Language of document : ECLI:EU:T:2023:101

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção alargada)

1 de março de 2023 (*)

«União aduaneira — Regulamento (UE) n.o 952/2013 — Determinação da origem não preferencial de certos motociclos fabricados pela Harley‑Davidson — Decisão de execução da Comissão que pede a revogação de decisões relativas às informações vinculativas em matéria de origem adotadas pelas autoridades aduaneiras nacionais — Conceito de “operações de complemento de fabrico ou de transformação […] economicamente não justificadas” — Direito de audiência»

No processo T‑324/21,

HarleyDavidson Europe Ltd, com sede em Oxford (Reino Unido),

Neovia Logistics Services International, com sede em Vilvoorde (Bélgica),

representadas por O. Van Baelen, G. Lebrun, advogados, e T. Lyons, KC,

recorrentes,

contra

Comissão Europeia, representada por F. Clotuche‑Duvieusart e M. Kocjan, na qualidade de agentes,

recorrida,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção alargada),

composto, nas deliberações, por S. Papasavvas, presidente, J. Svenningsen, M. Jaeger, C. Mac Eochaidh (relator) e T. Pynnä, juízes,

secretária: I. Kurme, administradora,

vista a fase escrita do processo,

após a audiência de 21 de setembro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1        Com o presente recurso, com base no artigo 263.o TFUE, as recorrentes, Harley‑Davidson Europe Ltd (a seguir, conjuntamente com o grupo a que pertence, «Harley‑Davidson») e a Neovia Logistics Services International (a seguir «Neovia»), pedem a anulação da Decisão de Execução (UE) 2021/563 da Comissão, de 31 de março de 2021, sobre a validade de certas decisões relativas às informações vinculativas em matéria de origem (JO 2021, L 119, p. 117, a seguir «decisão recorrida»), dirigida ao Reino da Bélgica. Através dessa decisão, a Comissão Europeia pediu a revogação de duas decisões relativas a informações vinculativas em matéria de origem (a seguir «decisões IVO»), adotadas a favor da Neovia por conta da Harley‑Davidson, quanto à importação para a União Europeia, através da Bélgica, de determinadas categorias de motociclos fabricados pela Harley‑Davidson na Tailândia.

I.      Quadro jurídico

2        Nos termos do seu artigo 1.o, o Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013, que estabelece o Código Aduaneiro da União (JO 2013, L 269, p. 1, a seguir «Código Aduaneiro»), estabelece o Código Aduaneiro da União que determina as normas e procedimentos gerais aplicáveis às mercadorias à entrada ou à retirada do território aduaneiro da União.

3        O título II do código aduaneiro, intitulado «Elementos com base nos quais são aplicados os direitos de importação ou de exportação, bem como outras medidas previstas no âmbito do comércio de mercadorias», contém, nomeadamente, normas em matéria de determinação da origem das mercadorias, que servem, nomeadamente, para determinar os direitos de importação e as outras medidas que se aplicam a determinadas mercadorias.

4        Particularmente, nos termos do artigo 56.o, n.o 1, do código aduaneiro, que figura no referido título II, os direitos de importação ou de exportação devidos baseiam‑se na pauta aduaneira comum e as outras medidas estabelecidas por disposições específicas da União no âmbito do comércio de mercadorias são, se for caso disso, aplicadas em função da classificação pautal dessas mercadorias.

A.      Quanto à origem das mercadorias

5        O código aduaneiro prevê três categorias de regras para a determinação da origem das mercadorias, a saber, regras relativas à origem não preferencial de mercadorias, regras relativas à origem preferencial de mercadorias e regras de determinação da origem de mercadorias específicas.

6        Particularmente, o artigo 59.o do código aduaneiro dispõe que os artigos 60.o e 61.o definem as normas para a determinação da origem não preferencial das mercadorias para efeitos da aplicação, primeiro, da pauta aduaneira comum, com exceção das medidas referidas no artigo 56.o, n.o 2, alíneas d) e e), segundo, das medidas não pautais estabelecidas por disposições específicas da União no âmbito do comércio de mercadorias e, terceiro, outras medidas da União relacionadas com a origem das mercadorias.

7        Assim, o artigo 60.o do código aduaneiro, relativo à aquisição da origem não preferencial das mercadorias, dispõe:

«1. Consideram‑se originárias de um único país ou território as mercadorias inteiramente obtidas nesse país ou território.

2. Considera‑se que uma mercadoria em cuja produção intervêm dois ou mais países ou territórios é originária do país ou território onde se realizou o último processamento ou operação de complemento de fabrico substancial, economicamente justificado, efetuado numa empresa equipada para esse efeito, que resulte na obtenção de um produto novo ou que represente uma fase importante do fabrico.»

8        De acordo com o artigo 62.o do Código Aduaneiro, a Comissão fica habilitada a adotar atos delegados, nos termos do artigo 284.o, que estabeleçam as regras por força das quais se considera que as mercadorias cuja determinação da origem não preferencial é necessária, para efeitos de aplicação das medidas da União referidas no artigo 59.o, foram inteiramente obtidas num mesmo país ou território ou foram objeto do último processamento ou operação de complemento de fabrico substancial, economicamente justificado, efetuado numa empresa equipada para esse efeito, que resulte na obtenção de um produto novo ou que represente uma fase importante do fabrico, num dado país ou território, em conformidade com o artigo 60.o

9        A este título, a Comissão adotou o Regulamento Delegado (UE) 2015/2446 da Comissão, de 28 de julho de 2015, que completa o Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, com regras pormenorizadas relativamente a determinadas disposições do Código Aduaneiro da União (JO 2015, L 343, p. 1, a seguir «AD‑CAU»).

10      O artigo 33.o do AD‑CAU fornece precisões relativas às operações de complemento de fabrico ou transformações que não sejam economicamente justificadas. Esse artigo dispõe:

«Uma operação de complemento de fabrico ou de transformação realizada noutro país ou território deve ser considerada economicamente não justificada se for estabelecido com base nos dados disponíveis que o objetivo dessa operação era evitar a aplicação das medidas previstas no artigo 59.o do Código [aduaneiro, que diz respeito à aplicação da pauta aduaneira comum e a outras medidas, pautais ou não, relativas à origem das mercadorias importadas na União].

[…]»

B.      Quanto às decisões em matéria de origem

11      O artigo 33.o do código aduaneiro, relativo às decisões em matéria de informações vinculativas, dispõe:

«1. As autoridades aduaneiras tomam decisões, mediante pedido, relativamente a informações pautais vinculativas (decisões IPV) ou decisões relativas a informações vinculativas em matéria de origem (decisões IVO).

[…]

3. As decisões IPV e as decisões IVO são válidas pelo prazo de três anos a contar da data em que a decisão produz efeitos.

[…]»

12      O artigo 19.o do Regulamento de Execução (UE) 2015/2447 da Comissão, de 24 de novembro de 2015, que estabelece as regras de execução de determinadas disposições do Regulamento n.o 952/2013 (JO 2015, L 343, p. 558), institui um intercâmbio de dados relativos a decisões IVO, e enuncia nomeadamente, no seu n.o 1, que «[a]s autoridades aduaneiras transmitem à Comissão os dados pertinentes relativos às decisões IVO numa base trimestral» que adotaram.

13      O artigo 34.o, n.o 11, do código aduaneiro precisa:

«A Comissão pode tomar decisões que exijam que os Estados‑Membros revoguem decisões IPV ou IVO, a fim de garantir a correta e uniforme classificação pautal ou a determinação da origem das mercadorias.»

14      O artigo 37.o, n.o 2, do código aduaneiro enuncia, nomeadamente, que a Comissão adota as decisões que exijam que os Estados‑Membros revoguem as decisões IVO, por meio de atos de execução adotados pelo procedimento consultivo a que se refere o artigo 285.o, n.o 2, do código aduaneiro.

15      Resulta destas disposições que, esquematicamente, as autoridades aduaneiras nacionais podem, a pedido de importadores que pretendam obter garantias quanto à interpretação das regras que permitam definir a origem não preferencial de mercadorias importadas na União, adotar decisões que reconheçam oficialmente a origem geográfica das referidas mercadorias. Além disso, a Comissão, que é regularmente informada por essas autoridades, pode, por seu turno, se considerar a posteriori que essa determinação da origem pelas referidas autoridades aduaneiras não está correta, pedir‑lhes que revoguem as decisões adotadas.

C.      Quanto às medidas de política comercial

16      Nos termos do artigo 5.o, ponto 36, do código aduaneiro, as «medidas de política comercial» são as medidas não pautais estabelecidas no âmbito da política comercial comum sob a forma de disposições da União que regem o comércio internacional de mercadorias.

17      A esse respeito, o legislador da União adotou o Regulamento (UE) n.o 654/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, relativo ao exercício dos direitos da União tendo em vista a aplicação e o cumprimento das regras do comércio internacional, e que altera o Regulamento (CE) n.o 3286/94 do Conselho que estabelece procedimentos comunitários no domínio da política comercial comum, a fim de garantir o exercício dos direitos da Comunidade ao abrigo das regras do comércio internacional, nomeadamente as estabelecidas sob os auspícios da Organização Mundial do Comércio (JO 2014, L 189, p. 50).

18      De acordo com o artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 654/2014, caso seja necessário adotar medidas para salvaguardar os interesses da União nos casos referidos no artigo 3.o, a Comissão adota atos de execução que determinem as medidas de política comercial adequadas.

19      Com base no Regulamento n.o 654/2014, sobretudo no seu artigo 4.o, n.o 1, a Comissão adotou, mais especificamente, o Regulamento de Execução (UE) 2018/886 da Comissão, de 20 de junho de 2018, relativo a certas medidas de política comercial respeitantes a determinados produtos originários dos Estados Unidos da América e que altera o Regulamento de Execução (UE) 2018/724 (JO 2018, L 158, p. 5).

II.    Antecedentes do litígio

20      Em junho de 2018, o Governo dos Estados Unidos da América instituiu direitos aduaneiros adicionais de 25 % e de 10 %, respetivamente, sobre as importações de aço e sobre as importações de alumínio provenientes da União (a seguir «direitos aduaneiros impostos nos termos da section 232 da Lei de 1962 relativa à Expansão do Comércio»), com o objetivo de favorecer e aumentar a produção nacional desses produtos.

21      Em resposta à instituição dos direitos aduaneiros impostos nos termos da section 232 da Lei de 1962 relativa à Expansão do Comércio, a Comissão adotou, em 20 de junho de 2018, o Regulamento 2018/886, que prevê a aplicação de direitos aduaneiros adicionais sobre a importação de produtos originários dos Estados Unidos enumerados nos anexos I e II desse regulamento.

22      Segundo o artigo 2.o, alínea a), e o anexo I do Regulamento 2018/886, previa‑se que os produtos correspondentes ao código de nomenclatura 8711 50 00, a saber, as «[m]otocicletas […] [c]om motor de pistão de cilindrada superior a 800 cm3», fossem objeto, numa primeira fase, de direitos aduaneiros adicionais de uma taxa de 25 % a partir de 22 de junho de 2018.

23      Além disso, segundo o artigo 2.o, alínea b), e o anexo II do Regulamento 2018/886, que visavam igualmente os produtos correspondentes ao código da nomenclatura 8711 50 00, esses produtos eram objeto, numa segunda fase, de direitos aduaneiros adicionais de uma taxa de 25 %, a partir, em substância, de 1 de junho de 2021, o mais tardar.

