Language of document : ECLI:EU:T:2020:450

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

23 de setembro de 2020 (*) (i)

«Marca da União Europeia — Marca figurativa da União Europeia 7Seven — Falta de pedido de renovação do registo da marca — Cancelamento da marca por caducidade do registo — Artigo 53.o do Regulamento (UE) 2017/1001 — Pedido de restitutio in integrum apresentado pelo licenciado — Artigo 104.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001 — Dever de vigilância»

No processo T‑557/19,

Seven SpA, com sede em Leinì (Itália), representada por L. Trevisan, advogado,

recorrente,

contra

Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), representado por H. O’Neill, na qualidade de agente,

recorrido,

que tem por objeto um recurso da Decisão da Quinta Câmara de Recurso do EUIPO de 4 de junho de 2019 (processo R 2076/2018‑5), relativa a um pedido de restitutio in integrum no direito de pedir a renovação da marca figurativa da União Europeia 7SEVEN,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto por: D. Spielmann, presidente, U. Öberg (relator) e O. Spineanu‑Matei, juízes,

secretário: E. Coulon,

vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 9 de agosto de 2019,

vista a resposta apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 27 de novembro de 2019,

visto não terem as partes requerido a marcação de uma audiência de alegações no prazo de três semanas a contar da notificação do encerramento da fase escrita do processo e tendo sido decidido, nos termos do artigo 106.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, julgar o recurso prescindindo da fase oral do processo,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 22 de julho de 1997, a recorrente, Seven SpA, apresentou um pedido de registo de marca da União Europeia no Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), [substituído pelo Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca da União Europeia (JO 2009, L 78, p. 1), conforme alterado, substituído pelo Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, sobre a marca da União Europeia (JO 2017, L 154, p. 1)].

2        A marca cujo registo foi pedido é o seguinte sinal figurativo:

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3        Os produtos para os quais o registo foi pedido pertencem às classes 16, 18 e 25 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado.

4        Em 2 de maio de 2001, a marca foi registada como marca da União Europeia, sob o número 591206, tendo este registo sido publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.o 53/2001, de 18 de junho de 2001.

5        Em 29 de setembro de 2005, a recorrente cedeu a marca em questão à Seven Licensing Company S.à r.l., para os produtos da classe 25, tendo‑lhe sido concedida uma licença sobre a referida marca. Esta licença não foi inscrita no Registo de Marcas da União Europeia.

6        Na sequência de uma série de transferências, a marca em questão foi atribuída, em 30 de abril de 2013, para os produtos da classe 25, à Seven7 Investment PTE Ltd (a seguir «titular da marca em questão»). Foi‑lhe atribuído o novo número de registo 8252223, o qual foi publicado no Boletim de Marcas Comunitárias n.o 83/2013, de 3 de maio de 2013.

7        Em 26 de dezembro de 2016, em conformidade com o artigo 47.o, n.o 2, do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 53.o, n.o 2, do Regulamento 2017/1001), o EUIPO informou o titular da marca em questão de que o período de proteção da referida marca terminava em 22 de julho de 2017 e que o pedido de renovação podia ser apresentado entre 23 de janeiro de 2017 e 24 de julho de 2017. Além disso, o EUIPO referiu que, caso fosse paga a sobretaxa por atraso no pagamento da taxa de renovação, o prazo seria prorrogado até 22 de janeiro de 2018.

8        Todavia, o titular da marca em questão não pediu a renovação do registo da mesma.

9        Em 2 de fevereiro de 2018, o EUIPO notificou o representante do titular da marca em questão do termo do período de proteção da mesma a partir de 22 de julho de 2017.

10      Em 21 de julho de 2018, a recorrente apresentou um requerimento de restitutio in integrum com fundamento no artigo 104.o do Regulamento 2017/1001, tendo requerido para ser reinvestida no seu direito de pedir a renovação do registo da marca em questão (a seguir «requerimento para ser reinvestida nos seus direitos»). No requerimento para ser reinvestida nos seus direitos, a recorrente informou o EUIPO de que lhe tinha sido concedida uma licença sobre a referida marca e que o titular da marca tinha violado a sua obrigação contratual de a informar da sua intenção de não renovar o registo da mesma, pelo que a recorrente não tinha podido proceder, ela própria, à renovação atempada do referido registo.

