Language of document : ECLI:EU:T:2011:329

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção)

6 de Julho de 2011 (*)

«Marca comunitária – Pedido de marca nominativa comunitária BETWIN – Motivos absolutos de recusa – Carácter descritivo – Artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento (CE) n.° 207/2009 – Dever de fundamentação – Igualdade de tratamento – Artigo 49.° CE»

No processo T‑258/09,

i‑content Ltd Zweigniederlassung Deutschland, com sede em Berlim (Alemanha), representada inicialmente por A. Nordemann, e em seguida por T. Boddien, advogados,

recorrente,

contra

Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por S. Schäffner, na qualidade de agente,

recorrido,

que tem por objecto um recurso de anulação da decisão da Quarta Câmara de Recurso do IHMI de 4 de Maio de 2009 (processo R 1528/2008‑4), relativa a um pedido de registo do sinal nominativo BETWIN como marca comunitária,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção),

composto por: O. Czúcz (relator), presidente, I. Labucka e K. O’Higgins, juízes,

secretário: C. Heeren, administradora,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de Julho de 2009,

vista a contestação apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 7 de Outubro de 2009,

vista a réplica apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de Janeiro de 2010,

após a audiência de 30 de Novembro de 2010,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 20 de Abril de 2008, a recorrente, a i‑content Ltd Zweigniederlassung Deutschland, apresentou junto do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) um pedido de registo como marca comunitária do sinal nominativo BETWIN nos termos do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de Dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de Fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1)].

2        Os serviços para os quais foi pedido o registo pertencem às classes 35, 38 e 41 na acepção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem, para cada uma destas classes, à seguinte descrição:

–        classe 35: «Publicidade; serviços de gestão dos negócios comerciais; administração comercial; consultoria às empresas; trabalhos de escritório; previsões e análises económicas; estudo comportamental; marketing; marketing directo; estudos de mercado; relações públicas (Public Relations); estimativas em matéria de negócios; aconselhamento para a organização e a gestão de empresas; promoção das vendas (Sales Promotion) (por conta de terceiros); comercialização de anúncios; serviços de uma agência, a saber mediação de contratos de compra e venda de produtos; sistematização de dados em bases de dados informáticas; (informações em matéria de) negócios de empresas; escrituração comercial; serviços de escrituração; locação de espaços publicitários para os meios de comunicação; (difusão de) anúncios publicitários; reprodução de documentos; sondagens de opinião; edição de textos publicitários; colecta e compilação de artigos de imprensa temáticos; processamento de texto; mediação de negócios para terceiros; exploração de um centro de chamadas para a venda, o aconselhamento ou o serviço à clientela; desenvolvimento de projectos no plano dos negócios, da organização e da publicidade; patrocínio para fins publicitários; concepção e desenvolvimento de emissões radiofónicas e televisivas no plano da organização e da publicidade; organização e realização de exposições para fins económicos e publicitários; concepção e desenvolvimento de espectáculos, de jogos, de lotarias, de competições, de bailes, de sorteios, de concursos no plano dos negócios, da organização e da publicidade; desenvolvimento de sistemas de comunicação, de redes de processamento de dados, de bases de dados e de algoritmos, em particular, na Internet e para a Internet, no plano dos negócios e da organização; (locação de) material publicitário; consultoria (em gestão do pessoal); pesquisas e investigações económicas; organização de vendas em leilão; investigações comerciais; publicidade por correspondência; elaboração de peritagens em negócios; avaliações de valores; análises custo/utilidade; serviços de uma agência de preços; serviços de consultoria em negócios; publicidade televisiva; informações de negócios; estudos de mercado e de marketing; planificação de negócios; reprodução de documentos; Image not foundpublicação de textos publicitários; administração informatizada das bases de dados; (reprodução de) documentos; supervisão de negócios; administração de ficheiros por computador; (exploração de uma) agência de importação‑exportação; pesquisa relativa às empresas; colecta, estabelecimento e difusão de informações económicas; estatísticas, bases de dados informáticas e outras informações económicas; análise de mercado; locação de superfícies publicitárias; estudo de mercado; locação de material publicitário; apresentação de produtos para fins publicitários; (serviços de uma) agência de publicidade; publicidade sob a forma de pósteres; (organização de) exposições e de feiras para fins económicos e publicitários; distribuição de amostras de produtos para fins publicitários; locação de distribuidores automáticos; (elaboração de) previsões económicas; criação de anúncios para terceiros; publicidade em linha numa rede informática; (realização de) transcrições; serviços de aprovisionamento para terceiros (compra de produtos e de serviços para outras empresas); serviços de manequins para fins publicitários e promocionais; pesquisa em ficheiros informáticos (por conta de terceiros); colecta e compilação de artigos de imprensa temáticos; trabalhos de reprodução heliográfica; recrutamento (de pessoal); selecção de pessoal com recurso a testes psicológicos de aptidão; realização de feiras para fins comerciais ou publicitários; colocação de anúncios por conta de terceiros; (compilação de) dados em bases de dados informáticas; facturação; publicidade directa; compilação de dados em bases de dados informáticas; publicidade radiofónica; fotocópias; apresentação audiovisual para fins publicitários; (publicidade através de) escritos publicitários; (distribuição de) material publicitário (folhetos, prospectos, impressos, amostras de produtos)»;

–        classe 38: «Telecomunicações; difusão de programas radiofónicos e televisivos, também através de redes por cabo; colecta e fornecimento de informações; agências de imprensa; realização ou disponibilização de protocolos de comunicação para permitir a troca de dados ou a transmissão de dados entre dois ou mais parceiros de comunicação; disponibilização de uma caixa de correio electrónica; transmissão de mensagens; transmissão de mensagens e de imagens por computador; procuração de acesso a uma bases de dados para a descarga de dados e de informações através dos medias electrónicos (Internet); disponibilização de serviços de correio electrónico; (difusão de) emissões radiofónicas; execução de serviços de telefonia e de serviços de teletexto; serviço de videotexto; difusão, propagação e transmissão de imagens, de informações sonoras, de gráficos, de dados e outras informações por rádio, aparelhos de telecomunicações, medias electrónicos ou Internet; serviços de acesso a bases de dados na Internet; serviços electrónicos de anúncios (telecomunicações); disponibilização de equipamentos de telecomunicações para encomendar produtos e serviços através da comunicação electrónica de dados; transmissão via satélite; serviços de telefonia local e interurbana, de chamadas, para o estrangeiro e móvel; difusão de emissões de telecompra; (informações a respeito das) telecomunicações; disponibilização de ligações de telecomunicações para uma rede informática mundial; envio de mensagens em redes informáticas; exploração de redes para a transmissão de mensagens, de imagens, de textos, da voz, de sinais e de dados; colecta e fornecimento de mensagens de imprensa; procuração para acesso a bases de dados; difusão de programas na Internet; recepção e emissão de mensagens, de documentos e de dados para transmissão electrónica; retransmissão de chamadas telefónicas ou de mensagens de telecomunicações; transmissão (electrónica) de mensagens; tabelas de afixação e tabelas electrónicas de mensagens sobre temas de interesse geral; serviços de videotransmissão; difusão e transmissão de informações em redes ou na Internet; serviços de conferências telefónicas; transmissão electrónica sem fios de voz, de dados, de telecópias, de imagens e de informações; difusão de filmes cinematográficos e de programas audiovisuais; difusão e transmissão de textos, de mensagens, de informações, do som, da imagem e de dados; serviço de visiotelefonia; (difusão de) emissões radiotelefónicas; difusão de programas de televisão por assinatura; serviços em linha e transmissão em linha, a saber transmissão de dados vocais, do tipo imagem e vídeo bem como disponibilização de conferências visiotelefónicas e de videoconferências»;

