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Processos apensos T‑49/02 a T‑51/02

Brasserie nationale SA (anteriormente Brasseries Funck‑Bricher e Bofferding) e o.

contra

Comissão das Comunidades Europeias

«Acordos, decisões e práticas concertadas – Mercado luxemburguês da cerveja – Coimas»

Sumário do acórdão

1.      Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Proibição – Conclusão de acordos a fim de obviar aos efeitos de normas jurídicas consideradas demasiado desfavoráveis – Inadmissibilidade

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

2.      Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Proibição – Justificação de um acordo proibido pelo artigo 81.°, n.° 1, CE com fundamento numa regra de razão – Inadmissibilidade

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

3.      Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Ataque à concorrência – Critérios de apreciação – Objecto anticoncorrencial – Constatação suficiente

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

4.      Concorrência – Acordos, decisões e práticas concertadas – Acordos entre empresas – Conceito – Concurso de vontades quanto ao comportamento a adoptar no mercado – Forma de expressão das vontades – Irrelevância

(Artigo 81.°, n.° 1, CE)

5.      Concorrência – Procedimento administrativo – Decisão que declara uma infracção – Obrigação de delimitar o mercado em causa – Alcance

(Artigo 81.° CE)

6.      Concorrência – Normas comunitárias – Infracções – Actuação deliberada – Conceito

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°)

7.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Poder de apreciação da Comissão – Controlo jurisdicional

(Artigo 229.° CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 17.°)

8.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade de infracção – Infracções de especial gravidade – Partilha do mercado – Compartimentação do mercado

(Artigo 81.°, n.° 1, CE; Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)

9.      Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Duração das infracções – Acordo punido em razão do seu objecto anticoncorrencial independentemente dos seus efeitos – Tomada em consideração da duração da existência do acordo sem atender à sua não aplicação

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2)

10.    Concorrência – Coimas – Montante – Determinação – Critérios – Gravidade da infracção – Circunstâncias atenuantes – Não aplicação efectiva de um acordo – Apreciação a nível do comportamento individual de cada empresa

(Regulamento n.° 17 do Conselho, artigo 15.°, n.° 2; comunicação da Comissão 98/C 9/03, ponto 3)

1.      Não pode aceitar‑se que empresas obviem aos efeitos de normas jurídicas que consideram excessivamente desfavoráveis através da celebração de acordos que têm por objecto corrigir essas desvantagens sob pretexto de que as mesmas criam um desequilíbrio em seu detrimento.

(cf. n.° 81)

2.      Quando está provado que o objecto de um acordo constitui, pela sua natureza, uma restrição da concorrência, como seja a partilha da clientela, não pode deixar de se aplicar a esse acordo, por força de uma regra de razão (rule of reason), o disposto no artigo 81.°, n.° 1, CE, pelo facto de prosseguir igualmente objectivos ilegítimos.

(cf. n.° 85)

3.      Na medida em que um acordo entre empresas tenha por objecto restringir a concorrência, não há que analisar se teve também como efeito restringi‑la.

(cf. n.os 97, 140)

4.      O conceito de acordo, na acepção do artigo 81.°, n.° 1, CE, baseia‑se na existência de uma concordância de vontades entre duas partes pelo menos, cuja forma de manifestação não é importante desde que constitua a expressão fiel das mesmas.

(cf. n.° 119)

5.      A obrigação de proceder à delimitação do mercado em causa numa decisão adoptada em aplicação do artigo 81.° CE impõe‑se à Comissão apenas quando, sem essa delimitação, não seja possível determinar se o acordo, a decisão de associação de empresas ou a prática concertada em causa é susceptível de afectar as trocas comerciais entre Estados‑Membros e tem por objecto ou por efeito impedir, restringir ou falsear o jogo da concorrência no interior do mercado comum.

(cf. n.° 144)

6.      Para que uma infracção às regras de concorrência do Tratado possa ser considerada como cometida deliberadamente, não é necessário que a empresa tenha tido consciência de infringir a concorrência sendo suficiente que não tenha podido ignorar que a sua conduta tinha por objecto restringir a concorrência, e importa pouco saber se a empresa tinha ou não consciência de infringir o artigo 81.° CE.

(cf. n.° 155)

7.      A gravidade das infracções ao direito da concorrência deve ser determinada em função de um grande número de elementos tais como, nomeadamente, as circunstâncias específicas do caso, o seu contexto e o carácter dissuasivo das coimas, e isso sem que tenha sido fixada uma lista vinculativa ou exaustiva de critérios que devam obrigatoriamente ser tomados em consideração. Além disso, a Comissão dispõe, no âmbito do Regulamento n.° 17, de margem de apreciação na fixação do montante das coimas, a fim de orientar o comportamento das empresas no sentido do respeito das regras de concorrência.

Incumbe, todavia, ao Tribunal controlar se o montante da coima aplicada é proporcionado em relação à gravidade e à duração da infracção e ponderar a gravidade da infracção e as circunstâncias invocadas pela recorrente. A este propósito, as orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 e do artigo 65.°, n.° 5, [CA] não antecipam o juízo quanto à apreciação da coima pelo juiz comunitário, que dispõe, a este respeito, por força do artigo 17.° do Regulamento n.° 17, de competência de plena jurisdição.

(cf. n.os 169‑170)

8.      A partilha e a compartimentação do mercado estão abrangidas pelas infracções mais graves ao artigo 81.° CE.

Relativamente à partilha de mercado, os acordos deste género figuram entre os exemplos de acordos explicitamente declarados incompatíveis com o mercado comum no artigo 81.°, n.° 1, alínea c), CE. São qualificados como restrições manifestas à concorrência.

Relativamente à compartimentação do mercado comum, essa infracção patente ao direito da concorrência é, pela sua própria natureza, especialmente grave. É contrária aos objectivos mais fundamentais da Comunidade e em especial, à realização do mercado único.

(cf. n.os 173‑175)

9.      Uma vez que a Comissão não provou os efeitos de um acordo e não tinha a obrigação de o fazer, tendo o acordo em causa um objecto restritivo da concorrência, o facto de o acordo ter ou não entrado em vigor é irrelevante para o cálculo da duração da infracção. Para calcular a duração de uma infracção cujo objecto é restritivo da concorrência, importa, com efeito, determinar apenas o período durante o qual esse acordo existiu, ou seja, o período decorrido entre a data da sua celebração e a data em que foi posto fim ao mesmo.

(cf. n.° 185)

10.    O ponto 3, segundo travessão, das orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do artigo 15.°, n.° 2, do Regulamento n.° 17 e do artigo 65.°, n.° 5, [CA], relativo à «não aplicação efectiva dos acordos ou práticas ilícitos», não deve ser interpretado no sentido de que se refere às situações em que um acordo não é aplicado no seu conjunto, abstraindo do comportamento próprio de cada empresa, devendo antes entender‑se como uma circunstância baseada no comportamento individual de cada empresa.

(cf. n.° 195)