Language of document : ECLI:EU:T:2019:346

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

22 de maio de 2019 (*)

«Auxílios de Estado — Auxílio concedido pelas autoridades espanholas a um clube de futebol profissional — Acordo que visa compensar a não realização de uma transação imobiliária inicialmente acordada entre um município e um clube de futebol — Montante excessivo da compensação acordada com o clube de futebol — Decisão que declara o auxílio incompatível com o mercado interno — Vantagem»

No processo T‑791/16,

Real Madrid Club de Fútbol, com sede em Madrid (Espanha), representado por J. Pérez‑Bustamante Köster e F. Löwhagen, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por P.‑J. Loewenthal, G. Luengo e P. Němečková, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido, apresentado nos termos do artigo 263.o TFUE, de anulação da Decisão (UE) 2016/2393 da Comissão, de 4 de julho de 2016, relativa ao auxílio estatal SA.33754 (2013/C) (ex 2013/NN) concedido por Espanha ao Real Madrid CF (JO 2016, L 358, p. 3),

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção),

composto por: H. Kanninen (relator), presidente, J. Schwarcz e C. Iliopoulos, juízes,

secretário: I. Dragan, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 5 de setembro de 2018,

profere o presente

Acórdão

 Antecedentes do litígio

1        Em 20 de dezembro de 1991, o Ayuntamiento de Madrid (Município de Madrid, Espanha), a Gerencia Municipal de Urbanismo (Departamento Municipal de Urbanismo) desse município e o recorrente, o Real Madrid Club de Fútbol, assinaram um convénio sobre a renovação do Estádio Santiago Bernabéu (a seguir «convénio de 1991»).

2        Em 29 de novembro de 1996, o recorrente e a Comunidad Autonoma de Madrid (Comunidade Autónoma de Madrid) celebraram um convénio de permuta de terrenos (a seguir «convénio de 1996»).

3        Em 29 de maio de 1998, o recorrente e o Município de Madrid celebraram um novo convénio com vista a executar a permuta prevista no convénio de 1996 (a seguir «convénio de execução de 1998»). Nos termos do convénio de execução de 1998, estava previsto que o recorrente cedesse determinados terrenos ao referido município e que, em contrapartida, este cedesse ao recorrente terrenos por um valor equivalente às suas obrigações para com o recorrente, a saber, a cessão de parcelas cujo valor se aproximava de 13,5 milhões de euros. Ficou previsto que esse município cedesse parcelas situadas na zona de Julián Camarillo Sur (parcelas 33 e 34) e a parcela B‑32 de Las Tablas em Madrid (a seguir «parcela B‑32»). Para efeito desta permuta, os serviços técnicos do município avaliaram esta última parcela em 595 194 euros.

4        Em 29 de julho de 2011, o recorrente e o Município de Madrid assinaram um acordo com o objetivo de resolverem um diferendo de ordem jurídica que os opunha relativamente ao convénio de 1991 e à permuta de imóveis objeto do convénio de 1996 e do convénio de execução de 1998 (a seguir «acordo de transação de 2011»). Nos termos desse acordo, as partes reconheceram a impossibilidade jurídica de cessão ao recorrente da parcela B‑32 no seu estado atual. Considerando impossível cumprir as suas obrigações previstas no convénio de execução de 1998, o referido município decidiu indemnizar o recorrente, pagando‑lhe um montante correspondente ao valor da referida parcela em 2011. Num relatório de 2011, os serviços técnicos do Município de Madrid fixaram esse valor em 22 693 054,44 euros. As partes acordaram em que a compensação seria paga substituindo a cessão dessa parcela pela cessão pelo Município de Madrid de outras parcelas ao Real Madrid. Estas parcelas foram identificadas como sendo uma propriedade de 3 600 m2, diversos terrenos com a área total de 7 966 m2 e uma zona de 3 035 m2 cujo valor total foi estimado em 19 972 348,96 euros. As partes acordaram também em compensarem as suas dívidas recíprocas. O resultado foi um crédito líquido remanescente de 8,04 euros a favor do Real Madrid devido pelo Município de Madrid.

5        Nos termos de um acordo de urbanização celebrado em setembro de 2011 entre o Município de Madrid e o recorrente, este comprometeu‑se a restituir alguns imóveis. No âmbito da transação, o referido município e a Comunidade de Madrid alteraram o Plano Geral de Urbanização de Madrid (a seguir «PGU»).

6        Informada em 2011 da existência de auxílios de Estado presumidos a favor do recorrente, concedidos sob a forma de uma cessão vantajosa de bens imóveis, a Comissão Europeia, em 20 de dezembro de 2011, convidou o Reino de Espanha a formular observações sobre essas informações. Esse Estado‑Membro, em 23 de dezembro de 2011 e 20 de fevereiro de 2012, respondeu ao pedido da Comissão que, em 2 de abril de 2012, fez novo pedido, ao qual o Reino de Espanha respondeu em 18 de junho de 2012.

