Language of document : ECLI:EU:C:2019:392

CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

GERARD HOGAN

apresentadas em 8 de maio de 2019(1)

Processo C168/18

PensionsSicherungsVerein VVaG

contra

Günther Bauer

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesarbeitsgericht (Tribunal Federal do Trabalho, Alemanha)]

«Reenvio prejudicial — Proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador — Diretiva 2008/94/CE — Artigo 8.o — Regimes complementares de previdência — Proteção dos direitos a prestações de velhice — Âmbito de aplicação — Compensação, pelo antigo empregador, de uma redução anterior da pensão — Nível mínimo de proteção garantido — Efeito direto contra um organismo profissional de previdência complementar»






1.        O artigo 8.o da Diretiva 2008/94/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, relativa à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador (JO L 283, p. 36), obriga um organismo de seguro de insolvência responsável pelas pensões profissionais a assumir pagamentos que um empregador, atualmente em situação de insolvência, tinha obrigação de efetuar a um antigo trabalhador, a fim de cumprir uma obrigação legal? Embora esta seja a questão essencial que se decorre do presente reenvio do Bundesarbeitsgericht (Tribunal Federal do Trabalho, Alemanha), o referido reenvio exige igualmente que o Tribunal de Justiça se pronuncie uma vez mais sobre o âmbito e a interpretação desta disposição.

2.        Tal obrigação resulta do direito nacional, por força do qual os empregadores devem compensar qualquer redução nas prestações de pensões pagas por um fundo de pensões quando estas prestações foram pagas com base nas cotizações pagas pelo empregador.

I.      Quadro jurídico

A.      Direito da União

1.      Diretiva 80/987/CEE

3.        A Diretiva 80/987/CEE do Conselho, de 20 de outubro de 1980, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador (JO L 283, p. 23), previa no artigo 8.o:

«Os Estados‑Membros certificar‑se‑ão de que serão tomadas as medidas necessárias para proteger os interesses dos trabalhadores assalariados e das pessoas que tenham deixado a empresa ou o estabelecimento da entidade patronal na data da superveniência da insolvência desta, no que respeita aos seus direitos adquiridos ou em vias de aquisição, a prestações de velhice, incluindo as prestações de sobrevivência, a título de regimes complementares de previdência, profissionais ou interprofissionais existentes para além dos regimes legais nacionais de segurança social.»

4.        A Diretiva 80/987 foi substituída pela Diretiva 2008/94, que entrou em vigor em 17 de novembro de 2008.

2.      Diretiva 2008/94

5.        Os considerandos 3, 6, 7 e 9 da Diretiva 2008/94 estipulam:

«(3)      São necessárias disposições para proteger os trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador e para lhes assegurar um mínimo de proteção, em particular para garantir o pagamento dos seus créditos em dívida, tendo em conta a necessidade e um desenvolvimento económico e social equilibrado na Comunidade. Para esse efeito, os Estados‑Membros deverão criar uma instituição que garanta aos trabalhadores assalariados em causa o pagamento dos seus créditos em dívida.

[…]

(6)      A fim de garantir a segurança jurídica dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência das empresas com atividade em vários Estados‑Membros e consolidar os direitos dos trabalhadores assalariados no sentido apontado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, é conveniente prever disposições que determinem explicitamente qual a instituição competente para o pagamento dos créditos em dívida dos trabalhadores nestas situações e que fixem como objetivo para a cooperação entre as administrações competentes dos Estados‑Membros o pagamento, com a maior brevidade possível, dos créditos em dívida dos trabalhadores assalariados. […]

(7)      Os Estados‑Membros podem estabelecer limites à responsabilidade das instituições de garantia, que devem ser compatíveis com o objetivo social da diretiva e podem tomar em consideração os diferentes valores dos créditos.

[…]

(9)      […] Em conformidade com o princípio da proporcionalidade consagrado no mesmo artigo, a presente diretiva não excede o necessário para atingir aquele objetivo.»

6.        O artigo 1.o, n.o 1, da referida diretiva dispõe:

«A presente diretiva aplica‑se aos créditos dos trabalhadores assalariados emergentes de contratos de trabalho ou de relações de trabalho existentes em relação a empregadores que se encontrem em estado de insolvência, na aceção do n.o 1 do artigo 2.o»

7.        Nos termos do artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva 2008/94:

«A presente diretiva não prejudica o direito nacional no que se refere à definição dos termos “trabalhador assalariado”, “empregador”, “remuneração”, “direito adquirido” e “direito em vias de aquisição”.

Todavia, os Estados‑Membros não podem excluir do âmbito de aplicação da presente diretiva:

a)      Os trabalhadores a tempo parcial, na aceção da Diretiva 97/81/CE;

b)      Os trabalhadores com contratos de trabalho a termo, na aceção da Diretiva 1999/70/CE;

c)      Os trabalhadores que têm uma relação de trabalho temporário, na aceção do ponto 2 do artigo 1.o da Diretiva 91/383/CEE.»

8.        O artigo 8.o da Diretiva 2008/94 tem a seguinte redação:

«Os Estados‑Membros certificar‑se‑ão de que serão tomadas as medidas necessárias para proteger os interesses dos trabalhadores assalariados e das pessoas que tenham deixado a empresa ou o estabelecimento da entidade patronal na data da superveniência da insolvência desta, no que respeita aos seus direitos adquiridos ou em vias de aquisição, a prestações de velhice, incluindo as prestações de sobrevivência, a título de regimes complementares de previdência, profissionais ou interprofissionais existentes para além dos regimes legais nacionais de segurança social.»

9.        O artigo 11.o da Diretiva 2008/94 prevê:

«A presente diretiva não prejudicará a faculdade de os Estados‑Membros aplicarem ou introduzirem disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis aos trabalhadores assalariados.»

B.      Direito nacional

10.      O § 1 da Gesetz zur Verbesserunger betrieblichen Altersversorgung (Betriebsrentengesetz) (Lei relativa à Melhoria dos Planos de Pensões Profissionais, a seguir «Lei relativa às Pensões»), sob a epígrafe «Constituição pelo empregador de um plano empresarial de pensões», prevê (com a última redação que lhe foi dada pela Lei de 17 de agosto de 2017), o seguinte:

«Se um empregador atribuir a um trabalhador uma pensão de velhice […]com base na relação laboral (plano empresarial de pensões), aplicam se as disposições da presente lei. O plano empresarial de pensões pode ser gerido diretamente pelo empregador ou através de um dos gestores de fundos de pensões referidos no § 1b, n.os 2 a 4. O empregador também responde pelo cumprimento das prestações por ele prometidas quando não as gere diretamente.»

11.      O § 1b da Lei relativa às Pensões enumera as escolhas possíveis do empregador quanto aos planos empresariais de reforma. Nele se prevê, no essencial, que o empregador, para efeitos do plano empresarial de pensões, pode subscrever um seguro de vida a favor do trabalhador (n.o 2) ou, como sucede no caso vertente, celebrar um plano empresarial de pensões com uma Pensionskasse (caixa de pensões) ou com um Pensionsfunds (fundo de pensões) (n.o 3) ou com uma dita Unterstützungskasse (caixa de previdência) (n.o 4).

12.      O § 7, n.o 1, da Lei relativa às Pensões, intitulado «Âmbito da proteção do seguro», estipula:

«Se os direitos de pensão garantidos diretamente pelo empregador não forem satisfeitos, devido à abertura de um processo de insolvência do empregador […] o beneficiário ou os seus herdeiros têm o direito de reclamar ao prestador da garantia contra a insolvência o montante da prestação que o empregador deveria pagar com base no plano de pensões, caso o processo de insolvência não tivesse sido aberto. […]»

13.      O § 10, n.o 1, da Lei relativa às Pensões, sob a epígrafe «Obrigação de contribuição e cálculo das contribuições»:

«O financiamento da garantia contra a insolvência é feito através de contribuições de direito público a cargo de todos os empregadores que tenham constituído planos empresariais de pensões, diretamente ou através de uma caixa de apoio, de um Direktversicherung (seguro direto) de um (seguro de vida celebrado pela entidade patronal a favor do trabalhador) […] ou de um fundo de pensões.»

