Language of document : ECLI:EU:T:2014:835

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

26 de setembro de 2014 (*)

«Ambiente — Diretiva 2003/87/CE — Regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa — Regras transitórias relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito, a partir de 2013 — Decisão 2011/278/UE — Medidas nacionais de execução apresentadas pela Alemanha — Cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas — Liberdades profissional e de empresa — Direito de propriedade — Proporcionalidade»

No processo T‑614/13,

Romonta GmbH, com sede em Seegebiet Mansfelder Land (Alemanha), representada por I. Zenke, M.‑Y. Vollmer, C. Telschow e A. Schulze, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por E. White, C. Hermes e K. Herrmann, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido de anulação da Decisão 2013/448/UE da Comissão, de 5 de setembro de 2013, relativa às medidas nacionais de execução para a atribuição transitória a título gratuito de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, em conformidade com o artigo 11.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho (JO L 240, p. 27), na parte em que o artigo 1.°, n.° 1, desta decisão recusa a atribuição à recorrente, para o terceiro período de comércio de licenças de emissão, compreendido entre 2013 e 2020, das licenças adicionais requeridas com base na cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, prevista no § 9, n.° 5, da Treibhausgas‑Emissionshandelsgesetz (Lei alemã do comércio de direitos de emissão de gases com efeito de estufa) de 21 de julho de 2011,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto por: A. Dittrich (relator), presidente, J. Schwarcz e V. Tomljenović, juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 14 de maio de 2014,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        A recorrente, Romonta GmbH, é uma empresa sediada na Alemanha e o único fabricante de cera de lignito na Europa. De lignito particularmente rico em betume, extrai o betume para o tratar e comercializar sob a forma de cera de lignito. A recorrente utiliza os resíduos de lignito numa central de cogeração de alto rendimento, cujo calor é utilizado para o seu processo industrial. A recorrente vende a eletricidade produzida acessoriamente na sua central de cogeração. A recorrente está sujeita, desde 1 de janeiro de 2005, ao regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na União Europeia, por força da Diretiva 2003/87/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de outubro de 2003, relativa à criação de um regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa na Comunidade e que altera a Diretiva 96/61/CE do Conselho (JO L 275, p. 32), que foi alterada, em último lugar, pela Diretiva 2009/29/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, que altera a Diretiva 2003/87/CE a fim de melhorar e alargar o regime comunitário de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa (JO L 140, p. 63) (a seguir «Diretiva 2003/87»). Nos termos do artigo 1.° da Diretiva 2003/87, este regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa foi criado para reduzir essas emissões na União.

2        Para este efeito, o artigo 9.°, primeiro parágrafo, da Diretiva 2003/87 dispõe que a quantidade de licenças de emissão emitidas anualmente no conjunto da União a partir de 2013 deve diminuir de forma linear a partir do ponto médio do período de 2008 a 2012. De acordo com o segundo parágrafo do mesmo artigo, a Comissão Europeia devia publicar a quantidade absoluta de licenças de emissão a nível da União para 2013. A este respeito, a Comissão adotou a Decisão 2010/384/UE, de 9 de julho de 2010, relativa à quantidade de licenças de emissão a conceder a nível comunitário para 2013 no âmbito do regime UE de comércio de licenças de emissão (JO L 175, p. 36), revogada pela Decisão 2010/634/UE da Comissão, de 22 de outubro de 2010, que ajusta essa quantidade (JO L 279, p. 34). Esta quantidade total foi distribuída de acordo com as regras a que se referem os artigos 10.°, 10.°‑A e 10.°‑C da Diretiva 2003/87. Assim, uma parte das licenças foi atribuída a título gratuito, com base nos artigos 10.°‑A e 10.°‑C desta diretiva. Todas as licenças que não forem atribuídas a título gratuito em conformidade com os artigos 10.°‑A e 10.°‑C da Diretiva 2003/87 serão leiloadas pelos Estados‑Membros a partir de 2013, por força do artigo 10.° da referida diretiva.

3        No que respeita às licenças a atribuir a título gratuito, com base no artigo 10.°‑A da Diretiva 2003/87, a Comissão devia aprovar medidas de execução a nível da União plenamente harmonizadas para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito. Nesse sentido, a Comissão era obrigada, designadamente, a determinar parâmetros de referência ex ante nos vários setores ou subsetores e a tomar como ponto de partida, para o efeito, a média dos resultados de 10% das instalações mais eficientes de um determinado setor ou subsetor na Comunidade durante o período de 2007‑2008. Com base nestes parâmetros de referência, era calculado o número de licenças de emissão a atribuir a título gratuito, a partir de 2013, a cada instalação em causa.

4        Em 27 de abril de 2011, a Comissão adotou a Decisão 2011/278/UE sobre a determinação das regras transitórias da União relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos do artigo 10.°‑A da Diretiva 2003/87 (JO L 130, p. 1). Nesta decisão, a Comissão definiu, tanto quanto possível, um parâmetro de referência para cada produto, como resulta do considerando 4 e do anexo I da referida decisão. Nos casos em que não foi possível calcular o parâmetro de referência de um produto, mas são produzidos gases com efeito de estufa elegíveis para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito, foram formuladas três abordagens de recurso hierarquizadas, segundo o considerando 12 da referida decisão. Assim, o parâmetro de referência relativo ao calor foi aplicado aos processos de consumo de calor em que é utilizado um vetor térmico mensurável. O parâmetro de referência relativo ao combustível foi aplicado quando era consumido calor não mensurável. No caso das emissões resultantes de processos, as licenças de emissão foram atribuídas com base nas emissões históricas.

5        O artigo 10.° da Decisão 2011/278 contém as regras com base nas quais os Estados‑Membros devem calcular, em cada ano, o número de licenças de emissão atribuídas a título gratuito, a partir de 2013, a cada instalação existente no seu território. Por força do n.° 2 deste artigo, os Estados‑Membros são obrigados primeiramente a determinar, separadamente para cada subinstalação, o número anual preliminar de licenças de emissão atribuídas a título gratuito, para cada subinstalação abrangida por um parâmetro de referência relativo a produtos e para as subinstalações abrangidas por um parâmetro de referência relativo ao calor, por um parâmetro de referência relativo a combustíveis e com emissões de processo.

6        Por força do artigo 11.°, n.° 1, da Diretiva 2003/87 e do artigo 15.°, n.os 1 e 2, da Decisão 2011/278, os Estados‑Membros deviam apresentar à Comissão, até 30 de setembro de 2011, a lista das instalações abrangidas por essa diretiva no seu território e de eventuais atribuições a título gratuito a cada instalação no seu território, calculadas nos termos das regras referidas no artigo 10.°‑A, n.° 1, e no artigo 10.°‑C da mencionada diretiva. Segundo o artigo 15.°, n.° 3, da Decisão 2011/278, a Comissão devia avaliar a inclusão de cada instalação na lista e as respetivas quantidades totais anuais preliminares de licenças de emissão atribuídas a título gratuito e determinar o fator de correção transetorial uniforme. Esta determinação era necessária, porquanto a quantidade máxima anual de licenças a atribuir a título gratuito era limitada, por força do artigo 10.°‑A, n.° 5, da Diretiva 2003/87. Segundo o artigo 15.°, n.° 4, da Decisão 2011/278, se a Comissão não rejeitar a inscrição de uma instalação nessa lista, incluindo as respetivas quantidades totais anuais preliminares de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a essa instalação, o Estado‑Membro em causa procederá à determinação da quantidade final anual de licenças de emissão atribuídas a título gratuito para cada ano do período de 2013 a 2020. Segundo o artigo 11.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87, os Estados‑Membros não podem emitir licenças de emissão a título gratuito a instalações cuja inscrição na lista referida no n.° 1 desse artigo tenha sido rejeitada pela Comissão.

7        Na Alemanha, a Decisão 2011/278 foi executada, nomeadamente, pela Treibhausgas‑Emissionshandelsgesetz (Lei do comércio de direitos de emissão de gases com efeito de estufa, a seguir «TEHG») de 21 de julho de 2011. O § 9, n.° 5, da TEHG contém uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, e prevê o seguinte:

«Se a atribuição das licenças efetuada com base nas regras estabelecidas no § 10 acarretar dificuldades excessivas para o operador da instalação e para uma empresa a este ligada, que, por motivos decorrentes do direito comercial e do direito das sociedades, tem de suportar, com o seu próprio capital, os riscos económicos desse operador, a autoridade competente atribui, a requerimento do operador, licenças adicionais na quantidade adequada a uma compensação, desde que a Comissão Europeia não recuse essa atribuição com base no artigo 11.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87/CE.»

8        Em 21 de dezembro de 2011, a recorrente requereu à autoridade alemã responsável pelo estabelecimento do regime de comércio de licenças de emissão a atribuição de licenças gratuitas para a sua instalação, cujo código de identificação é DE000000000000978, com base no critério das emissões de processos, no parâmetro de referência relativo ao calor e na cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, prevista no § 9, n.° 5, da TEHG. A este propósito, a recorrente explicou que a sua sobrevivência dependia da atribuição de licenças adicionais ao abrigo desta cláusula, sem o que entraria em liquidação judicial.