7        Por ofício de 18 de dezembro de 2013, a Comissão notificou o Reino de Espanha da sua decisão de dar início ao procedimento previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE. A Comissão chegou à conclusão preliminar de que a compensação concedida ao Real Madrid pelo Município de Madrid pelo acordo de transação de 2011 constituía um auxílio estatal a favor do Real Madrid, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Consequentemente, a Comissão convidou o Reino de Espanha e as outras partes interessadas a fornecerem informações pertinentes a fim de determinar se a cessão da parcela B‑32 ao Real Madrid nos termos do convénio de execução de 1998 era efetivamente impossível por parte do Município de Madrid e a estudar as potenciais consequências desta impossibilidade ao abrigo do direito espanhol. Além disso, a Comissão solicitou precisões sobre o valor das parcelas incluídas no acordo de transação de 2011 e no convénio urbanístico referido no n.o 5, supra. Em 16 de janeiro de 2014, o Reino de Espanha apresentou as suas observações sobre a decisão de abertura do processo.

8        Por Decisão (UE) 2016/2393 da Comissão, de 4 de julho de 2016, relativa ao auxílio estatal SA.33754 (2013/C) (ex 2013/NN) concedido pela Espanha ao Real Madrid CF (JO 2016, L 358, p. 3, a seguir «decisão impugnada»), a Comissão considerou, nos termos do artigo 1.o dessa decisão, que o auxílio estatal no montante de 18 418 054,44 euros, ilegalmente concedido pelo Reino de Espanha ao recorrente em 29 de julho de 2011 em violação do artigo 108.o, n.o 3, TFUE é incompatível com o mercado interno.

9        Na decisão impugnada, a Comissão considerou que um operador em economia de mercado, em circunstâncias semelhantes àquelas em que se encontrava o Município de Madrid, não teria celebrado o acordo de transação de 2011. Em primeiro lugar, tendo em conta as incertezas jurídicas que existiam em 2011 sobre a questão de saber se o Município de Madrid tinha o dever de indemnizar o Real Madrid por não lhe ter entregado a parcela B‑32 em virtude do convénio de execução de 1998, um operador numa economia de mercado na mesma situação que o Município de Madrid teria pedido um parecer jurídico antes de celebrar o referido acordo, a fim de avaliar a probabilidade de ser efetivamente declarado responsável por esse incumprimento. A Comissão esclareceu que o Município de Madrid não o fez. Em segundo lugar, a Comissão considerou que um operador numa economia de mercado numa situação semelhante à do Município de Madrid não teria aceitado pagar ao Real Madrid uma indemnização de 22 693 054,44 euros em virtude de tal acordo, uma vez que este montante ultrapassaria largamente o nível máximo da sua responsabilidade jurídica por incumprimento da obrigação de ceder a parcela B‑32.

10      A Comissão analisou, na decisão impugnada, a avaliação dos terrenos realizada pelos serviços técnicos do Município de Madrid, a constante de um relatório do ministro das Finanças espanhol de 2011, a do relatório indicado pelo recorrente pedido a um escritório de consultores imobiliários (a seguir «relatório do escritório de consultores imobiliários») e a do relatório encomendado pela Comissão ao escritório de peritagem imobiliária (a seguir «relatório do escritório de peritagem imobiliária»). A Comissão considerou que este último relatório fazia uma comparação detalhada e minuciosa e aceitou o valor da parcela B‑32 em 2011 avaliada nesse relatório em 4 275 000 euros.

 Tramitação processual e pedidos das partes

11      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 14 de novembro de 2016, o recorrente interpôs o presente recurso, pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        declarar o recurso admissível;

–        anular, na íntegra, a decisão impugnada;

–        condenar a Comissão nas despesas.

12      A Comissão apresentou a sua contestação na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de março de 2017, pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar o recorrente nas despesas.

13      O recorrente apresentou na secretaria do Tribunal Geral a sua réplica em 25 de abril de 2017 e a Comissão apresentou a sua tréplica em 6 de junho de 2017.

14      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, colocou por escrito questões às partes, a que estas responderam no prazo fixado. As partes responderam às questões nos prazos fixados.

15      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 5 de setembro de 2018.

 Questão de direito

 Quanto aos pedidos de inquirição de testemunhas e de apresentação de documentos

16      No seu requerimento inicial, o recorrente pede que sejam ouvidos os autores do relatório do escritório de consulta imobiliária, invocando os artigos 85.o, 88.o e 91.o, alínea d), do Regulamento de Processo, para obter os depoimentos dessas pessoas sobre o método de avaliação da parcela B‑32 utilizado pela Comissão e sobre os erros cometidos, segundo alega, no relatório do escritório de peritagem imobiliária. O recorrente requer ainda, nos termos do artigo 89.o, n.o 3, do referido regulamento, a obtenção de uma cópia do contrato celebrado com esse escritório de peritagem imobiliária.

