Language of document : ECLI:EU:T:2023:845

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção Alargada)

20 de dezembro de 2023 (*)

«União Económica e Monetária — União Bancária — Mecanismo Único de Resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento (MUR) — Fundo Único de Resolução (FUR) — Decisão do CUR relativa ao cálculo das contribuições ex ante de 2021 — Dever de fundamentação — Princípio da boa administração — Princípio da tutela jurisdicional efetiva — Exceção de ilegalidade — Limitação no tempo dos efeitos do acórdão»

No processo T‑383/21,

La Banque postale, com sede em Paris (França), representada por A. Gosset‑Grainville e M. Trabucchi, advogados,

recorrente,

contra

Conselho Único de Resolução (CUR), representado por J. Kerlin, C. De Falco e C. Flynn, na qualidade de agentes, assistidos por H.‑G. Kamann, F. Louis, P. Gey e V. Del Pozo Espinosa de los Monteros, advogados,

recorrido,

apoiado por

Parlamento Europeu, representado por J. Etienne, O. Denkov e M. Menegatti, na qualidade de agentes,

por

Conselho da União Europeia, representado por E. d’Ursel, A. Westerhof Löfflerová e J. Bauerschmidt, na qualidade de agentes,

e por

Comissão Europeia, representada por D. Triantafyllou, A. Nijenhuis e A. Steiblytė, na qualidade de agentes,

intervenientes,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção Alargada),

composto por: A. Kornezov, presidente, G. De Baere, D. Petrlík (relator), K. Kecsmár e S. Kingston, juízes,

secretário: S. Jund, administradora,

vistos os autos,

após a audiência de 10 de março de 2023,

profere o presente

Acórdão

1        No recurso que interpôs ao abrigo do disposto no artigo 263.o TFUE, a recorrente, La Banque postale, pede a anulação da Decisão SRB/ES/2021/22 do Conselho Único de Resolução (CUR), de 14 de abril de 2021, relativa ao cálculo das contribuições ex ante de 2021 para o Fundo Único de Resolução (a seguir «decisão impugnada»), na parte em que lhe diz respeito.

I.      Antecedentes do litígio

2        A recorrente é uma instituição de crédito com sede em França.

3        Na decisão impugnada, o CUR fixou, em conformidade com o artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento (UE) n.o 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 (JO 2014, L 225, p. 1), as contribuições ex ante para o Fundo Único de Resolução (FUR) (a seguir «contribuições ex ante»), do ano de 2021 (a seguir «período de contribuição de 2021») das instituições abrangidas pelas disposições conjugadas do artigo 2.o e do artigo 67.o, n.o 4, desse regulamento (a seguir «instituições»), entre as quais a recorrente.

4        Por aviso de cobrança de 28 de abril de 2021, a Autorité de contrôle prudentiel et de résolution (ACPR) (Autoridade de Supervisão Prudencial e de Resolução, França), na sua qualidade de autoridade nacional de resolução, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, ponto 3, do Regulamento n.o 806/2014, ordenou à recorrente que pagasse a sua contribuição ex ante para o período de contribuição de 2021, conforme fixada pelo CUR.

II.    Decisão impugnada

5        A decisão impugnada é constituída por um corpo principal acompanhado de três anexos.

6        O corpo da decisão impugnada descreve o procedimento de determinação das contribuições ex ante para o período de contribuição de 2021, aplicável a todas as instituições.

7        Mais especificamente, na secção 5 da referida decisão, o CUR determinou o nível‑alvo anual, mencionado no artigo 4.o do Regulamento de Execução (UE) 2015/81 do Conselho, de 19 de dezembro de 2014, que especifica condições de aplicação uniformes do Regulamento n.o 806/2014 no que se refere às contribuições ex ante para o Fundo Único de Resolução (JO 2015, L 15, p. 1), para o período de contribuição de 2021 (a seguir «nível‑alvo anual»).

8        O CUR explicou que tinha fixado esse nível‑alvo anual num oitavo de 1,35 % do montante médio dos depósitos cobertos, calculado trimestralmente, de todas as instituições em 2020 (a seguir «montante médio dos depósitos cobertos em 2020»), conforme obtido a partir dos dados comunicados pelos sistemas de garantia de depósitos em conformidade com o artigo 16.o do Regulamento Delegado (UE) 2015/63 da Comissão, de 21 de outubro de 2014, que complementa a Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho no que se refere às contribuições ex ante para os mecanismos de financiamento da resolução (JO 2015, L 11, p. 44).

9        Na secção 6 da decisão impugnada, o CUR descreveu o método utilizado para o cálculo das contribuições ex ante para o período de contribuição de 2021. A este respeito, no considerando 59 da referida decisão, o CUR precisou que, para esse período, 13,33 % das contribuições ex ante foram calculadas com «base nacional», ou seja, com base nos dados comunicados pelas instituições autorizadas no território do Estado‑Membro participante em causa (a seguir «base nacional»), em conformidade com o artigo 103.o da Diretiva 2014/59/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho, e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/CE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos (UE) n.o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2014, L 173, p. 190), e em conformidade com o artigo 4.o do Regulamento Delegado 2015/63. As restantes contribuições ex ante (a saber, 86,67 %) foram calculadas com «base na União Bancária», ou seja, com base nos dados comunicados por todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros que participam no Mecanismo Único de Resolução (MUR) (a seguir «base da União» e «Estados‑Membros participantes»), em conformidade com os artigos 69.o e 70.o do Regulamento n.o 806/2014 e com o artigo 4.o do Regulamento de Execução 2015/81.

10      Em seguida, o CUR calculou as contribuições ex ante das instituições, como a recorrente, orientando‑se pelas fases principais seguintes.

11      Na primeira fase, o CUR calculou, em conformidade com o artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, a «contribuição anual de base» de cada instituição, que é proporcional ao montante do passivo da instituição em causa, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, em relação ao total do passivo, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, de todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes. Em conformidade com o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento Delegado 2015/63, o CUR deduziu certo tipo de passivos do total do passivo da instituição a ter em conta na determinação dessa contribuição.

12      Na segunda fase do cálculo da contribuição ex ante, o CUR procedeu a um ajustamento da contribuição anual de base adaptada ao risco da instituição em causa, em conformidade com o artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea b), do Regulamento n.o 806/2014. Avaliou este perfil de risco com base nos quatro pilares de risco mencionados no artigo 6.o do Regulamento Delegado 2015/63, que são compostos por indicadores de risco. Para classificar as instituições de acordo com o seu nível de risco, o CUR começou por estabelecer ‑ para cada indicador de risco aplicado para o período de contribuição de 2021 ‑ um determinado número de «compartimentos» nos quais as instituições foram agrupadas, em conformidade com o anexo I, sob a epígrafe «Etapa 2», n.o 3, deste regulamento delegado. Às instituições pertencentes ao mesmo «compartimento» foi atribuído um valor comum para um determinado indicador de risco, o chamado «valor discretizado». Através da combinação dos valores discretizados para cada indicador de risco, o CUR calculou o «coeficiente de ajustamento adaptado ao risco» da instituição em causa (a seguir «coeficiente de ajustamento»). Multiplicando a contribuição anual de base dessa instituição pelo seu coeficiente de ajustamento, o CUR obteve a «contribuição anual de base adaptada ao risco» da referida instituição.

13      Em seguida, o CUR adicionou todas as contribuições anuais de base adaptadas ao risco para obter um «denominador comum» utilizado para calcular a proporção do nível‑alvo anual que cada instituição deve pagar.

14      Por último, o CUR calculou a contribuição ex ante de cada instituição dividindo o nível‑alvo anual entre todas as instituições com base no rácio existente entre a contribuição anual de base adaptada ao risco, por um lado, e o denominador comum, por outro.

15      O anexo I da decisão impugnada contém uma ficha individual para cada instituição sujeita ao pagamento das contribuições ex ante, em que se inclui a recorrente, da qual constam os resultados do cálculo da contribuição ex ante de cada uma dessas instituições (a seguir «ficha individual»). Cada uma dessas fichas indica o montante da contribuição anual de base da instituição em causa e o valor do seu coeficiente de ajustamento, tanto com base na União como com base nacional, mencionando, para cada indicador de risco, o número do «compartimento» a que pertence a referida instituição. Além disso, a ficha individual indica os dados utilizados para o cálculo das contribuições ex ante de todas as instituições em causa e que o CUR determinou adicionando ou combinando os dados individuais de todas essas instituições. Por último, esta ficha contém os dados declarados pela instituição em causa no formulário de declaração e que foram utilizados para o cálculo da sua contribuição ex ante.

16      O anexo II da decisão impugnada contém dados estatísticos relativos ao cálculo das contribuições ex ante por cada Estado‑Membro participante, de forma resumida e agregada. Este anexo especifica, nomeadamente, o montante global das contribuições ex ante a pagar pelas instituições em causa por cada um desses Estados‑Membros. Por outro lado, o referido anexo enumera, para cada indicador de risco, o número de «compartimentos», o número de instituições pertencentes a cada um deles e os valores mínimos e máximos desses «compartimentos». No caso dos «compartimentos» relativos à base nacional, estes valores estão, por razões de confidencialidade, diminuídos ou aumentados em montante aleatório, mantendo‑se a repartição original das instituições.

17      O anexo III da decisão impugnada, sob a epígrafe «Avaliação dos comentários apresentados no âmbito da consulta sobre as contribuições ex ante para o Fundo Único de Resolução de 2021», analisa as observações apresentadas pelas instituições durante o procedimento de consulta levado a cabo pelo CUR, entre 5 e 19 de março de 2021, com vista à adoção da decisão impugnada.

III. Pedidos das partes

18      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular a decisão impugnada na parte em que lhe diz respeito;

–        condenar o CUR nas despesas.

19      O CUR conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas;

–        a título subsidiário, para o caso de este Tribunal julgar procedentes o sexto, sétimo ou oitavo fundamentos de recurso, anular unicamente a secção 11 da decisão impugnada, relativa aos compromissos irrevogáveis de pagamento (a seguir «CIP»);

–        a título subsidiário, em caso de anulação da decisão impugnada, manter os efeitos da referida decisão até à sua substituição ou, pelo menos, durante um período de seis meses a contar da data do trânsito em julgado do acórdão.

20      O Parlamento Europeu conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso na parte em que se baseia nas exceções de ilegalidade do Regulamento n.o 806/2014;

–        condenar a recorrente nas despesas.

21      O Conselho da União Europeia conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne negar provimento ao recurso.

22      A Comissão Europeia conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

IV.    Questão de direito

23      A recorrente invoca oito fundamentos de recurso, relativos, o primeiro, à violação do princípio da igualdade de tratamento, o segundo, à violação do princípio da proporcionalidade, o terceiro, à violação do princípio da segurança jurídica, o quarto, à violação do princípio da boa administração, o quinto, à violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva, o sexto, à violação do dever de fundamentação da decisão impugnada no que respeita ao recurso aos CIP, o sétimo, a erros manifestos de apreciação do CUR no que se refere à limitação do recurso aos CIP a 15 % do montante das contribuições ex ante e à limitação das garantias apenas ao numerário e, o oitavo, a um erro de direito no que diz respeito à limitação do recurso aos CIP.

24      Na audiência, a recorrente informou que retirava o sexto fundamento.

A.      Quanto aos fundamentos de inadmissibilidade

25      Os cinco primeiros fundamentos contêm exceções de ilegalidade de várias disposições do Regulamento n.o 806/2014, do Regulamento Delegado 2015/63 e do Regulamento de Execução 2015/81.

26      A Comissão considera que as exceções de ilegalidade que servem de base aos três primeiros fundamentos devem ser julgadas inadmissíveis.

27      O CUR não arguiu nenhum fundamento de inadmissibilidade no presente processo.

28      Ora, uma vez que a Comissão, enquanto interveniente, só tem legitimidade para invocar fundamentos de inadmissibilidade na medida em que estes tenham sido invocados pela parte que apoia (v., neste sentido e por analogia, Acórdãos de 24 de março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C‑313/90, EU:C:1993:111, n.os 20 a 22; de 17 de junho de 1998, Svenska Journalistförbundet/Conselho, T‑174/95, EU:T:1998:127, n.os 77 e 78, e de 7 de março de 2013, Cindu Chemicals e o./ECHA, T‑95/10, EU:T:2013:108, n.o 32), o que não se verifica no caso em apreço, os fundamentos de inadmissibilidade que invoca são inadmissíveis.

29      Todavia, importa examinar oficiosamente a admissibilidade das exceções de ilegalidade arguidas pela recorrente, uma vez que os referidos fundamentos de inadmissibilidade são de ordem pública.

30      De acordo com estas exceções, a Comissão considera que a recorrente não demonstra a existência de uma conexão entre a decisão impugnada e as disposições contestadas e que não tem interesse em obter uma declaração de ilegalidade destas disposições.

31      A este respeito, por um lado, resulta da jurisprudência que uma exceção de ilegalidade, deduzida de modo incidental ao abrigo do artigo 277.o TFUE em caso de contestação, a título principal, da legalidade de outro ato, só é admissível se existir uma conexão entre esse ato e a norma cuja pretensa ilegalidade é arguida (Acórdãos de 30 de abril de 2019, Wattiau/Parlamento, T‑737/17, EU:T:2019:273, n.o 56, e de 16 de junho de 2021, Krajowa Izba Gospodarcza Chłodnictwa i Klimatyzacji/Comissão, T‑126/19, EU:T:2021:360, n.o 33).

32      No caso em apreço, decorre da decisão impugnada que todas as disposições cuja ilegalidade é invocada pela recorrente são aplicadas nessa decisão, quer na parte em que constituem o fundamento das contribuições ex ante exigidas à recorrente, como é o caso do artigo 70.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 806/2014, quer na parte em que determinam os parâmetros do cálculo dessas contribuições, como é o caso dos artigos 6.o e 7.o e do anexo I do Regulamento Delegado 2015/63. Por conseguinte, contrariamente ao que alega a Comissão, existe um nexo jurídico direto entre a decisão impugnada e as disposições contestadas.

33      Por outro lado, é certo que um recurso de anulação interposto por uma pessoa singular ou coletiva só é admissível se essa pessoa tiver interesse na anulação do ato recorrido. Esse interesse pressupõe que a anulação do ato possa, por si só, produzir consequências jurídicas e que, assim, o resultado do recurso possa proporcionar um benefício à parte que o interpôs. O interesse de um recorrente em agir deve ser efetivo e atual. Não pode dizer respeito a uma situação futura e hipotética (v. Acórdão de 5 de maio de 2021, Pharmaceutical Works Polpharma/EMA, T‑611/18, EU:T:2021:241, n.os 139 e 141 e jurisprudência referida).

34      No entanto, no caso em apreço, todas as disposições visadas pelas exceções de ilegalidade, ou constituem o fundamento das contribuições ex ante que foram reclamadas à recorrente relativamente ao ano de 2021, ou determinam os parâmetros de cálculo dessas contribuições, pelo que a recorrente tem um interesse efetivo e atual em obter a declaração da sua ilegalidade. Com efeito, no caso de a recorrente obter ganho de causa, essas contribuições perdem a base legal. Por conseguinte, contrariamente ao que alega a Comissão, a recorrente tem interesse em obter uma declaração de ilegalidade dessas disposições.

35      Por conseguinte, os fundamentos de inadmissibilidade invocados pela Comissão devem ser julgados improcedentes.

B.      Quanto às exceções de ilegalidade do Regulamento n.o 806/2014, do Regulamento Delegado 2015/63 e do Regulamento de Execução 2015/81

1.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento

36      No primeiro fundamento de recurso, a recorrente alega que o artigo 70.o, n.o 1 e n.o 2, segundo parágrafo, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 806/2014, bem como os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, violam o princípio da igualdade de tratamento. A argumentação desenvolvida em apoio deste fundamento articula‑se em quatro partes relativas, a primeira, à não tomada em consideração das diferenças de situação entre as instituições da União Bancária, a segunda, ao caráter injustificado da exclusão dos depósitos cobertos da base de cálculo da contribuição anual de base, a terceira, ao caráter injustificado da não dedução dos passivos elegíveis e, a quarta, ao caráter inadequado dos critérios de ajustamento da contribuição anual de base adaptada ao risco.

37      A título preliminar, importa esclarecer que nenhuma destas partes pode ser entendida no sentido de que a recorrente alega, na realidade, que as disposições acima referidas enfermam de um erro de apreciação pelos motivos evocados no n.o 36, supra. Na audiência, em resposta a uma questão do Tribunal Geral, a recorrente confirmou, com efeito, que, no primeiro fundamento, tomado na sua globalidade, alega apenas a violação do princípio da igualdade de tratamento, e não um erro de apreciação.

38      Por outro lado, no que diz respeito à violação do princípio da igualdade de tratamento, há que recordar que este princípio, enquanto princípio geral do direito da União, exige que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de maneira igual, a menos que esse tratamento seja objetivamente justificado (Acórdão de 3 de fevereiro de 2021, Fussl Modestraße Mayr, C‑555/19, EU:C:2021:89, n.o 95).

39      Tendo a recorrente invocado a violação do princípio da igualdade de tratamento, cabe‑lhe identificar com precisão as situações comparáveis que considera terem sido tratadas de maneira diferente ou as situações diferentes que considera terem sido tratadas de forma igual [Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 311].

40      Segundo jurisprudência constante, o caráter comparável de tais situações é apreciado tendo em conta todos os elementos que as caracterizam. Esses elementos devem, nomeadamente, ser determinados e apreciados à luz do objeto e da finalidade do ato que institui a distinção em causa. Devem, além disso, ser tomados em consideração os princípios e os objetivos do domínio em que esse ato foi adotado (v. Acórdão de 3 de fevereiro de 2021, Fussl Modestraße Mayr, C‑555/19, EU:C:2021:89, n.o 99 e jurisprudência referida).

41      No que respeita ao objeto e à finalidade do Regulamento n.o 806/2014 e do Regulamento Delegado 2015/63, importa recordar que, tal como a Diretiva 2014/59, estes atos pertencem ao domínio do MUR, cuja criação visa, em conformidade com o considerando 12 do Regulamento n.o 806/2014, assegurar uma abordagem neutra no tratamento das instituições bancárias em situação de insolvência, aumentar a estabilidade das instituições bancárias dos Estados‑Membros participantes e impedir a propagação das crises a Estados‑Membros não participantes nesse mecanismo, facilitando assim o funcionamento do mercado interno no seu todo.

42      Para garantirem o financiamento das atividades do MUR, a Diretiva 2014/59, o Regulamento n.o 806/2014 e o Regulamento Delegado 2015/63 instituíram as contribuições ex ante cuja natureza específica consiste, como resulta dos considerandos 105 a 107 desta diretiva e do considerando 41 deste regulamento, assegurar, numa lógica baseada na garantia, que o setor financeiro forneça recursos financeiros suficientes ao MUR para que este possa desempenhar as suas funções e incentivar as instituições a adotarem modos de funcionamento menos arriscados (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 113).

43      É à luz destas considerações que importa examinar a legalidade das disposições cuja ilegalidade a recorrente invoca.