9        Em 7 de maio de 2012, a República Federal da Alemanha transmitiu à Comissão a lista das instalações abrangidas pela Diretiva 2003/87, que se encontravam no seu território, e as licenças a atribuir a título gratuito a cada instalação situada no seu território, em conformidade com o artigo 15.°, n.° 1, da Decisão 2011/278. Para a instalação da recorrente, esse Estado‑Membro calculou a quantidade preliminar de licenças de emissão a atribuir a título gratuito, nomeadamente mediante a aplicação da cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, prevista no § 9, n.° 5, da TEHG.

10      Em 5 de setembro de 2013, a Comissão adotou a Decisão 2013/448/UE relativa às medidas nacionais de execução para a atribuição transitória a título gratuito de licenças de emissão de gases com efeito de estufa, em conformidade com o artigo 11.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87 (JO L 240, p. 27, a seguir «decisão impugnada»).

11      Por força do artigo 1.°, n.° 1, da decisão impugnada, conjugado com o anexo I, ponto A, desta decisão, a Comissão rejeitou a inscrição da instalação da recorrente nas listas de instalações abrangidas pela Diretiva 2003/87, apresentadas pelos Estados‑Membros em conformidade com o artigo 11.°, n.° 1, dessa diretiva, e as quantidades anuais totais preliminares de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a essa instalação.

12      A Comissão entendeu, no considerando 11 da decisão impugnada, que a atribuição de licenças a título gratuito à recorrente com base no § 9, n.° 5, da TEHG devia ser recusada, porquanto a Decisão 2011/278 não previa o ajustamento que a República Federal da Alemanha pretendia fazer com base nessa disposição. A República Federal da Alemanha não demonstrou que a atribuição calculada com base na Decisão 2011/278 e destinada à instalação em questão era manifestamente inadequada atendendo ao objetivo prosseguido de completa harmonização das atribuições de licenças de emissão. A atribuição de mais licenças a título gratuito a algumas instalações distorceria, ou ameaçaria distorcer, a concorrência e teria efeitos transfronteiriços, dado que o comércio nos setores abrangidos pela Diretiva 2003/87 se processa à escala da União. À luz do princípio da igualdade de tratamento das instalações no âmbito do regime de comércio de licenças de emissão, a Comissão considerou, portanto, justificado opor‑se às quantidades preliminares de licenças de emissão a atribuir a título gratuito a determinadas instalações constantes das medidas nacionais de execução da Alemanha e indicadas no anexo I, ponto A, da decisão impugnada.

13      Nos termos do artigo 2.° da decisão impugnada, salvaguardado o disposto no artigo 1.° dessa decisão, a Comissão não colocou nenhuma objeção quanto às listas de instalações abrangidas pela Diretiva 2003/87 apresentadas pelos Estados‑Membros em conformidade com o artigo 11.°, n.° 1, dessa diretiva nem quanto às quantidades anuais totais preliminares de licenças de emissão a atribuir a título gratuito às instalações em causa.

14      No artigo 3.° da decisão impugnada, a Comissão adaptou a quantidade total de licenças a emitir a partir de 2013, determinada nos termos dos artigos 9.° e 9.°‑A da Diretiva 2003/87 e fixada na Decisão 2010/634.

15      Por último, no artigo 4.° da decisão impugnada, conjugado com o anexo II desta decisão, a Comissão determinou, em conformidade com o artigo 15.°, n.° 3, da Decisão 2011/278, o fator de correção transetorial uniforme referido no artigo 10.°‑A, n.° 5, da Diretiva 2003/87.

 Tramitação processual e pedidos das partes

16      A recorrente interpôs o presente recurso por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 26 de novembro de 2013.

17      Por articulado separado, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral no mesmo dia, a recorrente requereu ao Tribunal Geral que julgasse o presente recurso seguindo uma tramitação acelerada, nos termos do artigo 76.°‑A do Regulamento de Processo do Tribunal Geral. Em 10 de dezembro de 2013, a Comissão apresentou as suas observações sobre esse requerimento.

18      Por articulado separado, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 27 de novembro de 2013, a recorrente apresentou um pedido de medidas provisórias, no qual requeria, no essencial, que o presidente do Tribunal Geral se dignasse suspender a execução da decisão impugnada, na parte em que, nessa decisão, tinha sido recusada a atribuição de licenças com base no § 9, n.° 5, da TEHG.

19      Por decisão de 17 de dezembro de 2013, o Tribunal Geral (Quinta Secção) deferiu o requerimento de tramitação acelerada.

20      Por despacho de 20 de janeiro de 2014, Romonta/Comissão (T‑614/13 R, EU:T:2014:16), foi indeferido o pedido de medidas provisórias e reservada para final a decisão quanto às despesas.

21      Em 21 de janeiro de 2014, foi encerrada a fase escrita do processo.

22      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Quinta Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo.

23      No âmbito de uma medida de organização do processo prevista no artigo 64.° do seu Regulamento de Processo, o Tribunal Geral convidou a Comissão a responder a uma questão na audiência.

24      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 14 de maio de 2014.

25      A recorrente conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

–        anular a decisão impugnada, na parte em que o artigo 1.°, n.° 1, dessa decisão recusa, para o terceiro período de comércio de licenças de emissão compreendido entre 2013 a 2020, atribuir‑lhe as licenças adicionais solicitadas com base na cláusula relativa aos casos que apresentavam dificuldades excessivas, prevista no § 9, n.° 5, da TEHG;

–        condenar a Comissão nas despesas.

26      A Comissão conclui pedindo ao Tribunal que se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

27      Sem suscitar formalmente uma exceção de inadmissibilidade, a Comissão contesta a admissibilidade do recurso. Antes de examinar os fundamentos suscitados pela recorrente, há pois que examinar a admissibilidade do recurso.

 Quanto à admissibilidade

28      A Comissão contesta a legitimidade da recorrente, mais precisamente o seu interesse direto em agir. Em seu entender, o artigo 15.°, n.os 4 e 5, da Decisão 2011/278 prevê medidas nacionais de execução antes da atribuição de licenças de emissão.

29      Nos termos do artigo 263.°, quarto parágrafo, TFUE, qualquer pessoa singular ou coletiva pode interpor, nas condições previstas nos primeiro e segundo parágrafos desse artigo, recursos contra os atos de que seja destinatária ou que lhe digam direta e individualmente respeito, bem como contra os atos regulamentares que lhe digam diretamente respeito e não necessitem de medidas de execução.

30      No caso em apreço, é pacífico que a decisão impugnada não foi dirigida à recorrente, que não é, portanto, destinatária desse ato. Nesta situação, por força do artigo 263.°, quarto parágrafo, do TFUE, a recorrente só pode interpor recurso de anulação do referido ato, nomeadamente, se o mesmo a afetar diretamente.

31      Quanto à afetação direta, é jurisprudência constante que esta condição exige, em primeiro lugar, que a medida impugnada produza diretamente efeitos na situação jurídica do particular e, em segundo lugar, que não deixe nenhum poder de apreciação aos destinatários dessa medida encarregados da sua aplicação, que tem caráter puramente automático e decorre apenas da legislação da União, sem aplicação de outras normas intermédias (acórdãos de 5 de maio de 1998, Dreyfus/Comissão, C‑386/96 P, Colet., EU:C:1998:193, n.° 43; de 29 de junho de 2004, Front national/Parlamento, C‑486/01 P, Colet., EU:C:2004:394, n.° 34; e de 10 de setembro de 2009, Comissão/Ente per le Ville vesuviane e Ente per le Ville vesuviane/Comissão, C‑445/07 P e C‑455/07 P, Colet., EU:C:2009:529, n.° 45).

32      Há que observar que, por força do artigo 11.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87, os Estados‑Membros não podem emitir licenças de emissão a título gratuito a instalações cuja inscrição na lista referida no n.° 1 tenha sido recusada pela Comissão. A recusa da inscrição da instalação da recorrente nessa lista e das quantidades anuais totais preliminares correspondentes de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a essa instalação produz, portanto, diretamente efeitos na situação jurídica da recorrente e não deixa nenhum poder de apreciação à República Federal da Alemanha, que está encarregada da execução da decisão impugnada. Por outro lado, verifica‑se que os efeitos da decisão impugnada também estão refletidos no § 9, n.° 5, da TEHG, segundo o qual a autoridade nacional só pode atribuir licenças de emissão a título gratuito com base na cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas se a Comissão não a recusar nos termos do artigo 11.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87 (v. n.° 7, supra).

33      Esta conclusão não é posta em causa pela argumentação da Comissão. Embora seja verdade, como a Comissão afirma, que o artigo 15.°, n.os 4 e 5, da Decisão 2011/278 prevê medidas nacionais de execução, não é menos certo que essa disposição não obsta a que a recorrente seja diretamente afetada pela decisão impugnada.

34      Com efeito, em primeiro lugar, no que diz respeito ao artigo 15.°, n.° 4, da Decisão 2011/278, importa salientar que este prevê que, se a Comissão não rejeitar a inscrição de uma instalação na lista de instalações prevista no artigo 11.°, n.° 1, da Diretiva 2003/87, incluindo as respetivas quantidades totais anuais preliminares de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a essa instalação, o Estado‑Membro em causa procederá à determinação da quantidade final anual de licenças de emissão atribuídas a título gratuito para cada ano do período de 2013 a 2020, em conformidade com o artigo 10.°, n.° 9, da Decisão 2011/278. Esta última disposição indica como é determinada a quantidade anual total final de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a cada instalação. Esta quantidade corresponde à quantidade total anual preliminar de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a cada instalação, multiplicada pelo fator de correção transetorial definido pela Comissão.