17      A Comissão considera que a audição requerida não é necessária uma vez que fundamentou detalhadamente as razões por que rejeitou a avaliação constante do relatório do escritório de consulta imobiliária, cuja cópia integral foi junta ao requerimento inicial e que reflete de forma completa a análise e as conclusões dos autores do relatório. No tocante ao pedido de apresentação do documento, a Comissão juntou à sua contestação uma versão não confidencial do contrato assinado com o escritório de peritagem imobiliária.

18      No que se refere ao pedido de audição apresentado pelo recorrente, importa recordar que só o Tribunal Geral é o único juiz da eventual necessidade de completar os elementos de informação de que dispõe sobre os processos que lhe são submetidos (v. Acórdão de 28 de junho de 2016, Portugal Telecom/Comissão, T‑208/13, EU:T:2016:368, n.o 280 e jurisprudência aí referida).

19      Resulta da jurisprudência que, se o Tribunal Geral se puder pronunciar utilmente com base nos pedidos, fundamentos e argumentos desenvolvidos quer durante a fase escrita quer durante a fase oral do processo e à luz dos documentos apresentados, deve indeferir o requerimento de inquirição de uma testemunha, apresentado pela recorrente, sem ter de justificar por meio de uma fundamentação específica a sua apreciação da inutilidade de investigar elementos de prova suplementares (v. Acórdão de 28 de junho de 2016, Portugal Telecom/Comissão, T‑208/13, EU:T:2016:368, n.o 285 e jurisprudência aí referida).

20      No caso em apreço, basta referir que foi junta ao requerimento inicial uma cópia do relatório do escritório de consulta imobiliária e que esse relatório contém já todos os elementos que permitem compreender a análise e as conclusões dos seus autores. Além disso, nos considerandos 47 e 54 da decisão impugnada, a Comissão reproduziu os argumentos do recorrente baseados nas conclusões do referido relatório. No considerando 64 da referida decisão, foram indicados os resultados desse relatório e em que é que ele se distinguia das avaliações consideradas no quadro do convénio de execução de 1998. No considerando 66 dessa decisão, a Comissão referiu o método utilizado no relatório do escritório de consulta imobiliária para avaliar a parcela B‑32, como referido pelo recorrente. Nos considerandos 107 e 110 da mesma decisão, a Comissão referiu, respetivamente, a estimativa e o método considerados no mesmo relatório. Além disso, a Comissão fundamentou detalhadamente as razões pelas quais rejeitou a avaliação do relatório do escritório de consulta imobiliária. Não é, portanto, necessário deferir o pedido de inquirição de testemunhas do requerente.

21      No tocante ao pedido do recorrente de apresentação de documento, basta referir que a Comissão comunicou, em anexo à sua contestação, a versão não confidencial do contrato assinado com o escritório de peritagem imobiliária. Assim, o Tribunal Geral não tem de se pronunciar sobre esse pedido.

 Quanto ao mérito

22      A título liminar, importa recordar que, na decisão impugnada, a Comissão considerou em primeiro lugar que um operador em economia de mercado que se encontrasse na mesma situação que o Município de Madrid teria pedido um parecer jurídico antes de assinar o acordo de transação de 2011 e que, na falta desse parecer, o município em causa não devia ter aceitado ser considerado responsável pelo não cumprimento da obrigação de ceder a parcela B‑32.

23      Em segundo lugar, para determinar a existência e o montante do auxílio concedido, a Comissão partiu da hipótese de que o Município de Madrid fora considerado inteiramente responsável pela não transferência da parcela B‑32 e avaliou o valor apenas dessa parcela, que era a base do reconhecimento de dívida desse município a favor do recorrente no quadro do acordo de transação de 2011.

24      Em apoio do recurso, o recorrente invoca três fundamentos. No quadro do primeiro fundamento, sustenta que a Comissão determinou de forma errada a existência de uma vantagem a seu favor. No quadro do segundo fundamento, combina a violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE com a violação do princípio geral de boa administração, sustentando que a Comissão cometeu erros manifestos de apreciação ao basear‑se numa peritagem desprovida de valor probatório e ao rejeitar, sem justificação, as outras avaliações da parcela B‑32. No quadro do terceiro fundamento, invoca a violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e da obrigação de fundamentação e ainda o princípio da boa administração, alegando que a decisão impugnada contém contradições na determinação do valor da indemnização concedida ao recorrente.

