Language of document : ECLI:EU:T:2023:830

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção Alargada)

20 de dezembro de 2023 (*)

«Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas adotadas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia — Congelamento de fundos — Lista das pessoas, das entidades e dos organismos aos quais se aplica o congelamento de fundos e de recursos económicos — Restrições em matéria de admissão no território dos Estados‑Membros — Lista das pessoas, das entidades e dos organismos que são objeto de restrições em matéria de admissão no território dos Estados‑Membros — Inclusão e manutenção do nome do recorrente nas listas — Conceito de “proeminentes homens de negócios” — Artigo 2.o, n.o 1, alínea g), da Decisão 2014/145/PESC — Dever de fundamentação — Direitos de defesa — Erro de apreciação — Proporcionalidade — Igualdade de tratamento — Direito de propriedade — Liberdade de empresa — Direito à vida privada — Aplicação de restrições em matéria de admissão a um nacional de um Estado‑Membro — Livre circulação dos cidadãos da União»

No processo T‑313/22,

Roman Arkadyevich Abramovich, residente em Nemchinovo (Rússia), representado por T. Bontinck, A. Guillerme, S. Bonifassi, M. Brésart, L. Burguin, J. Goffin, J. Bastien, R. Lööf, advogados, e C. Zatschler, SC,

recorrente,

contra

Conselho da União Europeia, representado por M. Bishop e M.‑C. Cadilhac, na qualidade de agentes,

recorrido,

apoiado por

Comissão Europeia, representada por J.‑F. Brakeland, C. Giolito, L. Puccio e M. Carpus Carcea, na qualidade de agentes,

interveniente,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção Alargada),

composto por: D. Spielmann, presidente, V. Valančius, R. Mastroianni (relator), M. Brkan e I. Gâlea, juízes,

secretário: H. Eriksson, administradora,

vistos os autos, nomeadamente:

–        a petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de maio de 2022;

–        a Decisão de 16 de agosto de 2022 que admite a Comissão a intervir em apoio do Conselho;

–        os articulados de adaptação apresentados na Secretaria do Tribunal Geral em 24 de novembro de 2022, 23 de março de 2023 e 17 de maio de 2023;

após a audiência de 12 de julho de 2023,

vistos, no seguimento da cessação de funções do juiz V. Valančius em 26 de setembro de 2023, o artigo 22.o e o artigo 24.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral,

profere o presente

Acórdão

1        Por meio do seu recurso, o recorrente, Roman Arkadyevich Abramovich, pede, por um lado, com base no artigo 263.o TFUE, a anulação, primeiro, da Decisão (PESC) 2022/429 do Conselho, de 15 de março de 2022, que altera a Decisão 2014/145/PESC que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2022, L 87 I, p. 44), e do Regulamento de Execução (UE) 2022/427 do Conselho, de 15 de março de 2022, que dá execução ao Regulamento (UE) n.o 269/2014 que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2022, L 87 I, p. 1) (a seguir, conjuntamente, «atos iniciais»), segundo, da Decisão (PESC) 2022/1530 do Conselho, de 14 de setembro de 2022, que altera a Decisão 2014/145/PESC que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2022, L 239, p. 149), e do Regulamento de Execução (UE) 2022/1529 do Conselho, de 14 de setembro de 2022, que dá execução ao Regulamento (UE) n.o 269/2014 que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2022, L 239, p. 1) (a seguir, conjuntamente, «atos de manutenção de setembro de 2022»), terceiro, da Decisão (PESC) 2023/572 do Conselho, de 13 de março de 2023, que altera a Decisão 2014/145/PESC que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2023, L 75 I, p. 134), e do Regulamento de Execução (UE) 2023/571 do Conselho, de 13 de março de 2023, que dá execução ao Regulamento (UE) n.o 269/2014 que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2023, L 75 I, p. 1) (a seguir, conjuntamente, «atos de manutenção de março de 2023»), e, quarto, da Decisão (PESC) 2023/811 do Conselho, de 13 de abril de 2023, que altera a Decisão 2014/145/PESC que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2023, L 101, p. 67) e do Regulamento de Execução (UE) 2023/806 do Conselho, de 13 de abril de 2023, que dá execução ao Regulamento (UE) n.o 269/2014 que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2023, L 101, p. 1) (a seguir, conjuntamente, «atos de manutenção de abril de 2023» e, conjuntamente com os atos de manutenção de setembro de 2022 e de março de 2023, «atos de manutenção»), na medida em que estes atos (a seguir, conjuntamente, «atos impugnados») lhe dizem respeito, e, por outro lado, com base no artigo 268.o TFUE, a reparação do dano que sofreu na sequência da adoção dos atos iniciais.

 Antecedentes do litígio

2        O recorrente é um homem de negócios de nacionalidade russa, israelita e portuguesa.

3        Em 17 de março de 2014, o Conselho da União Europeia adotou, com base no artigo 29.o TUE, a Decisão 2014/145/PESC que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2014, L 78, p. 16). No mesmo dia, adotou, com base no artigo 215.o, n.o 2, TFUE, o Regulamento (UE) n.o 269/2014 que impõe medidas restritivas no que diz respeito a ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia (JO 2014, L 78, p. 6).

4        Em 21 de fevereiro de 2022, o presidente da Federação da Rússia assinou um decreto que reconhecia a independência e a soberania das autoproclamadas «República Popular de Donetsk» e «República Popular de Lugansk» e ordenou o destacamento de forças armadas russas para essas zonas.

5        Em 22 de fevereiro de 2022, o Alto Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança publicou uma declaração em nome da União Europeia que condenava essas ações, uma vez que constituíam uma violação grave do direito internacional. Anunciou que a União responderia a estas últimas violações pela Federação da Rússia adotando, com caráter de urgência, medidas restritivas adicionais.

6        Em 23 de fevereiro de 2022, o Conselho adotou um primeiro pacote de medidas restritivas. Estas diziam respeito, primeiro, a restrições aplicáveis às relações económicas com as regiões não controladas pelo Governo de Donetsk e de Lugansk, segundo, a restrições ao acesso ao mercado de capitais, nomeadamente proibindo o financiamento da Federação da Rússia, do seu Governo e do seu banco central, e, terceiro, à inclusão de membros do Governo, de bancos, de homens de negócios, de generais e de 336 membros da Gosudarstvennaya Duma Federal’nogo Sobrania Rossiskoï Federatsii (Duma Estatal da Assembleia Federal da Federação da Rússia) na lista das pessoas, das entidades e dos organismos objeto de medidas restritivas.

7        Em 24 de fevereiro de 2022, o presidente da Federação da Rússia anunciou uma operação militar na Ucrânia e, no mesmo dia, as forças armadas russas atacaram a Ucrânia em diversos locais do país.

8        Em 25 de fevereiro de 2022, o Conselho adotou um segundo pacote de medidas restritivas. Primeiro, tratava‑se de medidas individuais que visavam políticos e homens de negócios implicados na violação da integridade do território ucraniano. Segundo, tratava‑se de medidas restritivas aplicáveis no domínio das finanças, da defesa, da energia, no setor da aviação e da indústria espacial. Terceiro, tratava‑se de medidas que suspendiam a aplicação de determinadas disposições do acordo que previam medidas destinadas a facilitar a emissão de vistos para certas categorias de cidadãos da Federação da Rússia que solicitassem um visto de curta duração.

9        Nessa mesma data, atendendo à gravidade da situação na Ucrânia, o Conselho adotou, por um lado, a Decisão (PESC) 2022/329, que altera a Decisão 2014/145 (JO 2022, L 50, p. 1), e, por outro, o Regulamento (UE) 2022/330, que altera o Regulamento n.o 269/2014 (JO 2022, L 51, p. 1), nomeadamente com a finalidade de retificar os critérios pelos quais as medidas restritivas em causa podiam visar pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos. De acordo com o considerando 11 da Decisão 2022/329, o Conselho considerou que os critérios de designação deviam ser alterados de modo a incluir pessoas e entidades que apoiavam o Governo Russo ou dele beneficiavam, bem como pessoas e entidades que representavam uma fonte substancial de receitas para o referido Governo e pessoas singulares ou coletivas associadas a pessoas e entidades que constavam da lista.

10      O artigo 2.o, n.os 1 e 2, da Decisão 2014/145, na versão alterada pela Decisão 2022/329, prevê o seguinte:

«1.      São congelados todos os fundos e recursos económicos pertencentes, na posse, à disposição ou sob controlo:

[…]

d)      Das pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos que prestem apoio material ou financeiro ou que obtenham benefícios dos decisores russos responsáveis pela anexação da Crimeia ou pela desestabilização no leste da Ucrânia;

[…]

g)      Dos proeminentes homens de negócios ou pessoas coletivas, entidades ou organismos envolvidos em setores económicos que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo da Federação da Rússia, que é responsável pela anexação da Crimeia e pela desestabilização da Ucrânia,

[…]

2.      É proibido colocar, direta ou indiretamente, fundos ou recursos económicos à disposição das pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos enumerados no anexo, ou disponibilizá‑los em seu proveito.»

11      As modalidades desse congelamento de fundos são definidas no artigo 2.o, n.os 3 a 6, da Decisão 2014/145 alterada.

12      O artigo 1.o, n.o 1, alíneas b) e e), da Decisão 2014/145 alterada proíbe a entrada no território dos Estados‑Membros ou o trânsito através dele das pessoas singulares que se integrem em critérios idênticos, em substância, aos previstos no artigo 2.o, n.o 1, alíneas d) e g), dessa decisão.

13      O Regulamento n.o 269/2014, na sua versão alterada pelo Regulamento 2022/330, impõe a adoção das medidas de congelamento de fundos e define as modalidades desse congelamento em termos idênticos, em substância, aos da Decisão 2014/145 alterada. Com efeito, o artigo 3.o, n.o 1, alíneas a) a g), desse regulamento alterado reproduz, no essencial, o artigo 2.o, n.o 1, alíneas a) a g), da referida decisão.

14      Neste contexto, com os atos iniciais, o Conselho incluiu o nome do recorrente nas listas das pessoas, das entidades e dos organismos objeto das medidas restritivas constantes do anexo da Decisão 2014/145 alterada e do anexo I do Regulamento n.o 269/2014 alterado (a seguir «listas em causa»).

15      Os motivos da inclusão do nome do recorrente nas listas em causa são os seguintes:

«[O recorrente] é um oligarca russo que tem há muito estreitos laços com Vladimir Putin. Tem tido um acesso privilegiado ao presidente e mantido relações muito boas com ele. Esta ligação ao líder russo ajudou‑o a manter a sua considerável fortuna. Roman Abramovich é um dos principais acionistas do grupo siderúrgico Evraz, que é um dos maiores contribuintes da Rússia.

[Obteve por isso] benefícios dos decisores russos responsáveis pela anexação da Crimeia ou pela desestabilização da Ucrânia. É também um dos destacados empresários russos com atividade em setores económicos que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo da Federação da Rússia, que é responsável pela anexação da Crimeia e pela desestabilização da Ucrânia.»