24      Na sequência da publicação no Jornal Oficial da União Europeia do Regulamento 2018/886, a Harley‑Davidson, uma empresa americana especializada na construção de motociclos, estava, portanto, informada da aplicação de direitos aduaneiros adicionais sobre os seus produtos importados para a União a partir dos Estados Unidos de 25 %, a partir de 22 de junho de 2018, e de 25 % suplementares, o mais tardar, a partir de 1 de junho de 2021, além da taxa do direito convencional de 6 %, ou seja, uma taxa total, para os seus motociclos, de 31 % a partir de 22 de junho de 2018, e, posteriormente, de 56 % a partir de 1 de junho de 2021.

25      Em 25 de junho de 2018, a Harley‑Davidson apresentou à Securities and Exchange Commission (comissão das operações de bolsa, Estados Unidos, a seguir «SEC»), um relatório com base num formulário 8‑K (Form 8‑K Current Report, a seguir «formulário 8‑K»). Esse formulário 8‑K destinava‑se a informar os seus acionistas da aplicação dos direitos aduaneiros adicionais acima mencionados no n.o 24 e das suas consequências sobre a sua atividade. Nesse formulário, a Harley‑Davidson comunicou a sua intenção de transferir a produção de certos motociclos destinados ao mercado da União dos Estados Unidos para as suas instalações internacionais situadas noutro país, a fim de evitar as medidas em causa da política comercial da União.

26      No formulário 8‑K, Harley‑Davidson indicou, especialmente, o seguinte:

«A União Europeia adotou direitos aduaneiros sobre diversos produtos fabricados nos Estados Unidos, entre os quais os motociclos Harley‑Davidson. Estes direitos, que entraram em vigor em 22 de junho de 2018, foram impostos em resposta aos direitos aduaneiros que os Estados Unidos instituíram sobre o aço e sobre o alumínio exportados da [União] para os EUA.

Por conseguinte, os direitos aduaneiros da [União] sobre os motociclos Harley‑Davidson exportados a partir dos Estados Unidos passaram de 6 % para 31 %. A Harley‑Davidson considera que estes direitos aduaneiros provocarão um custo suplementar de cerca de 2 200 dólares dos Estados Unidos por motociclo exportado dos EUA para a [União].

[…]

Para fazer frente ao custo substancial deste encargo pautal a longo prazo, a Harley‑Davidson irá executar um plano destinado a deslocar a produção de motociclos destinados à [União] dos EUA para as suas instalações internacionais, a fim de evitar o encargo pautal. A Harley‑Davidson prevê que o aumento da produção nas fábricas internacionais necessitará de investimentos suplementares e pode durar, pelo menos, 9 a 18 meses antes de estar completamente concluído.»

27      Na sequência da publicação do formulário 8‑K, a Harley‑Davidson escolheu a sua fábrica da Tailândia como instalação de produção de alguns dos seus motociclos destinados ao mercado da União.

28      A Harley‑Davidson pretendeu obter garantias a respeito da determinação do país de origem dos motociclos produzidos na sua fábrica da Tailândia e destinados ao mercado da União. Assim, a Harley‑Davidson e a Neovia, um intermediário que lhe presta serviços de assistência logística no âmbito das suas operações de importação de motociclos na União através da Bélgica, apresentaram conjuntamente, em 25 de janeiro de 2019, dois primeiros pedidos formais de decisões IVO, relativos a duas famílias de motociclos, às autoridades aduaneiras belgas. Foram apresentados posteriormente três outros pedidos de decisões IVO, relativos a três outras famílias de motociclos.

29      Em 31 de janeiro de 2019, as autoridades belgas participaram numa reunião com a Comissão a respeito dos pedidos de decisões IVO sobre a importação para a União de duas famílias de motociclos montadas na fábrica Harley‑Davidson na Tailândia. No termo dessa reunião, a Comissão emitiu um parecer informal segundo o qual o critério da justificação económica, na aceção do artigo 33.o do AD‑CAU, poderia não estar preenchido, devido às informações constantes do formulário 8‑K.

30      As autoridades belgas solicitaram uma discussão com os Estados‑Membros sobre a aplicabilidade do artigo 33.o do AD‑CAU, discussão que decorreu na reunião do grupo de peritos aduaneiros, secção «Origem», em 8 de abril de 2019. Nessa reunião, as autoridades belgas explicaram que tinha havido uma alteração do país de montagem de alguns dos motociclos produzidos pela Harley‑Davidson e que essa deslocalização tinha ocorrido na sequência da instituição de direitos aduaneiros adicionais sobre as mercadorias originárias do anterior país de produção, a saber, os Estados Unidos. A ata dessa reunião menciona que «certos delegados confirmaram que, com base nas informações disponíveis, a origem [devia] ser determinada aplicando o artigo 33.o do AD‑CAU, outros delegados não eram dessa opinião. A [Comissão] considera que o artigo 33.o se pode aplicar, tanto mais que o produtor indicou em declarações públicas que o objetivo da deslocalização das operações era evitar a aplicação das medidas na União». Contudo, apesar dos pedidos das autoridades belgas, a Comissão nunca emitiu nenhum parecer formal sobre a aplicabilidade do artigo 33.o do AD‑CAU aos factos do caso presente.

31      Em 24 de junho de 2019, em aplicação do artigo 33.o, n.o 1, do código aduaneiro, as autoridades aduaneiras belgas adotaram duas decisões IVO, pelas quais reconheceram e certificaram que certas categorias de motociclos Harley‑Davidson importados para a União, correspondentes às duas famílias de motociclos acima evocadas no n.o 28, eram originárias da Tailândia. Os três outros pedidos de decisões IVO também acima evocados no n.o 28 foram, posteriormente, objeto do mesmo tratamento pelas autoridades aduaneiras belgas.

32      As decisões IVO em causa foram notificadas à Comissão pelas autoridades aduaneiras belgas em 21 de agosto de 2019.

33      Em 5 de outubro de 2020, a Comissão informou as autoridades belgas da sua intenção de lhes pedir que revogassem as duas primeiras decisões IVO. Em 13 de novembro de 2020, as autoridades belgas responderam à Comissão que se opunham a esse pedido de revogação.

34      Em 22 de dezembro de 2020, a Comissão deu início a um procedimento formal com vista à adoção da decisão recorrida. Em 5 de março de 2021, a Comissão submeteu o projeto de decisão recorrida a todas as delegações nacionais do comité do código aduaneiro, secção «Origem», no âmbito do procedimento consultivo e por procedimento escrito. Quatro Estados‑Membros enviaram observações sobre o projeto de decisão recorrida e opuseram‑se ao parecer expresso pela Comissão nesse projeto.

35      Em 29 de março de 2021, a Comissão enviou uma nota de síntese ao Comité do Código Aduaneiro, secção «Origem», na qual indicou que os 23 Estados‑Membros que não tinham tomado posição tinham, tacitamente, dado o seu acordo com o projeto de decisão recorrida.

36      Em 31 de março de 2021, a Comissão adotou a decisão recorrida, que notificou ao Reino da Bélgica em 6 de abril de 2021 e que foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia no dia seguinte, pedindo às autoridades belgas que revogassem as duas primeiras decisões IVO.

37      Na decisão recorrida, a Comissão indicou:

«6)      Após a publicação das medidas de política comercial da União Europeia, [a Harley Davidson] comunicou, através [do] formulário 8‑K […] à [SEC] o seu plano de transferir a produção de determinados motociclos destinados ao mercado da União Europeia dos Estados Unidos da América para as suas instalações internacionais noutro país, a fim de evitar as medidas de política comercial da União Europeia.

7)      Ainda que a evasão às medidas de política comercial possa não ser necessariamente o único objetivo da transferência da produção, as condições referidas no artigo 33.o, primeiro parágrafo, do [AD‑CAU] estão cumpridas com base nos dados disponíveis. As operações de complemento de fabrico ou de transformação efetuadas no último país de produção são, por conseguinte, consideradas economicamente não justificadas. […]

9)      Uma vez que a determinação da origem não preferencial dos motociclos abrangidos pelas decisões IVO referidas no anexo não se baseia na regra estabelecida no artigo 33.o, terceiro parágrafo, do [AD‑CAU], a Comissão considera que esta determinação da origem não preferencial é incompatível com o artigo 60.o, n.o 2, do Código [Aduaneiro], em conjugação com o artigo 33.o do [AD‑CAU].»

38      Na sequência da adoção da decisão recorrida, as autoridades belgas informaram as recorrentes, por carta de 16 de abril de 2021, de que revogavam as cinco decisões IVO adotadas relativamente à importação para a União de motociclos fabricados na Tailândia pela Harley‑Davidson.

III. Pedidos das partes

39      As recorrentes concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        anular a decisão recorrida;

—        dar orientações às autoridades aduaneiras da União quanto às consequências úteis que devem retirar do acórdão e ao modo como devem agir para lhe dar execução;

—        ordenar as medidas de organização do processo ou as diligências de instrução que considere adequadas;

—        condenar a Comissão nas despesas.

40      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        negar provimento ao recurso;

—        condenar a recorrente nas despesas.

IV.    Questão de direito

A.      Quanto à competência do Tribunal Geral

41      A Comissão sustenta que o segundo pedido das recorrentes é inadmissível.

42      As recorrentes consideram, no entanto, que pode ser útil dar orientações quanto ao modo de executar o acórdão.

43      A este respeito, basta lembrar que, no âmbito da fiscalização da legalidade baseada no artigo 263.o TFUE, o Tribunal Geral não tem competência para dirigir injunções às instituições, órgãos e organismos da União, mesmo quando digam respeito às modalidades de execução dos seus acórdãos (Despachos de 22 de setembro de 2016, Gaki/Comissão, C‑130/16 P, não publicado, EU:C:2016:731, n.o 14, e de 19 de julho de 2016, Trajektna luka Split/Comissão, T‑169/16, não publicado, EU:T:2016:441, n.o 13).

44      Daí resulta que não se admite o segundo pedido, por incompetência.

B.      Quanto ao mérito

45      As recorrentes invocam seis fundamentos de recurso.

46      O Tribunal Geral considera oportuno examinar o terceiro fundamento e, em seguida, o quarto, o primeiro, o segundo, o quinto e o sexto fundamentos.

1.      Quanto ao terceiro fundamento, relativo a uma utilização abusiva do poder de revogação, dado que se baseia numa interpretação e aplicação incorretas do artigo 33.o do ADCAU

47      Com o terceiro fundamento, as recorrentes alegam que a Comissão cometeu um erro de direito na interpretação que deu ao artigo 33.o do AD‑CAU.

48      Especialmente, as recorrentes alegam que as versões anteriores da regulamentação dispunham que o critério da justificação económica não estava preenchido quando o «único objeto» de uma operação fosse a evasão, e que as diferentes versões linguísticas do artigo 33.o do AD‑CAU evocam sempre «um objetivo» no singular, o que deve ser entendido, pelo menos, como um «objetivo dominante único» ou um «objetivo essencial». Acrescentam que a jurisprudência do Tribunal de Justiça confirmou que a existência de qualquer outro motivo para uma operação, não ligado à evasão, era suficiente para que o critério da justificação económica estivesse preenchido. A este respeito, invocam nomeadamente o Acórdão de 13 de dezembro de 1989, Brother International (C‑26/88, EU:C:1989:637), no qual o Tribunal de Justiça declarou que «a transferência da montagem do país de fabrico dos componentes para outro país em que [fossem] utilizadas instalações já existentes não justifica[va] por si só a presunção de que tal transferência [tinha] por único objetivo iludir as disposições aplicáveis». Ora, segundo as recorrentes, a Comissão não lhes deu a oportunidade de provarem a existência de outros objetivos e nada permite saber se a Comissão examinou as informações que tinham fornecido às autoridades belgas com vista a demonstrar que o critério da justificação económica estava preenchido.

49      Quanto a este último aspeto, as recorrentes sustentam que a decisão da Harley‑Davidson de produzir na Tailândia motociclos destinados ao mercado da União se baseava num conjunto de fatores comerciais sólidos e legítimos e não era uma decisão artificial cujo objetivo essencial fosse contornar os direitos aduaneiros adicionais.

