Language of document : ECLI:EU:F:2006:112

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA DA UNIÃO EUROPEIA (Tribunal Pleno)

26 de Outubro de 2006 (*)

«Agente temporário – Contrato por tempo indeterminado – Despedimento – Insuficiência profissional – Dever de fundamentação – Erro manifesto de apreciação»

No processo F‑1/05,

que tem por objecto um recurso interposto ao abrigo dos artigos 236.° CE e 152.° EA,

Pia Landgren, antiga agente temporária da Fundação Europeia para a Formação, residente em Turim (Itália), representada por M.‑A. Lucas, advogado,

recorrente,

contra

Fundação Europeia para a Formação (FEF), representada pela sua directora, M. Dunbar, assistida por G. Vandersanden, advogado,

recorrida,

O TRIBUNAL DA FUNÇÃO PÚBLICA (Tribunal Pleno),

composto por: P. Mahoney, presidente, H. Kreppel e S. Van Raepenbusch (relator), presidentes de secção, I. Boruta, H. Kanninen, H. Tagaras e S. Gervasoni, juízes,

secretário: S. Boni, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 12 de Julho de 2006,

profere o presente

Acórdão

1        Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias em 28 de Abril de 2005, através de telecópia (o original foi apresentado no dia 2 de Maio seguinte), P. Landgren pede, designadamente, a anulação da decisão da Fundação Europeia para a Formação (FEF), de 25 de Junho de 2004, que rescinde o seu contrato por tempo indeterminado na qualidade de agente temporária (a seguir «decisão de despedimento»).

 Quadro jurídico

2        Nos termos do artigo 11.°, primeiro parágrafo, do Regime aplicável aos outros agentes das Comunidades Europeias (a seguir «ROA»), as disposições dos artigos 11.° a 26.° do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir «Estatuto»), relativas aos direitos e deveres dos funcionários, são aplicáveis por analogia.

3        Nos termos do artigo 25.°, segundo parágrafo, do Estatuto:

«Qualquer decisão individual tomada em cumprimento do presente Estatuto deve ser imediatamente comunicada por escrito ao funcionário interessado. Qualquer decisão que afecte interesses do funcionário deve ser fundamentada.»

4        Além disso, o artigo 47.° do ROA dispõe:

«Para além da cessação por morte, o contrato do agente temporário cessa:

[…]

c)       Nos contratos por tempo indeterminado:

i)      findo o prazo de pré‑aviso previsto no contrato; o período de pré‑aviso não pode ser inferior a um mês por ano de serviço cumprido, com um mínimo de três meses e um máximo de dez meses. Todavia, o prazo de pré‑aviso não pode começar a correr durante o período de uma licença de parto ou de uma ausência por doença, desde que esta última não ultrapasse um período de três meses. Por outro lado, fica suspenso, dentro do limite supra referido, durante o período dessa licença ou ausência;

[…]»

5        Em conformidade com o artigo 5.°, alínea b), do contrato de agente temporária, de 3 de Janeiro de 1995, celebrado entre a recorrente e a recorrida, modificado pelo aditamento de 18 de Julho de 2000 que prorrogou esse contrato por tempo indeterminado:

«This contract may be terminated by the institution or by the staff member for any of the reasons specified in articles 47 to 50 of the CEOS, subject to the conditions laid down in those articles. 

For the purposes of Article 47 § 2.a of the CEOS, should the employee decide to resign, the employee shall give a minimum of three months notice. In derogation from the Article 47 § 2.a of the CEOS, should the Foundation decide to terminate the contract, the Foundation shall give the employee a minimum of six months notice.»

(A instituição ou o agente poderão fazer cessar o contrato com base num dos fundamentos indicados nos artigos 47.° a 50.° do ROA, nas condições previstas nestes artigos.

Para efeitos do artigo 47.°, n.° 2, alínea a), do ROA, se o trabalhador decidir pedir a demissão, deverá dar um pré‑aviso de, pelo menos, três meses. Em derrogação do artigo 47.°, n.° 2, alínea a), se a Fundação decidir rescindir contrato, deverá dar ao trabalhador um pré‑aviso de, pelo menos, seis meses.)

 Factos na origem do litígio

6        P. Landgren, nascida em 21 de Junho de 1947, foi contratada, em 3 de Fevereiro de 1995, na qualidade de agente temporária de categoria C, pela FEF, por um período de três anos a contar de 1 de Janeiro de 1995. Foi provisoriamente classificada no grau C 3, escalão 1, e depois no grau C 1, escalão 2, mediante um aditamento de 1 de Julho de 1996 ao seu contrato de trabalho.

7        O seu contrato foi prorrogado por um novo período de três anos, em 24 de Outubro de 1997, e depois por tempo indeterminado, em 18 de Julho de 2000.

8        Em termos gerais, entre 1 de Janeiro de 1995 e Dezembro de 2001, P. Landgren exerceu simultaneamente funções de assistente administrativa, responsável pelos processos do pessoal e, mais especificamente, pelos processos de recrutamento, pelas missões e pelas férias, e funções de secretariado para uma ou várias pessoas.

9        O relatório de estágio elaborado a seu respeito em 10 de Maio de 1995 contém as seguintes apreciações:

–        no que respeita à «Aptidão para cumprir as suas funções»: «bom», não obstante a rubrica «Compreensão, adaptabilidade, decisão» ter a menção «insuficiente», justificada por falta de precisão, de preocupação pelo detalhe e de atenção;

–        no que respeita ao «Rendimento»: «bom», tendo a rubrica «Rapidez na execução do trabalho» igualmente a menção «insuficiente», justificada por alguns atrasos, nomeadamente na elaboração dos contratos do pessoal;

–        no que respeita à «Conduta no serviço»: «muito bom».

10      O primeiro relatório de avaliação de P. Landgren, com data de 13 de Maio de 1997, relativo ao período de 1995‑1997, é globalmente positivo. Numa escala de 1 a 6, de «excelente» a «absolutamente negativo», a recorrente obtém a classificação global de «3», que corresponde a «satisfatório». Mais especificamente, obtém as menções «bom» nas rubricas «Competência» e «Conduta no serviço» e «insatisfatório» na rubrica «Eficácia». A este respeito, é mais uma vez invocada a falta de atenção e de rapidez na execução das tarefas. Apesar de ser sublinhada a apreciação globalmente positiva, é‑lhe pedido que demonstre mais cuidado e que melhore o seu «senso político».

11      O segundo relatório de avaliação, com data de 17 de Junho de 1998, relativo ao período de 1997‑1998, atribui‑lhe uma classificação global superior, a saber, «2», que corresponde a «bom». De facto, no seu comentário geral, o notador constata uma melhoria notória das prestações da recorrente, pondo, porém, em evidência, na rubrica «Eficácia», que ainda são possíveis progressos.