14.      O § 14 da Lei relativa às Pensões, com a epígrafe «Prestador da garantia contra a insolvência», especifica que o organismo segurador contra o risco de insolvência é a Pensions‑Sicherungs‑Verein Versicherungsverein auf Gegenseitigkeit.

15.      Nos termos do Acordo de 22 de setembro de 2000 entre a República Federal da Alemanha e o Grão‑Ducado do Luxemburgo sobre a cooperação no domínio da garantia dos planos de pensões profissionais contra a insolvência, o referido organismo é também o prestador da garantia contra a insolvência para os planos de pensões de empresas com sede no Luxemburgo.

II.    Processo principal e questões prejudiciais

16.      Em dezembro de 2000, o demandante no processo principal e ora recorrido, G. Bauer, recebeu do seu antigo empregador várias prestações de pensão de velhice, a saber:

–        uma pensão concedida por um organismo profissional de previdência complementar (PKDW ‑ Pensionskasse für die Deutsche Wirtschaft [Caixa de Pensões da Economia Alemã, a seguir «caixa de pensões»]), com base nas contribuições a cargo do antigo empregador;

–        um complemento mensal de reforma pago diretamente pelo seu antigo empregador;

–        um subsídio anual de Natal, também pago pelo seu antigo empregador (2).

17.      Em meados de 2003, a PKDW enfrentou dificuldades financeiras e foi autorizada pelas autoridades nacionais a reduzir o montante das pensões pagas. Uma redução de 1,25 % até 1,4 % foi, portanto, gradualmente aplicada a cada ano. No total, entre 2003 e 2013, o valor da pensão complementar recebida por G. Bauer foi reduzido em 13,8 %, o que representa uma perda de 82,74 euros por mês. Segundo o Governo alemão, em comparação com o total das pensões profissionais, a percentagem de redução das prestações é de apenas 7,4 % (3).

18.      Nos termos da lei alemã, existe uma obrigação de responder pelas prestações devidas o antigo empregador de G. Bauer tinha, portanto, a obrigação de compensar essa redução da prestação de pensão.

19.      Em 30 de janeiro de 2012 foi aberto um processo de insolvência sobre o património do antigo empregador de G Bauer.

20.      Por notificação de 12 de setembro de 2012, a ora recorrente (PSV) comunicou ao demandante e ora recorrido que assumiria a responsabilidade pelo pagamento do complemento mensal de reforma, bem como do subsídio anual de Natal. No entanto, a PSV recusou‑se a assumir o valor pago pelo antigo empregador de G. Bauer para compensar pela redução da prestação de pensão.

21.      G. Bauer opõe‑se a esta recusa, alegando que a PSV tem a obrigação de responder por qualquer redução causada pela insolvência do seu antigo empregador. A PSV respondeu que, em direito nacional, não há nenhuma obrigação de garantir os pagamentos efetuados por um antigo empregador em compensação de uma redução anterior da pensão.

22.      Nestas circunstâncias, o Bundesarbeitsgericht (Tribunal Federal do Trabalho) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      O artigo 8.o da Diretiva 2008/94 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, relativa à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador, é aplicável a prestações de reforma de velhice de um plano profissional de reforma devidas por uma entidade interempresarial de previdência sujeita à supervisão financeira de um organismo estatal, quando essa entidade, por razões financeiras e com o acordo do organismo de supervisão, reduz legitimamente essas prestações e o empregador, que segundo o direito nacional deve responder perante o seu antigo trabalhador pelos montantes que foram reduzidos à sua pensão, não pode cumprir a sua obrigação por se ter tornado insolvente?

2)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

Em que circunstâncias podem os prejuízos sofridos pelo antigo trabalhador, no tocante às prestações do plano profissional de reformas, devido à insolvência do empregador, ser considerados manifestamente desproporcionados, obrigando os Estados‑Membros a prestarem uma proteção mínima, embora o antigo trabalhador receba, no mínimo, metade da pensão resultante dos seus direitos a pensão adquiridos?

3)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

O artigo 8.o da Diretiva 2008/94 tem efeito direto, conferindo direitos que os particulares, quando um Estado‑Membro não transpuser ou só transpuser incompletamente esta Diretiva para o direito nacional, podem invocar nos tribunais nacionais contra esse Estado‑Membro?

4)      Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

Uma entidade de direito privado, designada pelo Estado‑Membro como responsável pelo seguro de insolvência do plano profissional de reforma de velhice, que está sujeita a supervisão financeira, cobra aos empregadores contribuições para o seguro de insolvência nos termos de normas do direito público e pode, como os organismos públicos, cumprir os pressupostos para o início da execução mediante a prática de um ato administrativo, é um organismo público desse Estado‑Membro?»

III. Sobre o mérito da causa

A.      Quanto à primeira questão

23.      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 8.o da Diretiva 2008/94 deve ser interpretado como sendo aplicável à perda de uma prestação como a do processo principal, em razão da insolvência de um antigo empregador. A referida prestação era paga por este último para compensar, conforme exigido pelo direito nacional, a redução anterior da reforma profissional paga em seu nome por intermédio de um organismo interprofissional de previdência, sujeito a supervisão estatal, que, por razões financeiras e com o acordo do organismo de supervisão, fora obrigado a reduzir o montante pago.

24.      Uma vez que a questão suscitada diz diretamente respeito à aplicação do artigo 8.o, importa, pois, começar esta análise examinando quais são as condições de aplicação desta disposição.

25.      Nos termos deste artigo, «[o]s Estados‑Membros certificar‑se‑ão de que serão tomadas as medidas necessárias para proteger os interesses dos trabalhadores assalariados e das pessoas que tenham deixado a empresa ou o estabelecimento da entidade patronal na data da superveniência da insolvência desta, no que respeita aos seus direitos adquiridos ou em vias de aquisição, a prestações de velhice […] a título de regimes complementares de previdência, profissionais ou interprofissionais existentes para além dos regimes legais nacionais de segurança social». Por conseguinte, devem estar preenchidas quatro condições para que o artigo 8.o seja aplicável, nomeadamente:

–        o demandante deve ser um trabalhador assalariado ou uma pessoa que já tenha deixado a empresa ou o estabelecimento da entidade patronal na data da insolvência desta se;

–        o empregador deve estar em insolvência;

–        essa insolvência deve afetar direitos adquiridos ou em vias de aquisição a prestações de velhice;

–        as prestações de velhice em causa devem ter sido concedidas a título de regimes de previdência profissionais ou interprofissionais existentes para além dos regimes legais nacionais de segurança social.

26.      A primeira condição está manifestamente preenchida e não é objeto de controvérsia.

27.      A segunda condição (4) contempla a situação em que o empregador está em insolvência. Por conseguinte, o artigo 8.o não se aplica, em princípio, à situação em que é apenas o organismo de previdência de pensões profissionais que enfrenta dificuldades financeiras (5). Isto é conforme com o artigo n.o 1 da Diretiva 2008/94, que exige, para efeitos de aplicação da diretiva, que o crédito detido pelo trabalhador seja contra o seu empregador ou antigo empregador. Importa recordar que a Diretiva 2008/94 não visa garantir, em todas as circunstâncias, os direitos adquiridos ou em vias de aquisição dos trabalhadores ou antigos trabalhadores a prestações de velhice, antes tendo por objetivo, de acordo com o seu terceiro considerando, simplesmente protegê‑los em caso de insolvência do seu empregador. Como o Tribunal de Justiça declarou, o artigo 8.o apenas se aplica quando o empregador, que se comprometeu a garantir o pagamento das prestações estabelecidas num plano de pensões, está em situação de insolvência (6).

