Language of document : ECLI:EU:T:2009:520

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

17 de Dezembro de 2009 (*)

«Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado do carbonato de sódio na Comunidade – Decisão que dá por provada uma infracção ao artigo 81.° CE – Acordo que garante a uma empresa uma tonelagem mínima de vendas num Estado‑Membro e a compra das quantidades necessárias para atingir essa tonelagem mínima – Prescrição do poder da Comissão de aplicar coimas ou sanções – Prazo razoável – Formalidades essenciais – Afectação do comércio entre Estados‑Membros – Direito de acesso ao processo – Coima – Gravidade e duração da infracção – Circunstâncias agravantes e atenuantes»

No processo T‑58/01,

Solvay SA, com sede em Bruxelas (Bélgica), representada por L. Simont, P.‑A. Foriers, G. Block, F. Louis e A. Vallery, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por P. Oliver e J. Currall, na qualidade de agentes, assistidos por N. Coutrelis, advogado,

recorrida,

que tem por objecto, a título principal, um pedido de anulação da Decisão 2003/5/CE da Comissão, de 13 de Dezembro de 2000, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] (COMP/33.133‑B: Carbonato de sódio – Solvay, CFK) (JO 2003, L 10, p. 1), e, a título subsidiário, um pedido de anulação ou de redução da coima aplicada à recorrente,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção),

composto por: A. W. H. Meij, presidente, V. Vadapalas (relator) e A. Dittrich, juízes,

secretário: K. Pocheć, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 26 e 27 de Junho de 2008,

profere o presente

Acórdão

 Factos na origem do litígio

1        A recorrente, Solvay SA, é uma sociedade de direito belga, com actividade nos sectores da farmácia, da química, do plástico e da transformação. Produz carbonato de sódio, entre outros.

2        O carbonato de sódio encontra‑se na natureza sob a forma de minério de trona (sódio natural) ou é obtido por processo químico (sódio sintético). O sódio natural é obtido pela trituração, purificação e calcinação do minério de trona. O sódio sintético resulta da reacção do sal comum e da pedra calcária pelo processo «amónia – sódio», criado pelos irmãos Solvay em 1863.

3        À época dos factos ora em causa, a recorrente tinha actividade no sector do carbonato de sódio, por meio de unidades de comercialização estabelecidas em nove países europeus, a saber, Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, França, Itália, Países Baixos, Portugal e Suíça. Tinha também unidades de produção na Alemanha, na Áustria, na Bélgica, em Espanha, em França, na Itália e em Portugal. Em 1988, detinha 52,5% do mercado alemão.

4        Além da recorrente, os produtores comunitários eram, no período entre 1987 e 1989, as sociedades Imperial Chemical Industries (a seguir «ICI»), Rhône‑Poulenc, AKZO, Matthes & Weber e a sociedade Chemische Fabrik Kalk (a seguir «CFK»), filial da Kali & Salz, pertencente ao grupo BASF. A sua capacidade anual de produção era a seguinte: 580 000 toneladas a Rhône‑Poulenc, 435 000 toneladas a AKZO, 320 000 toneladas a Matthes & Weber e cerca de 260 000 toneladas a CFK.

5        Em Abril de 1989, a Comissão das Comunidades Europeias procedeu a inspecções junto dos diversos produtores de carbonato de sódio da Comunidade, nos termos do artigo 14.°, n.° 3, do Regulamento n.° 17 do Conselho, de 6 de Fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos [81.° CE] e [82.° CE] (JO 1962, 13, p. 204), na versão aplicável à data dos factos. Apreendeu também vários documentos nas instalações das sociedades em causa.

6        Em 19 de Fevereiro de 1990, a Comissão abriu oficiosamente um processo contra a recorrente, a ICI e a CFK, ao abrigo do artigo 3.°, n.° 1, do Regulamento n.° 17.

7        Em 13 de Março de 1990, a Comissão dirigiu uma comunicação de acusações à recorrente, à ICI e à CFK. Cada uma delas recebeu unicamente as partes da comunicação de acusações relativas às infracções a ela respeitantes, às quais eram juntas as respectivas provas acusatórias.

8        A Comissão constituiu um processo único para todas as infracções abrangidas pela comunicação de acusações.

9        No que respeita ao presente processo, a Comissão concluiu, sob o título III com a epígrafe «O acordo Solvay/CFK» da comunicação de acusações, que a recorrente tinha participado com a CFK num acordo e/ou numa prática concertada contrária ao artigo 81.° CE.

10      Em 28 de Maio de 1990, a recorrente apresentou as suas observações escritas em resposta às acusações da Comissão.

11      Em 19 de Dezembro de 1990, a Comissão adoptou a Decisão 91/298/CEE, relativa a um processo de aplicação do artigo [81.° CE] (IV/33.133‑B: Carbonato de sódio – Solvay, CFK) (JO 1991, L 152, p. 16). Nessa decisão, notificada por ofício de 1 de Março de 1991, considerou provado que «[a recorrente] e a CFK [tinham violado] o disposto no artigo [81.° CE] ao participar, desde aproximadamente 1987 até pelo menos final de 1990, num acordo de repartição dos mercados, nos termos do qual a [recorrente] garantia à CFK uma tonelagem mínima de vendas anuais de carbonato de sódio na Alemanha, calculada em função das vendas realizadas pela CFK em 1986, e compensava a CFK por qualquer défice, através da aquisição junto desta das tonelagens necessárias para que as suas vendas se situassem ao nível mínimo garantido». A recorrente e a CFK foram condenadas numa coima de três milhões de ecus e de um milhão de ecus, respectivamente.

12      Na mesma data, a Comissão adoptou a Decisão 91/297/CEE, relativa a um processo de aplicação do artigo [81.° CE] (IV/33.133‑A: Carbonato de sódio –Solvay, ICI) (JO 1991, L 152, p. 1), onde dava por provado que «[a recorrente] e a [ICI tinham violado] o disposto no artigo [81.° CE] ao participarem desde 1 de Janeiro de 1973, e pelo menos até ao início do presente processo, num acordo e/ou prática concertada através do qual limitaram as suas vendas de carbonato de sódio na CEE aos respectivos mercados internos, nomeadamente, à Europa Ocidental [c]ontinental quanto à [recorrente] e ao Reino Unido e à Irlanda, quanto à ICI». A recorrente e a ICI foram condenadas numa coima de sete milhões de ecus, respectivamente.

13      Na mesma data, a Comissão adoptou a Decisão 91/299/CEE, relativa a um processo de aplicação do artigo [82.° CE] (IV/33.133‑C: Carbonato de sódio – Solvay) (JO 1991, L 152, p. 21), onde deu por provado que «[a recorrente tinha violado] o disposto no artigo [82.° CE] a partir aproximadamente de 1983 até ao presente através de um comportamento destinado a excluir ou a limitar significativamente a concorrência e que consistia [na] conclusão de acordos com os clientes com a obrigação por parte destes de [lhe] comprarem a totalidade, ou uma grande percentagem, das quantidades necessárias à satisfação das suas necessidades em carbonato de sódio […] durante um período indeterminado ou excessivamente longo; [na] concessão de grandes descontos e de outros incentivos financeiros relativos à tonelagem marginal que vai para além da tonelagem contratual de base do cliente, com o objectivo de assegurar que este [lhe compraria] a totalidade, ou a quase totalidade, das quantidades necessárias à cobertura das suas necessidades […]; [e em] fazer depender a concessão dos descontos da condição de o cliente acordar em comprar[‑lhe] a totalidade das quantidades necessárias à cobertura das suas necessidades […]. Foi aplicada à recorrente uma coima de 20 milhões de ecus por essa infracção.

14      Sempre na mesma data, a Comissão adoptou a Decisão 91/300/CEE, relativa a um processo de aplicação do artigo [82.° CE] (IV/33.133‑D: Carbonato de sódio – ICI) (JO 1991, L 152, p. 40), onde deu por provado que «a [ICI tinha violado] o disposto no artigo [82.° CE] desde aproximadamente 1983 até ao presente através de um comportamento destinado a excluir ou a limitar seriamente a concorrência e que consistiu [em conceder] grandes descontos e outros incentivos financeiros relativos à tonelagem marginal com o objectivo de levar os clientes a comprarem à ICI a totalidade, ou a quase totalidade, das quantidades necessárias à cobertura das suas necessidades; [a]ssegurar o acordo por parte dos clientes de que comprariam a totalidade, ou a quase totalidade, das quantidades necessárias à satisfação das suas necessidades à ICI e/ou limitariam as suas compras de material a concorrentes a uma tonelagem específica [e,] [p]elo menos num caso, fazer depender a concessão dos descontos e de outros benefícios financeiros da condição de o cliente acordar em comprar à ICI a totalidade das quantidades necessárias à satisfação das suas necessidades». A ICI foi condenada numa coima de dez milhões de ecus.

15      Em 2 de Maio de 1991, a recorrente interpôs no Tribunal Geral um recurso de anulação da Decisão 91/298. Na mesma data, a recorrente pediu a anulação das Decisões 91/297 e 91/299. Em 14 de Maio de 1991, a ICI pediu a anulação das Decisões 91/297 e 91/300. A CFK não recorreu e pagou a coima de um milhão de ecus que lhe tinha sido aplicada pela Decisão 91/298.

16      Por acórdão de 29 de Junho de 1995, Solvay/Comissão (T‑31/91, Colect., p. II‑1821, a seguir «acórdão Solvay II»), o Tribunal Geral anulou a Decisão 91/298, na parte respeitante à recorrente, pelo facto de a autenticação da decisão ter sido efectuada depois da sua notificação, o que constituía uma preterição de uma formalidade essencial, na acepção do artigo 230.° CE.

17      Na mesma data, o Tribunal Geral anulou também a Decisão 91/299 (acórdão Solvay/Comissão, T‑32/91, Colect., p. II‑1825, a seguir «acórdão Solvay III») e a Decisão 91/300 (acórdão ICI/Comissão, T‑37/91, Colect., p. II‑1901, a seguir «acórdão ICI II») devido à irregular autenticação das decisões recorridas. Por outro lado, o Tribunal Geral anulou a Decisão 91/297 (acórdãos Solvay/Comissão, T‑30/91, Colect., p. II‑1775, a seguir «acórdão Solvay I», e ICI/Comissão, T‑36/91, Colect., p. II‑1847, a seguir «acórdão ICI I»), na parte relativa às recorrentes nesses dois processos, por violação do direito de acesso ao processo.

18      Por petições apresentadas na Secretaria do Tribunal de Justiça em 30 de Agosto de 1995, a Comissão recorreu dos acórdãos Solvay II, referido no n.° 16 supra, Solvay III e ICI II, referidos no n.° 17 supra.

19      Por acórdãos de 6 de Abril de 2000, Comissão/ICI (C‑286/95 P, Colect., p. I‑2341), e Comissão/Solvay (C‑287/95 P e C‑288/95 P, Colect., p. I‑2391), o Tribunal de Justiça negou provimento aos recursos interpostos dos acórdãos ICI II, referido no n.° 17 supra, Solvay II, referido no n.° 16 supra, e Solvay III, referido no n.° 17 supra.

20      Na terça‑feira, 12 de Dezembro de 2000, uma agência noticiosa publicou um comunicado de imprensa com o seguinte teor:

«A Comissão Europeia aplicará uma coima às sociedades da indústria química Solvay SA e Imperial Chemical Industries plc […] quarta‑feira, por violação do direito da concorrência da União Europeia, declarou um porta‑voz esta terça‑feira.

As coimas pelo alegado abuso de posição dominante no mercado do carbonato de sódio tinham sido aplicadas originariamente há dez anos, tendo, porém, sido anuladas pelo mais alto Tribunal de Justiça europeu, por razões processuais.

A Comissão adoptará novamente a mesma decisão na quarta‑feira, mas da forma correcta, declarou o porta‑voz.

A substância da decisão nunca foi impugnada pelas sociedades. Adoptaremos a mesma decisão, declarou.»

21      Em 13 de Dezembro de 2000, a Comissão adoptou a Decisão 2003/5/CE, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] COMP/33.133‑B: Carbonato de sódio – Solvay, CFK) (JO 2003, L 10, p. 1, a seguir «decisão recorrida»).

22      Na mesma data, a Comissão adoptou ainda as Decisões 2003/6/CE, relativa a um processo de aplicação do artigo 82.° [CE] (COMP/33.133‑C: Carbonato de sódio – Solvay) (JO 2003, L 10, p. 10), e 2003/7/CE, relativa a um processo nos termos do artigo 82.° [CE] (COMP/33.133‑D: Carbonato de sódio – ICI) (JO 2003, L 10, p. 33).

23      A decisão recorrida contém o seguinte dispositivo:

«Artigo 1.°

A Solvay […] violou o disposto no artigo [81.° CE] ao participar, desde aproximadamente 1987 até pelo menos final de 1990, num acordo de repartição dos mercados, nos termos do qual a Solvay garantia à CFK uma tonelagem mínima de vendas anuais de carbonato de sódio na Alemanha, calculada em função das vendas realizadas pela CFK em 1986, e compensava a CFK por qualquer défice, através da aquisição junto desta das tonelagens necessárias para que as suas vendas se situassem ao nível mínimo garantido.

Artigo 2.°

É aplicada à Solvay uma coima de 3 milhões de euros devido à infracção descrita no artigo 1.°

[…]»

24      A decisão recorrida está redigida praticamente nos mesmos termos da Decisão 91/298. A Comissão unicamente introduziu algumas modificações de redacção e acrescentou uma nova parte intitulada «Processos perante o Tribunal de Primeira Instância e o Tribunal de Justiça».

25      Nessa nova parte da decisão recorrida, a Comissão, baseando‑se no acórdão do Tribunal Geral de 20 de Abril de 1999, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão (T‑305/94 a T‑307/94, T‑313/94 a T‑316/94, T‑318/94, T‑325/94, T‑328/94, T‑329/94 e T‑335/94, Colect., p. II‑931, a seguir «acórdão PVC II do Tribunal Geral»), considerou que tinha «o direito de adoptar novamente uma decisão que [tivesse] sido anulada por vícios meramente processuais, […] sem dar início a um novo processo administrativo», e que «não [era] obrigada a realizar uma nova audição oral se o texto da nova decisão não [incluísse] outras objecções para além das formuladas na primeira decisão» (considerando 70).

26      A Comissão esclareceu também na decisão recorrida que o prazo de prescrição deveria ser prorrogado pelo período da pendência do recurso da Decisão 91/298 no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça, de acordo com o artigo 3.° do Regulamento (CEE) n.° 2988/74 do Conselho, de 26 de Novembro de 1974, relativo à prescrição quanto a procedimentos e execução de sanções no domínio do direito dos transportes e da concorrência da Comunidade Económica Europeia (JO L 319, p. 1; EE 08 F2 p. 41) (considerandos 75 e 76). Assim, tendo em conta as circunstâncias do caso, a Comissão considerou que tinha até Setembro de 2004 para aprovar nova decisão (considerando 78). Indicou ainda que não existia qualquer violação do direito de defesa se a nova decisão fosse aprovada num prazo razoável (considerando 70).

27      No que respeita à infracção propriamente dita, a Comissão precisou na decisão recorrida que a recorrente e a CFK tinham chegado a um entendimento ou a um acordo que estipulava que a recorrente garantia à CFK um mínimo anual de vendas no mercado alemão. Se as vendas da CFK na Alemanha fossem inferiores ao mínimo garantido, a recorrente «compraria o défice» à CFK (considerando 42). Segundo a Comissão, a garantia da CFK tinha sido inicialmente fixada em 179 000 toneladas, número aparentemente baseado nas vendas realizadas pela CFK na Alemanha em 1986, e, posteriormente, aumentada para 190 000 toneladas em 1989 com um mecanismo de compensação retroactivo para o ano de 1988 (considerandos 43, 45 e 46).

28      Na decisão recorrida, a Comissão baseou‑se também numa reunião de 14 de Março de 1989, à qual assistiram dirigentes da CFK e da sua empresa‑mãe Kali & Salz, por um lado, e da Deutsche Solvay Werke (DSW), uma filial da recorrente. Segundo a Comissão, era muito significativo o facto de não ter sido elaborado qualquer registo ou acta oficial dessa reunião. Contudo, a Comissão acrescentou que tinha sido apreendida uma breve nota manuscrita nas instalações da DSW (considerando 47).

29      A Comissão indicou na decisão recorrida que o acordo tinha claramente por objectivo criar as condições para uma estabilidade artificial do mercado e que, como contrapartida por retomar um comportamento em matéria de preços que a recorrente não considerasse prejudicial, foi concedida à CFK uma quota mínima do mercado alemão. A Comissão acrescentou ainda que, ao retirar do mercado a tonelagem que a CFK não podia vender, a recorrente assegurava que os níveis de preços não baixariam devido à concorrência. Daí inferiu que os acordos, do tipo «cartel», que tinham sido postos em prática e produzido o efeito pretendido, restringiam a concorrência, na acepção do n.° 1 do artigo 81.° CE (considerandos 55 à 58).

30      Quanto ao efeito no comércio entre Estados‑Membros, a Comissão considerou na decisão recorrida que o facto de a tonelagem mínima garantida dizer apenas respeito às vendas no mercado alemão não impedia de modo algum a aplicação do artigo 81.° CE. Segundo a Comissão, o acordo fazia parte de uma política global de controlo do mercado do carbonato de sódio na Comunidade e o acordo entre a recorrente e a CFK tinha por objectivo não só reduzir a concorrência de forma substancial na Comunidade mas também manter a rigidez da estrutura de mercado existente e a sua repartição em função das fronteiras nacionais. A Comissão considerou ainda que, na ausência do acordo, era muito provável que a tonelagem adquirida pela recorrente nos termos da garantia fosse colocada pela CFK noutros mercados da Comunidade (considerando 59).