16      Em 16 de março de 2022, o Conselho publicou no Jornal Oficial da União Europeia um aviso à atenção das pessoas, entidades e organismos sujeitos às medidas restritivas previstas na Decisão 2014/145 alterada e no Regulamento n.o 269/2014, executado pelo Regulamento de Execução 2022/427 (JO 2022, C 121 I, p. 1). Esse aviso referia, nomeadamente, que as pessoas em causa podiam enviar ao Conselho um pedido de reapreciação da decisão de as incluir nas listas em causa, acompanhado de documentação justificativa.

17      Por carta de 13 de abril de 2022, o Conselho transmitiu ao recorrente as informações constantes do dossiê de provas com a referência WK 3624/2022, datado de 12 de março de 2022 («primeiro dossiê WK»), no qual baseara a sua Decisão.

18      Em 25 de maio de 2022, o recorrente apresentou um pedido de reapreciação dos atos iniciais.

 Factos posteriores à apresentação do presente recurso

19      Em 14 de setembro de 2022, o Conselho adotou os atos de manutenção de setembro de 2022, pelos quais as medidas restritivas adotadas no que diz respeito ao recorrente foram prorrogadas até 15 de março de 2023. Nesses atos, o Conselho justificou a prorrogação das referidas medidas retomando todos os fundamentos dos atos iniciais.

20      Por carta de 22 de dezembro de 2022, à qual foi junto o dossiê de provas com a referência WK 17693/2022, datado de 15 de dezembro de 2022 (a seguir «segundo dossiê WK»), o Conselho informou o recorrente de que pretendia prorrogar as medidas restritivas que lhe haviam sido aplicadas e convidou‑o a apresentar observações.

21      Por carta de 19 de janeiro de 2023, o recorrente apresentou as suas observações sobre os novos elementos de prova.

22      Pelos atos de manutenção de março de 2023, as medidas restritivas adotadas no que diz respeito ao recorrente foram prorrogadas até 15 de setembro de 2023. Por carta de 14 de março de 2023, o Conselho informou o recorrente da sua decisão.

23      Pelos atos de manutenção de abril de 2023, foi introduzida uma alteração em determinadas versões linguísticas da exposição de motivos relativa ao recorrente, bem como na rubrica intitulada «elementos de identificação» que lhe diz respeito.

24      Os motivos da inclusão do nome do recorrente nas listas em causa foram modificados nos atos de manutenção de abril de 2023, da seguinte forma:

«[O recorrente] é um oligarca russo que tem há muito estreitos laços com Vladimir Putin. Tem tido acesso privilegiado ao presidente e mantido relações muito boas com ele. Esta ligação ao líder russo ajudou‑o a manter a sua considerável fortuna. Roman Abramovich é um dos principais acionistas do grupo siderúrgico Evraz, que é um dos maiores contribuintes da Rússia.

Tem por isso obtido benefícios dos decisores russos responsáveis pela anexação da Crimeia ou pela desestabilização da Ucrânia. É também um dos destacados empresários russos com atividade em setores económicos que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo da Federação da Rússia, que é responsável pela anexação da Crimeia e pela desestabilização da Ucrânia.»

25      Por carta de 11 de maio de 2023, o Conselho informou o recorrente, em resposta a uma carta deste de 4 de maio de 2023, dos fundamentos da referida alteração.

 Pedidos das partes

26      O recorrente pede que o Tribunal Geral se digne:

–        anular os atos impugnados na medida em que lhe dizem respeito;

–        condenar o Conselho no pagamento de 1 milhão de euros, a título provisório, a favor da fundação de beneficência que está a ser criada no âmbito da venda do Chelsea FC em benefício das vítimas de conflitos, como reparação do dano moral sofrido;

–        condenar o Conselho nas despesas.

27      O Conselho, apoiado pela Comissão Europeia, pede que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

28      Em apoio do seu pedido de anulação, o recorrente invoca quatro fundamentos de recurso relativos, formalmente, o primeiro, à «violação do direito à tutela jurisdicional efetiva e do dever de fundamentação», o segundo, a um «erro manifesto de apreciação», o terceiro, à «violação do princípio da proporcionalidade e do princípio da igualdade de tratamento» e, o quarto, à «violação dos direitos fundamentais». Alega, por outro lado, que tem direito a uma indemnização pelo dano provocado pelo comportamento ilegal do Conselho. No quadro dos seus dois primeiros articulados de adaptação, o recorrente suscita também argumentos relativos à «violação dos direitos de defesa» e ao «desrespeito, pelo Conselho, do seu dever de reapreciação no âmbito da adoção dos atos de manutenção de setembro de 2022 e de março de 2023», os quais se relacionam, em substância, com o primeiro fundamento, pelo que serão analisados como uma parte deste.

 Quanto ao pedido de anulação

 Quanto ao primeiro fundamento

29      O primeiro fundamento pode ser dividido, em substância, em duas partes, a primeira das quais diz respeito à «violação do direito à tutela jurisdicional efetiva e do dever de fundamentação» e a segunda das quais é constituída por argumentos suscitados pelo recorrente no quadro dos dois primeiros articulados de adaptação, especificamente dirigidos contra os atos de manutenção de setembro de 2022 e de março de 2023.

–       Quanto à primeira parte, relativa à «violação do direito à tutela jurisdicional efetiva e do dever de fundamentação»

30      O recorrente alega que as informações fornecidas pelo Conselho não lhe permitem defender‑se corretamente. Em especial, acusa o Conselho de não ter esclarecido a natureza e o alcance dos «laços» ou das «relações» mantidas com o presidente Putin.

31      De acordo com o recorrente, o Conselho não lhe transmitiu informações fiáveis e credíveis que lhe permitissem verificar os motivos da inclusão e da manutenção do seu nome nas listas em causa, bem como as razões individuais, específicas e concretas pelas quais considerou que os atos impugnados se justificavam.

32      A este respeito, o recorrente sublinha que os elementos de prova que constam dos autos, compostos apenas por artigos de imprensa ou extratos e capturas de ecrã a partir de sítios Internet, não permitem identificar nenhum ato de apoio ou benefício recebido da parte do presidente Putin.

33      Além disso, o recorrente acusa o Conselho de não ter identificado os decisores russos de quem tenha obtido benefícios.

34      Por outro lado, o recorrente afirma que as alegações do Conselho lhe impõem o dever de fornecer provas negativas, desse modo invertendo o ónus da prova.

35      Na sua réplica, o recorrente invoca a falta de uma base factual contemporânea na adoção das medidas restritivas em causa. Além disso, acusa o Conselho de não ter em consideração o contexto e as circunstâncias do caso concreto, na medida em que o Conselho não apresenta um conjunto de indícios suficientemente concretos, precisos e concordantes que permitam estabelecer a existência de uma ligação suficiente entre o recorrente e as «situações combatidas», ou seja, as ações que comprometam ou ameacem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia.

36      Nos articulados de adaptação, o recorrente alega que nenhum elemento permite concluir que, no que diz respeito ao grupo siderúrgico Evraz (a seguir «Evraz»), o seu estatuto de acionista da sociedade‑mãe lhe permite exercer uma influência sobre as situações combatidas pelas medidas restritivas. A este respeito, sublinha que o Conselho já não se baseia nos elementos de prova anexados à carta de 22 de dezembro de 2022, que se refere, de forma geral, às relações comerciais da Evraz e, em especial, aos contratos que filiais desta celebraram com a Guarda Nacional da Federação Russa. Além disso, os elementos de prova contidos no segundo dossiê WK, ainda que, em grande parte, anteriores aos atos de manutenção de setembro de 2022, não foram invocados na adoção destes.

37      O Conselho, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos do recorrente.

38      De acordo com jurisprudência constante, o direito à tutela jurisdicional efetiva, enunciado no artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), exige que o interessado possa conhecer os fundamentos em que se baseia a decisão contra ele tomada quer através da leitura da própria decisão, quer através da comunicação destes fundamentos, feita a seu pedido (v., Acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 100 e jurisprudência referida).

39      O dever de fundamentar um ato lesivo, previsto no artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE, que constitui um corolário do princípio do respeito pelos direitos de defesa, tem por fim, por um lado, fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber se o ato foi devidamente fundamentado ou se enferma eventualmente de um vício que permita impugnar a sua validade perante o juiz da União e, por outro, permitir a este último exercer a sua fiscalização da legalidade desse ato (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de novembro de 2012, Conselho/Bamba, C‑417/11 P, EU:C:2012:718, n.os 49 e 50, e de 22 de abril de 2021, Conselho/PKK, C‑46/19 P, EU:C:2021:316, n.o 47 e jurisprudência referida).

40      A fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE e pelo artigo 41.o, n.o 2, terceiro travessão, da Carta deve ser adaptada à natureza do ato em causa e ao contexto em que o mesmo foi adotado. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas a quem o ato diga direta ou individualmente respeito podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, nem que responda de forma detalhada às considerações formuladas pelo interessado ao ser consultado antes da adoção do mesmo ato, na medida em que o caráter suficiente de uma fundamentação deve ser apreciado à luz não só do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das regras jurídicas que regulam a matéria em causa (v., Acórdãos de 15 de novembro de 2012, Conselho/Bamba, C‑417/11 P, EU:C:2012:718, n.o 53 e jurisprudência referida, e de 22 de abril de 2021, Conselho/PKK, C‑46/19 P, EU:C:2021:316, n.o 48 e jurisprudência referida).

41      Assim, por um lado, um ato lesivo está suficientemente fundamentado quando tenha sido adotado num contexto conhecido do interessado, que lhe permita compreender o alcance da medida adotada a seu respeito. Por outro lado, o grau de precisão da fundamentação de um ato deve ser proporcionado em relação às possibilidades materiais e às condições técnicas ou temporais nas quais deve ser adotado (v., Acórdão de 27 de julho de 2022, RT France/Conselho, T‑125/22, EU:T:2022:483, n.o 104 e jurisprudência referida).

42      Além disso, a jurisprudência especificou que a fundamentação de um ato do Conselho que impõe uma medida restritiva não devia apenas identificar a base jurídica dessa medida, mas também as razões específicas e concretas pelas quais o Conselho considerava, no exercício do seu poder discricionário de apreciação, que o interessado devia ser objeto dessa medida (v., Acórdão de 27 de julho de 2022, RT France/Conselho, T‑125/22, EU:T:2022:483, n.o 105 e jurisprudência referida).

43      Por último, cabe recordar que o dever de fundamentação constitui uma formalidade essencial que se distingue do mérito da fundamentação, uma vez que este decorre da validade material do ato controvertido. Com efeito, a fundamentação de um ato consiste em exprimir formalmente as razões em que assenta esse ato. Se essas razões estiverem feridas de erros, estes inquinam a validade material do referido ato, mas não a sua fundamentação, que pode ser suficiente, contendo embora motivos errados (v., Acórdão de 5 de novembro de 2014, Mayaleh/Conselho, T‑307/12 e T‑408/13, EU:T:2014:926, n.o 96 e jurisprudência referida). O mesmo se aplica no que diz respeito à distinção entre a questão da fundamentação e a da prova do comportamento alegado, que decorre também da validade material do ato em causa e implica verificar a veracidade dos factos mencionados nesse ato e a qualificação desses factos no sentido de que constituem elementos que justificam a aplicação de medidas restritivas contra a pessoa em causa (v., neste sentido, Acórdão de 6 de outubro de 2015, Chyzh e o./Conselho, T‑276/12, não publicado, EU:T:2015:748, n.o 111 e jurisprudência referida).