28.      Quanto à terceira condição, que se refere ao conceito de «direitos adquiridos» e «direitos em vias de aquisição», há que observar que, de acordo com o artigo 2.o, n.o 2, primeiro período, da Diretiva 2008/94, a definição destes conceitos não prejudica o direito nacional. Uma vez que a expressão «não prejudica» pode criar uma certa ambiguidade, o significado desta disposição deve ser explicado. Com efeito, esta expressão pode ser entendida ou no sentido de que os conceitos de «direitos adquiridos» e «direitos em vias de aquisição» devem ser interpretados à luz do direito nacional ou então que a Diretiva 2008/94 não visa modificar a definição que a legislação nacional tenha dado a estes conceitos noutras áreas de direito.

29.      O segundo período do artigo 2.o, n.o 2, esclarece, contudo, de que modo o primeiro período deve ser entendido. Com efeito, ao passo que o primeiro período menciona a expressão «trabalhador assalariado» entre os conceitos que diretiva não afeta, o segundo período do artigo 2.o, n.o 2, estipula que os Estados‑Membros não podem excluir determinados tipos de trabalhadores do âmbito de aplicação desta diretiva. Dado que o segundo período visa limitar a autonomia dos Estados‑Membros na definição de um dos conceitos referidos no primeiro período, esta frase deve ser entendida como autorizando os Estados‑Membros a definir os termos em questão. Por conseguinte, os conceitos de «direito adquirido» e de «direito em vias de aquisição» e, por extensão, portanto, o terceiro requisito, assentam no direito nacional.

30.      No que diz respeito à quarta condição, parece‑me que a definição dos conceitos «prestações concedidas a título de regimes complementares de previdência, profissionais ou interprofissionais existentes para além dos regimes legais nacionais de segurança social» está igualmente sujeita ao direito nacional (7). Isto decorre simplesmente da referência feita à noção de «regimes legais nacionais de segurança social» que não pode ser apreciada senão por referência ao direito nacional (8).

31.      São estas as quatro condições que devem estar reunidas, para além das enunciadas no artigo 1.o relativas à aplicação geral da Diretiva 2008/94, sobre as quais o Tribunal de Justiça não é questionado. O facto de o trabalhador ter reclamado um crédito emergente de um contrato de trabalho, como exige o artigo 1.o da Diretiva 2008/94, não é, por si só, suficiente para justificar a aplicação do artigo 8.o

32.      No caso em apreço, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 8.o é ou não aplicável à perda de uma prestação como a que está em causa no processo principal, devido à insolvência de um antigo empregador. Ora, a prestação foi paga por este último para compensar, conforme previsto pela legislação nacional, a redução de uma reforma profissional que tinha sido, inicialmente, concedida por esse empregador por intermédio de um organismo interprofissional de previdência sujeito a supervisão f estatal dos serviços financeiros, cujo montante, por razões financeiras, fora reduzido, com o consentimento do organismo de supervisão.

33.      Tendo em conta a terceira e a quarta condições acima referidas, para apreciar se o artigo 8.o se aplica, é necessário, em primeiro lugar, determinar o estatuto dos direitos detidos pela pessoa em questão, caso o seu antigo empregador se encontre em situação de insolvência.

34.      No presente processo, a especificidade da situação tem a ver com o facto de que os direitos detidos já tinham sido objeto de uma redução anterior. Por conseguinte, o estatuto jurídico dos referidos direitos no momento da insolvência do antigo empregador depende das consequências produzidas por esta operação, as quais, por sua vez, dependem da questão de saber se esta operação já era ou não abrangida pelo artigo 8.o da Diretiva 2008/94 (ou, antes disso, pelo artigo 8.o da Diretiva 80/987). Com efeito, se o artigo 8.o não era então aplicável, a consequência resultante dessa redução dependia do direito nacional, pelo que não se pode excluir que uma parte desses direitos se tenha perdido ou que as quantias pagas para compensar essa redução não o tenham sido por força de «regimes complementares de previdência profissionais ou interprofissionais».

35.      No caso em apreço, a dificuldade reside no facto de o órgão jurisdicional de reenvio não ter precisado a razão pela qual o organismo profissional de previdência tinha enfrentado dificuldades financeiras desde 2003. Resulta, no entanto, das informações comunicadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, e confirmadas pelas partes na audiência, que, nos termos do § 1 da Lei relativa às Pensões, as entidades patronais são responsáveis pela execução das prestações de reforma profissional que concederam no âmbito de uma relação de trabalho, mesmo se tais pagamentos forem efetuados por um organismo profissional de previdência intermediário. Por conseguinte, o empregador deve garantir o pagamento em questão, mesmo na eventualidade de o fundo de pensões não pagar as prestações concedidas ou se as pagar apenas parcialmente.

36.      De qualquer modo, todas as partes concordaram na audiência que a redução não alterou a natureza e o quantum dos direitos de G. Bauer. Com efeito, tendo em conta as informações comunicadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, afigura‑se que, à luz do direito alemão, quando um empregador estabelece um regime de pensões, continua a ser responsável por assegurar a concessão ulterior das prestações.

37.      Assim, uma vez que a insolvência, em 2012, do antigo empregador do demandante e ora recorrido afetou os direitos adquiridos ou em vias de aquisição às prestações de velhice e que não se contesta que estes direitos foram concedidos a título de regimes profissionais ou interprofissionais de previdência existentes para além dos regimes legais nacionais de segurança social, proponho que à primeira questão se responda que o artigo 8.o deve ser interpretado no sentido de que abrange a perda de um pagamento, como o que está em causa no processo principal, efetuado por um antigo empregador para compensar, conforme exigido pelo direito nacional, uma redução de uma reforma profissional. Embora as circunstâncias precisas do presente caso sejam reconhecidamente pouco habituais, não deixa de ser verdade que o facto de o antigo empregador não ter efetuado o pagamento complementar relativo às reduções das pensões de outro modo impostas ao trabalhador, se enquadra perfeitamente no âmbito do artigo 8.o

B.      Quanto à segunda questão

38.      Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta em que circunstâncias, referidas no n.o 35 do Acórdão de 24 de novembro de 2016, Webb‑Sämann (C‑454/15, EU:C:2016:891), os prejuízos sofridos pelo trabalhador, em consequência da insolvência do seu antigo empregador, poderiam ser considerados manifestamente desproporcionados, à luz da obrigação da proteção dos interesses dos trabalhadores assalariados, consagrada no artigo 8.o da Diretiva 2008/94, mesmo que esses prejuízos não equivalham a mais de metade das prestações de velhice resultantes dos direitos a pensão acumulados, para os quais pagou cotizações ao abrigo de um regime complementar de previdência profissional.

39.      Esta questão requer uma apreciação completa da jurisprudência proferida pelo Tribunal de Justiça até esta data tanto quanto a mesma diga respeito ao artigo 8.o da Diretiva 2008/94.

40.      Como o Tribunal de Justiça salientou, o grau de proteção exigido pela Diretiva 2008/94 deve ser determinado em função dos termos utilizados na disposição em causa e, se necessário, à luz dos objetivos prosseguidos pela presente diretiva (9).

41.      Segundo a redação do artigo 8.o da Diretiva 2008/94, os Estados‑Membros devem certificar‑se de que serão tomadas as medidas necessárias para proteger os interesses dos trabalhadores assalariados e das pessoas que tenham deixado a empresa ou o estabelecimento da entidade patronal na data da insolvência desta, no que respeita aos seus direitos adquiridos ou em vias de aquisição a prestações de velhice a título de regimes complementares de previdência, profissionais ou interprofissionais existentes para além dos regimes legais nacionais de segurança social.

42.      Nas suas conclusões no processo Robins e o. (C‑278/05, EU:C:2006:476, n.os 70 e 82), a advogada‑geral J. Kokott considerou que o artigo 8.o exige uma proteção completa dos interesses dos trabalhadores, embora tal proteção não signifique necessariamente que os regimes de pensões devam ser sempre integralmente financiados. Defendeu, no entanto, que o artigo 8.o exige, caso exista um financiamento insuficiente lesivo dos interesses dos trabalhadores em caso de insolvência, que os Estados‑Membros tomem as medidas adequadas para garantir o pagamento da pensão a que os trabalhadores têm direito.