31      A Comissão concluiu na decisão recorrida que a recorrente e a CFK tinham cometido uma infracção ao artigo 81.° CE ao participarem, «desde aproximadamente 1986 até final de 1990» nesse acordo (considerando 60).

32      Quanto às coimas aplicadas à recorrente e à CFK, a Comissão precisou na decisão recorrida que a infracção era «grave» pelo facto de os acordos de repartição de mercados constituírem, pela sua própria natureza, grandes restrições da concorrência. No que respeita à duração da infracção, a Comissão calculou o montante das coimas considerando que o acordo tinha sido celebrado numa data qualquer em 1987 (considerandos 62 e 63).

33      Resulta também da decisão recorrida que, para determinar o montante da coima, a Comissão tomou em consideração a posição dominante da recorrente no mercado enquanto principal produtor na Alemanha e na Comunidade (considerando 64). A Comissão deu ainda por provado que a infracção tinha sido cometida deliberadamente e que ambas as partes deviam ter plena consciência da óbvia incompatibilidade entre os seus acordos e o direito comunitário (considerando 65).

34      Por último, a Comissão referiu na decisão recorrida que já por várias vezes tinha aplicado coimas substanciais à recorrente por colusão na indústria química.

35      Em 13 de Dezembro de 2000, a Comissão publicou também um comunicado de imprensa em que indicava que iria adoptar decisões em que aplicaria à recorrente e à ICI coimas idênticas às inicialmente aplicadas nos processos «Carbonato de sódio».

 Tramitação do processo

36      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de Março de 2001, a recorrente interpôs o presente recurso.

37      Em 8 de Maio de 2001, o processo foi distribuído à Quarta Secção do Tribunal Geral, tendo sido nomeado um juiz‑relator.

38      Autorizadas pelo Tribunal Geral, a recorrente e a Comissão apresentaram as suas observações, respectivamente, em 6 e 23 de Dezembro de 2002, quanto às consequências que, para o presente processo, se poderiam extrair do acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Outubro de 2002, Limburgse Vinyl Maatschappij e o./Comissão (C‑238/99 P, C‑244/99 P, C‑245/99 P, C‑247/99 P, C‑250/99 P a C‑252/99 P e C‑254/99 P, Colect., p. I‑8375, a seguir «acórdão PVC II do Tribunal de Justiça»).

39      Tendo sido alterada a composição das Secções do Tribunal Geral a contar de 1 de Outubro de 2003, o juiz‑relator foi afectado à Primeira Secção, à qual, consequentemente, o presente processo foi distribuído em 8 de Outubro de 2003.

40      Em 19 de Dezembro de 2003, o Tribunal Geral convidou a Comissão a apresentar a comunicação de acusações, os respectivos anexos e uma lista enumerativa detalhada de todos os documentos do processo. Essa lista deveria conter uma indicação sucinta que permitisse identificar o autor, a natureza e o conteúdo de cada documento. O Tribunal Geral pediu ainda à Comissão que lhe indicasse a quais desses documentos tinha sido facultado acesso à recorrente no procedimento administrativo.

41      Em 13 de Fevereiro de 2004, a Comissão juntou a comunicação de acusações e respectivos anexos, bem como a lista enumerativa pedida. Pediu um prazo para responder ao último pedido do Tribunal Geral.

42      Por ofício de 10 de Março de 2004, a Comissão precisou que, no procedimento administrativo, a recorrente tinha tido acesso aos documentos de suporte da comunicação de acusações e que lhe estavam juntos. Além disso, referiu 65 «subprocessos» que compunham o processo, entre os quais se encontravam 22 «subprocessos» provenientes da sede da recorrente ou de uma das suas filiais (os «subprocessos» n.os 2 a 14, 24 a 27, 50 a 52 e 62 a 65 e uma parte do «subprocesso» n.° 61). Segundo a Comissão, o procedimento seguido em 1990 respeitava a jurisprudência existente sobre o direito de acesso ao processo. Acrescentou que, após releitura do processo instrutor, nada indicava nessa fase que os direitos de defesa tivessem sido violados no procedimento administrativo, mesmo analisando esse processo instrutor à luz da jurisprudência posterior relativa ao direito de acesso ao processo.

43      Por ofício de 21 de Junho de 2004, a Comissão enviou à Secretaria do Tribunal Geral uma lista enumerativa revista dos documentos do procedimento administrativo mais completa que a fornecida em 13 de Fevereiro de 2004. Como a anterior, essa lista enumerativa revista referia 65 «subprocessos». Enunciava também alguns documentos, na maioria provenientes da sociedade Oberland Glas.

44      Por carta de 21 de Julho de 2004, o Tribunal Geral convidou a recorrente a indicar os documentos da lista enumerativa revista que não lhe tivessem sido facultados no procedimento administrativo e que, na sua opinião, fossem susceptíveis de conter elementos que pudessem ser úteis à sua defesa.

45      Por carta de 29 de Setembro de 2004, a recorrente salientou que a lista enumerativa revista estava incompleta e era imprecisa. Indicou também quais dos documentos repertoriados nessa lista enumerativa revista lhe pareciam úteis à sua defesa e que desejaria consultar. Afirma que esses documentos lhe poderiam ter permitido desenvolver a sua argumentação sobre o efeito do acordo em causa no comércio entre Estados‑Membros.

46      Tendo a composição das Secções do Tribunal Geral sido modificada a partir de 13 de Setembro de 2004, o juiz‑relator foi afectado, na qualidade de presidente, à Quarta Secção, na sua nova composição, à qual, por conseguinte, o presente processo foi distribuído em 7 de Outubro de 2004.

47      Em 17 de Dezembro de 2004, o Tribunal Geral convidou a Comissão a apresentar na Secretaria os documentos do processo mencionados pela recorrente na carta de 29 de Setembro de 2004, em versões confidencial e não confidencial.

48      Por ofício de 28 de Janeiro de 2005, a Comissão apresentou na Secretaria do Tribunal Geral a versão confidencial dos documentos do processo pedidos. Pediu um prazo suplementar para apresentar uma eventual versão não confidencial, visto que as empresas em causa deveriam ser consultadas sobre o seu interesse de manutenção da confidencialidade. A Comissão esclareceu também o seguinte:

«A lista, embora incluindo todos os processos na sua posse na presente data, não reproduz todos os processos mencionados em juízo no primeiro processo Carbonato de sódio. Apesar de longas buscas, não se consegue encontrar os processos em falta.»

49      Por ofício de 15 de Março de 2005, indicando que as empresas em causa não pediam tratamento confidencial, a Comissão apresentou as seguintes observações:

«No que respeita aos processos que não se consegue encontrar, a Comissão lamenta não poder dar uma resposta totalmente fiável às questões do Tribunal.

O processo administrativo ([isto é] o processo relativo ao procedimento a partir da abertura do inquérito até ao envio da comunicação de acusações) actualmente em poder da Comissão contém 65 pastas numeradas que abrangem o período até Setembro de 1989 e o processo com o n.° 71, que contém a comunicação de acusações de Março de 1990 e os seus anexos, bem como uma pasta não numerada, denominada ‘Oberland Glas’. É de crer, portanto, que estão em falta cinco pastas.

No que respeita ao conteúdo das pastas em falta, a Comissão lamenta informar que é impossível redigir a lista completa dos documentos desaparecidos, pois também não se consegue encontrar os índices dessas pastas. Dito isto, tudo permite acreditar que pelo menos algumas delas continham correspondência trocada nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17, o que corresponde à explicação dada pela Comissão ao Tribunal Geral sobre o procedimento administrativo em 1990. Por exemplo, é provável que a resposta da […] ICI ao pedido de informações da Comissão de 19 de Junho de 1989 faça parte dos processos em falta: esse pedido feito à ICI ainda consta do processo administrativo nas mãos da Comissão, mas falta a resposta.»

50      Em 14 de Abril de 2005, a recorrente consultou na Secretaria do Tribunal Geral os documentos do processo mencionados na sua carta de 29 de Setembro de 2004.

51      Em 15 de Julho de 2005, a recorrente apresentou as suas observações sobre a utilidade desses documentos para a sua defesa. Em 17 de Novembro de 2005, a Comissão respondeu às observações da recorrente.

52      Por cessação de funções do juiz‑relator inicialmente designado, o presidente do Tribunal Geral, por decisão de 22 de Junho de 2006, nomeou um novo juiz‑relator.

53      Tendo sido alterada a composição das Secções do Tribunal Geral a contar de 25 de Setembro de 2007, o juiz‑relator foi afectado à Sexta Secção, à qual, consequentemente, o presente processo foi distribuído em 5 de Outubro de 2007.

54      Em 12 de Fevereiro de 2008, por impedimento do juiz T. Tchipev, o presidente do Tribunal Geral, nos termos do artigo 32.°, n.° 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, nomeou o juiz A. Dittrich para completar a Secção.

55      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Sexta Secção) decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, colocou, em 5 de Maio de 2008, determinadas perguntas por escrito à recorrente e à Comissão. Ambas responderam no prazo fixado.

56      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas orais do Tribunal Geral na audiência de 26 de Junho de 2008.

 Pedidos das partes

57      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        a título principal, declarar extinto o procedimento de aplicação de sanção por força do decurso do tempo e, de qualquer forma, anular a decisão recorrida;

–        a título subsidiário, declarar prescrito o poder da Comissão de aplicar coimas e, de qualquer forma, anular o artigo 2.° da decisão recorrida na parte em que lhe aplica uma coima de três milhões de euros;

–        a título ainda mais subsidiário, declarar não aplicável qualquer coima ou, pelo menos, reduzi‑la substancialmente;

–        a título de diligência de instrução, ordenar que a Comissão apresente todos os documentos internos relativos à adopção da decisão recorrida e, em particular, as actas de todas as reuniões do colégio de comissários em que tenha sido discutida a decisão recorrida;

–        ordenar que a Comissão apresente todos os documentos que compõem o seu processo instrutor no procedimento COM/33.133;

–        condenar a Comissão nas despesas.

58      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso por improcedente;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

59      Os pedidos da recorrente visam, a título principal, a anulação da decisão recorrida e, a título subsidiário, a anulação ou a redução da coima que lhe foi aplicada por essa decisão.

1.     Quanto ao pedido de anulação da decisão recorrida

60      A recorrente invoca, no essencial, quatro fundamentos de anulação da decisão recorrida. Esses fundamentos são relativos, primeiro, ao decurso do tempo, segundo, à preterição de formalidades essenciais, terceiro, à inexistência de afectação do comércio entre Estados‑Membros e, quarto, à violação do direito de acesso ao processo.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao decurso do tempo

61      O primeiro fundamento articula‑se em duas partes, relativas, respectivamente, à aplicação errada das regras da prescrição previstas no Regulamento n.° 2988/74 e à violação do princípio do prazo razoável.

 Quanto à primeira parte, relativa à aplicação errada das regras da prescrição

–       Argumentos das partes

62      A recorrente alega que o raciocínio seguido pela Comissão a respeito das regras da prescrição é contrário à letra e ao espírito do Regulamento n.° 2988/74.

63      Segundo a recorrente, o recurso de segunda instância interposto pela Comissão em 30 de Agosto de 1995, que não teve efeito suspensivo por força do artigo 60.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, não tinha por objecto a Decisão 91/298, que tinha deixado de existir de forma retroactiva, mas sim o acórdão Solvay II, referido no n.° 16 supra. Com efeito, por força do artigo 58.° do Estatuto do Tribunal de Justiça, o processo de segunda instância limita‑se às questões de direito e o Tribunal de Justiça procede a uma fiscalização da legalidade, baseando‑se na apreciação soberana do Tribunal Geral quanto à matéria de facto.

64      Embora o «processo pendente no Tribunal de Justiça» a que se refere o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 deva ser interpretado no sentido de incluir também o Tribunal Geral, a criação de um duplo grau jurisdicional não permite que se alargue o período de suspensão da prescrição para abranger um processo cujo objecto não é a decisão recorrida. Por outro lado, alegar que o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 implica a suspensão da prescrição durante um recurso de segunda instância seria dar efeito a uma decisão anulada ab initio, o que não tem precedente na prática comum dos Estados‑Membros.

65      Baseando‑se no n.° 1098 do acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, a recorrente assinala que o objectivo do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 é permitir a suspensão da prescrição quando a Comissão estiver impedida de intervir por uma razão objectiva que não lhe seja imputável, relativa ao próprio facto de estar pendente um recurso. A recorrente entende que, no caso, a Comissão podia afirmar‑se impedida de agir enquanto estivesse pendente o recurso no Tribunal Geral. Em contrapartida, a partir da prolação do acórdão do Tribunal Geral, a Comissão, sem prejuízo do respeito do princípio do prazo razoável, tinha a liberdade de adoptar nova decisão. Assim, ao interpor recurso de segunda instância, a Comissão assumiu o risco de a sua acção prescrever, mesmo tendo conhecimento do acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de Junho de 1994, Comissão/BASF e o. (C‑137/92 P, Colect., p. I‑2555), que se tinha pronunciado sobre a falta de autenticação dos actos adoptados pelo colégio de comissários. Assim, nenhuma razão objectiva justifica a inércia da Comissão enquanto o seu recurso estava pendente no Tribunal de Justiça.

66      Por conseguinte, só o tempo do processo no Tribunal Geral poderia ser tido em conta para a prorrogação do prazo de prescrição. Esse prazo teve o seu termo, portanto, em 15 de Janeiro de 2000, muito antes da adopção da decisão recorrida.

67      A recorrente assinala também que, no acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, essa interpretação não é posta em causa. Com efeito, nesse processo, a nova decisão da Comissão foi adoptada num prazo inferior ao prazo de cinco anos unicamente acrescido do «prazo de suspensão» relativo ao processo no Tribunal Geral. Assim, no acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, não foi analisada a questão de saber se um recurso de segunda instância tem efeito suspensivo, na acepção do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74.

68      Na réplica, a recorrente acrescenta que a tese da Comissão leva a deixar o acórdão Solvay II, referido no n.° 16 supra, sem qualquer efeito enquanto não tivesse sido confirmado pelo Tribunal de Justiça, o que viola a autoridade desse acórdão. Por outro lado, dar uma interpretação extensiva ao artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, abrangendo situações em que a Comissão não está impedida de agir, é contrário ao princípio da segurança jurídica.

69      Por último, nas suas observações apresentadas na sequência do acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, a recorrente alega que nem o Tribunal Geral nem o Tribunal de Justiça podiam, no processo que deu origem a esse acórdão, ter a intenção de decidir a questão de saber se o recurso de segunda instância interposto de um acórdão de anulação pela Comissão tem o efeito de suspender a prescrição durante o tempo do processo em recurso.

70      A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

71      A título preliminar, há que salientar que o Regulamento n.° 2988/74 institui uma regulamentação completa que rege em pormenor os prazos em que a Comissão, sem pôr em causa a exigência fundamental de segurança jurídica, pode aplicar coimas às empresas sujeitas a procedimentos de aplicação das normas comunitárias de concorrência (acórdãos do Tribunal Geral de 19 de Março de 2003, CMA CGM e o./Comissão, T‑213/00, Colect., p. II‑913, n.° 324, e de 18 de Junho de 2008, Hoechst/Comissão, T‑410/03, Colect., p. II‑881, n.° 223).

72      Assim, nos termos do artigo 1.°, n.° 1, alínea b), e n.° 2, e ainda do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento n.° 2988/74, a prescrição dos procedimentos opera quando a Comissão não tenha aplicado uma coima ou uma sanção nos cinco anos seguintes ao ponto de partida do prazo de prescrição se não tiver entretanto ocorrido um acto interruptivo ou, no máximo, nos dez anos seguintes a esse mesmo ponto de partida se tiverem sido praticados actos interruptivos. Contudo, nos termos do artigo 2.°, n.° 3, desse regulamento, esse prazo de prescrição é prorrogado pelo período em que a prescrição tenha estado suspensa nos termos do artigo 3.° do mesmo regulamento (acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.° 140).

73      Nos termos do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, a prescrição de procedimentos suspende‑se enquanto a decisão da Comissão for objecto de um processo pendente no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias.

74      No presente caso, resulta da decisão recorrida que, nesse procedimento, a Comissão aplicou as regras da prescrição da forma seguinte.

75      Primeiro que tudo, a Comissão entendeu que, quanto a infracções continuadas, o prazo de prescrição tinha começado a correr no final de 1990. Acrescentou também que, mesmo admitindo que a infracção tivesse chegado ao fim em 19 de Dezembro de 1990 e que a adopção e a notificação da Decisão 91/298 não tivessem interrompido o prazo de prescrição, o prazo para a Comissão aprovar a sua decisão correria, pelo menos, até final de 1995 (considerando 74).

76      Seguidamente, a Comissão considerou que o prazo de prescrição deveria ser prorrogado pelo período em que o recurso da decisão esteve pendente no Tribunal Geral (considerando 75). Ora, no caso, uma vez que o recurso tinha sido interposto nesse Tribunal em 2 de Maio de 1991, o acórdão tinha sido proferido pelo Tribunal Geral em 29 de Junho de 1995, o recurso de segunda instância tinha sido interposto no Tribunal de Justiça em 30 de Agosto de 1995 e o acórdão tinha sido proferido pelo Tribunal de Justiça em 6 de Abril de 2000, a prescrição tinha estado suspensa por um período mínimo de oito anos, nove meses e quatro dias (considerando 77). Consequentemente, a Comissão entendeu que o prazo para adoptar uma nova decisão ia até Setembro de 2004 (considerando 78).

