Language of document : ECLI:EU:C:2008:268

CONCLUSÕES DA ADVOGADA‑GERAL

ELEANOR SHARPSTON

apresentadas em 8 de Maio de 2008 1(1)

Processo C‑138/07

Belgische Staat

contra

N.V. Cobelfret

«Impostos – Sociedades – Lucros distribuídos pela sociedade afiliada à sociedade‑mãe – Isenção da tributação»





1.        O artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades‑mães e sociedades afiliadas de Estados‑Membros diferentes (2) (a seguir «directiva sociedades‑mãe/sociedades afiliadas» ou «directiva»), dispõe que quando uma sociedade‑mãe residente num Estado‑Membro recebe um dividendo da sociedade afiliada residente noutro Estado‑Membro, o Estado da sociedade‑mãe ou se abstém de tributar esse dividendo, ou autoriza a sociedade‑mãe a deduzir do montante do imposto a pagar sobre esse dividendo a fracção do imposto pago pela afiliada sobre os lucros distribuídos desse modo.

2.        No presente processo, o Hof van beroep te Antwerpen (tribunal de recurso de Antuérpia, Bélgica) perguntou ao Tribunal de Justiça, no essencial, se o artigo 4.° da directiva se opõe a uma legislação nacional segundo a qual tais dividendos são, em primeiro lugar, incluídos na matéria colectável da sociedade‑mãe e, posteriormente, deduzidos dessa matéria colectável apenas na medida em que a sociedade‑mãe tem lucros tributáveis.

 A directiva sociedades‑mãe/sociedades afiliadas

3.        A directiva sociedades‑mãe/sociedades afiliadas visa eliminar a desvantagem fiscal suportada pelas sociedades de diferentes Estados‑Membros, em comparação com as sociedades do mesmo Estado‑Membro, quando pretendem cooperar constituindo grupos de sociedades‑mãe e afiliadas (3). Fá‑lo de duas maneiras.

4.        Em primeiro lugar, o artigo 4.°, n.° 1, dispõe que quando uma sociedade‑mãe (4) recebe os lucros distribuídos de uma sociedade afiliada, o Estado‑Membro da sociedade‑mãe ou «se abstém de tributar esses lucros» (método da isenção), ou «os tributa, autorizando esta sociedade a deduzir do montante do imposto a fracção do imposto da afiliada correspondente a tais lucros […] dentro do limite do montante do imposto nacional correspondente» (método do crédito de imposto ou da imputação).

5.        Em segundo lugar, o artigo 5.°, n.° 1, exige que os Estados‑Membros isentem de retenção na fonte os lucros distribuídos por uma sociedade afiliada à sua sociedade‑mãe.

 Legislação nacional

6.        Apesar de o despacho de reenvio ser lacónico na sua referência às disposições nacionais relevantes, parece incontroverso que a legislação belga (5), na parte relevante, opera do seguinte modo. Em primeiro lugar, os dividendos recebidos das sociedades afiliadas na acepção da directiva são incluídos na matéria colectável da sociedade‑mãe. Em segundo lugar, 95% do montante desses dividendos são deduzidos dos lucros tributáveis da sociedade‑mãe (6). Esta dedução é designada «aftrek van definitief belaste inkomsten» (dedução dos rendimentos tributados a título definitivo, a seguir «ADBI»). Em terceiro lugar, a ADBI é limitada ao montante dos lucros do exercício em questão. Portanto, a ADBI não pode ser efectuada num ano em que não houve lucros; além disso, quando o montante da ADBI excede os lucros, a parte da ADBI que não foi efectuada não é transitável.

 Processo principal e questão prejudicial

7.        Mais uma vez, o despacho de reenvio é pobre em informações. No entanto, com relevância para o caso em apreço, podem extrair‑se os seguintes factos das observações escritas.

8.        De 1992 a 1998, a Cobelfret NV (a seguir «Cobelfret»), uma sociedade belga, recebeu dividendos das suas participações em sociedades situadas na Bélgica e no Reino Unido. É incontroverso que, no que respeita às suas participações em sociedades belgas, a Cobelfret é uma sociedade‑mãe, e estas sociedades são afiliadas suas, na acepção da directiva.