44      Entre essas disposições figura, desde logo, o artigo 70.o, n.o 1 e n.o 2, segundo parágrafo, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 806/2014, que prevê a definição do nível‑alvo anual que deve ser repartido entre as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes.

45      Por outro lado, a recorrente contesta a legalidade dos artigos 6.o e 7.o do Regulamento Delegado 2015/63, que precisam os critérios de ajustamento das contribuições ex ante em função do risco das instituições, conforme fixados pelo artigo 103.o, n.o 7, da Diretiva 2014/59. Mais concretamente, o artigo 6.o desse regulamento delegado enumera os pilares de risco e os indicadores de risco que o CUR deve ter em conta para avaliar o perfil de risco das instituições, ao passo que o artigo 7.o do referido regulamento delegado clarifica a ponderação relativa de cada pilar de risco e indicador de risco que deve ser efetuada pelo CUR para avaliar o perfil de risco de cada instituição.

46      Por último, a recorrente invoca a ilegalidade do anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, que especifica as diferentes etapas do método de cálculo utilizado pelo CUR para determinar o montante das contribuições ex ante e enuncia as fórmulas matemáticas que devem ser aplicadas pelo CUR.

a)      Quanto à primeira e segunda partes, relativas à não tomada em consideração das diferenças de situação entre as instituições da União Bancária e ao caráter injustificado da exclusão dos depósitos cobertos da base de cálculo da contribuição anual de base

47      A primeira parte do primeiro fundamento de recurso articula‑se em torno de duas alegações, relativas, a primeira, à não tomada em consideração das diferenças de situação entre os setores bancários dos Estados‑Membros participantes e, a segunda, à incoerência ligada à não consideração dos critérios de avaliação utilizados no âmbito do Mecanismo Único de Supervisão (MUS).

48      Na segunda parte do primeiro fundamento, a recorrente alega, em substância, que o artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014 viola o princípio da igualdade de tratamento, uma vez que prevê uma exclusão dos depósitos cobertos do passivo que é tido em conta para calcular a contribuição anual de base.

49      O CUR, o Parlamento, o Conselho e a Comissão contestam esta argumentação.

1)      Quanto à primeira alegação da primeira parte, relativa à não tomada em consideração das diferenças de situação entre os setores bancários dos EstadosMembros participantes, e quanto à segunda parte, relativa ao caráter injustificado da exclusão dos depósitos cobertos da base de cálculo da contribuição anual de base

50      Em primeiro lugar, no âmbito da primeira alegação da primeira parte, a recorrente alega que a repartição das contribuições ex ante entre as diferentes instituições da união bancária, realizada com base no artigo 70.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 806/2014 e nos artigos 6.o e 7.o e no anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, é aplicada com base em critérios cuja metodologia de cálculo ignora as diferenças de situação entre os setores bancários dos Estados‑Membros participantes. Em especial, estas disposições não tiveram em conta as características próprias e a singularidade do perfil das instituições com sede em França (a seguir «instituições francesas»), como a recorrente. Assim, embora essas instituições se encontrem em situações diferentes das das instituições com sede noutros Estados‑Membros participantes (a seguir «instituições dos outros Estados‑Membros»), são tratadas de forma igual no que respeita ao cálculo do montante das referidas contribuições.

51      A este respeito, a recorrente alega que as instituições francesas se distinguem das instituições dos outros Estados‑Membros pelo facto de, muito embora, de um modo geral, terem um montante total de passivo significativo, dispõem de um montante de depósitos cobertos relativamente baixo.

52      A recorrente alega que apresenta esta característica para defender que ela própria é atingida pela violação do princípio da igualdade de tratamento. Esta violação resulta do facto de o reduzido montante dos seus depósitos cobertos não lhe permitir reduzir a sua contribuição anual de base e, portanto, aumentar «artificialmente» o peso relativo dessa contribuição no cálculo da totalidade da sua contribuição ex ante.

53      O argumento da recorrente deve, assim, ser entendido no sentido de que alega, em substância, que se encontra em desvantagem em relação às instituições que dispõem de um montante elevado de depósitos cobertos, as quais estão, nomeadamente, estabelecidas noutros Estados‑Membros, devido à possibilidade de estas últimas beneficiarem de uma maior redução dos passivos utilizados para o cálculo da contribuição ex ante, pelo que a recorrente deve, na realidade, ser tratada de maneira diferente em relação a essas instituições.

54      Este argumento sobrepõe‑se aos invocados no âmbito da segunda parte do primeiro fundamento, relativa ao caráter injustificado da exclusão dos depósitos cobertos da base de cálculo da contribuição anual de base. Por conseguinte, há que examiná‑los em conjunto.

55      A este respeito, começa‑se por observar que a exclusão dos depósitos cobertos da base de cálculo da contribuição anual de base, prevista no artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, se aplica do mesmo modo a todas as instituições abrangidas pelo seu âmbito de aplicação, incluindo, portanto, as instituições francesas, entre as quais a recorrente, e as instituições dos outros Estados‑Membros, independentemente do montante dos seus depósitos cobertos.

56      Em seguida, no que respeita à questão de saber se as instituições francesas, entre as quais a recorrente, se encontram numa situação comparável à das instituições dos outros Estados‑Membros para efeitos da aplicação da referida exclusão, importa recordar que a Diretiva 2014/59 e o Regulamento n.o 806/2014 visam, nomeadamente, assegurar, numa lógica baseada na garantia, que o setor financeiro forneça recursos financeiros suficientes ao MUR para que este possa desempenhar as suas funções, como referido no n.o 42, supra. Em contrapartida das suas obrigações de pagamento das contribuições ex ante, todas as instituições beneficiam dessas contribuições através da estabilidade do sistema financeiro assegurada pelo FUR. Este benefício existe independentemente do montante dos depósitos cobertos de que dispõem as instituições e da medida em que podem excluir esse montante da base de cálculo da sua contribuição anual de base.

57      Nestas circunstâncias, o simples facto de as instituições disporem de montantes diferentes de depósitos cobertos não tem por consequência colocá‑las em situações diferentes à luz do objeto e da finalidade da Diretiva 2014/59 e do Regulamento n.o 806/2014.

58      Por último, a circunstância de a aplicação desses critérios conduzir a montantes de contribuições ex ante diferentes para a recorrente e para as outras instituições é o resultado do mero facto de disporem de montantes diferentes de depósitos cobertos.

59      Ora, mesmo admitindo que as instituições francesas, entre as quais a recorrente, dispõem de um montante de depósitos cobertos menos elevado do que as instituições dos outros Estados‑Membros, esta circunstância não basta para demonstrar uma violação do princípio da igualdade de tratamento.

60      A este respeito, resulta da jurisprudência que a adoção, pelo legislador da União, de uma regulamentação num domínio de ação específico pode ter repercussões diferentes para certos operadores económicos, tendo em conta a sua situação individual ou as regras nacionais às quais, de resto, estão sujeitos, não podendo essa consequência ser considerada uma violação do princípio da igualdade de tratamento se a referida regulamentação se basear em critérios objetivos e adaptados aos objetivos por ela prosseguidos (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 19 de setembro de 2013, Panellinios Syndesmos Viomichanion Metapoiisis Kapnou, C‑373/11, EU:C:2013:567, n.o 34 e jurisprudência referida).

61      No caso em apreço, por um lado, importa observar que a exclusão dos depósitos cobertos da base de cálculo da contribuição anual de base se baseia em critérios objetivos. A este respeito, decorre do artigo 3.o, n.o 1, ponto 11, do Regulamento n.o 806/2014, que remete para o artigo 2.o, n.o 1, ponto 5, da Diretiva 2014/49/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativa aos sistemas de garantia de depósitos (JO 2014, L 173, p. 149), que o conceito de «depósitos cobertos», na aceção do Regulamento n.o 806/2014, corresponde, para efeitos da exclusão desses depósitos da base de cálculo da contribuição anual de base, ao conceito de «depósitos cobertos» no âmbito do sistema de garantia de depósitos (SGD). Ora, este último conceito é definido com base nos critérios previstos no artigo 2.o, pontos 3 e 4, e no artigo 6.o da Diretiva 2014/49, que têm caráter objetivo.

62      Por outro lado, impõe‑se salientar que esta exclusão se fundamenta em critérios adaptados aos objetivos prosseguidos pelo artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014. Com efeito, como explicou o CUR, a referida exclusão tem, nomeadamente, por objetivo evitar um efeito de dupla contabilização dos depósitos cobertos. A este respeito, há que recordar que as instituições são obrigadas, em razão dos mencionados depósitos, a pagar contribuições aos SGD a que pertencem, em aplicação da Diretiva 2014/49. Ora, se, como reivindica a recorrente, os depósitos cobertos não estivessem excluídos da base de cálculo das contribuições ex ante, as instituições seriam obrigadas a pagar, em razão desses mesmos depósitos cobertos, as contribuições ex ante paralelamente com as contribuições que permitem o financiamento dos SGD.

63      Nestas circunstâncias, pode considerar‑se que a opção feita pelo legislador da União, no artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, de excluir os depósitos cobertos do total do passivo das instituições que deve ser tido em conta para calcular a contribuição anual de base se baseia em critérios objetivos e adaptados aos objetivos prosseguidos por esta disposição.

64      Por conseguinte, há que rejeitar o primeiro argumento da recorrente, invocado para sustentar a primeira alegação da primeira parte do primeiro fundamento, bem como a segunda parte deste fundamento.

65      Em segundo lugar, a recorrente alega que o método de cálculo previsto nas disposições mencionadas no n.o 50, supra, tem como consequência que as contribuições ex ante das instituições francesas sejam significativamente mais elevadas do que as das instituições dos outros Estados‑Membros e que tenham fortemente aumentado desde 2016.

66      A este respeito, antes de mais, a recorrente não contesta que os critérios de cálculo dessas contribuições ex ante se aplicam da mesma forma às instituições francesas, das quais a mesma faz parte, e às instituições dos outros Estados‑Membros.

67      Em seguida, a recorrente não explica a relevância da circunstância evocada no n.o 65, supra, para o exame da questão de saber se se encontra numa situação diferente da das instituições dos outros Estados‑Membros.

68      Por último e em todo o caso, o montante elevado das contribuições ex ante das instituições francesas é explicado por vários fatores que não foram contestados pela recorrente.

69      Em primeiro lugar, o CUR esclareceu, sem ser contestado, que as instituições francesas têm geralmente uma proporção de passivos totais superior à das instituições dos outros Estados‑Membros, correspondente a mais de um terço desses passivos durante o período relevante para o cálculo das contribuições ex ante.

70      Essa circunstância tem um impacto significativo no montante das contribuições anuais de base das instituições envolvidas e, consequentemente, no montante das suas contribuições ex ante. Com efeito, em conformidade com o artigo 103.o, n.o 2, da Diretiva 2014/59 e com o artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, a contribuição anual de base de cada instituição é proporcional ao montante do passivo dessa instituição, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, em relação ao total do passivo, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, de todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes. A aplicação destas disposições leva, assim, a que as contribuições anuais das instituições francesas sejam frequentemente mais elevadas do que as das instituições dos outros Estados‑Membros.

71      Ora, a recorrente não contestou a legalidade do artigo 103.o, n.o 2, da Diretiva 2014/59 nem a do artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, nos termos dos quais o legislador da União decidiu basear o cálculo das contribuições ex ante no montante dos passivos das instituições.

72      Em segundo lugar, a recorrente também não contestou a afirmação do CUR de que a dimensão dos balanços das instituições francesas e dos seus passivos tinha aumentado entre 2016 e 2021, o que levou a um aumento da contribuição anual de base dessas instituições e, portanto, das contribuições ex ante que a recorrente estava obrigada a pagar.

73      Em terceiro lugar, o CUR explicou, sem ser contestado, que o aumento das contribuições ex ante das instituições francesas tinha sido acelerado pelo mecanismo dito de «phasingin» do cálculo dessas contribuições, conforme previsto no artigo 8.o, n.o 1, do Regulamento de Execução 2015/81 (a seguir «mecanismo de “phasingin”»). Segundo este mecanismo, aliás aplicável a todas as instituições em causa, uma proporção cada vez mais elevada das contribuições ex ante das instituições é calculada com base na União, e não com base nacional, ascendendo essa proporção a 86,67 % para o cálculo das contribuições ex ante para o período de contribuição de 2021.

74      A esse respeito, o CUR precisou que essa circunstância implica que o perfil de risco das instituições francesas é medido cada vez mais por referência ao das instituições dos outros Estados‑Membros. Assim, à luz da proporção de passivos totais das instituições francesas em relação aos passivos totais das instituições dos outros Estados‑Membros, como se indica no n.o 69, supra, o mecanismo de «phasingin» explica — segundo os mesmos esclarecimentos não contestados do CUR — a razão pela qual o montante das contribuições ex ante das instituições francesas, incluindo a recorrente, aumentou mais entre 2016 e 2021 do que o das instituições dos outros Estados‑Membros.

75      Por conseguinte, o aumento da contribuição ex ante das instituições francesas, como o recorrente, é explicado por um conjunto de fatores objetivos, entre os quais figura o montante cada vez mais elevado dos seus passivos, e não por uma desigualdade de tratamento de que estas tenham sido objeto.

76      Nestas circunstâncias, a recorrente não demonstrou que as disposições mencionadas no n.o 50, supra, violam o princípio da igualdade de tratamento.

77      Em terceiro lugar, o argumento da recorrente, segundo o qual, em substância, o mecanismo de «phasingin» leva a não ter em conta as características específicas de cada setor bancário e a criar uma distorção entre os setores bancários em detrimento do setor francês, também não pode ser acolhido.

78      Com efeito, este argumento visa pôr em causa a própria existência do mecanismo de «phasingin», sem que a recorrente invoque a ilegalidade da disposição que o prevê, a saber, o artigo 8.o, n.o 1, do Regulamento de Execução 2015/81.

79      Em todo o caso, esta disposição diz respeito a todas as instituições, incluindo a recorrente. Por conseguinte, o mecanismo de «phasingin» aplica‑se da mesma forma às instituições francesas, entre as quais a recorrente, e às instituições dos outros Estados‑Membros. Além disso, se a crítica da recorrente dever ser entendida no sentido de que esta última alega que as instituições francesas não se encontram numa situação comparável à das instituições dos outros Estados‑Membros no âmbito do mecanismo de «phasingin», importa salientar que a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento concreto que demonstre que as primeiras se encontram efetivamente nessa situação diferente da das segundas no âmbito deste mecanismo.

80      Em quarto lugar, a recorrente alega que, além de a mesma não apresentar o mesmo risco que as instituições dos outros Estados‑Membros, é pouco provável que possa beneficiar do FUR, tendo em conta o requisito mínimo de fundos próprios e de passivos elegíveis (a seguir «RMPE») a que está sujeita, bem como à necessária execução do instrumento de recapitalização interna em proporções significativas e antes de qualquer intervenção do FUR.

81      Em primeiro lugar, importa recordar que, em conformidade com o artigo 3.o, n.o 1, ponto 40, do Regulamento n.o 806/2014, os fundos próprios correspondem aos meios postos à disposição de uma instituição pelos seus acionistas, ou de outros investidores, bem como aos lucros que realizou e que não foram distribuídos.

82      Em seguida, segundo o artigo 3.o, ponto 49, do Regulamento n.o 806/2014, entende‑se por «passivos elegíveis» os passivos e os instrumentos de capital que não se qualifiquem como instrumentos de fundos próprios de certos níveis e que não estão excluídos do âmbito de aplicação do instrumento de recapitalização interna.

83      Além disso, o artigo 12.o, n.o 16, primeiro parágrafo, alíneas a) a f), do Regulamento n.o 806/2014 prevê que um passivo elegível emitido para respeitar o RMPE, na aceção do n.o 1 desta mesma disposição, deve ser um instrumento emitido e integralmente realizado, não deve ser um passivo devido à própria instituição nem caucionado ou garantido por esta, a compra do instrumento não deve ter sido financiada direta ou indiretamente pela instituição, o passivo deve ter um prazo de vencimento restante de, pelo menos, um ano, o passivo não deve decorrer nem de um derivado nem de um depósito que beneficia de uma preferência no âmbito da hierarquia prevista nos procedimentos nacionais de insolvência.

84      Por último, importa recordar que, como resulta do considerando 73 e do artigo 27.o do Regulamento n.o 806/2014, o instrumento de recapitalização interna minimiza os custos a suportar pelos contribuintes em virtude da resolução de uma entidade em situação de insolvência, garantindo que os acionistas e credores dessa entidade em situação de insolvência suportam as perdas apropriadas e uma parte adequada dos custos decorrentes da situação de insolvência da entidade. Do mesmo modo, resulta do considerando 83 do Regulamento n.o 806/2014 que, para garantir a aplicação efetiva do instrumento de recapitalização interna, o artigo 12.o deste regulamento prevê que as instituições devem ter montantes suficientes de fundos próprios e de passivos elegíveis para absorver perdas e recapitalizar as instituições em situação de insolvência.

85      No entanto, a recorrente não contesta que o Regulamento n.o 806/2014 e o Regulamento Delegado 2015/63 a tratam da mesma forma que as outras instituições envolvidas no que respeita à tomada em consideração dos requisitos em matéria de RMPE e de execução do instrumento de recapitalização interna.

86      Embora, nessas circunstâncias, a argumentação da recorrente deva ser entendida no sentido de que esta última alega, na realidade, que foi prejudicada pelo facto de o Regulamento n.o 806/2014 e o Regulamento Delegado 2015/63 não terem tido suficientemente em conta os requisitos em matéria de RMPE e de execução do instrumento de recapitalização interna para o cálculo do montante das contribuições ex ante, importa salientar o seguinte.

87      Em primeiro lugar, o recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento concreto para contestar a afirmação do CUR segundo a qual as instituições com passivos significativos, como ela própria, são as que mais podem beneficiar dos mecanismos de resolução adotados pelo Regulamento n.o 806/2014, apesar dos requisitos a que estão sujeitas em matéria de RMPE ou de outros requisitos prudenciais. Quanto a este ponto, o considerando 5 do Regulamento Delegado 2015/63 sublinha, aliás, que, quanto maior for uma instituição, mais provável é que, em caso de dificuldades, a autoridade de resolução considere ser do interesse público a sua resolução e a utilização do FUR para assegurar uma aplicação eficaz dos instrumentos de resolução.

88      Em seguida, o artigo 6.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento Delegado 2015/63 prevê um indicador de risco baseado, nomeadamente, nos requisitos em matéria de MREL, no âmbito da avaliação do perfil de risco das instituições, para efeitos do cálculo do montante da sua contribuição ex ante. Ora, a recorrente não alegou que o peso deste indicador de risco era insuficiente no âmbito do cálculo das contribuições ex ante.

89      A esse respeito, importa acrescentar que, embora seja verdade que o artigo 20.o do Regulamento Delegado 2015/63 permite ao CUR não ter em conta, a título transitório, esse indicador de risco no cálculo da contribuição ex ante, a recorrente não contestou, contudo, a validade dessa disposição.