43.      Nos n.os 36 e 45 do Acórdão de 25 de janeiro de 2007, Robins e o. (C‑278/05, EU:C:2007:56), o Tribunal de Justiça declarou que a redação do artigo 8.o deixa aos Estados‑Membros uma ampla margem de apreciação para determinar quer os meios empregados para efeitos dessa proteção quer o nível de proteção conferido. O Tribunal de Justiça concluiu que esta última obrigação não incluía a obrigação de garantir o pagamento integral das pensões.

44.      Esta afirmação é, no entanto, algo surpreendente. Embora se possa admitir facilmente que o artigo 8.o deixa uma margem considerável aos Estados‑Membros quanto aos meios empregados para garantir tal proteção, não obstante, esta disposição é, em contrapartida, bastante clara no que diz respeito ao nível de proteção que deve ser concedido. Em qualquer caso, a consequência habitual do facto de um Estado‑Membro ter sido investido de um amplo poder de apreciação por uma determinada diretiva, é que esse Estado‑Membro poderá eximir‑se à responsabilidade demonstrando que tomou todas as medidas adequadas que se poderiam razoavelmente esperar para cumprir essa obrigação específica (10). No entanto, devo confessar que não tenho conhecimento de outras circunstâncias em que a existência uma margem de apreciação para decidir dos meios que devem ser utilizados para alcançar certo um objetivo levou a admitir que esse objetivo deva ser alcançado apenas parcialmente ou nas quais foi considerado que um Estado‑Membro cumpriu a sua obrigação de alcançar esse objetivo remetendo para uma solução vaga simplesmente devido à amplitude do poder de apreciação que lhe foi atribuído pela medida legislativa pertinente.

45.      Voltando agora ao Acórdão Robins, o Tribunal de Justiça acrescentou que uma «disposição do direito interno suscetível de conduzir, em determinadas situações, a uma garantia das prestações limitada a 20 % ou 49 % dos direitos do trabalhador assalariado, isto é, a menos de metade desses direitos, não pode ser entendida como correspondendo à definição da expressão “proteger” usada no artigo 8.o da diretiva». A situação em causa no referido processo era um dos casos específicos, em que, por um lado, «aproximadamente 65 000 inscritos em regimes de reforma sofreram perdas de mais de 20 % em relação às prestações esperadas» e, por outro lado, «aproximadamente 35 000, ou seja, cerca de 54 % do conjunto, tiveram perdas que ultrapassaram 50 % das referidas prestações».

46.      Afigura‑se, portanto, que o Tribunal de Justiça considerou que uma redução das prestações a que um determinado trabalhador tem direito não bastava, por si só, para desencadear a responsabilidade do Estado‑Membro em causa. Por conseguinte, o Tribunal de Justiça declarou que o trabalhador deve ir mais longe e demonstrar que, de modo geral, o Estado‑Membro não garante uma proteção suficiente dos trabalhadores assalariados. Esta abordagem, coerente com o conceito de obrigação de meios, refletiu‑se também nas considerações do Tribunal de Justiça sobre o efeito direto desta disposição, em relação à qual o Tribunal de Justiça decidiu que a determinação da responsabilidade do Estado‑Membro pressupõe a demonstração de «uma violação manifesta e grave», por parte desse Estado‑Membro, dos limites que se impõem ao seu poder de apreciação.

47.      Há, contudo, que reconhecer que o que resulta do Acórdão Robins é que, para que seja satisfeito um pedido baseado no artigo 8.o, os trabalhadores, não só devem demonstrar que houve uma «violação manifesta e grave» pelo Estado‑Membro em causa, a fim de obterem uma compensação financeira no caso dessa violação das obrigações do Estado, mas também que, em qualquer caso, não se espera que os Estados‑Membros garantam integralmente os direitos dos trabalhadores. Pelas razões que passo a expor, não posso deixar de pensar que o limiar de 50 % enfraqueceu de certo modo o âmbito da proteção conferida pelo artigo 8.o aos trabalhadores assalariados. Pessoalmente, considero que, no processo Robins, é acertada a interpretação dada pela advogada‑geral J. Kokott ao âmbito de aplicação do artigo 8.o

48.      Defendo este ponto de vista pelas seguintes razões. Em primeiro lugar, o teor literal do artigo 8.o («[…] certificar‑se‑ão […]») impõe claramente uma obrigação aos Estados‑Membros. Em segundo lugar, é evidente que esta obrigação é extensiva à «prote[cão] [d]os interesses dos trabalhadores assalariados […] no que respeita aos seus direitos adquiridos ou em vias de aquisição a prestações de velhice […]». Em terceiro lugar, o artigo 8.o não prevê ele próprio, um limiar máximo ou uma qualquer percentagem relativamente ao alcance da obrigação do Estado‑Membro.

49.      Consequentemente, dificilmente antevejo de que forma a obrigação prevista no artigo 8.o poderia, em princípio, referir‑se a algo que não seja a total satisfação dos direitos do trabalhador à pensão. Como observou a advogada‑geral J. Kokott nas suas conclusões no processo Robins, «não corresponde inteiramente ao interesse de um trabalhador assalariado receber apenas uma fração da pensão a que tem direito por acordo expresso em contrato».

50.      Se — como é seguramente o caso — é precisamente esse interesse do trabalhador que o Estado‑Membro é obrigado a proteger nos termos do artigo 8.o, não existe nenhuma fórmula mágica nos 50 % que o Tribunal de Justiça, no Acórdão Robins, declarou como percentagem mínima que um trabalhador assalariado deve receber a título de prestações de velhice na sequência da insolvência de um empregador. Se — como claramente o faz — o artigo 8.o impõe aos Estados‑Membros a obrigação de assegurar a proteção dos interesses destes trabalhadores, na falta de uma linguagem clara noutras disposições da diretiva, deverei pensar que esta obrigação é extensiva à totalidade das prestações de velhice em questão e não apenas parte delas. Importar recordar que, em muitos casos, uma diminuição de cerca de 50 % das prestações de pensão de velhice pode representar enormes dificuldades financeiras para as pessoas beneficiárias dessas pensões.

51.      Se o legislador da União tivesse querido diluir, com tal amplitude potencial, o alcance da obrigação dos Estados‑Membros de proteger os reformados do impacto da insolvência do empregador no que respeita aos seus direitos a pensão, considero que teria sido utilizada para esse efeito uma linguagem muito clara. Isto é especialmente verdade, dada a importância social manifesta desta obrigação especial.

52.      Por conseguinte, se o legislador da União tivesse considerado que o alcance desta obrigação era simplesmente o enunciado pelo Tribunal de Justiça no quarteto de processos que se inicia com o processo Robins, o artigo 8.o teria tido provavelmente uma redação diferente, de modo a precisar que o alcance da obrigação imposta aos Estados‑Membros visasse simplesmente assegurar que apenas 50 % (ou qualquer outra percentagem) destas prestações beneficiava de proteção.

53.      Neste caso, pode observar‑se que o artigo 4.o, n.os 2 e 3, da diretiva prevê expressamente que os Estados‑Membros podem limitar o número de meses para os quais podem, em caso de insolvência, ser reclamados ao fundo de garantia créditos por salários não pagos. Com efeito, o artigo 4.o, n.o 3, permite aos Estados‑Membros impor limiares máximos «em relação aos pagamentos efetuados pela instituição de garantia», embora esses limiares não possam ser inferiores a um limiar «socialmente compatível com o objetivo social da diretiva».