9.        Em 1994, 1995 e 1997, a Cobelfret sofreu prejuízos e, portanto, não pôde efectuar a ADBI relativa a esses anos. Em 1996, a ADBI a que a Cobelfret tinha direito excedia os seus lucros tributáveis em 277 432 euros. A Cobelfret não pôde transitar essa parte da dedução não efectuada para o ano seguinte, em que sofreu prejuízos. A Cobelfret é de opinião de que a Bélgica, portanto, não isenta verdadeiramente os dividendos, visto que os prejuízos fiscais transitáveis são reduzidos de tal modo que, no ano seguinte, o lucro tributável é aumentado artificialmente pelo montante dos dividendos que deveriam ter sido isentos.

10.      A Cobelfret sustentou, com êxito, no Rechtbank van eerste aanleg, Antwerp (tribunal de primeira instância de Antuérpia), que essa limitação da ADBI era contrária ao artigo 4.°, n.° 1, da directiva. As autoridades fiscais belgas recorreram para o Hof van beroep te Antwerpen, que submeteu à apreciação do Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial:

«O regime vigente na Bélgica para os rendimentos tributados a título definitivo, nos termos do qual [, numa primeira fase,] os dividendos relevantes são […] adicionados à matéria colectável da sociedade‑mãe e, numa [fase] posterior, por força do artigo 205.°, n.° 2, [do Código do Imposto sobre o Rendimento belga], o montante dos dividendos recebidos só é deduzido [...] à matéria colectável da sociedade‑mãe [até 95%] se esta tiver obtido lucros tributáveis, é compatível com o artigo 4.° da Directiva 90/435 [...], tendo em conta que a referida limitação da dedução dos rendimentos tributados a título definitivo leva a que uma sociedade‑mãe suporte, num exercício [fiscal] posterior, o imposto sobre os dividendos recebidos se, no exercício [fiscal] em que os recebeu, não tiver obtido [...] lucros tributáveis ou estes não forem suficientes, ou [, na melhor das hipóteses,] leva a que os prejuízos fiscais do exercício em questão se esgotem indevidamente, deixando por isso de ser transitáveis até ao montante dos dividendos recebidos, os quais, [de qualquer modo,] no caso de inexistência de prejuízos fiscais, teriam ficado isentos de imposto [até] 95%?»

11.      A Cobelfret, o Estado belga e a Comissão apresentaram observações escritas e estiveram igualmente representados na audiência.

 Efeito directo

12.      A questão submetida não se refere ao efeito directo do artigo 4.°, n.° 1, da directiva. No entanto, o órgão jurisdicional de reenvio considera, no despacho de reenvio, que «é necessário obter uma resposta decisiva quanto ao efeito directo da referida directiva», e todas as partes avançam argumentos sobre esta questão. Por conseguinte, farei as breves observações seguintes.

13.      Resulta claramente de jurisprudência assente que, em todos os casos em que as disposições de uma directiva mostrem ser, do ponto de vista do seu conteúdo, incondicionais e suficientemente precisas, estas disposições podem ser invocadas, na falta de medidas de aplicação adoptadas nos prazos, contra toda e qualquer disposição nacional que não esteja em conformidade com a directiva, ou ainda na medida em que sejam susceptíveis de definir direitos que os particulares estejam em condições de invocar contra o Estado (7). Uma disposição comunitária é incondicional quando enuncia uma obrigação que não é acompanhada de qualquer condição nem subordinada, na sua execução ou nos seus efeitos, à intervenção de qualquer acto das instituições da Comunidade ou dos Estados‑Membros (8). É suficientemente precisa para ser invocada por um particular e aplicada pelo juiz quando enuncia uma obrigação em termos inequívocos (9).

