ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção
Alargada)
14 de Maio de 1998 (1)
«Concorrência Artigo 85.°, n.° 1, do Tratado CE Imputabilidade do
comportamento ilícito Coima Fundamentação»
No processo T-309/94,
NV Koninklijke KNP BT, sociedade de direito neerlandês, com sede em
Amesterdão, representada por Tom R. Ottervanger e Francis Herbert, advogados
no foro de Bruxelas, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório do
advogado Carlos Zeyen, 56-58, rue Charles Martel,
contra
Comissão das Comunidades Europeias, representada por Richard Lyal e Wouter
Wils, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio
escolhido no Luxemburgo no gabinete de Carlos Gómez de la Cruz, membro do
Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,
que tem por objecto um pedido de anulação da Decisão 94/601/CE da Comissão,
de 13 de Julho de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do
Tratado CE (IV/C/33.833 Cartão) (JO L 243, p. 1),
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção Alargada),
composto por: B. Vesterdorf, presidente, C. P. Briët, P. Lindh, A. Potocki e J. D.
Cooke, juízes,
secretário: J. Palacio González, administrador,
vistos os autos e após a audiência que teve lugar entre 25 de Junho e 8 de Julho
de 1997,
profere o presente
Acórdão
Factos na origem do litígio
- 1.
- O presente processo tem por objecto a Decisão 94/601/CE da Comissão, de 13 de
Julho de 1994, relativa a um processo de aplicação do artigo 85.° do Tratado CE
(IV/C/33.833 Cartão) (JO L 243, p. 1), rectificada, antes da sua publicação, por
uma decisão da Comissão de 26 de Julho de 1994 [C(94) 2135 final] (a seguir
«decisão»). A decisão aplicou coimas a dezanove produtores fornecedores de
cartão na Comunidade, com fundamento em violações do artigo 85.°, n.° 1, do
Tratado.
- 2.
- Por carta de 22 de Novembro de 1990, a British Printing Industries Federation,
organização profissional que representa a maioria dos impressores de cartão do
Reino Unido (a seguir «BPIF»), apresentou uma denúncia informal à Comissão.
Alegou que os produtores de cartão que fornecem o Reino Unido haviam
introduzido uma série de aumentos de preços simultâneos e uniformes e solicitou
que a Comissão investigasse a eventual existência de uma infracção às regras
comunitárias da concorrência. Por forma a garantir que seria dada publicidade à
sua iniciativa, a BPIF emitiu um comunicado de imprensa. O conteúdo desse
comunicado foi apresentado pela imprensa profissional especializada no decurso
do mês de Dezembro de 1990.
- 3.
- Em 12 de Dezembro de 1990, a Fédération française du cartonnage apresentou
igualmente uma denúncia informal à Comissão, na qual apresentou alegações
relativamente ao mercado francês do cartão, em termos semelhantes aos utilizados
na denúncia da BPIF.
- 4.
- Em 23 e 24 de Abril de 1991, agentes da Comissão, actuando ao abrigo do n.° 3
do artigo 14.° do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962,
Primeiro Regulamento de aplicação dos artigos 85.° e 86.° do Tratado (JO 1962,
13, p. 204; EE 08 F1 p. 22, a seguir «Regulamento n.° 17»), efectuaram
investigações simultâneas sem aviso prévio nas instalações de diversas empresas e
associações comerciais do sector do cartão.
- 5.
- Na sequência dessas investigações, a Comissão pediu informações e documentos
a todos os destinatários da decisão, em aplicação do artigo 11.° do Regulamento
n.° 17.
- 6.
- Os elementos obtidos no âmbito destas investigações e pedidos de informações e
de documentos levaram a Comissão a concluir que as empresas em causa tinham
participado, entre meados de 1986 e Abril de 1991, pelo menos (na maior parte
dos casos), numa infracção ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado.
- 7.
- Em consequência, decidiu dar início a um procedimento em aplicação desta última
disposição. Por carta de 21 de Dezembro de 1992, enviou uma comunicação de
acusações a cada uma das empresas em causa. Todas as empresas destinatárias
responderam por escrito. Nove das empresas pediram para ser ouvidas. A sua
audição teve lugar entre 7 e 9 de Junho de 1993.
- 8.
- No termo do procedimento, a Comissão adoptou a decisão, que inclui as seguintes
disposições:
«Artigo 1.°
As empresas Buchmann GmbH, Cascades SA, Enso-Gutzeit Oy, Europa Carton
AG, Finnboard-the Finnish Board Mills Association, Fiskeby Board AB, Gruber &
Weber GmbH & Co KG, Kartonfabriek 'de Eendracht NV (com denominação
comercial 'BPB de Eendracht), NV Koninklijke KNP BT NV (anteriormente
Koninklijke Nederlandse Papierfabrieken NV), Laakmann Karton GmbH & Co
KG, Mo Och Domsjö AB (MoDo), Mayr-Melnhof Gesellschaft mbH, Papeteries
de Lancey SA, Rena Kartonfabrik A/S, Sarrió SpA, SCA Holding Ltd
[anteriormente Reed Paper & Board (UK) Ltd], Stora Kopparbergs Bergslags AB,
Enso Española SA (anteriormente Tampella Española SA) e Moritz J. Weig
GmbH & Co KG infringiram o disposto no n.° 1 do artigo 85.° do Tratado CE ao
participarem,
no caso da Buchmann e da Rena desde, aproximadamente, Março de 1988
até, pelo menos, final de 1990,
no caso da Enso Española desde, pelo menos, Março de 1988 até, pelo
menos, final de Abril de 1991,
no caso da Gruber & Weber desde, pelos menos, 1988 até finais de 1990,
noutros casos, a partir de meados de 1986 até, pelo menos, Abril de 1991,
num acordo e prática concertada com início em meados de 1986, através da qual
os fornecedores de cartão na Comunidade:
se reuniram regularmente numa série de reuniões secretas e
institucionalizadas para debater e acordar um plano comum do sector
destinado a restringir a concorrência,
acordaram aumentos de preços regulares para cada qualidade do produto
em cada moeda nacional,
planearam e aplicaram aumentos de preços simultâneos e uniformes em
toda a Comunidade,
chegaram a um acordo quanto à manutenção das quotas de mercado dos
principais produtores a níveis constantes, sujeitas a modificações ocasionais,
adoptaram, principalmente a partir do início de 1990, medidas concertadas
por forma a controlar o fornecimento do produto na Comunidade e a
assegurar a aplicação dos referidos aumentos concertados de preços,
procederam ao intercâmbio de informações comerciais sobre os
fornecimentos, preços, suspensões de actividade, cadernos de encomendas
e taxas de utilização das máquinas em apoio às medidas supracitadas.