12      O terceiro relatório de avaliação, com data de 17 de Janeiro de 2000, relativo ao período de 1999‑2000, confirma a classificação global de «2» e não regista qualquer ponto fraco, tendo o conjunto das rubricas recebido igualmente a apreciação de «bom». Contudo, pede‑se que a recorrente melhore o seu «time management» (gestão do tempo de trabalho). Em contrapartida, salienta‑se o seu conhecimento da regulamentação e do funcionamento da FEF.

13      No quarto relatório de avaliação, com data de 29 de Março de 2001 relativo ao período de 2000‑2001, atribui‑se à recorrente uma classificação global inferior, ou seja, «3». Apesar de pôr em evidência a capacidade de comunicação da recorrente, o seu tacto, a sua cortesia, o seu vasto conhecimento da FEF, a sua flexibilidade e a sua lealdade para com a hierarquia, o relatório menciona problemas em matéria de informática e, na rubrica «Análise e decisão», é‑lhe pedido que não tire conclusões demasiado prematuras, sobretudo quando não tem conhecimento suficiente dos processos, ainda que se admita que apresente boas propostas. Por fim, é‑lhe sugerido receber formação para tomar notas em reuniões.

14      De Janeiro de 2002 a Janeiro de 2003, inclusive, a recorrente trabalhou na direcção da FEF, onde exerceu funções de secretária e de assistente administrativa, especialmente encarregue das missões e das férias dos membros da direcção.

15      Em 9 de Julho de 2002, o director adjunto da FEF, U. Hillenkamp, elaborou um relatório de avaliação provisório, onde concluiu que P. Landgren não respondia suficientemente às exigências das suas funções. Esta conclusão assentava em deficiências constatadas na preparação das missões e na organização dos programas de trabalho, atribuídas a falta de organização e de acompanhamento, a uma capacidade limitada de utilização dos sistemas informáticos e a um conhecimento insuficiente das tarefas e da estrutura da organização da FEF. Esse relatório sublinhava, não obstante, a atitude positiva e os esforços de P. Landgren para cumprir as suas múltiplas tarefas.

16      No final de 2002, os dois directores adjuntos, U. Hillenkamp e L. Pescia, elaboraram, na qualidade de «Reporting officers» (agentes avaliadores), um projecto de relatório de avaliação de P. Landgren para o ano de 2002, segundo um novo sistema de avaliação das prestações, introduzido em Janeiro do mesmo ano.

17      U. Hillenkamp confirmou a sua avaliação de 9 de Julho de 2002, registando falta de fiabilidade e deficiências graves em quase todos os aspectos das funções exercidas, apesar de ter sublinhado os esforços da recorrente para realizar as suas tarefas. Afirmou ter perdido a confiança na qualidade dos seus serviços e concluiu que a recorrente não estava em condições de continuar a assumir as suas funções.

18      A apreciação de L. Pescia foi muito menos severa na medida em que considerou que a execução por P. Langren das suas tarefas específicas era, na maior parte dos casos, satisfatória, mesmo boa nalgumas delas. Todavia, na sua apreciação global, salientou atrasos de execução e erros devidos a falta de atenção, explicados em parte, segundo ele, por um volume de trabalho excessivo.

19      Nos seus comentários a esse relatório de avaliação, P. Landgren, apesar de contestar ou justificar certas críticas específicas de U. Hillenkamp, admitiu que o lugar que ocupava era demasiado exigente para ela. Chamou igualmente a atenção da direcção para o facto de as suas dificuldades poderem ser explicadas por uma deficiência temporária de memória atribuída ao seu estado de saúde, bem como para as consequências muito negativas que a perda do emprego implicaria para ela, tendo em conta os seus recursos financeiros, a sua situação familiar e a sua idade. Solicitou, pois, que fosse examinada a possibilidade de lhe serem confiadas outras tarefas, menos exigentes, na mesma direcção ou noutros serviços.

20      Esse relatório de avaliação nunca chegou a ser concluído nem, como tal, a ser arquivado no processo pessoal da recorrente.

21      Em 1 de Fevereiro de 2003, a recorrente foi afectada, por um período indeterminado, ao departamento «Europa de Leste e Ásia Central» (a seguir «ELAC») da FEF para aí assumir, no âmbito de um trabalho a tempo parcial, o secretariado da chefe de departamento S. Stefani, da chefe de departamento adjunta S. Taurelli, e do coordenador da FEF. O pedido para trabalhar a tempo parcial, tal como foi aceite pelo director, abrangia o período compreendido entre 1 de Fevereiro de 2003 e 31 de Dezembro de 2004 e foi justificado como «preparation for retirement (as 55 years of age)» (preparação para a aposentação de um agente com 55 anos de idade).

22      O relatório de avaliação da recorrente apresentado em 18 de Março de 2004 relativo ao ano de 2003 foi favorável. Este relatório contém a passagem seguinte:

«Pia has achieved her key objectives set for 2003. An assessment of the related key indicators shows that she has been able to perform her tasks effectively and efficiently with respect of deadlines.

Pia has shown capacity to concentrate on her work even while having to deal with several issues at the same time. She has made a substantial effort to improve her memory.

Pia has improved her IT skills.

Pia maintains good, friendly but respectful relations with peers and fellow colleagues.»

(A Pia atingiu os objectivos principais estabelecidos para 2003. A avaliação dos principais indicadores correspondentes demonstra que conseguiu executar as suas tarefas de maneira eficaz e eficiente dentro dos prazos.

A Pia demonstrou capacidade para se concentrar no seu trabalho, mesmo quando teve de se ocupar de várias questões ao mesmo tempo. Fez esforços significativos para melhorar a sua memória.

A Pia melhorou as suas competências no domínio da informática.

A Pia mantém boas relações, amigáveis mas respeitosas, com os seus pares e colegas de trabalho).

23      Este último relatório foi redigido por S. Taurelli, na qualidade de chefe de departamento em funções, na ausência de S. Stefani, de baixa por doença de Novembro de 2003 a Março de 2004 inclusive, e aprovado por P. de Rooij, na qualidade de director. Apesar de S. Stefani não o ter assinado, o seu nome figura no relatório como «Reporting Officer», a par de S. Taurelli. É pacífico que a chefe de departamento não partilhava da avaliação feita for S. Taurelli e que tinha uma opinião mais negativa das prestações da recorrente.

24      Posteriormente, durante uma reunião com S. Stefani, a recorrente julgou necessário pedir para continuar a exercer a sua actividade a tempo parcial. Com efeito, segundo a recorrente, apesar de a autorização para trabalhar a tempo parcial lhe ter sido concedida para o período compreendido entre 1 de Fevereiro de 2003 e 31 de Dezembro de 2004, essa autorização tinha entretanto caducado em 1 de Fevereiro de 2004, uma vez que o artigo 1.° do anexo IV A do Estatuto, na versão anterior a 1 de Maio de 2004, limita esse tipo de autorizações a um período de um ano. Aquando da referida reunião, que teve lugar a 10 de Maio de 2004, a chefe de departamento informou P. Landgren que se reservava a possibilidade de falar acerca desse pedido com o director, P. de Rooij.