14.      Concordo com a Cobelfret e com a Comissão relativamente ao facto de o artigo 4.°, n.° 1, da directiva satisfazer ambos os critérios. A obrigação que impõe de não tributar os lucros distribuídos recebidos pela sociedade‑mãe da sua afiliada ou de tributar esses lucros autorizando a sociedade‑mãe a deduzir do montante do imposto devido o imposto pago pela sociedade afiliada referente a esses lucros é enunciada em termos inequívocos e não é acompanhada de nenhuma condição nem sujeita, na sua execução ou nos seus efeitos, à adopção de qualquer medida pelas instituições comunitárias ou pelos Estados‑Membros.

15.      A Bélgica afirma que o artigo 4.°, n.° 1, não pode ter efeito directo, uma vez que dá aos Estados‑Membros a possibilidade de escolher os métodos para atingir o resultado pretendido.

16.      A Cobelfret indica, no entanto, que o Tribunal de Justiça declarou que «[a] faculdade de o Estado escolher entre uma multiplicidade de meios possíveis com vista a atingir o resultado descrito por uma directiva não exclui a possibilidade de os particulares invocarem perante os órgãos jurisdicionais nacionais os direitos cujo conteúdo pode ser determinado com precisão suficiente com base apenas nas disposições da directiva» (10).

17.      Por conseguinte, considero que o artigo 4.°, n.° 1, da directiva tem efeito directo.

 Compatibilidade com o artigo 4.°, n.° 1

18.      A Cobelfret e a Comissão alegam que as disposições belgas são contrárias à directiva; o Governo belga é de opinião contrária.

19.      Concordo com a primeira opinião.

20.      O artigo 4.°, n.° 1, da directiva exige que os Estados‑Membros se abstenham de tributar o dividendo ou autorizem a sociedade‑mãe a deduzir do montante do imposto devido sobre o dividendo o imposto pago pela afiliada sobre os lucros distribuídos desse modo. Em meu entender, as disposições belgas não implementaram adequadamente nenhum destes dois métodos.

21.      O efeito destas disposições consiste no facto de os dividendos recebidos de uma afiliada serem sempre incluídos na matéria colectável da sociedade‑mãe mas nem sempre serem deduzidos dessa mesma matéria colectável, uma vez que não se opera qualquer dedução quando a sociedade‑mãe não tem lucros tributáveis no mesmo período. Nesse caso, imputar os dividendos à matéria colectável conduz a um imposto global mais elevado, visto que reduz o montante do prejuízo transitável. Por consequência, o imposto será cobrado no ano subsequente em que houver lucros tributáveis sobre um montante adicional correspondente a uma fracção ou ao total dos montantes dos dividendos.

22.      O sistema belga, portanto, não prevê a isenção sistemática dos dividendos. Prevê antes a sua isenção apenas quando existam outros lucros tributáveis. Deste modo, a Bélgica sujeita a isenção fiscal dos dividendos a uma condição não prevista na directiva. Portanto, não é um verdadeiro sistema de isenção.

23.      O Tribunal de Justiça já declarou que, uma vez que o objectivo da directiva é aligeirar o regime fiscal da cooperação transfronteiriça, os Estados‑Membros não podem instituir unilateralmente medidas restritivas como a exigência de um período mínimo de participação já completado no momento da distribuição dos lucros para os quais é solicitado o benefício fiscal (11). Não vejo razão para não aplicar o mesmo princípio no que se refere àquilo que é de facto a exigência de a sociedade‑mãe ter lucros tributáveis.

24.      O sistema belga também não é um sistema de imputação, segundo o qual o imposto pago pela afiliada seria deduzido do imposto a pagar pela sociedade‑mãe.

25.      A Bélgica sustenta, em primeiro lugar, que a limitação da ADBI conduz pelo menos ao mesmo resultado que o método da imputação. Alega que, se o método de imputação satisfaz as exigências do artigo 4.°, n.° 1, a limitação da ADBI também o deve fazer, dado que não há razão para que a «[abstenção] da tributação» dos lucros distribuídos conduza a um resultado mais generoso do que o método da imputação.

