Language of document : ECLI:EU:C:2018:653

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

7 de agosto de 2018 (*)

«Reenvio prejudicial — Política social — Despedimentos coletivos — Diretiva 98/59/CE — Artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo — Conceito de “empresa que controla o empregador” — Procedimentos de consulta dos trabalhadores — Ónus da prova»

Nos processos apensos C‑61/17, C‑62/17 e C‑72/17,

que têm por objeto pedidos de decisão prejudicial apresentados, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Landesarbeitsgericht Berlin‑Brandenburg (Tribunal Regional do Trabalho de Berlim‑Brandeburgo, Alemanha), por decisões de 24 de novembro de 2016, que deram entrada no Tribunal de Justiça em 6 de fevereiro de 2017 (C‑61/17 e C‑62/17) e 9 de fevereiro de 2017 (C‑72/17), nos processos

Miriam Bichat (C‑61/17),

Daniela Chlubna (C‑62/17),

Isabelle Walkner (C‑72/17)

contra

Aviation Passage Service Berlin GmbH & Co. KG,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

composto por: J. L. da Cruz Vilaça, presidente de secção, E. Levits (relator), A. Borg Barthet, M. Berger e F. Biltgen, juízes,

advogado‑geral: E. Sharpston,

secretário: R. Șereș, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 12 de abril de 2018,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação de M. Bichat, por F. Koch, Rechtsanwalt,

–        em representação de D. Chlubna, por H. Kuster e U. Meißner, Rechtsanwälte,

–        em representação de I. Walkner, por H. Kuster e U. Meißner, Rechtsanwälte,

–        em representação da Aviation Passage Service Berlin GmbH & Co. KG, por U. Rupp e U. Schweibert, Rechtsanwältinnen,

–        em representação do Governo alemão, por T. Henze e R. Kanitz, na qualidade de agentes,

–        em representação da Comissão Europeia, por C. Valero, F. Erlbacher e M. Kellerbauer, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 21 de junho de 2018,

profere o presente

Acórdão

1        Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação do artigo 2.o, n.o 4, da Diretiva 98/59/CE do Conselho, de 20 de julho de 1998, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos coletivos (JO 1998, L 225, p. 16).

2        Estes pedidos foram apresentados no âmbito de três litígios que opõem, respetivamente, Miriam Bichat, Daniela Chlubna e Isabelle Walkner ao seu antigo empregador, a sociedade Aviation Passage Service Berlin GmbH & Co. KG (a seguir «APSB»), a respeito da regularidade dos seus despedimentos relativamente aos procedimentos de consulta previstos no artigo 2.o da Diretiva 98/59.

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        Em 17 de fevereiro de 1975, o Conselho das Comunidades Europeias adotou a Diretiva 75/129/CEE, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos coletivos (JO 1975, L 48, p. 29; EE 05 F2 p. 54).

4        A Diretiva 92/56/CEE do Conselho, de 24 de junho de 1992, alterou a Diretiva 75/129 e completou o seu artigo 2.o mediante a inserção do n.o 4 que tinha a seguinte redação:

«As obrigações previstas nos n.os 1, 2 e 3 são aplicáveis independentemente de a decisão aos despedimentos coletivos ser tomada pelo empregador ou por uma empresa que o controle.

Quanto às alegadas infrações às obrigações de informação, consulta e notificação previstas na presente diretiva, não será tomada em consideração qualquer justificação do empregador fundamentada no facto de as informações necessárias não lhe terem sido fornecidas pela empresa cuja decisão deu origem aos despedimentos coletivos.»

5        Com o objetivo de clareza e de racionalidade, a Diretiva 75/129, conforme alterada pela Diretiva 92/56, foi em seguida revogada e substituída pela Diretiva 98/59 que procedeu à codificação da diretiva inicial.

6        O considerando 2 da Diretiva 98/59 enuncia:

«Considerando que se deve reforçar a proteção dos trabalhadores em caso de despedimento coletivo, tendo em conta a necessidade de um desenvolvimento económico e social equilibrado na Comunidade;»

7        O artigo 2.o desta diretiva tem a seguinte redação:

«1.      Sempre que tencione efetuar despedimentos coletivos, a entidade patronal é obrigada a consultar em tempo útil os representantes dos trabalhadores, com o objetivo de chegar a um acordo.