77      Daí resulta que, segundo a Comissão, a decisão recorrida, de 13 de Dezembro de 2000, foi adoptada antes do termo do prazo de prescrição.

78      A esse respeito, refira‑se, antes de mais, que o prazo de prescrição começou a correr quando a infracção chegou ao fim, isto é, 1989, como adiante indicado nos n.os 293 a 305, e não em 1990, como refere a Comissão.

79      Em seguida, como acertadamente salientam as partes, a referência do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 a «um processo pendente no Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias» deve ser interpretada, desde a criação do então Tribunal de Primeira Instância, no sentido de que em primeiro lugar se refere a um processo pendente nesse Tribunal, na medida em que os recursos relativos a sanções ou coimas no domínio do direito da concorrência são da sua competência. Por conseguinte, suspendeu‑se a prescrição durante todo o processo no Tribunal Geral.

80      Por último, resulta do n.° 157 do acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, que a prescrição, na acepção do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, suspende‑se enquanto a decisão em causa for objecto de um processo pendente «no Tribunal [Geral] e no Tribunal de Justiça». Por conseguinte, a prescrição também ficou suspensa durante todo o tempo do processo no Tribunal de Justiça, sem que seja necessário decidir sobre o período entre a prolação do acórdão do Tribunal Geral e o recurso para o Tribunal de Justiça.

81      Em face do exposto, a prescrição não operou no presente caso, visto que o prazo de prescrição começou a correr em 1989 e a Comissão aplicou uma coima em 13 de Dezembro de 2000, isto é, dentro do prazo de cinco anos a seguir ao ponto de partida do prazo de prescrição, prorrogado pelo período da suspensão da prescrição. A esse respeito, o erro cometido pela Comissão na decisão recorrida quanto à data do fim da infracção não tem qualquer consequência no facto de a decisão recorrida ter sido adoptada com observância das regras da prescrição consagradas no Regulamento n.° 2988/74.

82      Nenhum dos argumentos da recorrente é susceptível de pôr isto em causa.

83      Com efeito, em primeiro lugar, refira‑se que o artigo 60.° do Estatuto do Tribunal de Justiça e o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 têm um âmbito de aplicação diferente. O facto de um recurso de segunda instância não ter efeito suspensivo não é susceptível de privar de qualquer efeito útil o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, que respeita a situações em que a Comissão tem de aguardar a decisão do tribunal comunitário. Não procede, pois, a tese da recorrente de que a Comissão não podia ter em conta o período da pendência de um recurso de segunda instância no Tribunal de Justiça, pois isso levaria a privar o acórdão do Tribunal de Justiça em segunda instância da sua razão de ser e dos seus efeitos.

84      Em segundo lugar, quanto ao argumento da recorrente de que a criação de um duplo grau jurisdicional não permite alargar o período de suspensão da prescrição, há que lembrar que o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 protege a Comissão contra o efeito da prescrição nas situações em que tenha de aguardar a decisão do tribunal comunitário, no âmbito de processos cuja tramitação não domina, antes de saber se o acto recorrido está ou não ferido de ilegalidade (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.° 144).

85      Em terceiro lugar, quanto ao argumento de que o acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, não é relevante para a decisão da presente causa, resulta claramente do texto desse acórdão, pelo contrário, que, de forma geral, há que adicionar ao prazo de prescrição o período da suspensão da prescrição, isto é, não só o período da pendência do processo no Tribunal Geral mas também o período da pendência do processo no Tribunal de Justiça.

86      Em quarto lugar, quanto ao argumento de que a suspensão da prescrição pelo tempo de um processo em recurso de segunda instância levaria a conceder efeitos a uma decisão anulada em primeira instância, basta referir que a suspensão da prescrição apenas permite que a Comissão eventualmente adopte uma nova decisão no caso de negação de provimento ao recurso interposto de um acórdão do Tribunal Geral que anula uma decisão da Comissão. Essa suspensão da prescrição não tem qualquer efeito na decisão anulada pelo acórdão do Tribunal Geral.

87      Em quinto lugar, é certo que, em caso de recurso de segunda instância, a Comissão não está formalmente impedida de agir e adoptar nova decisão na sequência da anulação da decisão inicial pelo Tribunal Geral. Contudo, um recurso interposto de uma decisão final que aplique sanções suspende a prescrição em matéria de procedimentos sancionatórios até que o tribunal comunitário decida definitivamente sobre o recurso (acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.° 147). Com efeito, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 protege a Comissão contra o efeito da prescrição nas situações em que tenha de aguardar a decisão do tribunal comunitário, no âmbito de processos cuja tramitação não domina, antes de saber se o acto recorrido está ou não ferido de ilegalidade. O artigo 3.° diz, portanto, respeito a casos em que a inércia da instituição não é consequência de uma falta de diligência (acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.° 144). Assim, não se pode criticar a Comissão por ter interposto um recurso de segunda instância, no exercício dos seus direitos de defesa, e aguardado pelo acórdão Comissão/Solvay, referido n.° 19 supra, antes de adoptar nova decisão.

88      Em sexto lugar, há que acrescentar que a interpretação do artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74 proposta pela recorrente conduz a sérias dificuldades práticas. Com efeito, se a Comissão tiver de adoptar uma nova decisão na sequência da anulação de uma decisão pelo Tribunal Geral, sem aguardar o acórdão do Tribunal de Justiça, existe o risco de coexistirem duas decisões com o mesmo objecto no caso de o Tribunal de Justiça anular o acórdão do Tribunal Geral.

89      Além disso, vai contra as exigências da economia processual administrativa impor à Comissão que, unicamente para evitar a prescrição, adopte nova decisão antes de saber se a decisão inicial está ou não ferida de ilegalidade.

90      Resulta do exposto que não pode ser acolhida a primeira parte do primeiro fundamento.

 Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio do prazo razoável

–       Argumentos das partes

91      A recorrente alega que teve conhecimento da «acusação que lhe é feita» em 13 de Março de 1990, data em que a comunicação de acusações lhe foi dirigida, isto é, onze anos antes da data da interposição do presente recurso. Além disso, o que está em causa na presente lide é particularmente importante para ela, uma vez que, na Decisão 91/298 e depois na decisão recorrida, a Comissão lhe imputou uma infracção grave e lhe aplicou uma coima de três milhões de euros. Ora, no momento da interposição do presente recurso, ainda não tinha sido adoptada nenhuma decisão definitiva sobre as acusações que lhe tinham sido dirigidas na comunicação de acusações.

92      Baseando‑se no artigo 6.°, n.° 1, da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (a seguir «CEDH »), assinada em Roma, em 4 de Novembro de 1950, a recorrente assinala que, no seu conjunto, o processo lançado em Fevereiro de 1990 ultrapassou manifestamente um prazo razoável. A este respeito, a jurisprudência comunitária não prevê que a duração do processo deva ser apreciada por etapas. Assim, nada pode justificar que a Comissão tenha esperado cinco anos e meio para adoptar uma nova decisão, tanto mais que o recurso para o Tribunal de Justiça não tinha efeito suspensivo.

93      Na sequência do acórdão Solvay II, referido no n.° 16 supra, a Comissão não só optou por interpor um recurso cuja improcedência podia esperar à luz do acórdão Comissão/BASF e o., referido no n.° 65 supra, mas também por aguardar o seu resultado antes de adoptar a decisão recorrida. Além disso, segundo a recorrente, a Comissão aguardou ainda mais oito meses depois do acórdão Comissão/Solvay, referido no n.° 19 supra, quando no processo que deu origem ao acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, a nova decisão tinha sido adoptada no prazo de um mês e meio.

94      Por outro lado, a Comissão confunde prazo razoável e prazo de prescrição, ao considerar, erradamente, ter sido autorizada a aguardar 2004 para adoptar uma nova decisão. Assim, na decisão recorrida, a Comissão não indica em que elementos se baseia para considerar que o prazo razoável foi respeitado. Segundo a recorrente, qualquer que possa ser a justificação do tempo de cada etapa do processo, «um prazo de catorze a dezasseis anos ou mais para todo o processo entre a comunicação de acusações e a decisão definitiva do Tribunal Geral ou do Tribunal de Justiça» não pode ser qualificado de razoável.

95      Assim, cabe ao Tribunal Geral declarar excedido o prazo razoável e anular a decisão recorrida, uma vez que não é possível, nessa fase, formular um juízo num prazo razoável sobre as acusações feitas à recorrente. Qualquer outra solução, por exemplo a de ter em conta o excesso do prazo razoável na fixação do montante da coima, não sanaria a violação do artigo 6.° da CEDH. Além disso, a recorrente alega que, de acordo com os princípios aplicados pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, não tem de demonstrar que esse excesso do prazo razoável prejudicou os seus direitos de defesa, o que seria um fundamento de anulação distinto. Com efeito, o critério da lesão dos direitos de defesa é distinto do direito de ser julgado num prazo razoável em matéria penal.

96      De qualquer forma, a recorrente alega que o excesso do prazo razoável e a deterioração das provas daí resultante a impede de se defender, nomeadamente privando‑a da possibilidade de dar suporte aos argumentos apresentados na petição. Além disso, a recorrente alega que já não pode recorrer aos seus antigos trabalhadores que estavam empregados no sector e na filial em causa. Assim, a recorrente alega ter sido «prejudicada concretamente na sua defesa».

97      A recorrente entende que a inércia culposa da Comissão ao longo dos cinco anos e meio posteriores ao acórdão Solvay II, referido no n.° 16 supra, deve ser especialmente punida. A esse respeito, a recorrente precisa que teve razões para acreditar legitimamente que a Comissão tinha desistido de reabrir o processo, de forma que não tentou conservar sistematicamente um registo dos factos e documentos eventualmente úteis à sua defesa. Além disso, a sua política de arquivos impõe‑lhe, salvo em circunstâncias excepcionais, uma destruição sistemática dos arquivos ao fim de dez anos, ou mesmo cinco anos.

98      Por último, considerar que cabe à recorrente o ónus da prova da falta de razoabilidade do prazo seria contrário à jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, segundo a qual cabe às autoridades nacionais, em face de longos períodos de inactividade, explicá‑los, só podendo ser justificados em circunstâncias excepcionais. A recorrente alega também que, ao contrário da Comissão, não lhe pode ser imputada qualquer manobra destinada a atrasar o processo desde 1989. Assinala que a Comissão se revelou incapaz de respeitar as normas internas de autenticação e o princípio da segurança jurídica, o que atrasou em vários anos a análise de mérito da decisão inicial.

99      A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

100    A título preliminar, há que lembrar que o princípio do prazo razoável tem de ser respeitado em matéria de concorrência, nos procedimentos administrativos abertos nos termos do Regulamento n.° 17 susceptíveis de conduzir à aplicação das sanções previstas nesse diploma e no processo jurisdicional nos tribunais comunitários (acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.° 179).

101    Em primeiro lugar, em apoio da sua alegação de falta de razoabilidade da duração do procedimento administrativo, a recorrente invoca o facto de, apesar de o recurso de segunda instância não ter efeito suspensivo, a Comissão ter esperado cinco anos e meio para adoptar uma nova decisão na sequência da anulação da Decisão 91/298 pelo acórdão Solvay II, referido no n.° 16 supra.

102    Ora, como mencionado na análise da primeira parte do primeiro fundamento, suspendeu‑se a prescrição de acordo com o artigo 3.° do Regulamento n.° 2988/74, durante todo o tempo do processo no Tribunal de Justiça na sequência da interposição do recurso de segunda instância contra o acórdão Solvay II, referido no n.° 16 supra. Portanto, não se pode imputar à Comissão qualquer violação do princípio do prazo razoável unicamente por ter esperado que o Tribunal de Justiça decidisse o recurso de segunda instância, antes de adoptar a decisão recorrida.

103    Em segundo lugar, a recorrente alega, mais em geral, que a duração do procedimento administrativo, no seu conjunto, isto é, entre o envio da comunicação de acusações e a adopção da decisão recorrida, excedeu um prazo razoável.

104    Este argumento deve ser rejeitado.

105    Com efeito, no âmbito da análise de uma alegação de violação do princípio do prazo razoável, há que fazer uma distinção entre o procedimento administrativo e o processo jurisdicional. Assim, o período em que o juiz comunitário analisou a legalidade da Decisão 91/298 e a validade do acórdão Solvay II, referido no n.° 16 supra, não pode ser tido em conta na determinação da duração do procedimento na Comissão (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.os 202 a 204).

106    Em terceiro lugar, a recorrente critica a duração do procedimento administrativo entre a prolação do acórdão Comissão/Solvay, referido no n.° 19 supra, e a adopção da decisão recorrida.

107    A esse respeito, há que lembrar que esse período começou em 6 de Abril de 2000, data da prolação do acórdão Comissão/Solvay, referido no n.° 19 supra, e teve o seu termo em 13 de Dezembro de 2000, com a adopção da decisão recorrida. Essa etapa do procedimento administrativo durou, portanto, oito meses e sete dias.

108    Nesse período, a Comissão apenas procedeu a modificações de forma da Decisão 91/298, nomeadamente com a introdução de uma nova passagem relativa aos «[p]rocessos perante o Tribunal de Primeira Instância e o Tribunal de Justiça», sobre a apreciação dos prazos de prescrição. Por outro lado, a adopção da decisão recorrida não foi precedida de qualquer acto de instrução suplementar, tendo‑se a Comissão baseado nos resultados do inquérito levado a cabo dez anos antes. Contudo, há que admitir que, mesmo nessas condições, certas investigações e concertações na administração podem ser indispensáveis para se chegar a esse resultado.

109    Nessa perspectiva, não há que considerar que o prazo de oito meses e sete dias decorrido entre a prolação do acórdão Comissão/Solvay, referido no n.° 19 supra, e a adopção da decisão recorrida não é razoável.

110    Em quarto lugar, quanto à duração do procedimento administrativo entre o envio da comunicação de acusações e a adopção da Decisão 91/298, refira‑se que a recorrente não alega que, só por si, merece crítica. Com efeito, a recorrente limita‑se a afirmar que o carácter razoável do prazo devia ser avaliado a partir de 13 de Março de 1990, isto é, a data em que a comunicação de acusações lhe foi dirigida, sem criticar o período de onze meses e meio decorrido entre a comunicação de acusações e a adopção da Decisão 91/298, em 1 de Março de 1991.

111    Resulta do exposto que a recorrente não apresentou qualquer elemento que permita considerar que a duração de todo o procedimento administrativo foi excessiva no presente caso.

112    Com efeito, mesmo embora se deva ter em conta a fase do procedimento administrativo anterior à comunicação de acusações (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Setembro de 2006, Nederlandse Federatieve Vereniging voor de Groothandel op Elektrotechnisch Gebied/Comissão, C‑105/04 P, Colect., p. I‑8725, n.° 51), há que considerar que a duração de todo o procedimento administrativo não é excessiva, nomeadamente à luz das investigações efectuadas a partir de Abril de 1989, dos pedidos de informações efectuados na sequência disso e da abertura oficiosa do procedimento em 19 de Fevereiro de 1990. Nestas condições, nem a duração de cerca de onze meses entre as investigações efectuadas a partir de Abril de 1989 pela Comissão e a data da comunicação de acusações nem a duração de todo o procedimento administrativo podem ser consideradas não razoáveis.

113    Diga‑se ainda que, de qualquer forma, a violação do princípio do prazo razoável só justificaria a anulação da decisão tomada no termo de um procedimento administrativo em matéria de concorrência se implicasse também uma violação dos direitos de defesa da empresa em causa. Com efeito, quando não se prove que o decurso excessivo do tempo tenha afectado a capacidade de as empresas em questão se defenderem efectivamente, o desrespeito do princípio do prazo razoável não tem incidência na validade do procedimento administrativo (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, n.° 122).

114    A esse respeito, a recorrente alega que lhe é difícil defender‑se de acusações relativas a factos alegadamente ocorridos nessa época, pois já não pode recorrer aos seus empregados no momento dos factos no sector e na filial em causa.

115    Contudo, a Comissão não procedeu a qualquer acto de instrução entre a prolação do acórdão Comissão/Solvay, referido no n.° 19 supra, e a decisão recorrida.

116    Além disso, resulta da decisão recorrida que esta se baseou nos mesmos fundamentos da Decisão 91/298, que o conteúdo das duas decisões é quase idêntico e que a Comissão não teve em conta qualquer elemento novo que necessitasse do exercício de um direito de defesa.

117    Nestas circunstâncias, os direitos de defesa da recorrente não foram violados.

118    Em quinto lugar, quanto ao processo jurisdicional, há que observar que, na petição, a recorrente não põe directamente em causa a duração do processo no Tribunal Geral nem no Tribunal de Justiça no que respeita à Decisão 91/298.

119    De qualquer forma, há que lembrar que o princípio geral de direito comunitário nos termos do qual qualquer pessoa tem direito a um processo equitativo, que se inspira no artigo 6.°, n.° 1, da CEDH, nomeadamente o direito a um processo num prazo razoável, é aplicável no âmbito do recurso jurisdicional de uma decisão da Comissão que aplica coimas a uma empresa por violação do direito da concorrência. O carácter razoável do prazo é apreciado em função das circunstâncias concretas de cada processo, designadamente, da importância do litígio para o interessado, da complexidade do processo, bem como do comportamento do recorrente e das autoridades competentes. A lista destes critérios não é taxativa e a apreciação do carácter razoável do prazo não exige uma análise sistemática das circunstâncias da causa à luz de cada um deles quando a duração do processo se revela justificada à luz de apenas um. Assim, a complexidade do processo pode justificar um prazo à primeira vista demasiado longo (v. acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de Janeiro de 2007, Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão, C‑403/04 P e C‑405/04 P, Colect., p. I‑729, n.os 115 a 117 e jurisprudência aí referida).