25      No âmbito do primeiro fundamento, o recorrente formula três acusações. Com a primeira, censura a Comissão de ter erradamente substituído a condição baseada no princípio do operador em economia de mercado por um teste formal de peritagem jurídica externa. Na segunda, alega que cabia à Comissão demonstrar que o Município de Madrid não tinha a obrigação de reparar o prejuízo causado pelo incumprimento das suas obrigações contratuais e que a Comissão não determinou corretamente o nível máximo de responsabilidade do município. Na terceira, o recorrente alega que o valor da parcela B‑32 fixado no acordo de transação de 2011 é bastante inferior à exposição financeira do município para que o mesmo possa exonerar‑se da sua responsabilidade decorrente do não cumprimento do convénio de execução de 1998.

26      Em substância, na primeira e na segunda acusação do primeiro fundamento, o recorrente critica a decisão impugnada no que se refere aos fundamentos que declaram que o Município de Madrid foi erradamente considerado responsável pela não transferência da parcela B‑32, designadamente por não ter sido apresentado um parecer externo que fixasse essa responsabilidade. Além disso, o recorrente contesta, na terceira acusação do primeiro fundamento e no segundo e terceiro fundamentos, a existência de um auxílio de Estado e a avaliação do seu montante.

27      O Tribunal Geral analisará em primeiro lugar a primeira e segunda alegações do primeiro fundamento e, depois, em conjunto, a terceira alegação do primeiro fundamento e o segundo fundamento e, por fim, o terceiro fundamento.

 Quanto à primeira e segunda acusações do primeiro fundamento

28      Segundo o recorrente, por um lado, a Comissão não pode substituir a condição baseada no princípio do operador em economia de mercado por um teste formal de um parecer jurídico externo, segundo o qual, na falta de tal parecer, o hipotético operador em economia de mercado numa situação semelhante não assumiria a plena responsabilidade jurídica do não cumprimento de uma obrigação contratual.

29      O Município de Madrid obteve um parecer jurídico elaborado pelos seus serviços jurídicos antes de celebrar o acordo de transação de 2011, e não teria a obrigação de recorrer a um parecer externo antes de celebrar o referido acordo.

30      O recorrente contesta também o argumento da Comissão segundo o qual o Município de Madrid não tinha a obrigação de celebrar o acordo de transação de 2011 se tal obrigação não fosse judicialmente declarada. O recorrente contesta, designadamente, a interpretação que a Comissão faz do Acórdão de 27 de setembro de 1988, Asteris e o. (106/87 e 120/87, EU:C:1988:457).

31      Por outro lado, o recorrente sustenta que, para demonstrar a existência de um auxílio de Estado ao abrigo do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, cabia à Comissão demonstrar que o Município de Madrid não tinha a obrigação de reparar o prejuízo causado pelo incumprimento das suas obrigações contratuais. A Comissão também não terá determinado corretamente o nível máximo da responsabilidade do referido município. Sendo assim, nenhuma incerteza jurídica subsiste quanto à responsabilidade desse município pelo não cumprimento do convénio de execução de 1998. Segundo o direito espanhol, o referido município só poderia eximir‑se à responsabilidade por não ter cedido a parcela B‑32 em duas hipóteses, a saber, se o convénio de execução fosse nulo por ter previsto uma obrigação de cessão originariamente impossível ou se a obrigação de cessão fosse válida inicialmente, mas, antes de se tornar exigível sobreviesse uma causa de exoneração do município em causa do cumprimento da sua obrigação. Ora, os requisitos relativos a estas duas hipóteses não se verificam no caso em apreço.

32      A Comissão contesta a argumentação do recorrente.

33      A este respeito, importa, a título liminar, indicar que, em apoio da primeira acusação do primeiro fundamento, o recorrente invocou na réplica um argumento relativo à pretensa aplicação do critério de seletividade. Em resposta a uma questão do Tribunal Geral na audiência, o recorrente precisou que esse argumento não devia ser entendido como um meio baseado na falta de seletividade, mas apenas como expressão de ausência de uma vantagem económica no quadro da análise da condição baseada no princípio do operador em economia de mercado. Não há, pois, que decidir a questão suscitada pela Comissão da admissibilidade do argumento baseado na falta de caráter seletivo da medida.

34      Em segundo lugar, como já salientado, a Comissão, para determinar no caso em apreço a existência de um auxílio e avaliar o seu montante, partiu do princípio de que o Município de Madrid foi considerado inteiramente responsável pela não transferência da parcela B‑32. Ao fazê‑lo, a Comissão não fez uma apreciação diferente da que foi feita pelo referido município e pelo recorrente, que, ao celebrarem o acordo de transação de 2011 com o reconhecimento de dívida a favor do recorrente correspondente ao valor da referida parcela, consideraram que esse município devia suportar a plena responsabilidade da não transferência da referida parcela.