2.      As consultas incidirão, pelo menos, sobre as possibilidades de evitar ou de reduzir os despedimentos coletivos, bem como sobre os meios de atenuar as suas consequências recorrendo a medidas sociais de acompanhamento destinadas, nomeadamente, a auxiliar a reintegração ou reconversão dos trabalhadores despedidos.

[…]

3.      Para que os representantes dos trabalhadores possam formular propostas construtivas, o empregador deve, em tempo útil, no decurso das consultas:

a)      Facultar‑lhes todas as informações necessárias; e

b)      Comunicar‑lhes, sempre por escrito:

i)      os motivos do despedimento previsto,

ii)      o número e as categorias dos trabalhadores a despedir,

iii)      o número e as categorias dos trabalhadores habitualmente empregados,

iv)      o período durante o qual se pretendem efetuar os despedimentos;

v)      os critérios a utilizar na seleção dos trabalhadores a despedir, na medida em que as leis e/ou práticas nacionais deem essa competência ao empregador,

vi)      o método previsto para o cálculo de qualquer eventual indemnização de despedimento que não a que decorre das leis e/ou práticas nacionais.

[…]

4.      As obrigações previstas nos n.os 1, 2 e 3 são aplicáveis independentemente de a decisão dos despedimentos coletivos ser tomada pelo empregador ou por uma empresa que o controle.

Quanto às alegadas infrações às obrigações de informação, consulta e notificação previstas na presente diretiva, não será tomada em consideração qualquer justificação do empregador fundamentada no facto de as informações necessárias não lhe terem sido fornecidas pela empresa cuja decisão deu origem dos despedimentos coletivos.»

8        O artigo 5.o da referida diretiva dispõe:

«A presente diretiva não prejudica a faculdade que os Estados‑Membros têm de aplicar ou de introduzir disposições legislativas, regulamentares ou administrativas mais favoráveis aos trabalhadores ou de permitir ou promover a aplicação de disposições convencionais mais favoráveis aos trabalhadores.»

9        O artigo 6.o da mesma diretiva tem a seguinte formulação:

«Os Estados‑Membros devem prever a existência de procedimentos administrativos e/ou judiciais para fazer cumprir as obrigações instituídas pela presente diretiva a que possam recorrer os representantes dos trabalhadores e/ou os trabalhadores.»

 Direito alemão

10      O § 17 da Kündigungsschutzgesetz (Lei sobre a proteção contra os despedimentos BGBl.I, p. 1317 a seguir «KSchG») transpôs o artigo 2.o da Diretiva 98/59 e dispõe:

«(2)      Quando um empregador tenha a intenção de efetuar despedimentos coletivos é obrigado a fornecer atempadamente as informações úteis aos representantes dos trabalhadores e, em particular, a comunicar‑lhes por escrito:

1.      Os motivos do despedimento previsto,

2.      O número e as categorias dos trabalhadores a despedir,

3.      O número e as categorias dos trabalhadores habitualmente empregados,

4.      O período durante o qual se pretende efetuar os despedimentos,

5.      Os critérios previstos para a escolha dos trabalhadores a despedir;

6.      O método de cálculo previsto para todas as possíveis indemnizações por despedimento.

As consultas entre o empregador e os representantes dos trabalhadores incidirão, pelo menos, sobre as possibilidades de evitar ou de reduzir os despedimentos coletivos, bem como sobre os meios de atenuar as suas consequências.

(3a)      As obrigações de informação, de consulta e de notificação previstas nos n.os 1 a 3 são aplicáveis independentemente de a decisão dos despedimentos coletivos ser tomada pelo empregador ou por uma empresa que o controle. O empregador não pode alegar que a empresa que tomou a decisão relativa aos despedimentos coletivos não lhe forneceu as informações necessárias.»

 Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

11      M. Bichat trabalhou, desde 1 de maio de 1988, para a sociedade APSBbem como para o seu legal predecessor no âmbito da assistência aos passageiros no aeroporto de Tegel em Berlim (Alemanha). D. Chlubna e I. Walkner ocuparam lugares similares desde 1 de maio de 1992.

12      A APSB trabalhava exclusivamente para a sociedade GlobeGround Berlin GmbH & Co. KG (a seguir «GGB»), ativa em diferentes âmbitos aeroportuários. Em 2008, esta sociedade foi adquirida pelo grupo WISAG que procedeu a determinadas restruturações, mantendo a parte demandada o seu setor de atividade.