35      No caso em apreço, na decisão impugnada, a Comissão determinou definitivamente todos os fatores a tomar em consideração para o cálculo, pela República Federal da Alemanha, das quantidades anuais finais de licenças de emissão atribuídas a título gratuito para cada ano, durante o período de 2013 a 2020, à instalação da recorrente. Com efeito, nessa decisão, a Comissão determinou, por um lado, as quantidades anuais totais preliminares de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a cada instalação e, por outro, o fator de correção transetorial. Para calcular a quantidade anual total final de licenças de emissão atribuídas a título gratuito à instalação em causa, em conformidade com as regras previstas no artigo 10.°, n.° 9, da Decisão 2011/278, a República Federal da Alemanha não dispunha, portanto, de nenhum poder de apreciação. O cálculo dessa quantidade decorria unicamente da decisão impugnada, em que todos os fatores relevantes tinham sido determinados definitivamente. A execução da decisão impugnada, mediante o cálculo da quantidade anual total final de licenças de emissão atribuídas a título gratuito à instalação em causa, tinha, portanto, natureza puramente automática.

36      Em segundo lugar, no que diz respeito ao artigo 15.°, n.° 5, da Decisão 2011/278, recorde‑se que o mesmo obriga os Estados‑Membros a comunicar à Comissão a lista das quantidades anuais finais de licenças de emissão atribuídas a título gratuito durante o período compreendido entre 2013 e 2020, elaborada em conformidade com o artigo 10.°, n.° 9, dessa decisão, após ter determinado a quantidade anual final para todas as instalações existentes situadas nos respetivos territórios. A este respeito, basta notar que essa obrigação de informação não tem a consequência de atribuir um poder de apreciação aos Estados‑Membros e só os obriga a comunicar à Comissão o resultado do respetivo cálculo da quantidade anual total final de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a cada instalação em causa.

37      Por conseguinte, deve considerar‑se que a recorrente foi diretamente afetada pela decisão impugnada. Além disso, atendendo a que foi individualmente afetada por essa decisão, visto que, através dela, a Comissão rejeitou individualmente as quantidades anuais totais preliminares de licenças de emissão atribuídas a título gratuito à sua instalação, o que, aliás, a Comissão não contestou, a recorrente tem legitimidade para agir.

38      O recurso é, portanto, admissível.

 Quanto ao mérito

39      A recorrente invoca três fundamentos para o seu recurso, relativos, em primeiro lugar, à violação do princípio da proporcionalidade, em segundo lugar, à violação das competências dos Estados‑Membros e do princípio da subsidiariedade, e, em terceiro lugar, à violação dos direitos fundamentais. O Tribunal Geral considera oportuno examinar, em primeiro lugar, conjuntamente o primeiro e terceiro fundamentos e, em segundo lugar, o segundo fundamento.

 Quanto ao primeiro e terceiro fundamentos, relativos à violação do princípio da proporcionalidade e dos direitos fundamentais

40      A recorrente alega que, ao recusar a atribuição de licenças de emissão a título gratuito para os casos que apresentam dificuldades excessivas, a Comissão violou o princípio da proporcionalidade e os seus direitos fundamentais. A título principal, afirma que, ao considerar que a Decisão 2011/278 obstava à atribuição de licenças com fundamento numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, a Comissão não teve em conta esta decisão e violou o princípio da proporcionalidade e os seus direitos fundamentais. Subsidiariamente, a recorrente alega que, se a sua argumentação principal vier a ser rejeitada pelo facto de a Decisão 2011/278 não mencionar expressamente a possibilidade de atribuir licenças adicionais em caso de dificuldades excessivas, haverá que considerar que é esta decisão que é desproporcionada e viola os seus direitos fundamentais.

 — Quanto à argumentação, aduzida a título principal, relativa à violação do princípio da proporcionalidade e dos direitos fundamentais, por inobservância da Decisão 2011/278

41      A recorrente alega que a Comissão desrespeitou a Decisão 2011/278, quando considerou que esta decisão obstava à atribuição de licenças com fundamento numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas. Ao recusar autorizar a atribuição de licenças de emissão com fundamento no § 9, n.° 5, da TEHG, a Comissão violou o princípio da proporcionalidade e os direitos fundamentais da recorrente, a saber, a sua liberdade profissional, a sua liberdade de empresa e o seu direito de propriedade, previstos pelos artigos 15.° a 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

42      Verifica‑se que, para se poder concluir que a Comissão desrespeitou a Decisão 2011/278, violando, por conseguinte, o princípio da proporcionalidade e os direitos fundamentais da recorrente ao recusar autorizar a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com fundamento numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, é necessário que essa atribuição seja possível de acordo com essa decisão, que assenta na Diretiva 2003/87, o que a Comissão contesta.

43      No caso em apreço, importa observar que a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com base numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas não era possível de acordo com a Decisão 2011/278, que assenta na Diretiva 2003/87, porque, de acordo com as normas jurídicas aplicáveis, a Decisão 2011/278 não permitia que a Comissão autorizasse a atribuição de licenças com base nessa cláusula, e a Comissão não dispunha de nenhum poder de apreciação, como esta alega.

44      Com efeito, importa realçar, em primeiro lugar, que a Decisão 2011/278 não permite à Comissão autorizar a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com fundamento numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, como a prevista no § 9, n.° 5, da TEHG. Com efeito, o artigo 10.° da Decisão 2011/278 contém as regras com base nas quais os Estados‑Membros devem calcular, em cada ano, o número de licenças de emissão atribuídas a título gratuito, a partir de 2013, a cada uma das instalações existentes situadas nos respetivos territórios. Segundo esta disposição, os Estados‑Membros são obrigados a calcular a quantidade de licenças de emissão a atribuir a título gratuito às instalações situadas no seu território, com base nos valores dos parâmetros de referência fixados na Decisão 2011/278 ou nos das emissões de processo, em determinados coeficientes de multiplicação e no fator de correção transetorial determinado em conformidade com o artigo 15.°, n.° 3, dessa decisão.

45      Estas regras de atribuição são explicadas, nos considerandos da Decisão 2011/278. Como resulta do considerando 4 da Decisão 2011/278, a Comissão elaborou, na medida do possível, os parâmetros de referência relativamente aos produtos. Segundo o considerando 12 da referida decisão, nos casos em que não foi possível calcular o parâmetro de referência de um produto, mas são produzidos gases com efeito de estufa elegíveis para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito, foram formuladas três abordagens de recurso hierarquizadas. Assim, resulta do referido considerando 12 que o parâmetro de referência relativo ao calor se aplica aos processos de consumo de calor em que é utilizado um vetor térmico quantificável. O parâmetro de referência relativo ao combustível aplica‑se quando é consumido calor não mensurável. No caso das emissões resultantes de processos, as licenças de emissão são atribuídas com base nas emissões históricas.

46      O sistema criado pela Decisão 2011/278 prevê, pois, regras taxativas para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito, pelo que fica excluída qualquer atribuição de licenças a título gratuito fora dessas normas. Esta conclusão é corroborada pelo facto de que, apesar de ter sido discutida a inclusão de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, por iniciativa de um Estado‑Membro no decurso do procedimento de adoção da Decisão 2011/278, essa cláusula acabou por não ser acolhida, como a Comissão indicou na audiência, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral.

47      Em segundo lugar, há que salientar que a Comissão não dispunha de nenhum poder de apreciação para rejeitar a inscrição da instalação da recorrente nas listas de instalações abrangidas pela Diretiva 2003/87 e apresentadas à Comissão nos termos do artigo 11.°, n.° 1, desta diretiva, e as quantidades anuais totais preliminares correspondentes de licenças de emissão atribuídas a título gratuito a essa instalação. Com efeito, a decisão impugnada tem como bases jurídicas os artigos 10.°‑A e 11.° da Diretiva 2003/87. Em conformidade com o artigo 11.°, n.° 1, dessa diretiva, cada Estado‑Membro apresenta à Comissão a lista das instalações abrangidas pela referida diretiva no seu território e de eventuais atribuições a título gratuito a cada instalação no seu território, calculadas nos termos das regras referidas no artigo 10.°‑A, n.° 1, e no artigo 10.°‑C da mesma diretiva. Segundo o artigo 11.°, n.° 3, dessa diretiva, os Estados‑Membros não podem emitir licenças de emissão a título gratuito a instalações cuja inscrição na lista referida no n.° 1 desse artigo tenha sido rejeitada pela Comissão. Como a Comissão afirma, decorre do artigo 11.°, n.os 1 e 3, da Diretiva 2003/87 que a sua decisão de recusar ou não a inscrição de uma instalação na lista em causa depende exclusivamente de saber se as licenças atribuídas à instalação pelo Estado‑Membro em questão foram calculadas de acordo com as regras referidas no artigo 10.°‑A, n.° 1, e no artigo 10.°‑C da mencionada diretiva. Se não tiver sido esse o caso, a Comissão tem a obrigação de recusar essa inscrição, sem que tenha poder discricionário a esse respeito.