90      Por último, resulta dos artigos 22.o e 27.o do Regulamento n.o 806/2014 que, no âmbito da adoção de uma resolução ao abrigo deste regulamento, o instrumento de recapitalização interna destina‑se a ser aplicado, da mesma forma, a todas as instituições antes do recurso ao FUR. Além disso, a possibilidade de recorrer ao instrumento de recapitalização interna não exclui um eventual recurso ao FUR. Nestas condições, a recorrente não demonstrou que as instituições francesas se encontravam numa situação diferente da das instituições dos outros Estados‑Membros em razão dos seus MELR e da possibilidade que tinham de aplicar o instrumento de recapitalização interna.

91      Em quinto lugar, a recorrente alega que, na reunião de 9 de dezembro de 2014, o Conselho estabeleceu um acordo político segundo o qual as «contribuições francesas e alemãs» deviam estar ao mesmo nível durante o período transitório.

92      Todavia, não resulta da ata dessa reunião do Conselho, publicada no seu sítio Internet, que esse acordo tenha sido celebrado.

93      Por conseguinte, há que rejeitar o argumento da recorrente.

94      Em sexto lugar, a recorrente considera ter sido objeto de uma desigualdade de tratamento por não ter podido beneficiar do regime de cálculo das contribuições ex ante aplicável às pequenas e médias instituições.

95      O artigo 10.o do Regulamento Delegado 2015/63 e o artigo 8.o, n.o 5, do Regulamento de Execução 2015/81 preveem regimes especiais a favor das instituições de pequena e média dimensão, dos quais decorre, por um lado, que as contribuições ex ante das instituições de pequena dimensão são constituídas, em princípio e salvo circunstâncias especiais, por montantes fixos e, por outro, que as contribuições ex ante das instituições de média dimensão são, numa parte, fixas e, no que respeita à outra parte, podem ser calculadas segundo as regras aplicáveis a todas as outras instituições. No entanto, tendo em conta as considerações enunciadas no n.o 87, supra, as instituições de grande dimensão com um montante de passivo muito elevado, como a recorrente, não apresentam, no que respeita à utilização do FUR, um perfil de risco equivalente ao das instituições de pequena e média dimensão ou menor do que este. Por conseguinte, estas duas categorias não se encontram numa situação comparável para efeitos do cálculo das contribuições ex ante.

96      Em consequência e tendo em conta todas as considerações precedentes, a recorrente não demonstrou que o artigo 70.o, n.o 1 e n.o 2, segundo parágrafo, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 806/2014, bem como os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, violam o princípio da igualdade de tratamento.

97      Por conseguinte, há que julgar improcedentes a primeira alegação da primeira parte e a segunda parte do primeiro fundamento.

2)      Quanto à segunda alegação da primeira parte, relativa à incoerência ligada à não tomada em consideração dos critérios de avaliação utilizados no âmbito do MUS

98      A recorrente alega que, tendo em conta a continuidade e a forte relação entre o MUS e o MUR, é incoerente avaliar o risco representado por uma instituição no âmbito do MUR sem tomar em consideração os critérios de avaliação utilizados no âmbito do MUS, que permitem garantir que as instituições com a maior probabilidade de recorrer ao FUR são as que mais contribuem para o seu financiamento. A não tomada em consideração dos critérios de avaliação utilizados no âmbito do MUS leva, assim, a penalizar as instituições para as quais o recurso ao FUR é menos provável, tendo em conta, nomeadamente, a sua solidez reconhecida no âmbito do MUS.

99      A este respeito, importa observar, antes de mais, que, apesar dos requisitos decorrentes da jurisprudência acima referida nos n.os 38 e 39, a recorrente não explica, com suficiente clareza, em que medida o alegado requisito de coerência com os critérios mencionados no n.o 98, supra, é relevante para determinar se a mesma sofreu uma violação do princípio da igualdade de tratamento.

100    Embora, nestas condições, a argumentação da recorrente deva ser entendida no sentido de que alega, na realidade, que é tratada da mesma forma que as outras instituições com um perfil de risco mais elevado à luz dos critérios de avaliação utilizados no âmbito do MUS, apesar de, segundo esses critérios, a probabilidade de recorrer ao FUR ser menor, importa salientar o seguinte.

101    É certo que, como resulta dos considerandos 11, 13, 15 e 52 do Regulamento n.o 806/2014, existe uma relação de complementaridade entre as regras estabelecidas no âmbito do MUR e as adotadas no âmbito do MUS.

102    Em especial, alguns dos critérios de avaliação utilizados no âmbito do MUR aproximam‑se dos critérios utilizados no âmbito do MUS, conforme previstos, nomeadamente, no Regulamento (UE) n.o 575/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativo aos requisitos prudenciais para as instituições de crédito e para as empresas de investimento e que altera o Regulamento (UE) n.o 648/2012 (JO 2013, L 176, p. 1).

103    Assim, vários dos critérios da regulamentação relativa ao MUR utilizam conceitos que correspondem aos da regulamentação adotada no âmbito do MUS e são mesmo definidos por uma referência expressa a este último. É, nomeadamente, o caso dos conceitos de «fundos próprios», de «rácio de alavancagem» ou de «rácio de fundos próprios principais de nível I» que são determinantes para a aplicação dos indicadores de risco enumerados no artigo 6.o, n.o 2, alíneas a) a c), do Regulamento Delegado 2015/63 e que são definidos, no artigo 3.o deste regulamento delegado, por referência ao Regulamento n.o 575/2013.

104    No entanto, apesar dessa relação de complementaridade, não se pode deixar de observar que, como alega o CUR sem ser contestado nesse ponto, os objetivos prosseguidos pela regulamentação relativa ao MUR em matéria de resolução das instituições são diferentes dos prosseguidos pela regulamentação relativa ao MUS no que respeita aos requisitos de supervisão.

105    Assim, por um lado, a regulamentação da União em matéria de resolução das instituições tem por objetivo, no que respeita às contribuições ex ante, garantir, como resulta do n.o 42, supra, numa lógica baseada na garantia, que o setor financeiro forneça recursos financeiros suficientes ao MUR para que este possa desempenhar as suas funções e incentivar as instituições a adotarem modos de funcionamento menos arriscados.

106    Por outro lado, a regulamentação da União relativa aos requisitos prudenciais tem, por seu turno, por objetivo, segundo o considerando 32 do Regulamento n.o 575/2013, incentivar as atividades bancárias economicamente úteis que sirvam o interesse geral e desincentivar a especulação financeira não viável sem real valor acrescentado, mas também, nos termos do considerando 42 deste regulamento, aplicar melhores métodos de medição e gestão de riscos e utilizá‑los para os requisitos de fundos próprios regulamentares.

107    Daqui resulta, mais especificamente, que a avaliação do risco na aplicação da regulamentação relativa ao MUR e a avaliação do risco no âmbito do MUS cumprem objetivos diferentes. Assim, a avaliação do risco no âmbito do pilar II do MUS é efetuada para cumprir os requisitos prudenciais por ele fixados com vista a garantir que uma determinada instituição disponha de fundos próprios suficientes para fazer face a qualquer risco específico não coberto pelo pilar I do MUS, que corresponde à avaliação transversal do risco de uma instituição. O resultado dessa avaliação tende a determinar os requisitos prudenciais a que uma determinada instituição deve estar sujeita para evitar encontrar‑se em situação de insolvência.

108    Em contrapartida, a avaliação do risco no âmbito do ajustamento da contribuição anual de base em função do perfil de risco, prevista no artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea b), do Regulamento n.o 806/2014 e nos artigos 5.o a 9.o do Regulamento Delegado 2015/63, é efetuada a fim de repartir as contribuições ex ante entre todas as instituições envolvidas. O resultado dessa avaliação tende a aferir não só o risco de insolvência de uma determinada instituição mas, de uma forma mais ampla, o risco de recurso ao FUR por uma instituição em situação de insolvência.

109    Além disso, a regulamentação relativa ao MUR segue uma lógica específica, no sentido de que o perfil de risco de uma determinada instituição é igualmente avaliado à luz do perfil de risco de todas as outras instituições envolvidas.

110    Tendo em conta os objetivos e as finalidades específicos das regulamentações relativas ao MUS e ao MUR, respetivamente, bem como a lógica comparativa deste último, não se pode inferir nenhuma violação do princípio da igualdade de tratamento apenas pelo facto de o quadro jurídico que rege o cálculo das contribuições ex ante do MUR não reproduzir, enquanto tais, os critérios de avaliação do risco previstos no âmbito do MUS.

111    Por conseguinte, há que julgar improcedente a segunda alegação da primeira parte do primeiro fundamento e, com ela, toda a primeira parte no seu conjunto.

b)      Quanto à terceira parte, relativa ao caráter injustificado da não dedução dos passivos elegíveis que cumprem os requisitos prudenciais no âmbito do MELR

112    A recorrente alega que o artigo 70.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 806/2014, bem como os artigos 6.o e 7.o e o anexo I, do Regulamento Delegado 2015/63 violam o princípio da igualdade de tratamento pelo facto de, nem o artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, nem o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento Delegado 2015/63, preverem a dedução dos passivos elegíveis do passivo que é tido em conta para calcular a contribuição anual de base. Esta regulamentação deveria ter previsto essa dedução, uma vez que os passivos elegíveis constituem «quase fundos próprios» criados para cumprir os requisitos prudenciais no âmbito do MELR e que servem para absorver perdas, bem como para implementar o instrumento de recapitalização interna.

113    O CUR, o Parlamento, o Conselho e a Comissão contestam esta argumentação.

114    À luz das precisões fornecidas pela recorrente na audiência, importa declarar que esta alega, em substância e em primeiro lugar, que a violação do princípio da igualdade de tratamento decorre do facto de os passivos elegíveis se encontrarem numa situação comparável à dos fundos próprios, mas serem tratados de maneira diferente desses fundos dado que não são excluídos, nos termos do artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, do passivo tido em conta para calcular a contribuição anual de base.

115    A este respeito, importa recordar que, nos termos do artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, os fundos próprios são excluídos do passivo tido em conta para calcular a contribuição anual de base. Em contrapartida, nem o artigo 70.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 nem o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento Delegado 2015/63, que preveem a exclusão de certos passivos do cálculo da contribuição anual de base, excluíram os passivos elegíveis do referido passivo.

116    Tendo em conta a jurisprudência referida no n.o 40, supra, importa examinar se, à luz do objeto e da finalidade do Regulamento n.o 806/2014, os passivos elegíveis se encontram numa situação comparável à dos fundos próprios, pelo que devem ser excluídos do cálculo da contribuição anual de base.

117    Quanto a este ponto, importa observar que, em conformidade com o artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014 e com o artigo 48.o, n.o 1, da Diretiva 2014/59, ao aplicar o instrumento de recapitalização interna a uma instituição no âmbito de um procedimento de resolução, as autoridades nacionais de resolução exercem os poderes de redução e de conversão dos créditos, em primeiro lugar, sobre os fundos próprios e, em seguida, «se, e só se» os fundos próprios disponíveis não tiverem podido absorver as perdas, sobre os passivos elegíveis.

118    Além disso, nos termos do artigo 21.o, n.os 1 e 7‑A, do Regulamento n.o 806/2014, o CUR exerce os poderes de reduzir ou converter os passivos elegíveis, independentemente de uma medida de resolução, unicamente no que respeita aos passivos elegíveis que preencham as condições específicas e restritivas do artigo 12.o‑G, n.o 2, alínea a), desse regulamento, com exceção da condição relativa ao prazo de vencimento residual dos passivos, referida no artigo 72.o‑C, n.o 1, do Regulamento n.o 575/2013. Estas disposições demonstram que as possibilidades de o CUR proceder, independentemente de uma medida de resolução, à redução e à conversão dos passivos elegíveis são enquadradas por condições específicas e limitativas, contrariamente aos fundos próprios.

119    Por último, o artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento n.o 806/2014 prevê que, em circunstâncias excecionais, caso seja aplicado um instrumento de recapitalização interna, determinados passivos elegíveis podem ser excluídos ou parcialmente excluídos da aplicação dos poderes de redução ou de conversão. Ora, essa possibilidade não existe no que respeita aos fundos próprios.

120    Por conseguinte, contrariamente ao que alega a recorrente, os fundos elegíveis não têm a mesma capacidade dos fundos próprios para absorver as perdas das instituições.

121    Nestas circunstâncias, importa concluir que, apesar dos requisitos decorrentes da jurisprudência recordada no n.o 39, supra, a recorrente não demonstrou que os passivos elegíveis se encontram em situação comparável à dos fundos próprios no que respeita à sua capacidade para absorver perdas e implementar o instrumento de recapitalização interna.

122    Em segundo lugar, a recorrente critica o facto de o artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento Delegado 2015/63 não prever a dedução dos passivos elegíveis do passivo que serve de base de cálculo para determinar a contribuição anual de base.

123    A este respeito, importa observar que esta disposição também não prevê a exclusão dos fundos próprios do passivo que serve de base de cálculo para determinar a contribuição anual de base, estando esta exclusão prevista no artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014.

124    Além disso, resulta da jurisprudência que a tomada em consideração do princípio da igualdade de tratamento não pode justificar a dedução dos passivos elegíveis do passivo que serve de base de cálculo para determinar a contribuição anual de base, uma vez que o Regulamento Delegado 2015/63 distinguiu situações com particularidades significativas, diretamente relacionadas com os riscos apresentados pelos passivos em causa (v., neste sentido, Acórdão de 3 de dezembro de 2019, Iccrea Banca, C‑414/18, EU:C:2019:1036, n.o 95).

125    Decorre do exposto que o facto de não ter previsto, no artigo 5.o, n.o 1, do Regulamento Delegado 2015/63, a dedução dos passivos elegíveis do passivo que serve de base de cálculo para determinar a contribuição anual de base não constitui uma violação do princípio da igualdade de tratamento.

126    Por conseguinte, a terceira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente.

c)      Quanto à quarta parte, relativa ao facto de as contribuições ex ante não serem representativas do risco realmente suportado em razão dos critérios de cálculo do coeficiente de ajustamento

127    Na quarta parte do primeiro fundamento, a recorrente alega que o artigo 70.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 806/2014, bem como os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, violam o princípio da igualdade de tratamento pelo facto de as contribuições ex ante não serem representativas do risco realmente suportado em razão dos critérios de cálculo do coeficiente de ajustamento. A este respeito, a recorrente apresenta três alegações relativas, a primeira, à não tomada em consideração do perfil de risco global intrínseco de cada instituição, a segunda, à não apreciação dos fatores de risco à luz de qualquer requisito imposto pela autoridade de supervisão no âmbito do MUS e, a terceira, à impossibilidade de ter globalmente em conta as especificidades individuais de cada instituição.

1)      Quanto à primeira alegação, relativa à não tomada em consideração do perfil de risco global intrínseco de cada instituição

128    A recorrente alega que os critérios fixados nos «artigos 6.o e seguintes» do Regulamento Delegado 2015/63 assentam na tomada em consideração de fatores de risco considerados individualmente e, não, na tomada em conta do perfil de risco global intrínseco de cada instituição.

129    O CUR, o Parlamento, o Conselho e a Comissão contestam esta argumentação.

130    Importa começar por salientar que, em violação da jurisprudência referida no n.o 39, supra, a recorrente não identificou com precisão as situações comparáveis que, em seu entender, foram tratadas de maneira diferente ou as situações diferentes que, em seu entender, foram tratadas de forma igual no que respeita à determinação, pelo legislador da União, dos critérios do ajustamento da contribuição anual de base adaptada ao risco.

131    Em seguida, é pacífico que os critérios de cálculo do coeficiente de ajustamento, que conduzem ao ajustamento da contribuição anual de base adaptada ao risco, se aplicam a todas as instituições envolvidas, como a recorrente, com exceção das que são elegíveis para o pagamento de uma contribuição fixa nos termos do artigo 10.o do Regulamento Delegado 2015/63 e das que são mencionadas no artigo 11.o deste regulamento delegado. Nestas circunstâncias, a recorrente não é tratada de forma diferente no que respeita aos referidos critérios.

132    Além disso, a recorrente não alegou, e muito menos demonstrou, que a violação do princípio da igualdade de tratamento decorre do facto de não dever ser tratada da mesma forma que as outras instituições no que respeita à aplicação dos critérios de cálculo do coeficiente de ajustamento acima referidos.

133    Por outro lado, mesmo admitindo que a crítica da recorrente deva ser entendida no sentido de que alega que não se encontra numa situação comparável à das outras instituições e que deve ser tratada de forma diferente, importa salientar que a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento concreto que demonstre que se encontra nessa situação.

134    Por último e em todo o caso, a argumentação da recorrente assenta em premissas erradas. Em primeiro lugar, a recorrente alega erradamente que os critérios fixados pelo Regulamento Delegado 2015/63 não têm em conta o perfil de risco global intrínseco das instituições. Com efeito, vários dos quatro pilares de risco mencionados no artigo 6.o do Regulamento Delegado 2015/63, nomeadamente o relativo à importância da instituição para a estabilidade do sistema financeiro ou para a economia, permitem essa análise global.

135    Em segundo lugar, importa rejeitar as críticas da recorrente contra os critérios previstos nos «artigos 6.o e seguintes» do Regulamento Delegado 2015/63 pelo facto de terem em conta os bancos regionais de pequena dimensão, o que induziria uma parcialidade negativa contra as instituições de grande dimensão devido ao facto de esses bancos regionais terem um montante significativo de depósitos cobertos, contrariamente às instituições de grande dimensão, como a recorrente, cujas atividades não são, no entanto, mais arriscadas.

136    Com efeito, por um lado, resulta dos n.os 51 a 63, supra, que a recorrente não demonstrou que a exclusão dos depósitos cobertos para efeitos do cálculo da contribuição ex ante violava o princípio da igualdade de tratamento. Por outro lado, tendo em conta as considerações enunciadas nos n.os 94 e 96 supra, as instituições de grande dimensão com um montante de passivos muito elevado, como a recorrente, não têm um perfil de risco equivalente ao das pequenas e médias instituições ou menor do que este último. Por conseguinte, estas duas categorias não se encontram numa situação comparável para efeitos da apreciação que o CUR deve efetuar para calcular as contribuições ex ante.

137    Por conseguinte, há que julgar improcedente a presente alegação.

2)      Quanto à segunda alegação, relativa à não apreciação dos fatores de risco à luz dos requisitos impostos pela autoridade de supervisão no âmbito do MUS

138    A recorrente alega que o método de ajustamento da contribuição anual de base adaptada ao risco leva a que os fatores de risco sejam apreciados independentemente de qualquer requisito imposto pela autoridade de supervisão no âmbito do MUS. Ora, segundo os critérios do MUS, as instituições francesas são as que têm menor risco da União Bancária, embora surjam como sendo as de maior risco de acordo com os critérios de avaliação enunciados no Regulamento Delegado 2015/63.

139    O CUR e o Conselho contestam esta argumentação.

140    A presente alegação e a segunda alegação da primeira parte do primeiro fundamento, que foi julgada improcedente nos n.os 100 a 110, supra, sobrepõem‑se em substância.