50      As recorrentes comparam igualmente o conceito de «evitar», na aceção do artigo 33.o do AD‑CAU, com os conceitos de «evasão», de «abuso», de «manipulação» e de «subtração», conforme precisados pela jurisprudência. Assim, remetendo para diferentes acórdãos do Tribunal de Justiça nos quais estes conceitos foram abordados e precisados, particularmente em direito fiscal ou em direito antidumping, as recorrentes alegam que, mesmo que o fabrico pela Harley‑Davidson, na Tailândia, de motociclos destinados à União se destinasse principalmente a evitar os direitos aduaneiros adicionais, havia que verificar se não existia mais nenhum objetivo comercial legítimo subjacente às operações de deslocalização, o que a Comissão não fez. Procedendo também por analogia, as recorrentes lembram que o Tribunal de Justiça confirmou por diversas vezes que, no mercado da União, um operador dispunha de uma grande liberdade e estava, por exemplo, autorizado a estruturar a sua atividade de forma que limitasse a sua dívida fiscal.

51      Assim, as recorrentes consideram que a forma como a Comissão aplicou o artigo 33.o do AD‑CAU alterou o critério da justificação económica e transformou um critério originariamente objetivo num critério subjetivo. Segundo as recorrentes, a interpretação feita pela Comissão modifica o objeto do artigo 60.o, n.o 2, do código aduaneiro, com a consequência de que também não há que determinar a origem com base em elementos objetivos, a saber, a natureza da operação efetuada, mas com base em elementos subjetivos, a saber, o raciocínio ou as motivações do produtor. Ora, a apreciação do «objetivo» de uma operação de deslocalização deve assentar numa análise objetiva dos elementos e do contexto da própria operação, análise que a Comissão não efetuou.

52      A Comissão contesta esta argumentação.

53      No caso, há que verificar se a Comissão, ao adotar a decisão recorrida com base no artigo 33.o do AD‑CAU, cometeu um erro de direito ao considerar que a operação de deslocalização, para a Tailândia, do fabrico de certas categorias de motociclos Harley‑Davidson destinados ao mercado da União não podia ser qualificada de «economicamente justificada», uma vez que visava, segundo esta instituição, evitar as medidas de política comercial da União adotadas, a partir de 2018, contra os produtos originários dos Estados Unidos.

54      A esse respeito, há que lembrar que, de acordo com jurisprudência constante, para efeitos de interpretação de uma disposição do direito da União, há que ter em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte. A génese de uma disposição do direito da União pode também apresentar elementos pertinentes para a sua interpretação (v. Acórdão de 2 de setembro de 2021, CRCAM, C‑337/20, EU:C:2021:671, n.o 31 e jurisprudência referida).

55      Nos termos do artigo 60.o, n.o 2, do código aduaneiro (v. n.o 7, supra), para um país ou um território ser considerado local de origem de mercadorias, para efeitos da aplicação das medidas da União relativas à origem das mercadorias importadas, é necessário, nomeadamente, que a última operação de complemento de fabrico ou de transformação substancial seja efetuada nesse local e seja «economicamente justificada».

56      O artigo 33.o do AD‑CAU, com a epígrafe «Operações de complemento de fabrico ou de transformação que não sejam economicamente justificadas», precisa, no seu primeiro parágrafo, que «[u]ma operação de complemento de fabrico ou de transformação realizada noutro país ou território deve ser considerada economicamente não justificada se for estabelecido com base nos dados disponíveis que o objetivo dessa operação era evitar a aplicação das medidas» da União relativas à origem das mercadorias.

57      Assim, antes de mais, decorre da redação do artigo 33.o do AD‑CAU, nomeadamente da utilização do termo «considerada» neste último artigo, que, em certas circunstâncias, a saber, quando o objetivo de uma dada operação tenha sido evitar a aplicação das medidas previstas no artigo 59.o do Código Aduaneiro, a Comissão e as autoridades aduaneiras da União devem considerar que a condição ligada à justificação económica não pode estar preenchida.

58      Em seguida, no que respeita precisamente à utilização da expressão «objetivo dessa operação era evitar» no artigo 33.o do AD‑CAU, o Tribunal considera que a utilização do conceito de «objetivo» no singular deve ser entendida, em situações em que a realização de uma determinada operação de deslocalização tivesse prosseguido vários objetivos, no sentido de que remete para a ideia de um «objetivo principal» ou «dominante». Por conseguinte, pode acontecer que este objetivo não seja o único, mas é necessário que seja determinante para a escolha de deslocalizar a produção para outro país ou território.

59      Ora, resulta do artigo 33.o do AD‑CAU, nomeadamente da referência às «medidas previstas no artigo 59.o» do código aduaneiro, lido à luz do considerando 21 do AD‑CAU e do projeto consolidado de ato delegado apresentado pela Comissão antes da adoção do AD‑CAU, que o artigo 33.o do AD‑CAU se aplica quando a União tiver adotado medidas de política comercial. Essas medidas de política comercial podem consistir em medidas pautais como as adotadas no caso presente, a saber, direitos aduaneiros adicionais relativos a certas mercadorias originárias dos Estados Unidos instituídos pelo Regulamento 2018/886 em aplicação do artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 654/2014.

60      Assim, o artigo 33.o do AD‑CAU visa assegurar a plena execução das medidas de política comercial da União, impedindo, para as mercadorias objeto de tais medidas, a aquisição de uma nova origem quando o objetivo principal ou dominante de uma operação, como uma transferência de produção para outro país ou território, tenha sido evitar a aplicação das referidas medidas.

61      Por último, a utilização da expressão «com base nos dados disponíveis» no artigo 33.o do AD‑CAU faz referência aos elementos factuais de que dispõe a autoridade encarregada de verificar se o objetivo de uma operação de deslocalização era evitar a aplicação das medidas da União relativas à origem das mercadorias.

62      Resulta do exposto que há que interpretar o artigo 33.o do AD‑CAU no sentido de que, se, com base nos dados disponíveis, se verificar que o objetivo principal ou dominante de uma operação de deslocalização era evitar a aplicação de medidas de política comercial da União, deve‑se então considerar que essa operação não pode, por princípio, ser economicamente justificada.

63      Por conseguinte, cabe ao operador económico em causa fazer prova de que o objetivo principal ou dominante de uma operação de deslocalização não era, no momento em que a decisão a seu respeito foi tomada, evitar a aplicação de medidas de política comercial da União. Ora, tal prova distingue‑se da investigação a posteriori de uma justificação económica ou da racionalidade económica dessa operação de deslocalização. Com efeito, se a prova de que o objetivo principal ou dominante de uma operação de deslocalização não era evitar a aplicação de medidas de política comercial pudesse ser feita pela simples demonstração da existência de uma justificação económica, isso privaria de qualquer efeito útil o artigo 33.o do AD‑CAU.

64      No caso, resulta dos autos que os dados disponíveis, na aceção do artigo 33.o do AD‑CAU, são as alegações enunciadas pela Harley‑Davidson no formulário 8‑K, acima reproduzidas no n.o 26, e os elementos comunicados pelas recorrentes às autoridades aduaneiras belgas em apoio dos seus pedidos de decisões IVO.

65      Quanto aos elementos comunicados às autoridades aduaneiras belgas, as recorrentes indicam ter fornecido, no outono de 2018, uma síntese das diversas razões pelas quais a produção na Tailândia era, segundo elas, «economicamente justificada», síntese que completaram em 26 de março de 2019, ou seja, nove meses após a publicação do formulário 8‑K, com explicações suplementares.

66      Resulta da análise desses documentos, juntos ao presente recurso, que estes foram elaborados pelas recorrentes no âmbito das suas trocas com as autoridades aduaneiras belgas com vista a obter decisões IVO que reconhecessem a origem tailandesa dos motociclos fabricados pela Harley‑Davidson e destinados ao mercado da União. Essas trocas tiveram início em setembro de 2018, ou seja, vários meses após a publicação do formulário 8‑K que anunciava publicamente a operação de deslocalização em causa. Esses documentos, que não são anteriores nem contemporâneos ao formulário 8‑K, e que foram elaborados com o único objetivo de as autoridades aduaneiras belgas reconhecerem a origem tailandesa dos motociclos fabricados pela Harley‑Davidson, não permitem tirar uma conclusão determinante quanto à realidade de uma decisão de deslocalização na Tailândia do fabrico de motociclos destinados ao mercado da União que teria existido antes da instauração de direitos aduaneiros adicionais (v. n.o 21, supra) ou que procederia de um raciocínio económico perfeitamente racional e alheio à instituição desses direitos aduaneiros adicionais.

67      Daí resulta que, com base nos dados disponíveis, a saber, as próprias alegações da Harley‑Davidson que figuram no formulário 8‑K, foi para «fazer frente ao custo substancial da carga tarifária [induzida pela instituição de direitos aduaneiros adicionais] a longo prazo [que] a Harley‑Davidson [pôs] em prática um plano destinado a deslocar a produção de motociclos destinados à [União] dos Estados Unidos para as suas instalações internacionais». Assim, resulta da leitura do formulário 8‑K que a instituição dos direitos aduaneiros adicionais foi o facto gerador do anúncio da decisão de deslocalização em causa. De resto, as recorrentes reconheceram na audiência, em resposta a uma questão do Tribunal, que a entrada em vigor dos referidos direitos aduaneiros adicionais tinha «acelerado» a decisão de deslocalizar para a Tailândia a produção destinada ao mercado da União.

68      Além disso, as recorrentes não conseguiram demonstrar, nem nos elementos resultantes das suas trocas com as autoridades aduaneiras belgas, nem nos articulados apresentados no âmbito do presente processo, nem em resposta às questões do Tribunal Geral na audiência, demonstrar que a decisão de deslocalizar para a Tailândia a produção dos motociclos Harley‑Davidson destinados ao mercado da União era anterior à entrada em vigor do Regulamento 2018/886 ou fazia parte de uma estratégia global especificamente destinada a reduzir os custos de produção dos motociclos destinados ao mercado da União. Quando muito, as recorrentes limitaram‑se a vagas e abstratas alegações de que a Harley‑Davidson prosseguia, há vários anos, uma estratégia destinada a aumentar a sua presença comercial fora dos Estados Unidos, alegações que apoiaram na apresentação de documentos destinados à SEC, dos quais resulta apenas, sem mais precisões, que o crescimento internacional fazia essencialmente parte de uma estratégia global da empresa a longo prazo.

69      As recorrentes não apresentaram nenhum documento, tais como cópias de decisões do conselho de administração da Harley‑Davidson, que demonstrassem que a decisão específica de deslocalizar para a Tailândia a produção de motociclos destinados ao mercado da União era anterior à instituição dos direitos aduaneiros adicionais em causa. Pelo contrário, resulta de um dos documentos apresentados pelas recorrentes, acima mencionado no n.o 68, datado de 28 de fevereiro de 2019 e destinado à SEC, que a produção de motociclos na fábrica da Tailândia só tinha começado em 2018 e que essa produção era, pelo menos até 31 de dezembro de 2018, destinada exclusivamente a determinados mercados asiáticos, e não ao mercado da União.

70      Em todo o caso, não se pode deixar de observar que, ao indicar unicamente, no formulário 8‑K, que pretendia, ao deslocalizar a sua produção, «evitar o encargo pautal» resultante da entrada em vigor dos direitos aduaneiros adicionais, a Harley‑Davidson tinha por objetivo principal ou dominante evitar a aplicação dessas medidas de política comercial. Resulta claramente do objeto e do conteúdo do formulário 8‑K que este, datado de 25 de junho de 2018, foi publicado imediatamente em reação à publicação do Regulamento 2018/886, apenas cinco dias após a referida publicação e três dias após a sua entrada em vigor. O Tribunal constata que existe uma coincidência temporal entre a entrada em vigor do Regulamento 2018/886 e o anúncio da operação de deslocalização em causa. Ora, uma tal coincidência temporal é suscetível, segundo a jurisprudência, de justificar a presunção de que uma operação de deslocalização tem por objetivo evitar a aplicação de medidas de política comercial (v., neste sentido, Acórdão de 13 de dezembro de 1989, Brother International, C‑26/88, EU:C:1989:637, n.o 29).