48      Em terceiro lugar, a argumentação da recorrente deve também ser rejeitada na parte em que esta alega que é possível o reconhecimento de um caso de força maior, sendo permitida, assim, a atribuição de licenças de emissão a título gratuito quando uma empresa corre o risco de se tornar insolvente e de não poder cumprir a sua obrigação de reembolso por falta de meios suficientes. Com efeito, é certo que, segundo a jurisprudência, mesmo na falta de disposição específica, o reconhecimento de um caso de força maior é possível quando uma causa exterior invocada pelos interessados tenha consequências irresistíveis e inevitáveis, de modo a tornar objetivamente impossível, para as pessoas em causa, a observância das suas obrigações (acórdão de 17 de outubro de 2013, Billerud Karlsborg e Billerud Skärblacka, C‑203/12, Colet., EU:C:2013:664, n.° 31; v., igualmente, neste sentido, acórdão de 18 de março de 1980, Ferriera Valsabbia e o./Comissão, 154/78, 205/78, 206/78, 226/78 a 228/78, 263/78, 264/78, 31/79, 39/79, 83/79 e 85/79, Recueil, EU:C:1980:81, n.° 140). Contudo, dado que a recorrente está sujeita, desde 1 de janeiro de 2005, ao regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa previsto na Diretiva 2003/87, o simples risco de se tornar insolvente e de não poder cumprir uma obrigação de reembolso por falta de meios suficientes não é suficiente para que se verifique um caso de força maior, que exige um circunstancialismo alheio a quem a invoca, anormal e imprevisível, cujas consequências não poderiam ter sido evitadas, apesar de todas as diligências desenvolvidas (v. acórdão de 18 de julho de 2013, Eurofit, C‑99/12, Colet., EU:C:2013:487, n.° 31 e jurisprudência aí referida).

49      Por conseguinte, a Comissão não violou a Decisão 2011/278 ao recusar a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com fundamento numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas.

50      Há, pois, que rejeitar a argumentação aduzida pela recorrente a título principal.

 — Quanto à argumentação, aduzida a título subsidiário, relativa à violação do princípio da proporcionalidade e dos direitos fundamentais pela Decisão 2011/278

51      A recorrente alega que a Decisão 2011/278, na parte em que não permite a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com base numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, viola os seus direitos fundamentais e o princípio da proporcionalidade.

52      Há que verificar, pois, se a Comissão violou os direitos fundamentais da recorrente e o princípio da proporcionalidade, ao não prever, nas regras de atribuição de licenças de emissão a título gratuito estabelecidas na Decisão 2011/278, que estas licenças de emissão a título gratuito podiam ser atribuídas com base numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas.

53      Saliente‑se que não se pode excluir, desde logo, a violação dos direitos fundamentais e do princípio da proporcionalidade devido à inexistência, nas regras de atribuição de licenças de emissão a título gratuito estabelecidas pela Decisão 2011/278, de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, uma vez que o artigo 10.°‑A da Diretiva 2003/87, que constitui a base jurídica dessa decisão, não obsta à atribuição, pela Comissão, de licenças de emissão a título gratuito com base numa cláusula desse tipo. Com efeito, em primeiro lugar, por força do artigo 10.°‑A, n.° 1, primeiro e segundo parágrafos, da Diretiva 2003/87, a Comissão estava obrigada a aprovar medidas de execução, a nível da União, plenamente harmonizadas para a atribuição das licenças de emissão a título gratuito, medidas essas que se destinavam a alterar elementos não essenciais da Diretiva 2003/87, para a completar. O estabelecimento, pela Comissão, de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, aplicável a todos os Estados‑Membros, respeitaria a exigência de plena harmonização, a nível da União, dessas medidas de execução. Além disso, porque essa cláusula apenas versaria sobre casos excecionais e, consequentemente, não poria em causa o sistema estabelecido pela Diretiva 2003/87, não se destinava a alterar elementos essenciais dessa diretiva. Em segundo lugar, por força do artigo 10.°‑A, n.° 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2003/87, a Comissão estava obrigada a determinar, na medida do possível, parâmetros de referência ex ante. Nos casos em que não era possível calcular o parâmetro de referência de um produto, mas eram produzidos gases com efeito de estufa elegíveis para a atribuição de licenças de emissão a título gratuito, a Comissão dispunha de um amplo poder discricionário para estabelecer regras, o que fez, formulando três abordagens de recurso hierarquizadas. Assim, no âmbito desse poder discricionário, a Comissão também poderia ter previsto a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com base numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas.

54      Para corroborar a sua argumentação, a recorrente alega que a Decisão 2011/278, ao não prever uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, não respeitou a sua liberdade profissional, a sua liberdade de empresa e o seu direito de propriedade, previstos pelos artigos 15.° a 17.° da Carta dos Direitos Fundamentais, nem o princípio da proporcionalidade.

55      Por força do artigo 6.°, n.° 1, primeiro parágrafo, TUE, a União reconhece os direitos, as liberdades e os princípios enunciados na Carta dos Direitos Fundamentais, que tem o mesmo valor jurídico que os Tratados.

56      O artigo 15.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais dispõe que todas as pessoas têm o direito de exercer uma profissão livremente escolhida ou aceite. Nos termos do artigo 16.° da Carta dos Direitos Fundamentais, é reconhecida a liberdade de empresa, de acordo com o direito da União e com as legislações e práticas nacionais. A proteção conferida pelo referido artigo 16.° abrange a liberdade de exercer uma atividade económica ou comercial, a liberdade contratual e a livre concorrência, como decorre das explicações relativas a este mesmo artigo, que devem, em conformidade com o artigo 6.°, n.° 1, terceiro parágrafo, TUE e 52.°, n.° 7, da Carta dos Direitos Fundamentais, ser tomadas em consideração para a interpretação desta (acórdão de 22 de janeiro de 2013, Sky Österreich, C‑283/11, Colet., EU:C:2013:28, n.° 42).

57      Nos termos do artigo 17.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais, todas as pessoas têm o direito de fruir da propriedade dos seus bens legalmente adquiridos, de os utilizar, de dispor deles e de os transmitir em vida ou por morte. Ninguém pode ser privado da sua propriedade, exceto por razões de utilidade pública, nos casos e condições previstos por lei e mediante justa indemnização pela respetiva perda, em tempo útil. A utilização dos bens pode ser regulamentada por lei na medida do necessário ao interesse geral. A proteção conferida por esse artigo tem por objeto direitos com valor patrimonial, do qual decorre, tendo em conta a ordem jurídica, uma posição jurídica adquirida, que permite o exercício autónomo destes direitos pelo e a favor do seu titular (acórdão Sky Österreich, n.°  56, supra, EU:C:2013:28, n.° 34).

58      Importa realçar que, na falta de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas na Decisão 2011/278, a Comissão era obrigada a rejeitar a atribuição de licenças de emissão a título gratuito à recorrente, que excedia as regras de atribuição previstas nesta decisão. Como semelhante cláusula se destinava a fazer face às dificuldades excessivas encontradas pela instalação em causa, que ameaçam a sua existência, a sua inexistência constitui uma ingerência na liberdade profissional e na liberdade de empresa, e no direito de propriedade da recorrente.

59      Todavia, segundo jurisprudência constante, o livre exercício de uma atividade profissional, assim como o direito de propriedade, não devem ser entendidos como prerrogativas absolutas, antes devendo ser considerados atendendo à sua função na sociedade. Por conseguinte, podem ser introduzidas restrições ao exercício dessas liberdades e ao direito de propriedade, desde que estas restrições correspondam, efetivamente, a objetivos de interesse geral prosseguidos pela União e não constituam, face a esses objetivos, uma intervenção desproporcionada e intolerável, suscetível de atentar contra a própria essência desses direitos (acórdão de 14 de maio de 1974, Nold/Comissão, 4/73, Colet., EU:C:1974:51, n.° 14; v., também, acórdãos de 21 de fevereiro de 1991, Zuckerfabrik Süderdithmarschen e Zuckerfabrik Soest, C‑143/88 e C‑92/89, Colet., EU:C:1991:65, n.° 73 e jurisprudência aí referida; de 6 de setembro de 2012, Deutsches Weintor, C‑544/10, Colet., EU:C:2012:526, n.° 54 e jurisprudência aí referida; e acórdão Sky Österreich, n.°  56, supra, EU: C:2013:28, n.° 45 e jurisprudência aí referida). Nos termos do artigo 52.°, n.° 1, da Carta dos Direitos Fundamentais, qualquer restrição ao exercício dos direitos e liberdades reconhecidos por esta deve ser prevista por lei e respeitar o conteúdo essencial desses direitos e liberdades. Na observância do princípio da proporcionalidade, essas restrições só podem ser introduzidas se forem necessárias e corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União, ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros.

60      No que diz respeito aos objetivos de interesse geral anteriormente, referidos, resulta igualmente de jurisprudência constante que entre eles se conta a proteção do ambiente (v. acórdão de 9 de março de 2010, ERG e o., C‑379/08 e C‑380/08, Colet., EU:C:2010:127, n.° 81 e jurisprudência aí referida).