25      Em 17 de Maio de 2004, a recorrente teve uma reunião com P. de Rooij, que lhe deu a possibilidade de escolher entre a «reforma antecipada» e o seu despedimento. P. de Rooij indicou igualmente que, em caso de despedimento, a recorrente poderia beneficiar dos subsídios de desemprego, ao abrigo do artigo 28.°‑A do ROA, até à data em que atingisse a idade mínima da reforma, isto é, os 60 anos.

26      Em 15 de Junho de 2004, a recorrente teve uma nova reunião com P. de Rooij, desta vez na presença do mediador designado pela FEF. Nessa reunião, P. de Rooij explicou à recorrente que era uma «pessoa gentil, mas uma secretária ineficaz» e que, por esta última razão, lhe era pedido que se demitisse.

27      Numa terceira reunião, em 25 de Junho de 2004, na presença de outros responsáveis da FEF, P. de Rooij entregou à recorrente uma carta de rescisão do contrato de agente temporária, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2005. Resulta dos autos que, ao fixar a data efectiva do despedimento, o director da FEF teve em conta o facto de a interessada fazer dez anos de serviço nessa data, dando‑lhe direito a uma pensão de aposentação.

28      A decisão de despedimento tem a seguinte redacção:

«Dear Pia,

In accordance with article 47 of the Conditions of Employment of Other Servants and in accordance with the terms and conditions of your contract and its amending clauses, I am very sorry to inform you that your employment as temporary agent within the FEF will be terminated. The amending clause of your contract foresees a period of notice of six months, therefore your last working day will be 31 December 2004.

Thank you very much for your contribution to the FEF and let me wish you a lot of success in your future career.»

(Cara Pia,

Em conformidade com o artigo 47.° do ROA e com as condições do seu contrato e respectivos aditamentos, lamento informá‑la de que o seu contrato de agente temporária na FEF vai ser rescindido. Visto que o aditamento ao seu contrato de trabalho prevê um período de pré‑aviso de seis meses, o dia 31 de Dezembro de 2004 será o seu último dia de trabalho.

Agradeço‑lhe muito a contribuição que deu à FEF e desejo‑lhe o maior sucesso na sua futura carreira profissional.)

29      Na sequência desta decisão, a recorrente foi afectada à unidade «Administração e serviços centrais», com efeitos a partir de 1 de Julho de 2004. A seu pedido, foi autorizada a retomar a sua actividade a tempo inteiro a partir dessa data.

30      A recorrente, que foi sujeita a uma operação cirúrgica em Outubro de 2004, esteve de baixa por doença durante três meses. Consequentemente, o seu pré‑aviso foi suspenso durante três meses.

31      Em 27 de Setembro de 2004, a recorrente apresentou uma reclamação, ao abrigo do artigo 90.°, n.° 2, do Estatuto, contra a decisão de despedimento.

32      Por decisão de 19 de Janeiro de 2005, recebida a 21 de Janeiro seguinte, a entidade habilitada a concluir contratos (a seguir «EHCC») indeferiu essa reclamação, alegando que o despedimento era justificado pelo carácter insatisfatório e insuficiente das prestações da recorrente e que a EHCC não fez uso de maneira manifestamente errada do amplo poder de apreciação de que dispõe ao avaliar o interesse do serviço. Cumprindo o seu dever de assistência, teve inclusivamente em conta o interesse da recorrente ao fixar a data de produção de efeitos do despedimento.

 Tramitação processual e pedidos das partes

33      O presente recurso foi inicialmente registado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância sob o número T‑180/05.

34      Por despacho de 15 de Dezembro de 2005, o Tribunal de Primeira Instância, nos termos do artigo 3.°, n.° 3, da Decisão 2004/752/CE do Conselho, de 2 de Novembro de 2004, que institui o Tribunal da Função Pública da União Europeia (JO L 333, p. 7), remeteu o presente processo a este último. O recurso foi registado na Secretaria do Tribunal da Função Pública com o número F‑1/05.

35      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão de despedimento;

–        anular, se necessário, a decisão de 19 de Janeiro de 2005 que indefere a sua reclamação de 27 de Setembro de 2004;

–        condenar a FEF a pagar‑lhe, como indemnização pelos danos patrimoniais que lhe foram causados pela decisão de despedimento, uma quantia correspondente à remuneração e à pensão de que beneficiaria se tivesse podido prosseguir a sua carreira na FEF até aos 65 anos de idade, deduzida a indemnização de despedimento e o subsídio de desemprego, bem como a pensão que recebeu ou receberá em razão do seu despedimento;

–        condenar a FEF a pagar à recorrente uma indemnização pelos danos morais causados pela decisão de despedimento, cuja quantia o Tribunal fixará;

–        condenar a recorrida nas despesas.

36      A FEF conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–      julgar improcedentes os pedidos de anulação;

–        a título principal, julgar inadmissível e a título subsidiário improcedente o pedido de reparação dos danos patrimoniais e morais alegadamente sofridos;

–        decidir sobre as despesas nos termos legais.

 Questão de direito

37      A recorrente invoca quatro fundamentos de recurso relativos, respectivamente:

–        à não demonstração, por parte da FEF, de que a decisão de despedimento se baseou num fundamento juridicamente válido;

–        à ilegalidade e ao carácter contrário ao interesse do serviço do fundamento da decisão de despedimento, na medida em que esse fundamento, a saber, a recusa de S. Stefani em manter a recorrente ao seu serviço após 31 de Dezembro de 2004, se baseou numa decisão nesse sentido, adoptada sem o conhecimento da recorrente e antes da sua afectação no departamento ELAC;

–        à ilegalidade e ao carácter arbitrário do fundamento da decisão de despedimento, na medida em que a recusa de S. Stefani em manter a recorrente ao seu serviço após 31 de Dezembro de 2004 se baseou em avaliações negativas de que a recorrente tinha sido objecto no passado;

–        à falta de fundamentação, à violação dos direitos de defesa e ao erro manifesto de apreciação, na medida em que a recusa de S. Stefani em manter a recorrente ao seu serviço após 31 de Dezembro de 2004 ou após a decisão de despedimento se baseou na insuficiência profissional desta última.

 Quanto ao primeiro e ao quarto fundamento

38      Importa analisar o primeiro e o quarto fundamentos em conjunto.

 Argumentos das partes

39      Em apoio do seu primeiro fundamento, a recorrente alega que uma decisão de despedimento deve assentar num fundamento juridicamente admissível, relativo ao interesse do serviço e que exclua qualquer arbitrariedade (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 1 de Março de 1962, De Bruyn/Parlamento, 25/60, Recueil, p. 39, pp. 58 a 60, Colect., p. 5). Incumbe à administração fazer prova, sobretudo quando a decisão de despedimento está em contradição aparente com determinados elementos do processo, como, no caso vertente, o último relatório de avaliação favorável de que a interessada foi objecto em 2004.