26.      Os argumentos da Bélgica sobre esta questão não me convencem. Acresce que, se a limitação da ADBI não conduz a um resultado que seja pelo menos tão favorável para o contribuinte como o que ele obteria segundo o método da imputação, é jurisprudência assente que os Estados‑Membros não podem invocar a forma como poderiam ter transposto uma directiva se assim tivessem decidido (12). A Bélgica não alega ter optado por transpor o artigo 4.°, n.° 1, da directiva seguindo o método da imputação. Portanto, em meu entender, é irrelevante saber se o método alternativo que a Bélgica escolheu opera de modo não menos favorável que o método da imputação, ou saber em que medida isso acontece.

27.      A Bélgica alega, em segundo lugar, que não resulta da redacção do artigo 4.°, n.° 1, da directiva, que exige que os Estados‑Membros «se [abstenham] de tributar» os dividendos, que os Estados‑Membros tenham a obrigação de conceder uma «isenção» e que tal «isenção» exija que os dividendos recebidos não tenham efeitos sobre o montante dos prejuízos transitáveis. Os considerandos da directiva e o texto do artigo 4.°, n.° 1, referem simplesmente a «[abstenção] de tributar» tais lucros e não a respectiva «isenção».

28.      Não posso aceitar este argumento. Não há nada no sistema nem no objectivo da directiva que sugira qualquer diferença significativa entre os conceitos de «[abstenção] de tributar» e de «isenção do imposto». Tal como refere a Cobelfret, com efeito, os considerandos de uma directiva que alterou recentemente a directiva sociedades‑mãe/sociedades afiliadas fazem referência ao artigo 4.°, n.° 1, no sentido de que exige que «[seja eliminada] a dupla tributação, quer através de uma isenção ou de um crédito de imposto» (13). Além disso, o Tribunal de Justiça empregou indistintamente os conceitos de «isenção» e de «[abstenção] de tributar» na acepção do artigo 4.°, n.° 1 (14).

29.      A Bélgica considera, em terceiro lugar, que a sua legislação é conforme ao objectivo do artigo 4.°, n.° 1, concretamente a eliminação da desvantagem nas relações transfronteiriças entre sociedades‑mãe e sociedades afiliadas em comparação com as mesmas relações num contexto nacional (15). A limitação da ADBI não desfavorece a criação de relações entre as sociedades‑mãe e as sociedades afiliadas, em especial as relações transfronteiriças, o que é exemplificado decisivamente pela forma como o mercado belga funciona na prática e pelo facto de a aplicação da limitação da ADBI tratar igualmente as relações nacionais e as relações transfronteiriças entre as sociedades‑mãe e as sociedades afiliadas. Portanto, a limitação da ADBI não contraria o objectivo do artigo 4.°, n.° 1.

30.      Mais uma vez, esta argumentação não me convence. Mesmo que as afirmações da Bélgica sejam correctas, o facto de a transposição incorrecta por um Estado‑Membro de uma disposição de uma directiva não contrariar os objectivos dessa directiva não pode, em si mesmo, tornar essa transposição correcta.

31.      A Bélgica refere, em seguida, a Directiva 90/434/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às fusões, cisões, entradas de activos e permutas de acções entre sociedades de Estados‑Membros diferentes (16), que exige, no essencial, que os Estados‑Membros assegurem que tais reestruturações não resultem na tributação de mais‑valias e de reservas isentas. No que respeita aos prejuízos que resultam de reestruturações transfronteiriças, no entanto, a Bélgica observa que a directiva exige simplesmente que os Estados‑Membros tratem esses prejuízos do mesmo modo que os prejuízos resultantes de reestruturações no interior de um único Estado‑Membro (17). A Bélgica parece sustentar que, por analogia, o artigo 4.°, n.° 1, da directiva sociedades‑mãe/sociedades afiliadas autoriza igualmente um Estado‑Membro a aplicar um sistema como o das regras da ADBI a dividendos recebidos por uma sociedade‑mãe de uma afiliada noutro Estado‑Membro, na condição de aplicar o mesmo sistema a dividendos recebidos de uma afiliada nacional. Todavia, não é isso que o artigo 4.°, n.° 1, afirma; e não vejo de que forma uma disposição de um instrumento absolutamente distinto pode ser relevante.