54.      A inexistência de restrições ou limitações análogas no artigo 8.o no que se refere ao alcance das obrigações dos Estados‑Membros em matéria de proteção dos direitos dos trabalhadores assalariados a prestações de velhice em razão da insolvência do empregador é seguramente reveladora. Como observou a advogada‑geral J. Kokott nas suas conclusões no processo Robins, o mero facto de se encontrarem noutras disposições da diretiva as restrições expressas ao alcance da obrigação, imposta aos Estados‑Membros, de proteger os trabalhadores em caso de insolvência, reforça este argumento relativo à natureza e ao alcance da obrigação prevista no artigo 8.o

55.      Por todas estas razões, considero, portanto, que o artigo 8.o impõe aos Estados‑Membros a obrigação de proteger todas as prestações de velhice afetadas pela insolvência do empregador, e não apenas uma parte ou uma determinada percentagem dessas prestações. A este respeito, concordo inteiramente com o raciocínio da advogada‑geral J. Kokott nas suas conclusões no processo Robins. Por conseguinte, entendo que o raciocínio do Tribunal de Justiça no Acórdão Robins sobre a questão do artigo 8.o não pode ser aceite e não deve agora ser seguido por este Tribunal.

56.      Nada disto implica, contudo, que os Estados‑Membros não disponham de nenhuma margem para determinar os meios que devem ser utilizados para garantir tal proteção. Com efeito, como resulta da redação do artigo 8.o, a obrigação imposta aos Estados‑Membros não é a de garantirem eles próprios o pagamento das pensões, mas a de se «certificarem de que serão tomadas as medidas necessárias» para esse efeito. A este respeito, partilho das conclusões do Tribunal de Justiça no Acórdão Robins, de que um particular não pode simplesmente alegar que sofreu uma redução da sua pensão e exigir em seguida que o Estado‑Membro em causa compense esta redução. Em vez disso, é necessário que o requerente vá mais longe e demonstre que o respetivo Estado‑Membro não adotou as medidas que poderiam razoavelmente ter sido consideradas suficientes para proteger esses interesses.

57.      Como procurarei demonstrar, uma consequência da interpretação do artigo 8.o, a meu ver e com todo o respeito, incorreta, adotada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Robins, é que o Tribunal de Justiça tem tido posteriormente dificuldades em justificar esta solução à luz da própria redação do artigo 8.o

58.      Isto talvez seja bem ilustrado pelo acórdão subsequente Hogan e o. (11). Neste acórdão o Tribunal de Justiça, abandonou, de facto, a condição relativa à existência de circunstâncias especiais. Considerou, em vez disso, que a transposição correta do artigo 8.o da Diretiva 2008/94 requer que um trabalhador receba, em caso de insolvência do seu empregador, pelo menos, metade das prestações de velhice resultantes dos direitos a pensão acumulados, para os quais pagou cotizações no quadro de um regime complementar de previdência profissional (12).

59.      No seu acórdão de 24 de novembro de 2016, Webb‑Säman (C‑454/15, EU:C:2016:891, n.o 35), o Tribunal acrescentou, no entanto, que a obrigação de os Estados‑Membros protegerem os trabalhadores de qualquer prejuízo que equivale a metade ou mais de metade das suas prestações de velhice não excluía que «noutras circunstâncias os prejuízos sofridos possam igualmente, mesmo se diferirem em termos percentuais, ser considerados manifestamente desproporcionados à luz da obrigação da proteção dos interesses dos trabalhadores assalariados, consagrada no artigo 8.o da Diretiva [2008/94]».

60.      No seu mais recente acórdão sobre este assunto, de 6 de setembro de 2018, Hampshire (C-17/17, EU:C:2018:674, n.o 46), o Tribunal de Justiça reiterou que certos prejuízos sofridos podem, mesmo que a sua percentagem seja inferior a metade das prestações esperadas, podem igualmente ser considerados manifestamente desproporcionados à luz da obrigação de proteção dos interesses dos trabalhadores assalariados, consagrada na referida disposição (13).

61.      Como sucede em relação ao valor de 50 %, o Tribunal de Justiça não deu qualquer justificação ou orientação acerca de qual o grau de diminuição das prestações que, de outro modo, poderia constituir uma interferência manifestamente desproporcionada nos direitos dos trabalhadores em questão.

62.      No entanto, há que referir que, nos Acórdãos Webb‑Säman (14) e Hampshire (15), o Tribunal de Justiça declarou que a obrigação de os Estados‑Membros garantirem pelo menos metade das prestações de velhice resultantes dos direitos a pensão acumulados para os quais o trabalhador pagou cotizações no quadro de um regime complementar de previdência profissional, constitui uma garantia mínima individual para cada trabalhador assalariado. Por conseguinte, afigura‑se que, nestes dois acórdãos, o Tribunal de Justiça considerou que a aplicação da regra dos 50 % não esgota plenamente os efeitos desta disposição. Por outras palavras, os Estados‑Membros têm a obrigação de se certificar de que seja garantido a cada trabalhador, pelo menos, 50 % das prestações a que tem direito no quadro de um regime complementar de previdência profissional em caso de insolvência do seu empregador (16), mas esta obrigação não os isentaria de tomar as medidas necessárias (financeiras, prudenciais ou outras) para proteger integralmente os interesses dos trabalhadores. Quando a redução for inferior a 50 %, os trabalhadores em questão poderão obter indemnização se provarem a existência de um incumprimento por parte do Estado‑Membro da obrigação de meios que lhe incumbe, por não ter assegurado a adoção de todas as medidas necessárias (financeiras, prudenciais ou outras) para proteger os interesses dos trabalhadores. Assim, para retomar a formulação utilizada no Acórdão Robins e o., mesmo que o prejuízo sofrido não atinja este limiar, o trabalhador pode, no entanto, pedir que seja indemnizado integralmente pelo Estado‑Membro em questão, em caso de «violação manifesta e grave» por parte do referido Estado‑Membro, dos limites que se impõem ao seu poder de apreciação para adotar as medidas adequadas.

63.      Estas decisões recentes podem, assim, ser entendidas como um esforço tácito do Tribunal de se afastar da jurisprudência Robins e avançar na direção do que, a meu ver, é o objetivo subjacente do artigo 8.o, ou seja, a proteção de todos os direitos a pensões profissionais dos aposentados contra o risco de perda causada pela insolvência do empregador.

64.      Neste contexto, a existência de prejuízos desproporcionados pode ser considerada, por si só, como prova, em apoio de uma presunção ilidível, de que o Estado‑Membro não cumpriu a sua obrigação de meios de garantir tal proteção.

65.      Seja como for, penso que o Tribunal de Justiça deveria ter mais em conta a importância da proporcionalidade do prejuízo sofrido.

66.      Em qualquer análise adequada da proporcionalidade, é óbvio que o contexto é extremamente importante. Recorde‑se que a provisão para pensões de reforma faz parte da estrutura do contrato social nos Estados europeus desde os tempos de Bismarck. O investimento em planos de pensões privados constitui, por sua vez, para alguns trabalhadores assalariados uma parte essencial deste contrato social, pois é através deste mecanismo que os que estão empregados durante a sua vida ativa podem poupar para a reforma com a convicção de que assim estarão a tomar as devidas providências para si próprios e para a sua família, uma vez chegados à idade da reforma. Constituir provisão em regime de pensão privada é, portanto, para muitos trabalhadores do setor privado uma decisão financeira tão importante quanto, por exemplo, comprar uma casa ou providenciar para o futuro dos filhos, no que respeita à sua educação.

67.      É por isso que mesmo uma perda parcial do direito a pensão em virtude da insolvência de um empregador é um assunto tão grave e sério para o respetivo trabalhador. O trabalhador em questão não só deve ter o sentimento de que os seus melhores planos de poupança prudente para a reforma se frustraram devido a fatores externos sobre os quais não exerce qualquer controlo, mas, além disso, a sua capacidade de reagir a essa perda revela‑se, muitas vezes, seriamente comprometida por motivos de velhice e de doença. Portanto, muito simplesmente, a capacidade de, digamos, uma pessoa com 70 anos para compensar esse prejuízo financeiro ficará gravemente prejudicada, visto que, para todos os efeitos, a perspetiva de reingressar no mercado de trabalho não é uma opção viável para a maioria dos aposentados.

68.      A salvaguarda dos interesses destes aposentados, que investiram em pensões privadas, contra prejuízos resultantes da insolvência do antigo empregador, é, portanto, um objetivo político fundamental dos Estados‑Membros. É, à sua maneira, tão indispensável quanto é dispor de um sistema de educação ou habitação ou proteger a segurança dos depósitos bancários.