120    Por outro lado, no acórdão de 17 de Dezembro de 1998, Baustahlgewebe/Comissão (C‑185/95 P, Colect., p. I‑8417), depois de verificar que o Tribunal Geral tinha violado as exigências ligadas ao respeito do prazo razoável, o Tribunal de Justiça, por razões de economia processual e para garantir uma solução imediata e efectiva contra tal irregularidade processual, julgou procedente o fundamento relativo à duração excessiva do processo, para efeitos da anulação do acórdão recorrido, na medida em que fixava o montante da coima aplicada à recorrente em 3 milhões de ecus. Sem qualquer indício de que a duração do processo tivesse influenciado a decisão da causa, o Tribunal de Justiça considerou que esse fundamento não podia levar à anulação integral do acórdão recorrido, mas que um montante de 50 000 ecus constituía uma satisfação equitativa, em razão da excessiva duração do processo, pelo que reduziu o montante da coima aplicada à empresa em causa.

121    Por conseguinte, na falta de qualquer indício de que a duração do processo tivesse influenciado a decisão da causa, um eventual excesso do prazo razoável pelo tribunal comunitário no presente caso, mesmo admitindo‑o demonstrado, não tem qualquer influência na legalidade da decisão recorrida.

122    Há que acrescentar que, na petição, a recorrente renunciou expressamente à possibilidade de uma redução da coima a título de reparação pela alegada violação do seu direito a ser julgada num prazo razoável. Também não apresentou qualquer pedido de indemnização.

123    Portanto, há que julgar improcedente a segunda parte do primeiro fundamento e, consequentemente, todo o primeiro fundamento.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à preterição de formalidades essenciais

124    O segundo fundamento articula‑se, no essencial, em sete partes, relativas, em primeiro lugar, à violação do princípio da colegialidade, em segundo lugar, à violação do princípio da segurança jurídica, em terceiro lugar, ao direito da recorrente a ser novamente ouvida, em quarto lugar, à inexistência de nova consulta do comité consultivo, em quinto lugar, à irregular composição do comité consultivo, em sexto lugar, à violação do direito de acesso ao processo e, em sétimo lugar, à violação dos princípios da imparcialidade, da boa administração e da proporcionalidade.

125    O Tribunal entende oportuno analisar a sexta parte do segundo fundamento no âmbito de um quarto fundamento, relativo à violação do direito de acesso ao processo, na sequência da análise do fundamento relativo ao mérito do processo.

 Quanto à primeira parte, relativa à violação do princípio da colegialidade

–       Argumentos das partes

126    A recorrente assinala que, segundo a carta de acompanhamento de 10 de Janeiro de 2001, assinada pelo membro da Comissão responsável pela concorrência, a decisão recorrida foi adoptada pelo colégio dos comissários em 13 de Dezembro de 2000.

127    Ora, resulta das declarações da porta‑voz da Comissão, reproduzidas em comunicado de imprensa de uma agência noticiosa de 12 de Dezembro de 2000, que a decisão de adoptar novamente a Decisão 91/298 já estava tomada o mais tardar na véspera do dia em que o colégio dos comissários reuniu para deliberar.

128    Segundo a recorrente, não havendo qualquer indicação de que o colégio dos comissários deliberou em data anterior a 12 de Dezembro de 2000, há que inferir daí que a decisão recorrida foi adoptada em violação do princípio da colegialidade.

129    Por outro lado, admitindo que a decisão recorrida tivesse sido realmente adoptada pelo colégio dos comissários, resulta do comunicado de imprensa de uma agência noticiosa de 12 de Dezembro de 2000 que a Comissão aparentemente tinha decidido adoptar uma nova decisão de conteúdo idêntico ao da Decisão 91/298 pelo facto de a recorrente nunca ter impugnado o seu mérito. Ora, a recorrente alega ter criticado a apreciação jurídica e factual feita pela Comissão, bem como o princípio e o montante da coima. Consequentemente, o colégio dos comissários não estava correctamente informado da posição da recorrente no momento em que decidiu adoptar a decisão recorrida.

130    A recorrente pede também ao Tribunal Geral que ordene que a Comissão apresente todos os documentos internos relativos à adopção da decisão recorrida, em particular as actas de todas as reuniões do colégio dos comissários em que tivesse sido discutido o projecto de decisão e os documentos apresentados ao colégio.

131    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

132    Segundo jurisprudência assente, o princípio da colegialidade assenta na igualdade dos membros da Comissão no processo de decisão e implica, nomeadamente, que as decisões são tomadas em comum e que todos os membros do colégio são colectivamente responsáveis, no plano político, por todas as decisões (acórdãos do Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 1998, Comissão/Alemanha, C‑191/95, Colect., p. I‑5449, n.° 39, e de 13 de Dezembro de 2001, Comissão/França, C‑1/00, Colect., p. I‑9989, n.° 79).

133    O respeito do princípio da colegialidade, e, em especial, a necessidade de as decisões serem tomadas em comum, interessa necessariamente aos sujeitos de direito afectados pelos seus efeitos jurídicos, devendo estes poder confiar que essas decisões foram efectivamente tomadas pelo colégio e correspondem exactamente à sua vontade. Em particular, é esse o caso dos actos, expressamente qualificados de decisões, que a Comissão pratica face às empresas ou associações de empresas com vista ao respeito das normas de concorrência e que têm por objecto a declaração de uma infracção a essas normas, dirigir intimações a essas empresas e aplicar‑lhes sanções pecuniárias (acórdão Comissão/BASF e o., referido no n.° 65 supra, n.os 64 e 65).

134    No caso, a recorrente invoca o facto de, segundo um comunicado de imprensa de uma agência noticiosa de 12 de Dezembro de 2000, a porta‑voz da Comissão ter anunciado que esta iria adoptar novamente a mesma decisão em 13 de Dezembro de 2000.

135    Contudo, admitindo que a porta‑voz da Comissão tenha feito as afirmações referidas pela recorrente, o simples facto de um comunicado de imprensa de uma sociedade privada mencionar uma declaração que não tem qualquer carácter oficial não basta para considerar que a Comissão violou o princípio da colegialidade. Com efeito, o colégio dos comissários em nada estava vinculado por essa declaração e, na reunião de 13 de Dezembro de 2000, também poderia decidir, após deliberação em comum, não adoptar a decisão recorrida.

136    Há que acrescentar que o comunicado de imprensa oficial da Comissão foi publicado em 13 de Dezembro de 2000.

137    Por outro lado, mesmo admitindo que a porta‑voz da Comissão tivesse declarado que a recorrente nunca tinha impugnado o mérito da Decisão 91/298, esse argumento é inoperante. Com efeito, resulta do considerando 70 da decisão recorrida que a Comissão adoptou uma nova decisão de conteúdo quase idêntico ao da Decisão 91/298, por esta ter sido anulada por vício de forma. Portanto, o facto de a recorrente ter criticado o mérito da Decisão 91/298 é irrelevante.

138    Resulta do exposto que não há que ordenar que a Comissão, no âmbito das medidas de organização do processo, apresente todos os documentos internos relativos à adopção da decisão recorrida.

139    Assim, há que julgar improcedente a primeira parte do segundo fundamento.

 Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio da segurança jurídica

–       Argumentos das partes

140    A recorrente dá a entender que as formalidades de autenticação previstas no regulamento interno da Comissão (JO 1999, L 252, p. 41), que era aplicável no momento da adopção da decisão recorrida, não estão em conformidade com o que prescrevem os acórdãos Comissão/BASF e o., referido no n.° 65 supra (n.os 73 a 76), e Comissão/Solvay, referido no n.° 19 supra (n.os 44 a 49).

141    Com efeito, o artigo 16.°, primeiro parágrafo, do regulamento interno da Comissão, em vigor nessa época, não impõe qualquer formalidade de autenticação da decisão recorrida, que não é assinada mesmo se mencionar o nome do membro da Comissão responsável pela concorrência. Em particular, não está previsto que os actos adoptados tenham de ser juntos à nota recapitulativa quando esta é redigida, embora a «autenticação de uma ou outra dessas notas não tenha ligação directa com o acto adoptado». A esse respeito, o artigo 16.°, primeiro parágrafo, do regulamento interno da Comissão é diferente do artigo 15.° da Decisão 2000/396/CE, CECA, Euratom do Conselho, de 5 de Junho de 2000, que aprova o regulamento interno (JO L 149, p. 21).

142    Assim, o regulamento interno da Comissão desrespeita o carácter fundamental das formalidades da autenticação e viola o princípio da segurança jurídica. Consequentemente, entende que a decisão recorrida não foi validamente autenticada.

143    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

144    O Tribunal Geral entende, a título preliminar, que a argumentação da recorrente deve ser interpretada no sentido de que argúi a ilegalidade de uma disposição do regulamento interno da Comissão em vigor no momento da adopção da decisão recorrida.

145    Há que julgar admissível esta questão de ilegalidade.

146    Com efeito, segundo a jurisprudência, o âmbito de aplicação do artigo 241.° CE deve também estender‑se às disposições do regulamento interno de uma instituição que, embora não constituam a base jurídica da decisão recorrida nem produzam efeitos análogos aos de um regulamento na acepção desse artigo do Tratado, determinam as formalidades essenciais exigidas para a adopção dessa decisão e garantem, consequentemente, a segurança jurídica dos seus destinatários. Com efeito, é importante que qualquer destinatário de uma decisão possa contestar de forma eficaz a legalidade do acto que condiciona a validade formal dessa decisão, não obstante esse acto não ser o seu fundamento jurídico, uma vez que não teve a possibilidade de pedir a anulação desse acto antes de receber a notificação da decisão controvertida. Consequentemente, as disposições do regulamento interno da Comissão podem ser objecto de uma questão de ilegalidade, uma vez que garantem a protecção dos particulares (acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, n.os 286 e 287).

147    Por outro lado, há que lembrar que a questão de ilegalidade deve ser limitada ao indispensável à decisão da causa.

148    Com efeito, o artigo 241.° CE não tem por objectivo permitir a uma parte contestar a aplicabilidade de todo e qualquer acto de carácter geral a favor de um recurso qualquer. O acto geral cuja ilegalidade é arguida deve ser aplicável, directa ou indirectamente, ao caso concreto em recurso e tem de existir uma ligação jurídica directa entre a decisão individual recorrida e o acto geral em causa (v. acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, n.os 288, 289 e jurisprudência aí referida).

149    A esse respeito, há que lembrar que a decisão recorrida foi autenticada nos termos das disposições do artigo 16.°, primeiro parágrafo, do regulamento interno. Consequentemente, existe uma ligação jurídica directa entre essa decisão e esse artigo do regulamento interno, cuja ilegalidade a recorrente invoca. Daí resulta que o artigo 16.°, primeiro parágrafo, do regulamento interno aplicável no momento da adopção da decisão recorrida pode ser objecto de uma questão de ilegalidade.

150    Há que verificar, portanto, se as formalidades de autenticação previstas no regulamento interno da Comissão estão em conformidade com as exigências do princípio da segurança jurídica.

151    No presente caso, o texto de referência é o artigo 16.°, primeiro parágrafo, do regulamento interno da Comissão, na versão aplicável no momento da adopção da decisão recorrida, que dispõe o seguinte:

«Os actos adoptados em reunião são anexados de forma indissociável, na(s) língua(s) em que faz(em) fé, à nota recapitulativa elaborada no final da reunião d[a] Comissão em que foram adoptados. Estes actos são autenticados pelas assinaturas do presidente e do secretário‑geral, apostas na última página da nota recapitulativa.»

152    No acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, foi analisada a legalidade do artigo 16.°, primeiro parágrafo, do regulamento interno da Comissão, de 17 de Fevereiro de 1993 (JO L 230, p. 15), que tinha a seguinte redacção:

«Os actos adoptados em reunião […] são anexados, na(s) língua(s) em que faz(em) fé, à acta da reunião da Comissão em que foram adoptados ou em que foi registada a sua adopção. Estes actos são autenticados pelas assinaturas do presidente e do secretário‑geral, apostas na primeira página da acta.»

153    Nesse acórdão, o Tribunal Geral considerou que as modalidades previstas nessa disposição constituíam por si próprias uma garantia suficiente para controlar, em caso de impugnação, a correspondência perfeita dos textos notificados ou publicados com o texto adoptado pelo colégio e com a vontade do autor. Com efeito, uma vez que o texto era anexado à acta e a primeira página dessa acta era assinada pelo presidente e pelo secretário‑geral, existia uma ligação directa entre a acta e os documentos anexos que permitia garantir o conteúdo e a forma exactos da decisão do colégio. A esse respeito, presumia‑se que uma autoridade tinha agido em conformidade com a lei aplicável até que o juiz comunitário declarasse a desconformidade dessa actuação com a norma. Portanto, a autenticação prevista consoante as modalidades do artigo 16.°, primeiro parágrafo, do regulamento interno devia ser considerada legal (acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, n.os 302 a 304).

154    Ora, há que observar que o artigo 16.°, primeiro parágrafo, do regulamento interno da Comissão na versão aplicável no momento da adopção da decisão recorrida previa um procedimento de autenticação mais formalista que o analisado no acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra.

155    Com efeito, as alterações introduzidas entre as duas versões do texto são as seguintes: os actos adoptados em reunião deixam de ser apenas «anexados» à acta, passando a sê‑lo «de forma indissociável»; o termo «acta» é substituído por «nota recapitulativa»; a nota é elaborada «no final da reunião»; por último, a assinatura deixa de ser «na primeira página da acta», passando a ser «na última página da nota recapitulativa».

156    Estas alterações, em conjunto, reforçam as garantias processuais disponibilizadas para assegurar o respeito do princípio da segurança jurídica.

157    Assim, o artigo 16.°, primeiro parágrafo, do regulamento interno da Comissão aplicável à data da adopção da decisão recorrida não está ferido de ilegalidade.

158    Nestas condições, há que julgar improcedente a segunda parte do segundo fundamento.

 Quanto à terceira parte, relativa à violação do direito da recorrente a ser novamente ouvida

–       Argumentos das partes

159    A recorrente reconhece que, nos n.os 246 a 252 do acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, considerou‑se que, quando uma decisão da Comissão é anulada por vício de forma e para se adoptar uma nova decisão, só é necessária uma nova audição das empresas em causa se essa decisão tiver novas acusações.

160    Contudo, essa solução não é transponível para os factos da presente lide. Por um lado, o procedimento administrativo está ferido de vários vícios devido à violação do direito de acesso ao processo. Por outro lado, a decisão recorrida reproduz a análise da Decisão 91/297, anulada por outras razões para além das razões de forma, e que não foi novamente adoptada.

161    Assim, a anulação da Decisão 91/297 afectou a validade das medidas preparatórias da decisão recorrida. Com efeito, no acórdão Solvay I, referido no n.° 17 supra, o Tribunal Geral considerou que a recusa total da divulgação de documentos oposta pela Comissão violava o direito de acesso da recorrente ao processo. Por outro lado, esse vício de procedimento afectava tanto o procedimento administrativo que levou à Decisão 91/298 como o relativo à Decisão 91/297. Assim, a Comissão deveria ter reaberto o procedimento, concedendo‑lhe um acesso completo ao seu processo e permitindo‑lhe seguidamente apresentar todas as observações escritas e orais a esse respeito.

162    Além disso, é juridicamente errada a interpretação dada no acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, pois limita o direito de audiência unicamente à possibilidade de a empresa em causa apresentar observações sobre as acusações que lhe são imputadas. Com efeito, qualquer empresa tem também o direito de audiência e de apresentar observações quanto ao princípio, à oportunidade e ao montante das coimas. Baseando‑se na jurisprudência, a recorrente afirma que as empresas potencialmente destinatárias de uma decisão que dá por provada uma infracção por elas cometida e por isso lhes aplica uma coima devem ter a possibilidade de apresentar todas as observações quanto à coima na fase do procedimento administrativo. Ora, por causa do decurso do tempo na presente lide, a recorrente alega que teria tido novas observações a apresentar quanto à prescrição do poder da Comissão de lhe aplicar coimas, quanto ao excesso do prazo razoável e quanto ao montante da coima.

163    A recorrente entende que, na sequência da anulação da Decisão 91/297, deveria ter sido ouvida sobre a coerência interna da análise da Comissão, que apresentou na decisão recorrida a infracção como uma infracção que reforçava os efeitos de uma alegada política geral anticoncorrencial, e sobre a validade de certas afirmações contidas na decisão recorrida quanto à existência de um acordo com a ICI directamente retiradas da Decisão 91/297.

164    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

165    Quando a Comissão, depois da anulação de uma decisão que aplica sanções a empresas que infringiram o artigo 81.°, n.° 1, CE, com fundamento em vício de forma relativo exclusivamente às modalidades da sua adopção definitiva pelo colégio dos comissários, adopta uma nova decisão, com um conteúdo substancialmente idêntico e com base nas mesmas acusações, não tem de proceder a nova audição das empresas em causa (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.os 83 a 111).

166    Quanto às questões de direito susceptíveis de surgir no âmbito da aplicação do artigo 233.° CE, como as relativas ao decurso do tempo, à possibilidade de recomeço do procedimento, ao acesso ao processo que seria inerente a esse recomeço, à intervenção do consultor‑auditor e do comité consultivo, bem como a eventuais implicações do artigo 20.° do Regulamento n.° 17, não exigem novas audições, na medida em que não alteram o conteúdo das acusações, sendo unicamente passíveis de fiscalização jurisdicional posterior, se for esse o caso (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido n.° 38 supra, n.° 93).