61      Verifica‑se que a inexistência, na Decisão 2011/278, de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas não afeta o conteúdo essencial da liberdade profissional e da liberdade de empresa, nem do direito de propriedade. Com efeito, a inexistência dessa cláusula não impede o exercício de uma atividade profissional e empresarial enquanto tal pelos operadores de instalações sujeitos ao regime de comércio de licenças de emissão, nem os priva da respetiva propriedade. Os encargos que decorrem da inexistência dessa cláusula para as instalações em causa estão conexos com a obrigação de comprar em leilão as licenças em falta, que é a regra estabelecida pela Diretiva 2009/29.

62      Quanto à proporcionalidade da ingerência verificada, há que recordar que, segundo jurisprudência constante, o princípio da proporcionalidade, que é um dos princípios gerais do direito da União, exige que os atos das instituições não ultrapassem os limites do que é adequado e necessário para a realização dos objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa, entendendo‑se que, quando se proporcione uma escolha entre várias medidas adequadas, se deve recorrer à menos restritiva, e que os inconvenientes causados não devem ser desproporcionados relativamente aos objetivos prosseguidos (v. acórdão de 8 de julho de 2010, Afton Chemical, C‑343/09, Colet., EU:C:2010:419, n.° 45 e jurisprudência aí referida).

63      No que diz respeito à fiscalização jurisdicional das condições acima mencionadas no n.° 62, há que reconhecer à Comissão um amplo poder de apreciação num domínio como o do caso vertente, que implica, por sua parte, opções de natureza política, económica e social, e no qual é chamada a efetuar apreciações e avaliações complexas face ao objetivo geral de redução das emissões de gases com efeito de estufa através de um regime de comércio de licenças em condições que ofereçam uma boa relação custo‑eficácia e sejam economicamente eficientes (artigo 1.°, primeiro parágrafo, e considerando 5 da Diretiva 2003/87). Só a manifesta inadequação de uma medida adotada nesse domínio, em relação ao objetivo que as instituições competentes pretendem prosseguir, pode afetar a legalidade dessa medida (v., neste sentido, acórdãos de 12 de dezembro de 2006, Alemanha/Parlamento e Conselho, C‑380/03, Colet., EU:C:2006:772, n.° 145; e jurisprudência aí referida, e de 7 de março de 2013, Polónia/Comissão, T‑370/11, Colet., EU:T:2013:113, n.° 65 e jurisprudência aí referida).

64      A recorrente contesta a adequação da Decisão 2011/278 e alega que esta decisão não é manifestamente proporcionada, em sentido estrito.

65      Em primeiro lugar, no tocante à adequação da Decisão 2011/278, a recorrente alega que a inexistência de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas não aproveita à proteção do clima. Segundo afirma, por um lado, qualquer aumento do número de licenças num caso específico implica um aumento do fator de correção transetorial, que tem o objetivo de garantir o respeito da quantidade de licenças gratuitas a emitir para toda a União, definida num valor fixo. Por outro lado, o desaparecimento da sua instalação não implicaria uma redução absoluta das emissões, dado que a procura de produtos não cessaria e seria coberta por concorrentes situados fora da União, que não gerariam menos emissões.

66      A este respeito, saliente‑se que o objetivo principal declarado da Diretiva 2003/87, antes da sua alteração pela Diretiva 2009/29, era reduzir substancialmente as emissões de gases com efeito de estufa, para cumprir os compromissos da União e dos Estados‑Membros relativamente ao Protocolo de Quioto, aprovado pela Decisão 2002/358/CE do Conselho, de 25 de abril de 2002, relativa à aprovação, em nome da Comunidade Europeia, do Protocolo de Quioto da Convenção‑Quadro das Nações Unidas sobre as alterações climáticas e ao cumprimento conjunto dos respetivos compromissos (JO L 130, p. 1) (acórdãos de 29 de março de 2012, Comissão/Polónia, C‑504/09 P, Colet., EU:C:2012:178, n.° 77, e Comissão/Estónia, C‑505/09 P, Colet., EU:C:2012:179, n.° 79). Nos termos do considerando 4 da Diretiva 2003/87, o Protocolo de Quioto obrigava a União e os seus Estados‑Membros, no período de 2008 a 2012, a reduzirem em 8% as suas emissões antropogénicas agregadas de gases com efeito de estufa, em relação ao nível de 1990 (acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 67).

67      Resulta do artigo 1.°, segundo parágrafo, e do considerando 3 da Diretiva 2003/87 que, após a sua alteração pela Diretiva 2009/29, a Diretiva 2003/87 prevê maiores reduções das emissões de gases com efeito de estufa, a fim de contribuir para os níveis de reduções considerados cientificamente necessários para evitar alterações climáticas perigosas. Como decorre destas disposições e dos considerandos 3, 5, 6 e 13 da Diretiva 2009/29, o objetivo principal da Diretiva 2003/87, após a sua alteração pela Diretiva 2009/29, é reduzir, até 2020, as emissões globais de gases com efeito de estufa da União em pelo menos 20% face aos níveis de 1990 (acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 68).

68      Este objetivo deve ser alcançado com observância de uma série de subobjetivos e com recurso a certos instrumentos. O instrumento principal para este efeito é constituído pelo regime de comércio de direitos de emissão de gases com efeito de estufa, como decorre do artigo 1.°, primeiro parágrafo, da Diretiva 2003/87 e do seu considerando 2. O artigo 1.°, primeiro parágrafo, desta diretiva expõe que este regime promove a redução das referidas emissões em condições que ofereçam uma boa relação custo‑eficácia e sejam economicamente eficientes. Os outros subobjetivos a que o referido regime deve dar resposta são, designadamente, conforme mencionado nos considerandos 5 e 7 desta diretiva, a preservação do desenvolvimento económico e do emprego, bem como da integridade do mercado interno e das condições de concorrência (acórdãos Comissão/Polónia, n.°  66, supra, EU:C:2012:178, n.° 77; Comissão/Estónia, n.°  66, supra, EU:C:2012:179, n.° 79; e Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 69).

69      Em primeiro lugar, no que respeita ao objetivo principal da Diretiva 2003/87, a saber, a redução das emissões de gases com efeito de estufa na União, não se pode arguir que, na falta de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, as regras de atribuição constantes da Decisão 2011/278 são manifestamente inadequadas para atingir esse objetivo. Com efeito, as regras de cálculo relativas às atribuições de licenças de emissão, previstas na Decisão 2011/278 e baseadas em parâmetros de referência relativos a produtos, ao calor, a combustíveis e às emissões de processo, destinam‑se a impedir que a quantidade de licenças a atribuir a título gratuito para o terceiro período de comércio, a saber, a partir de 2013, seja reduzida face à quantidade a atribuir para o segundo período de comércio, a saber, o período compreendido entre 2008 e 2012. Estas medidas fazem parte das regras transitórias relativas à emissão de licenças a título gratuito previstas no artigo 10.°‑A da Diretiva 2003/87 e destinam‑se, como resulta do n.° 1, terceiro parágrafo, desta disposição, a assegurar que a atribuição se processe de uma forma que incentive reduções das emissões de gases com efeito de estufa e técnicas energéticas eficientes e que não incentive o aumento das emissões.

70      Esta conclusão não é posta em causa pelo facto de, apesar de ser permitida a atribuição de licenças a título gratuito adicionais com base numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, a quantidade anual máxima de licenças gratuitas a que se refere o artigo 10.°‑A, n.° 5, da Diretiva 2003/87 não ser aumentada devido à necessária aplicação do fator de correção transetorial uniforme, que leva a uma redução uniforme das quantidades iniciais de licenças gratuitas em todos os setores e subsetores em causa. Com efeito, como a Comissão afirma, se existisse uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, os operadores de instalações poderiam ser menos incentivados a reduzir as suas emissões através de medidas de adaptação económicas ou técnicas, uma vez que poderiam pedir que fossem atribuídas às suas instalações licenças a título gratuito adicionais em caso de dificuldades excessivas.

71      Quanto ao argumento da recorrente de que o desaparecimento da sua instalação não implicaria uma redução absoluta das emissões, dado que a procura de produtos não cessaria e estaria coberta por concorrentes situados fora da União que não gerariam menos emissões, importa salientar, por um lado, que o objetivo principal da Diretiva 2003/87 consiste em reduzir as emissões de gases com efeito de estufa na União. Importa referir, por outro lado, que é inerente a regras gerais de atribuição que elas tenham um impacto mais importante em determinadas instalações do que noutras (acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 85). Além disso, o artigo 10.°‑A, n.° 12, da Diretiva 2003/87 institui uma regra especial para a atribuição de licenças gratuitas às instalações dos setores ou subsetores expostos a um risco significativo de «fugas de carbono», a saber, um risco de relocalização das atividades das empresas dos setores expostos a uma forte concorrência internacional, implantadas na União, em países terceiros em que os requisitos em matéria de emissões de gases com efeito de estufa são menos rigorosos. Esta regra especial reduz o risco de um simples deslocação das emissões.

