar a localização de uma hiperligação, não constitui um ato de comunicação ao público dessa obra.


99      Recordo que era o caso da obra em causa no processo que esteve na origem do Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634).


100      Acórdão de 13 de fevereiro de 2014, Svensson e o. (C‑466/12, EU:C:2014:76, n.o 31).


101      Ou, mais precisamente, só está condicionada pela existência de uma obra entendida como a expressão da criação intelectual do seu autor.


102      Acórdão de 7 de agosto de 2018, Renckhoff (C‑161/17, EU:C:2018:634, n.o 36).


103      Considerandos 9 e 31 da Diretiva 2001/29.


104      Acórdão de 23 de janeiro de 2014, Nintendo e o. (C‑355/12, EU:C:2014:25, n.o 25).