167    No presente caso, a Comissão reproduziu a quase totalidade do conteúdo da Decisão 91/298. Apenas completou a decisão recorrida com uma passagem relativa ao processo no Tribunal Geral e no Tribunal de Justiça.

168    É certo que, na parte da decisão recorrida relativa aos factos, a Comissão acrescentou também considerações provenientes da Decisão 91/297, posteriormente anulada pelo acórdão Solvay I, referido no n.° 17 supra.

169    No entanto, por um lado, a Decisão 91/298, na origem da decisão recorrida, referia expressamente a Decisão 91/297 no respeitante às informações sobre o produto e o mercado do carbonato de sódio (v. ponto I B dos considerandos da Decisão 91/298). Na réplica, a recorrente reconhece, aliás, que as passagens da Decisão 91/297 reproduzidas na decisão recorrida faziam «integralmente parte» da Decisão 91/298.

170    Por outro lado, essas informações, visto terem um carácter unicamente factual, não são relevantes no que respeita à infracção imputada à recorrente na presente lide. Com efeito, no presente caso, a conduta em causa respeita a um acordo entre a recorrente e a CFK e não às práticas anticoncorrenciais entre a recorrente e a ICI.

171    Assim, há que observar que a decisão recorrida e a Decisão 91/298 têm um conteúdo substancialmente idêntico e se baseiam nos mesmos fundamentos.

172    Consequentemente, de acordo com a jurisprudência acima referida nos n.os 165 e 166, a Comissão não tinha de ouvir de novo a recorrente antes de adoptar a decisão recorrida.

173    Por outro lado, quanto ao argumento relativo à violação do direito de acesso ao processo, é objecto de uma alegação autónoma, pelo que será analisado noutro local.

174    Resulta do exposto que a terceira parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente.

 Quanto à quarta parte, relativa à inexistência de nova consulta do comité consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes

–       Argumentos das partes

175    A recorrente contesta a apreciação que consta dos n.os 254 a 257 do acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, segundo a qual não era necessária uma nova consulta do comité consultivo no presente processo. Segundo a recorrente, ao contrário do que entendeu o Tribunal Geral nesse acórdão, a obrigação de consulta ao comité consultivo não resulta do artigo 1.° do Regulamento n.° 99/63/CEE da Comissão, de 25 de Julho de 1963, relativo às audições referidas nos n.os 1 e 2 do artigo 19.° do Regulamento n.° 17 (JO 1963, 127, p. 2268; EE 08 F1 p. 62), que se limita a reger a cronologia do procedimento a seguir, mas do artigo 10.° do Regulamento n.° 17, na versão aplicável à data dos factos. Além disso, mesmo embora a consulta do comité consultivo constitua uma importante garantia processual, prossegue um objectivo diferente da simples audição da empresa a que se dirige o projecto de decisão, como demonstra o facto de a renúncia da empresa à audição não dispensar a Comissão de consultar o comité consultivo.

176    Consequentemente, no presente caso, o comité consultivo deveria ter sido consultado sobre o projecto da Comissão de adoptar a decisão recorrida na sequência do acórdão Comissão/Solvay, referido no n.° 19 supra, em particular sobre a questão do respeito do princípio do prazo razoável.

177    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

178    Nos termos do artigo 10.° do Regulamento n.° 17, na versão aplicável à data dos factos:

«3. Será consultado um Comité Consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes antes de tomada qualquer decisão na sequência de um processo nos termos do n.° 1, e de qualquer decisão respeitante à renovação, modificação ou revogação de uma decisão tomada nos termos do n.° 3 do artigo [81.° CE].

[…]

5. A consulta realizar‑se‑á durante uma reunião conjunta, convocada pela Comissão e realizada catorze dias, o mais tardar, após o envio da convocatória. A esta serão anexados uma exposição do processo com indicação dos elementos mais importantes e um anteprojecto de decisão para cada caso a examinar.»

179    Por outro lado, o artigo 1.° do Regulamento n.° 99/63 dispõe:

«Antes de consultar o Comité Consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes, a Comissão procederá a uma audição, nos termos do n.° 1 do artigo 19.° do Regulamento n.° 17.»

180    Segundo jurisprudência assente, resulta do artigo 1.° do Regulamento n.° 99/63 que a audição das empresas em causa e a consulta do comité são necessárias nas mesmas situações (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Setembro de 1989, Hoechst/Comissão, 46/87 e 227/88, Colect., p. 2859, n.° 54, e acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.° 115).

181    O Regulamento n.° 99/63 foi substituído pelo Regulamento (CE) n.° 2842/98 da Comissão, de 22 de Dezembro de 1998, relativo às audições dos interessados directos em certos processos, nos termos dos artigos [81.° CE] e [82.° CE] (JO L 354, p. 18), em vigor no momento da adopção da decisão recorrida, cujo artigo 2.°, n.° 1, está redigido em termos próximos dos do artigo 1.° do Regulamento n.° 99/63.

182    No caso, há que observar que, nos termos da decisão recorrida, o comité consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes foi consultado previamente à Decisão 91/298. A recorrente não impugna a existência ou a regularidade dessa consulta.

183    Assim, visto a decisão recorrida não conter alterações substanciais face à Decisão 91/298, a Comissão, que não tinha de ouvir novamente a recorrente antes de adoptar a decisão recorrida, também não tinha de proceder a uma nova consulta do comité consultivo (v., neste sentido, acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.° 118).

184    Por consequência, há que julgar improcedente a quarta parte do segundo fundamento.

 Quanto à quinta parte, relativa à irregular composição do comité consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes

–       Argumentos das partes

185    A recorrente alega que, posteriormente à consulta do comité consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes, realizada antes da adopção da Decisão 91/298 e da decisão recorrida, três Estados aderiram à Comunidade, em 1 de Janeiro de 1995. Uma vez que o comité consultivo se compõe de um representante de cada Estado‑Membro, não estava validamente constituído no momento em que a Comissão elaborou o projecto que levou à adopção da decisão recorrida. A Comissão deveria, portanto, ter procedido a uma nova consulta do comité consultivo regularmente constituído.

186    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

187    Nos termos do artigo 10.°, n.° 4, do Regulamento n.° 17, na versão aplicável à data dos factos:

«O Comité Consultivo será composto por funcionários competentes em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes. Cada Estado‑Membro designará um funcionário que o representa e que pode ser substituído, em caso de impedimento, por outro funcionário.»

188    Segundo a jurisprudência, a alteração da composição de uma instituição não afecta a continuidade da própria instituição, cujos actos definitivos ou preparatórios mantêm, em princípio, todos os seus efeitos (acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Novembro de 1990, Fedesa e o., C‑331/88, Colect., p. I‑4023, n.° 36).

189    Além disso, não existe nenhum princípio geral de direito comunitário que imponha a continuidade da composição do órgão administrativo ao qual esteja submetido um procedimento que possa levar à aplicação de uma coima (acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, n.os 322 e 323).

190    Daí resulta que a Comissão não tinha de consultar novamente o comité consultivo após a adesão de três novos Estados à Comunidade.

191    Assim, há que julgar improcedente a quinta parte do segundo fundamento.

 Quanto à sétima parte, relativa à violação dos princípios da imparcialidade, da boa administração e da proporcionalidade

–       Argumentos das partes

192    A recorrente alega que a decisão recorrida reproduz praticamente palavra a palavra uma decisão adoptada dez anos antes e que não tem em conta o decurso do tempo ou as consequências da anulação da Decisão 91/297. Além disso, a recorrente alega que a Comissão lhe deveria ter facultado acesso completo ao processo.

193    Por outro lado, a decisão recorrida é desproporcionada, na medida em que tem por efeito reabrir um processo muito tempo depois dos factos, pois, seja como for, não tem qualquer efeito útil.

194    Acresce que a recorrente afirma que a Comissão não indicou por que razões entendia oportuno aplicar‑lhe novamente uma «decisão draconiana», quando, por outro lado, tinha renunciado a adoptar uma nova decisão na sequência da anulação da Decisão 91/297. Não obstante, a Comissão tinha tratado como um todo as infracções que deram origem às Decisões 91/297, 91/298 e 91/299, que tinham sido redigidas nessa perspectiva. O Tribunal Geral encontra‑se, assim, na impossibilidade de apreciar a fundamentação da decisão da Comissão de adoptar uma nova decisão com um conteúdo quase idêntico ao da Decisão 91/298.

195    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

196    A recorrente, a coberto de uma alegada violação dos princípios da imparcialidade, da boa administração e da proporcionalidade, reproduz os argumentos já apresentados, nomeadamente a propósito do decurso do tempo e do direito de acesso ao processo, que o Tribunal Geral analisa noutro local.

197    O único elemento novo é relativo à falta de fundamentação sobre o facto de a Comissão ter adoptado uma nova decisão com um conteúdo quase idêntico ao da Decisão 91/298. Ora, a esse respeito, há que observar que a Comissão fundamentou a sua opção de adoptar novamente a Decisão 91/298 nos considerandos 67 a 78 da decisão recorrida, que acrescem à Decisão 91/298. Portanto, a alegação da recorrente não corresponde aos factos.

198    Consequentemente, há que julgar improcedente a sétima parte do segundo fundamento.

199    Resulta do exposto que há que julgar improcedente o segundo fundamento na íntegra, sem prejuízo da análise da sexta parte, relativa à violação do direito de acesso ao processo, que será efectuada no âmbito do quarto fundamento.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à inexistência de afectação do comércio entre Estados‑Membros

 Argumentos das partes

200    A recorrente alega que a Comissão «fundamentou mal» a decisão recorrida na medida em que, para tentar demonstrar o efeito no comércio entre Estados‑Membros, se limita a basear‑se numa alegada política geral sua para controlar o mercado do carbonato de sódio na Comunidade e a afirmar que o alegado acordo entre ela e a CFK fazia parte dessa política geral.

201    Segundo a recorrente, essa referência a uma alegada política geral remete para o critério da Comissão que, nos processos «Carbonato de sódio», sempre considerou que as alegadas infracções aos artigos 81.° CE e 82.° CE se reforçavam umas às outras para formar uma estratégia global de compartimentação dos mercados e de restrição da concorrência.

202    Ora, em primeiro lugar, a Comissão nunca conseguiu demonstrar a existência de um alegado «cartel europeu» entre todos os produtores de carbonato de sódio.

203    Em segundo lugar, os comportamentos criticados pela Comissão, admitindo‑os abusivos, constituem factos isolados e sem impacto significativo na concorrência.

204    Em terceiro lugar, o alegado acordo em causa respeita a tonelagens mínimas, mencionando a Comissão o número de 11 000 toneladas em dois anos num mercado de mais de um milhão de toneladas, isto é, cerca de 1% do consumo anual no mercado alemão e cerca de 4% da capacidade total de produção da CFK. Além disso, respeitava, por hipótese, a quantidades de carbonato de sódio que a CFK não conseguia colocar no mercado. Consequentemente, o alegado acordo não era susceptível de lesar sensivelmente o comércio entre Estados‑Membros.

205    Na réplica, a recorrente assinala que, embora não tenha formulado um fundamento específico quanto à existência do alegado acordo com a CFK que a Comissão lhe imputa, isso não significa que reconhece a existência desse acordo.

206    A recorrente refere também que os preços praticados na Alemanha eram mais altos que no resto da Comunidade. Assim, se a CFK tivesse querido colocar essas tonelagens noutros Estados‑Membros, teria suportado uma quebra de rendimentos que não lhe interessava aumentar fazendo descer ainda mais os preços nesses mercados. Sem esse alegado acordo, era no mercado alemão que a CFK tinha interesse em colocar as tonelagens que a DSW não tivesse absorvido.

207    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal

208    O n.° 1 do artigo 81.° CE só se aplica aos acordos susceptíveis de afectar o comércio entre Estados‑Membros. Segundo jurisprudência assente, para que um acordo entre empresas seja susceptível de afectar o comércio entre Estados‑Membros deve, com base num conjunto de elementos objectivos de direito ou de facto, permitir considerar, com um grau de probabilidade suficiente, que pode exercer influência, directa ou indirecta, efectiva ou potencial, nas correntes de trocas comerciais entre Estados‑Membros, de uma forma susceptível de prejudicar a realização dos objectivos de um mercado único entre Estados (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 1985, Remia e o./Comissão, 42/84, Recueil, p. 2545, n.° 22, e acórdão do Tribunal Geral de 13 de Dezembro de 2006, FNCBV e o./Comissão, T‑217/03 e T‑245/03, Colect., p. II‑4987, n.° 63). Assim, a afectação das trocas intracomunitárias resulta em geral da reunião de diversos factores que, isoladamente considerados, não seriam necessariamente determinantes (acórdãos do Tribunal de Justiça de 15 de Dezembro de 1994, DLG, C‑250/92, Colect., p. I‑5641, n.° 54, e de 29 de Abril de 2004, British Sugar/Comissão, C‑359/01 P, Colect., p. I‑4933, n.° 27).

209    A este respeito, pouco importa que a influência de um acordo sobre as trocas seja desfavorável, neutra ou favorável. Com efeito, uma restrição da concorrência pode afectar o comércio entre os Estados‑Membros quando for susceptível de desviar os fluxos comerciais da direcção que noutras condições teriam tido (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Outubro de 1980, van Landewyck e o./Comissão, 209/78 a 215/78 e 218/78, Recueil, p. 3125, n.° 172).

210    Além disso, a capacidade de um acordo afectar o comércio entre os Estados‑Membros, isto é, o seu efeito potencial, é suficiente para cair sob a alçada do artigo 81.° CE e não é necessário demonstrar uma afectação efectiva das trocas comerciais (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de Janeiro de 1999, Bagnasco e o., C‑215/96 e C‑216/96, Colect., p. I‑135, n.° 48, e acórdão do Tribunal Geral de 14 de Dezembro de 2006, Raiffeisen Zentralbank Österreich e o./Comissão, T‑259/02 a T‑264/02 e T‑271/02, Colect., p. II‑5169, n.° 166). É necessário, porém, que o efeito potencial do acordo sobre o comércio entre Estados seja sensível ou, dito de outra forma, que não seja insignificante (acórdão do Tribunal de Justiça de 28 de Abril de 1998, Javico, C‑306/96, Colect., p. I‑1983, n.os 12 e 17, e acórdão CMA CGM e o./Comissão, referido no n.° 71 supra, n.° 207).

211    Por outro lado, um acordo que abranja todo o território de um Estado‑Membro tem como efeito, pela sua própria natureza, consolidar barreiras de carácter nacional, entravando assim a interpenetração económica pretendida pelo Tratado CE (acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de Outubro de 1972, Vereeniging van Cementhandelaren/Comissão, 8/72, Colect., p. 333, n.° 29, e de 23 de Novembro de 2006, Asnef‑Equifax e Administración del Estado, C‑238/05, Colect., p. I‑11125, n.° 37).

212    No caso, no considerando 59 da decisão recorrida, a Comissão baseou‑se em três elementos para considerar que o acordo em causa afectava o comércio entre Estados‑Membros: em primeiro lugar, o acordo «fazia parte da sua política global de controlo do mercado do carbonato de sódio na Comunidade»; em segundo lugar, «tinha por objectivo não só reduzir a concorrência de forma substancial na Comunidade, mas também manter a rigidez da estrutura de mercado existente e a sua repartição em função das fronteiras nacionais»; em terceiro lugar, «na ausência do acordo, é muito provável que a tonelagem adquirida pela Solvay nos termos da garantia fosse colocada pela CFK noutros mercados da Comunidade».

213    Desde logo, há que considerar que, nos seus articulados, a recorrente não impugna os dois últimos elementos referidos pela Comissão.

214    Seguidamente, refira‑se que a recorrente não suscita nenhum fundamento em que impugne a existência de um acordo entre ela e a CFK, por força do qual, segundo o artigo 1.° da decisão recorrida, «[ela] garantia à CFK uma tonelagem mínima de vendas anuais de carbonato de sódio na Alemanha […] e compensava a CFK por qualquer défice, através da aquisição junto desta das tonelagens necessárias para que as suas vendas se situassem ao nível mínimo garantido».

215    Ora, um acordo de garantia de uma tonelagem anual mínima de vendas num mercado nacional, como o dos presentes autos, é, por definição, susceptível de desviar os fluxos comerciais da direcção que noutras condições teriam tido. Com efeito, leva a retirar do mercado uma parte da produção de carbonato de sódio, que poderia ter sido exportada para outros Estados‑Membros.

216    Consequentemente, mesmo admitindo que fosse procedente o argumento da recorrente de inexistência de uma política geral de controlo do mercado do carbonato de sódio, esse argumento não tem qualquer efeito na legalidade da decisão recorrida, na medida em que a conclusão da Comissão pela afectação do comércio entre Estados‑Membros está suficientemente demonstrada pelo facto de o acordo ser susceptível de desviar os fluxos comerciais da direcção que noutras condições teriam tido.

217    A recorrente alega também que, tendo em conta a importância mínima das tonelagens em causa, o acordo não era susceptível de afectar sensivelmente o comércio entre Estados‑Membros.

218    Ora, nos termos do considerando 43 da decisão recorrida, apesar de o mercado alemão representar cerca de 1 080 000 toneladas em 1986 e 1987, a garantia da CFK tinha sido inicialmente fixada, em 1987, em 179 000 toneladas, montante posteriormente aumentado. A esse respeito, há que tomar como base, não o montante efectivamente comprado pela recorrente à CFK em cada ano, mas o montante que a recorrente poderia ser levada a comprar à CFK por força do acordo, isto é, 179 000 toneladas inicialmente.

219    Como acertadamente salienta a Comissão na contestação, esse montante de 179 000 toneladas, que representa 16,57% do mercado alemão em 1987, não pode ser considerado insignificante.