11      Por Decisão de 30 de agosto de 2018, o departamento «Operações» do EUIPO indeferiu o requerimento da recorrente para ser reinvestida nos seus direitos e confirmou o cancelamento do registo da marca em questão.

12      Em 23 de outubro de 2018, a recorrente interpôs recurso da decisão do departamento «Operações» nos termos dos artigos 66.o a 71.o do Regulamento 2017/1001.

13      Em 4 de abril de 2019, a Câmara de Recurso enviou uma comunicação à recorrente na qual indicou que o reinvestimento no direito de pedir a renovação do registo da marca em questão não lhe podia ser concedido porquanto a situação descrita não revelava que a recorrente tivesse feito prova de toda a vigilância inerente às circunstâncias.

14      Por Decisão de 4 de junho de 2019 (a seguir «decisão impugnada»), a Quinta Câmara de Recurso do EUIPO negou provimento ao recurso. Antes de mais, recordou que as disposições do artigo 104.o do Regulamento 2017/1001 devem ser objeto de interpretação restrita. Em seguida, após ter constatado que a não renovação do registo da marca em questão era imputável ao titular da marca, a Câmara de Recurso considerou que a recorrente não podia validamente requerer a renovação do registo da mesma sem obter previamente uma autorização expressa do referido titular. No entanto, a falta dessa autorização não impedia o decurso do prazo de renovação. A recorrente só poderia sanar a falta de renovação por parte do titular da marca em questão se demonstrasse que essa falta tinha ocorrido apesar de a recorrente ter feito prova de toda a vigilância exigida. A Câmara de Recurso acrescentou que, caso se admitisse a existência de um direito do licenciado à renovação, independente do direito do titular da marca em questão, caberia então ao licenciado tomar todas as medidas necessárias para assegurar a renovação do registo da marca em questão em tempo útil. A Câmara de Recurso considerou, por outro lado, que a recorrente não tinha demonstrado a existência de circunstâncias excecionais suscetíveis de justificar que fosse reinvestida no direito de pedir a renovação do registo da marca em questão. Por último, a Câmara de Recurso julgou inoperante o argumento da recorrente segundo o qual a aceitação do reinvestimento no direito a pedir a renovação do registo da marca em questão não implicava qualquer violação de direitos ou expectativas de terceiros.

 Pedidos das partes

15      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular a decisão impugnada;

–        julgar procedente o pedido de restitutio in integrum e o pedido de renovação do registo da marca em questão.

16      O EUIPO conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

17      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca, em substância, cinco fundamentos, relativos, o primeiro, à violação dos artigos 53.o e 104.o do Regulamento 2017/1001, lidos em conjugação com o princípio geral da efetividade, na medida em que a Câmara de Recurso violou o direito autónomo reconhecido ao licenciado de apresentar o pedido de renovação do registo da marca em questão e o requerimento para ser reinvestido nos seus direitos; o segundo, à violação do artigo 104.o do Regulamento 2017/1001, na medida em que a recorrente apresentou o requerimento para ser reinvestida nos seus direitos e o pedido de renovação dentro do prazo; o terceiro, à violação do artigo 104.o do Regulamento 2017/1001, na medida em que a recorrente agiu com toda a vigilância inerente às circunstâncias; o quarto, à violação do artigo 104.o do Regulamento 2017/1001, uma vez que as medidas recomendadas pela Câmara de Recurso não asseguraram uma renovação do registo da marca em questão nos prazos fixados, e, o quinto, à violação do princípio geral da proteção conferida por uma marca da União Europeia, consagrado no considerando 11 do Regulamento 2017/1001.

18      O Tribunal examinará sucessivamente, em primeiro lugar, o primeiro fundamento, em seguida, os segundo, terceiro e quarto fundamentos em conjunto e, por último, o quinto fundamento.

 Quanto ao direito da recorrente de apresentar um requerimento para ser reinvestida nos seus direitos e pedir a renovação do registo da marca em questão

19      A recorrente alega que a decisão impugnada é errónea na medida em que, contrariamente aos artigos 53.o e 104.o do Regulamento 2017/1001, a Câmara de Recurso apreciou o pedido de renovação do registo da marca em questão e o requerimento da recorrente para ser reinvestida nos seus direitos como se se tratasse de reinvestir o titular da marca em questão nos seus direitos, em vez da recorrente.