...
Artigo 3.°
São aplicadas as seguintes coimas às empresas a seguir designadas relativamente
à infracção referida no artigo 1.°:
...
ix) NV Koninklijke KNP BT NV, coima de 3 000 000 ecus;
...»
- 9.
- Nos termos da decisão, a infracção foi praticada no âmbito de um organismo
denominado «Product Group Paperboard» (Grupo de estudos do produto cartão,
a seguir «PG Paperboard»), composto por diversos grupos ou comités.
- 10.
- Em meados de 1986, foi criado, no âmbito deste organismo, um «Presidents
Working Group» (grupo de trabalho dos presidentes, a seguir «PWG»), de que
fazem parte representantes de alto nível dos principais produtores de cartão da
Comunidade (cerca de oito).
- 11.
- O PWG tinha nomeadamente como actividades a discussão e a concertação sobre
os mercados, as quotas de mercado, os preços e a utilização das capacidades. Em
especial, adoptou decisões gerais relativamente ao calendário e ao nível dos
aumentos de preços a pôr em prática pelos fabricantes.
- 12.
- O PWG apresentava relatórios à «President Conference» (a seguir «PC» ou
«conferência de presidentes»), na qual participava (mais ou menos regularmente)
a quase totalidade dos directores executivos das empresas envolvidas. A PC
reuniu-se duas vezes por ano durante o período em causa.
- 13.
- No fim do ano de 1987, foi criado o «Joint Marketing Committee» (comité
conjunto de marketing, a seguir «JMC»). A sua principal atribuição consistia, por
um lado, em determinar se os aumentos de preços podiam entrar em vigor e, em
caso afirmativo, de que modo e, por outro, em fixar as modalidades de aplicação
das iniciativas em matéria de preços decididas pelo PWG relativamente a cada país
e aos principais clientes, com o objectivo de atingir um sistema de preços
equivalente na Europa.
- 14.
- Finalmente, o Comité Económico (a seguir «COE») debatia sobre matérias como
as flutuações de preços nos mercados nacionais e os cadernos de encomendas e
apresentava as suas conclusões ao JMC ou, até finais de 1987, ao predecessor do
JMC, o Marketing Committee. O COE era composto pelos directores comerciais
da maior parte das empresas em causa e reunia-se várias vezes por ano.
- 15.
- Além disso, resulta da decisão que a Comissão considerou que as actividades do
PG Paperboard eram apoiadas por um intercâmbio de informações por intermédio
da sociedade de auditores Fides, com sede em Zurique (Suíça). Segundo a decisão,
a maior parte dos membros do PG Paperboard fornecia à Fides relatórios
periódicos sobre as encomendas, a produção, as vendas e a utilização das
capacidades. Estes relatórios eram tratados no quadro do sistema Fides e os dados
resultantes eram enviados aos participantes.
- 16.
- A recorrente NV Koninklijke KNP BT (a seguir «KNP») controlou a KNP
Vouwkarton BV Eerbeek (a seguir «KNP Vouwkarton») a 100% até 1 de Janeiro
de 1990, data da cessão desta empresa à Mayr-Melnhof. Segundo a decisão, a KNP
Vouwkarton, que constituía uma das divisões do «Packaging Group» (a seguir
«grupo Embalagem») da KNP, participou nas reuniões do PWG (até meados de
1988), do JMC, da PC e do COE. Durante o período de participação nas reuniões
do PWG, o representante da KNP Vouwkarton, director do grupo Embalagem da
recorrente e membro da sua direcção, presidiu a reuniões deste órgão bem como
da PC. O comportamento ilegal da KNP Vouwkarton, relativamente ao período
entre meados de 1986 e 1 de Janeiro de 1990, foi imputado à recorrente.
- 17.
- A KNP comprou também, com efeito a 31 de Dezembro de 1986, o produtor
alemão de embalagens Herzberger Papierfabrik Ludwig Osthustenrich GmbH und
Co KG, cuja sucursal Badische Kartonfabrik (a seguir «Badische») participou nas
reuniões da PC, do JMC e do COE. A última participação da Badische no JMC
data de Maio de 1989 tendo-se retirado oficialmente do PG Paperboard no final
desse mesmo ano. Uma vez que a Badische procedeu a aumentos de preços
mesmo após ter deixado o PG Paperboard, a Comissão considerou que tinha
continuado a participar à margem do cartel, até Abril de 1991. A participação da
Badische no cartel foi imputado à recorrente.
Tramitação processual
- 18.
- Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 7 de
Outubro de 1994, a recorrente interpôs o presente recurso.
- 19.
- Dezasseis das outras dezoito empresas consideradas responsáveis pela infracção
recorreram igualmente da decisão (processos T-295/94, T-301/94, T-304/94,
T-308/94, T-310/94, T-311/94, T-317/94, T-319/94, T-327/94, T-337/94, T-338/94,
T-347/94, T-348/94, T-352/94 e T-354/94).
- 20.
- A recorrente no processo T-301/94, Laakmann Karton GmbH, desistiu da instância
por carta entregue na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 10 de Junho
de 1996, tendo o processo sido cancelado no registo do Tribunal por despacho de18 de Julho de 1996, Laakmann Karton/Comissão (T-301/94, não publicado na
Colectânea).
- 21.
- Quatro empresas finlandesas, membros do grupo profissional Finnboard e, por esse
facto, consideradas solidariamente responsáveis pelo pagamento da coima aplicada
ao grupo, recorreram igualmente da decisão (processos apensos T-339/94, T-340/94,
T-341/94 e T-342/94).
- 22.
- Finalmente, foi interposto um recurso pela associação CEPI-Cartonboard, não
destinatária da decisão. No entanto, esta desistiu da instância por carta apresentada
na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 8 de Janeiro de 1997, tendo o
processo sido cancelado no registo do Tribunal por despacho de 6 de Março de
1997, CEPI-Cartonboard/Comissão (T-312/94, não publicado na Colectânea).
- 23.