220    Resulta do exposto que, na decisão recorrida, a Comissão considerou acertadamente que o acordo em causa era susceptível de afectar o comércio entre Estados‑Membros.

221    Portanto, há que considerar improcedente o terceiro fundamento.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do direito de acesso ao processo

222    O quarto fundamento articula‑se, no essencial, em duas partes, relativas, respectivamente, à existência de documentos úteis à defesa entre os documentos do processo consultados no âmbito das medidas de organização do processo e à falta de consulta completa do processo pela recorrente.

223    A título preliminar, recorde‑se que o respeito dos direitos de defesa constitui um princípio fundamental do direito comunitário que deve ser respeitado em quaisquer circunstâncias, designadamente em qualquer procedimento que possa conduzir a sanções, mesmo que se trate de um procedimento administrativo. Este princípio exige que as empresas e as associações de empresas em causa possam, logo na fase do procedimento administrativo, pronunciar‑se utilmente sobre a realidade e a pertinência dos factos, acusações e circunstâncias alegadas pela Comissão (acórdão do Tribunal de Justiça de 23 de Maio de 1978, Hoffmann‑La Roche, 102/77, Colect., p. 391, n.° 11, e acórdão do Tribunal Geral de 27 de Setembro de 2006, Avebe/Comissão, T‑314/01, Colect., p. II‑3085, n.° 49).

224    O direito de acesso ao processo, corolário do princípio do respeito dos direitos de defesa, implica que a Comissão faculte à empresa em causa a possibilidade de proceder a um exame de todos os documentos que figuram no processo de instrução e que possam ser pertinentes para a sua defesa. Estes incluem elementos de prova tanto de acusação como de defesa, com a ressalva dos segredos comerciais de outras empresas, dos documentos internos da Comissão e de outras informações confidenciais (acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colect., p. I‑123, n.° 68, e acórdão de 18 de Junho de 2008, Hoechst/Comissão, referido no n.° 71 supra, n.° 145).

225    Quanto aos elementos incriminatórios, incumbe à empresa em questão demonstrar que o resultado a que a Comissão chegou na sua decisão teria sido diferente se um documento não comunicado no qual a Comissão se tinha baseado para incriminar essa empresa viesse a ser rejeitado como meio de prova incriminatório. Quanto aos elementos de defesa, a empresa em causa deve demonstrar que a sua não divulgação pôde influenciar, em seu prejuízo, o desenrolar do processo e o conteúdo da decisão da Comissão. Basta que a empresa demonstre que poderia ter feito uso dos referidos documentos de defesa, no sentido de que, se os pudesse ter utilizado no procedimento administrativo, poderia ter invocado elementos que não concordavam com as deduções feitas nessa fase pela Comissão e, consequentemente, poderia ter influenciado, de uma maneira ou de outra, as apreciações feitas por esta última na eventual decisão, pelo menos no que respeita à gravidade e à duração do comportamento que lhe era imputado, e, portanto, o nível da coima. A possibilidade de um documento não divulgado ter influenciado o desenrolar do procedimento e o conteúdo da decisão da Comissão só pode ser provada através de um exame provisório de certos meios de prova que revele que os documentos não divulgados podiam ter tido – em relação a esses meios de prova – uma importância que não deveria ter sido menosprezada (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 224 supra, n.os 73 a 76, e acórdão de 18 de Junho de 2008, Hoechst/Comissão, referido no n.° 71 supra, n.° 146).

226    Por último, uma violação do direito de acesso ao processo só pode originar uma anulação total ou parcial da decisão da Comissão se o acesso irregular ao processo instrutor no procedimento administrativo tiver impedido a ou as empresas em causa de tomarem conhecimento de documentos susceptíveis de ser úteis à sua defesa, violando, assim, os seus direitos de defesa. Será esse o caso se, com a divulgação de um documento, pudesse ter existido uma possibilidade, mesmo que reduzida, de o procedimento administrativo ter culminado num resultado diferente se a empresa em causa tivesse podido invocar esse documento no referido procedimento (v., neste sentido, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 224 supra, n.os 73 a 76).

227    É à luz destas considerações que cabe apreciar se, no presente processo, a Comissão respeitou os direitos de defesa da recorrente.

 Quanto à primeira parte, relativa à existência de documentos úteis à defesa entre os documentos do processo consultados no âmbito das medidas de organização do processo

228    Conforme resulta da jurisprudência referida nos números anteriores, quanto aos elementos de defesa, a empresa em causa deve demonstrar que a sua não divulgação pôde influenciar, em seu prejuízo, a tramitação do procedimento e o conteúdo da decisão da Comissão.

229    No caso, a recorrente apresentou as suas observações em 15 de Julho de 2005, após consulta de documentos do processo.

–       Argumentos das partes

230    A recorrente alega que o acesso a esses documentos no procedimento administrativo lhe teria permitido apresentar argumentos úteis à sua defesa sobre a inexistência de afectação do comércio entre Estados‑Membros.

231    Por um lado, a recorrente afirma que os documentos do processo instrutor a que não teve acesso no procedimento administrativo lhe teriam permitido demonstrar que não tinha uma estratégia comercial de controlo do mercado e que, nesse mesmo período, a CFK fornecia carbonato de sódio a outros concorrentes. Em particular, resultaria de uma nota interna da CFK que, em 1988, esta lhe forneceu 2 544 toneladas de carbonato de sódio, na sequência de dificuldades de produção que enfrentou nas suas fábricas do Sul da Europa. Por outro lado, outros documentos do processo instrutor a que a recorrente não teve acesso no procedimento administrativo provariam que todos os produtores de carbonato de sódio se forneciam regularmente entre si.

232    Por outro lado, a recorrente alega que os documentos do processo a que não teve acesso no procedimento administrativo demonstrariam que, nos anos em que a CFK efectuou os fornecimentos controvertidos, a tipologia e o volume das suas exportações para outros Estados da Comunidade continuaram a ser semelhantes. Consequentemente, os fornecimentos à recorrente não tiveram qualquer efeito nos fluxos das trocas na Comunidade.

233    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

234    Há que lembrar, antes de mais, que o elemento, dado por provado pela Comissão na decisão recorrida, segundo o qual o acordo em causa fazia parte de uma política geral de controlo do mercado do carbonato de sódio na Comunidade não tem qualquer influência na legalidade da decisão recorrida (v. n.° 216 supra). Portanto, os documentos invocados pela recorrente na sequência da consulta do processo, mesmo que se destinassem a demonstrar a inexistência de uma sua estratégia comercial de controlo do mercado, não poderiam levar à anulação da decisão recorrida.

235    De qualquer forma, a recorrente, que era o primeiro produtor de carbonato de sódio na Comunidade à época dos factos em discussão, dispunha necessariamente dos elementos de informação que lhe permitiam invocar e demonstrar em 1990 o facto de que os produtores de carbonato de sódio se forneciam regularmente entre si. Em particular, a recorrente invoca vários documentos que indicam que existiram vendas de carbonato de sódio entre ela e as suas concorrentes, o que obviamente não podia ignorar.

236    Por outro lado, o argumento de que os fornecimentos à recorrente não tinham tido qualquer efeito nos fluxos das trocas na Comunidade não é susceptível de pôr em causa a conclusão da Comissão quanto à afectação do comércio entre Estados‑Membros. Com efeito, como indica a Comissão no considerando 58 da decisão recorrida, o objectivo do acordo era criar as condições para uma estabilidade artificial do mercado, o que a recorrente não impugna. Ora, uma vez que o acordo tinha em vista manter a estrutura existente no mercado do carbonato de sódio, daí resulta logicamente que as exportações da CFK na Comunidade deveriam manter‑se estáveis. Consequentemente, ao contrário de pôr em causa as considerações da Comissão sobre a afectação do comércio entre Estados‑Membros, o argumento da recorrente vai mais no sentido de as reforçar.

237    Consequentemente, a recorrente não demonstrou que a divulgação desses documentos teria tido uma possibilidade, mesmo que reduzida, de conduzir o procedimento administrativo a um resultado diferente se tivesse podido invocá‑los nesse procedimento como exige a jurisprudência (v., neste sentido, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 224 supra, n.os 73 a 76).

238    Assim, resulta da análise dos documentos invocados pela recorrente na sequência do acesso ao processo, no âmbito das medidas de organização do processo, que a Comissão não violou os direitos de defesa da recorrente. Portanto, há que julgar improcedente a primeira parte do quarto fundamento invocado pela recorrente.

 Quanto à segunda parte, relativa à falta de consulta completa do processo pela recorrente

–       Argumentos das partes

239    Na petição, a recorrente alega que nunca conseguiu obter uma lista enumerativa completa do processo da Comissão. Além disso, no procedimento administrativo prévio à adopção da Decisão 91/298, a Comissão limitou‑se a conceder‑lhe acesso aos documentos incriminatórios, anexos à comunicação de acusações. Consequentemente, de acordo com a descrição do processo que resulta do acórdão Solvay I, referido no n.° 17 supra, foi recusado à recorrente o acesso a um conjunto de «subprocessos» relativos aos seus concorrentes (Rhône‑Poulenc, CFK, Matthes & Weber, Akzo e ICI) e a uma dezena de processos com as respostas aos pedidos de informações nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17, na versão aplicável no momento dos factos, nomeadamente os enviados pela Comissão a alguns dos seus clientes. A recorrente alega que foi assim impedida de verificar se esses processos continham elementos úteis à sua defesa, nomeadamente no que respeitava à situação concorrencial no mercado alemão, ao contexto do alegado acordo e aos seus efeitos na concorrência e no comércio entre Estados‑Membros. A deterioração das provas resultante do tempo decorrido desde os factos imputados tornou ainda mais importante esse acesso ao processo.

240    Nas suas observações de 15 de Julho de 2005, apresentadas na sequência da consulta do processo na Secretaria do Tribunal Geral, a recorrente entende que não pode indicar em que medida os documentos em falta no processo teriam sido úteis à sua defesa. A esse respeito, assinala que, por um lado, a Comissão reconheceu expressamente a perda de cinco pastas e que, por outro lado, não pode garantir a integralidade das pastas que ainda tem, por não haver numeração contínua dos documentos nem lista enumerativa. Daí infere que a decisão recorrida deve ser anulada na íntegra, uma vez que o Tribunal Geral não tem a possibilidade de fiscalizar a respectiva legalidade.

241    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

–       Apreciação do Tribunal

242    A título preliminar, há que salientar que, no procedimento administrativo prévio à adopção da Decisão 91/298, a Comissão não elaborou uma lista enumerativa dos documentos do processo e que comunicou à recorrente unicamente os documentos incriminatórios, anexos à comunicação de acusações.

243    A esse respeito, a Comissão alegou na audiência que, em certos processos, a prática tinha consistido em dirigir às empresas em causa uma comunicação de acusações unicamente acompanhada de certos documentos, devido ao volume do processo, sendo posteriormente essas empresas convidadas a vir às suas instalações consultar todos os documentos acessíveis com o auxílio de uma lista enumerativa. Contudo, no âmbito do processo que deu origem à Decisão 91/298, o relator decidiu, segundo a Comissão, «simplificar o procedimento», considerando que, uma vez que todos os documentos invocados tinham sido comunicados com a comunicação de acusações, era inútil uma consulta e, consequentemente, não era necessária uma lista enumerativa.

244    Ora, há que lembrar que, nas páginas 40 e 41 do seu Décimo Segundo Relatório sobre a Política de Concorrência, a Comissão fixou, no que respeita ao acesso ao processo, as seguintes regras:

«A Comissão concede às empresas envolvidas num procedimento a faculdade de tomarem conhecimento do seu processo. As empresas são informadas do conteúdo do processo da Comissão pela junção à comunicação de acusações ou à carta de rejeição da denúncia de uma lista de todos os documentos do processo, com a indicação dos documentos ou partes deles cujo acesso lhes seja facultado. As empresas são convidadas a analisar no local os documentos acessíveis. Se uma empresa desejar apenas alguns, a Comissão pode remeter‑lhe cópias. A Comissão considera confidenciais, e consequentemente inacessíveis a determinada empresa, os documentos seguintes: documentos ou partes deles que contenham segredos de negócios de outras empresas; documentos internos da Comissão, tais como notas, projectos ou outros documentos de trabalho; quaisquer outras informações confidenciais, tais como as que permitam identificar os denunciantes que não queiram que a sua identidade seja revelada, bem como as informações prestadas à Comissão sob reserva de respeito da sua confidencialidade.»

245    Resulta destas regras que, no procedimento administrativo prévio à adopção da Decisão 91/298, a Comissão tinha a obrigação de facultar à recorrente o acesso a todos os documentos de acusação e de defesa recolhidos no inquérito, com excepção dos segredos de negócios de outras empresas, dos documentos internos da Comissão e outras informações confidenciais (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 17 de Dezembro de 1991, Hercules Chemicals/Comissão, T‑7/89, Colect., p. II‑1711, n.os 51 a 54, e de 18 de Dezembro de 1992, Cimenteries CBR e o./Comissão, T‑10/92 a T‑12/92 e T‑15/92, Colect., p. II‑2667, n.os 39 a 41).

246    Assim, há que observar que, no procedimento que deu origem à Decisão 91/298, a Comissão não respeitou as regras que se tinha imposto a si própria em 1982 ao não constituir uma lista enumerativa dos documentos do processo e ao não facultar à recorrente acesso a todos os documentos do processo.

247    Refira‑se seguidamente que, tendo a Decisão 91/298 sido anulada pelo Tribunal Geral por uma falta de autenticação, a Comissão considerou que podia adoptar a decisão recorrida sem reabrir o procedimento administrativo.

248    Consequentemente, há que observar que, antes da adopção da decisão recorrida, a Comissão não comunicou à recorrente todos os documentos do processo que lhe podiam ser facultados nem a convidou a vir consultá‑los nas suas instalações, pelo que o procedimento administrativo era irregular nesse ponto.

249    Contudo, resulta de jurisprudência assente que os direitos de defesa só são violados por uma irregularidade processual na medida em que esta tiver tido uma influência concreta na possibilidade de as empresas arguidas se defenderem (acórdãos do Tribunal Geral de 8 de Julho de 2004, Mannesmannröhren‑Werke/Comissão, T‑44/00, Colect., p. II‑2223, n.° 55, e de 14 de Dezembro de 2005, General Electric/Comissão, T‑210/01, Colect., p. II‑5575, n.° 632).

250    Nestas circunstâncias, o Tribunal Geral, no âmbito do recurso jurisdicional interposto da decisão recorrida, ordenou medidas de organização do processo destinadas a assegurar um acesso completo ao processo, a fim de apreciar se a recusa da Comissão de divulgar um documento ou de comunicar um elemento pôde prejudicar a defesa da recorrente (v., neste sentido, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 224 supra, n.° 102).

251    A esse respeito, há que lembrar que, visto limitar‑se a uma fiscalização jurisdicional dos fundamentos invocados, essa análise não tem por objectivo ou por efeito substituir uma instrução completa do processo no âmbito de um procedimento administrativo. O conhecimento tardio de certos documentos do processo não volta a colocar a empresa que recorreu de uma decisão da Comissão na situação em que se encontraria se tivesse podido basear‑se nos mesmos documentos para apresentar as suas observações escritas e orais nessa instituição (v. acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 224 supra, n.° 103 e jurisprudência aí referida). Além disso, quando o acesso ao processo é garantido na fase do processo jurisdicional, a empresa em causa não tem de demonstrar que, se tivesse tido acesso aos documentos não comunicados, a decisão da Comissão teria tido um conteúdo diferente, mas apenas que esses documentos poderiam ter sido úteis à sua defesa (acórdão do Tribunal de Justiça de 2 de Outubro de 2003, Corus UK/Comissão, C‑199/99 P, Colect., p. I‑11177, n.° 128, e acórdão PVC II do Tribunal de Justiça, referido no n.° 38 supra, n.° 318).

252    No caso, a pedido do Tribunal, a Comissão apresentou a comunicação de acusações e os documentos anexos. Elaborou ainda uma lista enumerativa dos documentos do processo, na sua composição actual.

253    Ora, a esse respeito, em primeiro lugar, observe‑se que existe uma incerteza quanto ao conteúdo exacto do processo na sua composição inicial. Com efeito, é certo que a Comissão indicou que o processo, na sua composição actual, era uma cópia do processo na sua composição inicial, compondo‑se este de «subprocessos» numerados de 1 a 71. Contudo, simultaneamente, a Comissão informou o Tribunal da existência de um «subprocesso» não numerado, denominado «Oberland Glas».

254    Em segundo lugar, observe‑se que a Comissão reconheceu expressamente ter perdido os cinco «subprocessos» numerados de 66 a 70. Com efeito, resulta do seu ofício de 15 de Março de 2005 que chegou a essa conclusão ao verificar que tinha «subprocessos» numerados de 1 a 65 e que o «subprocesso» 71 continha a comunicação de acusações.

255    Nas suas observações de 18 de Novembro de 2005, a Comissão indicou que era «pouco provável que os processos extraviados contivessem elementos de defesa». Na audiência, convidada a precisar essa frase, indicou que era «plausível» que esses «subprocessos» não contivessem qualquer documento ilibatório e que, do ponto de vista «estatístico», não poderiam ser úteis à defesa da recorrente.

256    Resulta destas respostas que a Comissão não tem como identificar de forma certa o autor, a natureza e o conteúdo de cada um dos elementos que constituem os «subprocessos» n.os 66 a 70.