40      Segundo a recorrente, a verdadeira causa do despedimento reside, no presente caso, no compromisso que P. de Rooij assumiu perante S. Stefani de não manter a recorrente ao serviço após 31 de Dezembro de 2004, data em que esta podia invocar os seus direitos à reforma. Este compromisso foi manifestamente arbitrário, uma vez que julgou antecipadamente a forma como a recorrente iria desempenhar as suas tarefas no futuro.

41      A recorrente alega que o argumento desenvolvido pela recorrida na sua resposta de indeferimento da reclamação, destinado a demonstrar que S. Stefani não aprovava o carácter positivo do último relatório de avaliação da recorrente e que desejava modificá‑lo, é desprovido de todo o fundamento, dado que, por um lado, a própria S. Stefani deu a conhecer à recorrente, numa reunião de avaliação intermédia realizada a 24 de Julho de 2003, que estava muito satisfeita tanto com a sua conduta no serviço como com o desempenho das suas tarefas e que, por outro, S. Stefani não estava em condições de apreciar objectivamente as prestações da recorrente, pelo facto de ter estado ausente durante as férias de Verão e durante a sua doença entre Novembro de 2003 e Março de 2004. Em todo o caso, ainda que a decisão de despedimento se baseie na opinião desfavorável de S. Stefani em relação à recorrente, esta não foi disso informada antes da adopção da referida decisão, que, deste modo, foi adoptada em violação dos direitos de defesa.

42      Ainda que a decisão de indeferimento da reclamação se destinasse a demonstrar que, de maneira geral, as prestações de P. Landgren tinham sido insatisfatórias, facto que constituiria o único fundamento do seu despedimento, ela assenta unicamente na avaliação negativa ou matizada das prestações da recorrente feita por alguns dos seus superiores hierárquicos no passado e na circunstância de o seu volume de trabalho e as exigências dos seus superiores terem sido normais tendo em conta o seu grau C 1 e a pequena dimensão da FEF. Ora, a recorrida não demonstrou por nenhum modo que as prestações da recorrente ao serviço de S. Stefani não foram satisfatórias nem que não foram suficientes para fazer desaparecer as dúvidas quanto à sua aptidão profissional resultantes das avaliações de que tinha sido objecto anteriormente.

43      Além disso, os relatórios de avaliação relativos ao período compreendido entre 1995 e o final de 2002 não são suficientes para justificar um despedimento, já que esses relatórios foram globalmente satisfatórios, mesmo favoráveis ou muito favoráveis, apesar de alguns deles registarem algumas deficiências, e que o relatório relativo ao ano de 2002 nunca chegou a ser concluído.

44      Face a uma contradição aparente entre a decisão de despedimento e o relatório de avaliação de 18 de Março de 2004, a FEF não demonstrou, pois, pelo menos na sua decisão de indeferimento da reclamação, que essa decisão assentava num fundamento juridicamente válido.

45      Em apoio do seu quarto fundamento, a recorrente acrescenta, no caso de a decisão de despedimento não se basear no facto de S. Stefani se recusar a mantê‑la ao seu serviço após 31 de Dezembro de 2004, mas sim na sua alegada insuficiência profissional geral, incluindo no período em que trabalhou no departamento ELAC, que a referida decisão foi adoptada em violação dos direitos de defesa e com base em apreciações manifestamente erradas.

46      Com efeito, essa opinião negativa baseou‑se em avaliações que não foram comunicadas à recorrente (como a recusa do chefe do departamento «Tempus» em conceder‑lhe uma entrevista na sequência da sua candidatura a uma vaga nesse departamento) ou que não adquiriram carácter definitivo (como o projecto do relatório de avaliação de 2002).

47      Além disso, as avaliações negativas contidas nos relatórios antigos tiveram mais peso do que a avaliação muito favorável feita por S. Taurelli no último relatório, sem que o director tenha indicado, na decisão de despedimento ou nas reuniões que a precederam, as razões pelas quais ele considerava que os aspectos negativos deviam prevalecer sobre os aspectos positivos. Ora, as apreciações negativas expressas sobre a recorrente no passado são explicadas, nomeadamente, pelo elevado volume de trabalho que tinha na altura e pelas exigências dos seus superiores hierárquicos.

48      As razões pelas quais S. Stefani não estava de acordo com as avaliações contidas no relatório de 2004 não foram dadas a conhecer à recorrente nas reuniões de 17 de Maio e de 15 e 25 de Junho de 2004, nem indicadas na decisão de despedimento ou na resposta de indeferimento da reclamação. Uma vez que a opinião desfavorável de S. Stefani determinou a adopção da decisão de despedimento, os direitos de defesa da recorrente foram violados e essa decisão está viciada por insuficiência de fundamentação de tal modo grave que equivale a falta de fundamentação.

49      Por fim, a recorrente invoca a violação do dever de assistência, dado que a decisão de despedimento teve em conta os seus méritos e interesses legítimos de uma forma manifestamente insuficiente. Com efeito, o despedimento, ocorrido dois anos antes de a recorrente atingir a idade mínima da reforma, causou‑lhe, para além de danos patrimoniais, graves danos morais que consistem num sentimento de profunda humilhação e de ingratidão, apesar dos esforços que ela envidou para cumprir as suas pesadas tarefas o melhor possível. Mesmo que as suas prestações tenham por vezes sido objecto de críticas, estas explicam‑se pelo volume de trabalho dobrado que assumiu sob as ordens de dois directores adjuntos e pelos seus problemas de saúde.

50      A recorrida observa que, de modo geral, não existe, tanto à luz do ROA como do contrato de trabalho da recorrente, nenhuma base jurídica que a obrigue a fundamentar a decisão de despedimento (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 18 de Outubro de 1977, Schertzer/Parlamento, 25/68, Recueil, p. 1729, Colect., p. 615, e do Tribunal de Primeira Instância de 28 de Janeiro de 1992, Speybrouck/Parlamento, T‑45/90, Colect., p. II‑33). Os artigos 47.° a 50.° do ROA não prevêem nenhuma remissão para o artigo 11.° do ROA nem, por maioria de razão, por analogia, para o artigo 25.° do Estatuto, que impõe o dever de fundamentação das decisões que afectem interesses do funcionário.

51      Assim sendo, no caso vertente, a recorrente foi despedida, como resulta das reuniões de 15 e 25 de Junho de 2004 com P. de Rooij, pelo facto de as suas prestações terem sido consideradas insuficientes e insatisfatórias ao ponto de quebrar a confiança nela depositada. A recorrida contesta, pois, a existência de uma qualquer decisão tomada no final de 2002, antes da afectação da recorrente ao departamento ELAC, na qual estaria previsto que os serviços desta última cessariam em 31 de Dezembro de 2004.