35      Independentemente da questão de saber se a primeira e segunda acusações do primeiro fundamento são, em definitivo, inoperantes, uma vez que visam interrogar a realidade e o âmbito da responsabilidade do Município de Madrid que a Comissão considerou à semelhança desse município e do recorrente, importa salientar que a Comissão salientou na decisão impugnada que um operador em economia de mercado que se encontrasse na situação em que se encontrava o referido município, devia ter pedido um parecer jurídico antes de assinar o acordo de transação de 2011.

36      Importa recordar que, nos termos do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, salvo disposição em contrário dos Tratados, são incompatíveis com o mercado interno, na medida em que afetem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções.

37      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a qualificação de uma medida de «auxílio de Estado», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, exige que estejam cumpridos os seguintes requisitos. Primeiro, deve tratar‑se de uma intervenção do Estado ou através de recursos estatais. Em segundo lugar, essa intervenção deve ser suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. Em terceiro lugar, deve conceder uma vantagem seletiva ao seu beneficiário. Em quarto lugar, deve falsear ou ameaçar falsear a concorrência (v. Acórdão de 6 de março de 2018, Comissão/FIH Holding e FIH Erhvervsbank, C‑579/16 P, EU:C:2018:159, n.o 43 e a jurisprudência aí referida).

38      Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o conceito de «auxílio» é mais geral do que o de «subvenção», pois abrange não apenas prestações positivas, como as próprias subvenções, mas também as intervenções do Estado que, de diversas formas, aliviam os encargos que normalmente oneram o orçamento de uma empresa, pelo que, não sendo subvenções na aceção estrita da palavra, têm a mesma natureza e efeitos idênticos (v. Acórdãos de 8 de maio de 2003, Itália e SIM 2 Multimedia/Comissão, C‑328/99 e C‑399/00, EU:C:2003:252, n.o 35 e jurisprudência aí referida, e de 21 de dezembro de 2016, Comissão/Aer Lingus e Ryanair Designated Activity, C‑164/15 P e C‑165/15 P, EU:C:2016:990, n.o 40 e jurisprudência aí referida).

39      Decorre do artigo 107.o, n.o 1, TFUE que o conceito de auxílio é um conceito objetivo que é função, nomeadamente, da questão de saber se uma medida estatal confere ou não um benefício a uma ou a certas empresas.

40      Assim, para apreciar se uma medida estatal constitui um auxílio, há que determinar se a empresa beneficiária recebe uma vantagem económica que não teria obtido em condições normais de mercado (Acórdãos de 11 de julho de 1996, SFEI e o., C‑39/94, EU:C:1996:285, n.o 60 e jurisprudência aí referida, e de 29 de abril de 1999, Espanha/Comissão, C‑342/96, EU:C:1999:210, n.o 41; v., igualmente, Acórdão de 12 de junho de 2014, Sarc/Comissão, T‑488/11, não publicado, EU:T:2014:497, n.o 90 e jurisprudência aí referida). Assim, segundo jurisprudência já constante, o fornecimento de bens ou serviços em condições preferenciais é suscetível de constituir um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (v. Acórdãos de 11 de julho de 1996, SFEI e o., C‑39/94, EU:C:1996:285, n.o 59 e jurisprudência aí referida; de 1 de julho de 2010, ThyssenKrupp Acciai Speciali Terni/Comissão, T‑62/08, EU:T:2010:268, n.o 57 e jurisprudência aí referida; e de 28 de fevereiro de 2012, Land Burgenland/Comissão, T‑268/08 e T‑281/08, EU:T:2012:90, n.o 47 e jurisprudência aí referida).

41      A aplicação do critério do operador privado numa economia de mercado consiste em comparar o comportamento das autoridades públicas com o que teria um operador privado de dimensão comparável nas mesmas circunstâncias. No caso de o Estado se comportar, na realidade, como o faria qualquer outro operador privado que agisse em condições normais de mercado (v., neste sentido, Acórdão de 1 de outubro de 2015, Electrabel e Dunamenti Erőmű/Comissão, C‑357/14 P, EU:C:2015:642, n.o 144 e jurisprudência aí referida), não existe uma vantagem ligada à intervenção do Estado, pois a entidade beneficiária poderia, em princípio, obter os mesmos benefícios do simples funcionamento do mercado (v. Acórdão de 30 de abril de 2014, Tisza Erőmű/Comissão, T‑468/08, não publicado, EU:T:2014:235, n.o 85 e jurisprudência aí referida; v., também, neste sentido, Acórdão de 28 de fevereiro de 2012, Land Burgenland/Comissão, T‑268/08 e T‑281/08, EU:T:2012:90, n.o 48 e jurisprudência aí referida).

42      No caso em apreço, importa determinar se o recorrente obteve uma vantagem que não teria obtido em condições normais de mercado.

43      Mais precisamente, como corretamente salientou a Comissão no considerando 86 da decisão impugnada, importa determinar se o acordo de transação de 2011 concedeu uma vantagem económica ao recorrente no quadro da aplicação do princípio do operador em economia de mercado.