20      Acrescenta que, por força do princípio da efetividade das normas jurídicas, todas as normas jurídicas que conferem um direito a um cidadão da União devem ser aplicadas de modo que atinja, in fine, o seu objetivo. Segundo a recorrente, o requerimento para ser reinvestido nos seus direitos tem por objetivo assegurar que o titular de um direito sobre uma marca da União não perca esse direito em caso de inobservância de um prazo, desde que determinados prazos sejam cumpridos e seja feita prova de toda a vigilância inerente às circunstâncias. Ora, ao impor à recorrente a prova de que o titular da marca em questão tinha agido com essa vigilância e de que o mesmo tinha legitimidade para apresentar esse requerimento, a Câmara de Recurso tornou o exercício desse direito impossível e violou o princípio da efetividade.

21      O EUIPO contesta os argumentos da recorrente.

22      Importa recordar que, nos termos do artigo 53.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001, «[o] registo da marca da UE é renovado a pedido do titular da marca da UE ou de qualquer pessoa por ele expressamente autorizada, desde que tenham sido pagas as taxas».

23      O artigo 104.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001, prevê que «[o] requerente ou o titular de uma marca da UE ou qualquer outra parte num processo perante o Instituto que, embora tendo feito prova de toda a vigilância inerente às circunstâncias, não tenha conseguido observar um prazo em relação ao [EUIPO], é, mediante requerimento, reinvestido nos seus direitos se, por força do disposto no presente regulamento, o impedimento tiver tido por consequência direta a perda de um direito ou de uma faculdade de recurso».

24      Ao abrigo desta última disposição, o requerimento no EUIPO pressupõe, em primeiro lugar, que o requerente seja parte no processo em causa, em segundo lugar, que, embora tendo feito prova de toda a vigilância inerente às circunstâncias, o requerente não pôde observar um prazo no EUIPO e, em terceiro lugar, que esse impedimento teve como consequência direta a perda de um direito ou de um meio de recurso [Acórdãos de 12 de maio de 2009, Jurado Hermanos/IHMI (JURADO), T‑410/07, EU:T:2009:153, n.o 15, e de 5 de abril de 2017, Renfe‑Operadora/EUIPO (AVE), T‑367/15, não publicado, EU:T:2017:255, n.o 24].

25      No que respeita ao primeiro requisito, há que salientar que, em conformidade com o artigo 53.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001, só o titular da marca ou as pessoas por ele expressamente autorizadas podem ser consideradas partes no procedimento de renovação (Acórdão de 12 de maio de 2009, JURADO, T‑410/07, EU:T:2009:153, n.o 16).

26      Ora, nenhuma disposição do Regulamento 2017/1001 se opõe a que uma «parte no processo de renovação» possa ser considerada uma «parte num processo no [EUIPO]», na aceção do artigo 104.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001. Com efeito, a utilização da conjunção «ou» no artigo 104.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001 significa que o requerimento para ser reinvestido nos seus direitos pode beneficiar qualquer parte num processo no EUIPO, independentemente de a mesma ser ou não titular da marca da União Europeia registada em causa [v., por analogia, Acórdão de 31 de janeiro de 2019, Thun/EUIPO (Poisson), T‑604/17, não publicado, EU:T:2019:42, n.o 17].

27      No entanto, não resulta de modo algum destas disposições que, enquanto titular de uma licença sobre a marca em questão, a recorrente seja juridicamente equiparada ao titular da marca no que respeita à renovação do respetivo registo, mas, muito pelo contrário, que, como qualquer outra pessoa, deve ser expressamente autorizada pelo titular da marca em questão, para poder apresentar um pedido de renovação, e provar a existência de tal autorização (v., neste sentido, Acórdão de 12 de maio de 2009, JURADO, T‑410/07, EU:T:2009:153, n.o 21).

28      No caso em apreço, é pacífico que, em 17 de julho de 2018, a recorrente obteve uma autorização do titular da marca em questão que lhe permitia apresentar um requerimento com fundamento no artigo 104.o do Regulamento 2017/1001 para ser reinvestida no direito de pedir a renovação do registo da referida marca. No entanto, há que salientar que esta autorização foi concedida após o decurso do prazo para pedir a referida renovação, previsto nos termos do artigo 53.o, n.o 3, do Regulamento 2017/1001, e quase um ano após a caducidade do registo efetivo da marca, em 22 de julho de 2017.