13      Ao ter realizado perdas, a GGB rescindiu, a partir de 30 de junho de 2014 e por etapas, os contratos celebrados com a APSB e informou esta última de que os serviços prestados seriam confiados a empresas alheias ao grupo. Estas últimas não contrataram nenhum membro do pessoal da APSB.

14      Em 22 de setembro de 2014, numa assembleia dos sócios da APSB, a GGB, na sua qualidade de única sócio possuindo direito de voto, decidiu pôr fim às atividades da APSB a partir de 31 de março de 2015 e dissolver a organização criada para o exercício das referidas atividades.

15      Em janeiro de 2015, a APSB informou a comissão dos trabalhadores do projeto de um despedimento coletivo e ouviu a este respeito, sem no entanto ter em consideração, posteriormente, a oposição dessa comissão expressa em relação a todos os pré‑avisos, por considerar que se tratava de uma situação deficitária fictícia, tanto no que dizia respeito à APSB como à GGB.

16      Em 29 de janeiro de 2015, M. Bichat, D. Chlubna e I. Walkner foram avisadas de que a suas relações laborais terminavam em 31 de agosto de 2015.

17      Foram intentados com êxito vários processos contra esses despedimentos coletivos. Em 10 de junho de 2015, a APSB avisou a comissão dos trabalhadores de que tinha a intenção de proceder a um novo despedimento coletivo. Esse despedimento ocorreu em 27 de junho de 2015 com efeitos, desta vez, a partir de 31 de janeiro de 2016. Neste contexto, a GGB a indicou que os motivos eram os mesmos que os que haviam sido comunicados à comissão dos trabalhadores da APSB aquando do despedimento coletivo precedente que deveria produzir efeitos em 31 de agosto de 2015.

18      Por sentenças de 12 de janeiro de 2016 (processo C‑61/17), de 23 de fevereiro de 2016 (processo C‑62/17) e de 1 de março de 2016 (processo C‑72/17), o Arbeitsgericht Berlin‑Brandenburg (Tribunal do Trabalho de Berlim‑Brandeburgo, Alemanha) julgou improcedentes as respetivas ações das demandantes no processo principal. As demandantes no processo principal interpuseram recurso das referidas sentenças para o órgão jurisdicional de reenvio.

19      O Landesarbeitsgericht Berlin‑Brandenburg (Tribunal Regional do Trabalho de Berlim‑Brandeburgo, Alemanha) estima que a solução dos litígios pendentes que lhe foram submetidos depende, em particular, da interpretação do artigo 2.o, n.o 4, da Diretiva 98/59. A este respeito, esse órgão jurisdicional salienta que o § 17 da KSchG, que transpõe quase textualmente o artigo 2.o da referida diretiva, origina, à escala nacional, divergências de interpretação, especialmente do conceito de «empresa que controla o empregador». Assim, uma interpretação extensiva deste conceito que inclua também as empresas não ligadas em termos de direito aos grupos de sociedades, mas que estão unicamente submetidas a um controlo de jure ou de facto, poderia tornar nulos os despedimentos em causa nos processos principais, ao passo que, segundo uma interpretação estrita desse conceito, tal não sucederia.

20      Nestas circunstâncias, o Landesarbeitsgericht Berlin‑Brandenburg (Tribunal Regional do Trabalho de Berlim‑Brandeburgo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais, que são formuladas em termos idênticos em cada um dos referidos processos:

«1)      A expressão “empresa que […] controle [o empregador]”, na aceção do artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59[…], refere‑se apenas a empresas cuja influência é garantida através de participações sociais e direitos de voto, ou basta que essa influência seja assegurada por contrato ou por via de facto (por exemplo, através da possibilidade de pessoas singulares darem instruções)?

2.      Para o caso de a primeira questão ser respondida no sentido de que não é exigível que a influência seja garantida através de participações sociais e direitos de voto:

Também se verifica uma “decisão dos despedimentos coletivos”, na aceção do artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59[…], quando a empresa que controla o empregador lhe dá instruções que tornam esses despedimentos coletivos necessários do ponto de vista económico?