44      No tocante à questão de saber se, por um lado, a Comissão substituiu a condição baseada no princípio do operador em economia de mercado por um critério formal de existência de um parecer jurídico externo, e, por outro, se existia a obrigação de celebrar o acordo de transação de 2011 antes de tal obrigação ser declarada por um tribunal (v. n.o 30, supra), é útil recordar o que a Comissão considerou, na decisão impugnada, no que se refere à falta de parecer jurídico sobre a responsabilidade do Município de Madrid pela não transferência da parcela B‑32.

45      No considerando 93 da decisão impugnada, a Comissão considerou que, perante as incertezas jurídicas existentes 2011 sobre a questão de saber se o Município de Madrid tinha o dever de indemnizar o recorrente por não lhe ter cedido a parcela B‑32, um operador em economia de mercado que se encontrasse na mesma situação teria pedido um parecer jurídico antes de assinar o acordo de transação de 2011 e salientou que o Município em causa não pediu tal parecer. A Comissão acrescentou, no considerando 94 da decisão impugnada, que pediu ao Reino de Espanha que lhe enviasse «qualquer parecer jurídico pedido pelo [município em causa] antes de celebrar [o acordo de transação]». A Comissão indicou na nota n.o 23 da decisão impugnada que o Reino de Espanha confirmara a inexistência «desse tipo de parecer externo».

46      Assim, à exceção da referida nota, em que a Comissão se refere expressamente a um parecer «externo», resulta dos diferentes considerandos da decisão impugnada, a saber, os considerandos 93, 94, 105 e 108, que não é precisado o que a Comissão entendeu por parecer jurídico e também não é indicado que ela censura a falta de um parecer elaborado por um organismo independente.

47      Inquirida na audiência, a Comissão confirmou que, se tivesse recebido qualquer outro parecer jurídico, tê‑lo‑ia tido em conta.

48      Além disso, resulta dos documentos comunicados pelas partes na fase escrita do processo, assim como das respostas das partes às questões colocadas na audiência, que a Comissão perguntou realmente ao Reino de Espanha, por correio eletrónico de 2 de março de 2016, durante o procedimento administrativo, se o Município de Madrid solicitara um parecer jurídico independente sobre as suas obrigações e as opções que tinha disponíveis.

49      Ora, foi o Reino de Espanha que indicou, no seu correio eletrónico de resposta de 9 de março de 2016, que, se por parecer jurídico independente se devia entender um parecer externo, as autoridades competentes tinham indicado que não tinham procedido a nenhuma consulta desse tipo.

50      Não foi junto nenhum documento que prove que a Comissão tenha dado qualquer resposta a esta última mensagem de correio eletrónico precisando que o parecer jurídico independente não significava apenas um parecer externo.

51      Contudo, como salienta a Comissão, a aplicabilidade do critério do investidor privado implica que se proceda, inequivocamente e com base em elementos objetivos e verificáveis, uma avaliação comparável à que um operador privado poderia ter acesso antes ou no momento em que tomou a decisão em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de junho de 2012, Comissão/EDF, C‑124/10 P, EU:C:2012:318, n.os 81 a 83, e de 24 de outubro de 2013, Land Burgenland e o./Comissão, C‑214/12 P, C‑215/12 P e C‑223/12 P, EU:C:2013:682, n.os 57 e 58).

52      Para responder ao pedido da Comissão, o Reino de Espanha podia ter usado toda e qualquer análise jurídica que o Município de Madrid tenha pedido nas condições indicadas no n.o 51, supra.

53      No caso em apreço, o recorrente sustentou na audiência que o Município de Madrid recebeu dois relatórios técnicos dos seus próprios serviços antes de celebrar o acordo de transação de 2011. A prova da existência desses relatórios seria feita pela leitura da exposição de motivos do referido acórdão, que reproduz as conclusões do referido município a esse respeito.

54      Ora, importa constatar, por um lado, que, nem no decurso do processo na Comissão nem no Tribunal Geral, foram comunicados esses relatórios dos serviços municipais que alegadamente foram recebidos pelo Município de Madrid. Apesar dos múltiplos contactos havidos entre o Reino de Espanha e a Comissão durante o processo administrativo, e das possibilidades que foram dadas ao referido município de participar no processo, não foi comunicado à Comissão nenhum parecer jurídico sobre a responsabilidade desse município no tocante à não transferência da parcela B‑32.