69.      Neste contexto, quando interrogados na audiência sobre se, por exemplo, uma redução de 25 % dos direitos a pensão em virtude da insolvência do empregador representaria um prejuízo desproporcionado para o aposentado em causa, tanto os representantes da PSV como do Governo alemão admitiram livremente que tal seria penoso para o aposentado em questão. Mas não posso deixar de pensar que um prejuízo destes é algo mais do que isso: representaria uma perda imprevista dos rendimentos em relação aos quais tinham todas as razões para crer que deles iriam beneficiar quando as suas vidas profissionais chegassem ao fim. O Estado social moderno existe precisamente para proteger os seus cidadãos contra este tipo de perdas potencialmente graves.

70.      Este é, portanto, o contexto no qual a proporcionalidade de qualquer perda deve ser apreciada. Outros fatores são, sem dúvida, também relevantes, nomeadamente a questão de saber se o montante da pensão que o aposentado e as pessoas a seu cargo recebem atualmente, é suficiente para as fazer face às suas necessidades tendo em conta o nível de vida das pessoas reformadas que residem no Estado‑Membro em causa (17).

71.      É certo que reduções relativamente pequenas dos direitos a pensões profissionais podem, em geral, ser consideradas de minimis ou, pelo menos, como situando‑se a um nível que não afeta a essência do direito a pensão e a correspondente expectativa do aposentado em causa.

72.      No entanto, quando a perda que afeta a pensão privada em virtude da insolvência do empregador não pode ser considerada como sendo de minimis, o espetro da desproporcionalidade vislumbrar‑se‑á algures no tempo, mesmo que também não exista uma qualquer fórmula mágica que torne essa perda automaticamente desproporcionada. Contrariamente ao que quer que o Tribunal de Justiça possa ter sugerido anteriormente, considero que, em muitos casos, uma perda inferior a 50 % dos direitos a pensão em razão da insolvência do empregador será desproporcionada. Os direitos de pensão da maioria dos aposentados são relativamente modestos e mesmo uma pequena redução dessa pensão seria muito difícil de suportar.

73.      Embora se trate de uma matéria que, em última análise, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar, o representante de G. Bauer alegou, na audiência, que a perda da sua pensão profissional poderá situar‑se entre 30 % a 33 % (consoante a idade). Assim sendo e tendo em conta o nível relativamente modesto em que foi fixado o seu direito a pensão profissional, mesmo quando pago a 100 %, é difícil concluir que a perda em questão não é desproporcionada tendo em conta o contexto geral do artigo 8.o que acabei de descrever.

74.      Para resumir, considero que estes são fatores que se repercutem na questão da proporcionalidade que talvez não tenham sido suficientemente destacados na jurisprudência até à data.

75.      Nesta medida, considero, portanto, que o Tribunal de Justiça deve afastar‑se de decisões, como o Acórdão Robins, e responder à segunda questão no sentido de que as circunstâncias a que o Tribunal de Justiça se referiu no n.o 35 do Acórdão de 24 de novembro de 2016, Webb‑Säman (C-454/15, EU:C:2016:891), são aquelas em que o requerente faz prova de que o Estado‑Membro não cumpriu a sua obrigação de se certificar de que sejam tomadas as medidas necessárias para proteger os interesses dos trabalhadores assalariados e das pessoas que tenham deixado a empresa da entidade patronal, e em que a redução dos direitos à pensão se situe num nível que não é de minimis ou que de outra forma lesa a essência do direito à pensão privada que, se não tivesse havido insolvência do empregador, o aposentado tinha todas as razões para esperar receber.

C.      Quanto à terceira questão

76.      Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, no caso de um Estado‑Membro não transpor corretamente a Diretiva 2008/94 para o direito nacional, o artigo 8.o pode ser invocado contra este Estado‑Membro perante um tribunal nacional.

77.      A este respeito, como expliquei anteriormente, o Tribunal de Justiça, no princípio cauteloso, decidiu que, dado que nem o artigo 8.o da diretiva nem qualquer outra disposição da mesma contêm elementos que permitam estabelecer com precisão o nível mínimo exigido para a proteção dos direitos a prestações, a responsabilidade do Estado‑Membro em causa depende da declaração de uma violação manifesta e grave, por parte do referido Estado, dos limites que se impõem ao seu poder de apreciação (18).

78.      No acórdão Hampshire (19), o Tribunal de Justiça abandonou alguma da sua cautela anterior e declarou, no que diz respeito à obrigação de os Estados‑Membros garantirem pelo menos metade das prestações de velhice a que os trabalhadores normalmente teriam direito, que o artigo 8.o pode ser invocado contra o Estado‑Membro perante um tribunal nacional sempre que um trabalhador sofra uma perda superior a 50 % das suas prestações.

79.      Para chegar a esta conclusão, o Tribunal de Justiça recordou que, de acordo com a jurisprudência, a disposição de uma diretiva pode ser invocada pelos litigantes contra um Estado‑Membro se esta disposição for incondicional e suficientemente precisa, e que esse exame deverá incidir sobre três aspetos, a saber: a determinação dos beneficiários da proteção prevista por esta disposição, o conteúdo desta proteção e a identidade do devedor da referida proteção (20).

80.      Concordo plenamente com a análise do Tribunal de Justiça a este respeito, ainda que o seu raciocínio sobre a identidade do devedor da proteção concedida pelo artigo 8.o também mereça ser contextualizado.

81.      No que diz respeito à identidade dos beneficiários da proteção consagrada no artigo 8.o da Diretiva 2008/94, decorre claramente do teor do referido artigo que esta diretiva visa proteger os trabalhadores assalariados afetados pela insolvência do seu empregador (21).

82.      No que se refere à identidade do devedor da proteção prevista no artigo 8.o da Diretiva 2008/94, resulta da própria redação do artigo 8.o que este designa, clara e incondicionalmente, para esse efeito, os Estados‑Membros.

83.      É certo que o artigo 8.o deixa aos Estados‑Membros uma certa margem de apreciação. Esta margem refere‑se, no entanto, essencialmente aos meios a adotar para garantir o cumprimento do artigo 8.o (22). Por conseguinte, não trata da identidade dos devedores da proteção prevista no artigo 8.o, que são os Estados‑Membros.

84.      Por último, quanto ao conteúdo da proteção prevista no artigo 8.o da Diretiva 2008/94, apesar de os Estados‑Membros disporem de uma ampla margem para determinar a forma e o método de transposição do artigo 8.o (23), este artigo pode ser diretamente invocado perante os tribunais nacionais. Com efeito, mesmo quando os Estados‑Membros dispõem de uma certa margem de apreciação, a disposição pode ser invocada se o Estado‑Membro exceder esta margem, principalmente se o seu direito nacional não garantir a proteção mínima exigida por esta disposição (24).

85.      Daqui resulta que, no que respeita à proteção mínima exigida pelo artigo 8.o, uma vez que o Tribunal de Justiça declarou que essa proteção mínima consiste na obrigação de proteger os trabalhadores contra uma redução que seja superior 50 % dos seus direitos adquiridos, se um Estado‑Membro não conceder tal proteção, deve necessariamente deduzir‑se que o Estado‑Membro excedeu a sua margem de manobra. Por conseguinte, tal violação pode ser invocada diretamente contra esse Estado‑Membro.

86.      Quanto à obrigação, referida no n.o 35 do Acórdão Webb‑Säman (25), de os Estados‑Membros assegurarem a adoção das medidas necessárias para evitar um prejuízo desproporcionado, é verdade que o Tribunal de Justiça não indicou a situação à qual essa obrigação se referia. Deve, porém, recordar‑se que uma obrigação pode ser considerada clara e precisa não só quando a mesma se encontra expressamente prevista num texto, mas igualmente quando pode ser inferida desse texto através de métodos de interpretação comummente aceites, como sucede, em minha opinião, no caso em apreço, uma vez que pode inferir‑se da redação do artigo 8.o que este último protege na íntegra os direitos detidos pelos trabalhadores assalariados.