32.      Por último, a Bélgica faz referência ao Modelo de Convenção fiscal sobre o rendimento e o património, publicado pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico («OCDE») (18). O capítulo V, intitulado «Métodos de eliminação da dupla tributação» prevê quer o método da isenção (artigo 23.°‑A) quer o método do crédito de imposto (artigo 23.°‑B). A Bélgica afirma que o Modelo de Convenção não fornece regras pormenorizadas sobre a forma de execução do método de isenção, de modo que compete aos Estados contratantes determiná‑la.

33.      É jurisprudência assente que, na falta de medidas de unificação ou de harmonização comunitária, os Estados‑Membros continuam a ser competentes para determinar, por via convencional ou unilateral, os critérios de repartição do seu poder tributário, de modo a, nomeadamente, eliminar a dupla tributação, utilizando, designadamente, os critérios de repartição seguidos na prática fiscal internacional, incluindo os modelos de convenção elaborados pela OCDE (19). No entanto, não vejo que relevância isso possa ter no âmbito do presente caso, em que o que está em causa é a interpretação de uma medida comunitária de harmonização.

 Limitação no tempo

34.      A Bélgica conclui as suas observações escritas pedindo que o Tribunal de Justiça, se julgar que o artigo 4.°, n.° 1, da directiva se opõe a uma legislação nacional como a do sistema da ADBI, limite no tempo os efeitos dessa decisão. Neste contexto, a Bélgica invoca, primeiro, a segurança jurídica que a Comissão criou ao alegadamente aprovar (embora implicitamente) o sistema da ADBI; segundo, a imprecisão do âmbito artigo 4.°, n.° 1; em terceiro lugar, a falta de jurisprudência sobre essa questão, e, em quarto lugar, o impacto orçamental no caso de as disposições belgas serem consideradas incompatíveis.

35.      Resulta claramente da jurisprudência do Tribunal de Justiça que as consequências financeiras que podem resultar, para um Estado‑Membro, de um acórdão proferido a título prejudicial não justificam, por si só, a limitação dos efeitos desse acórdão no tempo. Tal limitação apenas se impõe em circunstâncias bem precisas, nomeadamente, quando exista um risco de repercussões económicas graves devidas em especial ao grande número de relações jurídicas constituídas de boa fé com base na regulamentação que se considerou estar validamente em vigor e quando se verifique que os particulares e as autoridades nacionais tenham sido levados a um comportamento não conforme com a regulamentação comunitária em virtude de uma incerteza objectiva e importante quanto ao alcance das disposições comunitárias, incerteza para a qual tenham eventualmente contribuído os próprios comportamentos adoptados por outros Estados‑Membros ou pela Comissão (20).

36.      No presente processo, independentemente do mérito dos seus outros argumentos, a Bélgica não tentou demonstrar nas suas observações orais e escritas que existe esse risco de repercussões económicas graves.

37.      Por conseguinte, em minha opinião, se o Tribunal julgar que o artigo 4.°, n.° 1, da directiva se opõe a uma legislação nacional como a do sistema de ADBI, não deverá limitar os efeitos dessa decisão no tempo.

 Conclusão

38.      Face ao exposto, sou de opinião de que deve ser dada a seguinte resposta à questão submetida pelo Hof van beroep te Antwerpen, Bélgica:

O artigo 4.° da Directiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990, relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades‑mães e sociedades afiliadas de Estados‑Membros diferentes, opõe‑se a uma legislação nacional segundo a qual os dividendos recebidos por uma sociedade‑mãe num Estado‑Membro de uma sociedade afiliada de outro Estado‑Membro são, primeiro, adicionados à matéria colectável da sociedade‑mãe e, posteriormente, deduzidos dessa matéria colectável (em 95%) apenas na medida em que a sociedade‑mãe tem lucros tributáveis.


1 – Língua original: inglês.


2 – JO L 225, p. 6. A directiva foi alterada posteriormente, mas o processo principal só diz respeito à versão original.