52      Segundo a recorrida, o facto de despedir um agente por insuficiência profissional e devido ao carácter insatisfatório das suas prestações é conforme ao interesse geral.

53      A constatação das insuficiências profissionais da recorrente resulta de forma objectiva dos diferentes relatórios de estágio e de avaliação relativos ao período compreendido entre 1995 e 2002, sobre cujo conteúdo a recorrente pôde, na altura da sua elaboração, apresentar as suas observações. Em anexo à sua réplica, a recorrida juntou várias declarações ajuramentadas redigidas em Fevereiro e em Março de 2006 por P. de Rooij, U. Hillenkamp e F. Panzica, antigo chefe do pessoal e da administração, e por S. Stefani e N. Perrine, secretária na FEF.

54      As críticas formuladas de forma precisa e repetida pelos notadores disseram respeito ao tipo e ao nível das tarefas confiadas à recorrente. Ora, estas tarefas (designadamente, a organização do programa de trabalhos e das viagens da direcção, os pedidos de missão, as reservas de quartos de hotel e a reprodução de documentos para as reuniões) foram não só pouco absorventes, atendendo às competências normalmente exigidas a uma secretária de grau C 1, mas também limitadas em termos quantitativos. Tanto a qualidade como a quantidade das tarefas foram, pois, inferiores à média exigida para um trabalho de secretariado desse nível. Por conseguinte, não houve, no caso vertente, nenhum erro manifesto de apreciação.

55      O relatório de avaliação de 2003, o único favorável à recorrente, não é susceptível de alterar a apreciação negativa global, uma vez que se limita a reflectir, relativamente a uma parte específica do ano considerado, o parecer do chefe de departamento «em funções» e não o parecer do chefe de departamento que, no momento da sua elaboração, se encontrava ausente por doença.

56      A recorrida acrescenta que S. Taurelli, afastando‑se da opinião negativa de S. Stefani, tentou encorajar a recorrente, apesar das suas fracas prestações, e não desmotivá‑la para o futuro.

57      Quando S. Stefani retomou o seu trabalho após a baixa por doença e as suas férias anuais, o relatório de avaliação em causa já era definitivo, não podendo, por isso, ser alterado.

58      Além disso, P. de Rooij informou muito claramente a recorrente, nas reuniões de 15 e 25 de Junho de 2004, das críticas que lhe eram dirigidas. Deste modo, segundo a recorrida, a recorrente não podia ignorar as críticas contra si formuladas desde de 1995. Nestas condições, dado que a recorrente teve a possibilidade de apresentar as suas observações, não pode ser imputada à FEF qualquer violação dos direitos de defesa.

59      Por fim, embora a recorrente tenha efectivamente tido problemas de saúde, tal nunca foi considerado como um elemento em seu desfavor nem utilizado para justificar o seu despedimento. De qualquer modo, as deficiências profissionais invocadas já existiam antes da deterioração do seu estado de saúde.

 Apreciação do Tribunal da Função Pública

60      Em primeiro lugar, importa responder ao argumento avançado pela recorrida segundo o qual não existe, à luz do ROA ou do contrato de trabalho da recorrente, base jurídica que a obrigue a fundamentar a decisão de despedimento.

61      A este respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência assente (acórdãos do Tribunal de Justiça de 26 de Novembro de 1981, Michel/Parlamento, 195/80, Recueil, p. 2861, n.° 22; do Tribunal de Primeira Instância de 20 de Março de 1991, Pérez‑Mínguez Casariego/Comissão, T‑1/90, Colect., p. II‑143, n.° 73; de 18 de Março de 1997, Picciolo e Caló/Comité das Regiões, T‑178/95 e T‑179/95, ColectFP, pp. I‑A‑51 e II‑155, n.° 33; de 20 de Julho de 2001, Brumter/Comissão, T‑351/99, ColectFP, pp. I‑A‑165 e II‑757, n.° 28; de 16 de Março de 2004, Afari/BCE, T‑11/03, ColectFP, pp. I‑A‑65 e II‑267, n.° 37; de 6 de Julho de 2004, Huygens/Comissão, T‑281/01, ColectFP, pp. I‑A‑203 e II‑903, n.° 105; e de 3 de Outubro de 2006, Nijs/Tribunal de Contas, T‑171/05, ainda não publicado na Colectânea, n.° 36), o dever de fundamentação constitui um princípio essencial do direito comunitário que só pode ser derrogado por força de considerações imperiosas. Tem por objectivo, por um lado, permitir ao interessado verificar se o acto que afecta os seus interesses está ou não fundamentado e avaliar a oportunidade de interpor um recurso, e, por outro, tornar possível a fiscalização jurisdicional.

62      Este princípio, enunciado no artigo 253.° CE e retomado no artigo 25.°, segundo parágrafo, do Estatuto, faz parte precisamente dos direitos e obrigações dos funcionários a que alude o artigo 11.° do ROA. O Tribunal de Justiça declarou, a esse respeito, nos seus acórdãos de 15 de Julho de 1960, Von Lachmüller e o./Comissão (43/59, 45/59 e 48/59, Recueil, pp. 933, 956, Colect., p. 531), e de 16 de Dezembro de 1960, Fiddelaar/Comissão (44/59, Recueil, pp. 1077, 1099, Colect., p. 541), que incumbe à autoridade competente enunciar, de forma precisa e susceptível de ser contestada, os fundamentos que a levaram a rescindir unilateralmente o contrato de trabalho celebrado entre a instituição e um membro do seu pessoal.

63      É certo que, no acórdão Schertzer/Parlamento, já referido (n.os 38 a 40), o Tribunal de Justiça, a propósito do artigo 47.° do ROA, na versão aplicável ao caso dos autos, chegou a uma conclusão diferente no que respeita à rescisão de um contrato de um agente temporário. Segundo o Tribunal de Justiça, no caso de contratos por tempo indeterminado, o contrato de um agente temporário cessa uma vez transcorrido o período de pré‑aviso previsto no contrato, em conformidade com o artigo 47.°, n.° 2, do ROA. Deste modo, a rescisão unilateral desse contrato, expressamente prevista neste última disposição, que se enquadra no amplo poder de apreciação da autoridade competente e reconhecida pelo agente, no próprio momento da sua contratação, encontra a sua justificação no contrato de trabalho, não necessitando, por conseguinte, de ser fundamentada. É neste ponto que reside a diferença essencial entre a situação de um agente temporário e a de um funcionário estatutário, de modo que se exclui a aplicação por analogia do artigo 25.° do Estatuto, apesar da remissão geral do artigo 11.° do ROA para os artigos 11.° a 26.° do Estatuto.