87.      Contudo, uma vez que o Estado‑Membro em causa tem apenas uma obrigação de meios, os demandantes devem demonstrar que as medidas tomadas não são suficientes para garantir tal proteção, desde que a existência de um prejuízo desproporcionado seja considerada prova que sustente a presunção dessa insuficiência.

88.      Além disso, deve salientar‑se que a proteção conferida pelo artigo 8.o diz respeito aos direitos adquiridos ou em vias de aquisição, conceito cuja definição se baseia no direito nacional, e não aos efeitos financeiros inerentes a esses direitos. Com efeito, podem ser implementados dois tipos de regimes complementares de previdência: os «regimes de prestações definidas» e os «regimes de contribuições definidas» (26). Por conseguinte, se, em direito nacional, os direitos adquiridos por uma pessoa são apenas direitos a participação nos lucros e não, como acontece no direito alemão, direitos a prestações definidas, o Estado‑Membro deve garantir que o trabalhador assalariado beneficia efetivamente de tais direitos na íntegra, sem prejuízo do montante que será, em última análise, pago ao trabalhador.

89.      Em resumo, proponho que se responda afirmativamente à terceira questão, ou seja, que o artigo 8.o da Diretiva 2008/94 tem efeito direto, pelo que, sempre que um Estado‑Membro não transponha a diretiva para o direito nacional ou tenha feito uma transposição incorreta, esta disposição confere direitos ao particular que podem ser invocados contra o Estado‑Membro perante um órgão jurisdicional nacional.

D.      Quanto à quarta questão

90.      Com a sua quarta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se, em matéria de planos de pensões profissionais, quando o Estado‑Membro tiver designado — com efeitos vinculativos para os empregadores — uma entidade de direito privado como organismo responsável pelo seguro de insolvência para as reformas profissionais e, no caso de essa entidade estar sujeita à supervisão dos serviços financeiros de um organismo estatal e, além disso, por força de normas de direito público, cobra aos empregadores as contribuições necessárias para o seguro de insolvência e que pode, como se de uma autoridade pública se tratasse, fixar os pressupostos para a execução coerciva de tais contribuições mediante um ato administrativo, é um organismo público desse Estado‑Membro.

91.      A este respeito, importa recordar que o Tribunal de Justiça já declarou que qualquer disposição de uma diretiva que seja incondicional e suficientemente precisa pode ser invocada pelos litigantes, não só contra um Estado‑Membro e todos os órgãos da sua Administração, como as autoridades descentralizadas, mas também contra instituições, organismos e entidades que estejam sujeitos à autoridade ou ao controlo do Estado ou que disponham de poderes exorbitantes em relação àqueles que resultam das normas aplicáveis às relações entre particulares (27).

92.      Tais instituições, organismos e entidades distinguem‑se dos particulares e devem ser equiparados ao Estado, quer porque são pessoas coletivas de direito público que fazem parte do Estado em sentido lato, quer porque foram incumbidos, por uma autoridade pública, de exercer uma missão de interesse público e foram dotados, para esse efeito, dos referidos poderes exorbitantes (28).

93.      Uma vez que, na questão submetida, o órgão jurisdicional de reenvio refere um caso em que um Estado‑Membro designou — com efeitos vinculativos para os empregadores — como organismo de garantia contra o risco de insolvência para as reformas profissionais, uma determinada entidade, concedendo‑lhe o direito de cobrar aos empregadores, ao abrigo das normas de direito público, as contribuições necessárias para o seguro de insolvência, tal entidade deve ser equiparada ao Estado, mesmo sendo de direito privado.

94.      No entanto, para que uma obrigação decorrente de uma diretiva seja diretamente exigível a uma entidade, as missões de interesse público que lhe foram confiadas devem incluir, explícita ou implicitamente, a execução desta obrigação. Com efeito, o simples facto de uma entidade ter sido dotada de poderes exorbitantes por um Estado‑Membro não significa que essa entidade possa ser considerada responsável por qualquer obrigação imposta ao Estado‑Membro em causa pelo direito da União.

95.      Na sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio refere‑se a uma situação em que um Estado‑Membro designou uma instituição como responsável pela garantia das pensões profissionais. No entanto, os autos do processo, em conjugação com as informações fornecidas na audiência, parecem demonstrar que as missões transferidas pelo Governo alemão para a Pensions‑Sicherungs‑Verein VVaG dizem apenas respeito às situações em que o empregador concedeu a pensão de reforma através de uma promessa direta ou de uma Direktversicherung (seguro direto) ou através de uma «Unterstützungskasse» (organismo de seguros que é juridicamente independente do empregador) ou de um «Pensionsfonds» (fundo de pensões)(29). Assim, o caso em que a reforma profissional é concedida pelo empregador através de uma Pensionskasse, concretamente, a PKDW, não é abrangido por nenhuma dessas missões.

96.      Em todo o caso, cabe ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar a natureza específica da obrigação invocada — isto é, a violação da obrigação de evitar qualquer perda desproporcionada referida referidas no n.o 35 do Acórdão Webb‑Sämann (30), quer a obrigação específica tenha ou não sido delegada por esse Estado‑Membro a essa entidade (31).

97.      Consequentemente, proponho que se responda à quarta questão que, quando, em matéria de pensões profissionais, o Estado‑Membro tiver designado, com efeitos vinculativos para os empregadores, uma entidade de direito privado como organismo de garantia contra o risco de insolvência para as reformas profissionais e, quando essa entidade estiver sujeita à supervisão dos serviços financeiros de um organismo estatal e, além disso, por força de normas de direito público, cobrar aos empregadores as contribuições necessárias para o seguro de insolvência e, como se de uma autoridade pública se tratasse, puder fixar os pressupostos para a execução coerciva de tais contribuições mediante um ato administrativo, tal organismo deve ser considerado um organismo público desse Estado‑Membro. No entanto, o incumprimento da obrigação prevista pelo artigo 8.o da Diretiva 2008/94 só pode ser invocado contra essa entidade se o cumprimento da obrigação se enquadrar nos limites da missão que lhe foi conferida pelo referido Estado, o que cabe ao órgão jurisdicional nacional determinar.

IV.    Conclusão

98.      À luz das considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda às questões submetidas pelo Bundesarbeitsgericht (Tribunal Federal do Trabalho, Alemanha) da seguinte forma:

1)      O artigo 8.o da Diretiva 2008/94/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, relativa à proteção dos trabalhadores assalariados em caso de insolvência do empregador (JO L 283, p. 36), deve ser interpretado no sentido de que abrange a perda de um pagamento, como o que está em causa no processo principal, efetuado por um antigo empregador para compensar, conforme exigido pelo direito nacional, uma redução de uma reforma profissional.

2)      As circunstâncias a que o Tribunal de Justiça fez referência no n.o 35 do Acórdão de 24 de novembro de 2016, Webb‑Sämann (C-454/15, EU:C:2016:891), são aquelas em que o requerente faz prova de que o Estado‑Membro não cumpriu a sua obrigação de se certificar de que sejam tomadas as medidas necessárias para proteger os interesses dos trabalhadores assalariados e das pessoas que tenham deixado a empresa da entidade patronal, e em que a redução dos direitos à pensão se situe num nível que não é de minimis ou que de outra forma lesa a essência do direito à pensão privada que, se não tivesse havido insolvência do empregador, o aposentado tinha todas as razões para esperar receber.

3)      O artigo 8.o da Diretiva 2008/94/CE do Parlamento Europeu e do Conselho tem efeito direto, pelo que, sempre que um Estado‑Membro não transponha a diretiva para o direito nacional ou tenha feito uma transposição incorreta, esta disposição confere direitos ao particular que podem ser invocados contra o Estado‑Membro perante um órgão jurisdicional nacional.