–        classe 41: «Traduções; educação; formação; treino; divertimento; actividades desportivas e culturais; organização e realização de colóquios, conferências, congressos, seminários, simpósios, ateliers e exposições de todo o género para fins culturais e de ensino; manifestações recreativas; produção, organização e realização de espectáculos, jogos, lotarias, competições, bailes, sorteios, concursos de todo o género; produção de filmes; produção de espectáculos, de programas radiofónicos e televisivos; publicação de textos e de livros; exploração de campos de golfe, de parques de atracções, de férias e de lazer; exploração de um teatro, de um centro desportivo, de uma sala desportiva, de um estádio e de um estabelecimento de organização de espectáculos musicais, desportivos e outros espectáculos recreativos; locação de equipamentos e de objectos destinados ao sector da educação, da formação, do treino, da recreação, do desporto ou da cultura; publicação, difusão e edição de escritos informativos de todo o género; exploração de clubes de manutenção da forma; salas de jogo; exploração de casinos; produção musical; registo da imagem e do som; serviços de estabelecimentos de desportos, de jogos, de apostas e de lotaria, incluindo na e via Internet; disponibilização de equipamentos de desporto, de jogos, de apostas e de lotaria, incluindo na e via Internet; disponibilização de informações em linha relativas a jogos, em particular, jogos informáticos e em linha, bem como extensões informáticas para jogos; organização de reserva de bilhetes para espectáculos e outras manifestações recreativas; serviços de reportagens da actualidade; serviços de desporto e de relaxamento; produção e apresentação de programas radiofónicos e televisivos, de filmes, de espectáculos e de emissões recreativas em directo; serviços de lotaria; disponibilização de jogos informáticos aos quais os utentes têm acesso via uma rede informática global/ou Internet; serviços de parques desportivos; produção de emissões de telecompra; serviços de programas de informação para a rádio e para a televisão; disponibilização de informações sobre lazeres; serviços informatizados de formação e de prática; exploração de estúdios de música, de som, de filmes, de vídeo e de televisão; serviços relativos a clubes de saúde e de manutenção; recreação cinematográfica, musical, desportiva, de vídeo e de teatro; organização de competições de golfe; exploração de salões de jogos; publicação electrónica de livros e de revistas em linha; reservas para manifestações recreativas; programas de informação destinados a ser transmitidos na Internet; venda directa de programas televisivos para diversos canais; jogos interactivos, recreação e concursos interactivos bem como charadas e jogos de fortuna ou azar electrónicos, todos disponibilizados via uma rede informática global ou Internet; organização e realização de manifestações e de concursos nos domínios desportivo e cultural; serviços de um estúdio de televisão; serviços de um fotógrafo; exploração de salas de jogos; serviços de uma redacção; disponibilização de informações relativas a recreação via redes informáticas; exploração e organização de clubes de admiradores; serviços de um clube de manutenção; organizações de representações em directo; disponibilização de jogos informáticos interactivos para diversos jogadores via Internet e de redes electrónicas de comunicação; locação de gravações audiovisuais; organização de eventos desportivos e disponibilização de equipamentos para este efeito; informações relativas ao desporto, às manifestações desportivas e a outros acontecimentos actuais; jogos e concursos electrónicos disponibilizados via Internet; serviços de seguimento no domínio dos desportos; exploração, realização e organização de casinos, de jogos de fortuna ou azar, de jogos de cartas, de apostas, de apostas desportivas, de jogos de habilidade e de jogos em geral; jogos oferecidos em linha, via uma rede informática; organização de jogos e de competições; disponibilização de informações relativas a jogos de vídeo, jogos informáticos, máquinas automáticas de jogos, centros recreativos ou parques recreativos via redes de telecomunicações ou informáticas; disponibilização de informações em linha relativas a entretenimento a partir de uma base de dados informática ou da Internet; reserva de entradas e reservas para manifestações recreativas, desportivas e culturais; organização de corridas equestres; exploração de casinos; disponibilização de jogos informáticos em linha; exploração de salas de jogos com máquinas automáticas recreativas e de casinos bem como centros de apostas e de lotarias de todo o tipo; edição de estatísticas».

3        Por decisão de 10 de Setembro de 2008, o examinador indeferiu o pedido para todos os serviços em causa nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento (CE) n.° 40/94 [actual artigo 7.°, n.° 1, alíneas b) e c), do Regulamento n.° 207/2009].

4        Em 22 de Outubro de 2008, a recorrente interpôs recurso da decisão do examinador nos termos dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.° 40/94 (actuais artigos 58.° a 64.° do Regulamento n.° 207/2009).

5        Por decisão de 4 de Maio de 2009 (a seguir «decisão impugnada»), a Quarta Câmara de Recurso do IHMI negou provimento ao recurso com base em que o sinal nominativo BETWIN era descritivo para todos os produtos visados na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, e desprovido de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do referido regulamento.

6        No que respeita ao carácter descritivo, a Câmara de Recurso salientou que a sua apreciação se baseava no significado do sinal nominativo em inglês e, portanto, na sua percepção nas regiões anglófonas da União. A Câmara de Recurso considerou, no essencial, que, no seu conjunto, a combinação dos elementos «bet» e «win» evocava a possibilidade de «apostar e ganhar» e que se tratava de uma palavra composta em conformidade com as regras do inglês, cujo significado a priori evidente não era modificado em nada pela omissão da palavra «and» (e). Além disso, segundo a Câmara de Recurso, o significado desta palavra composta é directamente compreensível, pois o sinal nominativo em causa sugere directamente e sem esforço de análise ao consumidor final interessado nas ofertas de apostas e de jogos‑concursos que os serviços oferecidos lhe permitem apostar para ganhar qualquer coisa (n.os 15 a 17 da decisão impugnada). A Câmara de Recurso considerou ainda que se tratava de uma combinação de duas formas nominativas que, na sua interacção, informavam sobre a espécie e o destino dos serviços designados e não podia ser, portanto, outra que descritiva (n.° 18 da decisão impugnada). Por outro lado, rejeitou a outra interpretação do sinal nominativo cujo registo tinha sido solicitado, a saber «be twin», uma vez que «sê um gémeo» é uma mensagem desprovida de pertinência em relação aos serviços em causa (n.° 19 da decisão impugnada).

7        Quanto aos serviços abrangidos pela marca requerida, a Câmara de Recurso concluiu, no n.° 20 da decisão impugnada, que diziam respeito, no essencial, a serviços do sector dos jogos de fortuna ou azar e das apostas, que tinham como objectivo permitir ao consumidor final fazer apostas e realizar ganhos. A Câmara de Recurso considerou igualmente, no n.° 21 da decisão impugnada, que o marketing moderno associava de diversas maneiras as vendas e as possibilidades aleatórias de ganho, fazendo referência, designadamente aos canais de televisão e à ofertas na Internet que prevêem elementos de jogos de fortuna ou azar para promover as vendas, bem como aos canais de telecompra. A Câmara de Recurso assinalou, além disso, no n.° 22 da decisão impugnada, que o sector das apostas e dos jogos‑concurso se tinha tornado num sector que gerava um importante volume de negócios, cujas ofertas não podiam ser todas qualificadas como sérias. Além disso, resulta do n.° 23 da decisão impugnada que, segundo a Câmara de Recurso, os serviços requeridos incluem serviços exigidos no plano técnico para a realização e a venda de apostas e de jogos‑concurso em relação aos quais a marca requerida é igualmente descritiva, visto que estes permitem preencher os requisitos técnicos da gestão de apostas e de jogos‑concurso e que estes últimos podem, ainda, ser um elemento essencial de manifestações de jogo e de recreação, incluindo, por exemplo, no âmbito das emissões televisivas. Quanto aos serviços da classe 35, a Câmara de Recurso considerou, no n.° 24 da decisão impugnada, designadamente que tinham por objecto levantamentos comerciais e estatísticos indispensáveis, do ponto de vista de quem faz uma aposta, para poder calcular o risco, isto é, a relação entre a possibilidade de ganhar, que constitui o objecto de um sorteio, e a probabilidade do acontecimento que é o objecto da aposta. Em relação aos outros serviços, em particular, aos da classe 35, concluiu, no n.° 25 da decisão impugnada, que estes diziam respeito, muito em geral, à promoção das vendas e que, tendo em conta que o pedido de registo respeitava aos serviços em causa de modo muito geral, devia ser confirmado o indeferimento em relação aos referidos serviços na sua globalidade e considerou que, de resto, todos os serviços estavam indissociavelmente ligados.

8        A Câmara de Recurso considerou, além disso, no n.° 26 da decisão impugnada, que a recorrente já não tinha invocado perante a mesma os registos de marcas eventualmente comparáveis, acrescentando que, em qualquer caso, o examinador podia tê‑las em consideração sem lhes reconhecer efeito vinculativo.

9        No que respeita ao artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, a Câmara de Recurso entendeu, no n.° 27 da decisão impugnada, que, enquanto indicação descritiva cujo significado podia ser compreendido por qualquer um, mesmo sem conhecimentos especializados e sem esforço de análise, o sinal nominativo cujo registo tinha sido pedido era igualmente desprovido de carácter distintivo. Além disso, considerou que este veiculava unicamente uma incitação geral a participar em certas apostas ou jogos, ou a obter vantagens económicas sob a forma de ganho, sem precisar o nexo possível com um determinado prestatário, e era, portanto, desprovido de carácter distintivo na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009.

 Pedidos das partes

10      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada e a decisão do examinador;

–        condenar o IHMI nas despesas.