141    A presente alegação deve, assim, ser afastada pelos mesmos motivos.

3)      Quanto à terceira alegação, relativa à impossibilidade de ter globalmente em conta as especificidades individuais de cada instituição

142    A recorrente considera que o artigo 70.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 806/2014, bem como os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, violam o princípio da igualdade de tratamento pelo facto de, no âmbito de um procedimento aplicado de modo uniforme a todas as instituições e com vista a repartir o montante correspondente ao nível‑alvo anual de forma igual e proporcional entre estas, não ser possível ter globalmente em conta as especificidades individuais de cada instituição.

143    O CUR e o Conselho contestam esta argumentação.

144    Importa começar por salientar que, com a formulação da sua alegação, a própria recorrente reconhece que o método de cálculo das contribuições ex ante criticado se aplica da mesma forma a todas as instituições.

145    Em seguida, se a crítica da recorrente dever ser entendida no sentido de que alega que não se encontra numa situação comparável à das outras instituições e que deve ser tratada de forma diferente, importa salientar que a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento concreto que demonstre que se encontra nessa situação.

146    Por último e em todo o caso, a argumentação da recorrente equivale a sustentar, na realidade, que os critérios de ajustamento da contribuição anual de base adaptada ao risco não são adequados. Ora, a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento circunstanciado que demonstrasse, de forma concreta, o caráter inadequado desses critérios, limitando‑se a sua alegação a formular afirmações não fundamentadas.

147    Por conseguinte, a terceira alegação deve ser afastada e, com ela, a quarta parte do primeiro fundamento, bem como este fundamento na sua totalidade.

2.      Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade

148    A recorrente alega que o artigo 70.o, n.o 1 e n.o 2, segundo parágrafo, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 806/2014, bem como os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, estabelecem modalidades de cálculo das contribuições ex ante que violam o princípio da proporcionalidade.

149    O CUR, o Parlamento, o Conselho e a Comissão contestam esta argumentação.

150    O princípio da proporcionalidade, que faz parte dos princípios gerais do direito da União, exige que os atos das instituições da União sejam adequados a realizar os objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa e não ultrapassem os limites do que é adequado e necessário para a realização desses objetivos, sendo que, quando se proporcione uma escolha entre várias medidas adequadas, se deve recorrer à menos restritiva, e que os inconvenientes causados não devem ser desproporcionados relativamente aos objetivos prosseguidos (Acórdãos de 4 de maio de 2016, Philip Morris Brands e o., C‑547/14, EU:C:2016:325, n.o 165, e de 20 de janeiro de 2021, ABLV Bank/CUR, T‑758/18, EU:T:2021:28, n.o 142; v., igualmente, neste sentido, Acórdão de 8 de junho de 2010, Vodafone e o., C‑58/08, EU:C:2010:321, n.o 51).

151    No que respeita à fiscalização jurisdicional dos requisitos referidos no n.o 150, supra, importa recordar que, na determinação do modo de cálculo das contribuições ex ante, o legislador da União goza de um amplo poder de apreciação, uma vez que é levado a intervir num domínio que implica, da sua parte, opções de natureza política, económica e social, e em que é chamado a fazer apreciações complexas (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.os 117 e118).

152    Do mesmo modo, no contexto de um poder delegado na aceção do artigo 290.o TFUE, a Comissão dispõe, no exercício das competências que lhes são conferidas, de um amplo poder de apreciação quando é chamada, designadamente, a efetuar apreciações e avaliações complexas (v., neste sentido, Acórdão de 11 de maio de 2017, Dyson/Comissão, C‑44/16 P, EU:C:2017:357, n.o 53 e jurisprudência referida).

153    Assim sucede, nomeadamente, com o Regulamento Delegado 2015/63, através do qual a Comissão precisou as regras de ajustamento das contribuições ex ante ao perfil de risco, em aplicação do artigo 103.o, n.o 7, da Diretiva 2014/59.

154    Com efeito, como resulta dos documentos relativos à adoção do Regulamento Delegado 2015/63, nomeadamente os documentos «JRC technical work supporting Commission second level legislation on risk based contributions to the (single) resolution fund» [Estudo técnico do JRC para apoio da legislação de segundo nível da Comissão sobre as contribuições baseadas no risco para o Fundo (Único) de Resolução, a seguir «estudo técnico do JRC»] e «Commission Staff Working Document: estimates of the application of the proposed methodology for the calculation of contributions to resolution financing arrangements» (Documento de trabalho dos serviços da Comissão: estimativas da aplicação do método proposto para o cálculo das contribuições para os mecanismos de financiamento das resoluções), a elaboração dessas regras implicava apreciações e avaliações complexas por parte da Comissão, uma vez que esta devia examinar os diferentes elementos à luz dos quais os diversos tipos de risco eram apreendidos nos setores bancário e financeiro.

155    Nestas circunstâncias e em conformidade com a jurisprudência (v., neste sentido, Acórdãos de 4 de maio de 2016, Polónia/Parlamento e Conselho, C‑358/14, EU:C:2016:323, n.os 79, 96 e 97 e jurisprudência referida, e de 21 de dezembro de 2022, Firearms United Network e o./Comissão, T‑187/21, não publicado, pendente de recurso, EU:T:2022:848, n.os 122 e 123 e jurisprudência referida), a fiscalização, pelo Tribunal Geral, da observância do princípio da proporcionalidade deve limitar‑se a examinar se as medidas adotadas pelo legislador da União e pela Comissão são manifestamente inadequadas em relação ao objetivo prosseguido, se não ultrapassam manifestamente o necessário para atingir esse objetivo ou se não implicam inconvenientes manifestamente desproporcionados em relação ao referido objetivo.

156    A este respeito, a recorrente invoca, em substância, três argumentos.

157    Em primeiro lugar, há que examinar o argumento da recorrente segundo o qual o artigo 70.o, n.o 1 e n.o 2, segundo parágrafo, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 806/2014, bem como os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, violam o princípio da proporcionalidade pelo facto de o cálculo da contribuição ex ante de cada instituição depender da situação de outras instituições, sem que, no entanto, seja respeitado o objetivo de repartição equilibrada em função do risco. Em especial, em razão desta interdependência entre as instituições, o setor bancário francês sofre um encargo desproporcionado.

158    No que respeita, antes de mais, ao caráter adequado do método de cálculo das contribuições ex ante, por um lado, importa recordar que o Tribunal de Justiça já reconheceu que o legislador da União podia ter optado, no âmbito do seu amplo poder de apreciação, por um modo de cálculo das contribuições ex ante assente na tomada em consideração, especialmente, da situação financeira comparativa de cada instituição autorizada nos Estados‑Membros participantes (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 118).

159    Por outro lado, a recorrente não invocou nenhum elemento suscetível de pôr em causa os fundamentos dessa conclusão nem a afirmação do CUR de que esse método de cálculo visa encorajar as instituições a adotarem formas de funcionamento menos arriscadas, incentivando‑as, em especial, a melhorar a sua posição em relação à das outras instituições.

160    Nestas circunstâncias, a recorrente não pode sustentar que o cálculo das contribuições ex ante com base na tomada em consideração da situação financeira comparativa das instituições constitui uma medida manifestamente inadequada para atingir o objetivo mencionado no n.o 159, supra.

161    No que respeita ao caráter necessário do referido método, mencionado no n.o 159, supra, a recorrente alega que as contribuições ex ante poderiam ter sido calculadas através de outro método, unicamente baseado nos dados específicos da instituição em causa. No entanto, admitindo que esse método conduza a uma contribuição ex ante menos elevada e seja, assim, menos gravoso para as instituições, não está demonstrado que permitiria alcançar o objetivo enunciado no n.o 159, supra, de forma tão eficaz como o método de cálculo comparativo instituído pelo legislador da União e pela Comissão.

162    Tendo em conta o teor dos argumentos da recorrente, não está assim demonstrado que o método de cálculo ultrapasse manifestamente o necessário para atingir o objetivo mencionado no n.o 159, supra.

163    Por último, a recorrente não demonstrou que o cálculo das contribuições ex ante, com base na tomada em consideração da situação financeira comparativa de cada instituição, acarretaria inconvenientes manifestamente desproporcionados em relação ao objetivo prosseguido, acima descrito no n.o 159.

164    Em segundo lugar, a recorrente sustenta que a avaliação do perfil de risco das instituições para o cálculo das contribuições ex ante se baseia em critérios que não estão correlacionados com os que são aplicados no âmbito do MUS. Devido a esta falta de correlação, a recorrente está sujeita a uma contribuição ex ante cujo montante seja artificialmente elevado e desproporcionado.

165    Primeiro, no que respeita ao caráter adequado dos critérios de avaliação do perfil de risco das instituições, conforme estabelecidos no artigo 103.o, n.o 7, da Diretiva 2014/59, para o qual remete, aliás, o artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea b), do Regulamento n.o 806/2014, bem como os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, resulta do seu conteúdo, bem como do considerando 107 da Diretiva 2014/59, do considerando 109 do Regulamento n.o 806/2014 e do considerando 5 do Regulamento Delegado 2015/63 que esses critérios visam assegurar que as instituições com um modo de funcionamento mais arriscado são obrigadas a pagar contribuições ex ante mais elevadas do que as que adotaram um modo de funcionamento menos arriscado.

166    Sucede que a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento concreto que ponha em causa a suscetibilidade de os referidos critérios permitirem atingir esse objetivo. A este respeito, limitou‑se a formular uma afirmação não fundamentada segundo a qual os critérios utilizados para a avaliação do risco no âmbito do MUS são mais adequados para garantir que as instituições que apresentam um risco elevado contribuem mais para o FUR. Ora, à luz das considerações enunciadas nos n.os 104 a 111, supra, esse argumento não pode ser acolhido, uma vez que os objetivos da regulamentação relativa ao MUR e os respeitantes ao MUS são diferentes.

167    Nestas circunstâncias, devem ser rejeitados os argumentos apresentados pela recorrente para demonstrar que as disposições mencionadas no n.o 165, supra, que preveem os critérios de ajustamento das contribuições ex ante ao risco das instituições, são manifestamente inadequadas em relação ao objetivo recordado nesse número.

168    Segundo, no que respeita à necessidade de ter em conta os critérios resultantes das disposições referidas no n.o 165, supra, a recorrente alega que a eventual tomada em consideração dos critérios utilizados no âmbito do MUS para o cálculo das contribuições ex ante poderia implicar menos encargos para as instituições envolvidas.

169    No entanto, como o Tribunal de Justiça salientou no Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR (C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 113), os critérios previstos pelas disposições mencionadas no n.o 165, supra, visam repartir o montante do nível‑alvo anual entre todas as instituições envolvidas. Assim, embora critérios de substituição dos critérios resultantes destas disposições, como os utilizados no âmbito do MUS, impliquem menos encargos para certas instituições, causam, simultaneamente, mais encargos para outras instituições. Apesar disso, a recorrente não explicou de que forma a aplicação dos referidos critérios de substituição criaria menos encargos para todas as instituições envolvidas.

170    Além disso, admitindo que esses critérios conduzem a uma contribuição ex ante menos elevada para as instituições, a recorrente não esclarece de que modo a aplicação desses critérios permitiria alcançar o objetivo enunciado no n.o 165, supra, de forma tão eficaz quanto a aplicação dos critérios resultantes das disposições mencionadas nesse número, apesar de, como decorre dos n.os 104 a 111, supra, os objetivos prosseguidos pelo MUS e, mais especificamente, pela regulamentação da União relativa aos requisitos em matéria de supervisão serem diferentes dos previstos na regulamentação específica da resolução das instituições.

171    Nestas circunstâncias, a recorrente não demonstrou em que medida os critérios instituídos pelas disposições mencionadas no n.o 165, supra, ultrapassam manifestamente o necessário para atingir o objetivo enunciado no mesmo número.

172    Terceiro, a recorrente também não demonstrou que o ajustamento das contribuições ex ante em função do risco das instituições, à luz dos critérios instituídos pelas disposições mencionadas no n.o 165, supra, acarreta inconvenientes manifestamente desproporcionados em relação ao objetivo prosseguido, descrito no número referido.

173    Em terceiro lugar, a recorrente alega a existência de uma violação do princípio da proporcionalidade, uma vez que o montante das contribuições ex ante é quase exclusivamente determinado pela contribuição anual de base. Em seu entender, o principal parâmetro das contribuições ex ante continua a ser a dimensão do balanço e, não, o coeficiente de ajustamento que, na parte em que varia entre 0,8 e 1,5, tem uma influência limitada. Esse mecanismo implica que as instituições de grande dimensão vejam as suas contribuições anuais de base sobreavaliadas, ainda que apresentem um perfil de risco baixo no âmbito do MUS.

174    A este respeito, resulta do artigo 70.o, n.o 2, segundo parágrafo, alínea a), do Regulamento n.o 806/2014, em conjugação com o considerando 5 do Regulamento Delegado 2015/63, que a contribuição anual de base é calculada proporcionalmente com base no montante do passivo da instituição em causa, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, em relação ao passivo total, excluindo os fundos próprios e os depósitos cobertos, das instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes, baseando‑se assim essa contribuição na dimensão da instituição.

175    Quanto ao caráter adequado da tomada em consideração da dimensão das instituições para efeitos do cálculo da contribuição anual de base, deve recordar‑se, tendo em conta as considerações enunciadas no n.o 87, supra, que as instituições que possuem passivos significativos — e são, portanto, de grande dimensão — são as mais suscetíveis de lhes ser aplicado um instrumento de resolução e de beneficiar, assim, dos financiamentos do FUR.

176    Ora, foi com base no critério da importância dos passivos das instituições — e, portanto, na sua dimensão — que o legislador da União e a Comissão quiseram garantir os objetivos recordados no n.o 42, supra, que consistem, por um lado, em fornecer recursos financeiros suficientes ao MUR, para efeitos de uma aplicação eficiente dos instrumentos de resolução, e, por outro, em incentivar as instituições a adotarem modos de funcionamento menos arriscados, reduzindo, nomeadamente, os seus passivos.

177    Neste âmbito, a recorrente não demonstrou que, ao basear o cálculo da contribuição anual de base na dimensão das instituições, o legislador da União e a Comissão tinham preconizado uma medida manifestamente inadequada para atingir os objetivos mencionados no n.o 176, supra.

178    Quanto ao caráter necessário do critério relativo à dimensão, a recorrente alega, em substância, que, se o cálculo das contribuições ex ante se baseasse mais no coeficiente de ajustamento do que na dimensão das instituições, o montante dessas contribuições seria menos elevado, uma vez que refletiria o perfil de risco reduzido das instituições.

179    No entanto, se o argumento da recorrente for interpretado no sentido de que esta exige a aplicação de um intervalo mais amplo do coeficiente de ajustamento do que o previsto no artigo 9.o, n.o 3, do Regulamento Delegado 2015/63, a saber, um intervalo que também incluía valores superiores a 1,5 %, não está demonstrado que o cálculo das contribuições ex ante com base nesse intervalo implicaria menos encargos para as instituições. Com efeito, em tal hipótese, o coeficiente de ajustamento poderia ser fixado num valor superior a 1,5 %, pelo que o montante dessas contribuições aumentaria.

180    Assim, não se pode alegar que, ao basear o cálculo da contribuição ex ante mais na dimensão das instituições do que no coeficiente de ajustamento, o método de cálculo das referidas contribuições, previsto pelo legislador da União e precisado pela Comissão, ultrapassa manifestamente o necessário para atingir o objetivo mencionado no n.o 176, supra.

181    Assim, a recorrente não demonstrou que a tomada em consideração da dimensão das instituições para o cálculo das contribuições ex ante acarreta inconvenientes manifestamente desproporcionados relativamente aos objetivos prosseguidos.

182    Tendo em conta o que precede, há que julgar improcedente o segundo fundamento.

3.      Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do princípio da segurança jurídica

183    No seu terceiro fundamento, a recorrente alega que o artigo 69.o, n.os 1 e 2, e o artigo 70.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 806/2014, o artigo 4.o, n.o 2, os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, bem como o artigo 4.o do Regulamento de Execução 2015/81, violam o princípio da segurança jurídica. A argumentação desenvolvida em apoio deste fundamento articula‑se em três partes, relativas, a primeira, à impossibilidade de as instituições conhecerem antecipadamente o montante das suas contribuições ex ante, a segunda, à não tomada em consideração de certos indicadores de risco e, a terceira, à inadequação das modalidades de determinação da «taxa de crescimento dos depósitos cobertos» que servem para estabelecer o nível‑alvo anual. No âmbito do presente fundamento, a recorrente apresentou igualmente uma quarta parte, relativa à violação do artigo 290.o TFUE.

184    A título preliminar, há que precisar o alcance da presente exceção de ilegalidade.

185    A este respeito, impõe‑se salientar que, embora a demandante argua formalmente uma exceção de ilegalidade relativamente a todas as disposições mencionadas no n.o 183, supra, a argumentação que expõe para sustentar essa exceção visa apenas a conformidade dos artigos 6.o e 7.o e do anexo I do Regulamento Delegado 2015/63 com o princípio da segurança jurídica. Por conseguinte, a recorrente não apresenta nenhuma argumentação que diga especificamente respeito à legalidade do referido princípio, do artigo 69.o, n.os 1 e 2, do artigo 70.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 806/2014, do artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento Delegado 2015/63 e do artigo 4.o do Regulamento de Execução 2015/81. Nestas circunstâncias, importa concluir que a presente exceção de ilegalidade tem, na realidade, por objeto os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63.

a)      Quanto à primeira parte, relativa à impossibilidade de conhecer antecipadamente o nível da contribuição ex ante

186    A recorrente alega, em substância, que os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63 violam o princípio da segurança jurídica, uma vez que não pode conhecer com suficiente antecedência o montante da contribuição ex ante que lhe será exigida. Desde logo, todo o método de cálculo é opaco. Em seguida, o ajustamento da contribuição anual de base em função do risco depende das modalidades previstas por estas disposições, que são opacas. Por último, a sua afetação aos diferentes «compartimentos» é feita de forma unilateral e opaca.

187    Além disso, a fixação das contribuições ex ante baseia‑se na utilização de dados que não foram tornados públicos. Por último, o montante das contribuições ex ante depende da evolução da situação das outras instituições, o que cria interdependências fortes entre os montantes das contribuições individuais das diferentes instituições, tornando impossível o cálculo exato de uma contribuição ex ante por antecipação.

188    O CUR, o Parlamento, o Conselho e a Comissão contestam esta argumentação.

189    O princípio da segurança jurídica exige, por um lado, que as regras jurídicas sejam claras e precisas e, por outro, que a sua aplicação seja previsível para os particulares, em especial quando possam ter consequências desfavoráveis. O referido princípio exige, nomeadamente, que uma regulamentação permita aos interessados conhecer com exatidão a extensão das obrigações que lhes impõe e que estes possam conhecer sem ambiguidade os seus direitos e obrigações e agir em conformidade (Acórdãos de 29 de abril de 2021, Banco de Portugal e o., C‑504/19, EU:C:2021:335, n.o 51, e de 16 de fevereiro de 2022, Polónia/Parlamento e Conselho, C‑157/21, EU:C:2022:98, n.o 319).