71      Resulta igualmente da jurisprudência que, por conseguinte, perante tal coincidência temporal, cabe ao operador económico em causa fazer prova de um motivo razoável que não seja escapar às consequências decorrentes das disposições em causa, para a realização das operações de fabrico no país para onde a produção foi deslocalizada (v., neste sentido, Acórdão de 13 de dezembro de 1989, Brother International, C‑26/88, EU:C:1989:637, n.o 29). Ora, como acima referido nos n.os 65 a 68, as recorrentes não conseguiram fazer prova de um motivo razoável, anterior ou contemporâneo ao anúncio da decisão de deslocalização na Tailândia, destinado a demonstrar a alegação de que essa deslocalização poderia ter tido outra justificação que não fosse escapar às consequências da instituição de direitos aduaneiros adicionais.

72      Verifica‑se, portanto, que a instituição dos direitos aduaneiros adicionais foi o facto gerador da decisão de deslocalização em causa revelada pela publicação do formulário 8‑K e que, tendo em conta o contexto, esta decisão procedia efetivamente, pelo menos a título principal ou dominante, da vontade de escapar ao encargo financeiro induzido por esses direitos.

73      Daqui resulta que a Comissão não cometeu nenhum erro ao concluir que o objetivo principal dessa deslocalização era evitar a medida de política comercial constituída pelos direitos aduaneiros adicionais.

74      Por conseguinte, toda a argumentação das recorrentes relativa à existência de uma justificação económica da operação de deslocalização em causa é inoperante, uma vez que tal justificação não tinha de ser procurada pela Comissão no caso presente. Isto vale também para a argumentação das recorrentes relativa à realidade e ao caráter substancial das operações de produção na Tailândia.

75      Quanto à argumentação das recorrentes de que a Comissão transformou um critério originalmente objetivo num critério subjetivo, basta observar que a constatação, na decisão recorrida, de que a operação de deslocalização na Tailândia tinha sido realizada a fim de, pelo menos principalmente, evitar a aplicação de medidas de política comercial da União é uma constatação baseada em elementos de prova objetivos. A este respeito, no âmbito da sua análise do comportamento da Harley‑Davidson para identificar uma eventual subtração às referidas medidas de política comercial, a Comissão, com efeito, era obrigada a basear‑se em todos os elementos de facto pertinentes e disponíveis. Neste contexto, a Comissão podia ter de apreciar a estratégia prosseguida por essa empresa. Neste âmbito, a Comissão podia evocar fatores de natureza subjetiva, a saber, os motivos subjacentes à estratégia em questão, visto que esses fatores resultavam claramente, sem nenhuma ambiguidade e objetivamente, do formulário 8‑K. Assim, contrariamente ao que sustentam as recorrentes, a existência de uma intenção de contornar as medidas de política comercial em causa podia constituir uma das circunstâncias factuais objetivas suscetíveis de serem tomadas em consideração para efeitos da determinação dessa subtração.

76      Resulta do exposto que improcede o terceiro fundamento.

2.      Quanto ao quarto fundamento assente na ilegalidade do artigo 33.o do ADCAU

77      No âmbito do quarto fundamento, as recorrentes alegam que o artigo 33.o do AD‑CAU é ilegal, uma vez que ultrapassa o âmbito de uma legislação que pode ser adotada através de um ato delegado nos termos do artigo 290.o TFUE e viola os princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade.

a)      Quanto à primeira parte do quarto fundamento, relativa a uma violação do artigo 290.o TFUE

78      As recorrentes sustentam que, qualquer que seja a interpretação a dar ao artigo 33.o do AD‑CAU, esta disposição ultrapassa os limites de uma legislação delegada. A este respeito, alegam, em substância, que o critério da «justificação económica» não pode ser considerado um critério que forneça mais precisões sobre o modo como uma disposição substancial deve ser aplicada, antes se tratando, pelo contrário, de uma regra fundamental em matéria de determinação da origem. Enquanto tal, a norma que figura no artigo 33.o do AD‑CAU deve constar do direito primário, ao lado do artigo 60.o, n.o 2, do código aduaneiro, que contém a regra geral que permite determinar a origem das mercadorias transformadas em mais de um país.

79      A Comissão contesta essa argumentação.

80      A possibilidade de delegar poderes prevista no artigo 290.o TFUE visa permitir ao legislador concentrar‑se nos elementos essenciais de uma legislação e nos elementos não essenciais em relação aos quais considera oportuno legislar, confiando à Comissão a tarefa de «completar» certos elementos não essenciais do ato legislativo adotado ou ainda de «alterar» tais elementos ao abrigo de uma delegação a esta conferida (v. Acórdão de 11 de maio de 2017, Dyson/Comissão, C‑44/16 P, EU:C:2017:357, n.o 58 e jurisprudência referida).

81      Daí resulta que as normas essenciais da matéria em causa devem ser aprovadas na regulamentação de base e não podem ser objeto de delegação (v. Acórdão de 11 de maio de 2017, Dyson/Comissão, C‑44/16 P, EU:C:2017:357, n.o 59 e jurisprudência referida).

82      Resulta da jurisprudência que os elementos essenciais de uma regulamentação de base são os elementos para cuja adoção é necessário efetuar opções políticas da responsabilidade própria do legislador da União (v. Acórdão de 11 de maio de 2017, Dyson/Comissão, C‑44/16 P, EU:C:2017:357, n.o 61 e jurisprudência referida).

83      A identificação dos elementos de uma matéria que devem ser qualificados de essenciais deve basear‑se em elementos objetivos, suscetíveis de ser objeto de fiscalização jurisdicional, e impõe que sejam tomadas em consideração as características e as particularidades do domínio em causa (v. Acórdão de 11 de maio de 2017, Dyson/Comissão, C‑44/16 P, EU:C:2017:357, n.o 62 e jurisprudência referida).

84      No caso, o artigo 60.o do código aduaneiro prevê regras para a determinação da origem não preferencial das mercadorias, regras essas que variam consoante as mercadorias tenham sido obtidas num mesmo país ou território, ou a sua produção tenha envolvido vários países ou territórios. Estas duas categorias de regras estão estabelecidas, respetivamente, no n.o 1 e no n.o 2 desse artigo 60.o

85      O caso presente diz unicamente respeito à segunda categoria de regras.

86      Além disso, no que respeita a esta segunda categoria de regras, a Comissão adotou o artigo 33.o do AD‑CAU em aplicação da habilitação prevista no artigo 62.o do código aduaneiro, conjugado com o artigo 284.o do código aduaneiro. Assim, este artigo 62.o habilita esta instituição a adotar atos delegados com vista a estabelecer, em substância, as regras de execução das condições previstas no artigo 60.o, n.o 2, do código aduaneiro.

87      Daqui decorre que, à luz da sistemática geral do código aduaneiro, a condição da justificação económica, examinada no caso presente, está prevista no próprio código aduaneiro e constitui apenas uma das condições previstas por uma das normas em matéria de aquisição da origem não preferencial.

88      Neste contexto, no que respeita ao alcance da delegação conferida à Comissão no artigo 62.o do Código Aduaneiro, ao habilitar a Comissão a «estabelecer» regras, esta disposição autoriza a Comissão a «completar» o Código Aduaneiro, na aceção do artigo 290.o TFUE. Assim, embora a Comissão não esteja autorizada por esse artigo a alterar os elementos já adotados no código aduaneiro, está, em contrapartida, autorizada por ele a completar o código aduaneiro, desenvolvendo elementos que não tenham sido definidos pelo legislador, não deixando de ser obrigada a respeitar as disposições aprovadas pelo código aduaneiro.

89      Assim, mesmo admitindo que as normas para a determinação da origem constituíssem elementos essenciais do código aduaneiro, o artigo 33.o do AD‑CAU visa apenas completar, fornecendo‑lhe certo número de precisões, o artigo 60.o do código aduaneiro. Por conseguinte, não se pode considerar que este artigo 33.o ultrapasse os limites da delegação conferida à Comissão pelo artigo 62.o do código aduaneiro ou que modifique uma regra essencial do código aduaneiro.

90      Além disso, uma vez que o artigo 33.o do AD‑CAU visa unicamente assegurar, como resulta do seu considerando 21, a aplicação efetiva das medidas de política comercial instituídas ao abrigo de outras disposições do direito da União, há que considerar que a adoção deste artigo não implicou, enquanto tal, efetuar opções políticas que se prendessem com as responsabilidades próprias do legislador da União.

91      Resulta do exposto que se deve rejeitar a primeira parte do presente fundamento.

b)      Quanto à segunda parte do quarto fundamento, relativa à violação dos princípios da segurança jurídica e da proporcionalidade

92      As recorrentes alegam que a introdução de uma alteração tão substancial do critério jurídico da «justificação económica» através de um ato delegado é incompatível com os princípios gerais do direito da União, especialmente os da segurança jurídica e da proporcionalidade.

93      A esse respeito, sustentam que, ao considerar, no artigo 33.o do AD‑CAU, que se pode tomar em consideração uma multiplicidade de razões para avaliar a justificação económica de uma operação de deslocalização, a Comissão introduziu neste critério uma forma de subjetividade incompatível com o caráter objetivo do regulamento de base. Alegam igualmente que a Comissão não tinha nenhuma razão para alargar e alterar o critério, tal como tinha sido definido no direito primário ou na jurisprudência.

94      A Comissão opõe‑se a estas alegações.

95      O Tribunal observa que a argumentação das recorrentes assenta no postulado de o artigo 33.o do AD‑CAU prever que se pode ter em consideração uma multiplicidade de razões na determinação da existência de uma «justificação económica» e que a avaliação da importância respetiva dessas diferentes razões depende apenas do poder discricionário da Comissão. Ora, este postulado resulta de uma interpretação errada do artigo 33.o do AD‑CAU.

96      Com efeito, como foi acima demonstrado nos n.os 54 a 63, o artigo 33.o do AD‑CAU prevê que basta que «o objetivo», isto é, o objetivo principal ou dominante, de uma operação de deslocalização seja evitar a aplicação de medidas de política comercial da União para se poder considerar que essa operação de deslocalização não é economicamente justificada na aceção da regulamentação aplicável.

97      Por conseguinte, há que observar que, ao contrário do que sustentam as recorrentes, o artigo 33.o do AD‑CAU não prevê a ponderação ou a consideração de uma «multiplicidade de razões» para efeitos da determinação da existência de uma «justificação económica», prevendo apenas que tal justificação não pode, por princípio, existir em presença de uma estratégia que vise principalmente evitar a aplicação de medidas de política comercial da União.

98      Daqui resulta que se deve rejeitar a argumentação das recorrentes.

99      Resulta do exposto que improcede a segunda parte do quarto fundamento, e, com ela, todo o quarto fundamento.

3.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do dever de fundamentação e do procedimento consultivo prévio à adoção da decisão recorrida

100    No âmbito do primeiro fundamento, as recorrentes alegam, por um lado, que a Comissão preteriu formalidades essenciais, uma vez que a decisão recorrida não contém fundamentação ou contém fundamentação insuficiente e, por outro, que a Comissão não respeitou o procedimento consultivo prévio à adoção da decisão recorrida.

a)      Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, violação do dever de fundamentação

101    As recorrentes sustentam que a decisão recorrida não lhes indica o que a Comissão pensa das operações de montagem realizadas na Tailândia nem o que a Comissão pensa das razões que levaram a Harley‑Davidson a fabricar os seus produtos na Tailândia nem a forma como a Comissão aplicou o critério da justificação económica, pelo que o Tribunal Geral não está em condições de exercer a sua fiscalização.