11      O IHMI conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

12      Na audiência, em resposta a uma questão do Tribunal Geral, a recorrente precisou que desistia do seu primeiro pedido na medida em que este se destinava à anulação da decisão do examinador.

 Questão de direito

13      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca quatro fundamentos, relativos, respectivamente, a uma violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, a uma violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do referido regulamento, a uma violação do artigo 83.° do mesmo regulamento, conjugado com o princípio da igualdade de tratamento, bem como dos artigos 6.° e 14.° da Convenção para a protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950, a seguir «CEDH», e a uma violação do artigo 49.° CE.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009

 Argumentos das partes

14      A recorrente sustenta que a Câmara de Recurso concluiu erradamente que a marca requerida era descritiva. Alega que esta é uma invenção lexical não descritiva na sua totalidade e invulgar na sua estrutura, pois a combinação de dois verbos é invulgar em inglês. Segundo a recorrente, não é possível encontrar exemplos de adição de um verbo ou de um substantivo a seguir à palavra «bet» para constituir uma palavra composta. A marca requerida também não é, além disso, constituída por uma justaposição de palavras formada de modo usual em inglês, como a combinação das palavras «bet» (apostar, aposta) e «win» (ganhar, ganho).

15      Segundo a recorrente, o alegado carácter descritivo da marca requerida não pode ser justificado pelo facto de o domínio das apostas e dos jogos a dinheiro se ter, entretanto, tornado muito prometedor.

16      Além disso, a recorrente alega que a Câmara de Recurso não analisou de forma pertinente o seu argumento segundo o qual a marca requerida podia igualmente ser lida como uma combinação das palavras «be» e «twin», como no caso do programa informático beTwin, e deixou‑se guiar pela hipótese incorrecta segundo a qual o consumidor médio procura sempre, em primeiro lugar, o significado descritivo de uma marca.

17      Por último, a recorrente assinala, a título subsidiário; que a conclusão relativa a um eventual carácter descritivo da marca requerida está, em todo o caso, justificada para os serviços que dizem directamente respeito ao fornecimento de prestações de apostas e de jogos a dinheiro.

18      O IHMI contesta os argumentos da recorrente e alega que o termo «betwin» é descritivo.

19      Em particular, relativamente aos serviços que constituem o objecto do pedido de registo, o IHMI observa que o sinal nominativo BETWIN tem um carácter descritivo quanto aos serviços do sector dos jogos de fortuna ou azar e quanto aos serviços visados pelo pedido de marca que são exigidos no plano técnico para a realização e a venda de apostas e de jogos‑concurso. O IHMI precisa que todos os serviços das classes 35, 38 e 41 visados pelo pedido estão indissociavelmente ligados e que existe, pelo menos, uma ligação estreita e indissociável entre estes serviços e as apostas desportivas e outras, os jogos de fortuna ou azar, as lotarias, os jogos‑concurso ou outros, ou, ainda, que os referidos serviços implicam explicitamente a realização destes últimos.

 Apreciação do Tribunal Geral

20      Nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, será recusado o registo «[d]e marcas compostas exclusivamente por sinais ou indicações que possam servir, no comércio, para designar a espécie, a qualidade, a quantidade, o destino, o valor, a proveniência geográfica ou a época de fabrico do produto ou da prestação do serviço, ou outras características destes». Segundo o n.° 2 do mesmo artigo, «[o] n.° 1 é aplicável mesmo que os motivos de recusa apenas existam numa parte da Comunidade»

21      Segundo jurisprudência constante, o artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009 impede que os sinais, ou as indicações por ele visadas, sejam reservados a uma única empresa com base no seu registo como marca. Esta disposição prossegue um fim de interesse geral, que exige que esses sinais ou indicações possam ser livremente utilizados por todos [v. acórdão do Tribunal de 20 de Novembro de 2007, Tegometall International/IHMI – Wuppermann (TEK), T‑458/05, Colect., p. II‑4721, n.° 77, e a jurisprudência referida; acórdão do Tribunal de 9 de Julho de 2008, Reber/IHMI – Chocoladefabriken Lindt & Sprüngli (Mozart), T‑304/06, Colect., p. II‑1927, n.° 86].

22      Os sinais a que se refere o artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009 são considerados inaptos para exercer a função essencial da marca, a saber, identificar a origem comercial do produto ou do serviço, a fim de permitir ao consumidor que adquire o produto ou o serviço designado pela marca fazer, aquando de uma ulterior aquisição, a mesma escolha se a experiência se revelar positiva, ou fazer outra escolha se se revelar negativa [acórdãos do Tribunal 27 de Novembro de 2003, Quick/IHMI (Quick), T‑348/02, Colect., p. II‑5071, n.° 28, e a jurisprudência referida; acórdão Mozart, n.° 21 supra, n.° 87; v., igualmente, neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Outubro de 2003, IHMI/Wrigley, C‑191/01 P, Colect., p. I‑12447, n.° 30].

23      Os sinais e as indicações referidos no artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009 são os que podem servir, numa utilização normal do ponto de vista do público‑alvo, para designar seja directamente seja por referência a uma das suas características essenciais o produto ou o serviço para o qual é pedido o registo [acórdão do Tribunal de 22 de Junho de 2005, Metso Paper Automation/IHMI (PAPERLAB), T‑19/04, Colect., p. II‑2383, n.° 24, e a jurisprudência referida; acórdão Mozart, n.° 21 supra, n.° 88].

24      Daí resulta que, para que um sinal seja abrangido pela proibição enunciada pela referida disposição, é necessário que apresente com os produtos ou os serviços em causa um nexo suficientemente directo e concreto, susceptível de permitir ao público‑alvo perceber imediatamente e sem reflectir uma descrição da categoria de produtos ou serviços em causa ou de uma das suas características (v. acórdão PAPERLAB, n.° 23 supra, n.° 25, e a jurisprudência referida).

25      Importa igualmente recordar que a apreciação do carácter descritivo de um sinal só pode ser feita, por um lado, em relação à compreensão que dele tem o público em causa e, por outro, em relação aos produtos ou aos serviços em causa [v., acórdão do Tribunal de 7 de Junho de 2005, Münchener Rückversicherungs‑Gesellschaft/IHMI (MunichFinancialServices), T‑316/03, Colect., p. II‑1951, n.° 26, e a jurisprudência referida].

26      No caso em apreço, quanto ao público em relação ao qual importa apreciar o motivo absoluto de recusa em causa, a Câmara de Recurso entendeu, no essencial, que este era constituído pelo consumidor médio, o que, de resto, a recorrente não contesta. Além disso, atendendo ao facto de que o sinal nominativo BETWIN é constituído por palavras da língua inglesa, a Câmara de Recurso apreciou correctamente o seu carácter descritivo, em particular, do ponto de vista do público anglófono.

27      Importa, portanto, examinar se existe, do ponto de vista do referido público uma relação suficientemente directa e concreta entre o sinal nominativo em questão e os serviços para os quais o pedido de registo foi pedido.

28      Quanto aos serviços em causa, resulta do n.° 2 supra que estes se inserem nas classes 35, 38 e 41. As partes estão com razão de acordo quanto ao facto de estes compreenderem, por um lado, serviços que têm por objecto a oferta de apostas ou de jogos a dinheiro e, por outro, serviços que não têm nexo directo com este sector. Em relação a estes últimos, a recorrente alega, a título subsidiário, que a marca requerida não pode, em qualquer caso, ser considerada como descritiva a seu respeito. O Tribunal Geral entende ser útil examinar primeiro a legalidade da decisão impugnada em relação à primeira categoria de serviços, que têm por objecto a oferta de apostas ou de jogos a dinheiro.

–       Quanto ao carácter descritivo da marca requerida em relação aos serviços que têm por objecto a oferta de apostas ou de jogos a dinheiro

29      Importa recordar que, para que uma marca constituída por um neologismo ou por uma palavra resultante da combinação de elementos seja considerada descritiva, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, não basta que se apure um eventual carácter descritivo relativamente a cada um desses elementos. Tal carácter também deve ser apurado em relação ao neologismo ou à própria palavra [acórdãos do Tribunal PAPERLAB, n.° 23 supra, n.° 26; de 14 de Junho de 2007, Europig/IHMI (EUROPIG), T‑207/06, Colect., p. II‑1961, n.° 28, e de 25 de Março de 2009, allsafe Jungfalk/IHMI (ALLSAFE), T‑343/07, ainda não publicado na Colectânea, n.° 22].