44      A título preliminar, como reconheceu o recorrente na audiência, impõe‑se observar que os seus argumentos relativos à exatidão, ao caráter não contemporâneo das alegações constantes dos motivos da inclusão e ao conteúdo do segundo dossiê WK decorrem do mérito dos atos impugnados e não dizem respeito à existência ou ao caráter suficiente da sua fundamentação. O mesmo se aplica quanto ao seu argumento relativo à alegada inversão do ónus da prova, que diz respeito à questão do mérito da fundamentação.

45      No caso em apreço, em primeiro lugar, deve salientar‑se que o contexto geral que levou o Conselho a adotar as medidas restritivas em causa é claramente apresentado nos considerandos dos atos impugnados, que referem, nomeadamente, a agressão militar não provocada e injustificada da Federação Russa contra a Ucrânia. De igual modo, as bases jurídicas da adoção dos referidos atos, ou seja, o artigo 29.o TUE e o artigo 215.o TFUE, são claramente indicadas. A fundamentação dos atos impugnados é a que está exposta nos n.os 14 e 24, supra. Assim, o contexto e as circunstâncias que rodearam a adoção dos referidos atos eram bem conhecidos do recorrente.

46      Em segundo lugar, resulta de forma suficientemente clara da leitura da fundamentação dos atos impugnados que o Conselho incluiu o nome do recorrente nas listas em causa baseando‑se em dois critérios, que são expressamente referidos nos motivos da inclusão, designadamente os referidos no artigo 2.o, n.o 1, alíneas d) e g), da Decisão 2014/145 alterada [a seguir, respetivamente, «critério d)» e «critério g)»] (v., n.o 10, supra), o que, de resto, o recorrente não contesta.

47      Em terceiro lugar, os motivos da inclusão referidos nos n.os 15 e 24, supra, permitiram ao recorrente compreender que o seu nome foi inserido e mantido nas listas em causa devido ao facto, nomeadamente, de ter mantido laços estreitos e de longa duração com o presidente Putin, que, independentemente da sua natureza, o ajudaram a manter uma fortuna considerável, pelo que obteve benefícios dos decisores russos responsáveis pela anexação da Crimeia ou pela desestabilização da Ucrânia. Além disso, o recorrente está identificado como um dos principais acionistas da sociedade‑mãe da Evraz, que figura entre os maiores contribuintes da Rússia, pelo que está identificado como um proeminente homem de negócios com atividade num setor económico que representa ou constitui uma fonte substancial de receitas para o Governo da Federação da Rússia.

48      A este respeito, mais concretamente quanto ao caráter pretensamente vago e genérico da referência a decisores russos, há que salientar, à semelhança do Conselho, que, ao referir‑se ao «líder russo» no singular, o que permite identificar facilmente o presidente Putin como o decisor russo de quem o recorrente obteve benefícios, a exposição de motivos é suficientemente precisa.

49      Por último, não tendo havido alterações nos motivos da inclusão e da manutenção do nome do recorrente nas listas em causa, o recorrente não pode acusar o Conselho de não ter referido, na exposição de motivos dos atos de manutenção, os elementos de prova que lhe transmitira na carta de 22 de dezembro de 2022.

50      À luz das considerações que antecedem, há que concluir que os atos impugnados apresentam, de forma juridicamente suficiente, os elementos de direito e de facto que constituem, de acordo com o Conselho, o seu fundamento.

51      Por conseguinte, há que julgar improcedente a presente parte.

–       Quanto à segunda parte, relativa à «violação dos direitos de defesa» e ao «desrespeito, pelo Conselho, do seu dever de reapreciaçãono âmbito da adoção dos atos de manutenção de setembro de 2022 e de março de 2023»

52      O recorrente acusa o Conselho, em substância, de não lhe ter dado a possibilidade de ser ouvido antes da adoção dos atos de manutenção de setembro de 2022 e de março de 2023 e de não ter dado uma resposta substancial a um determinado número de elementos e de argumentos que apresentou.

53      Além disso, o recorrente acusa o Conselho de não ter reavaliado a necessidade de manter as medidas restritivas em causa no que lhe diz respeito, de ter referido elementos não contemporâneos e de ter ignorado as alterações de circunstâncias ocorridas após a inclusão do seu nome nas listas em causa, no que diz respeito, nomeadamente, ao papel que desempenhou em vários esforços humanitários e na mediação entre as partes, bem como as suas relações com o presidente Putin.

54      O recorrente considera, por isso, que os atos de manutenção de setembro de 2022 e de março de 2023 não teriam sido adotados se o Conselho tivesse reanalisado a sua situação e o tivesse ouvido.

55      O Conselho, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos do recorrente.

56      O direito de ser ouvido em todos os processos, previsto no artigo 41.o, n.o 2, alínea a), da Carta, que faz parte integrante do respeito pelos direitos de defesa, garante a qualquer pessoa a possibilidade de dar a conhecer, de maneira útil e efetiva, o seu ponto de vista no decurso do procedimento administrativo e antes da adoção de qualquer decisão suscetível de afetar desfavoravelmente os seus interesses (v., Acórdão de 27 de julho de 2022, RT France/Conselho, T‑125/22, EU:T:2022:483, n.o 75 e jurisprudência referida).

57      No âmbito de um procedimento de adoção da decisão, nomeadamente, de manutenção do nome de uma pessoa numa lista que figura no anexo de um ato que aplica medidas restritivas, o respeito pelos direitos de defesa e pelo direito à tutela jurisdicional efetiva exige que a autoridade competente da União comunique à pessoa interessada os elementos de que dispõe contra a referida pessoa para basear a sua decisão, para que esta pessoa possa defender os seus direitos nas melhores condições possíveis e decidir com pleno conhecimento de causa se é útil recorrer ao juiz da União. Nessa comunicação, a autoridade competente da União deve permitir que essa pessoa dê utilmente a conhecer o seu ponto de vista sobre os motivos contra ela invocados (v., neste sentido, Acórdãos de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.os 111 e 112, e de 12 de dezembro de 2006, Organisation des Modjahedines du peuple d’Iran/Conselho, T‑228/02, EU:T:2006:384, n.o 93).

58      A existência de uma violação dos direitos de defesa deve ser apreciada em função das circunstâncias específicas de cada caso concreto, nomeadamente da natureza do ato em causa, do contexto em que foi adotado e das normas jurídicas que regem a matéria em causa (v., neste sentido, Acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 102 e jurisprudência referida).

59      O direito de ser ouvido previamente à adoção de atos que mantêm o nome de uma pessoa ou de uma entidade numa lista de pessoas ou entidades abrangidas por medidas restritivas impõe‑se quando o Conselho lhe tenha imputado, na decisão que mantém a inclusão do seu nome nessa lista, novos elementos, ou seja, elementos que não figuravam na decisão inicial de inclusão do seu nome nessa mesma lista (v., Acórdão de 12 de fevereiro de 2020, Amisi Kumba/Conselho, T‑163/18, EU:T:2020:57, n.o 54 e jurisprudência referida; v., também, neste sentido, Acórdão de 7 de abril de 2016, Central Bank of Iran/Conselho, C‑266/15 P, EU:C:2016:208, n.o 33).

60      A título preliminar, há que recordar que nem a regulamentação em causa nem o princípio geral do respeito pelos direitos de defesa conferem aos interessados o direito a uma audição, sendo suficiente a possibilidade de apresentar observações escritas (v., neste sentido e por analogia, Acórdãos de 23 de outubro de 2008, People’s Mojahedin Organization of Iran/Conselho, T‑256/07, EU:T:2008:461, n.o 93, e de 6 de setembro de 2013, Bank Melli Iran/Conselho, T‑35/10 e T‑7/11, EU:T:2013:397, n.o 105).

61      Assim, quando sejam formuladas observações pela pessoa em causa sobre a exposição de motivos, a autoridade competente da União tem a obrigação de apreciar, com cuidado e imparcialidade, o mérito da fundamentação alegada, à luz dessas observações e dos eventuais elementos ilibatórios que as acompanham (Acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 114).

62      No caso em apreço, quanto aos atos de manutenção de setembro de 2022, o Conselho publicou um aviso, em 16 de março de 2022 (v., n.o 16, supra), à atenção das pessoas e entidades em causa, pelo qual estas foram informadas da possibilidade de apresentar um pedido de reapreciação antes de 1 de junho de 2022. Assim, o recorrente pôde apresentar o seu primeiro pedido de reapreciação em 25 de maio de 2022, pelo que teve a possibilidade de dar a conhecer o seu ponto de vista antes da adoção dos referidos atos de manutenção.

63      Quanto à avaliação da necessidade de manutenção das medidas contra o recorrente, na sua carta de 15 de setembro de 2022, o Conselho não só recordou os argumentos apresentados na contestação, uma vez que as observações constantes do pedido de reapreciação do recorrente eram idênticas aos fundamentos invocados na petição, mas também acrescentou alguns esclarecimentos relativos aos laços mantidos pelo recorrente com o presidente Putin, bem como à sua qualidade de acionista maioritário da Evraz, que justificavam a manutenção das medidas restritivas em causa no que lhe diz respeito. Além disso, o Conselho pôde salientar a inexistência de uma alteração de circunstâncias, o que é, nomeadamente, comprovado pela adoção dos atos de manutenção de setembro de 2022 com base nos mesmos elementos de prova dos atos iniciais. A este respeito, o envolvimento do recorrente em atividades de beneficência, em esforços humanitários e na mediação não pode ser considerada uma alteração das circunstâncias, tendo em conta o exposto.

64      Assim, o Conselho não violou o dever de reapreciar a situação do recorrente antes da adoção dos atos de manutenção de setembro de 2022.

65      Quanto aos atos de manutenção de março de 2023, importa salientar que o Conselho informou o recorrente, por carta de 22 de dezembro de 2022, de que pretendia manter o nome deste nas listas em causa, baseando‑se nos mesmos fundamentos, e convidou‑o a apresentar observações, o que este fez por carta de 19 de janeiro de 2023.

66      Assim, o recorrente pôde apresentar as suas observações quanto aos novos elementos de prova que o Conselho lhe transmitira por carta de 22 de dezembro de 2022, acompanhada do segundo dossiê WK.

67      Daqui decorre que o Conselho transmitiu ao recorrente os novos elementos antes da adoção dos atos de manutenção de março de 2023 e que este último pôde transmitir o seu ponto de vista sobre esses elementos antes da manutenção das medidas restritivas em causa no que lhe diz respeito.