- Por carta de 5 de Fevereiro de 1997, o Tribunal de Primeira Instância convidou as
partes a participarem numa reunião informal, na qual se deveriam pronunciar,
designadamente, sobre a eventual apensação dos processos T-295/94, T-304/94,
T-308/94, T-309/94, T-310/94, T-311/94, T-317/94, T-319/94, T-327/94, T-334/94,
T-337/94, T-338/94, T-347/94, T-348/94, T-352/94 e T-354/94, para efeitos da fase
oral. Nessa reunião, que teve lugar em 29 de Abril de 1997, as partes aceitaram a
apensação.
- 24.
- Por despacho de 4 de Junho de 1997, por razões de conexão, o presidente da
Terceira Secção Alargada do Tribunal de Primeira Instância ordenou a apensação
dos referidos processos para efeitos da fase oral, nos termos do artigo 50.° do
Regulamento de Processo, tendo deferido um pedido de tratamento confidencial
apresentado pela recorrente no processo T-334/94.
- 25.
- Por despacho de 20 de Junho de 1997, deferiu um pedido de tratamento
confidencial apresentado pela recorrente no processo T-337/94, relativamente a um
documento apresentado em resposta a uma pergunta escrita do Tribunal.
- 26.
- Com base no relatório preliminar do juiz-relator, o Tribunal de Primeira Instância
(Terceira Secção Alargada) decidiu iniciar a fase oral e adoptou medidas de
organização do processo, tendo pedido às partes para responderem a certas
perguntas escritas e para apresentarem certos documentos. As partes deram
satisfação a estes pedidos.
- 27.
- Foram ouvidas as alegações das partes nos processos mencionados no n.° 23 e as
suas respostas às perguntas colocadas pelo Tribunal na audiência que teve lugar
entre 25 de Junho e 8 de Julho de 1997.
Pedidos das partes
- 28.
- A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:
anular total ou parcialmente a decisão;
anular a coima aplicada ou, pelo menos, reduzir o seu montante;
adoptar as disposições que o Tribunal considerar necessárias;
condenar a recorrida nas despesas.
- 29.
- A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:
negar provimento ao recurso;
condenar a recorrente nas despesas.
Pedido de anulação da decisão
Fundamentos baseados, por um lado, em erro de apreciação no que se refere à
imputação à recorrente dos comportamentos da KNP Vouwkarton e da Badische e,
por outro, em violação do artigo 190.° do Tratado quanto a este ponto
Argumentos das partes
- 30.
- A recorrente alega que a decisão não respeita a obrigação de fundamentação do
artigo 190.° do Tratado na medida em que lhe imputa a participação da KNP
Vouwkarton e da Badische no cartel.
- 31.
- Recorda que o n.° 143 dos considerandos da decisão indica que o comportamento
de uma filial foi considerado imputável ao grupo, representado pela sociedade-mãe,
quando mais do que uma sociedade de um mesmo grupo participou na infracção
ou quando existiam provas específicas de que a sociedade-mãe do grupo estava
implicada na participação da sua filial no cartel. O critério escolhido pela Comissão
para imputar à recorrente o comportamento da KNP Vouwkarton e da Badische
não está, no entanto, claramente indicado na decisão.
- 32.
- Na medida em que a Comissão terá aplicado o segundo critério referido, isto é, a
existência de provas específicas que implicam a recorrente na participação no
cartel, os elementos que determinam que a recorrente terá sido activa e
directamente responsável pela participação das suas filiais no cartel deveriam ter
sido indicados na decisão. Na falta destes elementos, a recorrente não pode ser
considerada como tendo participado no cartel deliberadamente.
- 33.
- A recorrente considera além disto que a Comissão cometeu um erro de apreciação
ao imputar-lhe os comportamentos da KNP Vouwkarton e da Badische.
- 34.
- No que se refere à participação da KNP Vouwkarton no cartel, a recorrente
salienta que o membro do seu directório que era (indirectamente) co-director da
KNP Vouwkarton e que, nessa qualidade, assistia às reuniões do PWG e da PC
deixou de assistir a qualquer reunião dos órgãos do PG Paperboard após
Novembro de 1988 (Maio de 1988 no que se refere ao PWG). A partir desse
momento, foi quebrado qualquer «laço pessoal» entre a recorrente e o cartel.
- 35.
- De qualquer modo, a participação activa e directa da recorrente no cartel terminou
com a venda da KNP Vouwkarton ao grupo Mayr-Melnhof, com efeitos a 1 de
Janeiro de 1990.
- 36.
- Tratando-se da Badische, a participação desta no cartel não era da
responsabilidade activa e directa da recorrente. Em especial, nada permite concluir
que a participação do membro do conselho de direcção da recorrente nas reuniões
do PWG e da PC dizia também respeito à Badische.
- 37.
- Esta teria, com efeito, actuado de modo independente no mercado e não teria
nunca participado no cartel com base em instruções da recorrente. Deste modo,
não se justifica imputar a esta aquela participação (v. acórdãos do Tribunal de
Justiça de 14 de Julho de 1972, ICI/Comissão, 48/69, Colect., p. 205, de 12 de Julho
de 1979, BMW Belgium e o./Comissão, 32/78 e 36/78 a 82/78, Recueil, p. 2435,
n.° 24, e de 6 de Abril de 1995, BPB Industries e British Gypsum/Comissão,
C-310/93 P, Colect., p. I-865).
- 38.
- Em resposta ao fundamento baseado em violação do artigo 190.° do Tratado, a
Comissão alega que o n.° 149 dos considerandos da decisão contém uma
fundamentação expressa da imputação à recorrente do comportamento da KNP
Vouwkarton e da Badische. A participação nas reuniões do PWG e da PC do
director do grupo Embalagem da recorrente constitui, com efeito, uma prova
específica que estabelece um laço pessoal entre ela e o cartel.
- 39.
- Tratando-se do fundamento baseado em erro de apreciação, a Comissão considera,
no que se refere à KNP Vouwkarton, que a participação nas reuniões do PWG e
da PC do membro do conselho de direcção da recorrente prova que esta estava
informada do cartel, que existia uma relação muito directa entre ela e as suas
filiais, e, por fim, que contribuia activamente na participação das suas filiais no
cartel. Nestas condições, o simples facto de, após 1988, o membro do seu conselho
de direcção ter deixado de presidir às reuniões do PWG e da PC não afecta em
nada a existência do laço pessoal da recorrente com o cartel.
- 40.
- A Comissão defende, por outro lado, que a participação nas reuniões do PWG e
da PC do membro do conselho de direcção da recorrente constitui também um
laço directo entre ela e a participação da Badische no cartel.
Apreciação do Tribunal
- 41.