4)      Quando, em matéria de pensões profissionais, o Estado‑Membro tiver designado, com efeitos vinculativos para os empregadores, uma entidade de direito privado como organismo de garantia contra o risco de insolvência para as reformas profissionais e, quando essa entidade estiver sujeita à supervisão dos serviços financeiros de um organismo estatal e, além disso, por força de normas de direito público, cobrar aos empregadores as contribuições necessárias para o seguro de insolvência e, como se de uma autoridade pública se tratasse, puder fixar os pressupostos para a execução coerciva de tais contribuições mediante um ato administrativo, tal organismo deve ser considerado um organismo público desse Estado‑Membro. No entanto, o incumprimento da obrigação prevista pelo artigo 8.o da Diretiva 2008/94 só pode ser invocado contra essa entidade se o cumprimento da obrigação se enquadrar nos limites da missão que lhe foi conferida pelo referido Estado, o que cabe ao órgão jurisdicional nacional determinar.


1      Língua original: inglês.


2      Além disso, o demandante [ora recorrido] obteve, através das suas próprias contribuições, um aumento no valor da pensão paga pelo fundo de pensões. Este montante adicional não é afetado pelo presente pedido de decisão prejudicial. Além disso, o órgão jurisdicional de reenvio não especificou o montante da pensão do Estado de que o demandante [ora recorrido] estava a beneficiar.


3      Desde 2013, continua a ser aplicada a cada ano uma redução de 1,25 %.


4      O conceito de insolvência é definido no artigo 2.o, n.o 1, da diretiva.


5      Com efeito, o artigo 9.o, n.o 1, alínea e), da Diretiva 2003/41 prevê: «Em relação a cada instituição situada no seu território, cada Estado‑Membro assegura que […] se a empresa contribuinte garantir o pagamento das prestações de reforma, fica obrigada a assegurar o seu financiamento regular» (o sublinhado é meu). A contrario, isto significa que o direito da União não exige que os Estados‑Membros garantam que o empregador cumpre tal pagamento.


6      V. Acórdão de 25 de abril de 2013, Hogan e o. (C‑398/11, EU:C:2013:272, n.os 35 a 40). Nos processos em que o Tribunal já se pronunciou, ou decorre da descrição dos factos feita pelo órgão jurisdicional de reenvio que o empregador se comprometeu a garantir o pagamento ou o Tribunal de Justiça partiu do princípio de que era esse o caso.


7      V, por analogia, no que respeita ao conceito de «indemnização» utilizado no artigo 3.o, n.o 1, Acórdão de 28 de junho de 2018, Checa Honrado (C‑57/17, EU:C:2018:512, n.o 30).


8      No que diz respeito à Diretiva 77/187, que faz parte do mesmo pacote legislativo que a Diretiva 80/987, a Comissão abandonou a sua ideia inicial de regulamentar a transferência dos direitos à pensão complementar de uma forma harmonizada, nos termos do artigo 3.o, na medida em que «os requisitos, a forma e a natureza das obrigações em matéria de pensões são tão diferentes e as maneiras como se estruturam tão variadas que não é possível estabelecer regras comunitárias específicas na diretiva». V. Conclusões do advogado‑geral M. Bobek no Acórdão Webb‑Sämann (C‑454/15, EU:C:2016:653, n.o 62).


9      Acórdão de 25 de janeiro de 2007, Robins e o. (C-278/05, EU:C:2007:56, n.o 41).


10      V., neste sentido, Acórdão de 27 de março de 2014, UPC Telekabel Wien (C‑314/12, EU:C:2014:192, n.os 52 e 53).


11      Acórdão de 25 de abril de 2013, Hogan e o. (C‑398/11, EU:C:2013:272, n.o 43).


12      Contudo, ao decidir neste sentido, o Tribunal de Justiça afastou‑se da ideia de uma obrigação de meios.


13      N.o 50.


14      Acórdão de 24 de novembro de 2016, Webb‑Sämann (C‑454/15, EU:C:2016:891).


15      Acórdão de 6 de setembro de 2018, Hampshire (C‑17/17, EU:C:2018:674).


16      Como o Tribunal de Justiça estipula, os Estados‑Membros têm uma obrigação de resultado «a este respeito», nomeadamente no que diz respeito à garantia dos 50 %. Acórdão de 24 de novembro de 2016, Webb‑Sämann (C‑454/15, EU:C:2016:891, n.o 35).


17      É verdade que, no Acórdão Hogan e o. (n.o 33), o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 8.o da Diretiva 2008/94 deve ser interpretado no sentido de que, para determinar se um Estado‑Membro executou a obrigação prevista neste artigo, não podem ser tidas em conta as prestações da pensão legal. No entanto, penso que, quando o Tribunal de Justiça fez esta afirmação, apenas teve em conta o limiar de 50 %. Em primeiro lugar, quando este acórdão foi proferido, a solução adotada no Acórdão Webb‑Sämann e Hampshire ainda não tinha sido encontrada. Em segundo lugar, do ponto de vista lógico, do facto de o artigo 8.o só se aplicar aos créditos relativos a regimes complementares de previdência profissionais ou interprofissionais existentes para além dos regimes legais nacionais de segurança social, não se pode inferir que as prestações de pensão do Estado não podem ser tidas em conta ao apreciar se um Estado‑Membro cumpriu a obrigação prevista neste artigo. Com efeito, o alcance de uma garantia é diferente do montante da sua cobertura. No domínio da segurança social, o pagamento da indemnização é, frequentemente, decidido em função de uma determinada situação (invalidez, deficiência grave, orfandade), mas a quantia varia em função de fatores externos, tais como a totalidade dos rendimentos auferidos. No entanto, a interpretação dada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Hogan e o. está correta da perspetiva da regra dos 50 %, uma vez que, por definição, para analisar se a redução efetuada supera esse limite, só há que ter em consideração um regime de previdência profissional ou interprofissional.


18      Acórdão de 25 de janeiro de 2007, Robins e o. (C‑278/05, EU:C:2007:56, n.os 80 e 82).


19      Acórdão de 6 de setembro de 2018 (C‑17/17, EU:C:2018:674).


20      Ibid., n.o 56.


21      Ibid., n.o 57.


22      V., neste sentido, Acórdão de 18 de outubro de 2001, Gharehveran (C‑441/99, EU:C:2001:551, n.o 44).


23      V. Acórdãos de 25 de janeiro de 2007, Robins (C‑278/05, EU:C:2007:56, n.os 36 a 45), e de 25 de julho de 2018, Guigo (C‑338/17, EU:C:2018:605, n.os 30 e 31).


24      V., neste sentido, Acórdão de 25 de abril de 2013, Hogan e o. (C‑398/11, EU:C:2013:272, n.o 46).


25      Acórdão de 24 de novembro de 2016, Webb Sämann (C‑454/15, EU:C:2016:891).


26      Como os nomes indicam, num plano de prestações definidas de reforma, a pessoa em questão recebe uma pensão fixa — o que pode exigir que o empregador contribua com fundos para o plano em caso de mau desempenho dos investimentos realizados —, ao passo que o montante recebido num plano de contribuição definida depende do rendimento dos investimentos efetuados com uma contribuição fixa paga pelo empregador.


27      V. Acórdão de 10 de outubro de 2017, Farrell (C‑413/15, EU:C:2017:745, n.o 33).


28      Ibid., n.o 34.


29      V. § 7, primeira alínea, da Lei relativa às Pensões.


30      Acórdão de 24 de novembro de 2016, Webb‑Sämann (C‑454/15, EU:C:2016:891).


31      Nos Acórdãos de 16 de dezembro de 1993, Wagner Miret (C‑334/92, EU:C:1993:945, n.o 18) e de 18 de outubro de 2001, Gharehveran (C‑441/99, EU:C:2001:551, n.o 38), o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 3.o da Diretiva 80/987 (atual artigo 3.o da Diretiva 2008/94) dispõe que «a diretiva sobre a insolvência dos empregadores não obriga os Estados‑Membros a criar uma mesma instituição de garantia para todas as categorias de trabalhadores e, por consequência, a fazer depender o pessoal de direção da instituição de garantia criada para as demais categorias de trabalhadores assalariados».