3.      Em caso de resposta afirmativa à segunda questão:

O artigo 2.o, n.o 4, segundo parágrafo, em conjugação com o n.o 3, alíneas a) e b), […] i), e n.o 1, da Diretiva 98/59[…], exige que os representantes dos trabalhadores também sejam informados acerca dos motivos, de gestão empresarial ou de outra natureza, que subjazem às decisões da empresa que controla o empregador e que, por seu turno, levaram o empregador a efetuar despedimentos coletivos?

4.      É compatível com o artigo 2.o, n.o 4, em conjugação com o n.o 3, alíneas a) e b), […] i), e n.o 1, da Diretiva 98/59[…], impor aos trabalhadores que invocam judicialmente a ineficácia dos respetivos despedimentos no quadro de um despedimento coletivo, com fundamento no facto de o empregador que efetua o despedimento não ter conduzido devidamente o processo de consulta com os representantes dos trabalhadores, um ónus de alegação e de prova que exceda a obrigação de alegar indícios da existência de uma situação de controlo do empregador por outra empresa?

5.      Em caso de resposta afirmativa à quarta questão:

Neste caso, que outras obrigações de alegação e de prova podem ser impostas aos trabalhadores, segundo as mencionadas regras?»

21      Por decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 9 de março de 2017, os processos C‑61/17, C‑62/17 e C‑72/17 foram apensados para efeitos das fases escrita e oral e do acórdão.

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

 Quanto à admissibilidade

22      Há que assinalar, a título preliminar, que o Governo alemão alega que esta questão é inadmissível dado que se refere a um problema de natureza hipotética e que o Tribunal de Justiça não pode responder de maneira útil tendo em conta os elementos de facto e de direito apresentados pelo órgão jurisdicional de reenvio.

23      A este propósito, há que recordar lembrar que, segundo jurisprudência constante, é da competência exclusiva dos órgãos jurisdicionais nacionais, a quem é submetido o litígio e que devem assumir a responsabilidade pela decisão jurisdicional a proferir, apreciar, à luz das particularidades de cada caso, tanto a necessidade de uma questão prejudicial para poderem proferir a sua decisão como a relevância das questões submetidas ao Tribunal de Justiça. Consequentemente, desde que as questões colocadas digam respeito à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (Acórdão de 6 de março de 2018, SEGRO e Horváth, C‑52/16 e C‑113/16, EU:C:2018:157, n.o 42 bem como a jurisprudência referida).

24      A rejeição pelo Tribunal de Justiça de um pedido de decisão prejudicial submetido por um órgão jurisdicional nacional apenas é possível quando for manifesto que a interpretação solicitada do direito da União não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para responder de forma útil às questões que lhe são submetidas (v., designadamente, Acórdão de 6 de março de 2018, SEGRO e Horváth, C‑52/16 e C‑113/16, EU:C:2018:157, n.o 43 e jurisprudência referida).

25      Ora, no caso em apreço, em primeiro lugar, há que declarar que, na sequência de um pedido de informação que o Tribunal de Justiça enviou, em 25 de outubro de 2017, ao órgão jurisdicional de reenvio, este último reiterou tanto a necessidade do reenvio prejudicial para estar em situação de proferir o seu julgamento como a pertinência das questões submetidas ao Tribunal de Justiça.

26      Em segundo lugar, como a advogada‑geral salientou no n.o 32 das suas conclusões, a informação prestada pelo órgão jurisdicional de reenvio não permite considerar que a primeira questão prejudicial seja hipotética.

27      Daqui resulta que essa questão prejudicial é admissível.

 Quanto ao mérito

28      Mediante a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59 deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «empresa que controla o empregador» se refere unicamente a uma empresa ligada a esse empregador mediante participações ou direitos de voto ou também uma empresa que, devido aos seus vínculos contratuais ou de circunstâncias de facto, exerça o mesmo tipo de influência dominante sobre o referido empregador.

29      A este respeito, importa salientar, em primeiro lugar, que o artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59 não define o conceito de «empresa que controla o empregador», nem remete, quanto a este aspeto, para o direito dos Estados‑Membros. Assim, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, decorre das exigências tanto da aplicação uniforme do direito da União como do princípio da igualdade que os termos de uma disposição do direito da União que não admita nenhuma remissão expressa para o direito dos Estados‑Membros para determinar o seu sentido e alcance devem normalmente ser, em toda a União Europeia, objeto de uma interpretação autónoma e uniforme (v., nomeadamente, Acórdãos de 27 de janeiro de 2005, Junk, C‑188/03, EU:C:2005:59, n.os 29 e 30, e de 13 de maio de 2015, Lyttle e o., C‑182/13, EU:C:2015:317, n.o 26 e jurisprudência referida).