- Resulta do n.° 149, primeiro parágrafo, dos considerandos da decisão que a KNP
Vouwkarton esteve representada na PC e no PWG pelo director do seu grupo
Embalagem. Precisa-se, no mesmo ponto dos considerandos, que é conveniente
«dada a ligação provada entre o cartel e a própria KNP, considerar como
destinatário da presente decisão todo o grupo KNP no que se refere ao período
anterior à aquisição da KNP Vouwkarton pelo grupo [Mayr-Melnhof], ou seja, até
1 de Janeiro de 1990 (para o período após a transferência, o [Mayr-Melnhof] é
responsável pela continuação da participação da KNP Vouwkarton)».
- 42.
- Segundo o considerando n.° 149, terceiro parágrafo, a recorrente «era também
proprietária (95%) do produtor de cartão alemão Herzbergerpapierfabrik, que
incluía a Badische Kartonfabrik». A Comissão concluiu daqui: «No que se refere
à participação da Badische no cartel, o destinatário da presente decisão será,
consequentemente, a KNP».
- 43.
- Assim, conclui-se de modo suficientemente claro da decisão que esta foi enviada
à recorrente em aplicação do critério segundo o qual a decisão foi enviada ao
grupo, representado pela sociedade-mãe, quando existiam provas específicas de que
a sociedade-mãe do grupo estava implicada na participação da filial no cartel
(n.° 143, n.° 2, dos considerandos). Quanto a isto, ao invocar o facto de um
membro do conselho da direcção, igualmente director do seu grupo Embalagem,
ter participado nas reuniões do PWG e da PC na qualidade de representante da
KNP Vouwkarton, a decisão contém uma indicação suficiente dos elementos
escolhidos pela Comissão para concluir que a recorrente esteve implicada na
participação do cartel.
- 44.
- Consequentemente, o fundamento baseado em fundamentação insuficiente da
decisão não deve ser acolhido.
- 45.
- Quanto ao segundo fundamento, foi correctamente que a Comissão imputou à
recorrente os comportamentos anticoncorrenciais da KNP Vouwkarton e da
Badische.
- 46.
- Neste ponto, importa, antes de mais, salientar que a recorrente não alega que não
podia influenciar de modo determinante a política comercial da KNP Vouwkarton
e da Badische.
- 47.
- Em seguida, é ponto assente que um membro do conselho de direcção da
recorrente participou nas reuniões do PWG, tendo mesmo presidido às referidas
reuniões até 1988. Ora, segundo a decisão, o PWG constituía a instância onde
tiveram lugar as principais discussões com objectivo anticoncorrencial, conclusão
que a recorrente não contesta.
- 48.
- Nestas condições a Comissão determinou que a recorrente estava, por intermédio
do membro do seu conselho de direcção, activamente implicada nas acções
anticoncorrenciais da KNP Vouwkarton. Ao implicar-se deste modo na participação
de uma das suas filiais no cartel, a recorrente conhecia e aprovava também,
necessariamente, a participação da Badische na infracção em que a KNP tomava
parte.
- 49.
- A responsabilidade da recorrente não é afectada pelo facto de o membro do seu
conselho de direcção ter deixado de assistir às reuniões dos órgãos do PG
Paperboard em 1988. Com efeito, incumbia à recorrente, na sua qualidade de
sociedade-mãe, adoptar face às suas filiais uma medida destinada a impedir a
prossecução de uma infracção cuja existência não ignorava. A recorrente não
contestou aliás que nem sequer tentou impedir a continuação da infracção.
- 50.
- Conclui-se também que a cessão da KNP Vouwkarton à Mayr-Melnhof, com
efeitos a 1 de Janeiro de 1990, não afectou a responsabilidade da recorrente dado
que se manteve o comportamento anticoncorrencial da Badische.
- 51.
- Também não deve ser acolhido o fundamento baseado em erro de apreciação da
Comissão.
Fundamento baseado em erro de apreciação da duração da participação da Badische
no cartel
Argumentos das partes
- 52.
- A recorrente alega que a Badische deixou de participar no cartel no final do anode 1989. Apesar de a Comissão reconhecer que a Badische se retirou, nessa data,
das reuniões dos órgãos do PG Paperboard, considerou no entanto a recorrente
responsável pela participação da Badische no cartel até Abril de 1991.
- 53.
- O simples facto de a Badische ter recebido de um agente comercial independente,
sem as ter solicitado, informações esporádicas sobre as iniciativas em matéria de
preços, unicamente sobre o mercado do Reino Unido, não basta para considerar
que continuou a participar activamente no cartel. Além disto, conclui-se do artigo
1.°, nono travessão, da decisão, que foi só a partir do início do ano de 1990 que os
produtores de cartão adoptaram, cada vez mais frequentemente, medidas
concertadas de controlo do fornecimento do mercado.
- 54.
- A Comissão remete para o n.° 162 dos considerandos da decisão, segundo o qual
a Badische continuava a aplicar as iniciativas em matéria de preços no momento
em que a Comissão efectuou o seu inquérito. Deste modo, a Badische deve ser
considerada como tendo participado no cartel mesmo após se ter retirado dos
órgãos do PG Paperboard. A referência, no mesmo número dos considerandos, ao
facto de que tinha provavelmente obtido informações sobre as iniciativas previstas
no Reino Unido através do seu agente inglês, mais não é do que acessório.
Apreciação do Tribunal
- 55.
- Já se verificou (v. supra n.os 45 a 50) que a Comissão imputou correctamente o
comportamento ilícito da Badische à recorrente.
- 56.
- Esta reconhece que, não obstante ter abandonado os órgãos do PG Paperboard no
final do ano de 1989, continuou no entanto a receber informações sobre as
iniciativas em matéria de preços.
- 57.
- Não contesta, aliás, que se conclui dos quadros F e G anexos à decisão que, em
Abril de 1990 e em Janeiro de 1991, aumentou os preços do seu cartão GD na
Alemanha e no Reino Unido para o nível dos que eram aplicados pelas empresas
que participaram nos órgãos do PG Paperboard até ao mês de Abril de 1991.
- 58.
- Conclui-se assim que continuou, deliberadamente, a beneficiar das actividades
contrárias ao artigo 85.°, n.° 1, do Tratado, na medida em que não podia ignorar
a origem colusória das informações que utilizava.
- 59.
- A Comissão considerou portanto correctamente, no n.° 162, sexto parágrafo dos
considerandos da decisão, que a recorrente deveria ser «considerada como parte
na infracção até à data das investigações», isto é, até 23 e 24 de abril de 1991.