68      Além disso, há que salientar que, embora o Conselho tenha indeferido o segundo pedido de reapreciação e tenha decidido manter as referidas medidas em causa contra o recorrente, tal não é passível de demonstrar que violou o seu dever de reapreciação. De facto, por um lado, não houve nenhuma alteração das circunstâncias em relação à adoção dos atos iniciais e, por outro, nada impedia o recorrente de apresentar novos elementos de prova no segundo pedido de reapreciação em apoio do argumento relativo às alterações de circunstâncias alegadamente ocorridas após a inclusão do seu nome nas listas em causa. Além disso, na carta de 14 de março de 2023, o Conselho precisou as razões que justificavam a manutenção do nome do recorrente nas referidas listas, ou seja, por um lado, a sua atividade como proeminente homem de negócios e, por outro, os laços mantidos com o presidente Putin.

69      Quanto à alegada falta de resposta substancial a determinados argumentos do recorrente, deve salientar‑se que, embora o respeito pelos direitos da defesa e pelo direito de ser ouvido exija que as instituições da União permitam que a pessoa atingida por um ato lesivo dê a conhecer utilmente o seu ponto de vista, não lhes pode impor que adiram a este (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de julho de 2017, Arbuzov/Conselho, T‑221/15, não publicado, EU:T:2017:478, n.o 84, e de 27 de setembro de 2018, Ezz e o./Conselho, T‑288/15, EU:T:2018:619, n.o 330).

70      Assim, o simples facto de o Conselho não ter concluído pela inexistência de mérito da prorrogação das medidas restritivas, nem mesmo ter considerado útil proceder a verificações à luz das observações apresentadas pelo recorrente, não implica que não tenha tomado conhecimento de tais observações (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 2018, Ezz e o./Conselho, T‑288/15, EU:T:2018:619, n.os 330 e 331).

71      Por último, quanto ao argumento do recorrente relativo ao caráter não contemporâneo dos novos elementos de prova, há que considerar que, na medida em que invoca um erro de apreciação, não pode ser utilmente apresentado em apoio da presente parte.

72      À luz das considerações que antecedem, importa concluir que o Conselho cumpriu o seu dever no que diz respeito ao direito de o recorrente ser ouvido durante o procedimento de adoção dos atos de manutenção de setembro de 2022 e de março de 2023. Por isso, há que julgar improcedente a presente parte e, consequentemente, o primeiro fundamento na sua totalidade.

 Quanto ao segundo fundamento, relativo a um «erro manifesto de apreciação»

73      O recorrente alega, em substância, que o Conselho não apresenta elementos concretos, precisos e concordantes que permitam constituir uma base factual suficientemente sólida para fundamentar a inclusão e a manutenção do seu nome nas listas em causa em aplicação dos critérios d) e g).

74      O Conselho, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos do recorrente.

–       Considerações preliminares

75      A título preliminar, cabe salientar que o segundo fundamento deve ser considerado relativo a um erro de apreciação e não a um erro manifesto de apreciação. Com efeito, se é certo que o Conselho dispõe de uma certa margem de apreciação para determinar, caso a caso, se os critérios jurídicos em que se fundamentam as medidas restritivas em causa estão cumpridos, não é menos certo que os órgãos jurisdicionais da União devem garantir uma fiscalização, em princípio completa, da legalidade de todos os atos da União (v., Acórdão de 26 de outubro de 2022, Ovsyannikov/Conselho, T‑714/20, não publicado, EU:T:2022:674, n.o 61 e jurisprudência referida).

76      A efetividade da fiscalização jurisdicional garantida pelo artigo 47.o da Carta exige, nomeadamente, que o juiz da União se assegure de que a decisão pela qual foram adotadas ou mantidas medidas restritivas, que reveste um alcance individual para a pessoa ou entidade em causa, assenta numa base factual suficientemente sólida. Tal implica uma verificação dos factos alegados na exposição de motivos em que essa decisão se baseia, de modo que a fiscalização jurisdicional não se limite à apreciação da probabilidade abstrata dos motivos invocados, tendo antes por objeto a questão de saber se estes motivos, ou pelo menos um deles, considerado, por si só, suficiente para basear esta mesma decisão, têm fundamento (v., neste sentido, Acórdãos de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 119, e de 5 de novembro de 2014, Mayaleh/Conselho, T‑307/12 e T‑408/13, EU:T:2014:926, n.o 128).

77      Tal apreciação deve ser feita analisando os elementos de prova e a informação, não de maneira isolada, mas no contexto em que se inserem. Com efeito, o Conselho respeita o ónus da prova que lhe incumbe se apresentar ao juiz da União um conjunto de indícios suficientemente concretos, precisos e concordantes que permitam estabelecer a existência de uma ligação suficiente entre a pessoa ou a entidade sujeita a uma medida de congelamento dos seus fundos e o regime ou, em geral, as situações combatidas (v., Acórdão de 20 de julho de 2017, Badica e Kardiam/Conselho, T‑619/15, EU:T:2017:532, n.o 99 e jurisprudência referida; Acórdão de 26 de outubro de 2022, Ovsyannikov/Conselho, T‑714/20, não publicado, EU:T:2022:674, n.os 63 e 66).

78      Cabe à autoridade competente da União, em caso de contestação, demonstrar que os motivos invocados contra a pessoa ou a entidade em causa têm fundamento, e não a esta última apresentar a prova negativa de que os referidos motivos não têm fundamento. Para esse efeito, não é exigível que o Conselho apresente ao juiz da União todas as informações e todos os elementos de prova inerentes aos motivos alegados no ato cuja anulação é pedida. As informações ou os elementos de prova apresentados devem alicerçar os motivos invocados contra a pessoa ou a entidade em causa (Acórdãos de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.os 121 e 122, e de 28 de novembro de 2013, Conselho/Fulmen e Mahmoudian, C‑280/12 P, EU:C:2013:775, n.o 67; v., também, Acórdão de 1 de junho de 2022, Prigozhin/Conselho, T‑723/20, não publicado, EU:T:2022:317, n.o 73 e jurisprudência referida).

79      Nesta hipótese, cabe ao juiz da União verificar a exatidão material dos factos alegados tendo em conta essas informações ou elementos e apreciar a força probatória destes últimos em função das circunstâncias do caso concreto e à luz das eventuais observações apresentadas, nomeadamente, pela pessoa ou entidade em causa a respeito dos mesmos (v., neste sentido, Acórdão de 18 de julho de 2013, Comissão e o./Kadi, C‑584/10 P, C‑593/10 P e C‑595/10 P, EU:C:2013:518, n.o 124).

80      No que diz respeito, mais concretamente, à fiscalização da legalidade exercida sobre os atos de manutenção do nome da pessoa interessada nas listas em causa, importa recordar que as medidas restritivas têm natureza cautelar e, por definição, provisória, cuja validade está sempre subordinada à perpetuação das circunstâncias de facto e de direito que presidiram à sua aprovação, bem como à necessidade da sua manutenção tendo em vista a realização do objetivo que lhes está associado. Deste modo, compete ao Conselho, na reapreciação periódica dessas medidas, proceder a uma apreciação atualizada da situação e elaborar um balanço do impacto dessas medidas, a fim de determinar se as mesmas permitiram alcançar os objetivos visados pela inclusão inicial dos nomes das pessoas e das entidades em causa na lista controvertida ou se continua a ser possível chegar à mesma conclusão no que respeita às referidas pessoas e entidades (v., Acórdão de 27 de abril de 2022, Ilunga Luyoyo/Conselho, T‑108/21, EU:T:2022:253, n.o 55 e jurisprudência referida; Acórdão de 26 de outubro de 2022, Ovsyannikov/Conselho, T‑714/20, não publicado, EU:T:2022:674, n.o 67).

81      Daqui decorre que, para justificar a manutenção do nome de uma pessoa numa lista de pessoas e entidades objeto de medidas restritivas, o Conselho não está impedido de se basear nos mesmos elementos de prova que justificaram a inclusão inicial, a reinclusão ou a manutenção anterior do nome do recorrente na referida lista, desde que, por um lado, os motivos da inclusão se mantenham inalterados e, por outro, o contexto não tenha evoluído de tal forma, que esses elementos de prova se tornaram desatualizados (v., neste sentido, Acórdão de 23 de setembro de 2020, Kaddour/Conselho, T‑510/18, EU:T:2020:436, n.o 99). A este respeito, a evolução do contexto inclui a tomada em consideração, por um lado, da situação no país em relação ao qual o sistema de medidas restritivas foi instituído, bem como da situação especial da pessoa em causa (Acórdão de 26 de outubro de 2022, Ovsyannikov/Conselho, T‑714/20, não publicado, EU:T:2022:674, n.o 78; v., também, neste sentido, Acórdão de 23 de setembro de 2020, Kaddour/Conselho, T‑510/18, EU:T:2020:436, n.o 101), e, por outro, de todas as circunstâncias pertinentes e, nomeadamente, a realização dos objetivos visados pelas medidas restritivas (Acórdão de 27 de abril de 2022, Ilunga Luyoyo/Conselho, T‑108/21, EU:T:2022:253, n.o 56; v., também, neste sentido e por analogia, Acórdão de 12 de fevereiro de 2020, Amisi Kumba/Conselho, T‑163/18, EU:T:2020:57, n.os 82 a 84 e jurisprudência referida).

82      É à luz destes princípios que importa verificar se o Conselho cometeu um erro de apreciação ao decidir incluir e, depois, manter o nome do recorrente nas listas em causa, começando pela análise da aplicação do critério g) ao recorrente.

–       Quanto à aplicação do critério g) ao recorrente

83      O recorrente contesta, em geral, que o facto de ser acionista maioritário da Evraz possa implicar quer uma contribuição significativa para as receitas fiscais da Federação da Rússia relacionadas com a anexação da Crimeia e a destabilização da Ucrânia, quer ligações estreitas ao Governo Russo.

84      Em primeiro lugar, o recorrente esclarece que a Evraz não constitui uma fonte importante de receitas para a Federação da Rússia dada a afetação dos impostos pagos por esta ao orçamento regional, que é independente do orçamento federal.

85      Em segundo lugar, o recorrente realça os efeitos negativos que as ações do Governo Russo na Ucrânia acarretaram para a Evraz.

86      Em terceiro lugar, o recorrente salienta que detém apenas 28,64 % do capital social da sociedade‑mãe da Evraz, o que não lhe confere a qualidade de acionista maioritário nem a possibilidade de determinar as operações desta.

87      Em quarto lugar, o recorrente sustenta que as atividades da Evraz não se restringem à Rússia, mas são também exercidas nos Estados Unidos e no Canadá, bem como na República Checa e no Cazaquistão.

88      Em quinto lugar, o recorrente assinala que as suas contribuições fiscais pessoais na Rússia não são significativas e que, consequentemente, não pode ser considerado um contribuinte importante para a Federação da Rússia. A este respeito, contesta a aplicação do critério do «setor de atividade», que é discriminatório para determinar a fonte substancial de receitas. Acrescenta que o facto de a Evraz ser o fornecedor de aço da companhia nacional dos caminhos de ferro não pode ser determinante para demonstrar que constitui uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo.