190    No entanto, estes requisitos não podem ser entendidos no sentido de que se opõem a que uma instituição da União, no âmbito de uma norma que adote, utilize um conceito jurídico abstrato nem no sentido de que impõe que essa norma abstrata mencione as diferentes hipóteses concretas em que é suscetível de ser aplicada, uma vez que nem todas estas hipóteses podem ser determinadas antecipadamente pela referida instituição (v., por analogia, Acórdãos de 20 de julho de 2017, Marco Tronchetti Provera e o., C‑206/16, EU:C:2017:572, n.os 39 e 40, e de 16 de fevereiro de 2022, Polónia/Parlamento e Conselho, C‑157/21, EU:C:2022:98, n.o 320).

191    Consequentemente, uma disposição de um ato da União só viola o princípio da segurança jurídica, por falta de clareza, se apresentar uma ambiguidade tal que impeça os particulares de ultrapassar, com um grau de certeza suficiente, eventuais dúvidas quanto ao alcance ou ao sentido dessa disposição (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de abril de 2005, Bélgica/Comissão, C‑110/03, EU:C:2005:223, n.o 31, e de 22 de maio de 2007, Mebrom/Comissão, T‑216/05, EU:T:2007:148, n.o 108).

192    Do mesmo modo, o facto de um ato da União conferir um poder de apreciação às autoridades responsáveis pela sua implementação não viola, em si mesmo, o requisito de previsibilidade, desde que o alcance e as modalidades de exercício desse poder se encontrem definidas com clareza suficiente, tendo em conta o fim legítimo em jogo, para fornecer uma proteção adequada contra o arbítrio (v. Acórdão de 16 de fevereiro de 2022, Polónia/Parlamento e Conselho, C‑157/21, EU:C:2022:98, n.o 321 e jurisprudência referida)

193    Em conformidade com a jurisprudência referida nos n.os 191 e 192, supra, importa examinar, no caso em apreço, se a regulamentação aplicável apresenta uma ambiguidade tal que impeça as instituições de ultrapassar, com um grau de certeza suficiente, eventuais dúvidas quanto ao alcance ou o sentido dos artigos 6.o e 7.o e do anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, cuja ilegalidade a recorrente invoca.

194    Em primeiro lugar, no que respeita, à alegada opacidade do método de cálculo em sentido global, cabe à recorrente identificar a falta de clareza, as imprecisões ou a falta de previsibilidade nas regras jurídicas que contesta. Ora, a recorrente não os identificou, tendo‑se limitado a formular afirmações gerais e não fundamentadas.

195    Em todo o caso, resulta da jurisprudência que a regulamentação aplicável não deve necessariamente permitir às instituições verificar a exatidão do cálculo da sua contribuição ex ante, pois essa exigência implicaria, necessariamente, impedir o legislador da União de estabelecer um método de cálculo da contribuição que incorpore dados cuja natureza confidencial é protegida pelo direito da União e, por conseguinte, reduzir de forma excessiva o amplo poder de apreciação que o legislador e a Comissão devem ter para esse efeito, impedindo‑os nomeadamente de optar por um método capaz de assegurar uma adaptação dinâmica do financiamento do FUR às evoluções do setor financeiro, tendo, nomeadamente, em conta a situação financeira comparativa de cada instituição autorizada no território de um Estado‑Membro participante no FUR (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 118).

196    Assim, basta que as pessoas afetadas por uma decisão que fixa contribuições ex ante, não tendo embora recebido os dados abrangidos pelo segredo comercial, conheçam o método de cálculo utilizado pelo CUR e disponham de informações suficientes para compreender, em substância, a forma como a sua situação individual foi tomada em consideração para o cálculo da sua contribuição ex ante, tendo em conta a situação de todas as outras instituições envolvidas (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 122).

197    Entre as informações que devem assim ser disponibilizadas às instituições incluem‑se, nomeadamente, os valores‑limite para cada «compartimento» e os dos indicadores de risco conexos, com base nos quais a contribuição ex ante das instituições foi adaptada ao seu perfil de risco (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 167).

198    Além disso, o Regulamento Delegado 2015/63 não obsta de forma alguma à possibilidade de o CUR divulgar, de forma agregada e anónima, informações suficientes para permitir a uma instituição compreender de que forma a sua situação individual foi tida em conta no cálculo da respetiva contribuição ex ante, tendo em conta a situação de todas as outras instituições envolvidas (Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 139).

199    Nestas circunstâncias, há que rejeitar a primeira alegação.

200    Em segundo lugar, no que respeita ao ajustamento da contribuição anual de base das instituições em função do risco, há que salientar que a recorrente se limita a alegar que os artigos 6.o e 7.o do Regulamento Delegado 2015/63 são «opacos pela sua dimensão» e, portanto, a arguir, de um modo geral, que os conceitos utilizados nessas disposições apresentam uma falta de clareza tal que conduz à violação do princípio da segurança jurídica.

201    No entanto, a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento concreto para contestar a legalidade dos artigos 6.o e 7.o do Regulamento Delegado 2015/63 por alegada falta de clareza, imprecisão ou falta de previsibilidade.

202    Nestas circunstâncias, a segunda alegação não pode ser acolhida.

203    Em terceiro lugar, quanto ao argumento da recorrente segundo o qual o método dito de «compartimentação», descrito no n.o 204 infra, nomeadamente da afetação da recorrente aos diferentes «compartimentos», é aplicado de forma unilateral e opaca, deve notar‑se o seguinte.

204    Em aplicação do anexo I, sob a epígrafe «Etapa 2», do Regulamento Delegado 2015/63, cabe ao CUR calcular, num primeiro momento, vários «compartimentos» para comparar as instituições tendo em conta os diferentes indicadores e subindicadores de risco. Num segundo momento, cabe ao CUR afetar as instituições a cada «compartimento». Num terceiro momento, cabe ao CUR atribuir a todas as instituições de um determinado «compartimento» a mesma pontuação, denominada «indicador discretizado», que deve ter em conta para o cálculo restante do seu coeficiente de ajustamento.

205    Por outro lado, o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63 especifica, nomeadamente, as diferentes etapas do método de compartimentação e enuncia as fórmulas matemáticas que devem ser aplicadas pelo CUR.

206    Ora, a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento concreto que permitisse identificar uma falta de clareza, de precisão ou de previsibilidade relativamente a essas diferentes etapas ou a essas fórmulas.

207    Em todo o caso, à luz das considerações enunciadas nos n.os 195 a 197 supra, a Comissão não era obrigada a prever que fossem fornecidos dados às instituições que lhes permitissem verificar, com completude, a exatidão da aplicação do método de compartimentação.

208    Além disso, o Regulamento Delegado 2015/63 não impede de modo nenhum o CUR de divulgar, para cumprir os requisitos mencionados nos n.os 196 e 197, supra, os valores‑limite de cada «compartimento» e os indicadores com ele relacionados, com vista a permitir à instituição em causa verificar, nomeadamente, que a classificação que lhe foi atribuída quando os indicadores foram discretizados, tal como definido no anexo I desse regulamento delegado, corresponde efetivamente à sua situação económica, que essa discretização foi efetuada de acordo com o método definido por esse regulamento delegado com base em dados plausíveis e que todos os fatores de risco a ter em conta nos termos do Regulamento n.o 806/2014 e do regulamento delegado o foram efetivamente.

209    Em quarto lugar, para fundamentar a presente exceção de ilegalidade, a recorrente não pode invocar o facto de o instrumento de cálculo colocado à disposição das instituições pelo CUR antes da adoção da decisão impugnada não ter permitido fiscalizar a análise efetuada por este para afetar as instituições aos diferentes «compartimentos». Com efeito, este instrumento de cálculo não está previsto no regulamento aplicável, mais concretamente no Regulamento Delegado 2015/63. Por conseguinte, essa crítica diz respeito à legalidade dos atos do CUR e, não, à legalidade deste regulamento delegado.

210    Admitindo que se deva entender essa alegação no sentido de que, através dela, a recorrente contesta a legalidade da decisão impugnada, basta salientar que a mesma não explica o modo como, apesar de a regulamentação aplicável não obrigar o CUR a disponibilizar às instituições a ferramenta de cálculo mencionada no n.o 209, supra, e de a comunicação deste preceder a adoção dessa decisão, dados alegadamente insuficientes nesse instrumento afetam a validade da referida decisão. Em todo o caso, resulta da jurisprudência referida nos n.os 195 e 196, supra, que o CUR não é obrigado a fornecer à recorrente os dados abrangidos pelo segredo comercial, relativos à situação económica de cada uma das outras instituições envolvidas.

211    Em quinto lugar, a recorrente sublinha que a publicação de determinados dados confidenciais agregados nas decisões que determinam as contribuições ex ante de um determinado ano é insuficiente, uma vez que ainda não são publicados pelo CUR outros elementos não confidenciais necessários à boa compreensão e à antecipação dos cálculos.

212    Ora, com esta argumentação, a recorrente também não põe em causa as disposições da regulamentação aplicável, mencionadas no n.o 186, supra, cuja ilegalidade invoca à luz do princípio da segurança jurídica.

213    Com efeito, a recorrente limita‑se a criticar a não publicação pelo CUR de determinados elementos não confidenciais, necessários ao cálculo das contribuições ex ante, em momento anterior à adoção das decisões que determinam essas contribuições. Por conseguinte, esta alegação não diz respeito à legalidade da regulamentação aplicável, mas sim às modalidades da sua aplicação pelo CUR.

214    Admitindo que se deva entender essa alegação no sentido de que, através dela, a recorrente contesta a legalidade da decisão impugnada, a mesma não explica, com clareza suficiente, quais os elementos concretos que o CUR estava obrigado a publicar para cumprir os requisitos resultantes da jurisprudência referida nos n.os 195 e 196, supra, apesar de não o ter feito. A esse respeito, decorre, aliás, dessa mesma jurisprudência que seria excessivo exigir que o CUR comunicasse cada um dos números em que se baseia o cálculo da contribuição ex ante de cada instituição em causa (v. Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR,  C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 123 e jurisprudência referida).

215    Em sexto lugar, quanto ao facto de o cálculo das contribuições ex ante de uma instituição depender dos dados confidenciais relativos à situação das outras instituições, o que aumenta a imprevisibilidade do método de cálculo, importa salientar que a argumentação da recorrente a este respeito não está de modo nenhum desenvolvida.

216    Em todo o caso, essa argumentação colide com os ensinamentos decorrentes do Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR (C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601), que, na verdade, têm por objeto o cumprimento do dever de fundamentação, mas são igualmente válidos no que respeita à observância do princípio da segurança jurídica.

217    No Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR (C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601), o Tribunal de Justiça reconheceu que o próprio princípio do método de cálculo das contribuições ex ante, conforme resultava da Diretiva 2014/59 e do Regulamento n.o 806/2014, podia implicar a utilização, pelo CUR, de dados das outras instituições abrangidos pelo segredo comercial (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 114).

218    Nestas condições, por um lado, a recorrente não pode apoiar‑se na mera circunstância de não poder calcular antecipadamente a contribuição ex ante de que é devedora pelo facto de os dados das outras instituições não lhe serem comunicados.

219    Por outro lado, conforme salientado no n.o 198, supra, o Regulamento Delegado 2015/63 não obsta de modo nenhum à possibilidade de o CUR divulgar, de forma agregada e anónima, informações suficientes para permitir a uma instituição compreender o modo como a sua situação individual foi considerada no cálculo da sua contribuição ex ante, tendo em conta a situação de todas as outras instituições envolvidas.

220    Em consequência, há que julgar improcedente a primeira parte do terceiro fundamento.

b)      Quanto à segunda parte, relativa à falta de previsibilidade quanto à aplicação de certos indicadores de risco

221    A recorrente alega que não foram aplicados certos indicadores de risco para calcular as contribuições ex ante para o período de contribuição de 2021, a saber, o «rácio de financiamento líquido estável», o MELR, bem como a «complexidade» e a «resolubilidade». A não tomada em consideração destes indicadores de risco, bem como a falta de previsibilidade quanto à sua implementação, contraria o princípio da segurança jurídica, dado que a recorrente não pode antecipar a sua aplicação.

222    Além disso, o facto de, nas suas disposições transitórias, o Regulamento Delegado 2015/63 deixar a possibilidade ao CUR de não ter em conta certos indicadores de risco, ao mesmo tempo que, no entanto, lhe permite ajustar a contribuição anual de base em função do perfil de risco, é fonte de insegurança jurídica.

223    O CRU e a Comissão contestam esta argumentação.

224    Em conformidade com a jurisprudência referida nos n.os 189 a 192 supra, há que examinar, no caso em apreço, se a regulamentação aplicável apresenta uma ambiguidade tal que impeça as instituições de ultrapassar, com um grau de certeza suficiente, eventuais dúvidas quanto à aplicação de certos indicadores de risco, como o «rácio de financiamento líquido estável», a MELR, bem como a «complexidade» e a «resolubilidade».

225    As condições em que o CUR se pode abster, a título transitório, de aplicar tais indicadores de risco estão previstas no artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento Delegado 2015/63, segundo o qual «[q]uando as informações exigidas por um indicador específico, como referido no anexo II [deste regulamento delegado], não estiverem incluídas no requisito aplicável de comunicação de informações para efeitos de supervisão a que se refere o artigo 14.o [do referido regulamento delegado], esse indicador de risco não é aplicado até que o referido requisito de comunicação de informações para efeitos de supervisão passe a ser aplicável».

226    O artigo 20.o, n.o 1, do Regulamento Delegado 2015/63 prevê, assim, duas condições para que o CUR não aplique, a título transitório, um indicador de risco, a saber, em primeiro lugar, aquela em que as informações requeridas relativamente a esse indicador não fazem parte do requisito de comunicação de informações para efeitos de supervisão, referido no artigo 14.o desse regulamento delegado, e, em segundo lugar, aquela em que esse indicador é mencionado no anexo II do referido regulamento delegado, intitulado «Dados a apresentar às autoridades de resolução» e que contém quinze categorias de dados. Ora, a recorrente não alegou, e muito menos demonstrou, que essas condições apresentam uma ambiguidade tal que impede as instituições de ultrapassar, com um grau de certeza suficiente, eventuais dúvidas quanto à aplicação de certos indicadores de risco.

227    Nestas circunstâncias, os argumentos que a recorrente apresentou para demonstrar que o Regulamento n.o 806/2014 ou o Regulamento Delegado 2015/63 são ilegais por alegada violação do princípio da segurança jurídica em razão da falta de previsibilidade quanto à implementação dos indicadores de risco devem ser rejeitados.

228    Por conseguinte, há que julgar improcedente a segunda parte do terceiro fundamento.

c)      Quanto à terceira parte, relativa às modalidades de determinação da «taxa de crescimento dos depósitos cobertos»

229    A recorrente considera que o objetivo de atingir um nível‑alvo final ‑ igual a 1 % do montante dos depósitos cobertos da União Bancária ‑ implica que, anualmente, o CUR avalie uma «taxa de crescimento desses depósitos cobertos», que é determinada de forma opaca e cuja evolução é dificilmente previsível pelas instituições.

230    O CRU contesta esta argumentação.

231    Importa salientar que a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento concreto para demonstrar que as disposições mencionadas no n.o 183, supra, apresentam uma ambiguidade tal que impedem as instituições de ultrapassar, com um grau de certeza suficiente, eventuais dúvidas quanto à determinação do nível‑alvo final ou do nível‑alvo anual.

232    Além disso, numa parte da sua argumentação, a recorrente contesta, na realidade, a falta de fundamentação da decisão impugnada no que se refere à determinação do nível‑alvo anual. Esta alegação não diz respeito à legalidade das disposições mencionadas no n.o 183, supra, e será examinada nos n.os 271 a 308, infra.

233    Por conseguinte, há que julgar improcedente a terceira parte do terceiro fundamento, uma vez que a recorrente contesta a legalidade destas disposições.

d)      Quanto à quarta parte, relativa à violação do artigo 290.o TFUE pelos critérios de cálculo definidos pelo Regulamento Delegado 2015/63

234    No âmbito do terceiro fundamento, a recorrente considerou igualmente que o facto de os critérios essenciais de cálculo terem sido definidos pelo Regulamento Delegado 2015/63, e não pelo Regulamento n.o 806/2014, implica uma violação do artigo 290.o TFUE. Na audiência, a recorrente esclareceu que, com este argumento, alega que a Diretiva 2014/59 apenas fixou as grandes categorias de risco, que agrupou em quatro pilares de risco, mas que não se pronunciou sobre os próprios critérios, que tinham sido definidos pela Comissão no Regulamento Delegado 2015/63.

235    O Parlamento contesta a procedência desta parte do terceiro fundamento e questiona a sua admissibilidade, uma vez que não foi apresentado de forma suficientemente clara e precisa na petição de recurso.

236    A este respeito, resulta da jurisprudência que, para que um recurso seja admissível, é necessário que os elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia resultem, pelo menos sumariamente, mas de um modo coerente e compreensível, do texto da própria petição, a fim de garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça. Assim, qualquer fundamento que não esteja suficientemente articulado na petição inicial deve ser considerado inadmissível. São impostas exigências análogas quando uma alegação é invocada para sustentar um fundamento. Esta exceção de inadmissibilidade de ordem pública deve ser conhecida oficiosamente pelo juiz da União (v. Acórdãos de 30 de junho de 2021, Itália/Comissão, T‑265/19, não publicado, EU:T:2021:392, n.o 33 e jurisprudência referida, e de 7 de julho de 2021, Bateni/Conselho, T‑455/17, EU:T:2021:411, n.o 135 e jurisprudência referida).

237    No caso em apreço, no seu n.o 125, a petição limitou‑se a referir que «a função eminentemente estruturante e determinante dos critérios de cálculo definidos pelo Regulamento Delegado [2015/63] leva a considerar que estes critérios são, por definição, essenciais ao [Regulamento n.o 806/2014], o que implica uma violação do artigo 290.o do TFUE» e, no seu n.o 139, a enunciar que «o facto de terem sido adotados critérios essenciais de cálculo no âmbito do regulamento delegado e não do [Regulamento n.o 806/2014] viola o artigo 290.o, [n.o 1,] do TFUE».

238    Estas afirmações não foram acompanhadas por nenhuma argumentação na petição. Assim, a recorrente não identificou, nomeadamente, as disposições do Regulamento Delegado 2015/63 que, em seu entender, contêm elementos essenciais, na aceção do artigo 290.o, n.o 1, segundo parágrafo, segundo período, TFUE, e que deveriam figurar na Diretiva 2014/59. A recorrente também não especificou quais os elementos concretos das referidas disposições que revestem caráter «essencial» nem apresentou argumento para o efeito.

239    Por último, a falta de clareza da parte em análise é agravada pelo facto de esta ter sido apresentada no âmbito de um fundamento relativo à violação de uma norma jurídica diferente, a saber, o princípio da segurança jurídica.

240    Por conseguinte, importa declarar que os elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia a alegação relativa à violação do artigo 290.o TFUE não resultam, pelo menos sumariamente, do texto da própria petição. Tal alegação não preenche, assim, os requisitos enunciados no n.o 236, supra.

241    Nestas circunstâncias, a argumentação que a recorrente apresentou na audiência não pode ser considerada uma ampliação da alegação enunciada nos n.os 125 e 139 da petição, uma vez que tal alegação não foi validamente invocada.