257    Há que verificar, portanto, se a recorrente teve a possibilidade de proceder a um exame de todos os documentos do processo instrutor que pudessem ser relevantes para a sua defesa e, não sendo esse o caso, se a violação do direito de acesso ao processo foi de tal importância que teve o efeito de deixar sem substância essa garantia procedimental. Com efeito, segundo a jurisprudência, o acesso ao processo faz parte das garantias procedimentais que protegem os direitos de defesa (acórdão Solvay I, referido no n.° 17 supra, n.° 59), e a violação do direito de acesso ao processo da Comissão no procedimento administrativo prévio à adopção da decisão é susceptível, em princípio, de levar à anulação dessa decisão se tiverem sido lesados os direitos de defesa da empresa em causa (acórdão Corus UK/Comissão, referido no n.° 251 supra, n.° 127).

258    A esse respeito, há que analisar se os direitos de defesa da recorrente foram lesados no que respeita às acusações formuladas contra ela na comunicação de acusações e na decisão recorrida.

259    Segundo a jurisprudência, a violação dos direitos de defesa deve ser examinada em função das circunstâncias específicas de cada caso concreto, uma vez que depende essencialmente das acusações em que a Comissão se baseia para demonstrar a infracção imputada à empresa em causa (acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 224 supra, n.° 127). Há que proceder, portanto, a uma análise sumária das acusações de fundo em que a Comissão se baseou na comunicação de acusações e na decisão recorrida (acórdão Solvay I, referido no n.° 17 supra, n.° 60).

260    É também necessário analisar a existência de uma violação dos direitos de defesa tendo em conta os argumentos concretamente invocados pela empresa contra a decisão recorrida (v., neste sentido, acórdão ICI II, referido no n.° 17 supra, n.° 59).

261    Ora, no âmbito do presente recurso, o Tribunal analisou a argumentação apresentada pela recorrente e as acusações de fundo dadas por provadas na decisão recorrida, concluindo que o fundamento invocado pela recorrente era improcedente.

262    Não tendo a recorrente suscitado na petição qualquer argumento que impugnasse a existência do acordo referido pela Comissão na decisão recorrida, nenhum indício permite presumir que poderia ter descoberto nos subprocessos em falta quaisquer documentos que lhe permitissem pôr em causa as considerações da Comissão. Além disso, se a recorrente não tivesse celebrado o acordo referido na decisão recorrida, teria podido alegá‑lo na petição, mesmo na falta de acesso completo ao processo. Por último, quanto ao argumento da recorrente de inexistência de uma política geral de controlo do mercado do carbonato de sódio, há que lembrar que, como acima se refere no n.° 215, um acordo de garantia como o que está aqui em causa é susceptível, por definição, de desviar os fluxos comerciais da direcção que noutras condições teriam tido.

263    Assim, há que concluir que não se demonstrou que a recorrente não teve a possibilidade de analisar todos os documentos do processo instrutor susceptíveis de ter relevância para a sua defesa. Com efeito, mesmo não tendo tido acesso a todos os documentos do processo instrutor, isso não impediu a recorrente de assegurar a sua defesa quanto às acusações de fundo dadas por provadas pela Comissão na comunicação de acusações e na decisão recorrida.

264    Consequentemente, nas circunstâncias do presente caso, não há que anular a decisão recorrida pelo facto de terem desaparecido do processo cinco «subprocessos» a que a recorrente nunca teve acesso. Improcede, pois, a segunda parte do quarto fundamento e, por conseguinte, todo o quarto fundamento.

2.     Quanto aos pedidos de anulação ou redução da coima

265    Os pedidos da recorrente de anulação ou redução da coima articulam‑se, no essencial, em cinco fundamentos, relativos, em primeiro lugar, à errada apreciação da gravidade da infracção, em segundo lugar, à errada apreciação da duração da infracção, em terceiro lugar, ao facto de a Comissão ter erradamente dado por provadas circunstâncias agravantes, em quarto lugar, à existência de circunstâncias atenuantes e, em quinto lugar, ao carácter desproporcionado da coima, nomeadamente tendo em conta o decurso do tempo.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à errada apreciação da gravidade da infracção

 Argumentos das partes

266    A recorrente alega que a Comissão tem de respeitar as Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.° 2 do artigo 15.° do Regulamento n.° 17 e do n.° 5 do artigo 65.° do Tratado CECA (JO 1998, C 9, p. 3, a seguir «orientações para o cálculo das coimas»). Contudo, uma vez que, no presente caso, estão em causa factos anteriores à sua adopção, a Comissão, em princípio, não tinha de as ter em consideração, com duas excepções: por um lado, quando essas orientações reproduzirem os princípios fixados pela prática da Comissão e, por outro lado, quando flexibilizarem a política da Comissão de fixação do montante da coima.

267    Quanto à gravidade da infracção, a Comissão não explica em que medida o alegado acordo consiste num acordo de repartição de mercado, pois essa qualificação surge pela primeira e única vez no considerando 62 da decisão recorrida. Por outro lado, a Comissão não teve em conta as quantidades insignificantes a que respeitava o alegado acordo. Por último, a Comissão não fundamentou nem demonstrou que o acordo tivesse sido executado em condições de segredo muito estritas.

268    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

 Apreciação do Tribunal

269    A título preliminar, há que lembrar que, embora a Comissão disponha de um poder de apreciação na fixação do montante de cada coima, sem ter de aplicar uma fórmula matemática precisa, o Tribunal Geral decide, ao abrigo do artigo 17.° do Regulamento n.° 17, com competência de plena jurisdição, na acepção do artigo 229.° CE, os recursos interpostos das decisões em que a Comissão fixe uma coima, podendo, consequentemente, suprimir, reduzir ou aumentar a coima aplicada (acórdãos do Tribunal Geral de 29 de Abril de 2004, Tokai Carbon e o./Comissão, T‑236/01, T‑239/01, T‑244/01 a T‑246/01, T‑251/01 e T‑252/01, Colect., p. II‑1181, n.° 165, e FNCBV e o./Comissão, referido no n.° 208 supra, n.° 358).

270    Em primeiro lugar, quanto à aplicação das orientações para o cálculo das coimas, há que lembrar que, tendo a Decisão 91/298 sido anulada por vício de forma, a Comissão podia adoptar nova decisão sem abrir novo procedimento administrativo.

271    Uma vez que o conteúdo da decisão recorrida é quase idêntico ao da Decisão 91/298 e essas duas decisões se baseiam nos mesmos fundamentos, a decisão recorrida está sujeita, no âmbito da fixação do montante da coima, às normas em vigor no momento da adopção da Decisão 91/298.

272    Com efeito, a Comissão retomou o procedimento no ponto em que se produziu o erro procedimental e, sem proceder a uma nova apreciação do caso à luz de normas que não existiam à época da adopção da Decisão 91/298, adoptou uma nova decisão. Ora, a adopção de uma nova decisão exclui em qualquer caso a aplicação das orientações posteriores à primeira adopção.

273    Consequentemente, as orientações para o cálculo das coimas não são aplicáveis no presente caso.

274    Em segundo lugar, refira‑se que a Comissão considerou que a infracção imputada à recorrente, isto é, o acordo com a CFK, tinha sido «grave» (considerando 62 da decisão recorrida).

275    A esse respeito, há que lembrar que, segundo a jurisprudência, o montante das coimas deve ser graduado em função das circunstâncias do ilícito e da gravidade da infracção, devendo a apreciação dessa gravidade para esse efeito ser efectuada levando em conta a natureza das restrições causadas à concorrência (v. acórdão do Tribunal Geral de 23 de Fevereiro de 1994, CB e Europay/Comissão, T‑39/92 e T‑40/92, Colect., p. II‑49, n.° 143 e jurisprudência aí referida).

276    No caso, há que considerar que a prática imputada à recorrente justificava, pelo menos, a qualificação de «grave» feita pela Comissão.

277    Com efeito, o acordo em causa tinha por fim restringir a concorrência no mercado alemão ao garantir a compra de uma certa quantidade de carbonato de sódio à CFK para manter o nível dos preços.

278    No considerando 58 da decisão recorrida, cujo conteúdo não é impugnado pela recorrente, o objectivo do acordo é apresentado da seguinte forma:

«O acordo tinha claramente por objectivo criar as condições para uma estabilidade artificial do mercado. Como contrapartida por retomar um comportamento em matéria de preços que a Solvay não considerasse prejudicial, foi concedida à CFK uma quota mínima do mercado alemão. Ao retirar do mercado a tonelagem que a CFK não podia vender, a Solvay assegurava que os níveis de preços não baixariam devido à concorrência. Resulta dos documentos encontrados que os acordos foram postos em prática e produziram o efeito pretendido. Tais acordos clássicos do tipo ‘cartel’, devido à sua própria natureza, restringem a concorrência, na acepção do n.° 1 do artigo 81.° [CE]».

279    Assim, ao contrário do que afirma a recorrente, trata‑se de um acordo de repartição de mercado, no sentido de que as empresas em causa chegaram a acordo para regular, no território alemão, a colocação da produção da CFK no mercado.

280    Ora, os acordos deste género figuram entre os exemplos de acordos expressamente declarados incompatíveis com o mercado comum no artigo 81.°, n.° 1, alínea c), CE. Com efeito, são qualificados pela jurisprudência como restrições manifestas à concorrência (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal Geral de 15 de Setembro de 1998, European Night Services e o./Comissão, T‑374/94, T‑375/94, T‑384/94 e T‑388/94, Colect., p. II‑3141, n.° 136, e de 27 de Julho de 2005, Brasserie nationale e o./Comissão, T‑49/02 a T‑51/02, Colect., p. II‑3033, n.° 173).

281    Em terceiro lugar, quanto ao argumento relativo ao carácter insignificante das quantidades a que respeitava o acordo, basta lembrar que esse argumento já acima foi analisado e considerado improcedente (v. n.os 218 e 219 supra).

282    Em quarto lugar, quanto ao argumento da inexistência de segredo na execução do acordo, refira‑se que o considerando 47 da decisão recorrida menciona o seguinte:

«Foi realizada uma reunião em 14 de Março de 1989, em que participaram dirigentes da CFK e da sua empresa‑mãe Kali & amp; Salz, por um lado, e a DSW, por outro. É muito significativo o facto de não ter sido elaborado qualquer registo ou acta oficial desta reunião e, com efeito, não se encontram quaisquer indícios da sua realização, nem na CFK nem na Kali & amp; Salz. No entanto, uma breve nota manuscrita relativa a esta reunião foi encontrada nas instalações da DSW.»

283    Na petição, a recorrente alega, no essencial, que a Comissão não «fundamentou nem demonstrou» que o acordo em causa tinha sido executado em condições de segredo muito estritas. Por seu turno, a Comissão invoca a inexistência de qualquer relatório oficial, mesmo apesar de ter sido apreendida uma nota manuscrita nas instalações da DSW.

284    Contudo, só a inexistência de qualquer relatório oficial não permite considerar que o acordo tenha sido executado em condições de segredo muito estritas, tanto mais que, como reconhece a Comissão, a filial alemã da recorrente redigiu uma nota interna relativa a essa reunião.

285    Consequentemente, a Comissão não podia ter em conta o carácter secreto do acordo em causa na apreciação da gravidade da infracção.

286    Contudo, tendo em conta que o acordo em causa constitui uma flagrante restrição da concorrência, a Comissão podia, de qualquer forma, qualificar de grave a infracção cometida pela recorrente.

287    Por conseguinte, o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à errada apreciação da duração da infracção

 Argumentos das partes

288    Segundo a recorrente, a Comissão de modo nenhum demonstrou que tivesse sido dada a menor garantia de volume para 1990. Assim, admitindo que estivesse provada a infracção, a sua duração deveria, de qualquer forma, ser reduzida em um quarto.

289    A Comissão responde que a comunicação de acusações, enviada à recorrente e à CFK em 14 de Março de 1990, indicava que a infracção tinha continuado «até [essa] data». Alega, assim, que deu às empresas em causa a oportunidade de darem a conhecer os seus pontos de vista sobre a duração da infracção. Ora, nas suas respostas à comunicação de acusações, a recorrente e a CFK limitaram‑se a negar em bloco a existência do acordo, sem tomar posição quanto à duração, e não lhe forneceram qualquer elemento que lhe permitisse pensar que a infracção tinha chegado ao fim.

290    A Comissão alega que, tendo em conta a inverosimilhança dos argumentos da recorrente e da CFK nas suas respostas às acusações, tinha razões para concluir que o acordo tinha continuado durante 1990. A esse respeito, a Comissão baseia‑se nas conclusões do advogado‑geral Sir Gordon Slynn no processo que deu origem ao acórdão do Tribunal de Justiça de 7 de Junho de 1983, Musique Diffusion française e o./Comissão (100/80 a 103/80, Recueil, pp. 1825, 1914), segundo as quais, a partir do momento em que está demonstrada a existência de um acordo, presume‑se que ele prossegue, até prova em contrário. No presente caso, a Comissão afirma ter‑se baseado em circunstâncias particulares, que não se prendem com a própria natureza do acordo, mas com as explicações dadas pelas empresas em causa quanto à sua existência.

291    Por último, a Comissão alega que a recorrente se limita a afirmar que a Comissão não demonstrou o facto de ter sido acordada uma garantia de volume em 1990, sem indicar quando tinha o acordo chegado ao fim. Assinala que, em 1989, tinha sido acordada uma garantia dessas e ainda que o volume tinha aumentado no âmbito de uma política estrutural e não de fornecimentos pontuais.

 Apreciação do Tribunal

292    A título preliminar, refira‑se que a recorrente impugna a data do termo da infracção, mas não põe em causa a data do seu início, que o dispositivo da decisão recorrida fixa em «aproximadamente 1987».

293    Segundo jurisprudência do Tribunal Geral, para calcular a duração de uma infracção cujo objecto é restritivo da concorrência, importa determinar apenas o período durante o qual esse acordo existiu, ou seja, o período decorrido entre a data da sua celebração e a data em que lhe foi posto fim (acórdão CMA CGM e o./Comissão, referido no n.° 71 supra, n.° 280).

294    A duração da infracção é um elemento constitutivo do conceito de infracção nos termos do artigo 81.°, n.° 1, CE, elemento esse cujo ónus da prova pertence, a título principal, à Comissão. A este respeito, a jurisprudência exige que, na falta de elementos de prova que permitam determinar directamente a duração de uma infracção, a Comissão se baseie, pelo menos, em elementos de prova relativos a factos suficientemente próximos no tempo, de modo a que se possa razoavelmente admitir que essa infracção perdurou ininterruptamente entre duas datas precisas (acórdãos do Tribunal Geral de 7 de Julho de 1994, Dunlop Slazenger/Comissão, T‑43/92, Colect., p. II‑441, n.° 79, e de 16 de Novembro de 2006, Peróxidos Orgánicos/Comissão, T‑120/04, Colect., p. II‑4441, n.° 51).

295    Essa repartição do ónus da prova pode, contudo, variar na medida em que os elementos de facto invocados por uma parte podem ser susceptíveis de obrigar a outra parte a fornecer uma explicação ou uma justificação, sob pena de se poder concluir que foi feita a prova (acórdão Peróxidos Orgánicos/Comissão, referido no n.° 294 supra, n.° 53; v., também, neste sentido, acórdão Aalborg Portland e o./Comissão, referido no n.° 224 supra, n.° 79).

296    No presente caso, a Comissão indicou, no artigo 1.° da decisão recorrida, que a recorrente tinha violado o artigo 81.° CE «ao participar, desde aproximadamente 1987 até pelo menos final de 1990, num acordo de repartição dos mercados». Por outro lado, no considerando 60 da decisão recorrida, refere‑se ao período que ia «desde aproximadamente 1986 até final de 1990».

297    Em contrapartida, no considerando 2 da decisão recorrida, a Comissão refere que, «desde data incerta, por volta de 1987 até, pelo menos, 1989, a Solvay e a CFK participaram num acordo ou prática concertada contrários ao artigo 81.° [CE], através dos quais a Solvay garantia à CFK, em relação aos anos de 1987, 1988 e 1989, um volume mínimo de vendas».

298    Consequentemente, há que considerar que a decisão recorrida contém elementos contraditórios quanto ao termo da infracção.

299    Por outro lado, a passagem da decisão recorrida relativa ao acordo de garantia (considerandos 42 a 48) apenas menciona números até 1989, não sendo o ano de 1990 mencionado na passagem relativa à duração da infracção (considerandos 63 a 66).

300    A Comissão, baseando‑se nas conclusões do advogado‑geral Sir Gordon Slynn no processo Musique Diffusion française e o./Comissão, referido no n.° 290 supra, alega que, uma vez que demonstrou a existência da infracção, existe uma presunção da sua continuação e que, no caso, cabia à recorrente demonstrar que o acordo já não era aplicado em 1990.

301    Saliente‑se porém que, como acima referido, a consideração da Comissão de que o acordo em causa tinha existido até ao final de 1990 surge unicamente no dispositivo e no considerando 60 da decisão recorrida, que refere as conclusões da Comissão quanto à existência de uma infracção ao artigo 81.° CE, sem ter o menor apoio nos fundamentos relativos à qualificação do acordo (considerandos 53 a 59 da decisão recorrida) ou nos fundamentos relativos à sua duração (considerandos 63 a 66 da decisão recorrida). Nestas circunstâncias, tendo em conta a contradição dos fundamentos da decisão recorrida quanto ao termo da infracção, a presunção invocada pela Comissão não pode ser aplicada, mesmo não tendo a recorrente, no presente caso, apresentado qualquer elemento capaz de indicar que o acordo tinha chegado ao seu termo no final de 1989.