30      Uma marca constituída por um neologismo ou por uma palavra composta por elementos, cada um dos quais é descritivo das características dos produtos ou serviços em relação aos quais o registo é pedido, é ela própria descritiva das características desses produtos ou serviços, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, salvo se existir uma diferença perceptível entre o neologismo ou a palavra e a simples adição dos elementos que o constituem. Isso pressupõe que, devido ao carácter invulgar da combinação em relação aos referidos produtos ou serviços, o neologismo ou a palavra crie uma impressão suficientemente afastada da que é produzida pela simples reunião das indicações dadas pelos elementos que o constituem, de modo a prevalecer sobre a soma dos referidos elementos. A este respeito, a análise do termo em causa tendo presentes as regras lexicais e gramaticais apropriadas é igualmente pertinente (v. acórdão ALLSAFE, já referido, n.° 29 supra, n.° 23, e jurisprudência referida).

31      Relativamente à compreensão da marca requerida pelo público pertinente no caso em apreço, como indica a Câmara de Recurso no n.° 16 da decisão impugnada, confirmando assim a análise do examinador, a marca requerida é composta por duas palavras inglesas «bet» (apostar, aposta) e «win» (ganhar, ganho). Trata‑se de termos correntes da língua inglesa, o que, de resto, a recorrente não contesta.

32      Quanto à combinação destas duas palavras, a Câmara de Recurso indicou nos n.os 16 e 17 da decisão impugnada, que, considerada no seu conjunto, aquela evocava a possibilidade de «apostar e ganhar». Segundo a Câmara de Recurso, esta combinação é directamente compreensível para o público pertinente e existe, além disso, uma relação estreita entre os significados das duas palavras: aposta‑se para ganhar e, para ganhar, é preciso primeiro ter apostado. Esta apreciação deve ser confirmada. Com efeito, como assinala a Câmara de Recurso, a omissão da palavra «and» não retira nada ao significado evidente do termo composto «betwin». Com efeito, quer seja compreendido como uma sequência de dois substantivos, de dois infinitivos ou de dois verbos em sentido imperativo, não se trata de uma combinação invulgar ou arbitrária cujo sentido se afastaria do da simples soma dos elementos que a compõem.

33      Em relação aos serviços em causa, a Câmara de Recurso cita como exemplos, no n.° 20 da decisão impugnada, os serviços que correspondem à descrição seguinte: «concepção e desenvolvimento de espectáculos, de jogos, de lotarias, de competições, de bailes, de sorteios, de concursos; produção, organização e realização de jogos, lotarias, competições, bailes, sorteios, concursos de todo o género; salas de jogo; exploração de casinos; serviços de estabelecimentos de desportos, de jogos, de apostas e de lotaria, incluindo na e via Internet; disponibilização de equipamentos de desporto, de jogos, de apostas e de lotaria, incluindo na e via Internet; exploração de salas de jogos; disponibilização de jogos informáticos interactivos; realização e organização de casinos, de jogos de fortuna ou azar, de jogos de cartas, de apostas, de apostas desportivas, de jogos de habilidade; exploração de casinos; exploração de salas de jogos; exploração de centros de apostas e de lotarias de todo o tipo;» (a seguir «serviços mencionados no n.° 20 da decisão impugnada»).

34      Em relação às três classes de serviços cobertas pelo pedido de marca, tal como recordadas no n.° 2 supra, a saber as classes 35, 38 e 41, importa assinalar que a lista de serviços da classe 35 compreende os serviços de «concepção e desenvolvimento de espectáculos, de jogos, de lotarias, de competições, de bailes, de sorteios, de concursos no plano dos negócios, da organização e da publicidade», os quais, na medida em que são quase idênticos aos serviços mencionados no n.° 20 da decisão impugnada, são abrangidos pelos argumentos da Câmara de Recurso expostos no n.° 20, ainda que a decisão impugnada não o indique explicitamente. Quanto à classe 38, nenhum dos serviços que aí são enumerados corresponde aos mencionados no mesmo n.° 20 da decisão impugnada. Em relação aos serviços incluídos na classe 41, há que notar que se trata, em parte, de serviços referidos no n.° 20 da decisão impugnada (v. o n.° 33 supra).

35      Importa assinalar que, em relação aos serviços do sector das apostas e dos jogos a dinheiro, tal como descritos nos dois números precedentes, a Câmara de Recurso considerou com razão, no n.° 20 da decisão impugnada, que estes serviços tinham como objectivo permitir ao consumidor final fazer apostas e realizar ganhos. Relativamente a estes serviços, a consideração que consta do n.° 32 supra, segundo a qual não existe uma diferença perceptível entre o neologismo «betwin» e a simples adição dos elementos que o constituem, é, portanto, completamente pertinente. Com efeito, como assinala a Câmara de Recurso no n.° 18 da decisão impugnada, na sua interacção, os termos «bet» e «win» informam claramente sobre o destino dos serviços em causa e sobre as circunstâncias da sua utilização, pelo que são descritivos a seu respeito. Do mesmo modo, tratando‑se de serviços desta natureza, o termo combinado «betwin» evoca para o público pertinente a possibilidade de apostar e de ganhar.

36      Nenhum dos argumentos invocados pela recorrente põe em causa esta apreciação.

37      Contrariamente ao que alega, o facto de a combinação de dois verbos ser invulgar em inglês e de não existir no léxico de combinação o termo «bet» com outra palavra não tem por consequência que a combinação das palavras «bet» e «win», no caso em apreço, não tenha para o público pertinente um sentido imediatamente perceptível, nem que a referida combinação seja susceptível de criar uma qualquer dificuldade de compreensão. Com efeito, atendendo à estreita relação entre os significado dos dois termos, a omissão da palavra «e» ou do «&» não o impedirá de compreender que os serviços oferecidos lhe permitem apostar e ganhar. Em qualquer caso, como assinala a Câmara de Recurso no n.° 15 da decisão impugnada, o facto de se tratar de uma combinação de palavras escrita num único termo, sem hífen ou espaço, não é determinante, nem, de resto, o facto de se tratar de um termo que não se encontre no léxico [(v., neste sentido e por analogia, acórdão do Tribunal de 26 de Outubro de 2000, Harbinger/IHMI (TRUSTEDLINK), T‑345/99, Colect., p. II‑3525, n.° 37, e a jurisprudência referida].

38      Quanto ao argumento da recorrente segundo o qual o carácter descritivo da marca requerida não pode ser justificado pelo facto de o domínio das apostas e dos jogos a dinheiro se ter tornado, entretanto, muito prometedor, há que salientar que, ainda que a Câmara de Recurso, no n.° 22 da decisão impugnada, se refira efectivamente ao facto de o sector em causa ser gerador de um importante volume de negócios e colocar questões jurídicas relativas à protecção dos consumidores, todavia, esta não retirou daí qualquer consequência para apreciar o carácter descritivo da marca requerida em relação aos serviços que se incluem no sector das apostas e dos jogos a dinheiro.

39      Em relação ao argumento segundo o qual existe um programa informático designado «beTwin» e que a marca requerida poderia, portanto, ser lida pelo público pertinente como uma combinação das palavras «be» e «twin», deve recordar‑se que, como assinala o IHMI, um sinal nominativo deve ser objecto de recusa de registo, em aplicação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, se, em pelo menos um dos seus significados potenciais, designar uma característica dos produtos ou serviços em causa (acórdãos do Tribunal de Justiça IHMI/Wrigley, n.° 22 supra, n.° 32, e de 12 de Fevereiro de 2004, Campina Melkunie, C‑265/00, Colect., p. I‑1699, n.° 38). Atendendo também ao facto de que importa prescindir da forma concreta com que se escreva a denominação do aludido programa informático, beTwin, no âmbito de um pedido de marca nominativa que se pode escrever de diferentes formas, resulta desta jurisprudência que uma utilização efectiva particular da palavra composta em causa num domínio específico não exclui que, em presença de serviços com uma ligação directa com o sector das apostas e dos jogos, o termo «betwin» se possa entender como uma referência à possibilidade de apostar e de ganhar.

40      Resulta das considerações precedentes que há que confirmar a conclusão da Câmara de Recurso segundo a qual a marca requerida BETWIN é descritiva, na acepção do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, dos serviços que têm por objecto a oferta de apostas e de jogos a dinheiro.

–       Quanto ao carácter descritivo da marca requerida em relação aos serviços que não têm por objecto a oferta de apostas e de jogos a dinheiro

41      A Câmara de Recurso indica, no n.° 25 da decisão impugnada, que os termos dos serviços designados são de tal forma que estes se encontram indissociavelmente ligados. Além disso, segundo esta, não é possível, com base na muito longa lista de serviços das classes 35, 38 e 41, identificar os que não têm nenhuma relação com as apostas ou com os jogos‑concurso e os que apenas têm uma relação aleatória com as referidas apostas ou jogos‑concurso.