242    Por conseguinte, há que julgar inadmissível a quarta parte do terceiro fundamento.

4.      Quanto aos quarto e quinto fundamentos, relativos à violação do princípio da boa administração e à violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva, na medida em que configuram uma exceção de ilegalidade

243    A recorrente considera que tanto o artigo 4.o, n.o 2, os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63 como a decisão impugnada, que se baseia nessas disposições, violam o princípio da boa administração, que inclui o dever de fundamentação, e o princípio da tutela jurisdicional efetiva. Segundo a recorrente, as instituições não têm acesso a todos os dados essenciais que lhes permitam compreender e verificar a decisão impugnada. Em especial, as modalidades detalhadas do cálculo da «taxa de ajustamento dos depósitos cobertos» não são conhecidas das instituições, o que as impede de verificarem a validade dos cálculos realizados a esse respeito.

244    O CRU contesta esta argumentação.

245    Em primeiro lugar, importa recordar que o princípio da boa administração exige, nos casos em que, como no caso em apreço, as instituições ou órgãos da União dispõem de poder de apreciação, o respeito pelas garantias conferidas pela ordem jurídica da União nos procedimentos administrativos, entre os quais figura, nomeadamente, a obrigação de a instituição ou do órgão competente examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos relevantes do caso concreto (Acórdãos de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, EU:C:1991:438, n.o 14; de 30 de setembro de 2003, Atlantic Container Line e o./Comissão, T‑191/98, T‑212/98 a T‑214/98, EU:T:2003:245, n.o 404, e de 9 de abril de 2019, Qualcomm e Qualcomm Europe/Comissão, T‑371/17, não publicado, EU:T:2019:232, n.o 200).

246    Em segundo lugar, é jurisprudência constante que a efetividade da fiscalização jurisdicional garantida pelo artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») exige que o interessado possa conhecer os motivos nos quais se baseia a decisão tomada a seu respeito, quer através da leitura da própria decisão, quer através de uma comunicação destes motivos feita a seu pedido, sem prejuízo do poder do juiz competente de exigir da autoridade em causa que os comunique, para lhe permitir defender os seus direitos nas melhores condições possíveis e decidir com pleno conhecimento de causa se é útil recorrer ao juiz competente, bem como para dar a este último condições para exercer plenamente a fiscalização da legalidade da decisão nacional em causa (Acórdãos de 26 de abril de 2018, Donnellan, C‑34/17, EU:C:2018:282, n.o 55, e de 24 de novembro de 2020, Minister van Buitenlandse Zaken, C‑225/19 e C‑226/19, EU:C:2020:951, n.o 43).

247    Além disso, à luz do princípio do contraditório, que faz parte dos direitos de defesa mencionados no artigo 47.o da Carta, as partes num processo devem ter o direito de tomar conhecimento de todos os documentos ou observações apresentados ao juiz, com vista a influenciar a sua decisão e a discuti‑los. Com efeito, seria violar o direito fundamental à ação fundar uma decisão judicial em factos e documentos de que as próprias partes, ou uma delas, não puderam tomar conhecimento e sobre os quais, portanto, não podiam posição (v. Acórdãos de 4 de junho de 2013, ZZ, C‑300/11, EU:C:2013:363, n.os 55 e 56, e de 23 de outubro de 2014, Unitrading, C‑437/13, EU:C:2014:2318, n.o 21).

248    No entanto, em casos excecionais, uma autoridade da União pode opor‑se à comunicação ao interessado dos motivos precisos e completos que constituem o fundamento de uma decisão tomada contra ele, invocando razões relacionadas com a proteção de dados confidenciais. Nesse caso, é necessário aplicar técnicas e normas jurídicas que permitam conciliar, por um lado, as considerações legítimas da proteção de dados confidenciais que tenham sido tidas em conta para a adoção dessa decisão e, por outro, a necessidade de garantir suficientemente ao litigante o respeito pelos seus direitos processuais, como o direito de ser ouvido e o princípio do contraditório (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.os 115 a 120; v., igualmente, neste sentido e por analogia, Acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 125).

249    Tendo em conta a natureza específica das contribuições ex ante, essa conciliação deve ser igualmente feita no caso do cálculo dessas contribuições. Com efeito, como resulta dos considerandos 105 a 107 da Diretiva 2014/59 e do considerando 41 do Regulamento n.o 806/2014, as referidas contribuições visam assegurar, numa lógica baseada na garantia, que o setor financeiro fornece recursos financeiros suficientes ao MUR para que este possa desempenhar as suas funções, ao mesmo tempo que incentiva a adoção, pelas instituições envolvidas, de modelos de funcionamento menos arriscados. Assim, o cálculo dessas contribuições não assenta na aplicação de uma taxa a uma base, mas, nos termos dos artigos 102.o e 103.o da Diretiva 2014/59 e dos artigos 69.o e 70.o do Regulamento n.o 806/2014, na definição de um nível‑alvo final a atingir pela soma dessas contribuições cobradas antes do final do período inicial de oito anos a contar de 1 de janeiro de 2016 (a seguir «período inicial» e «nível‑alvo final»), e depois de um nível‑alvo anual a ser repartido pelas instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 113).

250    Uma vez que o nível‑alvo final é definido como devendo ascender a, pelo menos, 1 % do valor dos depósitos cobertos de todas essas instituições e que a contribuição anual de base de cada instituição é calculada proporcionalmente ao montante do seu passivo (excluindo os fundos próprios) menos os depósitos cobertos, em relação ao passivo agregado (excluindo os fundos próprios) menos os depósitos cobertos de todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes, afigura‑se que o próprio princípio do método de cálculo das contribuições ex ante, tal como resulta da Diretiva 2014/59 e do Regulamento n.o 806/2014, implica a utilização pelo CUR de dados abrangidos pelo segredo comercial (Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 114).

251    Ora, em princípio, as instituições e organismos da União são obrigados, por força do princípio de proteção do segredo comercial, o qual constitui um princípio geral do direito da União consagrado nomeadamente no artigo 339.o TFUE, a não revelar aos concorrentes de um operador privado informações confidenciais fornecidas por este (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.os 109 e 114 e jurisprudência referida).

252    Nestas circunstâncias, cabia à Comissão e ao Conselho da União Europeia, aquando da instituição do sistema de cálculo das contribuições ex ante pelo Regulamento Delegado 2015/63 e pelo Regulamento de Execução 2015/81, conciliar o respeito pelo segredo comercial com o princípio da tutela jurisdicional efetiva, para que os dados abrangidos por esse segredo não pudessem ser comunicados aos interessados e não pudessem, nomeadamente, ser incluídos na fundamentação das decisões que fixam o montante das contribuições ex ante.

253    No entanto, esta característica do sistema de cálculo das contribuições ex ante não impede o exercício de uma fiscalização jurisdicional efetiva pelo juiz da União.

254    Com efeito, por um lado, nada nas disposições cuja ilegalidade é invocada pela recorrente se opõe a que, em conformidade com o artigo 88.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 806/2014, o CUR, quando adota a decisão que fixa as contribuições ex ante, divulgue informações confidenciais obtidas no exercício das suas funções, de forma sumária ou agregada, de um modo que as instituições em causa não possam ser identificadas (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 136).

255    Por outro lado, quando a fundamentação dessa decisão tenha de ser limitada para garantir a proteção de dados confidenciais, compete ao autor dessa decisão, em caso de recurso para os órgãos jurisdicionais da União que envolva esses dados, justificar‑se perante estes no âmbito da instrução contenciosa (v., neste sentido, Acórdãos de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.o 110, e de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 145).

256    Se necessário, a fim de exercer uma fiscalização jurisdicional efetiva, em conformidade com as exigências do artigo 47.o da Carta, os órgãos jurisdicionais da União podem solicitar ao CUR a apresentação de dados suscetíveis de fundamentar os cálculos cuja exatidão seja contestada perante eles, assegurando, se necessário, a confidencialidade desses dados (v. Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 146).

257    Além disso, ao proceder ao exame de todos os elementos de facto e de direito fornecidos pelo CUR, incumbe ao juiz da União verificar a procedência das razões por este invocadas para se opor à comunicação dos dados utilizados para efeitos do cálculo da contribuição ex ante (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 126).

258    Se se verificar que as razões invocadas pelo CUR se opõem efetivamente à comunicação de informações ou de elementos de prova produzidos perante o juiz da União, é necessário ponderar adequadamente as exigências ligadas ao direito a uma tutela jurisdicional efetiva, em especial ao respeito pelo princípio do contraditório, e as decorrentes da proteção do segredo comercial (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 128).

259    Decorre do exposto que o cálculo das contribuições ex ante com base em dados abrangidos pelo segredo comercial, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 2, os artigos 6.o e 7.o e o anexo I do Regulamento Delegado 2015/63, e sem que os referidos dados sejam colocados à disposição dos interessados, não implica, por si só, que essas disposições sejam incompatíveis com o princípio da boa administração e o princípio da tutela jurisdicional efetiva.

260    Esta conclusão não é posta em causa pelos argumentos da recorrente.

261    A este respeito, primeiro, a recorrente não pode basear‑se nos Acórdãos de 28 de novembro de 2019, Portigon/CUR (T‑365/16, EU:T:2019:824), e de 23 de setembro de 2020, Landesbank Baden‑Württemberg/CUR (T‑411/17, EU:T:2020:435). Por um lado, este último acórdão foi anulado pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR (C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601), no qual foram censuradas as considerações relativas ao princípio da tutela jurisdicional efetiva em que a recorrente se baseia. Por outro lado, o Acórdão de 28 de novembro de 2019, Portigon/CUR (T‑365/16, EU:T:2019:824), contrariamente ao que alega a recorrente, não contém nenhuma análise especificamente relativa ao princípio da tutela jurisdicional efetiva.

262    Segundo, a recorrente não pode contestar a legalidade do Regulamento Delegado 2015/63 com o fundamento de que nem o Regulamento n.o 806/2014 nem a Diretiva 2014/59 impõem um método de cálculo das contribuições ex ante segundo o qual é inicialmente definido um nível‑alvo e é depois efetuada uma repartição relativa dessas mesmas contribuições entre as instituições.

263    A este respeito, basta recordar que, como salientado nos n.os 254 a 258, supra, o Tribunal de Justiça admitiu a possibilidade de o legislador da União recorrer a um método de cálculo baseado na definição de um nível‑alvo e, em seguida, de um nível‑alvo anual que deve ser repartido entre todas as instituições, sem que, no entanto, sejam violados o dever de fundamentação ou o princípio da tutela jurisdicional efetiva (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.os 136, 145 e 146).

264    Nestas circunstâncias, o Regulamento Delegado 2015/63 podia igualmente introduzir esse método.

265    Terceiro, a recorrente considera que as instituições não têm acesso a todos os dados essenciais que lhes permitam compreender e verificar a decisão impugnada.

266    A esse respeito, por um lado, basta lembrar que as disposições evocadas no n.o 243, supra, não impedem de modo algum o CUR de divulgar, para cumprir os requisitos acima referidos nos n.os 245 a 258, as informações necessárias para permitir às instituições envolvidas assegurar‑se, nomeadamente, de que têm acesso a todos os dados essenciais para compreender e verificar a decisão impugnada.

267    Por outro lado, na parte em que a referida alegação visa a legalidade da decisão impugnada, a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhuma argumentação que a fundamente.

268    Tal alegação não pode, portanto, proceder.

269    Quarto, quanto à argumentação da recorrente sobre a inexistência, na decisão impugnada, de dados relativos à fixação da «taxa de ajustamento dos depósitos cobertos» que servem para determinar o nível‑alvo anual, tal argumentação não põe em causa as disposições mencionadas no n.o 243, supra, cuja ilegalidade a recorrente invoca à luz do princípio da boa administração e do princípio da tutela jurisdicional efetiva, mas a legalidade da decisão impugnada. Será assim examinada nos n.os 309 a 314, infra.

270    Por conseguinte, há que julgar improcedentes o quarto e o quinto fundamentos, uma vez que são invocados para sustentar a exceção de ilegalidade do artigo 4.o, n.o 2, dos artigos 6.o e 7.o e do anexo I do Regulamento Delegado 2015/63.

C.      Quanto aos fundamentos relativos à legalidade da decisão impugnada

1.      Quanto à fundamentação da determinação do nívelalvo anual

271    Como indicado no n.o 232, supra, na terceira parte do terceiro fundamento a recorrente contesta, nomeadamente e na realidade, a falta de fundamentação da decisão impugnada no que se refere à determinação do nível‑alvo anual.

272    A este respeito, importa recordar que, em conformidade com o artigo 69.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, até ao termo do período inicial, os meios financeiros disponíveis no FUR devem atingir o nível‑alvo final, que corresponde pelo menos a 1 % do montante dos depósitos cobertos de todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes.

273    Segundo o artigo 69.o, n.o 2, do Regulamento n.o 806/2014, durante o período inicial, as contribuições ex ante devem ser escalonadas ao longo do tempo da forma mais equilibrada possível até que seja atingido o nível‑alvo mencionado no n.o 272, supra, mas tendo devidamente em conta a fase do ciclo económico e o impacto que as contribuições pró‑cíclicas podem ter na posição financeira das instituições.

274    O artigo 70.o, n.o 2, do Regulamento n.o 806/2014 especifica que, todos os anos, as contribuições devidas por todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes não excedem 12,5 % do nível‑alvo final.

275    No que respeita ao método de cálculo das contribuições ex ante, o artigo 4.o, n.o 2, do Regulamento Delegado 2015/63 prevê que o CUR determina o seu montante com base no nível‑alvo anual, tendo em conta o nível‑alvo final, e com base no valor médio dos depósitos cobertos registado no ano precedente, calculado trimestralmente, de todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes.

276    Do mesmo modo, segundo o artigo 4.o do Regulamento de Execução 2015/81, o CUR calcula a contribuição ex ante para cada instituição com base no nível‑alvo anual, que deve ser estabelecido em relação ao nível‑alvo final e de acordo com a metodologia prevista no Regulamento Delegado (UE) 2015/63.

277    No caso em apreço, como resulta do considerando 48 da decisão impugnada, o CUR fixou, para o período de contribuição de 2021, o montante do nível‑alvo anual em 11 287 677 212,56 euros.

278    Nos considerandos 36 e 37 da decisão impugnada, o CUR explicou, em substância, que o nível‑alvo anual deve ser determinado com base numa análise sobre a evolução dos depósitos cobertos ao longo dos anos anteriores, sobre a evolução relevante de toda a situação económica e sobre uma análise dos indicadores relativos à fase do ciclo económico e ao impacto que as contribuições pró‑cíclicas têm na posição financeira das instituições. Em seguida, o CUR considerou adequado fixar um coeficiente que se baseava nessa análise e nos meios financeiros disponíveis no FUR (a seguir «coeficiente»). O CUR aplicou esse coeficiente a um oitavo do montante dos depósitos cobertos em 2020, para obter o nível‑alvo anual.

279    O CUR expôs, nos considerandos 38 a 47 da decisão impugnada, o procedimento adotado para a fixação do coeficiente.

280    No considerando 38 da decisão impugnada, o CUR verificou uma tendência de crescimento constante dos depósitos cobertos de todas as instituições dos Estados‑Membros participantes. Em especial, o montante médio desses depósitos, calculado trimestralmente, ascendeu, relativamente ao ano de 2020, a 6,689 biliões de euros.

281    Nos considerandos 40 e 41 da decisão impugnada, o CUR apresentou a evolução prevista dos depósitos cobertos para os restantes três anos do período inicial, a saber, de 2021 a 2023. Estimou que as taxas de crescimento anual dos depósitos cobertos até ao final do período inicial variariam entre 4 % e 7 %.

282    Nos considerandos 42 a 45 da decisão impugnada, o CUR apresentou uma avaliação da fase do ciclo económico e o potencial impacto pró‑cíclico que as contribuições ex ante poderiam ter na posição financeira das instituições. Para o efeito, referiu ter tido em conta vários indicadores, como a previsão de crescimento do produto interno bruto da Comissão e as projeções do Banco Central Europeu (BCE) a este respeito ou o fluxo de crédito do setor privado em percentagem do produto interno bruto.

283    No considerando 46 da decisão impugnada, o CUR concluiu que, embora fosse razoável esperar a continuação do crescimento dos depósitos cobertos na União Bancária, o ritmo deste crescimento seria inferior ao de 2020. A esse respeito, o CUR referiu, no considerando 47 da decisão impugnada, ter adotado uma «abordagem conservadora» relativamente às taxas de crescimento dos depósitos cobertos ao longo dos próximos anos e até 2023.

284    À luz destas considerações, o CUR fixou, no considerando 48 da decisão impugnada, o valor do coeficiente em 1,35 %. Em seguida, calculou o montante do nível‑alvo anual, multiplicando o montante médio dos depósitos cobertos em 2020 por esse coeficiente e dividindo o resultado desse cálculo por oito, em conformidade com a seguinte fórmula matemática, que consta do considerando 48 da referida decisão:

«Alvo0 [montante do nível‑alvo anual] = Total de depósitos cobertos2020 * 0,0135 * ⅛ = 11 287 677 212,56 euros».

285    Na audiência, o CUR indicou, no entanto, que tinha determinado o nível‑alvo anual para o período de contribuição de 2021 da seguinte forma.

286    Primeiro, com base numa análise prospetiva, o CUR fixou o montante dos depósitos cobertos de todas as instituições autorizadas no território de todos os Estados‑Membros participantes, previsto até ao final do período inicial, em cerca de 7,5 biliões de euros. Para chegar a este montante, o CUR considerou o montante médio dos depósitos cobertos em 2020, a saber, 6,689 biliões de euros, uma taxa de crescimento anual dos depósitos cobertos de 4 %, bem como o número de períodos de contribuição restantes até ao final do período inicial, a saber, três.

287    Segundo, em conformidade com o artigo 69.o, n.o 1, do Regulamento n.o 806/2014, o CUR calculou 1 % desses 7,5 biliões de euros para obter o montante estimado do nível‑alvo final que devia ser atingido no final do período inicial, a saber, cerca de 75 mil milhões de euros.

288    Terceiro, o CUR deduziu deste último montante os recursos financeiros já disponíveis no FUR em 2021, ou seja, cerca de 42 mil milhões de euros, para obter o montante que faltava receber durante os períodos de contribuição restantes antes do final do período inicial, a saber, de 2021 a 2023. Este montante ascendia a cerca de 33 mil milhões de euros.

289    Quarto, o CUR dividiu este último montante por três para o repartir uniformemente entre os três referidos períodos de contribuição restantes. O nível‑alvo anual para o período de contribuição de 2021 foi assim fixado no montante mencionado no n.o 277, supra, ou seja, em cerca de 11,287 mil milhões de euros.

290    O CUR também afirmou, em sede de audiência, que tinha tornado públicos os elementos de informação nos quais se baseou o método descrito nos n.os 286 a 289, supra, e que teriam permitido à recorrente compreender o método pelo qual o nível‑alvo anual foi determinado. Em especial, esclareceu que tinha publicado no seu sítio Internet, em maio de 2021, ou seja, após a adoção da decisão impugnada mas antes da interposição do presente recurso, uma ficha descritiva denominada «Fact Sheet 2021» (a seguir «ficha descritiva») que indicava o montante estimado do nível‑alvo final. Da mesma forma, o CUR afirmou que o montante dos meios financeiros disponíveis no FUR também estava disponível no seu sítio Internet, bem como noutras fontes públicas, muito antes da adoção da decisão impugnada.