89      Em sexto e último lugar, o recorrente contesta a sua qualificação de «homem de negócios de primeiro plano» na Rússia e recorda que o seu património foi investido, em grande parte, fora do referido país, ou seja, nomeadamente, em Israel, no Reino Unido, nos Estados Unidos e no Canadá, e que, por outro lado, se distinguiu como um filantropo reconhecido cujas ações de beneficência se estendem por todos os países nos quais exerce atividade.

90      O Conselho, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos do recorrente.

91      No caso em apreço, o fundamento invocado contra o recorrente, relacionado com o critério g), é relativo ao facto de este, uma vez que é acionista maioritário ou um dos principais acionistas da Evraz, que é um dos de maiores contribuintes da Rússia, ser um proeminente homem de negócios com atividade em setores económicos que representam ou constituem uma fonte substancial de receitas para o Governo da Federação da Rússia.

92      O critério g) relaciona o conceito de «proeminentes homens de negócios» com o facto de estarem «envolvidos em setores económicos que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo [Russo]», sem qualquer outro requisito relativo a uma ligação, direta ou indireta, ao referido Governo. A finalidade prosseguida por esse critério é, de facto, exercer a máxima pressão sobre as autoridades russas para que estas ponham termo às suas ações e às suas políticas de destabilização da Ucrânia, bem como à agressão militar deste país.

93      A este respeito, existe uma ligação lógica entre o facto de ter como alvo os proeminentes homens de negócios envolvidos em setores económicos que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo, por um lado, e o objetivo das medidas restritivas em causa, que é, nomeadamente, aumentar a pressão sobre a Federação da Rússia e aumentar o custo das ações desta que visam comprometer a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia, por outro (v., neste sentido, Acórdão de 13 de setembro de 2018, Rosneft e o./Conselho, T‑715/14, não publicado, EU:T:2018:544, n.o 157 e jurisprudência referida).

94      Contudo, nada nos considerandos ou nas disposições da Decisão 2014/145 alterada e do Regulamento n.o 269/2014 alterado permite concluir que compete ao Conselho demonstrar a existência de ligações estreitas ou de uma relação de interdependência entre a pessoa cujo nome é incluído nas listas em causa e o Governo Russo ou as suas ações que comprometem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia.

95      Tal interpretação colide não só com a redação do critério g) mas também com o objetivo pretendido.

96      De facto, por um lado, atendendo à redação do critério g), há que ter em conta que as pessoas visadas devem ser consideradas proeminentes devido à sua importância no setor económico no qual exercem a sua atividade e à importância que esse setor reveste para a economia russa (v., neste sentido, Acórdão de 13 de setembro de 2018, Rosneft e o./Conselho, T‑715/14, não publicado, EU:T:2018:544, n.o 157 e jurisprudência referida). Assim, o conceito de «proeminentes homens de negócios» deve ser entendido no sentido de que diz respeito à importância destes em termos, consoante o caso, dos seus estatutos profissionais, do relevo das suas atividades económicas, da dimensão do capital que possuem ou da amplitude das suas funções numa ou em várias empresas nas quais exercem a sua atividade.

97      Por outro lado, o objetivo das medidas restritivas em causa não é aplicar sanções a determinadas pessoas ou determinadas entidades devido às suas ligações à situação na Ucrânia ou às suas ligações ao Governo Russo, mas, como é recordado no n.o 93, supra, exercer a máxima pressão sobre as autoridades russas para que estas ponham termo às suas ações e às suas políticas de destabilização da Ucrânia, bem como aumentar o custo das ações da Federação da Rússia que visam comprometer a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia e promover o fim da crise (v., neste sentido, Acórdão de 27 de julho de 2022, RT France/Conselho, T‑125/22, EU:T:2022:483, n.o 163 e jurisprudência referida).

98      Em última análise, o critério g) deve ser interpretado no sentido de que, por um lado, é aplicável a «proeminentes homens de negócios» na aceção descrita no n.o 96, supra, e, por outro, os setores económicos nos quais essas pessoas estão envolvidas devem representar uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo.

99      É, portanto, à luz desta interpretação do critério g) que importa apreciar o mérito dos motivos invocados nos atos impugnados.

100    No caso em apreço, atendendo a que esses motivos da inclusão e da manutenção do nome do recorrente nas listas em causa não se alteraram, não há que distinguir entre, por um lado, os atos iniciais e, por outro, os atos de manutenção, uma vez que a verificação das informações alegadas na exposição de motivos e nos elementos de prova, constantes dos primeiro e segundo dossiês WK, diz respeito, em substância, às mesmas circunstâncias factuais.

101    Os motivos invocados no que diz respeito ao recorrente, quanto ao critério g), são relativos ao facto de este ser, no momento da adoção tanto dos atos iniciais como dos atos de manutenção, acionista maioritário ou um dos principais acionistas da Evraz, que é um dos maiores contribuintes russos e opera, nomeadamente, num setor económico que representa ou constitui uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo.

102    Ora, decorre dos elementos de prova constantes dos autos que o recorrente detém diretamente 28,64 % do capital social da sociedade‑mãe da Evraz e que apenas três outros acionistas desta detêm uma participação superior a 5 %.

103    Embora o recorrente conteste a sua qualidade de acionista maioritário da Evraz, bem como o seu poder para determinar as operações do referido grupo ou para o controlar, é ponto assente não apenas que é um dos acionistas mais importantes da sociedade‑mãe da Evraz, mas também, segundo o prospeto desta sociedade inserido nos autos do processo pelo recorrente, que é seu o principal acionista.

104    De facto, na sociedade‑mãe da Evraz, o recorrente detém a percentagem mais elevada dos direitos de voto dos quatro acionistas principais, incluindo ele próprio, os quais detêm, no seu conjunto, 63,35 % desses direitos, sendo o resto do capital social flutuante, e têm capacidade para exercer controlo sobre a eleição dos administradores, a declaração dos dividendos, a nomeação da direção e outras decisões políticas da referida sociedade‑mãe. A este respeito, como sublinha o Conselho, importa salientar que o conselho de administração dessa sociedade‑mãe é composto por onze membros, seis dos quais administradores não executivos independentes, e que o recorrente tem o direito de nomear, individualmente, até três administradores. Em todo o caso, há que salientar que, ainda que a participação do recorrente na sociedade‑mãe em causa, enquanto mero investidor, constitua uma participação minoritária que não lhe permite exercer nenhuma forma de controlo sobre esta, ela não é menos significativa, tendo em conta, nomeadamente, que a Evraz é um dos principais grupos russos no domínio da siderurgia e das minas. Daqui decorre que, enquanto acionista principal da sociedade‑mãe em questão durante muitos anos, o recorrente pode ser qualificado de proeminente homem de negócios à luz do critério g).

105    No que diz respeito, mais concretamente, ao caráter «proeminente» do recorrente, há que esclarecer que, para entrar na categoria de «proeminentes homens de negócios», como foi referido nos n.os 96 e 97, supra, o critério g) não requer a existência de ligações estreitas ou de uma relação de interdependência com o Governo Russo ou com o presidente da Federação da Rússia. Também não depende de uma espécie de imputabilidade ao recorrente da decisão de prosseguir com a invasão da Ucrânia ou de uma ligação direta ou indireta à anexação da Crimeia ou à destabilização da Ucrânia, pelo que o argumento do recorrente relativo à inexistência de benefício das atividades do Governo Russo na Ucrânia deve ser julgado improcedente.

106    Daqui decorre que o Conselho teve razão ao considerar que o recorrente era um proeminente homem de negócios devido, nomeadamente, ao seu estatuto profissional, à relevância das suas atividades económicas, à dimensão do capital que possui na Evraz e, mais concretamente, à sua qualidade de acionista principal da sociedade‑mãe do referido grupo de sociedades (v., n.o 96, supra).

107    Além disso, o recorrente contesta, em substância, que exerça atividade em setores económicos que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo na aceção do critério g).

108    A este respeito, importa salientar, à semelhança do Conselho, que, contrariamente ao que afirma o recorrente, a expressão «que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo da Federação da Rússia», constante do critério g), se refere, à luz da redação deste, às receitas provenientes dos setores económicos importantes da Federação da Rússia e não apenas aos impostos pagos pelos proeminentes homens de negócios. De facto, embora a redação do considerando 11 da Decisão 2022/329 refira que os critérios de designação devem ser alterados de modo que incluam «pessoas e entidades que […] representam uma fonte substancial de receitas [para o Governo da Federação da Rússia]», o certo é que não pode justificar uma interpretação do referido critério num sentido contrário à sua redação, que é muito clara. Por outro lado, há que salientar que a interpretação defendida pelo recorrente iria contra a finalidade prosseguida pelas medidas restritivas em causa, que é diminuir a capacidade de a Federação da Rússia travar a sua guerra de agressão contra a Ucrânia.

109    Além disso, se é certo que nem a Decisão 2014/145 alterada nem o Regulamento n.o 269/2014 alterado definem o conceito de «fonte substancial de receitas», não é menos certo que a utilização do adjetivo qualificativo «substancial», que se refere ao termo «fonte», implica que essa fonte deve ser significativa e, portanto, não negligenciável.

110    Acresce que, embora a própria contribuição da Evraz para o orçamento da Federação da Rússia possa ser útil para determinar a importância económica desta, nomeadamente para demonstrar o caráter proeminente do homem de negócios que é o principal acionista da sua sociedade‑mãe, não é determinante para responder à questão de saber se o setor económico no qual o recorrente exerce atividade representa uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo.

111    No caso em apreço, quanto à questão de saber se o setor económico no qual o recorrente está envolvido através da Evraz representa uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo, não pode ser validamente sustentado que tal não é o caso do setor siderúrgico e das minas.

112    De facto, essa fonte substancial de receitas que o setor siderúrgico e das minas representa para o Governo Russo pode ser deduzida do contexto e do documento n.o 2 do primeiro dossiê WK, que refere que esse setor constituía, em 2016, o terceiro setor económico em termos de receitas fiscais na Rússia e que 10 dos 50 principais contribuintes russos, entre os quais a Evraz, eram do referido setor. Decorre também do referido documento que, apesar de a carga fiscal global sobre a economia russa ter diminuído em 2016, aumentou de 12,4 % para 12,9 % para esses contribuintes.

113    Além disso, decorre do documento n.o 10 do primeiro dossiê WK, bem como do histórico da Evraz, junto aos autos pelo recorrente, que a sociedade‑mãe desse grupo de sociedades constitui uma das maiores empresas siderúrgicas e mineiras verticalmente integradas do mundo, com várias filiais.