- 60.
- Daqui resulta que o fundamento não deve ser acolhido.
Pedido de anulação ou de redução do montante da coima
Fundamento baseado em insuficiência da fundamentação da decisão quanto à
determinação do montante da coima
Argumentos das partes
- 61.
- A recorrente considera que a decisão não permite, não obstante o nível geral
relativamente elevado das coimas, compreender de que modo a Comissão fixou
concretamente o montante da coima que lhe foi aplicada. Além disto, se o Tribunal
concluir que a infracção não está provada num ou em vários pontos, ficará afectada
a base sobre a qual foi calculada a coima.
- 62.
- Na tréplica, a recorrente sublinha que a falta de indicação precisa dos elementos
tidos em conta para o cálculo da coima não lhe permite apresentar mais
argumentos sobre o presente fundamento. A Comissão não pode portanto
contestar a sua admissibilidade pelo facto de não ter sido suficientemente
desenvolvido na petição. Com efeito, enquanto a Comissão não fornecer indicações
relativas, nomeadamente, ao volume de negócios tido em conta para calcular a
coima, ao período considerado e à influência de eventuais circunstâncias atenuantes
ou agravantes, não está em condições de apresentar observações mais
pormenorizadas.
- 63.
- A Comissão alega que o fundamento baseado na insuficiente fundamentação da
coima é inadmissível nos termos do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de
Processo, uma vez que a petição não contém nenhuma exposição do referido
fundamento.
- 64.
- Subsidiariamente, recorda que os n.os 167 a 172 dos considerandos da decisão
contêm uma exposição pormenorizada dos elementos tidos em conta para calcular
as coimas. Em qualquer caso, considera que não é obrigada a elaborar uma espécie
de «catálogo» das coimas.
Apreciação do Tribunal
- 65.
- Há que considerar o presente fundamento admissível. Com efeito, na petição, a
recorrente defendeu expressamente, ainda que de forma sumária, que a decisão era
insuficientemente fundamentada quanto «à forma como a Comissão determinou
concretamente a coima». A Comissão respondeu, aliás, referindo-se aos n.os 167 a
172 dos considerandos da decisão.
- 66.
- O fundamento em causa deve portanto ser examinado.
- 67.
- Segundo jurisprudência constante, o dever de fundamentar uma decisão individual
tem por finalidade permitir ao juiz comunitário exercer a sua fiscalização da
legalidade da decisão e fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber
se a decisão é fundada ou se está eventualmente afectada por um vício que
permita contestar a sua validade, esclarecendo-se que o alcance dessa obrigação
depende da natureza do acto em causa e do contexto em que o mesmo foi
adoptado (v., nomeadamente, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 11
de Dezembro de 1996, Van Megen Sports/Comissão, T-49/95, Colect., p. II-1799,
n.° 51).
- 68.
- No que respeita a uma decisão que, como no presente caso, aplica coimas a
diversas empresas por uma infracção às regras comunitárias da concorrência, há
que determinar o alcance da obrigação de fundamentação, tendo em conta,
designadamente, que a gravidade das infracções deve ser apreciada em função de
um grande número de elementos, tais como, nomeadamente, as circunstâncias
específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas, e isto sem
que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam
obrigatoriamente ser tomados em consideração (despacho do Tribunal de Justiça
de 25 de Março de 1996, SPO e o./Comissão, C-137/95 P, Colect., p. I-1611, n.° 54).
- 69.
- Além disso, ao fixar o montante de cada coima, a Comissão dispõe de um poder
de apreciação e não pode ser obrigada a aplicar, para esse efeito, uma fórmula
matemática precisa (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Primeira Instância
de 6 de Abril de 1995, Martinelli/Comissão, T-150/89, Colect., p. II-1165, n.° 59).
- 70.
- Na decisão, os critérios tomados em conta para determinar o nível geral das coimas
e o montante das coimas individuais figuram, respectivamente, nos n.os 168 e 169
dos considerandos. Além disso, no que respeita às coimas individuais, a Comissão
explica, no n.° 170 dos considerandos, que as empresas que participaram nas
reuniões do PWG foram, em princípio, consideradas «líderes», ao passo que as
outras empresas foram consideradas «membros normais» deste. Finalmente, nos
n.os 171 e 172 dos considerandos, indica que os montantes das coimas aplicadas à
Rena e ao grupo Stora devem ser substancialmente reduzidos, a fim de ter em
conta a sua cooperação activa com a Comissão, e que oito outras empresas, entre
as quais a recorrente, podem igualmente beneficiar de uma redução, numa
proporção inferior, pelo facto de, na resposta que apresentaram à comunicação de
acusações, não terem negado as principais alegações de facto em que a Comissão
baseava as suas acusações.
- 71.
- Nas peças processuais apresentadas ao Tribunal e na resposta que deu a uma
pergunta escrita deste, a Comissão explicou que as coimas foram calculadas com
base no volume de negócios realizado por cada uma das empresas destinatárias da
decisão, no mercado comunitário do cartão, em 1990. Coimas de um nível de base
de 9% ou de 7,5% deste volume de negócios individual foram assim aplicadas,
respectivamente, às empresas consideradas «líderes» do cartel e às outras
empresas. Finalmente, a Comissão tomou em consideração a eventual atitude
cooperante de certas empresas ao longo do procedimento administrativo. Duas
empresas beneficiaram, por esse facto, de uma redução de dois terços do montante
das suas coimas, enquanto outras empresas beneficiaram de uma redução de um
terço.
- 72.
- De resto, resulta de um quadro fornecido pela Comissão, que contém indicações
quanto à fixação do montante de cada uma das coimas individuais, que, embora
estas não tenham sido determinadas aplicando de forma estritamente matemática
apenas os dados numéricos acima mencionados, os referidos dados foram
sistematicamente tomados em conta para efeitos do cálculo das coimas.
- 73.
- Ora, a decisão não precisa que as coimas foram calculadas com base no volume de
negócios realizado por cada uma das empresas, no mercado comunitário do cartão,
em 1990. Além disso, as taxas de base de 9% e de 7,5% aplicadas para calcular as
coimas a pagar, respectivamente, pelas empresas consideradas «líderes» e pelos
«membros normais», não figuram na decisão. Também não constam da decisão as
taxas das reduções concedidas à Rena e ao grupo Stora, por um lado, e a oito
outras empresas, entre as quais a recorrente por outro.