291    Para analisar se o CUR cumpriu o seu dever de fundamentação no que respeita à determinação do nível‑alvo anual, importa recordar, antes de mais, que a falta ou a insuficiência de fundamentação constitui um fundamento de ordem pública que pode, ou mesmo deve, ser conhecido oficiosamente pelo juiz da União (v. Acórdão de 2 de dezembro de 2009, Comissão/Irlanda e o., C‑89/08 P, EU:C:2009:742, n.o 34 e jurisprudência referida). Por conseguinte, o Tribunal Geral pode, ou mesmo deve, ter igualmente em conta outras faltas de fundamentação além das invocadas pela recorrente, nomeadamente quando estas se manifestem no decurso do processo.

292    Neste sentido, as partes foram ouvidas, durante a fase oral do processo, relativamente a todas as eventuais faltas de fundamentação de que estaria ferida a decisão impugnada no que respeita à determinação do nível‑alvo anual. Em especial, interrogado expressamente a este respeito, o CUR confirmou o método que tinha efetivamente seguido para determinar o nível‑alvo anual para o período de contribuição de 2021, conforme exposto nos n.os 286 a 289, supra.

293    No que diz respeito, em seguida, ao conteúdo do dever de fundamentação, resulta da jurisprudência que a fundamentação da decisão de uma instituição, órgão ou organismo da União tem uma importância especial, nos termos em que permite ao interessado decidir com pleno conhecimento de causa se pretende recorrer dessa decisão e permite ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização, constituindo assim uma das condições para a efetividade da fiscalização jurisdicional garantida pelo artigo 47.o da Carta (v. Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 103 e jurisprudência referida).

294    Essa fundamentação deve ser adaptada à natureza do ato em causa e ao contexto em que foi adotado. A este respeito, não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, uma vez que o caráter suficiente de uma fundamentação deve ser apreciado à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa e, em especial, do interesse que as pessoas envolvidas do ato podem ter em obter explicações. Por conseguinte, um ato lesivo está suficientemente fundamentado quando tiver sido praticado num contexto que seja do conhecimento do interessado, que lhe permita compreender o alcance da medida tomada a seu respeito (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 104 e jurisprudência referida).

295    Por outro lado, essa fundamentação não deve, nomeadamente, ter contradições para permitir aos interessados conhecer os motivos reais dessa decisão, com vista a defender os seus direitos perante o órgão jurisdicional competente e a este último exercer a sua fiscalização (v., neste sentido, Acórdãos de 10 de julho de 2008, Bertelsmann e Sony Corporation of America/Impala, C‑413/06 P, EU:C:2008:392, n.o 169 e jurisprudência referida; de 22 de setembro de 2005, Suproco/Comissão, T‑101/03, EU:T:2005:336, n.os 20 e 45 a 47, e de 16 de dezembro de 2015, Grécia/Comissão, T‑241/13, EU:T:2015:982, n.o 56).

296    Da mesma forma, quando o autor da decisão impugnada fornece determinadas explicações sobre os seus fundamentos no decurso do processo perante o juiz da União, essas explicações devem ser coerentes com as considerações expostas nessa decisão (v., neste sentido, Acórdãos de 22 de setembro de 2005, Suproco/Comissão, T‑101/03, EU:T:2005:336, n.os 45 a 47, e de 13 de dezembro de 2016, Printeos e o./Comissão, T‑95/15, EU:T:2016:722, n.os 54 e 55).

297    Com efeito, se as considerações expostas na decisão impugnada não forem coerentes com as explicações fornecidas durante o processo judicial, a fundamentação da decisão em causa não cumpre as funções recordadas nos n.os 293 e 294, supra. Em especial, tal incoerência impede, por um lado, os interessados de conhecerem os fundamentos reais da decisão impugnada, antes da interposição do recurso, e de prepararem a sua defesa a seu respeito, impedindo, por outro lado, o juiz da União de identificar os fundamentos que serviram de verdadeiro suporte jurídico a essa decisão e de examinar a sua conformidade com as regras aplicáveis.

298    Por último, há que lembrar que, quando o CUR adota uma decisão que fixa as contribuições ex ante, deve dar a conhecer às instituições envolvidas o método de cálculo dessas contribuições (v. Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 122).

299    O mesmo se aplica à metodologia utilizada para determinar o nível‑alvo anual, uma vez que esse montante reveste uma importância essencial para a economia de tal decisão. Com efeito, como resulta do artigo 4.o do Regulamento de Execução 2015/81, o modo de cálculo das contribuições ex ante consiste na repartição do referido montante entre todas as instituições envolvidas, pelo que um aumento ou uma redução desse montante implica o aumento ou a redução correspondente da contribuição ex ante de cada uma dessas instituições.

300    Resulta do exposto que, embora o CUR tenha de fornecer às instituições, através da decisão impugnada, explicações sobre o método de determinação do nível‑alvo anual, essas explicações devem ser coerentes com as explicações dadas pelo CUR durante o processo judicial no que se refere método efetivamente aplicado.

301    Ora, não é o que sucede no presente processo.

302    Com efeito, importa, antes de mais, referir que a decisão impugnada expôs, no considerando 48, uma fórmula matemática que apresentou como sendo a base para a determinação do nível‑alvo anual. Ora, verifica‑se que esta fórmula não integra os elementos do método efetivamente aplicado pelo CUR, conforme explicitado em sede de audiência. Com efeito, como resulta dos n.os 286 a 289, supra, de acordo com este método, o CUR obteve o montante do nível‑alvo anual deduzindo do nível‑alvo final os meios financeiros disponíveis no FUR, com o objetivo de calcular o montante ainda por cobrar até ao final do período inicial, e dividindo este último montante por três. Ora, estas duas etapas do cálculo não encontram expressão na referida fórmula matemática.

303    Por outro lado, esta conclusão não é posta em causa pela afirmação do CUR de que publicou, em maio de 2021, a ficha descritiva, a qual continha um intervalo que indicava os eventuais montantes do nível‑alvo final, e, no seu sítio Internet, o montante dos meios financeiros disponíveis no FUR. Com efeito, independentemente da questão de saber se a recorrente tinha efetivamente conhecimento destes montantes, estes não eram, por si só, suscetíveis de lhe permitir compreender que as duas operações mencionadas no n.o 302, supra, tinham sido efetivamente executadas pelo CUR, sendo que, além disso, a fórmula matemática prevista no considerando 48 da decisão impugnada nem sequer as mencionava.

304    Incoerências semelhantes também afetam a forma como foi fixado o coeficiente de 1,35 %, que desempenha, no entanto, um papel fundamental na fórmula matemática mencionada no n.o 303, supra. Com efeito, este coeficiente pode ser entendido no sentido de que se baseia, entre outros parâmetros, no crescimento previsto dos depósitos cobertos durante os restantes anos do período inicial. Ora, esse facto é incoerente com as explicações dadas pelo CUR na audiência, das quais resulta que este coeficiente foi fixado para poder justificar o resultado do cálculo do montante do nível‑alvo anual, ou seja, depois de o CUR ter calculado esse montante através da aplicação das quatro etapas referidas nos n.os 286 a 289, supra, e, nomeadamente, da divisão por três do montante resultante da dedução dos meios financeiros disponíveis no FUR do nível‑alvo final. Ora, este procedimento não resulta de modo nenhum da decisão impugnada.

305    Além disso, importa recordar que, segundo a ficha descritiva, o montante do nível‑alvo final estimado se situava num intervalo compreendido entre os 70 e os 75 mil milhões de euros. Ora, este intervalo não é coerente com o intervalo, situado entre 4 % a 7 %, da taxa de crescimento dos depósitos cobertos, estabelecido no considerando 41 da decisão impugnada. Com efeito, o CUR indicou na audiência que, para a determinação do nível‑alvo anual, teve em conta a taxa de crescimento dos depósitos cobertos de 4 % ‑ que era a taxa mais baixa do segundo intervalo ‑ e que obteve, assim, o nível‑alvo final estimado de 75 mil milhões de euros ‑ que constituía o valor mais elevado do primeiro intervalo. Verifica‑se, pois, que existe uma discrepância entre estes dois intervalos. Com efeito, por um lado, o intervalo relativo à taxa de evolução dos depósitos cobertos também inclui valores superiores à taxa de 4 %, cuja aplicação teria, no entanto, resultado num montante estimado do nível‑alvo final mais elevado do que os incluídos no intervalo para este nível‑alvo. Por outro lado, a recorrente entende que lhe é impossível compreender a razão pela qual o CUR incluiu montantes inferiores a 75 mil milhões de euros no intervalo relativo ao referido nível‑alvo. Com efeito, para o conseguir, teria sido necessário aplicar uma taxa inferior a 4 %, que, no entanto, não está incluída no intervalo relativo à taxa de crescimento dos depósitos cobertos. Nestas circunstâncias, a recorrente não conseguia determinar a forma como o CUR utilizou o intervalo relativo à taxa de evolução desses depósitos para chegar ao cálculo do nível‑alvo final estimado.

306    Daí resulta, no que respeita à determinação do nível‑alvo anual, que o método efetivamente aplicado pelo CUR, conforme explicitado na audiência, não corresponde ao descrito na decisão impugnada, pelo que os fundamentos reais, à luz dos quais foi fixado esse nível‑alvo, não podiam ser identificados com base na decisão impugnada, nem pelas instituições, nem pelo Tribunal Geral.

307    Tendo em conta o que precede, há que concluir que a decisão impugnada padece de vícios de fundamentação no que respeita à determinação do nível‑alvo anual.

308    A terceira parte do terceiro fundamento, sendo relativa à falta de fundamentação da decisão impugnada quanto à determinação do nível‑alvo anual, deve, assim, ser acolhida. No entanto, tendo em conta as implicações jurídicas e económicas do presente processo, é do interesse de uma boa administração da justiça prosseguir com a análise dos demais fundamentos do recurso.

2.      Quanto ao restante dos quarto e do quinto fundamentos, relativos à violação do princípio da boa administração e à violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva pelo CUR na decisão impugnada

309    Como resulta do n.o 269, supra, nos seus quarto e quinto fundamentos, a recorrente contesta igualmente a violação do princípio da boa administração e do princípio da tutela jurisdicional efetiva pela própria decisão impugnada.

310    A argumentação da recorrente é relativa, mais precisamente, à inexistência, na decisão impugnada, de dados relativos à fixação da «taxa de ajustamento dos depósitos cobertos» que servem para determinar o nível‑alvo anual, a saber, o coeficiente.

311    Como resulta da análise constante dos n.os 271 a 308, supra, o CUR violou o dever de fundamentação no que se refere à fixação do nível‑alvo anual.

312    Além disso, resulta do artigo 41.o, n.o 2, alínea c), da Carta e da jurisprudência referida no n.o 246, supra, que a fundamentação da decisão de um órgão da União constitui uma das condições da efetividade dos princípios da boa administração e da tutela jurisdicional efetiva.

313    Daqui resulta que a violação do dever de fundamentação da decisão impugnada no que respeita à determinação do nível‑alvo anual constitui igualmente uma violação do princípio da boa administração e do princípio da tutela jurisdicional efetiva.

314    Por conseguinte, há que julgar procedentes o quarto e o quinto fundamentos, dado que têm por objeto a violação dos princípios da boa administração e da tutela jurisdicional efetiva em razão da violação do dever de fundamentação.

3.      Quanto aos sétimo e ao oitavo fundamentos, relativos a erros manifestos de apreciação e ao erro de direito resultante das limitações impostas ao recurso aos CIP

315    No sétimo fundamento, a recorrente alega que o CUR cometeu vários erros manifestos de apreciação quando avaliou o nível de recurso aos CIP e as garantias a aceitar em contrapartida.

316    No oitavo fundamento, a recorrente alega que o CUR violou o artigo 70.o, n.o 3, do Regulamento n.o 806/2014 e o artigo 103.o, n.o 3, da Diretiva 2014/59 ao fixar o nível de recurso aos CIP e as garantias a aceitar em contrapartida.

317    O CUR contesta esta argumentação.

318    A título preliminar, importa recordar que as contribuições ex ante podem ser pagas, quer através de pagamento imediato em numerário, quer através de um CIP, em conformidade com o artigo 70.o, n.o 3, do Regulamento n.o 806/2014. Em caso de utilização de um CIP, a instituição celebra com o CUR um acordo através do qual se compromete a pagar a soma correspondente, como parte da contribuição ex ante, à primeira solicitação.

319    A esse respeito, importa precisar que, na decisão impugnada, o CUR limitou o recurso aos CIP a 15 % do montante das contribuições ex ante devidas relativamente ao período de contribuição de 2021 e as garantias apresentadas relativamente aos CIP apenas ao numerário.

320    Além disso, há que lembrar que o artigo 70.o, n.o 3, do Regulamento n.o 806/2014 prevê que os meios financeiros disponíveis a tomar em consideração para efeitos do nível‑alvo final podem incluir CIP integralmente cobertos por garantias de ativos com baixo nível de risco não expostos a direitos de terceiros, de livre cessão e reservados para utilização exclusiva pelas autoridades de resolução, sendo que a proporção dos CIP não pode exceder 30 % do montante total das contribuições ex ante em cada ano. Esta possibilidade está igualmente prevista no artigo 103.o, n.o 3, da Diretiva 2014/59.

321    Segundo o artigo 13.o, n.o 3, do Regulamento Delegado 2015/63, cabe ao CUR especificar, na decisão respeitante às contribuições ex ante relativas a um determinado período de contribuição, a proporção dos CIP que cada instituição pode utilizar, uma vez que o CUR só aceitará garantias do tipo e mediante condições que permitam a rápida possibilidade de liquidação nos casos em que uma decisão de resolução seja tomada durante o fim de semana.

322    Quando o CUR define a proporção desses CIP, deve assegurar, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento de Execução 2015/81, que o recurso aos CIP não afeta de forma alguma a capacidade financeira ou a liquidez do FUR.

323    Por último, o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento de Execução 2015/81 refere que, durante o período inicial, em circunstâncias normais, o CUR deve permitir a utilização dos CIP a pedido de uma instituição e reparte a sua utilização equitativamente entre as instituições requerentes. Esta disposição precisa igualmente que os CIP afetados não devem ser inferiores a 15 % das obrigações de pagamento totais da instituição e que, ao calcular as contribuições anuais de cada instituição, o CUR assegura que, num determinado ano, a soma dos referidos CIP não é superior a 30 % do montante total dessas contribuições.

324    Resulta das disposições acima mencionadas, por um lado, que a taxa específica dos CIP concedidos a uma instituição que os solicita ascende, no mínimo, a 15 % do total das suas obrigações de pagamento e, por outro, que a soma do conjunto dos CIP autorizados não deve ultrapassar o limite máximo de 30 % do total das contribuições ex ante para a totalidade de um determinado período de contribuição. Este último limite máximo fixado pelo legislador da União visa, como confirma o artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento de Execução 2015/81, não pôr em perigo a liquidez e a capacidade operacional do FUR.

325    Cabe, assim, ao CUR fixar especificamente a proporção dos CIP concedidos à instituição que os solicita, não podendo essa proporção ser inferior a 15 % do total das suas obrigações de pagamento, ao mesmo tempo que garante que o limite máximo referido no n.o 324, supra, relativo à soma de todos os CIP autorizados, não seja excedido. Além disso, embora essas disposições não contenham indicações precisas quanto à natureza das garantias a aceitar, não é menos verdade que o CUR só pode aceitar CIP se estes estiverem garantidos por ativos de baixo risco não onerados com direitos de terceiros e se as condições que lhe estão associadas permitirem a sua rápida libertação.

326    A determinação da proporção exata dos CIP concedida à instituição que os solicita e da natureza das garantias aceitáveis implica, assim, avaliações complexas de ordem económica e técnica, pelo que a fiscalização do juiz da União se deve limitar a examinar se o exercício do poder de apreciação concedido ao CUR não enferma de erro manifesto ou desvio de poder, ou se o CUR não ultrapassou manifestamente os limites desse poder.

327    É à luz destas considerações que importa examinar os argumentos da recorrente.

328    Em primeiro lugar, quanto à limitação do recurso aos CIP a 15 % do montante das contribuições ex ante, a recorrente considera que essa limitação é contrária ao espírito, ao contexto e aos objetivos do artigo 70.o, n.o 3, do Regulamento n.o 806/2014, dado que o CUR não procurou oferecer plenamente às instituições a possibilidade de utilizarem CIP além desse limiar de 15 %.

329    A este respeito, como já foi referido no n.o 320, supra, o artigo 70.o, n.o 3, do Regulamento n.o 806/2014 especifica que a proporção dos CIP não pode exceder o limiar de 30 % do montante total de todas as contribuições ex ante pagas anualmente. Em contrapartida, esta disposição não prevê que o CUR deva fixar a proporção dos CIP em 30 % do total das obrigações de pagamento da instituição que os solicita.

330    Além disso, a determinação, pelo CUR, da proporção dos CIP concedida às instituições que os solicitam deve basear‑se numa apreciação concreta da situação dessas instituições e do FUR, devendo o CUR garantir também que o recurso aos CIP não compromete, de nenhum modo, a capacidade financeira ou a liquidez do FUR, em conformidade com o considerando 16 e o artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento de Execução 2015/81.

331    Ora, como resulta, nomeadamente, do considerando 150 da decisão impugnada, o CUR decidiu não fixar a proporção dos CIP a um nível superior a 15 % do montante das contribuições ex ante com base num exame concreto de todas as circunstâncias que considerou relevantes, nomeadamente as relacionadas com a pandemia de COVID‑19, bem como nas consequências a longo prazo que o pedido de um montante mais elevado dos CIP teria na situação das instituições.

332    Nestas circunstâncias, a recorrente não pode alegar que a limitação do recurso aos CIP a 15 % do total das obrigações de pagamento da instituição que os solicita é contrária ao artigo 70.o, n.o 3, do Regulamento n.o 806/2014.

333    Em segundo lugar, a recorrente alega, no que se refere ao requisito imposto pelo CUR segundo o qual as garantias dos CIP devem ser constituídas por numerário, que, nem o artigo 103.o, n.o 3, da Diretiva 2014/59, nem o artigo 70.o, n.o 3, do Regulamento n.o 806/2014, deixam à discrição do CUR a escolha para definir o tipo de garantia que as instituições podem prestar. O CUR ultrapassa, portanto, as prescrições legais que enquadram as suas competências ao impor, por princípio e de forma quase regulamentar, esse tipo de garantia.

334    A esse respeito, como foi observado no n.o 326, supra, resulta das disposições acima mencionadas nos n.os 320 a 323 que o CUR dispõe de poder de apreciação no que se refere às modalidades de recurso aos CIP e à natureza das garantias a aceitar em contrapartida destes últimos.