302    Com efeito, mesmo admitindo que possam verificar‑se circunstâncias especiais em que possa haver uma inversão do ónus da prova quanto à duração de uma infracção (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 15 de Março de 2000, Cimenteries CBR e o./Comissão, T‑25/95, T‑26/95, T‑30/95 a T‑32/95, T‑34/95 a T‑39/95, T‑42/95 a T‑46/95, T‑48/95, T‑50/95 a T‑65/95, T‑68/95 a T‑71/95, T‑87/95, T‑88/95, T‑103/95 e T‑104/95, Colect., p. II‑491, n.os 2801 a 2804), daí não resulta que a Comissão possa, numa decisão relativa a uma infracção ao artigo 81.°, n.° 1, CE, deixar de referir de forma fundamentada o termo da duração da infracção e dar informações sobre essa duração de que eventualmente disponha.

303    Resulta do exposto que a Comissão, que tinha o ónus da prova a título principal, não demonstrou que a infracção em causa tinha continuado até ao final de 1990.

304    Assim, há que considerar que a infracção em causa decorreu de 1987 a 1989 e não de 1987 a 1990. Consequentemente, o artigo 1.° da decisão recorrida deve ser anulado na medida em que declara que a recorrente infringiu as disposições do artigo 81.° CE ao participar, aproximadamente a partir de 1987 pelo menos até ao final de 1990, num acordo de repartição dos mercados.

305    Nestas circunstâncias, há que revogar a decisão recorrida, reduzindo em 25% o montante da coima aplicada à recorrente.

306    Por consequência, o montante da coima deve ser reduzido em 750 000 euros.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter erradamente dado por provadas circunstâncias agravantes

 Argumentos das partes

307    Segundo a recorrente, a Comissão não fundamentou nem justificou a qualificação da sua posição no mercado em causa como posição dominante, devendo essa qualificação ser rejeitada.

308    Por outro lado, a decisão recorrida não demonstra que a alegada infracção tenha sido cometida deliberadamente.

309    A Comissão alega que, nos considerandos 18 e 22, a decisão recorrida menciona que a recorrente detinha uma posição dominante, sendo o primeiro produtor na Alemanha e na Comunidade, com uma quota de mercado respectivamente de 52% e de 60%. Segundo a Comissão, essa fundamentação deve ser apreciada tendo em conta a Decisão 91/299 da mesma data.

310    Por outro lado, o carácter deliberado da infracção é mencionado na decisão recorrida. Com efeito, resulta do considerando 58 que as partes tinham plena consciência de participar num acordo restritivo da concorrência no mercado.

 Apreciação do Tribunal

311    A título preliminar, refira‑se que, nos termos do considerando 64 da decisão recorrida:

«Ao calcular a coima a aplicar a cada um dos produtores, a Comissão tomou em consideração a posição dominante da Solvay no mercado enquanto principal produtor na Alemanha e na Comunidade. A Solvay considera que, na posição que ocupava, tinha uma responsabilidade especial em assegurar a ‘estabilidade’ do mercado. A CFK era um produtor relativamente pequeno de carbonato de sódio, mas participou de forma voluntária no acordo colusivo.»

312    Por outro lado, no considerando 65 da decisão recorrida, indica‑se o seguinte:

«A infracção foi deliberada e ambas as partes deviam ter plena consciência da óbvia incompatibilidade entre os seus acordos e o direito comunitário.»

313    Quanto ao argumento da recorrente de que a Comissão não fundamentou a qualificação da sua posição no mercado em causa como posição dominante, refira‑se o seguinte.

314    Segundo a jurisprudência, o conceito de posição dominante visa uma situação de poder económico que confere à entidade que o detém o poder de impedir a subsistência de uma concorrência efectiva no mercado em questão, ao possibilitar‑lhe a adopção de comportamentos independentes, numa medida apreciável, relativamente aos seus concorrentes, aos seus clientes e, por fim, aos consumidores. Seja individual ou colectiva, uma entidade que detenha mais de 50% do mercado é susceptível de ter essa independência (acórdão do Tribunal Geral de 30 de Setembro de 2003, Atlantic Container Line e o./Comissão, T‑191/98, T‑212/98 a T‑214/98, Colect., p. II‑3275, n.os 931 e 932).

315    Ora, na decisão recorrida, a Comissão indicou que «[a recorrente] era o principal produtor, com quase 60% do mercado total da Comunidade» (considerando 18), e que a sua quota de mercado era de «52% na Alemanha» (considerando 22).

316    Assim, improcede a alegação de falta de fundamentação da decisão recorrida quanto à posição dominante da recorrente.

317    Seguidamente, admitindo que a recorrente invoca um fundamento de mérito sobre a inexistência de posição dominante, esse fundamento é inadmissível. Com efeito, a recorrente limita‑se a indicar o seguinte:

«A recorrente remete para os desenvolvimentos efectuados no recurso da decisão no processo que nesta data interpôs nos termos do artigo 82.° CE, a propósito da inexistência de uma posição dominante sua no(s) mercado(s) do carbonato de sódio em causa. A recorrente junta à presente petição as páginas relevantes desse recurso.»

318    Ora, segundo a jurisprudência do Tribunal Geral, para garantir a segurança jurídica e uma boa administração da justiça, é necessário, para que um recurso seja admissível, que os elementos essenciais de facto e de direito em que se baseia resultem de forma coerente e compreensível do texto da própria petição. Embora a petição possa ser sustentada e completada, em aspectos específicos, por remissões para excertos bem determinados de documentos anexos, uma remissão global para outros documentos, mesmo que juntos à petição, não pode compensar a falta de elementos essenciais na petição. Além disso, não compete ao Tribunal procurar e identificar, nos anexos, os fundamentos e os argumentos que poderia considerar constitutivos do fundamento do recurso, uma vez que os anexos têm uma função meramente probatória e instrumental. Esta interpretação do artigo 44.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento de Processo também se aplica às condições de admissibilidade da réplica, que se destina, segundo o artigo 47.°, n.° 1, do mesmo regulamento, a completar a petição (acórdão PVC II do Tribunal Geral, referido no n.° 25 supra, n.os 39 e 40).

319    No que respeita ao argumento da recorrente de que a decisão recorrida não demonstra que a alegada infracção tivesse sido cometida de forma deliberada e não está fundamentada quanto a esse ponto, impõem‑se as observações seguintes.

320    Segundo jurisprudência assente, para se poder considerar que uma infracção às normas de concorrência do Tratado CE foi cometida de forma deliberada, não é necessário que a empresa tenha tido consciência de restringir a concorrência, bastando que não pudesse ignorar que a sua conduta tinha por objectivo restringir a concorrência, pouco importando saber se a empresa tinha ou não consciência de infringir o artigo 81.° CE (v. acórdão Brasserie nationale e o./Comissão, referido no n.° 280 supra, n.° 155 e jurisprudência aí referida).

321    À luz desta jurisprudência e na presença de um acordo de repartição do mercado, a recorrente não podia ignorar que o acordo em causa tinha por objectivo restringir a concorrência, pelo que a infracção foi cometida deliberadamente.

322    Observe‑se ainda que a decisão recorrida está suficientemente fundamentada a esse respeito. Com efeito, nos considerandos 57 e 58 da decisão recorrida, a Comissão deu por provado que o acordo em causa tinha por objecto restringir a concorrência e que «tinha claramente por objectivo criar as condições para uma estabilidade artificial do mercado». Por outro lado, no considerando 65 da decisão recorrida, indica que as duas partes tinham de ter plena consciência da óbvia incompatibilidade entre os seus acordos e o direito comunitário.

323    Por conseguinte, a Comissão fundamentou suficientemente a decisão recorrida.

324    Acrescente‑se que está excluída a possibilidade de a recorrente encontrar elementos úteis à sua defesa quanto a estes pontos nos subprocessos em falta.

325    Com efeito, por um lado, tendo‑se apurado a existência de uma posição dominante da recorrente essencialmente com base na quota de mercado que detinha, nenhum indício permite presumir que a recorrente teria podido descobrir nos subprocessos em falta quaisquer documentos que desmentissem o facto de deter uma posição dominante no mercado do carbonato de sódio (v., neste sentido, acórdão ICI II, referido no n.° 17 supra, n.° 61).

326    Além disso, quanto ao facto de a infracção ter sido cometida de forma deliberada, está excluída a possibilidade de a recorrente encontrar documentos úteis à sua defesa nos subprocessos desaparecidos, visto não ser necessário que a empresa tenha consciência de infringir o artigo 81.° CE.

327    Por conseguinte, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à existência de circunstâncias atenuantes

328    O quarto fundamento articula‑se em duas partes, relativas, respectivamente, à cooperação da recorrente com a Comissão e à inexistência de efeitos na concorrência.

 Quanto à primeira parte, relativa à cooperação da recorrente com a Comissão

329    A recorrente afirma que, no inquérito, cooperou quer nas inspecções efectuadas pela Comissão nas suas instalações quer respondendo aos seus pedidos de informações.

330    Nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17, sob a epígrafe «Pedido de informações»:

«4. São obrigados a fornecer as informações pedidas os titulares das empresas ou seus representantes e, no caso de pessoas colectivas, de sociedades ou de associações sem personalidade jurídica, as pessoas encarregadas de as representar, segundo a lei ou os estatutos.

5. Se uma empresa ou associação de empresas não prestar as informações pedidas no prazo fixado pela Comissão ou se as fornecer de modo incompleto, a Comissão, mediante decisão, exigirá que a informação seja prestada. A decisão especificará as informações pedidas, fixará um prazo conveniente no qual a informação deve ser prestada e indicará as sanções previstas no n.° 1, alínea b), do artigo 15.° e no n.° 1, alínea c), do artigo 16.°, bem como a possibilidade de recurso da decisão para o Tribunal de Justiça.»

331    É jurisprudência assente que a cooperação no inquérito que não vá além das obrigações que para as empresas resultam do artigo 11.°, n.os 4 e 5, do Regulamento n.° 17 não justifica uma redução da coima (acórdãos do Tribunal Geral de 10 de Março de 1992, Solvay/Comissão, T‑12/89, Colect., p. II‑907, n.os 341 e 342, e de 18 de Julho de 2005, Scandinavian Airlines System/Comissão, T‑241/01, Colect., p. II‑2917, n.° 218). Em contrapartida, essa redução justifica‑se quando a empresa tiver fornecido informações que vão bastante além daquelas que a Comissão pode exigir que lhe sejam apresentadas nos termos do artigo 11.° do Regulamento n.° 17 (acórdão do Tribunal Geral de 9 de Julho de 2003, Daesang e Sewon Europe/Comissão, T‑230/00, Colect., p. II‑2733, n.° 137).

332    Ora, no caso, a recorrente limita‑se a alegar que respondeu aos pedidos de informações que lhe foram dirigidos. Uma vez que isso era uma das obrigações da recorrente, não pode constituir uma circunstância atenuante.

333    Quanto à alegada cooperação da recorrente com a Comissão nas inspecções efectuadas nas suas instalações, refira‑se que esse comportamento é também uma das obrigações da empresa e que não constitui uma circunstância atenuante.

334    Assim sendo, há que julgar improcedente a primeira parte do quarto fundamento.

 Quanto à segunda parte, relativa à inexistência de efeitos na concorrência

335    A recorrente alega que a Comissão deveria ter tido em conta a inexistência de efeitos do alegado acordo na concorrência, vistas as tonelagens insignificantes em causa.

336    A esse respeito, basta lembrar que não se pode considerar que o acordo entre a recorrente e a CFK, que representava 16,57% do mercado alemão em 1987, tinha como objecto tonelagens insignificantes (v. n.os 218 e 219 supra).

337    Assim, o argumento da recorrente, sem suporte nos factos, deve ser julgado improcedente.

338    Por conseguinte, há que julgar improcedentes a segunda parte do quarto fundamento e, consequentemente, o quarto fundamento.

 Quanto ao quinto fundamento, relativo ao carácter desproporcionado da coima, nomeadamente tendo em conta o decurso do tempo

339    Segundo a recorrente, a Comissão deveria ter tido em conta o facto de terem decorrido mais de onze anos desde o fim da alegada infracção. A recorrente pergunta qual é a «actualidade» do carácter punitivo e dissuasor da coima, quando adaptou a sua política comercial às exigências da Comissão. Não vê que justificação se poderá dar em termos de carácter dissuasor da coima face às empresas terceiras.

340    A esse respeito, há que lembrar que a Comissão considerou acertadamente que a infracção imputada à recorrente era «grave». No considerando 62 da decisão recorrida, indica nomeadamente que os acordos de repartição dos mercados são, pela sua própria natureza, graves restrições da concorrência e que, no presente caso, as partes tinham restringido a concorrência entre elas através de um mecanismo destinado a criar condições artificiais de estabilidade do mercado.

341    Assim sendo, a Comissão podia com razão aplicar uma coima à recorrente.

342    A título puramente indicativo, há que observar que as orientações para o cálculo das coimas, embora não aplicáveis no presente caso, prevêem, para as infracções «graves», que os montantes de partida no cálculo da coima vão de 1 a 20 milhões de euros.

343    Quanto ao decurso do tempo, resulta da análise do primeiro fundamento que, no presente processo, a Comissão respeitou as disposições do Regulamento n.° 2988/74 e o princípio do prazo razoável. Portanto, não se pode acusar a Comissão de ter demorado a adoptar a decisão recorrida.

344    Seguidamente, resulta da jurisprudência que, na determinação do montante das coimas por infracção ao direito da concorrência, a Comissão deve não só ter em consideração a gravidade da infracção e as circunstâncias específicas do caso concreto mas também o contexto em que a infracção foi cometida e zelar pelo carácter dissuasivo da sua acção, sobretudo para os tipos de infracção particularmente nocivos para a realização dos objectivos da Comunidade (acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, referido no n.° 290 supra, n.° 106, e acórdão do Tribunal Geral de 5 de Abril de 2006, Degussa/Comissão, T‑279/02, Colect., p. II‑897, n.° 272).

345    Por consequência, uma coima, mesmo se for novamente decidida depois de um certo lapso de tempo, não perde o seu carácter punitivo e dissuasor, quando se demonstre que a empresa em causa violou o direito da concorrência, nomeadamente, como no presente caso, por uma infracção grave.

346    Improcede, portanto, o quinto fundamento.

347    Em conclusão, há que anular a decisão recorrida na medida em que dá erradamente por provado que a infracção decorreu entre aproximadamente 1987 e o final de 1990.

348    Por conseguinte, fixa‑se o montante da coima aplicada à recorrente em 2,25 milhões de euros.

 Quanto às despesas

349    Nos termos do disposto no artigo 87.°, n.° 3, do Regulamento de Processo, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas.

350    No presente caso, os pedidos da recorrente foram julgados parcialmente procedentes. O Tribunal entende que será feita uma justa apreciação das circunstâncias do caso decidindo que a recorrente suportará três quartos das suas próprias despesas e três quartos das despesas apresentadas pela Comissão e que esta última suportará um quarto das suas próprias despesas e um quarto das despesas da recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

decide:

1)      É anulado o artigo 1.° da Decisão 2003/5/CE da Comissão, de 13 de Dezembro de 2000, relativa a um processo de aplicação do artigo 81.° [CE] (COMP/33.133‑B: Carbonato de sódio – Solvay, CFK), na medida em que declara que a Solvay SA infringiu as disposições do artigo 81.° CE em 1990.

2)      Fixa‑se em 2,25 milhões de euros o montante da coima aplicada à Solvay.

3)      É negado provimento ao recurso quanto ao restante.

4)      A recorrente suportará três quartos das suas próprias despesas e três quartos das despesas da Comissão Europeia.

5)      A Comissão suportará um quarto das suas próprias despesas e um quarto das despesas da recorrente.

Meij

Vadapalas

Dittrich

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 17 de Dezembro de 2009.

Índice


Factos na origem do litígio

Tramitação do processo

Pedidos das partes

Questão de direito

1.  Quanto ao pedido de anulação da decisão recorrida

Quanto ao primeiro fundamento, relativo ao decurso do tempo

Quanto à primeira parte, relativa à aplicação errada das regras da prescrição

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio do prazo razoável

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

Quanto ao segundo fundamento, relativo à preterição de formalidades essenciais

Quanto à primeira parte, relativa à violação do princípio da colegialidade

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio da segurança jurídica

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

Quanto à terceira parte, relativa à violação do direito da recorrente a ser novamente ouvida

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

Quanto à quarta parte, relativa à inexistência de nova consulta do comité consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

Quanto à quinta parte, relativa à irregular composição do comité consultivo em matéria de acordos, decisões e práticas concertadas e de posições dominantes

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

Quanto à sétima parte, relativa à violação dos princípios da imparcialidade, da boa administração e da proporcionalidade

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

Quanto ao terceiro fundamento, relativo à inexistência de afectação do comércio entre Estados‑Membros

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do direito de acesso ao processo

Quanto à primeira parte, relativa à existência de documentos úteis à defesa entre os documentos do processo consultados no âmbito das medidas de organização do processo

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

Quanto à segunda parte, relativa à falta de consulta completa do processo pela recorrente

– Argumentos das partes

– Apreciação do Tribunal

2.  Quanto aos pedidos de anulação ou redução da coima

Quanto ao primeiro fundamento, relativo à errada apreciação da gravidade da infracção

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

Quanto ao segundo fundamento, relativo à errada apreciação da duração da infracção

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

Quanto ao terceiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter erradamente dado por provadas circunstâncias agravantes

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal

Quanto ao quarto fundamento, relativo à existência de circunstâncias atenuantes

Quanto à primeira parte, relativa à cooperação da recorrente com a Comissão

Quanto à segunda parte, relativa à inexistência de efeitos na concorrência

Quanto ao quinto fundamento, relativo ao carácter desproporcionado da coima, nomeadamente tendo em conta o decurso do tempo

Quanto às despesas


* Língua do processo: francês.