29      O artigo 53.o, n.o 3, do Regulamento n.o 2017/1001, prevê o seguinte:

«O pedido de renovação é apresentado no prazo de seis meses anterior ao termo da validade do registo. São também pagas neste prazo a taxa de base de renovação e, se apropriado, uma ou mais taxas de classificação para cada classe de produtos ou serviços para além da primeira classe. Caso contrário, o pedido pode ser apresentado e as taxas pagas num prazo suplementar de seis meses a contar do termo da validade do registo, sob reserva do pagamento de uma sobretaxa pelo pagamento tardio da taxa de renovação ou pela apresentação tardia do pedido de renovação no decurso desse prazo suplementar.»

30      Como corretamente salienta a Câmara de Recurso, no n.o 25 da decisão impugnada, o prazo para pedir a renovação do registo de uma marca corre independentemente de uma eventual autorização expressa que o titular da marca conceda ao licenciado.

31      O procedimento de renovação termina, portanto, no termo do prazo previsto no artigo 53.o, n.o 3, do referido regulamento. Por conseguinte, para ser considerada parte nesse processo ao abrigo do artigo 53.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001, a recorrente devia ter obtido uma autorização expressa do titular da marca em questão para poder pedir a renovação do registo da marca em causa em data anterior ao termo do prazo previsto.

32      Uma vez que só recebeu uma autorização expressa após o termo desse prazo, a recorrente não pode ser considerada uma parte no processo de renovação, ao abrigo do artigo 53.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001, nem uma «parte num processo no [EUIPO]» na aceção do artigo 104.o, n.o 1, do referido regulamento. Por conseguinte, a recorrente não podia apresentar um requerimento para ser reinvestida nos seus direitos na qualidade de licenciada, devendo consequentemente considerar‑se que agiu no EUIPO unicamente em nome e por conta do titular da marca em questão, sendo que é em relação a este último que importa verificar o cumprimento dos requisitos do artigo 104.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001. Assim sendo, como acertadamente salientou a Câmara de Recurso, no n.o 25 da decisão impugnada, a recorrente só podia sanar a falta de renovação por parte do titular da marca em questão se demonstrasse que essa falta se tinha verificado apesar de o mesmo ter feito prova de toda a vigilância exigida.

33      A interpretação acolhida no n.o 32, supra, é a que melhor assegura o respeito do princípio da efetividade e da exigência de segurança jurídica. A mesma garante uma determinação clara e um respeito rigoroso do ponto de partida e do termo dos prazos previstos nos artigos 53.o e 104.o do Regulamento n.o 2017/1001.

34      Com efeito, segundo jurisprudência constante, a estrita aplicação das regras da União em matéria de prazos processuais responde à exigência de segurança jurídica e à necessidade de evitar qualquer discriminação ou tratamento arbitrário na administração da justiça. Tais normas só podem ser derrogadas em circunstâncias efetivamente excecionais. Independentemente de tais circunstâncias serem qualificadas de caso fortuito ou de força maior, ou mesmo de erro desculpável, as mesmas comportam, seja como for, um elemento subjetivo relativo à obrigação do litigante de boa‑fé fazer prova da vigilância e da diligência exigíveis a um operador normalmente avisado, para supervisionar a tramitação do procedimento, e respeitar os prazos previstos [v., neste sentido, Acórdão de 21 de maio de 2014, Melt Water/IHMI (NUEVA), T‑61/13, EU:T:2014:265, n.o 38 e jurisprudência referida].

35      Os requisitos de aplicação do artigo 104.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001 devem, portanto, ser interpretados de forma restrita. Com efeito, o respeito dos prazos constitui matéria de ordem pública e a restitutio in integrum de um registo após o seu cancelamento é suscetível de prejudicar a segurança jurídica [v., neste sentido, Acórdão de 19 de setembro de 2012, Video Research USA/IHMI (VR), T‑267/11, EU:T:2012:446, n.o 35].

36      Assim, o titular de uma marca que não renovou o respetivo registo no prazo fixado não pode contornar as consequências da sua própria negligência autorizando um terceiro a apresentar um requerimento para ser reinvestido no seu direito de pedir a renovação do registo de uma marca da União Europeia, após o termo do referido prazo.

37      Quanto ao licenciado, o mesmo não pode, por um lado, pedir para ser reinvestido nos seus direitos pelo simples facto de o titular da marca ter feito prova de inércia e não ter respeitado o prazo para pedir a renovação do registo da referida marca e, por outro, ser autorizado a contrariar a vontade do titular de uma marca que decidiu conscientemente não renovar o seu registo.