3 – V. terceiro considerando: «as disposições fiscais que regem actualmente as relações entre sociedades-mães e afiliadas de Estados‑Membros diferentes variam sensivelmente de uns Estados-Membros para os outros e são, em geral, menos favoráveis que as aplicáveis às relações entre sociedades-mães e afiliadas de um mesmo Estado-Membro; […] a cooperação entre sociedades de Estados-Membros diferentes é penalizada em comparação com a cooperação entre sociedades de um mesmo Estado-Membro; [torna-se] necessário eliminar essa penalização através da instituição de um regime comum e facilitar assim os agrupamentos de sociedades à escala comunitária».


4 – O artigo 3.º da directiva define «sociedade-mãe» e «sociedade afiliada». A definição inclui a exigência de a sociedade-mãe e a sociedade afiliada terem domicílio fiscal em Estados‑Membros diferentes.


5 – Artigos 202.º, 204.º e 205.º do Wetboek van de inkomstenbelastingen 1992 (Código do Imposto sobre o Rendimento de 1992).


6 – Com efeito, o artigo 4.º, n.º 2, da directiva autoriza os Estados-Membros que optaram pelo método da isenção a limitar a isenção a 95% dos dividendos recebidos.


7 – V., por exemplo, acórdão de 28 de Junho de 2007, JP Morgan Fleming Claverhouse Investment Trust e The Association of Investment Trust Companies (C-363/05, Colect., p. I-5517, n.º 58 e jurisprudência aí referida).


8 – Acórdão de 29 de Maio de 1997, Klattner (C-389/95, Colect., p. I-2719, n.º 33).


9 – Ibid.


10 – Acórdãos de 19 de Novembro de 1991, Francovich e o. (C-6/90 e C-9/90, Colect., p. I‑5357, n.º 17), e de 14 de Julho de 1994, Faccini Dori (C-91/92, Colect., p. I‑3325, n.º 17).


11 – Acórdão de 17 de Outubro de 1996, Denkavit e o. (C-283/94, C-291/94 e C-292/94, Colect., p. I‑5063, n.º 26).


12 – Acórdão Francovich e o., já referido na nota 10, n.º 21, e acórdão de 30 de Março de 2006, Uudenkaupungin kaupunki (C-184/04, Colect., p. I‑3039, n.º 28).


13 – Directiva 2003/123/CE do Conselho, de 22 de Dezembro de 2003, que altera a Directiva 90/435/CEE relativa ao regime fiscal comum aplicável às sociedades-mãe e sociedades afiliadas de Estados-Membros diferentes (JO L 7, p. 41), décimo considerando. V. igualmente n.º 17 da exposição de motivos da proposta desta directiva [COM (2003) 462 final].


14 – Acórdãos de 12 de Dezembro de 2006, Test Claimants in the FII Group Litigation (C-446/04, Colect., p. I‑11753, n.º 102), e Test Claimants in Class IV of the ACT Group Litigation (C‑374/04, Colect., p. I‑11673, n.º 53).


15 – V. terceiro considerando, referido na nota 3, supra.


16 – JO L 225, p. 1.


17 – O artigo 6.º dispõe: «Na medida em que os Estados-Membros apliquem, quando as operações mencionadas no artigo 1.° se realizem entre sociedades do Estado da sociedade contribuidora, disposições que permitam a retomada, pela sociedade beneficiária, dos prejuízos da sociedade contribuidora ainda não deduzidos para fins fiscais, os Estados-Membros tornarão extensivo o benefício dessas disposições à retomada, pelos estabelecimentos estáveis da sociedade beneficiária situados no seu território, dos prejuízos da sociedade contribuidora ainda não deduzidos para efeitos fiscais.»


18 – O Modelo de Convenção foi publicado originalmente em 1963. Desde então foi regularmente actualizado. A redacção em vigor em 28 de Janeiro de 2003 encontra‑se em http://www.oecd.org/dataoecd/52/34/1914467.pdf.


19 – Acórdão do Tribunal de Justiça de 13 de Março de 2007, Test Claimants in the Thin Cap Group Litigation (C-524/04, Colect., p. I‑2107, n.º 49 e processos aí referidos).


20 – V., recentemente, acórdão de 18 de Janeiro de 2007, Brzeziński (C-313/05, Colect., p. I‑513, n.os 57 e 58).