102    As recorrentes alegam igualmente que a decisão recorrida não contém explicações quanto às razões pelas quais a posição da Comissão é diferente da posição das autoridades aduaneiras belgas e que o raciocínio exposto no considerando 7 da referida decisão mais não constitui do que uma declaração perentória. Alegam, a este respeito, que, tendo em conta a tecnicidade da matéria, os investimentos consideráveis em jogo e devido ao caráter inédito de uma decisão como a decisão recorrida, a exposição de um raciocínio claro era particularmente importante.

103    A Comissão opõe‑se a estas alegações.

104    Há que lembrar que, segundo jurisprudência assente, o alcance do dever de fundamentação depende da natureza do ato em causa e do contexto em que foi praticado. A fundamentação deve revelar clara e inequivocamente o raciocínio da instituição, de forma que, por um lado, permita aos interessados conhecerem as justificações da medida, para poderem defender os seus direitos e verificar se a decisão é ou não fundada, e, por outro, permita ao julgador exercer a sua fiscalização da legalidade. Não é necessário que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, dado que a questão de saber se a fundamentação de um ato respeita as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada não só à luz da sua letra mas também do seu contexto e de todas as normas jurídicas que regem essa matéria. Particularmente, a Comissão não tem de tomar posição sobre todos os argumentos que os interessados lhe apresentam, bastando‑lhe expor os factos e as considerações jurídicas que tenham importância essencial na sistemática da decisão (v. Acórdão do Tribunal Geral de 12 de maio de 2011, Région Nord‑Pas‑de‑Calais e Communauté d’agglomération du Douaisis/Comissão, T‑267/08 e T‑279/08, EU:T:2011:209, n.o 43 e jurisprudência referida).

105    No caso, a Comissão indicou, na decisão recorrida e segundo os termos acima reproduzidos no n.o 37, o motivo pelo qual não se podia considerar que certas categorias de motociclos fabricados pela Harley‑Davidson e importados para a União a partir da Tailândia tinham esse país de origem, a saber, o facto de esse fabrico na Tailândia não ser economicamente justificado, visto que visava principalmente evitar as medidas de política comercial da União adotadas, a partir de 2018, contra produtos originários dos Estados Unidos.

106    Além disso, no considerando 9 da decisão recorrida, a Comissão criticou as autoridades aduaneiras belgas por não terem aplicado corretamente o artigo 33.o do AD‑CAU, uma vez que tinham determinado, nas duas decisões IVO, a Tailândia como local de origem dos motociclos em causa.

107    Assim, a decisão recorrida contém suficiente fundamentação a esse título ao mencionar as razões pelas quais a Comissão considerou que as autoridades aduaneiras belgas tinham adotado decisões IVO que não estavam em conformidade com a legislação aduaneira da União.

108    Além disso, pode‑se observar que alguns dos argumentos das recorrentes acima enunciados no n.o 102 se confundem com a crítica do mérito da decisão recorrida. Ora, o dever de fundamentar decisões constitui uma formalidade essencial que se distingue da questão do mérito da fundamentação. Com efeito, a fundamentação de um ato consiste em exprimir formalmente os fundamentos em que assenta. Se esses fundamentos estiverem feridos de erro, estes inquinam a legalidade material da decisão, mas não a sua fundamentação, que pode ser suficiente, exprimindo embora fundamentos errados (v. Acórdão de 10 de julho de 2008, Bertelsmann e Sony Corporation of America/Impala, C‑413/06 P, EU:C:2008:392, n.o 181 e jurisprudência referida).

109    Daí resulta que improcede a primeira parte do primeiro fundamento.

b)      Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa ao desrespeito do procedimento consultivo prévio à adoção da decisão recorrida

110    As recorrentes alegam que a Comissão era obrigada a consultar o comité consultivo competente antes de adotar a decisão recorrida e que a simples consulta do referido comité através de um procedimento escrito era, no caso presente, insuficiente, tanto mais que a Comissão não comunicou nenhum elemento de contexto factual e jurídico para permitir aos membros do comité formarem uma opinião. Além disso, segundo as recorrentes, o facto de, no âmbito da consulta realizada por procedimento escrito, quatro Estados‑Membros se terem manifestado para se oporem ao projeto de decisão recorrida deveria ter levado a Comissão a ter «na devida conta» essas observações, na aceção do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento (UE) n.o 182/2011 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de fevereiro de 2011, que estabelece as regras e os princípios gerais relativos aos mecanismos de controlo pelos Estados‑Membros do exercício das competências de execução pela Comissão (JO 2011, L 55, p. 13).

111    A Comissão contesta essas alegações.

112    Resulta do artigo 285.o do código aduaneiro que o comité do código aduaneiro é um comité na aceção do Regulamento n.o 182/2011. Resulta ainda do artigo 37.o, n.o 2, segundo e terceiro parágrafos, do Código Aduaneiro, conjugado com o artigo 285.o, n.os 2 e 6, do referido código, que as decisões, como a decisão recorrida, que pedem aos Estados‑Membros que revoguem as decisões IVO são adotadas segundo o procedimento consultivo previsto no artigo 4.o do Regulamento n.o 182/2011.

113    O artigo 4.o do Regulamento n.o 182/2011, sob a epígrafe «Procedimento consultivo», dispõe:

«1. Caso se aplique o procedimento consultivo, o comité dá parecer, se necessário, procedendo a votação. Se o comité proceder a uma votação, o parecer é aprovado por maioria simples dos membros que o compõem.

2. A Comissão decide sobre os atos de execução a adotar, tendo na devida conta as conclusões das discussões havidas no comité e o parecer emitido.»

114    Quanto à alegação relativa ao recurso a um procedimento conduzido pela via escrita no caso presente, nenhuma disposição do Regulamento n.o 182/2011 proíbe a Comissão de conduzir um procedimento consultivo segundo esta modalidade específica. Pelo contrário, está expressamente previsto, no artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento n.o 182/2011, que o parecer de um comité, no âmbito de um procedimento consultivo, pode ser obtido através de procedimento escrito.

115    Quanto à alegação de que o Comité Consultivo não beneficiou de elementos factuais e jurídicos suficientes quando examinou o projeto de decisão recorrida, refira‑se que as recorrentes não fundamentaram esta alegação e que, em todo o caso, os Estados‑Membros em causa em primeiro lugar não formularam nenhuma crítica sobre este ponto, pelo que não existem elementos que permitam concluir que as delegações não tinham podido adotar as suas posições com conhecimento de causa. Por conseguinte, esta alegação deve ser rejeitada.

116    No que respeita à consideração das observações formuladas pelos Estados‑Membros que se teriam manifestado para se oporem ao projeto de decisão, refira‑se que a exigência, prevista no artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 182/2011, não tem caráter vinculativo. Assim, a Comissão, que conserva uma margem de apreciação, não está vinculada pelo parecer emitido pelo comité nem, a fortiori, pelas opiniões divergentes minoritárias emitidas por alguns dos seus membros.

117    Com efeito, a formulação «tendo na devida conta» do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 182/2011 evidencia o caráter não vinculativo das conclusões que resultam dos debates no comité, incluindo opiniões emitidas apenas por alguns dos seus membros, e do parecer in fine emitido pelo referido comité. Se essas conclusões ou opiniões fossem vinculativas, não bastaria que a Comissão as tivesse em devida conta, dado o risco de desvirtuar os termos e a finalidade do artigo 4.o do Regulamento n.o 182/2011, antes tendo de lhes obedecer (v., neste sentido e por analogia, Despacho de 9 de julho de 2019, VodafoneZiggo Group/Comissão, T‑660/18, EU:T:2019:546, n.o 44). Esta conclusão é apoiada por uma comparação com o procedimento de exame, previsto no artigo 5.o desse regulamento, uma vez que, como resulta do seu considerando 11, este último procedimento deve permitir garantir que os atos de execução não possam ser adotados pela Comissão se não forem conformes com o parecer do comité competente. Isto significa que o parecer do comité competente não é vinculativo para a Comissão se, como no caso presente, for aplicável o procedimento consultivo.

118    Contudo, como acertadamente referem as recorrentes, a jurisprudência já reconheceu que o dever de ter «em devida conta» impunha um dever de fundamentação no sentido de que a Comissão devia poder explicar as divergências à luz das conclusões emergentes das discussões no comité e do parecer dado (v., neste sentido e por analogia, Despacho de 9 de julho de 2019, VodafoneZiggo Group/Comissão, T‑660/18, EU:T:2019:546, n.o 47).

119    A este respeito, há que observar que a decisão recorrida foi adotada no termo do procedimento administrativo acima descrito nos n.os 34 e 35. Especialmente, a Comissão apresentou o projeto de decisão recorrida às delegações do comité de 5 de março de 2021 e quatro Estados‑Membros enviaram observações que se opunham à posição adotada pela Comissão nesse projeto.

120    Resulta da nota de síntese dirigida pela Comissão ao Comité do Código Aduaneiro, secção «Origem», em 29 de março de 2021 (v. n.o 34, supra), que 23 Estados‑Membros não tinham tomado posição sobre o projeto de decisão recorrida. Assim, uma grande maioria das delegações tinha dado tacitamente o seu acordo ao referido projeto de decisão recorrida, em aplicação do artigo 3.o, n.o 5, do Regulamento n.o 182/2011, pelo que o parecer emitido pelo comité sobre o projeto de decisão recorrida podia ser considerado um parecer favorável, relativamente ao qual a Comissão não tinha, portanto, nenhuma divergência para explicar.

121    Resulta da ata da reunião do grupo de peritos aduaneiros, secção «Origem», de 20 de abril de 2021, que, das quatro delegações que manifestaram a sua oposição ao projeto de decisão recorrida, pelo menos três comunicaram preocupações precisas e detalhadas.

122    Especialmente, estas delegações emitiram reservas relativas à questão da falta de exame, no projeto de decisão recorrida, da racionalidade económica global da operação de deslocalização e à questão de saber se se devia entender o conceito de «objetivo», na aceção do artigo 33.o do AD‑CAU, no sentido de que remete para uma finalidade única ou para uma finalidade exclusiva e não apenas no sentido de que remete para um objetivo entre outros.

123    Assim, estas reservas são suscetíveis de integrar o conceito de «as conclusões das discussões havidas no comité», na aceção do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento n.o 182/2011, que cabia à Comissão ter «em devida conta», na aceção desta mesma disposição.

124    Contudo, resulta do considerando 7 da decisão recorrida que, «[a]inda que a evasão às medidas de política comercial possa não ser necessariamente o único objetivo da transferência da produção, as condições referidas no artigo 33.o, primeiro parágrafo, do [AD‑CAU] estão cumpridas com base nos dados disponíveis».

125    Ao fazê‑lo, a Comissão respondeu implícita mas necessariamente à questão de saber se se devia entender o conceito de «objetivo», na aceção do artigo 33.o do AD‑CAU, no sentido de que remete para um objetivo entre outros, considerando que esse objetivo podia, portanto, coexistir com outros objetivos. Além disso, também implícita mas necessariamente considerou com razão que, depois de ter demonstrado que o objetivo principal ou dominante de uma operação de deslocalização era evitar a aplicação de medidas de política comercial da União, não era necessário tomar posição sobre a questão da racionalidade económica global da operação de deslocalização em causa.