64      Esta interpretação foi confirmada reiteradamente pela jurisprudência (acórdãos do Tribunal de Justiça, de 19 de Junho de 1992, V/Parlamento, C‑18/91 P, Colect., p. I‑3997, n.° 39; do Tribunal de Primeira Instância, Speybrouck/Parlamento, já referido, n.° 90; de 17 de Março de 1994, Hoyer/Comissão, T‑51/91, ColectFP, p. I‑A‑103 e II‑341, n.° 27; de 17 de Março de 1994, Smets/Comissão, T‑52/91, ColectFP, pp. I‑A‑107 e II‑353, n.° 24; de 5 de Dezembro de 2002, Hoyer/Comissão, T‑70/00, ColectFP, pp. I‑A‑247 e II‑1231, n.° 55; de 7 de Julho de 2004, Schmitt/AER, T‑175/03, ColectFP, pp. I‑A‑211 e II‑939, n.os 57 e 58; de 23 de Fevereiro de 2006, Kazantzoglou/AER, T‑471/04, ainda não publicado na Colectânea, n.os 43 e 44; e de 6 de Junho de 2006, Girardot/Comissão, T‑10/02, ainda não publicado na Colectânea, n.° 72).

65      Todavia, tendo em conta a evolução do direito relativo à protecção do trabalhador contra o despedimento e a utilização abusiva de sucessivos contratos ou de relações de trabalho por tempo determinado, bem como a própria jurisprudência comunitária relativa à exigência de fundamentação formal dos actos que possam afectar interesses, considerada, como salientado no n.° 61 do presente acórdão, um princípio essencial do direito comunitário, há que examinar se a rescisão unilateral de um contrato por tempo indeterminado de um agente temporário pode não ser fundamentada.

66      Em primeiro lugar, como resulta do segundo parágrafo do preâmbulo e do ponto 6 das considerações gerais do acordo‑quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo, aplicado pela Directiva 1999/70/CE do Conselho, de 28 de Junho de 1999 (JO L 175, p. 43), os contratos de trabalho por tempo indeterminado constituem «a forma mais comum no que diz respeito à relação laboral entre empregadores e trabalhadores», caracterizando‑se pela estabilidade do emprego, ao passo que os contratos a termo só em certas circunstâncias respondem tanto às necessidades dos empregadores como dos trabalhadores. A este respeito, o Tribunal de Justiça sublinhou que o benefício da estabilidade do emprego constitui um elemento da maior importância na protecção dos trabalhadores (acórdão de 22 de Novembro de 2005, Mangold, C‑144/04, Colect., p. I‑9981, n.° 64; v., igualmente, acórdão de 4 de Julho de 2006, Adeneler e o., C‑212/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 62).

67      A circunstância de o contrato controvertido ter sido concluído com uma entidade de direito internacional público não é susceptível de pôr em causa a pertinência desta observação no caso vertente. Com efeito, no n.° 54 do acórdão Adeneler e o., já referido, o Tribunal de Justiça declarou que a Directiva 1999/70 e o acordo‑quadro acima referidos eram aplicáveis aos contratos e às relações de trabalho a termo celebrados com os órgãos da administração e outras entidades do sector público (v., igualmente, acórdãos do Tribunal de Justiça de 7 de Setembro de 2006, Marrosu e Sardino, C‑53/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 39, e Vassallo, C‑180/04, ainda não publicado na Colectânea, n.° 32).

68      Ora, permitir ao empregador fazer cessar uma relação de trabalho por tempo indeterminado sem indicar os fundamentos da rescisão, tendo como único limite a observância de um período de pré‑aviso, equivaleria a ignorar a própria natureza dos contratos de trabalho por tempo indeterminado, na medida em que estes garantem uma certa segurança de emprego, e a diluir a distinção entre esta categoria de contratos e a categoria dos contratos de trabalho a termo. Embora seja verdade que a estabilidade do emprego inerente aos contratos por tempo indeterminado não é comparável à que é garantida pelo Estatuto aos funcionários (v., neste sentido, acórdão Speybrouck/Parlamento, já referido, n.° 90), dado que os agentes temporários não beneficiam de modo algum de um contrato de trabalho permanente, não é menos verdade que a categoria dos contratos de trabalho por tempo indeterminado apresenta uma especificidade, na perspectiva da segurança do emprego, que a distingue essencialmente da dos contratos de trabalho a termo.

69      Em segundo lugar, importa ter em consideração a existência de padrões internacionais destinados a indicar as condições mínimas necessárias num Estado de direito para evitar despedimentos abusivos de trabalhadores. Assim, nos termos do artigo 4.° da Convenção n.° 158 da Organização Internacional do Trabalho (a seguir «OIT»), relativa à cessação do contrato de trabalho por iniciativa do empregador, adoptada em 22 de Junho de 1982, «[u]m trabalhador não deverá ser despedido sem que exista um motivo válido de despedimento relacionado com a aptidão ou com o comportamento do trabalhador, ou baseado nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço». Do mesmo modo, o artigo 24.°, alínea a), da Carta Social Europeia revista pelo Conselho da Europa (n.° 163), adoptada em 3 de Maio de 1996, que, segundo o seu relatório explicativo, «se inspira na Convenção n.° 158 da OIT», garante «[o] direito de os trabalhadores não serem despedidos sem motivo válido ligado à sua aptidão ou comportamento, ou baseado nas necessidades de funcionamento da empresa, do estabelecimento ou do serviço».

70      O referido artigo 24.°, alínea a) serviu, por si só, de fonte de inspiração para a redacção do artigo 30.° da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, proclamada em Nice em 7 de Setembro de 2000 (JO C 364, p. 1). Nos termos deste último artigo «[t]odos os trabalhadores têm direito a protecção contra os despedimentos sem justa causa, de acordo com o direito comunitário e as legislações e práticas nacionais». O artigo 41.°, n.° 2, alínea c), desta carta prevê igualmente, de modo geral, ao abrigo do direito a uma boa administração, «a obrigação, por parte da administração, de fundamentar as suas decisões».

71      Ora, como resulta do seu preâmbulo, o objectivo principal desta Carta consiste em reafirmar «os direitos que decorrem, nomeadamente, das tradições constitucionais e das obrigações internacionais comuns aos Estados‑Membros, do Tratado da União Europeia e dos Tratados comunitários, da […] [CEDH], das Cartas Sociais aprovadas pela Comunidade e pelo Conselho da Europa, bem como da jurisprudência do Tribunal de Justiça […] e do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem» (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 27 de Junho de 2006, Parlamento/Conselho, C‑540/03, ainda não publicado na Colectânea, n.° 38).

72      Além disso, ao proclamarem solenemente a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o Parlamento, o Conselho e a Comissão pretenderam necessariamente conferir‑lhe um significado particular que importa ter em conta, no caso vertente, na interpretação das disposições do Estatuto e do ROA.