- 74.
- No caso vertente, importa considerar, em primeiro lugar, que, interpretados à luz
da exposição pormenorizada que é feita, na decisão, das alegações de facto
formuladas em relação a cada destinatário da decisão, os n.os 169 a 172 dos
considerandos desta contêm uma indicação suficiente e pertinente dos elementos
de apreciação tomados em consideração para determinar a gravidade e a duração
da infracção cometida por cada uma das empresas em causa (v., neste sentido, o
acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 24 de Outubro de 1991,
Petrofina/Comissão, T-2/89, Colect., p. II-1087, n.° 264).
- 75.
- Em segundo lugar, quando o montante de cada coima é, como no presente caso,
determinado com base na tomada em consideração sistemática de certos dados
precisos, a indicação, na decisão, de cada um desses factores permite às empresas
apreciar mais correctamente se a Comissão cometeu algum erro ao fixar o
montante da coima individual e se o montante de cada coima individual se justifica
relativamente aos critérios gerais aplicados. No caso vertente, a indicação, na
decisão, dos factores em causa, isto é, o volume de negócios de referência, o ano
de referência, as taxas de base consideradas e a taxa de redução do montante das
coimas, não incluiu a divulgação implícita do volume de negócios preciso das
empresas destinatárias da decisão, divulgação que poderia ter constituído uma
violação do artigo 214.° do Tratado. Efectivamente, o montante final de cada coima
individual não resulta, como a própria Comissão sublinhou, de uma aplicação
estritamente matemática dos referidos factores.
- 76.
- Aliás, a Comissão reconheceu, na audiência, que nada a impediu de indicar, na
decisão, os factores tomados sistematicamente em conta e que tinham sido
divulgados numa conferência de imprensa que teve lugar no dia em que a decisão
foi adoptada pelo membro da Comissão responsável pela política da concorrência.
A este propósito, deve recordar-se que, segundo jurisprudência constante, a
fundamentação de uma decisão deve figurar no próprio corpo dessa decisão e que
explicações posteriores fornecidas pela Comissão não podem, salvo circunstâncias
excepcionais, ser tomadas em consideração (v. acórdão do Tribunal de Primeira
Instância de 2 de Julho de 1992, Dansk Pelsdyravlerforening/Comissão, T-61/89,
Colect., p. II-1931, n.° 131, e, no mesmo sentido, acórdão do Tribunal de PrimeiraInstância de 12 de Dezembro de 1991, Hilti/Comissão, T-30/89, Colect., p. II-1439,
n.° 136).
- 77.
- Não obstante o que acaba de se afirmar, deve sublinhar-se que a fundamentação
relativa à fixação do montante das coimas, contida nos n.os 167 a 172 dos
considerandos da decisão, é, pelo menos, tão pormenorizada como as constantes
das decisões anteriores da Comissão sobre infracções semelhantes. Ora, embora o
fundamento baseado num vício de fundamentação seja de ordem pública, no
momento da adopção da decisão, nenhuma crítica tinha ainda sido feita pelo juiz
comunitário quanto à prática seguida pela Comissão em matéria de fundamentação
das coimas aplicadas. Só no acórdão de 6 de Abril de 1995, Tréfilunion/Comissão
(T-148/89, Colect., p. II-1063, n.° 142), e em dois outros acórdãos proferidos no
mesmo dia, Société métallurgique de Normandie/Comissão (T-147/89, Colect.,
p. II-1057, publicação sumária) e Société des treillis et panneaux soudés/Comissão
(T-151/89, Colect., p. II-1191, publicação sumária), é que o Tribunal de Primeira
Instância sublinhou, pela primeira vez, ser desejável que as empresas pudessem
conhecer em pormenor o modo de cálculo da coima que lhes foi aplicada, sem
serem obrigadas, para tal, a interpor um recurso jurisdicional contra a decisão da
Comissão.
- 78.
- Daqui resulta que, quando uma decisão conclui pela existência de uma infracção
às regras da concorrência e aplica coimas às empresas que nela participaram, a
Comissão deve, se tiver sistematicamente tomado em conta certos elementos de
base para fixar o montante das coimas, indicar esses elementos no corpo da
decisão, a fim de permitir aos destinatários desta verificar as razões que levaram
à fixação do nível da coima e apreciar a existência de uma eventual discriminação.
- 79.
- Nas circunstâncias excepcionais salientadas no n.° 77, supra, e tendo em conta que
a Comissão se mostrou disposta a fornecer, na fase contenciosa do processo,
qualquer informação pertinente relativa ao modo de cálculo das coimas, a falta de
fundamentação específica, na decisão, quanto ao modo de cálculo das coimas, não
deve, neste caso, ser considerada uma violação da obrigação de fundamentação,
susceptível de justificar a anulação total ou parcial das coimas aplicadas.
- 80.
- Consequentemente, a primeira parte do fundamento não pode ser acolhida.
Fundamentos baseados, por um lado, num erro de apreciação que consistiu em
qualificar a recorrente como líder do cartel e, por outro, numa violação da obrigação
de fundamentação quanto a este ponto
Argumentos das partes
- 81.
- A recorrente alega que foi incorrectamente considerada como um dos líderes do
cartel (n.° 170 dos considerandos da decisão).
- 82.
- A Comissão admitiu que o PWG e a PC aceitaram ser presididas pelo
representante da recorrente tendo em conta a força do grupo KNP. Ora, a
recorrente é apenas um pequeno produtor de cartão que «forneceu» um
presidente ao PWG a pedido dos seus colegas, e por uma duração limitada a um
ano. Posteriormente, este mandato foi, a pedido dos seus colegas, prorrogado por
um ano. Além disto, aquele que era também codirector da KNP Vouwkarton foi
escolhido para ocupar esta função devido à sua «neutralidade» e aos seus
conhecimentos linguísticos. Acresce que só se tem a certeza de ele ter presidido a
quatro das oito reuniões do PWG efectuadas durante a sua presidência.
- 83.
- Consequentemente, a posição ocupada pelo membro do seu conselho de direcção
não demonstra que a recorrente tenha sido incentivadora do cartel.
- 84.
- Além disto, a decisão não é suficientemente fundamentada, uma vez que não indica
expressamente se se teve em conta a curta duração da presidência do PWG. A
Comissão explica na contestação que se baseou, para efeitos do cálculo da coima,
na constatação de que a recorrente deve ser considerada um dos líderes também
no período posterior a 1988. Ora, esta constatação é incorrecta, uma vez que a
decisão precisa que a recorrente só deve ser considerada um dos líderes «durante
o período em que foi membro do PWG» (n.° 170 dos considerandos da decisão).