42      A este respeito, o Tribunal de Justiça recordou, por um lado, que o exame dos motivos de recusa deve incidir sobre cada um dos produtos ou dos serviços para os quais o registo da marca é pedido e, por outro, a decisão pela qual o IHMI recusa o registo de uma marca deve, em princípio, ser fundamentada relativamente a cada um dos referidos produtos ou dos referidos serviços. (v., despacho do Tribunal de Justiça de 18 de Março de 2010, CFCMCEE/IHMI, C‑282/09 P, ainda não publicado na Colectânea, n.° 37, e a jurisprudência referida).

43      É verdade que, quando o mesmo motivo de recusa é invocado para uma categoria ou um grupo de produtos ou serviços, o IHMI pode limitar‑se a uma fundamentação global para todos os produtos ou serviços em questão (v., por analogia, acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Fevereiro de 2007, BVBA Management, Training en Consultancy, C‑239/05, Colect., p. I‑1455, n.° 37).

44      Esta faculdade não pode, todavia, pôr em causa a exigência fundamental de que qualquer decisão que recuse o benefício de um direito reconhecido pelo direito da União possa ser sujeita a uma fiscalização jurisdicional destinada a assegurar a tutela efectiva desse direito e que, por este facto, deve incidir sobre a legalidade dos motivos desta recusa (v. despacho CFCMCEE/IHMI, n.° 42 supra, n.° 39, e a jurisprudência referida).

45      Deve recordar‑se, a este respeito, que a faculdade de a Câmara de Recurso proceder a uma fundamentação global para uma série de produtos ou de serviços só se pode estender a produtos e serviços que apresentem entre si uma relação suficientemente directa e concreta, ao ponto de formarem uma categoria com homogeneidade suficiente para permitir que o conjunto das considerações de facto e de direito que constituem a fundamentação da decisão em causa, por um lado, explicite suficientemente o raciocínio seguido pela Câmara de Recurso para cada um dos produtos e dos serviços dessa categoria e, por outro, possa ser aplicado indiferentemente a cada um dos produtos e dos serviços em causa [v., acórdão do Tribunal de 2 de Abril de 2009, Zuffa/IHMI (ULTIMATE FIGHTING CHAMPIONSHIP), T‑118/06, Colect., p. II‑841, n.° 28, e a jurisprudência referida].. Em particular, mesmo no caso de os produtos ou serviços em causa pertencerem à mesma classe na acepção do Acordo de Nice, esse facto não é suficiente para concluir por uma homogeneidade suficiente, uma vez que essas classes contêm muitas vezes uma grande variedade de produtos ou de serviços que não apresentam necessariamente entre si uma relação suficientemente directa e concreta (v. despacho CFCMCEE/IHMI, n.° 42 supra, n.° 40).

46      Por outro lado, a falta ou insuficiência de fundamentação, que constitui uma preterição de formalidades essenciais, na acepção do artigo 253.° CE, é um fundamento de ordem pública de conhecimento oficioso pelo julgador comunitário [v. acórdão do Tribunal de 17 de Abril de 2008, Dainichiseika Colour & Chemicals Mfg./IHMI – Pelikan (Representação de um pelicano), T‑389/03, não publicado na Colectânea, n.° 85 e a jurisprudência aí referida].

47      No caso em apreço, importa desde logo precisar que resulta da jurisprudência referida no número precedente que o argumento do IHMI, invocado na audiência, segundo o qual o fundamento de falta de fundamentação ou de fundamentação de insuficiente da decisão impugnada é extemporâneo não pode deixar de ser rejeitado.

48      Por outro lado, em resposta a uma questão do Tribunal Geral na audiência, em que este pedia ao IHMI para precisar a que classes de serviços cobertas pela marca requerida se aplicavam os motivos enunciados nos n.os 20 e seguintes da decisão impugnada, este último alega que os n.os 20 a 22 da referida decisão eram relativos aos serviços das classes 38 e 41 e que, a partir do n.° 24, a Câmara de Recurso tratava da classe 35. O mesmo recordou também que a jurisprudência permitia categorizar os serviços e que todos os serviços que figuravam no pedido de registo não deviam, portanto, ser reproduzidos literalmente.

49      Importa concluir que a decisão impugnada oferece poucas referências para relacionar os diferentes motivos de recusa aos muito numerosos serviços cobertos pela marca requerida que fazem parte das classes 35, 38 e 41 enumeradas no n.° 2 supra e que uma leitura atenta desta decisão não permite validar a análise do IHMI exposta no número precedente.

50      Desde logo, como foi debatido designadamente no n.° 34 supra, uma parte dos serviços cobertos, por um lado, pela classe 35 e, por outro, pela classe 41 é claramente susceptível de ser relacionado com os fundamentos evocados no n.° 20 da decisão impugnada.

51      Quanto ao resto, em primeiro lugar, no que respeita aos serviços resultantes da classe 35, estes compreendem serviços relativos ao domínio da publicidade na acepção mais ampla. Ora, além dos serviços mencionados no n.° 34 supra, a referida classe 35 contém igualmente uma série de serviços que, ainda que se incluam no sector da publicidade em sentido amplo, são, contudo, muito heterogéneos, pois trata‑se de serviços tão diversos como, por exemplo, a «consultoria às empresas»; «escrituração comercial; serviços de escrituração»; as «pesquisas e investigações económicas;» a «locação de material publicitário», a «(exploração de uma) agência de importação‑exportação», a «publicidade sob a forma de pósteres», a «locação de distribuidores automáticos», o «recrutamento (de pessoal)», a «selecção de pessoal com recurso a testes psicológicos de aptidão» ou a «compilação de dados em bases de dados informáticas».

52      O fundamento que figura no n.° 21 da decisão impugnada, segundo o qual, no essencial, o marketing moderno associa de diversas maneiras as vendas e as possibilidades aleatórias de ganho, não oferece ângulo de análise que permita reagrupar todos os serviços em causa incluindo‑os numa categoria homogénea.

53      Quanto à conclusão que figura no n.° 24 da decisão impugnada, segundo a qual a referida classe 35 inclui serviços que têm por objecto levantamentos comerciais e estatísticos indispensáveis para a realização de apostas, há que observar que a mesma é muito geral e apenas se aplica a uma parte dos serviços da classe considerada. Por outro lado, não compete ao Tribunal Geral pesquisar a que serviços da classe 35 este argumento se pode aplicar.

54      Do mesmo modo, no n.° 25 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso examinou um determinado número de serviços e, em particular, os da classe 35. Esta alegou que estes últimos diziam respeito de forma muito geral à promoção das vendas «sob a forma da promoção das vendas das próprias apostas desportivas, por um lado, e, por outro, sob a forma de gestão mais específica de apostas desportivas para estimular a venda de outros produtos ou serviços». São citados como exemplos os serviços de publicidade, os serviços de gestão de negócios, a administração comercial, a colecta de artigos de imprensa e o patrocínio. Estes fundamentos também são suficientes para demonstrar que os serviços heterogéneos da classe 35, como os mencionados no n.° 51 supra, formam uma categoria com uma homogeneidade suficiente para permitir a aplicação de uma fundamentação global do carácter descritivo da marca requerida a seu respeito.

55      A Câmara de Recurso acrescentou, no n.° 25 da decisão impugnada, que, dado que o pedido de registo dizia respeito aos serviços em causa de uma forma muito geral, havia que confirmar a recusa para os referidos serviços na sua globalidade. A este respeito, fez referência ao n.° 33 do acórdão de 7 de Junho de 2001, DKV/IHMI (EuroHealth) (T‑359/99, Colect., p. II‑1645), no qual o Tribunal Geral considerou que, tendo a recorrente pedido o registo do sinal em causa para o conjunto dos serviços que relevam da categoria dos «seguros» sem fazer a distinção entre eles, devia confirmar‑se a apreciação da Câmara de Recurso na medida em que ela se referia ao conjunto destes serviços. Ora, o caso de uma classe descrita de forma genérica no pedido de marca como «seguros e serviços financeiros» não é transponível para o caso em apreço, no qual foi apresentada uma lista de serviços muito diversos.

56      Em segundo lugar, quanto aos serviços da classe 38, relativos ao sector da telecomunicação, deve assinalar‑se que, se é certo que compreendem igualmente serviços diversos como, designadamente, a difusão de programas radiofónicos e televisivos, também através de redes por cabo, as agências de imprensa, os serviços de conferências telefónicas, a transmissão via satélite, os serviços de telefonia, a difusão de emissões de telecompra, é, contudo, possível considerar que se incluem numa categoria homogénea de serviços para fins de uma fundamentação global.