114    Tal é também corroborado pelo relatório anual da sociedade‑mãe da Evraz relativo a 2021, junto aos autos pelo recorrente, que refere as receitas por setor de atividade. Decorre, especialmente, desse relatório que as atividades siderúrgicas renderam 12,5 milhões de dólares americanos (USD), tendo também em conta as receitas desse setor na região da América do Norte (que correspondem a 2,3 milhões de USD). Mais concretamente, embora a referida sociedade‑mãe exerça as suas atividades em vários setores da economia russa, as receitas no que se refere apenas à siderurgia, que, na Rússia, aumentaram 48,3 % entre 2020 e 2021, representam 66,3 % das suas receitas totais. De acordo com o referido relatório, essa sociedade‑mãe é «líder nos mercados da construção e dos produtos ferroviários na Rússia». De facto, detém 28 % das quotas do mercado russo de rodas para caminho de ferro e 97 % do dos comboios.

115    Por outro lado, decorre do prospeto relativo à Evraz que, em 2018, esta era o quarto produtor de aço bruto da Rússia e o maior fabricante por volume de produtos longos para a construção e as indústrias ferroviárias desse país e da Comunidade dos Estados Independentes (CEI). O relatório anual da sociedade‑mãe da Evraz relativo a 2021 refere também que 94,8 % dos 71 210 trabalhadores da Evraz estão empregados na Rússia e na CEI.

116    Assim, todos estes elementos, no seu conjunto, permitem demonstrar que o setor económico em causa, ou seja, o setor siderúrgico e das minas, no qual opera, nomeadamente, a Evraz, representa uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo.

117    O facto, admitindo que é demonstrado, de as receitas fiscais provenientes do setor siderúrgico e das minas serem afetadas principalmente aos orçamentos das entidades federadas locais não é relevante. Com efeito, atendendo ao objetivo das medidas restritivas em causa, recordado no n.o 93, supra, o conceito de «receitas para o Governo da Federação da Rússia» não pode ser interpretado de forma restritiva, no sentido de que visa apenas as receitas fiscais afetadas ao orçamento federal desse Estado. Por outro lado, e em todo o caso, mesmo que essa fonte de receitas não se destine ao orçamento federal, nem seja diretamente utilizada pelo referido Governo para sustentar as suas despesas militares, o certo é que permite a esse Governo, na sua totalidade, sem distinguir se essas receitas provêm do orçamento federal ou dos orçamentos regionais, mobilizar mais recursos para as suas ações que visam comprometer a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia.

118    Além disso, os argumentos do recorrente baseados em elementos de contexto mais pessoais, designadamente as suas atividades humanitárias e o seu papel nas negociações de paz, devem ser julgados inoperantes. De facto, tais elementos não são pertinentes para apreciar se os requisitos previstos no critério g), como especificado nos n.os 92 a 97, supra, estão preenchidos no caso em apreço.

119    Por último, a acusação apresentada pelo recorrente no quadro do segundo articulado de adaptação, no sentido de que, ao apoiar‑se nos elementos de prova constantes do segundo dossiê WK, o Conselho, na adoção dos atos de manutenção, cometeu erros no que se refere à apreciação dos contratos entre filiais da Evraz e a Guarda Nacional da Federação Russa e à existência de um projeto de lei sobre a economia de guerra que obriga as empresas como a Evraz a fornecer materiais e serviços ao exercito, não pode ser acolhida. De facto, há que observar que foi apenas a título exaustivo que o Conselho referiu esses elementos e que, na medida em que não os utilizou para fundamentar os atos de manutenção, visto que não estão diretamente relacionados com o critério g), a referida acusação deve ser julgada inoperante.

120    Assim, há que concluir que o Conselho apresentou um conjunto de indícios suficientemente concretos, precisos e concordantes que permite demonstrar que o setor económico no qual o recorrente exerce atividade representa uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo.

121    Face ao exposto, importa considerar que o motivo da inclusão do nome do recorrente nas listas em causa baseado no estatuto de proeminente homem de negócios com atividade em setores económicos que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo, que corresponde ao critério g), está suficientemente fundamentado, pelo que, à luz deste critério, o Conselho não cometeu nenhum erro de apreciação ao decidir incluir e, depois, manter, o nome do recorrente nas listas em causa.

122    Ora, de acordo com a jurisprudência, no âmbito da fiscalização da legalidade de uma decisão que adotou medidas restritivas, e tendo em conta a sua natureza preventiva, se o juiz da União considerar que, no mínimo, um dos motivos mencionados é suficientemente preciso e concreto, está demonstrado e constitui, por si só, uma base suficiente para fundamentar esta decisão, o facto de outros desses motivos não o estarem não justifica a anulação da referida decisão (v., Acórdão de 28 de novembro de 2013, Conselho/Manufacturing Support & Procurement Kala Naft, C‑348/12 P, EU:C:2013:776, n.o 72 e jurisprudência referida).

123    Por conseguinte, sem que seja necessário analisar o mérito das outras acusações apresentadas pelo recorrente com vista a pôr em causa a apreciação do Conselho à luz do critério d), há que julgar improcedente o segundo fundamento.

 Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação dos princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade

124    O terceiro fundamento divide‑se em duas partes, relativas, por um lado, à violação dos princípios da não discriminação e da igualdade de tratamento e, por outro, à violação do princípio da proporcionalidade.

–       Quanto à primeira parte, relativa à violação dos princípios da não discriminação e da igualdade de tratamento

125    O recorrente alega, em substância, que as medidas restritivas em causa são discriminatórias. Na sua opinião, primeiro, a interpretação do critério g) efetuada pelo Conselho é demasiado abrangente, pois permite aplicar sanções a todos os homens de negócios, independentemente da sua origem, que exerçam ou tenham exercido uma atividade económica significativa na Rússia e cumpram as suas obrigações fiscais, apenas com base nisso. Segundo, a aplicação desse critério pelo Conselho é discriminatória, na medida em que o referido critério é aplicável aos homens de negócios e às empresas de nacionalidade russa, ignorando as empresas estrangeiras, não obstante estas operarem também no território russo e efetuarem pagamentos a título de impostos e de taxas para o orçamento da Federação da Rússia. Terceiro, o recorrente considera que é objeto de sanções devido a elementos sobre os quais não tem nenhum controlo, sejam os montantes dos impostos a pagar, a afetação das receitas fiscais entre as regiões e o Governo federal ou a utilização do orçamento atribuído a este. Uma vez que não tem nenhum instrumento para influenciar a política fiscal russa e a afetação do produto das atividades da Evraz, nenhuma medida restritiva que lhe diga respeito pode alterar as obrigações desta enquanto contribuinte russo.

126    O Conselho, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos do recorrente.

127    Importa recordar que, de acordo com a jurisprudência, o princípio da igualdade de tratamento, que constitui um princípio fundamental de direito, proíbe que situações comparáveis sejam tratadas de maneira diferente ou que situações diferentes sejam tratadas de maneira igual, salvo se esse tratamento for objetivamente justificado (v., Acórdãos de 31 de maio de 2018, Kaddour/Conselho, T‑461/16, EU:T:2018:316, n.o 152 e jurisprudência referida, e de 13 de setembro de 2018, Vnesheconombank/Conselho, T‑737/14, não publicado, EU:T:2018:543, n.o 161 e jurisprudência referida).

128    No caso em apreço, em primeiro lugar, quanto ao argumento do recorrente relativo ao facto de a interpretação do critério g) efetuada pelo Conselho ser demasiado abrangente, pois permite, em substância, aplicar sanções a todos os homens de negócios, independentemente da sua origem, que exerçam ou tenham exercido uma atividade económica significativa na Rússia e cumpram as suas obrigações fiscais, apenas com base nisso, importa salientar que o recorrente não especifica de que modo ou em relação a que pessoas essa interpretação alegadamente demasiado abrangente do referido critério é discriminatória. Contrariamente ao que sustenta o recorrente, nem todos os homens de negócios que exerçam uma atividade económica significativa na Rússia e paguem ou tenham pago impostos nesse país com base nisso são abrangidos, pois esse critério só é aplicável aos que exerçam atividade num setor económico que represente uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo. Em todo o caso, os motivos nos quais o Conselho se baseou na adoção dos atos impugnados assentam na conclusão de que o recorrente é o acionista maioritário da Evraz, um dos maiores contribuintes da Federação da Rússia. Assim, ao contrário do que afirma, o recorrente foi objeto das medidas restritivas em causa na sequência de uma avaliação individual baseada em elementos de prova concretos contra ele.

129    Por outro lado, no âmbito do critério g), é o setor económico, e não os homens de negócios enquanto tais nem as sociedades das quais são acionistas, que é identificado como representando uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo (v., n.o 98, supra). Assim, o pagamento de impostos pelo recorrente ou pela sociedade‑mãe da Evraz ou respetivas filiais não é, em si mesmo, abrangido. O referido critério refere‑se ao conjunto das receitas geradas pelo setor económico no qual o homem de negócios visado está envolvido e inclui, portanto, nomeadamente, mas não apenas, as receitas fiscais geradas por esse setor.

130    Em segundo lugar, quanto ao argumento do recorrente de que a aplicação do critério g) pelo Conselho é discriminatória na medida em que o referido critério é aplicável aos homens de negócios e às empresas de nacionalidade russa, ignorando as empresas estrangeiras, basta observar, à semelhança do Conselho, que esse critério não se refere à nacionalidade das pessoas nomeadas, mas a todas as pessoas singulares que tenham a qualidade de proeminente homem de negócios na aceção do referido critério. Consequentemente, as pessoas visadas pelas medidas restritivas em causa podem ser de qualquer nacionalidade se cumprirem o critério em questão.

131    Nestas circunstâncias, mesmo admitindo que o Conselho não tenha adotado medidas de congelamento de fundos no que diz respeito a determinadas pessoas que cumprem o critério g) e analisado, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos pertinentes relativos a essas pessoas, esse facto não pode ser validamente invocado pelo recorrente, uma vez que os princípios da igualdade de tratamento e da não discriminação devem ser conciliados com o princípio da legalidade (v., neste sentido, Acórdão de 3 de maio de 2016, Post Bank Iran/Conselho, T‑68/14, não publicado, EU:T:2016:263, n.o 135 e jurisprudência referida). Em todo o caso, há que salientar que decorre da análise do segundo fundamento que o Conselho não cometeu nenhum erro de apreciação ao decidir, no âmbito do poder de apreciação de que dispõe para determinar se os critérios de designação estão satisfeitos, incluir e manter o nome do recorrente nas listas em causa.

132    Em terceiro lugar, importa salientar que o recorrente não explica as razões pelas quais a sua alegada falta de influência sobre a afetação das receitas fiscais russas e sobre a atribuição do produto das atividades da Evraz é suscetível de constituir uma violação do princípio da igualdade de tratamento, pelo que este argumento deve ser julgado improcedente por falta de fundamento.

133    Por isso, há que julgar improcedente a presente parte.

–       Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio da proporcionalidade

134    O recorrente afirma que as medidas restritivas em causa adotadas no que lhe diz respeito são inadequadas e desproporcionadas, na medida em que não exercem nenhuma pressão sobre as autoridades russas nem podem ter um efeito útil, uma vez que o recorrente não participa em nenhuma ação relacionada com a anexação da Crimeia ou com a destabilização da Ucrânia.