126    Resulta do exposto que improcede a segunda parte do primeiro fundamento e, com ela, todo o primeiro fundamento.

4.      Quanto ao segundo fundamento, relativo a erro manifesto de apreciação

127    As recorrentes sustentam que a decisão recorrida se baseia num erro manifesto de apreciação dos factos relevantes, porquanto a Comissão não teve em conta todos os elementos do contexto e uma vez que o contexto, o conteúdo e o objeto do formulário 8‑K não foram corretamente apreciados.

a)      Quanto à primeira parte do segundo fundamento, relativa à falta de análise de todos os factos relevantes

128    As recorrentes acusam a Comissão de ter cometido um erro manifesto de apreciação, visto que não examinou todos os factos relevantes, nomeadamente a data em que tinha sido adotada a decisão da Harley‑Davidson de transferir determinadas operações de fabrico para a Tailândia, as razões comerciais e económicas subjacentes a essa decisão, bem como a natureza dos processos e das operações realizadas na Tailândia.

129    A Comissão contesta essa argumentação.

130    Refira‑se que a argumentação das recorrentes diz respeito à questão de saber se a Comissão cometeu um erro de direito na aplicação que fez do artigo 33.o do AD‑CAU ao não procurar a justificação económica da deslocalização em causa. Ora, esta questão já foi examinada no âmbito da análise do terceiro fundamento.

131    A este respeito, resulta da análise acima efetuada nos n.os 54 a 63 que, tendo em conta o que a Comissão acertadamente declarou, com base nos elementos à sua disposição, que o objetivo principal da operação de deslocalização da produção de motociclos Harley‑Davidson destinados ao mercado da União para a Tailândia era evitar a aplicação das medidas de política comercial instituídas pelo Regulamento 2018/886, podia então validamente concluir, no âmbito da aplicação que tinha feito do artigo 33.o do AD‑CAU, que a operação não era economicamente justificada, sem necessidade de analisar os factos ligados aos outros eventuais objetivos da operação de deslocalização.

132    Daí resulta que se deve rejeitar a primeira parte do segundo fundamento.

b)      Quanto à segunda parte do segundo fundamento, relativa a um erro manifesto de apreciação do contexto, do conteúdo e do objeto do formulário 8K

133    As recorrentes acusam a Comissão de não ter tido em conta o contexto em que o formulário 8‑K foi tornado público. A este respeito, as recorrentes sustentam que a Comissão atribuiu demasiada importância à fórmula segundo a qual a deslocalização em causa devia permitir «evitar o encargo pautal» induzido pelos direitos aduaneiros adicionais, quando outros elementos justificavam essa deslocalização. Assim, as recorrentes consideram que a Comissão atribuiu valor probatório absoluto a uma única declaração, sem tomar em consideração o contexto em que essa declaração tinha sido efetuada ou o público a que se dirigia e que tinha por objetivo tranquilizar, com exclusão de qualquer outra prova. Por último, as recorrentes alegam que, mesmo que um dos fatores que motivassem a deslocalização fosse evitar a aplicação dos direitos aduaneiros adicionais, a Comissão não ponderou esse objetivo com outros objetivos prosseguidos pela deslocalização em causa.

134    A Comissão opõe‑se a estas alegações.

135    No caso, como acima resulta dos factos acima expostos nos n.os 24 e 25, em reação à entrada em vigor do Regulamento 2018/886, a Harley‑Davidson apresentou à SEC, em 25 de junho de 2018, o formulário 8‑K destinado a informar os seus acionistas da aplicação, desde 22 de junho de 2018, de direitos aduaneiros adicionais sobre os seus produtos importados para a União a partir dos Estados Unidos. Nesse formulário, a Harley‑Davidson comunicou igualmente a sua intenção de transferir a produção de certos motociclos destinados ao mercado da União dos Estados Unidos para as suas instalações internacionais, a fim de evitar as medidas de política comercial da União em causa.

136    Particularmente, o formulário 8‑K contém a seguinte formulação: «Para fazer frente ao custo substancial desta carga pautal a longo prazo, a Harley‑Davidson irá executar um plano destinado a deslocar a produção de motociclos destinados à [União] dos EUA para as suas instalações internacionais, a fim de evitar o encargo pautal.»

137    Daí resulta que pelo menos um dos fatores que motivaram a deslocalização em causa era evitar a aplicação dos direitos aduaneiros adicionais, o que as recorrentes não impugnam. Além disso, ficou acima demonstrado, nos n.os 64 a 72, que essa vontade de evitar a aplicação dos direitos aduaneiros adicionais foi o objetivo principal ou dominante da decisão de deslocalização em causa.

138    Por conseguinte, não se pode acusar a Comissão de ter cometido um erro manifesto de apreciação, quando afirmou, na decisão recorrida, que fora «[a]pós a publicação das medidas de política comercial da União Europeia, [que a Harley‑Davidson] [tinha comunicado], através [do] formulário 8‑K […] apresentado em 25 de junho de 2018 à [SEC], o seu plano de transferir a produção de determinados motociclos destinados ao mercado da União Europeia dos Estados Unidos da América para as suas instalações internacionais noutro país, a fim de evitar as medidas de política comercial da União […]», não deixando de referir que «[…] a evasão às medidas de política comercial [em causa] [podia] não ser necessariamente o único objetivo da transferência da produção […]».

139    Quanto à questão de saber se outros fatores deveriam ter sido tidos em conta pela Comissão, tais como elementos de contexto, o objeto do formulário 8‑K ou ainda os outros objetivos prosseguidos pela deslocalização em causa, há que observar que a mesma diz respeito à questão de saber se a Comissão cometeu um erro de direito na interpretação do artigo 33.o do AD‑CAU ao basear a sua conclusão na constatação de que o objetivo dominante dessa deslocalização era evitar a aplicação dos direitos aduaneiros adicionais, que já foi examinada e rejeitada na análise do terceiro fundamento e da primeira parte do presente fundamento.

140    Resulta do exposto que improcede a segunda parte do segundo fundamento e, com ela, todo o segundo fundamento.

5.      Quanto ao quinto fundamento, violação de princípios gerais do direito da União e da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia

141    No âmbito do quinto fundamento, as recorrentes alegam que a decisão recorrida viola os princípios da segurança jurídica e da confiança legítima, os princípios da não discriminação e da proporcionalidade, o direito a uma boa administração, a liberdade de empresa e o direito de propriedade.

a)      Quanto à primeira parte do quinto fundamento, relativa à violação dos princípios da segurança jurídica e da confiança legítima

142    As recorrentes alegam que a decisão recorrida não era previsível, nem tão pouco a sua aplicação e os seus efeitos, nomeadamente em relação às autoridades belgas, como demonstra o facto de estas terem revogado as cinco decisões IVO que tinham sido concedidas às recorrentes, e não apenas as duas decisões IVO indicadas na decisão recorrida. Além disso, sustentam que o facto de a Comissão não ter revogado as decisões IVO no momento em que foram concedidas constitui um comportamento que criou uma confiança legítima e recordam que o Tribunal de Justiça já declarou que um prazo de dois anos entre a publicação de uma decisão incorreta e a tentativa de correção da Comissão não era razoável. Alegam igualmente que o guia da Comissão sobre as informações vinculativas em matéria de origem indica que a revogação de uma decisão IVO está sujeita às condições do artigo 22.o, n.o 6, do código aduaneiro relativas ao direito de audiência, pelo que podiam legitimamente esperar que a Comissão as contactasse no âmbito do procedimento que conduziu à adoção da decisão recorrida. Por último, as recorrentes sustentam que não existia um interesse público imperioso que devesse prevalecer sobre os seus interesses privados.

143    A Comissão contesta esta argumentação.

144    As decisões IVO, adotadas em aplicação do artigo 33.o do código aduaneiro, são decisões através das quais as autoridades aduaneiras nacionais certificam, em resposta a pedidos de importadores que pretendam obter garantias quanto à interpretação das regras que permitem definir a origem de uma mercadoria importada, a origem geográfica de certos produtos importados para a União. A informação vinculativa em matéria de origem tem por objetivo dar ao operador económico toda a segurança quando subsiste uma dúvida sobre a origem geográfica de uma mercadoria importada para a União, protegendo‑o, assim, de qualquer modificação posterior da posição das autoridades aduaneiras nacionais durante certo período (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 29 de janeiro de 1998, Lopex Export, C‑315/96, EU:C:1998:31, n.o 28). Contudo, essa informação não tem por objetivo e não pode ter por efeito garantir definitivamente ao operador que a origem geográfica a que se refere não virá a ser posteriormente alterada, nomeadamente devido à revogação, a pedido da Comissão, da decisão IVO obtida, pelo motivo previsto no artigo 34.o, n.o 11, do código aduaneiro, a saber, a necessidade de garantir uma determinação da origem correta das mercadorias.

145    Além disso, o Tribunal de Justiça já declarou que o princípio da proteção da confiança legítima não pode ser invocado contra uma disposição precisa de um preceito do direito da União, pelo que o comportamento de uma autoridade nacional encarregada de aplicar o direito da União que com ele esteja em contradição não pode incutir num operador económico uma confiança legítima em que pode beneficiar de um tratamento contrário ao direito da União [v., neste sentido, Acórdão de 7 de abril de 2011, Sony Supply Chain Solutions (Europe), C‑153/10, EU:C:2011:224, n.o 47 e jurisprudência referida].

146    Ora, no caso, resulta da análise do terceiro fundamento que o artigo 33.o do AD‑CAU regula com suficiente precisão a condição relativa ao caráter economicamente justificado do complemento de fabrico ou da transformação. Além disso, resulta dos termos do artigo 60.o, n.o 2, do código aduaneiro que esta disposição regula com suficiente precisão as outras condições a respeitar para a determinação da origem de uma mercadoria importada na União.

147    Daí resulta que as autoridades aduaneiras belgas encarregadas de aplicar o direito da União, ao adotarem as decisões IVO, tiveram um comportamento contrário ao direito da União e que esse comportamento não podia criar confiança legítima nas recorrentes.

148    Quanto à questão do prazo decorrido entre a data em que a Comissão tomou conhecimento da existência das decisões IVO em causa e a data em que pediu às autoridades aduaneiras belgas a sua revogação, questão que, na realidade, pertence à terceira parte do presente fundamento, será abordada no âmbito da apreciação da referida parte, relativa à violação do direito a uma boa administração.

149    Por último, quanto à alegação das recorrentes de que podiam legitimamente esperar que a Comissão as contactasse antes de adotar a decisão recorrida, basta observar, para a rejeitar, que, no âmbito da primeira parte do quinto fundamento, essa alegação se baseia numa interpretação do artigo 22.o, n.o 6, do código aduaneiro, o qual diz unicamente respeito ao procedimento a seguir pelas autoridades aduaneiras nacionais, e não ao procedimento a seguir pela Comissão.

150    Resulta do exposto que improcede a primeira parte do presente fundamento.

b)      Quanto à segunda parte do quinto fundamento, relativa à violação dos princípios da não discriminação e da proporcionalidade

151    As recorrentes sustentam que resulta das declarações do antigo presidente da Comissão mas também do comissário para o comércio à época, que a Harley‑Davidson foi especificamente visada, ao lado de outras marcas americanas, para ser objeto dos direitos de retaliação em causa com vista a fazer pressão sobre, particularmente, determinados responsáveis políticos americanos, e não com fundamento em critérios objetivos. Acrescentam que o efeito da decisão recorrida foi desproporcionado à luz do objetivo prosseguido e que existiam outras soluções menos gravosas ou que poderiam ter beneficiado de garantias, por exemplo, ser avisadas de que a Comissão previa reexaminar a interpretação do critério do artigo 33.o do AD‑CAU efetuada pelas autoridades belgas, dando‑lhes a possibilidade de apresentarem observações.