72      Em segundo lugar, no que respeita aos subobjetivos da Diretiva 2003/87, a saber, a preservação do desenvolvimento económico e do emprego, é verdade que o Tribunal Geral já decidiu que o objetivo da redução dos gases com efeito de estufa em conformidade com os compromissos assumidos pela União e pelos Estados‑Membros no quadro do Protocolo de Quioto deve ser realizado, na medida do possível, no respeito das exigências da economia europeia (acórdão de 23 de novembro de 2005, Reino Unido/Comissão, T‑178/05, Colet., EU:T:2005:412, n.° 60). No entanto, há que ter em conta que, desde o terceiro período de comércio, a atribuição de licenças assenta, como o considerando 15 da Diretiva 2009/29 indica, no princípio da venda em leilão, previsto no artigo 10.° da Diretiva 2003/87 (acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 72). Atendendo a que, para atenuar os eventuais efeitos negativos do regime de comércio de licenças naqueles subobjetivos, este princípio foi sujeito a exceções, a saber, as disposições transitórias previstas no artigo 10.°‑A da Diretiva 2003/87, que implicam a atribuição de licenças a título gratuito durante um período transitório, a possibilidade de medidas financeiras prevista no n.° 6 desse artigo e as regras especiais aplicáveis aos setores expostos a um risco significativo de fugas de carbono, previstas no n.° 12 do referido artigo, não se pode arguir que as regras de atribuição de licenças previstas na Decisão 2011/278 são manifestamente inadequadas face a esses subobjetivos.

73      Consequentemente, a recorrente não aduziu elementos que permitam considerar que a Decisão 2011/278 era manifestamente inadequada face aos objetivos a atingir, devido à inexistência de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas.

74      Em segundo lugar, no tocante à proporcionalidade em sentido estrito da Decisão 2011/278 quanto à inexistência de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, cumpre recordar que, em aplicação deste princípio, a Decisão 2011/278, mesmo que seja adequada e necessária à realização das finalidades legitimamente prosseguidas, não deve causar inconvenientes excessivos face aos objetivos pretendidos (v., neste sentido, acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 89).

75      Há, pois, que examinar se a inexistência, na Decisão 2011/278, de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas é suscetível de causar, aos operadores de instalações sujeitos ao regime de comércio de licenças de emissão, inconvenientes excessivos face aos objetivos pretendidos pelo estabelecimento desse sistema, pelo que essa decisão é manifestamente desproporcionada em sentido estrito.

76      A este respeito, refira‑se que, ao aprovar medidas de execução plenamente harmonizadas, a nível da União, para a atribuição de licenças a título gratuito nos termos do artigo 10.°‑A, n.° 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2003/87, a Comissão tinha de fazer a ponderação entre, por um lado, os direitos fundamentais dos operadores de instalações sujeitos ao regime de comércio de licenças de emissão e, por outro, a proteção do ambiente, prevista no artigo 37.° da Carta dos Direitos Fundamentais, no artigo 3.°, n.° 3, primeiro parágrafo, TUE e nos artigos 11.° TFUE e 191.° TFUE.

77      Quando estão em causa vários direitos e liberdades fundamentais protegidos pela ordem jurídica da União, a apreciação do eventual caráter desproporcionado de uma disposição do direito da União deve respeitar a necessária conciliação das exigências ligadas à proteção desses diferentes direitos e liberdades, e um equilíbrio justo entre os mesmos (v. acórdão Sky Österreich, n.°  56, supra, EU:C:2013:28, n.° 60 e jurisprudência aí referida; v., igualmente, neste sentido, acórdão de 12 de junho de 2003, Schmidberger, C‑112/00, Colet., EU:C:2003:333, n.os 77 e 81).

78      A recorrente alega que a Comissão não apreciou corretamente, nem ponderou, a proteção do clima e a sua ruína económica. A Comissão considerou que a sua colocação em liquidação judicial era uma medida positiva a favor de uma proteção melhor do clima. Segundo a recorrente, a Comissão ignorou o facto de uma melhoria da proteção do clima não ser assegurada no caso vertente, devido ao risco de deslocação das emissões para fora da União. Além disso, a Comissão ignorou as graves consequências que resultam, para a recorrente, para os seus trabalhadores e para os seus clientes, da cessação das suas atividades. Segundo a recorrente, a Comissão considerou erradamente que a proteção do clima devia prevalecer sobre a manutenção de um grande número de postos de trabalho.

79      Há que salientar que a recorrente não apresentou elementos que permitam considerar que, na falta de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, a Decisão 2011/278 é manifestamente desproporcionada em sentido estrito.

80      Com efeito, em primeiro lugar, contrariamente ao que alega a Comissão, a introdução de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas não é, na verdade, incompatível com os objetivos da Diretiva 2003/87, uma vez que o objetivo principal de redução das emissões de gases com efeito de estufa na União deve ser alcançado com observância de uma série de subobjetivos e com recurso a certos instrumentos (v. n.° 68, supra). O artigo 1.°, primeiro parágrafo, desta diretiva refere que o regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa promove a redução das referidas emissões em condições que ofereçam uma boa relação custo‑eficácia e sejam economicamente eficientes. Os outros subobjetivos a que o referido regime deve dar resposta são, conforme referido no considerando 5 desta diretiva, a preservação do desenvolvimento económico e do emprego. A atribuição de licenças de emissão a título gratuito com base numa cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas destina‑se, precisamente, a evitar essas dificuldades para as instalações em causa e é favorável à preservação do desenvolvimento económico e do emprego.

81      Todavia, a inserção de tal cláusula é dificilmente conciliável com o princípio do poluidor‑pagador, consagrado, para o domínio do ambiente, no artigo 191.°, n.° 2, TFUE. Com efeito, de acordo com este princípio, a finalidade do regime de comércio de licenças consistia em fixar um preço para as emissões de gases com efeito de estufa e deixar aos operadores a opção entre o pagamento do preço ou a redução das suas emissões (acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 90). O princípio do poluidor‑pagador destina‑se assim, no essencial, a responsabilizar individualmente cada instalação em causa. Ora, a introdução de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas teria como consequência a atribuição de licenças adicionais a título gratuito a determinadas instalações e a redução uniforme da mesma quantidade deste tipo de licenças para as instalações de todos os setores e subsetores em causa, devido à necessária aplicação do fator de correção transetorial uniforme, pois a quantidade anual máxima de licenças a que se refere o artigo 10.°‑A, n.° 5, da Diretiva 2003/87 não pode ser aumentada. O aumento das quantidades de licenças a atribuir a título gratuito para as instalações em causa, por aplicação de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, poderia, pois, ter como consequência a redução deste tipo de licenças para outras instalações (v., neste sentido, acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 83). Isso seria concebível se a atribuição de licenças de emissão a título gratuito nos termos do regime de comércio de licenças fosse regida pelo princípio da solidariedade, como sucedia com o regime de quotas de produção estabelecido com base no artigo 58.° CA, na presença de uma crise manifesta da indústria siderúrgica, para repartir equitativamente, por toda essa indústria, as consequências resultantes da adaptação da produção às menores possibilidades de escoamento (acórdão de 29 de setembro de 1987, Fabrique de fer de Charleroi e Dillinger Hüttenwerke/Comissão, 351/85 e 360/85, Colet., EU:C:1987:392, n.os 13 a 16). Todavia, o estabelecimento de um regime de comércio de licenças de emissão pertence ao domínio do ambiente, que se rege pelo princípio do poluidor‑pagador.

82      Em segundo lugar, importa salientar que as regras introduzidas pela Diretiva 2009/29 para o período de comércio a contar de 2013 alteraram profundamente os métodos de atribuição das licenças para, à luz da experiência adquirida no primeiro e segundo períodos de comércio, a saber, durante os períodos compreendidos entre 2005 e 2007 e 2008 e 2012, instituir um regime mais harmonizado de comércio de licenças de emissão, a fim de explorar melhor os benefícios do comércio de licenças de emissão, evitar distorções no mercado interno e facilitar a ligação entre os diferentes regimes de comércio de licenças de emissão, como enunciado no considerando 8 da Diretiva 2009/29 (acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 53). Além disso, resulta do artigo 1.°, segundo parágrafo, e do considerando 3 da Diretiva 2003/87 que, após a sua alteração pela Diretiva 2009/29, a Diretiva 2003/87 prevê maiores reduções das emissões de gases com efeito de estufa, a fim de contribuir para os níveis de reduções considerados cientificamente necessários para evitar alterações climáticas perigosas (acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 68). Para o terceiro período de comércio, o artigo 9.° da Diretiva 2003/87 dispõe que a quantidade de licenças de emissão emitidas anualmente, no conjunto da União, a partir de 2013, deve diminuir de forma linear, a partir de meados do período de 2008 a 2012. Segundo o artigo 10.°, n.° 1, da Diretiva 2003/87 e o considerando 15 da Diretiva 2009/29, a partir de 2013, a atribuição das licenças assenta no princípio da venda em leilão. Por força do artigo 10.°‑A, n.° 3, da Diretiva 2003/87, em princípio, mais nenhuma quota pode ser atribuída a título gratuito a produtores de eletricidade. Em conformidade com o artigo 10.°‑A, n.° 11, segundo período, da Diretiva 2003/87, após 2013 a atribuição de licenças a título gratuito deve diminuir anualmente, em quantidades iguais até atingir 30% em 2020, com vista a alcançar a eliminação total destas em 2027.