57      Ainda que a classe 38 não seja explicitamente mencionada, a argumentação desenvolvida no n.° 23 da decisão impugnada refere‑se claramente a esta categoria de serviços. A Câmara de Recurso indica neste designadamente que os serviços requeridos incluem serviços exigidos no plano técnico para a realização e a venda de apostas e de jogos‑concurso, a saber, a difusão de emissões televisivas, em particular, os canais ditos de televisão por assinatura, a Internet, os programas e os jogos informáticos apropriados. Além disso, segundo a Câmara de Recurso, tais apostas e tais jogos podem ser elementos essenciais de manifestações de jogos e de recriação, incluindo no âmbito da difusão na televisão. É igualmente especificado que a difusão de manifestações desportivas na televisão é frequentemente acompanhada por informações sobre certas quotas de apostas de um prestatário privado.

58      O facto de diversos tipos de serviços de telecomunicações serem exigidos no plano técnico para a realização e a venda de apostas e de jogos‑concurso ou de tais apostas ou jogos poderem ser elementos essenciais de manifestações de jogos e de entretenimento televisivos ou outros não demonstra uma relação suficientemente directa e concreta entre a marca requerida BETWIN, en relação à qual se provou que para o público pertinente evocava a possibilidade de apostar e de ganhar, e estes serviços que, ainda que possam servir de ferramenta técnica para o sector dos jogos e das apostas, não têm em si mesmos como objecto a realização de apostas nem a procura de ganhos por este meio. Acresce que, relativamente à menção, no n.° 21 da decisão impugnada, relativa aos serviços de marketing, do exemplo dos canais de televisão e das ofertas na Internet que prevêem elementos de jogos de fortuna ou azar e de apostas para promover as vendas, bem como do exemplo dos canais de telecompra que recorrem a elementos aleatórios que evocam apostas para estimular as vendas, na falta de uma qualquer referência concreta neste número à classe 38, não é possível ao Tribunal Geral determinar se esta argumentação servia para demonstrar o carácter descritivo da marca requerida em relação aos serviços contidos na referida classe, pelo que, igualmente a este respeito, deve ser declarada uma falta de fundamentação da decisão impugnada.

59      Por conseguinte, há que concluir que a Câmara de Recurso não demonstrou suficientemente o carácter descritivo da marca requerida em relação aos serviços da classe 38, pelo que importa julgar procedente o fundamento relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009 no que respeita a estes serviços.

60      Em terceiro lugar, quanto à classe 41, importa assinalar que a decisão impugnada só a menciona na conclusão sobre o carácter descritivo contida no seu n.° 25 (v. n.° 41 supra). Como foi sublinhado no n.° 34 supra, uma parte dos serviços que se incluem nesta classe refere‑se claramente ‑se ao sector dos jogos e das apostas. A referida classe compreende igualmente determinados serviços ligados ao domínio da informática e das telecomunicações bem como ao domínio desportivo. Além do mais, os serviços da classe 41 dizem respeito a uma série de serviços heterogéneos, como os serviços de tradução, de educação, de formação, de organização e realização de colóquios, conferências, congressos, seminários, simpósios, ateliers e exposições de todo o género para fins culturais e de ensino, de publicação de textos e de livros, os serviços de um fotógrafo, os serviços relativos a clubes de saúde e de manutenção.

61      Ainda que determinados fundamentos da decisão impugnada devessem ser interpretados no sentido de que se aplicam a certos serviços da classe 41, designadamente, aos ligados ao domínio da informática e das telecomunicações bem como ao domínio desportivo, atendendo à heterogeneidade dos serviços da referida classe e à inexistência de discussão explícita a seu respeito na decisão impugnada, importa invocar oficiosamente em relação aos serviços da classe 41 que não são os mencionados explicitamente no n.° 20 da decisão impugnada, em conformidade com a jurisprudência referida no n.° 46 supra, o facto de que a Câmara de Recurso não fundamentou suficientemente a referida decisão, indicando, como deveria ter feito, que se tratava de uma categoria de serviços homogénea à qual tinha podido aplicar uma fundamentação global quanto ao carácter descritivo da marca requerida a seu respeito.

62      Das considerações precedentes resulta que a Câmara de Recurso demonstrou correctamente o carácter descritivo da marca requerida para os serviços mencionados no n.° 20 da decisão impugnada bem como para os serviços de «concepção e desenvolvimento de espectáculos, de jogos, de lotarias, de competições, de bailes, de sorteios, de concursos no plano dos negócios, da organização e da publicidade», incluídos na classe 35. No entanto, há que acolher o primeiro fundamento na medida em que diz respeito aos serviços incluídos na classe 38 e a decisão impugnada deve igualmente ser anulada em razão de uma falta de fundamentação suscitada oficiosamente, para os outros serviços compreendidos na classe 35 bem como para os serviços incluídos na classe 41 que não são os mencionados explicitamente no n.° 20 da decisão impugnada.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009

 Argumentos das partes

63      A recorrente sustenta que a marca requerida BETWIN apresenta o grau mínimo de poder distintivo exigido para ser registada, dado que tanto o consumidor médio como os públicos especializados verão nela uma indicação da origem atendendo à sua forma invulgar e inusitada. A título subsidiário, alega que, em qualquer caso, o público em causa atribuirá à marca requerida um carácter distintivo no sentido de uma indicação de proveniência em relação aos serviços que não têm uma relação com as apostas e os jogos a dinheiro, como os serviços de telecomunicações.

64      O IHMI considera que, na medida em que o sinal em causa é descritivo, o mesmo é igualmente desprovido de carácter distintivo. O IHMI contesta o argumento segundo o qual a marca requerida BETWIN dispõe do mínimo de carácter distintivo exigido. Segundo o IHMI, esta veicula unicamente uma incitação geral a participar em determinadas apostas ou jogos e não é, portanto, adequada para distinguir os serviços da recorrente dos oferecidos por outras empresas.

 Apreciação do Tribunal Geral

65      No que respeita aos serviços em relação aos quais foi demonstrado o carácter descritivo no âmbito do exame do primeiro fundamento, designadamente os mencionados no n.° 20 da decisão impugnada bem como os de «concepção e desenvolvimento de espectáculos, de jogos, de lotarias, de competições, de bailes, de sorteios, de concursos no plano dos negócios, da organização e da publicidade», incluídos na classe 35, não há que examinar o segundo fundamento, relativo à violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009. Com efeito, segundo jurisprudência assente, basta que um dos motivos absolutos de recusa enumerados no artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 207/2009 seja aplicável para que o sinal não possa ser registado como marca comunitária [acórdão do Tribunal de 2 de Abril de 2008, Eurocopter/IHMI (STEADYCONTROL), T‑181/07, ainda não publicado na Colectânea, n.° 56].

66      Relativamente aos outros serviços, importa recordar que, nos termos do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, será recusado o registo «[d]e marcas desprovidas de carácter distintivo».

67      O conceito de interesse geral subjacente ao artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009 confunde‑se com a função essencial da marca que é garantir ao consumidor ou ao utente final a identidade de origem do produto ou do serviço designado pela marca, permitindo‑lhe distinguir sem confusão possível esse produto ou serviço dos que têm outra proveniência (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 8 de Maio de 2008, Eurohypo/IHMI, C‑304/06 P, Colect., p. I‑3297, n.° 56 e jurisprudência aí referida). Assim, tem carácter distintivo na acepção desta disposição a marca que permite identificar o produto ou o serviço para o qual é pedido o registo como proveniente de uma empresa determinada e, portanto, distinguir esse produto dos das outras empresas (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Abril de 2004, Henkel/IHMI, C‑456/01 P e C‑457/01 P, Colect., p. I‑5089, n.° 34).

68      Por último, o carácter distintivo deve ser apreciado, por um lado, em relação aos produtos ou serviços para os quais é pedido o registo e, por outro, em relação à percepção que dele tem o público pertinente normalmente informado e razoavelmente atento e avisado [v., acórdão do Tribunal de 10 de Outubro de 2008, Inter‑IKEA/IHMI (Representações de uma palete), T‑387/06 a T‑390/06, ainda não publicado na Colectânea, n.° 27, e a jurisprudência referida].