73      A este respeito, há que referir que não existe nenhuma razão imperiosa que permita excluir os agentes temporários, na acepção do ROA, da protecção contra os despedimentos sem justa causa, em especial quando estão vinculados por um contrato por tempo indeterminado ou quando, estando vinculados por um contrato por tempo determinado, sejam despedidos antes do seu termo.

74      Ora, para garantir uma protecção suficiente neste sentido, importa, por um lado, permitir aos interessados saber se os seus interesses legítimos foram respeitados ou lesados, bem como avaliar a possibilidade de recorrerem ao tribunal e, por outro lado, permitir a este último exercer a sua fiscalização, o que equivale a reconhecer a existência de um dever de fundamentação por parte da autoridade competente.

75      Importa ainda acrescentar que o reconhecimento do dever de fundamentação por parte da autoridade competente não exclui que esta disponha de um amplo poder de apreciação em matéria de despedimento e que, portanto, a fiscalização do juiz comunitário esteja limitada à verificação da inexistência de erro manifesto ou de desvio de poder (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 11 de Fevereiro de 1999, Carrasco Benítez/EMEA, T‑79/98, ColectFP, pp. I‑A‑29 e II‑127, n.° 55; de 12 de Dezembro de 2000, Dejaiffe/IHMI, T‑223/99, ColectFP, pp. I‑A‑277 e II‑1267, n.° 53; e de 6 de Fevereiro de 2003, Pyres/Comissão, T‑7/01, ColectFP, pp. I‑A‑37 e II‑239, n.os 50 e 51).

76      Por outro lado, há que assinalar que a redacção do artigo 47.° do ROA não se opõe às considerações precedentes, na medida em que este artigo se limita, na alínea c), i), a prever a fixação de um pré‑aviso e a sua duração, sem abordar a questão da justificação do despedimento.

77      Nestas condições, há que verificar no caso vertente, por um lado, se a decisão de despedimento respeita o dever de fundamentação enquanto formalidade essencial e, por outro, quanto à procedência da fundamentação do acto, se a FEF actuou dentro de limites razoáveis e não usou do seu poder de apreciação de maneira manifestamente errada.

78      No que respeita, por um lado, ao dever de fundamentação formal, decorre da jurisprudência que o seu alcance deve ser analisado em função das circunstâncias concretas, nomeadamente do conteúdo do acto, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que o destinatário pode ter em receber explicações (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 9 de Março de 2000, Vicente Nuñez/Comissão, T‑10/99, ColectFP, pp. I‑A‑47 e II‑203, n.° 41, e de 12 de Dezembro de 2002, Morello/Comissão, T‑338/00 e 376/00, ColectFP, p. I‑A‑301 e II‑1457, n.° 46). Para apreciar o carácter suficiente de uma fundamentação, importa igualmente situá‑la no contexto em que a adopção do acto impugnado se inscreveu (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Abril de 1999, Thinus/Comissão, T‑283/97, ColectFP, pp. I‑A‑69 e II‑353, n.° 77, e Morello/Comissão, já referido, n.° 47).

79      Face a uma medida de despedimento de um agente com um contrato por tempo indeterminado, é particularmente importante que os fundamentos em que assenta tal medida sejam, regra geral, claramente enunciados por escrito, de preferência no próprio texto da decisão em causa. Com efeito, este é o único acto, cuja legalidade é apreciada à data em que é adoptado, que materializa a decisão da instituição. Todavia, pode igualmente considerar‑se que a obrigação de indicar os fundamentos do despedimento foi respeitada se o interessado tiver sido devidamente informado, em reuniões com a sua hierarquia, acerca desses fundamentos e se a decisão da EHCC tiver sido tomada num curto espaço de tempo após a realização dessas reuniões. Se for caso disso, a EHCC pode igualmente completar essa fundamentação na fase de resposta à reclamação apresentada pelo interessado.

80      No caso concreto, resulta dos autos que a recorrente foi informada, nas reuniões que teve com P. de Rooij em 15 e 25 de Junho de 2004, das razões, relativas a uma alegada insuficiência profissional, pelas quais se pretendia fazer cessar o seu contrato de agente temporária. Em resposta à reclamação da recorrente, a EHCC forneceu oportunamente informações complementares, de modo a permitir‑lhe apreciar a razão de ser da decisão de despedimento e a dar‑lhe a possibilidade de interpor recurso no Tribunal de Primeira Instância.

81      Daqui resulta que a acusação relativa à violação do dever de fundamentação deve ser rejeitada.

82      No que respeita, por outro lado, à procedência dos fundamentos que justificam a decisão de despedimento, há que examinar a apreciação da FEF quanto ao interesse do serviço, limitando este exame à verificação da inexistência de erro manifesto, como foi recordado no n.° 75 do presente acórdão.

83      Resulta igualmente de jurisprudência assente que a autoridade competente deve, quando decide da situação de um agente, tomar em consideração todos os elementos susceptíveis de determinar a sua decisão, designadamente o interesse do agente em causa. Com efeito, tal resulta do dever de assistência da administração, que reflecte o equilíbrio dos direitos e obrigações recíprocas que o Estatuto e, por analogia, o ROA criaram nas relações entre a autoridade pública e os seus agentes (acórdãos do Tribunal de Primeira Instância, Pyres/Comissão, já referido, n.° 51, e de 1 de Março de 2005, Mausolf/Europol, T‑258/03, ColectFP, p. I‑A‑0000 e II‑189, n.° 49; v. igualmente, neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 29 de Junho de 1994, Klinke/Tribunal de Justiça, C‑298/93 P, Colect., p. I‑3009, n.° 38; do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Abril de 1996, Kyrpitsis/CESE, T‑13/95, ColectFP, pp. I‑A‑167 e II‑503, n.° 52; e Dejaiffe/IHMI, já referido, n.° 53).

84      No caso vertente, para justificar o despedimento, a FEF invocou apenas a insuficiência profissional «geral» da recorrente, comprovada pela acumulação de relatórios de avaliação desfavoráveis ou críticos relativos às suas prestações. O relatório de avaliação de 2003, o único relatório favorável à recorrente, não bastou, segundo a recorrida, para reverter esta tendência geral.

85      A este respeito, apesar de ao longo de toda a sua carreira lhe terem sido regularmente apontadas faltas de atenção, de precisão e de rapidez na execução das tarefas, resulta dos diferentes relatórios de estágio ou de avaliação que a apreciação dos méritos da recorrente, contrariamente ao que é alegado pela recorrida, foi globalmente satisfatória, mesmo boa (para o período de 1997 a 2000 e para 2003).