135    Neste contexto, o recorrente considera, por um lado, que as medidas em causa adotadas no que lhe diz respeito não são necessárias para alcançar os objetivos prosseguidos, dado que o recorrente não esteve envolvido nem foi consultado em nenhuma decisão relativa à anexação da Crimeia ou à destabilização da Ucrânia. Sustenta ainda que as referidas medidas ficam aquém do seu alegado objetivo de afetar a política da Federação da Rússia na Ucrânia, tendo em conta a contribuição não substancial para o orçamento federal, e podem ter consequências negativas para as suas atividades fora da Rússia. Além disso, afirma que essas medidas foram adotadas devido ao seu estatuto de acionista da sociedade‑mãe da Evraz, a qual não é objeto de nenhuma medida semelhante. Por último, alega que as medidas em questão são desproporcionadas, uma vez que o impedem de intervir eficazmente enquanto vetor de comunicação no âmbito das negociações de paz.

136    O Conselho, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos do recorrente.

137    O princípio da proporcionalidade, que faz parte dos princípios gerais do direito da União e que é retomado no artigo 5.o, n.o 4, TUE, exige que os meios postos em prática por uma disposição do direito da União permitam alcançar os objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa e não vão além do que é necessário para alcançar os referidos objetivos (Acórdãos de 15 de novembro de 2012, Al‑Aqsa/Conselho e Países Baixos/Al‑Aqsa, C‑539/10 P e C‑550/10 P, EU:C:2012:711, n.o 122, e de 1 de junho de 2022, Prigozhin/Conselho, T‑723/20, não publicado, EU:T:2022:317, n.o 133).

138    Assim, quando haja que escolher entre várias medidas adequadas, deve recorrer‑se à menos restritiva e os inconvenientes causados não devem ser desproporcionados em relação aos objetivos pretendidos (v., neste sentido, Acórdão de 30 de novembro de 2016, Rotenberg/Conselho, T‑720/14, EU:T:2016:689, n.o 178 e jurisprudência referida).

139    Quanto à fiscalização jurisdicional do respeito pelo princípio da proporcionalidade, importa reconhecer ao legislador da União um amplo poder de apreciação em domínios que impliquem da sua parte escolhas de natureza política, económica e social, nas quais é chamado a efetuar apreciações complexas. Daqui decorre que só o caráter manifestamente inadequado de uma medida adotada nesses domínios, à luz do objetivo que a instituição competente pretende prosseguir, pode afetar a legalidade de tal medida (v., neste sentido, Acórdão de 30 de novembro de 2016, Rotenberg/Conselho, T‑720/14, EU:T:2016:689, n.o 179 e jurisprudência referida).

140    No caso em apreço, há que salientar que, atendendo à importância primordial dos objetivos prosseguidos pelas medidas restritivas em causa, ou seja, a proteção da integridade territorial, da soberania e da independência da Ucrânia e a promoção de uma resolução pacífica da crise neste país, que se inserem no objetivo mais amplo de manutenção da paz, de prevenção dos conflitos e de reforço da segurança internacional, em conformidade com os objetivos da ação externa da União enunciados no artigo 21.o, n.o 2, alínea c), TUE, as consequências negativas que resultam da sua aplicação ao recorrente não são manifestamente desproporcionadas (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 28 de março de 2017, Rosneft, C‑72/15, EU:C:2017:236, n.o 150).

141    Importa também salientar que, nos considerandos 2 a 10 da Decisão 2022/329, o Conselho referiu a degradação contínua da situação na Ucrânia, que conduziu, em 24 de fevereiro de 2022, à agressão da Ucrânia pela Federação da Rússia em flagrante violação da integridade territorial, da soberania e da independência desse Estado. Assim, foi devido ao agravamento da situação na Ucrânia, caracterizada pelo desencadeamento da guerra de agressão levada a cabo pela Federação da Rússia, que o Conselho considerou que devia alargar o círculo das pessoas e entidades visadas pelas medidas restritivas em causa, a fim de alcançar os objetivos prosseguidos. Ora, resulta de tal abordagem baseada na progressividade da violação dos direitos em função da efetividade das medidas que a sua proporcionalidade está também demonstrada (v., por analogia, Acórdãos de 28 de novembro de 2013, Conselho/Manufacturing Support & Procurement Kala Naft, C‑348/12 P, EU:C:2013:776, n.o 126, e de 25 de janeiro de 2017, Almaz‑Antey Air and Space Defence/Conselho, T‑255/15, não publicado, EU:T:2017:25, n.o 104).

142    Tendo em conta a evolução da situação na Ucrânia, o Conselho, ao abranger também os homens de negócios que exercem atividades em setores económicos que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo, podia legitimamente esperar que tais ações cessassem ou se tornassem mais dispendiosas para os que as levam a cabo, a fim de promover a cessação da flagrante violação da integridade territorial, da soberania e da independência da Ucrânia (v., por analogia, Acórdão de 13 de setembro de 2018, Rosneft e o./Conselho, T‑715/14, não publicado, EU:T:2018:544, n.o 157).

143    No caso em apreço, no âmbito do segundo fundamento, ficou demonstrado que as medidas restritivas no que diz respeito ao recorrente se justificavam, porque a sua situação permitia que se considerasse que preenchia os requisitos para a aplicação do critério g). De facto, a designação do recorrente, na sua qualidade de acionista principal da sociedade‑mãe da Evraz, toma em consideração o setor de atividade no qual essa sociedade opera, independentemente da questão de saber se esta é também objeto de sanções individuais enquanto pessoa coletiva e qual a contribuição fiscal de que o Governo Russo beneficia.

144    De resto, o facto de o recorrente não estar envolvido em nenhuma decisão relativa à anexação da Crimeia ou à destabilização da Ucrânia não é relevante, pois não lhe foram impostas medidas restritivas por essa razão, mas pelo facto, nomeadamente, de ser um proeminente homem de negócios com atividade em setores económicos que representam uma fonte substancial de receitas para o Governo Russo, responsável pela anexação da Crimeia e pela destabilização da Ucrânia. A este respeito, há que recordar que a importância dos objetivos prosseguidos por um ato da União que institui um regime de medidas restritivas é suscetível de justificar consequências negativas, mesmo consideráveis, para certos operadores, incluindo os que não têm responsabilidades na situação que levou à adoção das medidas em causa (v., por analogia, Acórdãos de 3 de setembro de 2008, Kadi e Al Barakaat International Foundation/Conselho e Comissão, C‑402/05 P e C‑415/05 P, EU:C:2008:461, n.o 361, e de 28 de março de 2017, Rosneft, C‑72/15, EU:C:2017:236, n.o 150).

145    Quanto ao caráter adequado das medidas restritivas adotadas no que diz respeito ao recorrente, importa salientar que, à luz de objetivos de interesse geral tão fundamentais para a comunidade internacional como os mencionados no n.o 140, supra, as referidas medidas não podem, enquanto tais, ser consideradas inadequadas (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 2 de dezembro de 2020, Kalai/Conselho, T‑178/19, não publicado, EU:T:2020:580, n.o 171 e jurisprudência referida).

146    No que diz respeito ao caráter necessário das medidas restritivas em causa, importa observar que outras menos restritivas não permitem alcançar com a mesma eficácia os objetivos prosseguidos, ou seja, exercer pressão sobre os decisores russos responsáveis pela situação na Ucrânia, nomeadamente face à possibilidade de contornar as restrições impostas (v., neste sentido, Acórdão de 30 de novembro de 2016, Rotenberg/Conselho, T‑720/14, EU:T:2016:689, n.o 182 e jurisprudência referida). De resto, o recorrente não conseguiu demonstrar que o Conselho podia prever a adoção de medidas menos restritivas, mas tão adequadas como as previstas.

147    Quanto ao argumento do recorrente relativo às repercussões na sua participação nas negociações de paz, deve recordar‑se que o artigo 2.o, n.os 3 e 4, da Decisão 2014/145 alterada, bem como o artigo 4.o, n.o 1, o artigo 5.o, n.o 1, e o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 269/2014 alterado, preveem a possibilidade, por um lado, de ser autorizada a utilização de fundos congelados para fazer face a necessidades essenciais ou cumprir certos compromissos e, por outro, de serem concedidas autorizações específicas que permitam o descongelamento de fundos, de outros ativos financeiros ou de outros recursos económicos. Em conformidade com o artigo 1, n.o 6, da referida decisão, a autoridade competente de um Estado‑Membro pode também autorizar a entrada das pessoas visadas no seu território, nomeadamente por razões humanitárias urgentes ou para efeitos de participação em reuniões intergovernamentais e em reuniões promovidas pela União ou de que a União seja anfitriã, ou em reuniões cujo país anfitrião seja um Estado‑Membro na qualidade de presidente em exercício da Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa (OSCE), nas quais se desenvolva um diálogo político que promova diretamente os objetivos estratégicos das medidas restritivas, incluindo o apoio à integridade territorial, à soberania e à independência da Ucrânia.

148    De resto, como sublinha corretamente o Conselho, a participação nas negociações de paz e, de forma mais geral, o fornecimento de ajuda humanitária não podem afetar a apreciação do Conselho quanto à necessidade de adotar medidas restritivas no que diz respeito ao recorrente ou a outros proeminentes homens de negócios russos para aumentar a pressão sobre o presidente Putin e o seu governo.

149    Atendendo ao exposto, importa concluir que as medidas restritivas em causa não são discriminatórias nem desproporcionadas.

150    Por conseguinte, há que julgar improcedente a presente parte, bem como o terceiro fundamento na íntegra.

 Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação de direitos fundamentais

151    De acordo com o recorrente, a inclusão e a manutenção do seu nome nas listas em causa constituem uma limitação injustificada e desproporcionada dos seus direitos fundamentais, entre os quais figuram, nomeadamente, o direito de propriedade, o direito ao respeito pela vida privada e a liberdade de empresa, bem como o direito de circular livremente no território dos Estados‑Membros. Considera que a adoção das medidas restritivas em causa implicou também a violação do seu direito à presunção de inocência e causou‑lhe um dano moral pela ofensa à sua reputação.

152    O Conselho, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos do recorrente.

153    Antes de mais, importa salientar que o direito ao respeito pela vida privada, o direito à liberdade de empresa, o direito de propriedade e o direito de circulação e de permanência fazem parte dos princípios gerais de direito da União e estão consagrados, respetivamente, nos artigos 7.o, 16.o, 17.o e 45.o da Carta.

154    É certo que as medidas restritivas constantes dos atos impugnados, apesar da sua natureza cautelar, implicam restrições ao exercício, pelo recorrente, dos direitos fundamentais referidos no n.o 153, supra.

155    Contudo, os direitos fundamentais invocados pelo recorrente não constituem prerrogativas absolutas e o seu exercício pode ser objeto de restrições nas condições enunciadas no artigo 52.o, n.o 1, da Carta, nos termos do qual, por um lado, «[q]ualquer restrição ao exercício dos direitos e liberdades reconhecidos pela […] Carta deve ser prevista por lei e respeitar o conteúdo essencial desses direitos e liberdades» e, por outro, «[n]a observância do princípio da proporcionalidade, essas restrições só podem ser introduzidas se forem necessárias e corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União, ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros».