69      No caso em apreço, a fundamentação da inexistência de carácter distintivo da marca requerida na decisão impugnada é muito sucinta. Com efeito, a Câmara de Recurso limitou‑se a indicar, no n.° 27 da decisão impugnada, que, por um lado, enquanto indicação descritiva «cujo significado podia ser compreendido por qualquer um, sem conhecimentos especializados e sem esforço de análise», a marca requerida, igualmente desprovida de carácter distintivo, estava excluída do registo por força do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009. A Câmara de Recurso indica, além disso, que o termo «betwin» veicula unicamente uma incitação geral a participar em certas apostas ou jogos, ou a obter vantagens económicas sob a forma de ganho, sem precisar o nexo possível com um determinado prestatário e que, por esta razão, o sinal em causa não permite ao consumidor em questão concebê‑lo como uma referência a uma origem comercial determinada dos serviços em relação com as possibilidades de apostas e de ganhos e de o perceber como o sinal individual de um prestatário determinado deste sector.

70      Nestas circunstâncias, em relação aos serviços diferentes dos directamente ligados ao sector das apostas e dos jogos‑concurso mencionados no n.° 65 supra, há que invocar oficiosamente uma falta de fundamentação, em conformidade com a referida no n.° 46 supra. Com efeito, não é possível compreender de que forma a fundamentação global reproduzida no número precedente se poderia aplicar a todos os outros serviços heterogéneos que são objecto do pedido de marca e dos quais alguns não têm nenhuma relação com as apostas e a procura de ganhos. A decisão impugnada deve, portanto, ser igualmente anulada a este respeito.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 83.° do Regulamento n.° 207/2009, bem como do princípio da igualdade de tratamento e dos artigos 6.° e 14.° da CEDH

 Argumentos das partes

71      A recorrente alega que os requerentes da marca têm direito a um tratamento igual nos processos no IHMI, em conformidade com o artigo 83.° do Regulamento n.° 207/2009, nos termos do qual os princípios processuais geralmente aceites completam as disposições processuais do referido regulamento, ao princípio da igualdade de tratamento e aos artigos 6.° e 14.° da CEDH, relativos, respectivamente, ao direito a um processo equitativo e à proibição de discriminação. Nesta base, a recorrente teria direito a uma prática de exame e de registo coerente da parte do IHMI, a fim de evitar injustiças e para permitir a todos os requerentes ter uma oportunidade igual de obter uma marca comunitária em casos comparáveis. Embora reconhecendo que as decisões das Câmaras de Recurso se inserem numa competência vinculada e que o princípio da igualdade de tratamento deve ser aplicado no respeito da lei, a recorrente considera que tem direito a que os órgãos do IHMI apliquem os mesmos critérios de cada vez e que o seu exame não seja mais severo a seu respeito do que a respeito de outros requerentes.

72      Por outro lado, atendendo às condições de aplicação difíceis dos processos de nulidade e do seu custo, estas não permitem sanar a desigualdade inicial resultante de um tratamento diferenciado de marcas comparáveis.

73      A recorrente invoca diversos exemplos de marcas comunitárias comparáveis que os órgãos do IHMI deveriam ter tido em conta no âmbito do princípio do exame oficioso dos factos. Trata‑se, designadamente, das marcas nominativas que formam, a partir do termo «bet» e de um outro termo descritivo, uma nova palavra, algumas das quais foram registadas para serviços que têm uma relação directa com apostas e ganhos; marcas nominativas comunitárias BETFAIR (n.° 003161205 e n.° 003580255), MYBET (n.° 00437885), BETMAX (n.° 004272159), ULTIMATEBET (n.° 004685681), YOUBET.COM (n.° 001499185), BETLINK (n.° 001738525), MEGA‑BET (n.° 004103644), MULTI‑BET (n.° 004104766), BET UNITED (n.° 004173472), BETWAY (n.° 004832325), BET‑AT‑HOME (n.° 003844073) e GAMEBOOKERS (n.° 005829056). Quanto ao argumento do IHMI segundo o qual a recorrente não invocou as marcas comunitárias em causa no processo perante o mesmo, a recorrente sustenta que o IHMI está obrigado, em conformidade com o artigo 76.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 207/2009, ao exame oficioso dos factos.

74      Por último, a recorrente alega que, segundo a jurisprudência, uma autoridade nacional competente para o registo de marcas é obrigada a ter em consideração as suas decisões anteriores tomadas em relação a pedidos de marca semelhantes, obrigação que se aplica por analogia ao IHMI. A este respeito, invoca o despacho do Tribunal de Justiça de 12 de Fevereiro de 2009, Bild digital e ZVS (C‑39/08 e C‑43/08, ainda não publicado na Colectânea).

75      O IHMI contesta os argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

76      Resulta do n.° 26 da decisão impugnada que, no processo na Câmara de Recurso, a recorrente já não se baseou nos registos de marcas pretensamente comparáveis que tinha invocado perante o examinador. No referido número, a Câmara de Recurso confirmou, não obstante, que o examinador podia tomar em consideração os referidos registos anteriores, sem lhes reconhecer efeito vinculativo.

77      Há que aprovar esta análise. Com efeito, resulta da jurisprudência que as decisões relativas ao registo de um sinal enquanto marca comunitária que as Câmaras de Recurso são chamadas a tomar, por força do Regulamento n.° 207/2009, resultam de uma competência vinculada e não de um poder discricionário, o que, de resto, a recorrente não contesta. Por conseguinte, a legalidade das decisões das Câmaras de Recurso deve ser apreciada apenas com base nesse regulamento e não com base numa prática decisória anterior a estas [acórdão do Tribunal de 27 de Fevereiro de 2002, Streamserve/IHMI (STREAMSERVE), T‑106/00, Colect., p. II‑723, n.° 66].

78      Segundo a jurisprudência, existem, por conseguinte, duas hipóteses. Se, ao admitir, num processo anterior, a possibilidade de registo de um sinal enquanto marca comunitária, a Câmara de Recurso tiver aplicado correctamente as disposições pertinentes do Regulamento n.° 207/2009, e se, num processo posterior, comparável ao primeiro, a Câmara de Recurso tiver adoptado uma decisão contrária, o juiz comunitário será conduzido a anular esta última decisão, por violação das disposições pertinentes do Regulamento n.° 207/2009. Nesta primeira hipótese, o fundamento relativo a violação do princípio da não discriminação seria, assim, inoperante (acórdão STRAMSERVE, n.° 77 supra, n.° 67).

79      Pelo contrário, se, ao admitir, num processo anterior, a possibilidade de registo de um sinal enquanto marca comunitária, a Câmara de Recurso tiver cometido um erro de direito e se, num processo posterior, comparável ao primeiro, a Câmara de Recurso tiver adoptado uma decisão contrária, a primeira decisão não pode ser utilmente invocada em apoio de um pedido de anulação desta última decisão. Com efeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o princípio da igualdade de tratamento deve ser conciliado com o cumprimento do princípio da legalidade, segundo o qual ninguém pode invocar em seu proveito uma ilegalidade cometida a favor de outrem (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 9 de Outubro de 1984, Witte/Parlamento, 188/83, Recueil, p. 3465, n.° 15, e de 4 de Julho de 1985, Williams/Tribunal de Contas, 134/84, Recueil p. 2225, n.° 14). Assim, nesta segunda hipótese, o fundamento relativo à violação do princípio da não discriminação é igualmente inoperante [acórdãos do Tribunal, STREAMSERVE, n.° 77 supra, n.° 67; de 30 de Novembro de 2006, Camper/IHMI – JC (BROTHERS by CAMPER), T‑43/05, ainda não publicado na Colectânea, n.os 94 e 95, e Mozart, n.° 21 supra, n.os 65 a 69].

80      Ora, tal como resulta da análise do primeiro fundamento, a Câmara de Recurso concluiu correctamente que a marca requerida não podia ser registada na medida em que era descritiva para os serviços que têm por objecto a oferta de apostas e de jogos a dinheiro.

81      Além disso, no que respeita ao artigo 76.°, n.° 1, primeiro período, do Regulamento n.° 207/2009, resulta deste que os examinadores do IHMI e, em sede de recurso, as Câmaras de Recurso do IHMI devem proceder ao exame oficioso dos factos para determinar se a marca pedida é ou não abrangida por um dos motivos de recusa de registo enunciados no artigo 7.° do mesmo regulamento. Ora, atendendo à competência vinculada evocada no n.° 77 supra e ao princípio da legalidade recordado no n.° 79 supra, este exame deve ser concentrado nas condições de aplicação do artigo 7.° do Regulamento n.° 207/2009, do qual não se pode deduzir que os órgãos do IHMI estejam vinculados pelas circunstâncias de registo das marcas anteriores.