- 85.
- A Comissão entende que a recorrente foi considerada um dos líderes do cartel
devido à sua participação no PWG, nomeadamente a sua presidência deste órgão.
- 86.
- O seu papel de líder é confirmado por documentos (essencialmente as actas
provenientes do PG Paperboard) anexos à tréplica, nos quais consta o nome do
membro do seu conselho de direcção.
- 87.
- Por fim, a Comissão teve consciência da duração limitada da participação da
recorrente nas reuniões do PWG. No entanto, não teria sido razoável ter em conta
esta circunstância aquando do cálculo da coima, dado que só aplicou o aumento
da coima infligido à recorrente, pelo facto de ser um dos líderes, no que se refere
à participação da KNP Vouwkarton.
Apreciação do Tribunal
- 88.
- Nos termos do n.° 170, primeiro parágrafo, dos considerandos da decisão, «aos
líderes, nomeadamente os grandes produtores de cartão que participaram no PWG
(Cascades; Finnboard; [Mayr-Melnhof]; MoDO; Sarrió e Stora), será imputada
uma responsabilidade especial. Eram, claramente, os principais responsáveis em
matéria de tomada de decisões e foram os primeiros incentivadores do cartel».
- 89.
- Nos termos do segundo parágrafo do mesmo número, a recorrente deve «também
ser considerada como um líder no cartel durante o período em que foi membro do
PWG», isto é, até meados de 1988 (n.° 36, segundo parágrafo, dos considerandos).
A decisão precisa que o representante da recorrente presidiu a PC e o PWG «num
período crítico».
- 90.
- Além disto, descreve amplamente o papel central do PWG no cartel
(nomeadamente, n.os 36 a 38 e n.os 130 a 132 dos considerandos).
- 91.
- Daqui resulta que a decisão contém uma fundamentação suficiente das razões pelas
quais a recorrente foi considerada pela Comissão como um líder.
- 92.
- Quanto à correcção desta fundamentação, há que salientar que a recorrente não
contesta ter participado nas reuniões do PWG nem mesmo ter garantido a
presidência durante os dois primeiros anos do cartel. Também não contesta a
realidade do objectivo essencialmente anticoncorrencial do PWG nem a dos
comportamentos anticoncorrenciais verificados pela Comissão.
- 93.
- Assim, a recorrente foi justamente qualificada como líder para efeitos do cálculo
da coima, não sendo a conclusão da Comissão em nada afectada pelo seu
comportamento real no seio do PWG e pelas razões invocadas para a acessão à
presidência desse órgão.
- 94.
- Tendo em conta as considerações que precedem, a recorrente não pôde no entanto
ser considerada líder e, portanto, penalizada a este título, a não ser no período
entre meados de 1986 e meados de 1988. O Tribunal analisará o alcance desta
conclusão, no âmbito da sua competência de plena jurisdição em matéria de
coimas, quando proceder à análise do fundamento baseado em erros cometidos no
cálculo da coima aplicada à recorrente (v., infra, n.os 101 e segs.).
- 95.
- Consequentemente, o presente fundamento não pode ser acolhido.
Fundamento baseado em erros cometidos no cálculo da coima aplicada à recorrente
Argumentos das partes
- 96.
- A recorrente alega que, no cálculo do montante da coima, a Comissão deveria ter
tido em conta a insignificante quota de mercado da Badische e a sua participação
marginal na infracção a partir de finais de 1989 (n.° 162 dos considerandos da
decisão), participação limitada ao Reino Unido.
- 97.
- Além disto, a sanção aplicada teve incorrectamente em conta a participação das
suas duas filiais no cartel durante todo o período de infracção, isto é de meados
de 1986 até Abril de 1991. Quanto a isto, sublinha que se indica no artigo 1.° da
versão neerlandesa da decisão que participou num acordo e numa prática
concertada desde meados do ano de 1988 e não desde meados de 1986. Solicita ao
Tribunal que retire oficiosamente conclusões deste erro manifesto.
- 98.
- Na audiência, o representante da recorrente indicou que um dos números tidos em
conta para calcular a coima não correspondia ao volume de negócios efectivamente
realizado pela Badische. Com efeito, a Comissão teve em conta o volume de
negócios realizado pela Badische no mercado comunitário do cartão em 1989, mas
deveria ter, em aplicação dos critérios gerais adoptados para o cálculo das coimas,
tido em conta o volume de negócios realizado nesse mesmo mercado em 1990.
Além disto, considerou incorrectamente as vendas de cartão internas ao grupo.
- 99.
- A Comissão sustenta ter tido em conta, no cálculo da coima, a quota de mercado
mínima da Badische uma vez que as coimas foram calculadas com base no volume
de negócios das empresas em causa.
- 100.
- Sublinha que o erro da versão neerlandesa da decisão relativa ao momento a que
remonta o cartel não escaparia a um leitor atento, o que é confirmado, afirma,
pelo facto de a recorrente só ter mencionado este erro na réplica.
- 101.
- Por fim, em resposta a uma questão escrita do Tribunal, a Comissão apresentou
um quadro pormenorizando o cálculo das coimas aplicadas às empresas
destinatárias da decisão. Segundo este documento, antes da redução, o montante
da coima aplicado à recorrente era constituído pela soma de dois números, isto é,
por um lado, o número resultante da aplicação da taxa de 9% ao volume de
negócios realizado pela KNP Vouwkarton multiplicado por 42/60 correspondente
à duração da participação na infracção da KNP Vouwkarton e, por outro lado,
o número resultante da aplicação da taxa de 7,5% ao número do volume de
negócios realizado pela badische multiplicado por 60/60 correspondente à
duração da participação da Badische na infracção . O montante total foi em
seguida reduzido de 1/3.
- 102.
- Na audiência, a Comissão declarou ter calculado o montante da coima a partir de
dois números, isto é, os volumes de negócios realizados respectivamente pela KNP
Vouwkarton e pela Badische, em 1989, no mercado comunitário do cartão.
- 103.
- Explicou que, no que se refere à KNP Vouwkarton, aplicou uma derrogação ao
critério do ano de referência, isto é, 1990, para ter em conta a venda desta
sociedade à Mayr-Melnhof nesse mesmo ano. Declarou, por outro lado, ter
considerado, para efeitos da determinação do montante da coima, o volume de
negócios realizado pela Badische em 1989 (19 milhões de ecus) e não o de 1990
(15 milhões de ecus) pelo facto de ser ter verificado, no Outono do ano de 1989,
o encerramento permanente de uma das suas instalações.