156    Assim, para estar em conformidade com o direito da União, uma restrição ao exercício dos direitos e liberdades fundamentais deve satisfazer quatro condições. Primeiro, deve ser «prevista por lei», no sentido de que a instituição da União que adota as medidas suscetíveis de restringir os direitos fundamentais de uma pessoa, singular ou coletiva, deve dispor de uma base legal para esse efeito. Segundo, deve respeitar o conteúdo essencial desses direitos. Terceiro, deve corresponder a um objetivo de interesse geral, reconhecido como tal pela União. Quarto, deve ser proporcionada (v., Acórdão de 27 de julho de 2022, RT France/Conselho, T‑125/22, EU:T:2022:483, n.os 145 e 222 e jurisprudência referida).

157    Ora, há que observar que essas quatro condições estão satisfeitas no caso em apreço.

158    Em primeiro lugar, as restrições em causa são «previstas por lei», pois são enunciadas em atos que têm, nomeadamente, um alcance geral e que dispõem de uma base jurídica clara no direito da União, bem como de uma previsibilidade suficiente, o que, de resto, não é contestado pelo recorrente.

159    Em segundo lugar, quanto à questão de saber se as restrições em causa respeitam o «conteúdo essencial» dos direitos fundamentais invocados pelo recorrente, há que salientar que as medidas restritivas em causa são limitadas no tempo e reversíveis. Com efeito, por um lado, aplicam‑se durante seis meses e ficam sujeitas a reapreciação permanente, como previsto no artigo 6.o, terceiro parágrafo, da Decisão 2014/145 alterada, e, por outro, é possível conceder isenções às medidas restritivas aplicadas, no que diz respeito tanto ao congelamento de fundos como às restrições em matéria de admissão no território dos Estados‑Membros (v., n.o 147, supra).

160    Em terceiro lugar, as restrições em causa correspondem a um objetivo de interesse geral, reconhecido como tal pela União. De facto, visam, nomeadamente, fazer pressão, direta e indiretamente, sobre os decisores e o Governo Russo responsáveis pela invasão da Ucrânia, a fim de diminuir a capacidade destes para prosseguir as suas ações que comprometem a integridade territorial, a soberania e a independência da Ucrânia e de lhes pôr termo tendo em vista preservar a estabilidade europeia e mundial. Ora, esse é um dos objetivos prosseguidos no quadro da PESC e referidos no artigo 21.o, n.o 2, alíneas b) e c), TUE, tais como, nomeadamente, preservar a paz, prevenir conflitos, reforçar a segurança internacional e a proteção das populações civis (v., neste sentido, Acórdão de 27 de julho de 2022, RT France/Conselho, T‑125/22, EU:T:2022:483, n.o 226).

161    Em quarto lugar, quanto ao caráter proporcionado das restrições em causa, importa salientar que, à luz de objetivos de interesse geral tão fundamentais para a comunidade internacional como os mencionados no n.o 140, supra, as medidas de congelamento de fundos não podem, enquanto tais, ser consideradas inadequadas. No que diz respeito ao caráter necessário das medidas restritivas em causa, cabe observar que outras menos restritivas não permitem alcançar com a mesma eficácia os objetivos prosseguidos, ou seja, exercer pressão sobre os decisores russos responsáveis pela situação na Ucrânia, nomeadamente face à possibilidade de contornar as restrições impostas (v., neste sentido, Acórdão de 30 de novembro de 2016, Rotenberg/Conselho, T‑720/14, EU:T:2016:689, n.o 182 e jurisprudência referida).

162    Em seguida, deve recordar‑se que o artigo 2.o, n.os 3 e 4, da Decisão 2014/145 alterada, bem como o artigo 4.o, n.o 1, o artigo 5.o, n.o 1, e o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 269/2014 alterado preveem a possibilidade, por um lado, de ser autorizada a utilização de fundos congelados para fazer face a necessidades essenciais ou cumprir certos compromissos e, por outro, de serem concedidas autorizações específicas que permitam o descongelamento de fundos, de outros ativos financeiros ou de outros recursos económicos.

163    No que se refere, mais concretamente, à alegada violação, pelo artigo 1.o da Decisão 2014/145 alterada, do direito de o recorrente, enquanto cidadão português e, portanto, da União, circular livremente no território desta, consagrado no artigo 21.o TFUE e no artigo 45.o, n.o 1, da Carta, importa salientar que o recorrente não contesta que a adoção de atos no domínio da PESC, prevista nos Tratados, pode restringir o direito à livre circulação dos cidadãos da União. De facto, o recorrente limita‑se a sustentar que a restrição à sua liberdade de circulação é desproporcionada.

164    Contudo, há que observar que o recorrente não explica de que forma tal restrição é desproporcionada à luz do objetivo prosseguido. Com efeito, nos seus articulados, limita‑se a efetuar uma remissão geral para a sua argumentação no fundamento relativo à violação do princípio da proporcionalidade, sem explicar as razões pelas quais os argumentos aduzidos no âmbito do referido fundamento são pertinentes para sustentar uma violação desproporcionada da sua liberdade de circular na União. Por conseguinte, a argumentação do recorrente relativa à violação desproporcionada da livre circulação dos cidadãos da União deve ser julgada improcedente por falta de fundamento.

165    Quanto à alegação pela qual o recorrente questiona a possibilidade de o Conselho adotar uma restrição à livre circulação com fundamento no artigo 215.o TFUE, admitindo que tal alegação constitui uma argumentação autónoma, há que concluir que esta também não está fundamentada, pelo que deve ser afastada. Em todo o caso, importa salientar que as restrições à liberdade de circulação apenas estão previstas no artigo 1.o da Decisão 2014/145 alterada e não constam do Regulamento n.o 269/2014 alterado. Ora, como decorre do preâmbulo da referida decisão, esta não foi adotada com fundamento no artigo 215.o TFUE, mas com fundamento no artigo 29.o TUE.

166    Por outro lado, importa também salientar que o recorrente não explica, de maneira nenhuma, de que forma as medidas restritivas adotadas no que lhe diz respeito violam o direito ao respeito pela sua vida privada.

167    Por último, quanto à alegada violação do direito do recorrente à presunção de inocência, que este refere nos seus articulados, sem, contudo, a fundamentar com argumentos específicos, importa salientar que, uma vez que as medidas restritivas adotadas no que diz respeito ao recorrente não têm como efeito confiscar os seus bens, mas pura e simplesmente congelá‑los a titulo cautelar, há que considerar que tais medidas não são de caráter penal, pelo que não têm como consequência a violação do direito à presunção de inocência, reconhecido no artigo 48.o, n.o 1, da Carta, que exige que todo o arguido se presuma inocente enquanto não tiver sido legalmente provada a sua culpa. Quanto ao alegado dano moral devido à ofensa à sua reputação, também referido no âmbito desta acusação, não pode ser utilmente invocado para demonstrar a existência de uma violação do direito do recorrente à presunção de inocência.

168    Importa concluir que as restrições em causa, que decorrem das medidas restritivas adotadas no que diz respeito ao recorrente nos atos impugnados, não são desproporcionadas nem podem ferir os referidos atos de ilegalidade.

169    Face ao exposto, há que julgar improcedente o quarto fundamento e, por conseguinte, o pedido de anulação na íntegra.

 Quanto ao pedido de indemnização

170    O recorrente solicita uma indemnização pelo dano causado à sua reputação, que é estimada em um milhão de euros a título provisório.

171    O Conselho, apoiado pela Comissão, contesta os argumentos do recorrente.

172    Decorre da jurisprudência que a responsabilidade extracontratual da União, na aceção do artigo 340.o, segundo parágrafo, TFUE, por comportamento ilícito das suas instituições ou dos seus órgãos, está sujeita à verificação de um conjunto de requisitos, nomeadamente a existência de uma violação suficientemente caracterizada de uma norma jurídica que tenha por objeto conferir direitos aos particulares, a realidade do dano e a existência de um nexo de causalidade entre o incumprimento da obrigação que incumbe ao autor do ato e o prejuízo sofrido pela pessoa lesada (v., Acórdão de 10 de setembro de 2019, HTTS/Conselho, C‑123/18 P, EU:C:2019:694, n.o 32 e jurisprudência referida).

173    Os requisitos da responsabilidade extracontratual da União, que o juiz da União não está obrigado a analisar numa ordem determinada, são cumulativos, pelo que basta que um deles não se verifique para que seja negado provimento ao recurso na sua totalidade (Acórdão de 1 de fevereiro de 2023, Klymenko/Conselho, T‑470/21, não publicado, EU:T:2023:26, n.o 62; v., também, neste sentido, Acórdão de 13 de dezembro de 2018, União Europeia/Kendrion, C‑150/17 P, EU:C:2018:1014, n.o 118 e jurisprudência referida).

174    Ora, decorre do exposto que os argumentos que o recorrente apresentou para demonstrar a ilegalidade dos atos impugnados pelos quais o seu nome foi incluído nas listas em causa devem ser julgados improcedentes, pelo que o requisito relativo à ilegalidade do comportamento imputado ao Conselho não está preenchido no caso em apreço. Assim, não se verificando um dos requisitos recordados no n.o 172, supra, não existe responsabilidade da União.

175    Por conseguinte, o pedido de indemnização deve ser julgado improcedente, sem que seja necessário analisar a realidade do dano e a existência de um nexo de causalidade entre este e o incumprimento da obrigação em causa. Portanto, há que negar provimento ao recurso na sua totalidade.

 Quanto às despesas

176    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o recorrente sido vencido, há que condená‑lo nas despesas, em conformidade com os pedidos do Conselho.

177    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. Consequentemente, a Comissão suportará as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção Alargada)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      Roman Arkadyevich Abramovich suportará as suas próprias despesas e as despesas efetuadas pelo Conselho da União Europeia.

3)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas.

Spielmann

Mastroianni

Brkan

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 20 de dezembro de 2023.

Assinaturas


Índice


Antecedentes do litígio

Factos posteriores à apresentação do presente recurso

Pedidos das partes

Questão de direito

Quanto ao pedido de anulação

Quanto ao primeiro fundamento

– Quanto à primeira parte, relativa à «violação do direito à tutela jurisdicional efetiva e do dever de fundamentação»

– Quanto à segunda parte, relativa à «violação dos direitos de defesa» e ao «desrespeito, pelo Conselho, do seu dever de reapreciação no âmbito da adoção dos atos de manutenção de setembro de 2022 e de março de 2023»

Quanto ao segundo fundamento, relativo a um «erro manifesto de apreciação»

– Considerações preliminares

– Quanto à aplicação do critério g) ao recorrente

Quanto ao terceiro fundamento, relativo à violação dos princípios da igualdade de tratamento e da proporcionalidade

– Quanto à primeira parte, relativa à violação dos princípios da não discriminação e da igualdade de tratamento

– Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio da proporcionalidade

Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação de direitos fundamentais

Quanto ao pedido de indemnização

Quanto às despesas



*      Língua do processo: francês.