55      Por outro lado, embora a exposição dos motivos do acordo de transação de 2011 contenha algumas indicações factuais sobre a regulamentação aplicável à parcela B‑32 e a obrigação do Município de Madrid transmitir essa parcela, tal exposição não constitui uma verdadeira análise jurídica das causas que levam a concluir pela responsabilidade desse município pela não transmissão da referida parcela. Não é designadamente indicada, em detalhe, a evolução da legislação aplicável a essa parcela desde a celebração do convénio de 1991 até ao acordo de transação de 2011. Também não foi analisado quem seria responsável, e por que razões, pela não transmissão da parcela em questão. Pelo contrário, apenas é constatado, como salienta a Comissão, que a cessão da parcela em causa não era possível, salientando‑se a boa vontade das partes para chegarem a um acordo num contexto em que a responsabilidades de cada uma não eram claras.

56      No que se refere à contestação pelo recorrente do alegado argumento da Comissão segundo o qual o Município de Madrid não tinha a obrigação de fazer o acordo de transação de 2011 enquanto essa obrigação não fosse declarada por um tribunal, basta salientar que essa constatação não é factualmente exata, uma vez que, na decisão impugnada, a Comissão não considerou em nenhum momento que a obrigação de fazer o acordo de transação devesse resultar de uma decisão judicial.

57      Importa acrescentar que, contrariamente ao processo que deu origem ao Acórdão de 27 de setembro de 1988, Asteris e o. (106/87 à 120/87, EU:C:1988:457), no qual as autoridades nacionais foram condenadas a reparar um prejuízo resultante da ilegalidade judicialmente declarada, a responsabilidade do Município de Madrid, no presente processo, não foi judicialmente declarada e a compensação concedida resulta do acordo de transação de 2011, que visava pôr fim a um diferendo entre as partes nos termos do qual apenas o Município suportaria a responsabilidade pela não transferência da parcela B‑32.

58      A Comissão não incorreu em erro ao concluir, no considerando 105 da decisão impugnada, que um operador prudente em economia de mercado confrontado com uma situação como a do caso em apreço teria pedido um parecer jurídico antes de assinar o acordo de transação de 2011 e de aceitar a plena responsabilidade jurídica da impossibilidade de ceder a parcela B‑32 nos termos do convénio de execução de 1998.

59      Tal conclusão é ainda mais justificada se tivermos em conta o quadro jurídico aplicável à parcela B‑32 desde a data do convénio de execução de 1998 até à data da celebração do acordo de transação de 2011 e considerando as competências partilhadas em matéria urbanística entre a Comunidade Autónoma de Madrid e o Município de Madrid, bem como o conhecimento desse quadro jurídico por parte do recorrente.

60      A este respeito, é útil precisar que resulta dos autos que, desde o convénio de 1996 até ao acordo de transação de 2011, o regime jurídico aplicável à parcela B‑32 não facilitava a sua cessão.

61      De acordo com os factos tal como fixados na decisão impugnada e que não são contestados, quando o recorrente e a Comunidade Autónoma de Madrid assinaram o convénio de 1996, as parcelas e os direitos a ceder deviam ser determinados ulteriormente e as partes fixaram o montante da transação em 27 milhões de euros. À data da celebração do convénio de execução de 1998 foi acordada a cessão da parcela B‑32 ao recorrente e o valor dessa parcela foi estimado pelos serviços técnicos do Município de Madrid em 595 194 euros. Foi tido em conta o facto de só ter sido concluído o ordenamento urbano, mas não a urbanização da zona e de também não ter sido começada qualquer construção.

62      Segundo os factos igualmente fixados na decisão impugnada e também não contestados, durante o ano de 1998, a parcela B‑32 não foi transferida do Município de Madrid para o recorrente pelo facto de este município não ter ainda a propriedade legal da parcela. No convénio de execução de 1998 estava previsto que a cessão devia ser efetuada sete dias após a inscrição no Registo Predial da referida parcela B‑32 em nome do Município de Madrid. Em 28 de julho de 2000, o Município de Madrid tornou‑se proprietário da referida parcela, mas a parcela só foi inscrita no registo em 11 de fevereiro de 2003. A parcela não foi transferida e era considerada, no plano local de urbanismo de 28 de julho de 1995, como um equipamento desportivo de base e estava integrada no PGU aprovado em 17 de abril de 1997 pelo Município e pela Comunidade Autónoma de Madrid.

63      Resulta da decisão impugnada que, segundo a Ley 9/2001, de 17 de julio 2001, del Suelo de la Comunidad de Madrid (Lei 9/2001, de 17 de julho de 2001, relativa ao plano de urbanização da Comunidade Autónoma de Madrid), o conjunto dos terrenos, instalações, construções e edifícios devem respeitar o destino que resulta da sua afetação urbanística correspondente e, segundo o artigo 7.7.2, alínea a), do PGU, as parcelas que relevam da categoria de «equipamento desportivo» são propriedade pública. A referida lei estava em vigor quando o Município de Madrid foi inscrito como proprietário da parcela B‑32 em 2003. A mesma lei consagra uma obrigação de propriedade pública para terrenos considerados como equipamentos desportivos de base e a cessão é proibida uma vez que a natureza pública da parcela proíbe a sua alienação.