86      É certo que duas pessoas em particular formularam apreciações muito negativas:

–        U. Hillenkamp, director adjunto, do qual a recorrente foi secretária de Janeiro de 2002 a Janeiro de 2003 e que, no relatório de avaliação provisório de 9 de Julho de 2002, considerou que a recorrente não respondia suficientemente às exigências das suas funções; do mesmo modo, num projecto de relatório de avaliação para o ano de 2002, constatou uma falta de fiabilidade e graves deficiências em quase todos os aspectos das funções por ela exercidas;

–        S. Stefani, chefe de departamento, da qual a recorrente foi igualmente secretária de 1 de Fevereiro de 2003 a 30 de Junho de 2004.

87      Todavia, no que respeita, por um lado, ao projecto de relatório de avaliação para o ano 2002, não só esse texto nunca foi concluído, como a apreciação do outro director adjunto, L. Pescia, para o qual a recorrente também trabalhou durante o mesmo período, foi muito menos severa, tendo este último considerado satisfatória, mesmo boa, a execução das tarefas por parte da recorrente ainda que tivesse reconhecido a existência de algumas deficiências que atribuiu, em parte, a um volume de trabalho excessivo.

88      Por outro lado, o relatório de avaliação para o ano 2003, apresentado em 18 de Março de 2004 por S. Taurelli, para a qual a recorrente também trabalhou, e aprovado por P. de Rooij em 31 de Março de 2004, isto é, cerca de dois meses antes das reuniões em que este comunicou à recorrente a sua intenção de rescindir o seu contrato, foi particularmente favorável a esta última. Com efeito, resulta desse relatório que a recorrente «has achieved her key objectives set for 2003 […] has been able to perform her tasks effectively and efficiently with respect of deadlines […] has shown capacity to concentrate on her work even while having to deal with several issues at the same time […] has made a substantial effort to improve her memory […] has improved her IT skills […] maintains good, friendly but respectful relations with peers and fellow colleagues» (atingiu os objectivos principais estabelecidos para 2003 […] conseguiu executar as suas tarefas de maneira eficaz e eficiente dentro dos prazos […] demonstrou capacidade para se concentrar no seu trabalho, mesmo quando teve de se ocupar de várias questões ao mesmo tempo […] fez esforços significativos para melhorar a sua memória […] melhorou as suas competências no domínio da informática […] mantém boas relações, amigáveis mas respeitosas, com os seus pares e colegas de trabalho).

89      O Tribunal da Função Pública não pode atribuir a declarações unilaterais, anexas à réplica da recorrida, redigidas depois da interposição do presente recurso e que se destinam a completar os relatórios de avaliação da recorrente, ou mesmo a demonstrar que estavam errados na apreciação global, o mesmo valor que confere aos próprios relatórios apresentados na sequência de um procedimento contraditório que tenha precisamente por objectivo permitir a apreciação objectiva dos méritos da agente em causa.

90      Além disso, não resulta do processo que as prestações profissionais da recorrente tenham baixado bruscamente entre o seu último relatório de avaliação elaborado por S. Taurelli em Março de 2004, que saúda o cumprimento das suas tarefas com eficiência e dentro dos prazos, e a adopção da decisão de despedimento menos de três meses mais tarde. Esta última decisão é tanto mais contestável quanto foi adoptada pouco tempo depois do referido relatório de avaliação.

91      Daqui resulta, sem que seja necessário examinar as acusações relativas à violação dos direitos de defesa e do dever de assistência nem os outros fundamentos invocados pela recorrente, que a decisão de despedimento contém um erro manifesto de apreciação, devendo, por isso, ser anulada.

92      A anulação de um acto pelo Tribunal tem por efeito eliminar retroactivamente este acto da ordem jurídica (acórdãos do Tribunal de Justiça de 26 de Abril de 1988, Asteris e o./Comissão, 97/86, 99/86, 193/86 e 215/86, Colect., p. 2181, n.° 30, e do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Março de 2004, Girardot/Comissão, T‑10/02, ColectFP, pp. I‑A‑109 e II‑483, n.° 84). Quando o acto anulado já tiver sido executado, a eliminação dos seus efeitos impõe o restabelecimento da situação jurídica em que se encontrava o recorrente antes da sua adopção (acórdãos do Tribunal de Justiça de 31 de Março de 1971, Comissão/Conselho, 22/70, Recueil, p. 263, n.° 60, e do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Março de 2004, Girardot/Comissão, já referido, n.° 84).

93      Todavia, apesar de, no caso vertente, não se colocar a questão relativa à existência, a favor do trabalhador, de um eventual direito à reintegração no caso de despedimento ilegal, há que assinalar que, no decurso da audiência, a recorrente declarou que o seu estado de saúde se tinha agravado bastante e que não estava fisicamente apta a retomar o exercício de uma actividade na FEF. Nestas condições, de modo a assegurar, no interesse da recorrente, que o acórdão de anulação tem um efeito útil, o Tribunal de Função Pública deve fazer uso da competência de plena jurisdição de que goza nos litígios com carácter pecuniário, convidando a recorrida a encontrar uma solução equitativa susceptível de proteger adequadamente os direitos de P. Landgren (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 6 de Julho de 1993, Comissão/Albani e o., C‑242/90 P, Colect., p. I‑3839, n.° 13, e do Tribunal de Primeira Instância de 31 de Março de 2004, Girardot/Comissão, já referido, n.° 89).

94      Daqui resulta que as partes são convidadas, em primeiro lugar, a procurar chegar a um acordo que fixe uma compensação pecuniária equitativa pelo despedimento ilegal da recorrente e, em seguida, a informar o Tribunal da Função Pública do montante assim determinado, ou, na falta de acordo, a apresentar‑lhe os seus pedidos quantificados, no prazo de três meses a contar da prolação do presente acórdão.

95      Na avaliação dessa compensação, importa ter em conta, designadamente, o facto de P. Landgren ter recebido subsídio de desemprego após o seu despedimento e a idade em que, em condições normais, tendo em conta o seu estado de saúde, poderia obter uma pensão de aposentação.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Tribunal Pleno)

decide:

1)      A decisão da Fundação Europeia para a Formação, de 25 de Junho de 2004, que rescinde o contrato por tempo indeterminado de P. Landgren na qualidade de agente temporária, é anulada.

2)      As partes comunicarão ao Tribunal, no prazo de três meses a contar da data da prolação do presente acórdão, o montante, fixado de comum acordo, da compensação pecuniária pela ilegalidade da decisão de 25 de Junho de 2004, ou, na falta de acordo, os seus pedidos quantificados relativamente a esse montante.

3)      Reserva‑se para final a decisão sobre as despesas.

Mahoney

Kreppel

Van Raepenbusch

Boruta

Kanninen Tagaras

Gervasoni

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 26 de Outubro de 2006.

O secretário

 

      O presidente

W. Hakenberg

 

      P. Mahoney

Os textos da presente decisão bem como as decisões dos órgãos jurisdicionais comunitários nela referidos e ainda não publicados na Colectânea encontram‑se disponíveis no sítio do Tribunal de Justiça www.curia.europa.eu na Internet


* Língua do processo: francês.