38      Por conseguinte, foi com razão que a Câmara de Recurso considerou que havia que verificar o cumprimento dos requisitos previstos no artigo 104.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001 relativamente ao titular da marca, pelo que há que julgar improcedente o primeiro fundamento.

 Quanto à violação da obrigação de vigilância inerente às circunstâncias e dos prazos previstos no artigo 104.o do Regulamento 2017/1001

39      Antes de mais, a recorrente sustenta ter respeitado os prazos previstos no artigo 104.o do Regulamento 2017/1001. Alega que este artigo fixa dois prazos. O primeiro seria um prazo perentório de um ano, que começaria a correr a partir do termo do prazo não observado, ou seja, em 22 de julho de 2017. O segundo seria um prazo dilatório de dois meses que começaria a correr a partir da cessação do impedimento na origem da inobservância do prazo. A este respeito, a recorrente sustenta que o impedimento cessou a partir do momento em que recebeu a autorização expressa para agir do titular da marca em questão, ou seja, em 17 de julho de 2018. Dado que o pedido para ser reinvestida nos seus direitos foi apresentado em 21 de julho de 2018, a recorrente alega que os dois prazos foram respeitados.

40      Em seguida, sustenta que a Câmara de Recurso aplicou erradamente um critério de natureza absoluta ao exigir que a recorrente provasse que tinha tomado todas as medidas necessárias para assegurar uma renovação em tempo útil. Ora, a recorrente apenas estava obrigada a tomar as medidas adequadas ao caso concreto e inerentes às circunstâncias em causa. No caso em apreço, o contrato que a vincula ao titular da marca em questão estava sujeito ao direito italiano, que consagra os princípios gerais da confiança legítima e da boa‑fé na execução das obrigações contratuais. Por conseguinte, a Câmara de Recurso devia ter considerado que, não podendo prever que o titular da marca em questão não cumpriria as suas obrigações contratuais, a recorrente tinha agido com toda a vigilância exigida pelas circunstâncias.

41      Por último, a recorrente alega que a Câmara de Recurso violou o artigo 104.o do Regulamento 2017/1001, uma vez que as medidas por ela recomendadas para assegurar uma renovação em tempo útil do registo da marca em questão não foram eficazes e não são pertinentes quanto à fiscalização do respeito do dever de vigilância pela recorrente.

42      O EUIPO contesta os argumentos da recorrente.

43      O Tribunal Geral salienta que resulta da análise do primeiro fundamento que, no caso em apreço, o deferimento do requerimento para ser reinvestido nos seus direitos depende do cumprimento, por parte do titular da marca, dos requisitos previstos no artigo 104.o do Regulamento 2017/1001.

44      A este respeito, em primeiro lugar, a recorrente não deu nenhuma explicação sobre a inércia do titular da marca em questão relativamente à renovação do registo da mesma, pelo que nada indica que este último tenha feito prova de toda a vigilância inerente às circunstâncias, na aceção do artigo 104.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001.

45      Em seguida, nos termos do artigo 104.o, n.o 2, do Regulamento 2017/1001, o requerimento para ser reinvestido nos seus direitos deve ser apresentado por escrito no prazo de dois meses a contar da cessação do impedimento.

46      Ora, por força do artigo 104.o, n.o 5, do Regulamento 2017/1001, o artigo 104.o não é aplicável aos prazos previstos no n.o 2 deste artigo. Assim, se não tiver sido observado o prazo de dois meses, que constitui um dos requisitos do requerimento em causa, já não há possibilidade de apresentar um novo requerimento para ser reinvestido nos seus direitos, mesmo justificando a referida inobservância [Acórdão de 23 de setembro de 2009, Evets/IHMI (DANELECTRO e QWIK TUNE), T‑20/08 e T‑21/08, EU:T:2009:356, n.o 24].

47      O argumento da recorrente segundo o qual o prazo de dois meses só podia começar a correr na data em que a mesma recebeu a autorização do titular da marca em questão, ou seja, em 17 de julho de 2018, tendo assim o pedido sido apresentado dentro do prazo, não pode ser acolhido.

48      Com efeito, o simples facto de reconhecer que a recorrente não podia validamente pedir a renovação do registo da marca em questão sem autorização expressa do titular desta não equivale a reconhecer que a falta dessa autorização constitui um impedimento na aceção do artigo 104.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001.