30      Nestas circunstâncias, e à semelhança do conceito de «estabelecimento» mencionado no artigo 1.o, n.o 1, primeiro parágrafo, alínea a), ii), da Diretiva 98/59, o conceito de «empresa que controla o empregador», que figura no artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, dessa diretiva, deve ser objeto de uma interpretação autónoma e uniforme no ordenamento jurídico da União (v., neste sentido, Acórdão de 13 de maio de 2015, Lyttle e o., C‑182/13, EU:C:2015:317, n.o 26 e jurisprudência referida).

31      A título preliminar, há que precisar que o conceito de «controlo» para efeitos da Diretiva 98/59 tem por objetivo, como salientou a advogada‑geral no n.o 50 das suas conclusões, uma situação em que uma empresa pode tomar uma decisão estratégica ou comercial que obrigue o empregador a considerar ou a projetar despedimentos coletivos (v., neste sentido, Acórdão de 10 de setembro de 2009, Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., C‑44/08, EU:C:2009:533, n.o 48).

32      Assim sendo, o teor do artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59 não permite, por si só, determinar quais são os vínculos entre a empresa e o empregador que permitem determinar em que circunstâncias a primeira «controla» o segundo. Nestas condições, há que ter em consideração a génese da referida disposição e o objetivo prosseguido pela regulamentação em causa no processo principal.

33      No que diz respeito, em primeiro lugar, à génese do artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59, há que recordar que a aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos coletivos, numa primeira fase, foi objeto da Diretiva 75/129, referida no n.o 3 do presente acórdão, que foi alterada pela Diretiva 92/56.

34      O sexto considerando da Diretiva 92/56, precisa que esta diretiva tem por objeto assegurar que as obrigações dos empregadores em matéria de informação, de consulta e de notificação sejam aplicáveis independentemente do facto de a decisão relativa aos despedimentos coletivos emanar do empregador ou de uma empresa que sobre ele exerça uma atividade de controlo. Para este efeito, a Diretiva 92/56 inseriu, no artigo 2.o da Diretiva 75/129, um n.o 4, que corresponde ao n.o 4 do artigo 2.o da Diretiva 98/59.

35      Tanto a Diretiva 98/59 como, anteriormente, a Diretiva 75/129, que substituiu, procedem a uma harmonização parcial das regras de proteção dos trabalhadores em caso de despedimento coletivo, concretamente o procedimento a seguir nesses despedimentos (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, AGET Iraklis, C‑201/15, EU:C:2016:972, n.o 29 e jurisprudência referida).

36      A este propósito, o Tribunal de Justiça precisou que no âmbito dessa harmonização parcial, o legislador pretendeu, com a adoção da Diretiva 92/56, e depois da Diretiva 98/59, colmatar uma lacuna da sua regulamentação anterior e precisar as obrigações dos empregadores que fazem parte de um grupo de empresas. Assim, num contexto económico marcado pela existência de um número crescente desses grupos, o artigo 2.o, n.o 4, da Diretiva 98/59 permite assegurar, quando uma empresa é controlada por outra, a realização efetiva do objetivo desta diretiva, que, como é indicado no seu segundo considerando, consiste em reforçar a proteção dos trabalhadores em caso de despedimentos coletivos (Acórdão de 10 de setembro de 2009, Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., C‑44/08, EU:C:2009:533, n.o 44 e jurisprudência referida).

37      Por conseguinte, o Tribunal de Justiça interpretou o artigo 2.o, n.os 1 e 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59 no sentido de que, independentemente do facto de os despedimentos coletivos serem considerados ou projetados na sequência de uma decisão da empresa que emprega os trabalhadores afetados ou de uma decisão da sua sociedade‑mãe, é sempre a primeira dessas duas sociedades que está obrigada, enquanto empregadora, a iniciar as consultas com os representantes dos seus trabalhadores (Acórdão de 10 de setembro de 2009, Akavan Erityisalojen Keskusliitto AEK e o., C‑44/08, EU:C:2009:533, n.o 62).