Apreciação do Tribunal
- 104.
- Como já se verificou (supra n.os 45 a 50), a Comissão considerou correctamente a
recorrente responsável pelo comportamento ilícito da KNP Vouwkarton e da
Badische. Considerou também correctamente que a recorrente participou no cartel
desde meados de 1986 até Abril de 1991 (v. supra n.os 55 a 60).
- 105.
- Daqui resulta que devem ser afastados os argumentos da recorrente baseados em
apreciação incorrecta da sua participação no cartel.
- 106.
- Deve também ser afastado o argumento baseado num erro contido no artigo 1.° da
versão neerlandesa da decisão, segundo a qual a recorrente participou «num
acordo e numa prática concertada desde meados de 1988». Com efeito, devendo
o dispositivo da decisão ser interpretado à luz da sua exposição de fundamentos (v.,
por exemplo, acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 1975, Suiker
Unie e o./Comissão, 40/73 a 48/73, 50/73, 54/73, 55/73, 56/73, 111/73, 113/73 e
114/73, Colect., p. 563, n.os 122 a 124), saliente-se que se conclui claramente destes
que a Comissão pretendia considerar, quanto à recorrente, uma participação num
acordo e numa prática concertada desde meados de 1986. Resulta aliás da petição
inicial da recorrente (n.° 8, onde se refere o n.° 172 dos considerando da decisão)
que foi também nesse sentido que entendeu a decisão impugnada.
- 107.
- Convém recordar que foram aplicadas coimas com um nível de base de 9% ou de
7,5% do volume de negócios realizado por cada uma das empresas destinatárias
da decisão no mercado comunitário do cartão em 1990, respectivamente, às
empresas consideradas líderes do cartel e às outras empresas. A aplicação efectiva
destes níveis de base foi confirmada pela Comissão durante o processo contencioso,
e, nomeadamente, na sua resposta a uma pergunta escrita apresentada pelo
Tribunal.
- 108.
- No caso da recorrente, o argumento baseado na insignificante quota de mercado
da Badische não pode ser acolhido. Com efeito, a Comissão teve em conta, como
para as outras empresas, o volume de negócios realizado no mercado comunitário
do cartão. Ao fazer isto, apreciou a dimensão e a força económica reais da
Badische neste mercado. No entanto, na medida em que considerou o volume de
negócios da Badische realizado em 1989 e não o, menos elevado, realizado em
1990 (v. supra n.° 103), como o exigiria o princípio da igualdade de tratamento, o
montante da coima aplicado à recorrente deverá ser reduzido. Convém acrescentar,
quanto a isto, que a Comissão não pode aplicar uma derrogação num caso
específico, sem fornecer qualquer explicação sobre esse ponto na decisão, aos
critérios geralmente considerados para determinar o montante das coimas. Com
efeito, segundo jurisprudência constante, a fundamentação de uma decisão deve
constar do próprio corpo desta. A decisão não pode ser fundamentada pela
primeira vez e a posteriori perante o juiz comunitário, salvo circunstâncias
excepcionais que não estão reunidas no caso concreto (v., nomeadamente, acórdão
Dansk Pelsdyravlerforening/Comissão, já referido, n.° 131).
- 109.
- As explicações relativas à determinação do montante da coima aplicada à
recorrente, apresentadas por escrito a pedido do Tribunal de Primeira Instância,
mostram também que foi aplicada uma taxa de 9% ao volume de negócios
realizado em 1989 pela KNP Vouwkarton relativamente a todo o período em que
pertenceu à KNP, isto é, até 1 de Janeiro de 1990, não obstante o facto de nenhum
representante da KNP ter participado nas reuniões do PWG após meados de 1988.
- 110.
- Na sua resposta escrita às perguntas do Tribunal bem como na audiência, a
Comissão propôs no entanto um método alternativo de cálculo da coima. Segundo
este outro método, a coima é calculada aplicando-se aos volumes de negócio da
KNP Vouwkarton e da Badische uma taxa de base de 9% para o período durante
o qual a recorrente foi um dos líderes do cartel e, para o restante período da
infracção, uma taxa de base de 7,5%.
- 111.
- Deve concluir-se que apenas este segundo método está em conformidade com as
indicações do n.° 170, segundo parágrafo, dos considerandos da decisão, segundo
o qual a recorrente devia ser considerada «como um líder no cartel durante o
período em que foi membro do PWG». Deve portanto ter-se em conta esta
conclusão na determinação do montante da coima.
- 112.
- Por fim, tratando-se das vendas de cartão internas ao grupo, é forçoso verificar que
a recorrente não apresentou qualquer elemento de prova susceptível de demonstrar
que a Comissão não as deveria ter tido em conta no cálculo da coima.
- 113.
- Resulta de tudo o que precede que o montante da coima aplicado à recorrente
deve ser reduzido.
- 114.
- Uma vez que nenhum dos fundamentos invocados pela recorrente, excepto o
baseado em erros cometidos no cálculo da coima aplicado à recorrente, justificam
uma redução, o Tribunal de Primeira Instância, no exercício da sua competência
de plena jurisdição, fixa o montante da coima em 2 700 000 ecus.
Quanto às despesas
- 115.
- Por força do disposto no n.° 3 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, se cada
parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas
sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas
próprias despesas. Dado que o recurso só foi acolhido parcialmente, o Tribunal,
fazendo uma justa apreciação das circunstâncias da causa, decide que a recorrente
deve suportar as suas despesas e metade das despesas da Comissão e que esta deve
suportar a outra metade das suas despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção Alargada),
decide:
1) O montante da coima aplicado à recorrente pelo artigo 3.° da Decisão
94/601/CE da Comissão, de 13 de Julho de 1994, relativa a um processo de
aplicação do artigo 85.° do Tratado CE (IV/C/33.833 Cartão), é fixado em
2 700 000 ecus.
2) Quanto ao restante, é negado provimento ao recurso.
3) A recorrente suportará as suas despesas e metade das despesas da
Comissão.
4) A Comissão suportará metade das suas despesas.
VesterdorfBriët
Lindh
Potocki Cooke
|
Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 14 de Maio de 1998.
O secretário
O presidente
H. Jung
B. Vesterdorf