82      Quanto aos argumentos extraídos pela recorrente do despacho Bild digital e ZVS, n.° 74 supra, há que assinalar que o Tribunal de Justiça indica, no n.° 17 deste despacho, que uma autoridade nacional competente para o registo deve, no âmbito da instrução de um pedido de registo e, na medida em que disponha de informações a este respeito, ter em conta as decisões já tomadas quanto a pedidos similares e indagar com especial atenção a questão de saber se há ou não que decidir no mesmo sentido. Se é permitido deduzir daí que tal consideração se aplica por analogia ao exame efectuado pelos órgãos do IHMI no âmbito do Regulamento n.° 207/2009, não é menos verdade que o Tribunal de Justiça precisou igualmente que a autoridade em causa não poderia em nenhum estar vinculada por estas decisões sobre pedidos semelhantes. Por outro lado, recordou igualmente, no n.° 18 do referido despacho, que o princípio da igualdade de tratamento deve ser conciliado com o cumprimento da legalidade. Nestas circunstâncias, esta jurisprudência não põe em causa a análise efectuada nos n.os 77 a 81 supra.

83      Além disso, no que respeita ao acórdão do Tribunal de Justiça de 9 de Setembro de 2010, IHMI/Borco‑Marken‑Import Matthiesen (C‑265/09 P, ainda não publicado na Colectânea), invocado pela recorrente na audiência, e do qual esta extraiu uma obrigação do IHMI de proceder ex officio ao exame de registos anteriores, importa assinalar que o Tribunal de Justiça recordou no n.° 45 do referido acórdão, ao qual a recorrente se refere, que o exame dos pedidos de registo não deve ser minimalista, mas rigoroso e completo para evitar que sejam registadas marcas indevidamente e garantir, por razões de segurança jurídica e de boa administração, que as marcas cuja utilização possa ser contestada com êxito nos órgãos jurisdicionais não sejam registadas. Ora, além da circunstância de este acórdão não dizer respeito à questão da consideração eventual de registos anteriores, o Tribunal de Justiça recorda nele igualmente que o exame do IHMI se deve fazer no cumprimento da legalidade. Portanto, esta jurisprudência também não contradiz a análise efectuada nos n.os 77 a 81 supra.

84      Por último, tendo em conta a competência vinculada dos órgãos do IHMI e o princípio da legalidade, e sem que seja necessário pronunciar‑se sobre a admissibilidade, no âmbito do presente litígio, de um fundamento relativo à violação de um artigo da CEDH, importa sublinhar que está excluído que, não existindo alegações concretas de erros de processo perante os órgãos do IHMI, que, em princípio, poderiam ter afectado a recorrente, a mera circunstância de as marcas pretensamente comparáveis terem sido registadas precedentemente possa conduzir a uma violação do direito da recorrente a um processo equitativo. Pelas mesmas razões, as circunstâncias em que se desenrolam os processos de nulidade permanecem desprovidas de pertinência a este respeito.

85      Resulta do que precede que o terceiro fundamento deve ser rejeitado.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo a uma violação do artigo 49.° CE

 Argumentos das partes

86      A recorrente sustenta que a recusa do IHMI de lhe conceder o registo do sinal nominativo em causa, embora tenha permitido aos seus concorrentes distinguir os seus serviços através de uma marca comparável e de excluir terceiros da utilização desta marcas, tem por efeito falsear a concorrência, limitar a livre circulação de serviços e entravar a sua actividade profissional.

87      O IHMI contesta os argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal Geral

88      Decorre da jurisprudência que o direito das marcas constitui um elemento essencial do sistema de concorrência leal que o Tratado pretende instituir e manter (v., acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de Maio de 2003, Libertel, C‑104/01, Colect., p. I‑3793, n.° 48, e a jurisprudência referida).

89      Além disso, a marca registada confere ao seu titular, em relação a produtos ou serviços determinados, um direito exclusivo que lhe permite monopolizar o sinal registado como marca sem limitações no tempo, embora a possibilidade de registar uma marca possa todavia ser objecto de restrições com base no interesse público (v., neste sentido, acórdão Libertel, n.° 88 supra, n.° 49 e 50).

90      Assim, como se recordou no n.° 21 supra, o fim do interesse geral prosseguido pelo artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009 exige que os sinais ou as indicações descritivas das categorias de produtos ou serviços para os quais o registo é pedido possam ser livremente utilizados por todos. Quanto ao interesse geral na base do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009, este visa a necessidade, por um lado, de não restringir indevidamente a disponibilidade do sinal cujo registo foi pedido quanto aos outros operadores que oferecem produtos ou serviços comparáveis àqueles em relação aos quais o registo foi requerido, bem como, por outro, de garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade da origem dos produtos ou dos serviços designados pelo pedido de marca, permitindo‑lhe distinguir, sem confusão possível, esses produtos ou esses serviços dos que têm outra proveniência (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 16 de Setembro de 2004, SAT.1/IHMI, C‑329/02 P, Colect., p. I‑8317, n.° 23, 26 e 27, e a jurisprudência aí referida; acórdão Eurohypo/IHMI, n.° 67 supra, n.° 59 e 62).

91      Por conseguinte, a decisão de uma Câmara de Recurso, como a adoptada no caso em apreço, para os serviços que têm por objecto a oferta de apostas ou de jogos a dinheiro, que conclui correctamente, nos termos do disposto no artigo 7.°, n.° 1, do Regulamento n.° 207/2009, que um sinal não pode ser registado como marca comunitária, não pode ser considerada como um entrave à livre concorrência, nem de resto à livre prestação de serviços na acepção do artigo 49.° CE ou à liberdade profissional da requerente da marca. Ao invés, como o IHMI assinalou com razão na audiência, o papel dos órgãos no IHMI de verificar que uma marca requerida cumpre a regulamentação que rege o registo das marcas comunitárias serve para garantir uma concorrência não falseada e não para restringir a concorrência.

92      Nestas circunstâncias, o quarto fundamento deve ser julgado improcedente.

93      Resulta de todo o exposto que a decisão impugnada deve ser anulada para os serviços que não são os mencionados no n.° 20 da decisão impugnada e os serviços de «concepção e desenvolvimento de espectáculos, de jogos, de lotarias, de competições, de bailes, de sorteios, de concursos no plano dos negócios, da organização e da publicidade», da classe 35.

 Quanto às despesas

94      Nos termos do artigo 87.°, n.° 3, do seu Regulamento de Processo, o Tribunal Geral pode repartir as despesas ou decidir que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas, se ambas as partes obtiverem vencimento parcial. Nas circunstâncias do caso em apreço, uma vez que o pedido da recorrente só foi julgado procedente para uma parte dos serviços em causa, há que decidir que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Terceira Secção)

decide:

1)      A decisão da Quarta Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) de 4 de Maio de 2009 (processo R 1528/2008‑4) é anulada na medida em que diz respeito a serviços que não são os serviços de «concepção e desenvolvimento de espectáculos, de jogos, de lotarias, de competições, de bailes, de sorteios, de concursos; produção, organização e realização de jogos, lotarias, competições, bailes, sorteios, concursos de todo o género; salas de jogo; exploração de casinos; serviços de estabelecimentos de desportos, de jogos, de apostas e de lotaria, incluindo na e via Internet; disponibilização de equipamentos de desporto, de jogos, de apostas e de lotaria, incluindo na e via Internet; exploração de salas de jogos; disponibilização de jogos informáticos interactivos; realização e organização de casinos, de jogos de fortuna ou azar, de jogos de cartas, de apostas, de apostas desportivas, de jogos de habilidade; exploração de casinos; exploração de salas de jogos; exploração de centros de apostas e de lotarias de todo o tipo», incluídos na classe 41 do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de Junho de 1957, conforme revisto e alterado, e os serviços «concepção e desenvolvimento de espectáculos, de jogos, de lotarias, de competições, de bailes, de sorteios, de concursos no plano dos negócios, da organização e da publicidade», compreendidos na classe 35 do referido acordo.

2)      Cada parte suportará as suas próprias despesas.

Czúcz

Labucka

O’Higgins

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 6 de Julho de 2011.

Assinaturas

Índice


Antecedentes do litígio

Pedidos das partes

Questão de direito

Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

– Quanto ao carácter descritivo da marca requerida em relação aos serviços que têm por objecto a oferta de apostas ou de jogos a dinheiro

– Quanto ao carácter descritivo da marca requerida em relação aos serviços que não têm por objecto a oferta de apostas e de jogos a dinheiro

Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação do artigo 7.°, n.° 1, alínea b), do Regulamento n.° 207/2009

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do artigo 83.° do Regulamento n.° 207/2009, bem como do princípio da igualdade de tratamento e dos artigos 6.° e 14.° da CEDH

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto ao quarto fundamento, relativo a uma violação do artigo 49.° CE

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal Geral

Quanto às despesas


* Língua do processo: alemão.