49      Por outro lado, resulta dos elementos dos autos que o titular da marca em questão tinha designado um representante, que foi informado da caducidade do registo efetivo da referida marca em 22 de julho de 2017, caso não fosse pedida a renovação. Ora, não resulta dos autos que o referido titular tenha alegado qualquer impedimento.

50      Por último, a questão de saber se a recorrente podia ou não confiar no facto de o titular da marca estar obrigado a respeitar as suas obrigações contratuais só é relevante do ponto de vista das relações contratuais entre ambos, bem como do ponto de vista da determinação da responsabilidade pelos danos eventualmente sofridos pela recorrente, sendo que tal circunstância não pode, no entanto, afetar a situação jurídica desta no EUIPO.

51      Assim sendo, o requerimento apresentado pela recorrente não era admissível, uma vez que não preenchia as condições do artigo 104.o, n.os 1 e 2, do Regulamento 2017/1001.

52      Por conseguinte, há que julgar improcedentes o segundo, terceiro e quarto fundamentos, sem que os outros argumentos invocados pela recorrente a este respeito possam pôr em causa tal conclusão.

 Quanto à violação do princípio geral da proteção conferida por uma marca da União Europeia

53      Segundo a recorrente, a decisão impugnada tem por efeito expor o público a um risco de confusão causado por eventuais registos futuros de sinais semelhantes à marca cujo registo chegou ao respetivo termo, pelo que aquela decisão viola o princípio geral da proteção conferida por uma marca da União Europeia, consagrado no considerando 11 do Regulamento 2017/1001, segundo o qual o objetivo do registo de uma marca é, nomeadamente, garantir a sua função de origem.

54      O EUIPO contesta os argumentos da recorrente.

55      Importa recordar que o considerando 11 do Regulamento 2017/1001 prevê o seguinte:

«A proteção conferida pela marca da União Europeia, cujo objetivo consiste nomeadamente em garantir a função de origem da marca, deverá ser absoluta em caso de identidade entre a marca e o sinal e entre os produtos ou serviços. A proteção deverá também poder ser invocada em caso de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos ou serviços. Há que interpretar a noção de semelhança em função do risco de confusão. O risco de confusão, cuja avaliação depende de numerosos fatores, nomeadamente do conhecimento da marca no mercado, da associação que pode ser estabelecida com o sinal utilizado ou registado, do grau de semelhança entre a marca e o sinal e entre os produtos e os serviços designados, deverá constituir uma condição específica da proteção.»

56      Embora o objetivo do considerando 11 do Regulamento 2017/1001 seja garantir ao consumidor ou ao utilizador final a identidade da origem do produto ou do serviço designado pela marca, permitindo que distingam sem confusão possível esse produto ou serviço de outros que tenham outra proveniência (v., por analogia, Acórdão de 19 de junho de 2012, Chartered Institute of Patent Attorneys, C‑307/10, EU:C:2012:361, n.o 36), o referido considerando não tem por objetivo, ao contrário do que a recorrente parece sugerir, garantir indefinidamente o registo da marca da União quando o mesmo tiver chegado ao respetivo termo devido à não renovação do registo da marca em causa.

57      Com efeito, quando uma marca caduca e o seu registo não é renovado, a mesma entra, em princípio, no domínio público, o que favorece a concorrência e encoraja o progresso. Por conseguinte, e por força do princípio da disponibilidade, há que colocar no domínio público as marcas que acabam por não ser exploradas para que outros agentes económicos as possam registar e delas retirar eficazmente toda a sua utilidade económica.

58      No caso em apreço, a caducidade do registo da marca em questão tem origem na não renovação desse registo em tempo útil. Como salienta acertadamente o EUIPO, o facto de a referida marca já não poder servir de base a uma ação judicial contra outras marcas posteriores é uma consequência desse termo e não uma violação do princípio geral da proteção conferida por uma marca da União Europeia.

59      Por conseguinte, o quinto fundamento deve ser julgado improcedente, bem como o recurso na sua totalidade, sem que seja necessário examinar a admissibilidade do segundo pedido da recorrente.

 Quanto às despesas

60      Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

61      Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com os pedidos do EUIPO.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A Seven SpA é condenada nas despesas.

Spielmann

Öberg

Spineanu‑Matei

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 23 de setembro de 2020.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.


i      O n.º 60 do presente texto foi objeto de uma alteração de ordem linguística, posteriormente à sua disponibilização em linha.