38      Em segundo lugar, no que diz respeito ao objetivo da Diretiva 98/59, depreende‑se claramente do seu considerando 2 que esta diretiva pretende reforçar a proteção dos trabalhadores em caso de despedimentos coletivos. A este respeito, o Tribunal de Justiça precisou que, nos termos do artigo 2.o, n.o 2, da referida diretiva, as consultas dos representantes dos trabalhadores que precedem os despedimentos coletivos versam sobre as possibilidades de evitar ou de reduzir os despedimentos coletivos, bem como sobre os meios de atenuar as suas consequências recorrendo a medidas sociais de acompanhamento destinadas, nomeadamente, a auxiliar a reintegração ou reconversão dos trabalhadores despedidos (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, AGET Iraklis, C‑201/15, EU:C:2016:972, n.os 27 e 28).

39      Para este efeito, a proteção dos trabalhadores em caso de despedimentos coletivos será ainda mais reforçada quanto mais amplos forem os critérios escolhidos para definir o conceito de «empresa que controla o empregador», que consta do artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59, devendo esses critérios, no entanto, respeitar o direito da União e os seus princípios, tais como o princípio da segurança jurídica.

40      Nestas circunstâncias, depreende‑se da interpretação da génese e do objetivo do artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59, por um lado, que o conceito de «empresa que controla o empregador» abrange qualquer empresa que, em virtude de pertencer ao mesmo grupo ou de participar no capital social que lhe confere a maioria dos votos na assembleia e/ou nos órgãos decisórios existentes no empregador, pode obrigá‑lo a tomar uma decisão que considera ou que procede a despedimentos coletivos.

41      Além disso, há que considerar como abrangidas neste conceito também as situações em que uma empresa, mesmo que não tenha a maioria dos votos recordada no número anterior, pode exercer uma influência determinante, no sentido do n.o 31 do presente acórdão, que se expressa nos resultados das votações nos órgãos societários, e isso devido, especialmente, à dispersão do capital social do empregador, a um grau de participação relativamente baixo dos sócios nas assembleias ou à existência de pactos entre sócios na empresa do empregador.

42      Por outro lado, para garantir a proteção do princípio da segurança jurídica, critérios puramente factuais, como o da existência de um interesse patrimonial comum entre o empregador e a outra empresa ou o do «interesse próprio da empresa em cumprir as obrigações de informação, consulta e notificação previstas pela Diretiva 98/59», que a Comissão Europeia invocou nas suas observações escritas e orais, não se podem basear na existência de uma situação em que uma empresa controla o empregador no sentido do artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59.

43      Além disso, a eventual utilização de tais critérios poderia obrigar o órgão jurisdicional nacional competente a proceder a investigações difíceis e levar a resultados aleatórios, tais como as relativas à apreciação da natureza e da intensidade dos diferentes interesses comuns às empresas em causa, o que poderia ser contrário ao princípio da segurança jurídica.

44      Além disso, é pacífico que uma simples relação contratual, na medida em que essa relação não permita a uma empresa exercer uma influência determinante nas decisões de despedimento tomadas pelo empregador, não pode ser considerada suficiente para demonstrar uma relação de controlo, no sentido do artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59.

45      Tendo em conta todas as considerações expostas, há que responder à primeira questão que o artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59 deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «empresa que controla o empregador» abrange qualquer empresa ligada a esse empregador mediante vínculos de participação no capital social deste último ou por outros vínculos jurídicos que lhe permitam exercer uma influência determinante nos órgãos decisórios do empregador e de o obrigar a considerar ou a proceder a despedimentos coletivos.

 Quanto às questões segunda a quinta

46      Tendo em conta a resposta dada à primeira questão, não há que responder às questões segunda a quinta.

 Quanto às despesas

47      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

O artigo 2.o, n.o 4, primeiro parágrafo, da Diretiva 98/59/CE do Conselho, de 20 de julho de 1998, relativa à aproximação das legislações dos EstadosMembros respeitantes aos despedimentos coletivos, deve ser interpretado no sentido de que o conceito de «empresa que controla o empregador» abrange qualquer empresa ligada a esse empregador mediante vínculos de participação no capital social deste último ou por outros vínculos jurídicos que lhe permitam exercer uma influência determinante nos órgãos decisórios do empregador e de o obrigar a considerar ou a proceder a despedimentos coletivos.

Assinaturas


*      Língua do processo: alemão.