83      Para atenuar as consequências deste regime de comércio de licenças para os setores e subsetores em causa, o legislador da União previu regras transitórias no artigo 10.°‑A da Diretiva 2003/87, para respeitar os direitos fundamentais e os princípios reconhecidos, nomeadamente, pela Carta dos Direitos Fundamentais, como resulta do considerando 50 da Diretiva 2009/29. Assim, o legislador da União estabeleceu um sistema transitório de atribuição de licenças a título gratuito para setores diversos do da produção de eletricidade, ao qual não foi atribuída nenhuma quota a título gratuito, por força do artigo 10.°‑A, n.° 3, da Diretiva 2003/87. Segundo o considerando 19 da Diretiva 2009/29, este setor tem, segundo o legislador, a possibilidade de repercutir o aumento do custo do CO2.

84      Além disso, o legislador criou regras especiais para determinados setores, de modo a perturbar o menos possível o desenvolvimento económico e o emprego, como resulta do considerando 5 da Diretiva 2003/87.

85      Por um lado, segundo o artigo 10.°‑A, n.° 6, da Diretiva 2003/87, os Estados‑Membros podem tomar medidas financeiras a favor de setores ou subsetores considerados expostos a um risco significativo de fugas de carbono, devido aos custos relacionados com as emissões de gases com efeito de estufa repercutidos no preço da eletricidade, a fim de compensar os referidos custos, caso essas medidas financeiras sejam compatíveis com as normas aplicáveis e a aprovar em matéria de auxílios estatais. A este respeito, a Comissão adotou as Orientações relativas a determinadas medidas de auxílios estatal no âmbito do regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa após 2012 (JO 2012, C 158, p. 4). A Comissão também já autorizou auxílios de Estado destinadas às empresas alemãs expostas a um risco significativo de fugas de carbono, devido aos custos relacionados com as emissões de gases com efeito de estufa repercutidos no preço da eletricidade (JO 2013, C 353, p. 2).

86      Por outro lado, o legislador previu, no artigo 10.°‑A, n.° 12, da Diretiva 2003/87, uma regra especial para a atribuição de licenças gratuitas às instalações dos setores ou subsetores expostos a um risco significativo de fugas de carbono. Segundo esta regra, as instalações em causa deviam receber, em 2013 e, subsequentemente, todos os anos até 2020, licenças de emissão a título gratuito correspondente a 100% da quantidade determinada de acordo com as medidas referidas no artigo 10.°‑A, n.° 1, da Diretiva 2003/87. Essa regra foi introduzida, segundo o considerando 24 da Diretiva 2009/29, para evitar desvantagens económicas para os setores e subsetores da União com utilização intensiva de energia sujeitos à concorrência internacional, que não está sujeita a restrições comparáveis em matérias de emissões de carbono.

87      Ademais, por força do artigo 10.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87, cabe aos Estados‑Membros determinar a utilização que é feita do produto da venda em leilão das licenças. Nesse aspeto, são obrigados a utilizar uma percentagem mínima de 50% das receitas geradas pela venda das licenças em leilão para os fins enumerados nessa disposição, entre os quais se contam, designadamente, de acordo com o seu n.° 3, alíneas a) e g), por um lado, a redução das emissões de gases com efeito de estufa e, por outro, o financiamento de ações de investigação e de desenvolvimento nos domínios da eficiência energética e das tecnologias limpas nos setores abrangidos pela Diretiva 2003/87.

88      Por conseguinte, uma vez que o princípio de base da venda das licenças de emissão em leilão, previsto na Diretiva 2003/87, não é posto em causa pela recorrente, a desvantagem que os operadores de instalações sujeitos ao regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa podem sofrer devido à inexistência de uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas consiste em que, durante o período transitório, aqueles só podem obter licenças gratuitas em aplicação das regras da Decisão 2011/278 e não, adicionalmente, ao abrigo dessa cláusula.

89      Assim sendo, a Decisão 2011/278 não se revela manifestamente desproporcionada em sentido estrito, por não prever, adicionalmente, uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas respeitantes a situações particulares. A recorrente não aduziu elementos que permitam considerar que, além do risco numa economia de mercado, a existência dos operadores de instalações sujeitos ao regime de comércio de licenças de emissão de gases com efeito de estufa é tipicamente ameaçada pela aplicação das regras de atribuição de licenças previstas na Decisão 2011/278. O facto de esta decisão não prever nenhuma cláusula para evitar as situações nas quais a existência de uma empresa está ameaçada devido a dificuldades económicas e financeiras resultantes da sua gestão individual não permite concluir que a mesma é manifestamente desproporcionada em sentido estrito. A este respeito, importa salientar que os Estados‑Membros podem, com observância dos artigos 107.° TFUE e 108.° TFUE, tomar em consideração medidas de auxílios de Estado.

90      No caso em apreço, há que observar que, segundo a recorrente, as suas dificuldades económicas e financeiras assentam, essencialmente, no facto de a Comissão ter erradamente recusado determinar, na Decisão 2011/278, um parâmetro de referência relativo a produtos específico para a cera de lignito, de que é o único fabricante na Europa. Segundo a recorrente, se tivesse sido determinado esse parâmetro de referência relativo a produtos, as regras de atribuição previstas na Decisão 2011/278 tinham‑lhe permitido obter licenças gratuitas suficientes. Ora, as circunstâncias na origem dessas dificuldades, que dizem respeito à determinação, pela Comissão, de um parâmetro de referência para um produto específico, não permitem considerar que a existência das instalações é tipicamente ameaçada pela aplicação das regras de atribuição de licenças previstas na Decisão 2011/278, tanto mais que a recorrente não aduziu, no âmbito do presente recurso, nenhum fundamento relativo à não determinação, nessa decisão, de um parâmetro de referência relativo a produtos para a cera de lignito, como resulta igualmente da audiência.

91      Em especial, não resulta dos elementos de facto e de direito apresentados pela recorrente que as regras previstas no artigo 10.°‑A, n.° 12, da Diretiva 2003/87 não são suscetíveis de evitar, em determinados casos, as dificuldades económicas para as instalações que fazem parte de um setor exposto a um risco significativo de fugas de carbono, nos termos da Decisão 2010/2/UE da Comissão, de 24 de dezembro de 2009, que estabelece, nos termos da Diretiva 2003/87, uma lista dos setores e subsetores considerados expostos a um risco significativo de fugas de carbono (JO 2010, L 1, p. 10), conforme alterada, pela última vez, pela Decisão 2014/9/UE da Comissão, de 18 de dezembro de 2013 (JO 2014, L 9, p. 9). A este respeito, há que observar que a recorrente pertence a esse setor, por força do ponto 1.2 do anexo da Decisão 2010/2. Com efeito, a recorrente pertence ao setor «Fabricação de produtos petrolíferos refinados», correspondente ao código 2320 da Nomenclatura Estatística das Atividades Económicas na União Europeia (NACE). A recorrente já beneficia, por isso, de um tratamento especial, na medida em que obteve em 2013, e obterá todos os anos seguintes, até 2020, uma quantidade de licenças gratuitas que representa 100% da quantidade determinada em conformidade com a Decisão 2011/278, e não apenas 80% com uma diminuição anual em quantidades iguais até atingir 30% a contar de 2020, que é o que está previsto no regime geral, por força do artigo 10.°‑A, n.° 11, da Diretiva 2003/87.

92      Segundo a jurisprudência, o benefício último para o ambiente depende do rigor com que se determina a quantidade total de licenças de emissão concedidas, que equivale ao limite global de emissões autorizadas pelo regime de comércio de licenças (acórdão Billerud Karlsborg e a Billerud Skärblacka, n.°  48, supra, EU:C:2013:664, n.° 26). Como a Comissão afirma, se existisse uma cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, os operadores seriam menos incentivados a reduzir as suas emissões através de medidas de adaptação económicas ou técnicas, uma vez que poderiam sempre pedir, em caso de dificuldades excessivas, a atribuição de licenças gratuitas adicionais.

93      Além disso, já foi decidido que, embora as instituições devam velar, no exercício dos seus poderes, por que os ónus impostos aos operadores económicos não excedam o que é necessário para atingir os objetivos que a autoridade é obrigada a realizar, daí não resulta, no entanto, que essa obrigação deva ser medida em relação à situação especial de um grupo determinado de operadores. Tal apreciação, dada a multiplicidade e a complexidade das situações económicas, não só seria impraticável mas constitui, além disso, uma fonte eterna de insegurança jurídica (acórdãos de 24 de outubro de 1973, Balkan‑Import‑Export, 5/73, Colet., EU:C:1973:109, n.° 22, e de 15 de dezembro de 1994, Unifruit Hellas/Comissão, T‑489/93, Colet., EU:T:1994:297, n.° 74). Além disso, foi decidido que o saneamento de um mercado visado por medidas de restrição da União não impõe à Comissão a obrigação de garantir a cada empresa individual um mínimo de produção nos seus próprios critérios de rentabilidade e de desenvolvimento (v., neste sentido, acórdãos de 7 de julho de 1982, Klöckner‑Werke/Comissão, 119/81, Recueil, EU:C:1982:259, n.° 13, e de 30 de novembro de 1983, San Carlo/Comissão, 235/82, Recueil, EU:C:1983:356, n.° 18).