152    A Comissão contesta estas alegações.

153    O Tribunal Geral observa que, uma vez que alegam, em substância, ter sido objeto de tratamento discriminatório, já que a Harley‑Davidson foi especificamente visada por declarações públicas de altos responsáveis da União, ao lado de outras marcas americanas, para serem objeto dos direitos de retaliação em causa, as recorrentes excedem o âmbito do presente litígio.

154    Com efeito, esta crítica das recorrentes não incide, na realidade, sobre a decisão recorrida, mas visa diretamente o Regulamento 2018/886 que instituiu os direitos aduaneiros adicionais e que, segundo elas, designou injustamente a Harley‑Davidson. Além disso, e em todo o caso, o Regulamento 2018/886 não visa especificamente a Harley‑Davidson, pois visa nomeadamente os produtos correspondentes ao código de nomenclatura 8711 50 00, a saber, os «[m]otociclos […] [c]om motor de pistão de cilindrada superior a 800 cm³». Ora, embora essa categoria de produtos corresponda efetivamente aos motociclos fabricados pela Harley‑Davidson, não se pode excluir a possibilidade de os motociclos fabricados por outras empresas implantadas nos Estados Unidos estarem igualmente abrangidas por essa categoria definida de forma objetiva, sem referência particular a uma marca, o que as recorrentes confirmaram na audiência designando outro fabricante americano.

155    Quanto à questão da proporcionalidade e ao caráter discriminatório da decisão recorrida, basta salientar que, com a referida decisão, a Comissão se limitou a pedir às autoridades aduaneiras nacionais que revogassem as decisões IVO, pelo facto de essas decisões não terem sido adotadas em conformidade com o direito da União. Por um lado, um pedido de compatibilização com a regulamentação aplicável não é desproporcionado. Por outro lado, as recorrentes não provam nem mesmo alegam que a Comissão tivesse renunciado a pedir a autoridades nacionais que modificassem decisões IVO relativas a outro produtor de produtos correspondentes ao código de nomenclatura 8711 50 00. Por outro lado, nada indica que a Comissão não teria agido exatamente da mesma forma em presença de outras decisões IVO desconformes com o direito da União.

156    Daí resulta que improcede o quinto fundamento.

c)      Quanto à terceira parte do quinto fundamento, relativa à violação do direito a uma boa administração e do direito de audiência

157    As recorrentes alegam que a Comissão não aplicou o seu processo decisório de forma imparcial e que a decisão recorrida só pode ter origem política. Acusam igualmente a Comissão de não ter adotado a decisão recorrida num prazo razoável e de não ter comunicado com elas, mesmo por intermédio das autoridades belgas, antes de adotar a referida decisão. A este respeito, as recorrentes lembram que o direito de audiência é um princípio geral do direito da União de que qualquer operador comercial deve beneficiar, independentemente do conteúdo da regulamentação aplicável.

158    A Comissão contesta essa argumentação.

159    Nos termos do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais, todas as pessoas têm direito, nomeadamente, a que os seus assuntos sejam tratados com imparcialidade pelas instituições da União. Esta exigência de imparcialidade abrange a imparcialidade subjetiva, no sentido de que nenhum membro da instituição em causa encarregada do processo deve manifestar ideias preconcebidas ou um juízo antecipado pessoal, e a imparcialidade objetiva, no sentido de que a instituição deve oferecer garantias suficientes para excluir a este respeito qualquer dúvida legítima (v. Acórdão de 11 de julho de 2013, Ziegler/Comissão, C‑439/11 P, EU:C:2013:513, n.o 155 e jurisprudência referida).

160    No caso, é verdade que resulta das afirmações feitas em março de 2018 pelo antigo presidente da Comissão, tais como relatadas na imprensa, que «deviam ser aplicadas taxas [adicionais] sobre os motociclos HarleyDavidson, sobre os jeans Levi’s, sobre o bourbon». Contudo, as recorrentes não podem deduzir só destas alegações espontâneas que a Comissão violou a exigência de imparcialidade. Antes de mais, a Comissão limitou‑se, através da decisão recorrida, adotada em março de 2021, a pedir às autoridades aduaneiras belgas, no âmbito do seu controlo a posteriori das decisões IVO adotadas pelas autoridades aduaneiras nacionais, que revogassem as decisões IVO em causa, uma vez que estas eram corretamente consideradas pela Comissão contrárias ao direito da União. Com efeito, a Comissão, com base no artigo 33.o do AD‑CAU, adotou a decisão recorrida com o único objetivo de garantir uma determinação da origem correta dos motociclos fabricados pela Harley‑Davidson, pelo que não lhe pode ser imputada a falta de imparcialidade formulada pelas recorrentes. Além disso, e em todo o caso, as recorrentes não invocam nenhum elemento relacionado com a adoção da decisão recorrida, além de considerações gerais e abstratas relativas a uma alegada vontade política de instituir os direitos aduaneiros adicionais em causa, para demonstrar a falta de objetividade e de imparcialidade da Comissão.

161    A este respeito, há que lembrar que o artigo 41.o, n.o 2, alínea a), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia dispõe que o direito a uma boa administração inclui, nomeadamente, o direito de qualquer pessoa de ser ouvida antes de ser tomada contra ela qualquer medida individual que a afete desfavoravelmente. O direito de audiência faz parte do direito de defesa, o qual constitui um princípio fundamental do direito da União que deve ser aplicado mesmo na inexistência de uma regulamentação específica nessa matéria. Este princípio exige que os destinatários de decisões que afetem de modo sensível os seus interesses devem ter a possibilidade de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre os elementos contra si invocados como fundamento dessas decisões (v. Acórdão de 28 de outubro de 2021, Vialto Consulting/Comissão, C‑650/19 P, EU:C:2021:879, n.o 122 e jurisprudência referida).

162    Resulta ainda da jurisprudência que, para uma violação do direito de audiência poder levar à anulação do ato em causa, deve existir uma possibilidade de o procedimento administrativo ter podido conduzir a um resultado diferente (v., neste sentido, Acórdão de 5 de maio de 2022, Zhejiang Jiuli Hi‑Tech Metals/Comissão, C‑718/20 P, EU:C:2022:362, n.o 49). Assim, cabe ao recorrente fazer prova, apresentando elementos concretos ou pelo menos argumentos ou indícios suficientemente fiáveis e precisos, de que a decisão da Comissão poderia ter sido diferente, permitindo, assim, caracterizar uma violação dos direitos de defesa (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 29 de junho de 2006, SGL Carbon/Comissão, C‑308/04 P, EU:C:2006:433, n.o 98).

163    Por último, a observância de um prazo razoável na condução de um procedimento administrativo constitui um princípio geral do direito da União. Além disso, a exigência fundamental de segurança jurídica, que se opõe a que a Comissão possa protelar indefinidamente o exercício dos seus poderes, leva a que o julgador examine se a tramitação do procedimento administrativo revela a existência de uma ação excessivamente tardia por parte dessa instituição (v. Acórdão de 22 de abril de 2016, França/Comissão, T‑56/06 RENV II, EU:T:2016:228, n.o 44 e jurisprudência referida).

164    Há que lembrar também que o caráter razoável do prazo do procedimento deve ser apreciado em função das circunstâncias próprias de cada processo, tais como a sua complexidade e o comportamento das partes (v. Acórdão de 13 de junho de 2013, HGA e o./Comissão, C‑630/11 P a C‑633/11 P, EU:C:2013:387, n.o 82 e jurisprudência referida).

165    É à luz destes princípios que se deve examinar a terceira parte do quinto fundamento.

1)      Quanto à violação do direito de audiência

166    Quanto à violação do direito de audiência, é pacífico entre as partes que a Comissão não deu às recorrentes a possibilidade de apresentarem observações no âmbito do procedimento que levou à adoção da decisão recorrida, a qual, ao ordenar às autoridades belgas que revogassem as duas primeiras decisões IVO em causa, e na falta de possibilidade de estas últimas não cumprirem essa ordem, constitui uma medida individual tomada contra as recorrentes, que as afeta desfavoravelmente. O argumento da Comissão de que o procedimento de adoção da decisão recorrida prevê apenas uma troca bilateral entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa não colhe, tendo em conta o facto, acima lembrado no n.o 161, de esse direito ser aplicável mesmo na falta de regulamentação específica. Além disso, o facto de as recorrentes poderem ou terem podido apresentar as suas observações às autoridades aduaneiras belgas tanto antes da adoção das decisões IVO em causa como também, segundo a Comissão, entre a adoção da decisão recorrida e a decisão de revogação efetiva dessas decisões IVO não é suscetível de permitir considerar que a Comissão respeitou a obrigação que lhe incumbia de ouvir as recorrentes antes da adoção da decisão recorrida.

167    Todavia, esta irregularidade só pode, no caso presente, levar à anulação da decisão recorrida desde que exista uma possibilidade de, devido a essa irregularidade, o procedimento administrativo ter podido conduzir a um resultado diferente, lesando assim concretamente os direitos de defesa.

168    Ora, ao limitar‑se, na decisão recorrida, a pedir às autoridades aduaneiras belgas, no âmbito do seu controlo a posteriori das decisões IVO adotadas pelas autoridades aduaneiras nacionais, que revogassem as decisões IVO que aplicavam incorretamente o artigo 33.o do AD‑CAU, a Comissão apenas fez uso da competência, que lhe é conferida pelo artigo 34.o, n.o 11, do código aduaneiro, de pedir a um Estado‑Membro que revogue as decisões IVO, a fim de garantir uma determinação correta e uniforme da origem das mercadorias.

169    A decisão recorrida contém uma interpretação e uma aplicação de uma norma de direito da União, a saber, o artigo 33.o do AD‑CAU, que já acima, nos n.os 53 a 73, se declarou não estarem feridas de erro. Assim, mesmo admitindo que as recorrentes tivessem podido apresentar observações no âmbito do processo que levou à adoção da decisão recorrida, a interpretação e a aplicação do artigo 33.o do AD‑CAU feitas nesta última pela Comissão não poderiam ter sido diferentes. Ora, foi só devido a divergências quanto à interpretação do artigo 33.o do AD‑CAU, evidenciadas pela leitura das trocas ocorridas entre as autoridades belgas e a Comissão, que esta apresentou em resposta a uma medida de organização do processo de 30 de junho de 2022, que as soluções respetivamente adotadas quanto à aplicação desse artigo aos factos do presente processo não foram as mesmas.

170    De qualquer forma, como já foi acima referido nos n.os 65 e 66, as recorrentes não apresentaram no Tribunal Geral elementos concretos capazes de demonstrar que a deslocalização em causa se justificava principalmente devido a considerações alheias à instituição dos direitos aduaneiros adicionais, apesar de lhes incumbir o ónus da prova, como acima recordado no n.o 162.

2)      Quanto à violação do princípio do prazo razoável

171    Quanto à alegada inobservância de um prazo razoável no procedimento administrativo que levou à adoção da decisão recorrida, refira‑se desde já que o artigo 34.o, n.o 11, do código aduaneiro, que autoriza a Comissão a pedir a um Estado‑Membro que revogue as decisões IVO, a fim de garantir uma determinação correta e uniforme da origem das mercadorias, não prevê, como, aliás, acertadamente refere a Comissão, nenhum prazo, mesmo indicativo, para a sua análise das decisões IVO que lhe são notificadas, nos termos do artigo 19.o do Regulamento 2015/2447 (v. n.o 12, supra).

172    No entanto, o simples facto de a Comissão não estar sujeita a nenhum prazo para pedir a um Estado‑Membro que revogue as decisões IVO não obsta a que o juiz da União verifique se essa instituição não respeitou um prazo razoável.

173    No caso, há que observar que as decisões IVO em causa foram notificadas à Comissão pelas autoridades aduaneiras belgas em 21 de agosto de 2019 e que a Comissão, em 5 de outubro de 2020, contactou essas autoridades para lhes comunicar a sua intenção de lhes pedir que revogassem as referidas decisões.