335    É certo que esse poder está enquadrado pelo requisito de que essas garantias devem ser ativos de baixo risco não onerados com direitos de terceiros, reservados à utilização exclusiva pelo CUR, que não comprometem de forma nenhuma a capacidade financeira ou a liquidez do FUR.

336    No entanto, a recorrente não apresentou ao Tribunal Geral nenhum elemento suscetível de demonstrar que outro tipo de ativos apresentaria garantias comparáveis ao numerário, no que se refere a esses requisitos.

337    Nestas circunstâncias, a recorrente não pode alegar que o CUR violou o artigo 103.o, n.o 3, da Diretiva 2014/59 e o artigo 70.o, n.o 3, do Regulamento n.o 806/2014 ao definir o tipo de garantia que as instituições devem prestar relativamente aos CIP.

338    Esta conclusão não é posta em causa pelo facto de o CUR ter justificado esse requisito fazendo referência, no considerando 152 da decisão impugnada, aos CIP já contratados nos períodos de contribuição anteriores, não tendo essa circunstância impacto no alegado erro de direito.

339    Em terceiro lugar, a recorrente alega que o enquadramento do recurso aos CIP é opaco, uma vez que o CUR recusou o pedido de certas instituições para que lhes fosse comunicada ou fosse publicada a sua Decisão SRB/ES/2020/71, de 16 de dezembro de 2020, que fixa a política para o período de contribuição de 2021 relativamente aos CIP (a seguir «decisão que fixa a política CIP»).

340    A este respeito, a recorrente não forneceu explicações suficientes sobre a influência desta circunstância na análise do erro de direito invocado no âmbito dos presentes fundamentos.

341    Além disso, uma vez que a presente alegação deve ser entendida no sentido de que, através dela, a recorrente põe em causa a suficiência da fundamentação da decisão impugnada, importa salientar que esta alegação e o sexto fundamento, relativo à falta de fundamentação da decisão impugnada no que respeita aos CIP, se sobrepõem. Ora, na audiência, a recorrente desistiu deste fundamento, subentendendo‑se assim que já não contesta a fundamentação da decisão impugnada no que respeita ao recurso aos CIP.

342    Em todo o caso, em resposta a uma diligência de instrução ordenada pelo Tribunal Geral de 9 de novembro de 2022, o CUR apresentou as decisões intermédias que eram relevantes para o cálculo das contribuições ex ante para o período de contribuição de 2021. Estas decisões, que foram em seguida notificadas à recorrente na sua versão não confidencial, incluem, nomeadamente, a decisão que fixa a política CIP. Além disso, a própria decisão impugnada apresenta uma fundamentação relativa aos CIP, nos seus considerandos 145 a 155.

343    Por outro lado, a recorrente não identificou nenhum elemento constante da decisão que fixa a política CIP que não tivesse sido reproduzido na própria decisão impugnada.

344    Por conseguinte, nada indica que a não publicação da decisão que fixa a política CIP tenha tido qualquer impacto sobre a extensão das informações de que a recorrente dispunha para poder verificar a legalidade do recurso aos CIP.

345    Em quarto lugar, a recorrente alega que o CUR cometeu erros manifestos de apreciação no que se refere aos riscos de liquidez e de pró‑ciclicidade que resultariam do recurso aos CIP acima de 15 % das contribuições ex ante. Com efeito, contrariamente à apreciação do CUR, o recurso aos CIP estava previsto para atenuar os efeitos pró‑cíclicos que as contribuições ex ante poderiam gerar devido ao seu montante. Assim, à luz do contexto macroeconómico do ano de 2020, um maior recurso aos CIP teria permitido contrabalançar o aumento dessas contribuições devido ao aumento dos depósitos das instituições.

346    A este respeito, é verdade que, embora o CUR fixe a percentagem dos CIP de cada instituição que os solicite a um nível superior a 15 % do total das suas obrigações de pagamento, esse nível pode apresentar uma redução a curto prazo para as instituições envolvidas, como alega a recorrente, dado que reduz a proporção das suas contribuições ex ante a ser pagas imediatamente em numerário.

347    No entanto, como refere em substância o CUR, sem que seja contestado neste ponto, um nível superior a 15 % pode ter efeitos pró‑cíclicos na posição das instituições a longo prazo. Com efeito, o artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento de Execução 2015/81 prevê que, quando uma medida de resolução envolver o FUR nos termos do artigo 76.o do Regulamento n.o 806/2014, uma parte ou a totalidade dos CIP são acionados pelo CUR para que os montantes correspondentes sejam pagos ao FUR. Daqui decorre que, em tal situação, as instituições que recorreram aos CIP devem mobilizar estes últimos e pagar os montantes correspondentes, o que implica um risco de prejuízos significativos para as mesmas, o qual seria ainda superior se a percentagem dos CIP fosse fixada a um nível elevado.

348    Isto é tanto mais verdade quanto o facto de a decisão impugnada ter sido adotada em circunstâncias especiais, marcadas pela incerteza económica ligada à pandemia de COVID‑19. Neste contexto, os efeitos provocados por uma eventual mobilização dos CIP na posição das instituições poderiam ter sido ainda agravados, como refere, em substância, o CUR nos considerandos 150, 152 e 153 da decisão impugnada.

349    Nestas circunstâncias, o CUR podia considerar que um nível mais elevado de CIP poderia ter efeitos pró‑cíclicos a longo prazo em relação às instituições, aumentando os seus prejuízos na sequência do pagamento dos montantes correspondentes aos CIP no âmbito de uma eventual medida de resolução.

350    Por conseguinte, a recorrente não demonstrou que o CUR cometeu um erro manifesto de apreciação ou um desvio de poder ou que ultrapassou manifestamente os limites do seu poder de apreciação ao fixar a proporção dos CIP em 15 % do montante das contribuições ex ante para o período de contribuição de 2021.

351    Esta conclusão não é posta em causa pelos acórdãos mencionados pela recorrente, a saber, os Acórdãos de 9 de setembro de 2020, Société générale/BCE (T‑143/18, não publicado, EU:T:2020:389), de 9 de setembro de 2020, Crédit agricole e o./BCE (T‑144/18, não publicado, EU:T:2020:390), de 9 de setembro de 2020, Confédération nationale du Crédit mutuel e o./BCE (T‑145/18, não publicado, EU:T:2020:391), de 9 de setembro de 2020, BPCE e o./BCE (T‑146/18, não publicado, EU:T:2020:392), de 9 de setembro de 2020, Arkéa Direct Bank e o./BCE (T‑149/18, não publicado, EU:T:2020:393), e de 9 de setembro de 2020, BNP Paribas/BCE (T‑150/18 e T‑345/18, EU:T:2020:394). Estes acórdãos dizem respeito a decisões do BCE em que este último impôs que os montantes cumulados dos CIP subscritos em relação ao FUR ou aos SGD fossem deduzidos dos fundos próprios. Nesses acórdãos, o juiz da União não se pronunciou sobre a determinação, pelo CUR, do nível de recurso aos CIP nem sobre as garantias a aceitar em contrapartida.

352    Em quinto lugar, a recorrente alega que o CUR não explicou em que medida existia um risco de liquidez no caso de garantias constituídas exclusivamente em numerário e expressas em euros. A este respeito, o modelo de acordo relativo aos CIP prevê um mecanismo que assegura a boa liquidez do FUR, uma vez que estipula, por um lado, a possibilidade de o CUR apreender, em curto prazo, numerário correspondente aos CIP prestado a título de garantia e, por outro, a propriedade plena do CUR desse numerário, bem como a possibilidade de este último dispor livremente do mesmo em caso de não pagamento pela instituição em causa.

353    Uma vez que a presente alegação também deve ser entendida no sentido de que, através dela, a recorrente põe em causa a suficiência da fundamentação da decisão impugnada no que respeita ao risco de liquidez no caso de garantias constituídas exclusivamente em numerário e expressas em euros, importa salientar que esta alegação e o sexto fundamento, relativo à falta de fundamentação da decisão impugnada no que respeita aos CIP, se sobrepõem. Ora, como foi referido no n.o 341, supra, na audiência, a recorrente retirou este fundamento.

354    Por outro lado, se a argumentação da recorrente relativa a essa alegação dever ser entendida no sentido de que esta alega que o CUR cometeu um erro manifesto de apreciação quando limitou a parte dos CIP a 15 % do montante das contribuições ex ante, apesar de essas garantias serem constituídas exclusivamente em numerário e não apresentarem, portanto, um risco de liquidez à luz do modelo de acordo relativo aos CIP, importa referir o seguinte.

355    Por um lado, embora esteja assente que as garantias relativas aos CIP constituídas exclusivamente em numerário são ativos de baixo risco devido à possibilidade de as liquidar a curto prazo, essa circunstância não põe em causa as considerações acima enunciadas nos n.os 347 a 349, segundo as quais o CUR podia considerar, nas circunstâncias específicas que marcam o período em causa e sem cometer um erro manifesto de apreciação, que uma taxa de CIP superior a 15 % do montante das contribuições ex ante poderia ter efeitos pró‑cíclicos a longo prazo para as instituições.

356    Por outro lado, a recorrente baseia‑se erradamente no modelo de acordo relativo aos CIP para alegar que o CUR deveria ter autorizado uma proporção mais elevada dos CIP do que 15 % pelo facto de esse modelo estipular que o CUR tem a propriedade plena do numerário transferido, pelo que esse numerário constitui um ativo de baixo risco.

357    É certo que no seu artigo 3.1., o modelo de acordo relativo aos CIP prevê que, para garantir o pagamento integral e pontual das obrigações garantidas, a instituição constitui uma garantia em numerário a favor do CUR e transfere para este a propriedade plena de um montante em numerário igual ao montante dos CIP e, no seu artigo 3.5., que o CUR tem a propriedade plena do numerário transferido e tem o direito de o utilizar livremente, sem prejuízo da obrigação de restituir o montante correspondente da garantia em numerário em caso de pagamento, na data do seu vencimento, das obrigações garantidas.

358    No entanto, os artigos 2.o, 5.o e 6.o do modelo de acordo relativo aos CIP estabelecem o procedimento através do qual o CUR exige o pagamento do CIP, bem como as consequências para a instituição em causa.

359    Nos artigos 2.1. e 2.2. do modelo de acordo relativo aos CIP, prevê‑se que o CUR envie à instituição um aviso solicitando o pagamento do CIP. O artigo 5.o do mesmo modelo de acordo estipula que, a partir da receção do pagamento solicitado, o CUR restituirá um montante de garantia em numerário igual ao montante do pagamento solicitado e pago. O artigo 6.o do modelo de acordo relativo aos CIP estipula, nomeadamente, que, em caso de não pagamento à primeira solicitação por parte da instituição, o CUR tem o direito de declarar a perda da garantia em numerário para liquidar as obrigações garantidas, e pode, nomeadamente, para o efeito, proceder a uma compensação entre o montante das obrigações garantidas não pagas e a sua obrigação de reembolsar a garantia em numerário.

360    Resulta da análise das disposições do modelo de acordo sobre os CIP que, mesmo que o CUR tenha a propriedade plena do numerário que garante os CIP, só o pode mobilizar, a favor do FUR, seguindo um procedimento específico.

361    Nestas circunstâncias, o CUR podia considerar, em conformidade com o artigo 7.o, n.o 1, do Regulamento de Execução 2015/81, que esses CIP não apresentam o mesmo grau de garantia, no que respeita à capacidade financeira e à liquidez do FUR, que um pagamento imediato em numerário.

362    Em sexto lugar, embora a recorrente alegue que o CUR não evocou a possibilidade de recorrer a outros tipos de ativos além do numerário, que, ainda assim, poderiam ser considerados de baixo risco e não onerados com direitos de terceiros, não referiu com precisão que outro tipo de ativos apresentaria garantias comparáveis ao numerário que não comprometessem a capacidade financeira ou a liquidez do FUR, pelo que este argumento deve ser rejeitado.

363    Nestas circunstâncias, a recorrente não demonstrou que o CUR cometeu erros manifestos de apreciação ou um erro de direito quando limitou o recurso aos CIP a 15 % do montante das contribuições ex ante devidas para o período de contribuição de 2021 e limitou as garantias apresentadas a título dos CIP apenas ao numerário.

364    Por conseguinte, há que julgar improcedentes o sétimo e oitavo fundamentos.

D.      Conclusão

365    Tendo em conta a procedência da terceira parte do terceiro fundamento e dos quarto e quinto fundamentos, que se dirigem diretamente contra a decisão impugnada, há que anular a decisão impugnada, na parte em que diz respeito à recorrente.

E.      Quanto à limitação no tempo dos efeitos do acórdão

366    O CUR pede ao Tribunal Geral que, em caso de anulação da decisão impugnada, mantenha os seus efeitos até à sua substituição ou, pelo menos, durante um período de seis meses a contar da data em que o acórdão transite em julgado.

367    A recorrente salientou na audiência que uma eventual anulação da decisão impugnada por ilegalidade quanto ao mérito deveria levar o CUR a restituir‑lhe o montante da sua contribuição ex ante. Além disso, tal anulação não teria impacto no funcionamento do CUR nem na estabilidade financeira da União, uma vez que o FUR está muito avançado na sua constituição.

368    Importa recordar que, nos termos do artigo 264.o, segundo parágrafo, TFUE, o juiz da União pode indicar, quando o considerar necessário, quais os efeitos do ato anulado que se devem considerar subsistentes.

369    A este respeito, resulta da jurisprudência que, por motivos relacionados com a segurança jurídica, os efeitos desse ato podem ser mantidos, nomeadamente, quando os efeitos imediatos da sua anulação originarem consequências negativas graves e a legalidade do ato impugnado não for contestada devido à sua finalidade ou ao seu conteúdo, mas por motivos de violação de formalidades essenciais (v. Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR, C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 175 e jurisprudência referida).

370    No caso em apreço, a decisão impugnada foi adotada com violação de formalidades essenciais. Em contrapartida, o Tribunal Geral não constatou, no presente processo, nenhum erro que afete a legalidade dessa decisão quanto ao mérito.

371    Além disso, à semelhança do que o Tribunal de Justiça declarou no Acórdão de 15 de julho de 2021, Comissão/Landesbank Baden‑Württemberg e CUR (C‑584/20 P e C‑621/20 P, EU:C:2021:601, n.o 177), importa declarar que anular a decisão impugnada sem prever a manutenção dos seus efeitos até à sua substituição por um novo ato seria suscetível de prejudicar a aplicação da Diretiva 2014/59, do Regulamento n.o 806/2014 e do Regulamento Delegado 2015/63, que constituem uma parte essencial da União Bancária, que contribui para a estabilidade da zona euro.

372    Nestas circunstâncias, os efeitos da decisão impugnada devem ser mantidos, no que diz respeito à recorrente, até à entrada em vigor, num prazo razoável que não deverá exceder seis meses a contar da data da prolação do presente acórdão, de uma nova decisão do CUR que fixe a contribuição ex ante da recorrente para o FUR para o período de contribuição de 2021.

 Quanto às despesas

373    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o CUR sido vencido, há que condená‑lo nas suas próprias despesas e nas despesas da recorrente, em conformidade com o pedido por esta deduzido.

374    Em conformidade com o artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, o Parlamento, o Conselho e a Comissão suportarão as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Oitava Secção Alargada),

decide:

1)      É anulada a Decisão SRB/ES/2021/22 do Conselho Único de Resolução (CUR), de 14 de abril de 2021, relativa ao cálculo das contribuições ex ante de 2021 para o Fundo Único de Resolução, na parte em que diz respeito à La Banque postale.

2)      Os efeitos da Decisão SRB/ES/2021/22, na parte em que diz respeito à La Banque postale, são mantidos até à entrada em vigor, num prazo razoável que não deverá exceder seis meses a contar da data da prolação do presente acórdão, de uma nova decisão do CUR que fixe a contribuição ex ante dessa instituição para o Fundo Único de Resolução para o período de contribuição de 2021.

3)      O CUR suportará, além das suas próprias despesas, as despesas da La Banque postale.

4)      O Parlamento Europeu, o Conselho da União Europeia e a Comissão Europeia suportarão as suas próprias despesas.

Kornezov

De Baere

Petrlík

Kecsmár

 

Kingston

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 20 de dezembro de 2023.

O Secretário

 

O Presidente

T. Henze


Índice


I. Antecedentes do litígio

II. Decisão impugnada

III. Pedidos das partes

IV. Questão de direito

A. Quanto aos fundamentos de inadmissibilidade

B. Quanto às exceções de ilegalidade do Regulamento n.o 806/2014, do Regulamento Delegado 2015/63 e do Regulamento de Execução 2015/81

1. Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento

a) Quanto à primeira e segunda partes, relativas à não tomada em consideração das diferenças de situação entre as instituições da União Bancária e ao caráter injustificado da exclusão dos depósitos cobertos da base de cálculo da contribuição anual de base

1) Quanto à primeira alegação da primeira parte, relativa à não tomada em consideração das diferenças de situação entre os setores bancários dos EstadosMembros participantes, e quanto à segunda parte, relativa ao caráter injustificado da exclusão dos depósitos cobertos da base de cálculo da contribuição anual de base

2) Quanto à segunda alegação da primeira parte, relativa à incoerência ligada à não tomada em consideração dos critérios de avaliação utilizados no âmbito do MUS

b) Quanto à terceira parte, relativa ao caráter injustificado da não dedução dos passivos elegíveis que cumprem os requisitos prudenciais no âmbito do MELR

c) Quanto à quarta parte, relativa ao facto de as contribuições ex ante não serem representativas do risco realmente suportado em razão dos critérios de cálculo do coeficiente de ajustamento

1) Quanto à primeira alegação, relativa à não tomada em consideração do perfil de risco global intrínseco de cada instituição

2) Quanto à segunda alegação, relativa à não apreciação dos fatores de risco à luz dos requisitos impostos pela autoridade de supervisão no âmbito do MUS

3) Quanto à terceira alegação, relativa à impossibilidade de ter globalmente em conta as especificidades individuais de cada instituição

2. Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade

3. Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação do princípio da segurança jurídica

a) Quanto à primeira parte, relativa à impossibilidade de conhecer antecipadamente o nível da contribuição ex ante

b) Quanto à segunda parte, relativa à falta de previsibilidade quanto à aplicação de certos indicadores de risco

c) Quanto à terceira parte, relativa às modalidades de determinação da «taxa de crescimento dos depósitos cobertos»

d) Quanto à quarta parte, relativa à violação do artigo 290.o TFUE pelos critérios de cálculo definidos pelo Regulamento Delegado 2015/63

4. Quanto aos quarto e quinto fundamentos, relativos à violação do princípio da boa administração e à violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva, na medida em que configuram uma exceção de ilegalidade

C. Quanto aos fundamentos relativos à legalidade da decisão impugnada

1. Quanto à fundamentação da determinação do nívelalvo anual

2. Quanto ao restante dos quarto e do quinto fundamentos, relativos à violação do princípio da boa administração e à violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva pelo CUR na decisão impugnada

3. Quanto aos sétimo e ao oitavo fundamentos, relativos a erros manifestos de apreciação e ao erro de direito resultante das limitações impostas ao recurso aos CIP

D. Conclusão

E. Quanto à limitação no tempo dos efeitos do acórdão

Quanto às despesas



*      Língua do processo: francês.