94      Daqui resulta que há que julgar improcedente a argumentação da recorrente, aduzida a título subsidiário e, por conseguinte, o primeiro e terceiro fundamentos.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo à violação das competências dos Estados‑Membros e do princípio da subsidiariedade

95      A recorrente alega que, ao rejeitar a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com fundamento na cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, prevista no § 9, n.° 5, da TEHG, a Comissão violou as competências dos Estados‑Membros. Em seu entender, os Estados‑Membros são competentes para determinar todas as regras de atribuição aplicáveis a par dos métodos de atribuição definidos pela Comissão na Decisão 2011/278. A Diretiva 2003/87 não prevê que a União tenha competência exclusiva para fixar as regras de atribuição. A recorrente alega igualmente que a Comissão violou, deste modo, o princípio da subsidiariedade.

96      Em primeiro lugar, no tocante à argumentação de que os Estados‑Membros são competentes para determinar todas as regras de atribuição aplicáveis a par dos métodos de atribuição definidos pela Comissão na Decisão 2011/278, a recorrente alega que resulta do artigo 11.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87 que pode haver outras regras de atribuição, a par dos métodos de atribuição definidos pela Comissão, sem o que não fará sentido a recusa a que aquela disposição se refere. Em seu entender, o âmbito de aplicação do artigo 11.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87 não pode abranger os casos que não dizem respeito a atribuições individuais e respetivo cálculo, mas sim às regras gerais de atribuição, porque o direito de fiscalização, pela Comissão, das atribuições individuais de licenças pelos Estados‑Membros já está previsto no artigo 51.° do Regulamento (UE) n.° 389/2013 da Comissão, de 2 de maio de 2013, que estabelece um Registo da União nos termos da Diretiva 2003/87 e das Decisões n.° 280/2004/CE e n.° 406/2009/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e que revoga os Regulamentos (UE) n.° 920/2010 e (UE) n.° 1193/2011 da Comissão (JO L 122, p. 1).

97      Esta argumentação não procede. Com efeito, o artigo 11.°, n.° 3, da Diretiva 2003/87 abrange as atribuições individuais, dado que esta disposição, conjugada com o n.° 1 do mesmo artigo, prevê, nomeadamente, que a Comissão verifica se as listas das instalações, bem como as licenças gratuitas atribuídas a cada instalação, estão em conformidade com as regras referidas no artigo 10.°‑A da Diretiva 2003/87.

98      No que respeita ao argumento relativo ao Regulamento n.° 389/2013, importa salientar que este regulamento é um regulamento de execução baseado no artigo 19.° da Diretiva 2003/87, pelo que não pode derrogar o disposto no artigo 11.°, n.° 3, dessa diretiva. Por outro lado, importa salientar que, por força do artigo 1.° do Regulamento n.° 389/2013, este último apenas tem por objeto, por um lado, a operação e manutenção do diário independente de operações previsto no artigo 20.°, n.° 1, da Diretiva 2003/87 e os registos previstos no artigo 6.° da Decisão n.° 280/2004/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de fevereiro de 2004, relativa à criação de um mecanismo de vigilância das emissões comunitárias de gases com efeito de estufa e de implementação do Protocolo de Quioto (JO L 49, p. 1), e, por outro, a comunicação com esse registo.

99      A recorrente alega também que resulta de uma análise global da sistemática do regime de comércio de licenças previsto na Decisão 2011/278 que, uma vez que os métodos de atribuição só dizem respeito ao caso geral e não preveem exceções para as situações atípicas, a República Federal da Alemanha tinha o direito de suprir esta lacuna através do § 9, n.° 5, da TEHG. Em seu entender, embora seja verdade que os Estados‑Membros não são competentes para regulamentar os casos regidos pela Decisão 2011/278, são‑no para determinar todas as outras regras de atribuição aplicáveis a par dos métodos de atribuição definidos pela Comissão.

100    Esta argumentação também não procede.

101    Com efeito, em primeiro lugar, há que salientar que o artigo 10.°‑A da Diretiva 2003/87 prevê regras transitórias relativas à emissão de licenças a título gratuito. Segundo o n.° 1, primeiro parágrafo, desta disposição, a Comissão aprova medidas de execução plenamente harmonizadas, a nível da União, para a atribuição das licenças de emissão de gases com efeito de estufa, o que aquela fez ao adotar a Decisão 2011/278, que define, nos termos do seu artigo 1.°, as regras transitórias da União relativas à atribuição harmonizada de licenças de emissão a título gratuito nos termos da Diretiva 2003/87, a partir de 2013. O artigo 10.° da Decisão 2011/278 contém os métodos de cálculo para a atribuição destas licenças às instalações (v. n.° 44, supra). Como a Comissão afirma, essa harmonização total para toda a União pressupõe que as regras de atribuição aprovadas na Decisão 2011/278 são taxativas e excluem necessariamente qualquer atribuição de licenças gratuitas por força de normas nacionais.

102    Em segundo lugar, a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com base numa norma nacional que vai além das regras estabelecidas na Decisão 2011/278 é contrária ao objetivo do legislador da União, que pretendia, como já foi declarado (v. n.° 82, supra), instituir um regime mais harmonizado de comércio de licenças de emissão, a fim de explorar melhor os benefícios do comércio de licenças de emissão, evitar distorções no mercado interno e facilitar a ligação entre os diferentes regimes de comércio de licenças de emissão (acórdão Polónia/Comissão, n.°  63, supra, EU:T:2013:113, n.° 41).

103    Em terceiro lugar, não se pode arguir que as regras de atribuição de licenças previstas na Decisão 2011/278 só dizem respeito ao caso geral, pelo que os casos atípicos podem ser regulados pelo direito nacional. Com efeito, a Comissão estava obrigada, por força do artigo 10.°‑A, n.° 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2003/87, a aprovar medidas de execução plenamente harmonizadas, a nível da União, relativas à atribuição harmonizada das licenças a atribuir a título gratuito. Uma vez que é inerente a essas regras gerais que tenham um impacto mais importante em determinadas instalações do que noutras (v. n.° 71, supra), essas regras dizem respeito a todos os casos e igualmente às situações atípicas. Uma derrogação às regras harmonizadas da União não pode ser concedida unilateralmente por um Estado‑Membro (v., por analogia, acórdão de 14 de maio de 1996, Faroe Seafood e o., C‑153/94 e C‑204/94, Colet., EU:C:1996:198, n.° 56).

104    Por outro lado, deve salientar‑se que o § 9, n.° 5, da TEHG não prevê que a República Federal da Alemanha seja competente para atribuir licenças a título gratuito aos operadores de instalações confrontados com dificuldades excessivas. Com efeito, semelhante atribuição, com base nessa disposição, só possível se a Comissão não a recusar.

105    Em segundo lugar, no que respeita à argumentação da recorrente de que a Comissão violou o princípio da subsidiariedade ao rejeitar a atribuição de licenças de emissão a título gratuito com base na cláusula relativa aos casos que apresentam dificuldades excessivas, prevista no § 9, n.° 5, da TEHG, recorde‑se que, nos termos do artigo 5.°, n.° 3, TUE, em virtude deste princípio, nos domínios que não sejam da sua competência exclusiva, a União intervém apenas se e na medida em que os objetivos da ação considerada não possam ser suficientemente alcançados pelos Estados‑Membros, tanto ao nível central como ao nível regional e local, podendo, contudo, devido à dimensão ou aos efeitos da ação considerada, ser mais bem alcançados ao nível da União.

106    No caso em apreço, esta argumentação não procede. Com efeito, há que salientar que as regras transitórias relativas à atribuição de licenças a título gratuito estabelecidas na Decisão 2011/278 com base no artigo 10.°‑A, n.° 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2003/87 são taxativas e excluem necessariamente qualquer atribuição de licenças gratuitas por força de normas nacionais (v. n.° 101, supra). Além disso, a recorrente não contestou que o estabelecimento de um regime de comércio de licenças de emissão na União pela Diretiva 2003/87 não podia ser suficientemente concretizado pelos Estados‑Membros, agindo individualmente, pelo que o estabelecimento desse sistema podia, devido à sua dimensão e aos seus efeitos, ser melhor alcançado ao nível da União. Resulta igualmente do considerando 8 da Diretiva 2009/29 que uma análise efetuada em 2007, tendo em conta a experiência adquirida durante os dois primeiros períodos de comércio, confirmou que era imperativo um regime mais harmonizado de comércio de licenças de emissão, a fim de explorar melhor os benefícios do comércio de licenças de emissão, com vista a evitar distorções no mercado interno e facilitar a ligação dos regimes de comércio de licenças de emissão.

107    Por conseguinte, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente.

108    À luz do exposto, deve ser negado provimento ao recurso.

 Quanto às despesas

109    Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas relativas ao processo principal e ao processo de medidas provisórias, em conformidade com os pedidos da Comissão.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Romonta GmbH suportará as despesas relativas ao processo principal e ao processo de medidas provisórias.

Dittrich

Schwarcz

Tomljenovič

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 26 de setembro de 2014.

Assinaturas


* Língua do processo: alemão.