174    Na sequência de uma troca de correspondência com as autoridades belgas, no âmbito da qual estas formularam observações por correio eletrónico de 13 de novembro de 2020, a Comissão iniciou, logo em 22 de dezembro de 2020, um procedimento com vista à adoção da decisão recorrida, que a levou a interrogar diferentes direções‑gerais. Em 5 de março de 2021, a Comissão submeteu o projeto de decisão recorrida a todas as delegações do comité do código aduaneiro, secção «Origem», no âmbito do procedimento consultivo e por procedimento escrito. Em 29 de março de 2021, a Comissão enviou uma nota de síntese ao Comité do Código Aduaneiro, secção «Origem», antes de adotar, em 31 de março de 2021, a decisão recorrida.

175    Assim, embora tenha decorrido um pouco mais de treze meses entre a notificação, pelas autoridades aduaneiras belgas, das decisões IVO em causa e o primeiro contacto da Comissão com estas últimas a respeito de um eventual pedido de revogação dessas decisões, não é por isso que se pode considerar que o prazo de dezasseis meses decorrido entre a referida notificação e a abertura do procedimento formal interno com vista à adoção da decisão recorrida é excessivo, em circunstâncias como as do caso presente, que, de resto, se caracterizavam pelo caráter inédito do uso, pela Comissão, da competência que lhe é conferida pelo artigo 34.o, n.o 11, do Código Aduaneiro, para pedir a um Estado‑Membro que revogue decisões IVO, a fim de garantir uma determinação correta e uniforme da origem das mercadorias.

176    Há que observar ainda que, na sequência disso, a Comissão adotou a decisão recorrida no termo de um procedimento administrativo que durou menos de quatro meses, no decurso do qual várias partes institucionais tiveram de ser consultadas e puderam formular observações, o que demonstra certa celeridade.

177    Daí decorre que há que rejeitar a terceira parte do quinto fundamento.

d)      Quanto à quarta parte do quinto fundamento, relativa à violação da liberdade de empresa e do direito de propriedade

178    As recorrentes alegam que a Comissão interpretou o artigo 33.o do AD‑CAU de uma forma que priva os operadores comerciais da escolha legítima do local de implantação das suas atividades, o que viola a sua liberdade de empresa e o seu direito de propriedade. Ora, segundo as recorrentes, qualquer ingerência da Comissão nas decisões comerciais tomadas pelas empresas não deve ir além do necessário para atingir um objetivo legítimo e, embora o controlo do regime comercial e aduaneiro da União constitua um objetivo legítimo, deve, no entanto, ser prosseguido dentro de limites estritos para não constituir uma ingerência arbitrária para fins políticos.

179    A Comissão contesta estas alegações.

180    A este respeito, há que lembrar que, nos n.os 41 a 46 do seu Acórdão de 22 de janeiro de 2013, Sky Österreich (C‑283/11, EU:C:2013:28), o Tribunal de Justiça recordou que a proteção conferida pelo artigo 16.o da Carta dos Direitos Fundamentais inclui a liberdade de exercer uma atividade económica ou comercial, a liberdade contratual e a livre concorrência. Além disso, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a liberdade de empresa não constitui uma prerrogativa absoluta, mas deve ser tomada em consideração tendo em conta a sua função na sociedade. Com base nesta jurisprudência e tendo em conta a redação do artigo 16.o da Carta dos Direitos Fundamentais, que é distinta da redação das restantes liberdades fundamentais consagradas no seu Título II, ao mesmo tempo que se aproxima da redação de determinadas disposições do Título IV dessa mesma Carta dos Direitos Fundamentais, a liberdade de empresa pode estar sujeita a um amplo leque de intervenções do poder público suscetíveis de estabelecer, no interesse geral, limitações ao exercício da atividade económica.

181    Por força do artigo 17.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais, todas as pessoas têm o direito de fruir da propriedade dos seus bens legalmente adquiridos, de os utilizar, de dispor deles e de os transmitir em vida ou por morte. Ninguém pode ser privado da sua propriedade, exceto por razões de utilidade pública, nos casos e condições previstos por lei e mediante justa indemnização pela respetiva perda, em tempo útil. Além disso, a utilização dos bens pode ser regulamentada por lei na medida do necessário ao interesse geral.

182    Dado que os direitos garantidos pelo artigo 16.o e pelo artigo 17.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais não são absolutos, o seu exercício pode estar sujeito a limitações justificadas por objetivos de interesse geral prosseguidos pela União. De acordo com o artigo 52.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais, qualquer limitação do exercício dos direitos e das liberdades consagrados nessa Carta deve estar prevista na lei, respeitar o seu conteúdo essencial e deve, no respeito do princípio da proporcionalidade, ser necessária e responder efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União ou, caso seja necessário, de proteção dos direitos e das liberdades de outrem.

183    No caso, as recorrentes não precisam os elementos de facto que poderiam sustentar as alegações que formulam no âmbito da presente parte e que seriam capazes de demonstrar que a decisão recorrida limitou de forma desproporcionada o seu direito de propriedade ou a sua liberdade de empresa.

184    Além disso, por um lado, uma eventual limitação desses direitos fundamentais, mesmo admitindo‑a demonstrada, não seria consequência da decisão recorrida. Na realidade, tal limitação, admitindo‑a demonstrada, teria origem no Regulamento 2018/886, que instituiu os direitos aduaneiros adicionais. Ora, como resulta dos autos, as recorrentes não puseram em causa a legalidade do referido regulamento no âmbito do presente recurso. Por outro lado, há que considerar igualmente que, uma vez que não foi demonstrado que a decisão recorrida obsta a que as recorrentes comercializem, na União, motociclos fabricados pela Harley‑Davidson, esta decisão não entrava de forma desproporcionada o gozo, pelas recorrentes, do seu direito de exercerem atividades económicas no mercado da União nem o exercício do seu direito de propriedade na produção e comercialização dos motociclos em causa.

185    Tendo em conta todas estas considerações, improcede a quarta parte do quinto fundamento e, com ela, todo o quinto fundamento.

6.      Quanto ao sexto fundamento, relativo a abuso de poder da Comissão para fins políticos

186    As recorrentes sustentam que o momento em que a decisão recorrida foi adotada demonstra muito claramente que o comportamento da Comissão se baseava em considerações políticas. Alegam, assim, que a Comissão abusou do seu poder, que lhe permite velar por que a origem das mercadorias importadas na União seja determinada de forma correta, ao pedirem às autoridades aduaneiras nacionais que revogassem decisões IVO, exclusiva ou principalmente para fins diferentes daqueles para os quais foi conferido, comprometendo assim o objetivo desse poder, que é garantir «condições de concorrência iguais» corretas e harmonizadas para os operadores económicos.

187    A Comissão contesta essas alegações.

188    O Tribunal observa que, a coberto de um alegado «abuso de poder», as recorrentes, com as suas alegações, alegam, na realidade, no âmbito deste sexto fundamento, um desvio de poder por parte da Comissão. Com efeito, com a sua argumentação, as recorrentes alegam, essencialmente, que a decisão recorrida constitui uma medida disfarçada de política comercial, destinada a pressionar o Governo dos Estados Unidos a renunciar aos direitos aduaneiros impostos nos termos da section 232 da Lei de 1962 sobre a expansão do comércio.

189    Resulta de jurisprudência constante que um ato só está ferido de desvio de poder se, com base em indícios objetivos, relevantes e concordantes, se verifica ter sido adotado com a finalidade exclusiva, ou pelo menos determinante, de atingir fins diversos dos invocados ou de tornear um processo especialmente previsto pelo Tratado para obviar às circunstâncias do caso (v. Acórdão de 20 de março de 2019, Foshan Lihua Ceramic/Comissão, T‑310/16, EU:T:2019:170, n.o 176 e jurisprudência referida).

190    Ora, as recorrentes não apresentam nenhum elemento concreto, além de alegações vagas e abstratas, capaz de demonstrar que a Comissão adotou a referida decisão para fins diversos dos invocados, a saber, garantir a determinação correta e uniforme da origem das mercadorias importadas na União. Embora as recorrentes tenham apresentado artigos de imprensa, alguns dos quais são, de resto, posteriores à adoção da decisão recorrida, não se pode deixar de observar que esses artigos não dizem respeito nem à decisão recorrida nem a decisões semelhantes. Além disso, esses artigos referem sobretudo uma preocupação por parte da Comissão relativamente a uma eventual escalada do diferendo que opõe a União aos Estados Unidos no contexto da iminente entrada em vigor dos direitos aduaneiros adicionais previstos no anexo II do Regulamento 2018/886.

191    Portanto, ao limitar‑se a alegar que a decisão recorrida foi adotada para «fins políticos», as recorrentes procedem por pura afirmação.

192    Assim, nenhum elemento revela indícios suscetíveis de sustentar a ideia de que o procedimento que conduziu à adoção da decisão recorrida foi iniciado com a finalidade exclusiva, ou pelo menos determinante, de atingir objetivos diferentes do acima evocado no n.o 190.

193    Daqui resulta que o sexto fundamento deve ser julgado improcedente.

194    Resulta do exposto que o pedido de anulação da decisão recorrida deve ser julgado improcedente.

C.      Quanto ao pedido de medidas de organização do processo ou de diligências de instrução

195    A Comissão sustenta que o terceiro pedido das recorrentes no sentido de o Tribunal Geral ordenar as medidas de organização do processo ou diligências de instrução que considere adequadas ficou sem objeto, dado que os documentos a que as recorrentes aludem foram tornados públicos em resposta ao seu pedido nesse sentido apresentado com base no Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO 2001, L 145, p. 43).

196    As recorrentes consideram que o Tribunal Geral pode, no entanto, julgar útil pedir à Comissão que apresente elementos de prova mais amplos, uma vez que os documentos que esta divulgou não permitem sustentar suficientemente as suas alegações.

197    Quanto à apreciação dos pedidos de medidas de organização do processo ou de diligências de instrução apresentados por uma parte num litígio, há que lembrar que só ao Tribunal Geral cabe decidir da eventual necessidade de completar os elementos de informação de que dispõe sobre os processos que lhe são submetidos (v. Acórdão de 22 de novembro de 2007, Sniace/Comissão, C‑260/05 P, EU:C:2007:700, n.o 77 e jurisprudência referida).

198    No caso, as recorrentes não indicam com precisão os fundamentos suscetíveis de justificar este pedido de medidas de organização do processo ou de diligências de instrução, como exige o artigo 88.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral.

199    De qualquer forma, refira‑se que os elementos que constam dos autos são suficientes para permitir ao Tribunal decidir, tendo este podido pronunciar‑se utilmente com base nos pedidos, fundamentos e argumentos desenvolvidos no decurso da instância e tendo em conta os documentos juntos pelas partes.

200    Por conseguinte, indefere‑se o pedido de medidas de organização do processo ou de diligências de instrução.

201    Daí resulta que se nega integralmente provimento ao recurso, sem que seja necessário conhecer da admissibilidade do documento junto pela Comissão, com vista à realização da audiência de alegações, que contém a transcrição de uma conversa telefónica realizada em 24 de julho de 2018 entre a Harley‑Davidson e os representantes dos seus acionistas.

 Quanto às despesas

202    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

203    Tendo as recorrentes sido vencidas, há que condená‑las nas despesas, em conformidade com o pedido da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção alargada)

decide:

1)      Negase provimento ao recurso.

2)      A HarleyDavidson Europe Ltd e a Neovia Logistics Services International são condenadas nas despesas.

Papasavvas

Svenningsen

Jaeger

Mac Eochaidh

 

      Pynnä

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 1 de março de 2023.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.