64      O recorrente não contesta que, à data da celebração do convénio de execução de 1998, de acordo com o PGU, a parcela B‑32 estava afeta a uso desportivo de base. O recorrente também não contesta que, em 2003, quando o Município de Madrid devia ter cumprido a sua obrigação de cessão, a referida parcela estava integrada no domínio público municipal e era inalienável.

65      Importa observar que o recorrente sabia, portanto, que, à data da celebração do convénio de execução de 1998, o Município de Madrid não era proprietário da parcela B‑32, e que esta parcela correspondia a uma categoria especial, ou seja, a dos equipamentos desportivos de base, e que era necessário, pelo menos, que o referido município a adquirisse e que a inscrevesse no registo antes de a transmitir para o recorrente.

66      O recorrente também não contestou que, nos termos do artigo 7.7.2, alínea a), do PGU, aprovado em 17 de abril de 1997 e, portanto, aplicável à data da celebração do convénio de execução de 1998, as parcelas da categoria «equipamento desportivo de base» eram propriedade pública. Ao celebrar o dito convénio de execução, o recorrente sabia, portanto, que, antes de lhe ser transmitida a propriedade da parcela B‑32, esta tinha de ser desclassificada para poder ser transferida, pois, segundo o direito espanhol, as parcelas de propriedade pública não podem ser cedidas.

67      Resulta da decisão impugnada e das respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral que o PGU é um diploma que não é apenas da competência do Município de Madrid, mas também da Comunidade Autónoma de Madrid. O referido município não pode alterar o PGU de motu proprio, pois tem de propor essa alteração à Comunidade Autónoma.

68      Importa acrescentar que o quadro legal aplicável à parcela B‑32 se alterou entre a data de celebração do convénio de execução de 1998 e a da celebração do acordo de transação de 2011. A Lei 9/2001, de 17 de julho de 2001, relativa ao plano urbanístico da Comunidade Autónoma de Madrid, estabeleceu que todos os terrenos, instalações, construções e edificações devem respeitar a afetação resultante da sua qualificação e da sua afetação urbanística.

69      As partes concordam em considerar que, embora as parcelas com a categoria de «equipamento desportivo de base» fossem já propriedade pública em virtude do artigo 7.7.2, alínea a), do PGU, a Lei 9/2001 de 17 de julho de 2001 sobre o plano urbanístico da Comunidade Autónoma de Madrid tornou ainda mais difícil a transferência da parcela B‑32.

70      Importa acrescentar que, na medida em que nem o Reino de Espanha nem o Município de Madrid nem o recorrente apresentaram à Comissão uma análise jurídica detalhada relativa à responsabilidade desse município pela não transferência da parcela B‑32, não cabia à Comissão efetuar essa análise e proceder a uma apreciação global que tivesse em conta, além dos elementos fornecidos, todo e qualquer outro elemento pertinente que lhe permitisse determinar se a medida em questão correspondia à qualidade de operador em economia de mercado ou à de autoridade pública do Reino de Espanha (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de junho de 2012, Comissão/EDF, C‑124/10 P, EU:C:2012:318, n.o 86, e de 24 de outubro de 2013, Land Burgenland e o./Comissão, C‑214/12 P, C‑215/12 P e C‑223/12 P, EU:C:2013:682, n.o 60). A Comissão não podia ter o ónus da prova de que o referido município não tinha a obrigação de indemnizar o prejuízo causado pelo incumprimento das suas obrigações contratuais e de determinar o nível máximo da responsabilidade do mesmo município.

71      Resulta do que precede que o primeiro e segundo fundamentos improcedem.

 Terceira acusação do primeiro fundamento e segundo fundamento

72      Com a terceira acusação do primeiro fundamento e com o segundo fundamento, o recorrente contesta, em substância, a avaliação da vantagem e, designadamente, o valor da parcela B‑32 fixado pela Comissão.

73      O recorrente sustenta que o Município de Madrid não podia ter‑se exonerado da sua responsabilidade pelo incumprimento do convénio de execução de 1998 e que a exposição financeira desse município não era equivalente ao preço da parcela B‑32 para o referido município. O valor de mercado da referida parcela, como foi prometido ao recorrente, seria o valor do direito de receber a parcela em plana propriedade, sem restrições quanto à sua revenda.

74      O grau máximo de exposição financeira do Município de Madrid no caso de um litígio com o recorrente e se o município fosse juridicamente responsável pelo incumprimento do convénio de execução de 1998 situar‑se‑ia entre 33 e 240 milhões de euros, de acordo com a estimativa do relatório do escritório de consulta imobiliária. Em todo o caso, a exposição financeira seria superior a 4 275 000 euros. O recorrente sustenta que a Comissão não contestou que teria sido possível alterar a afetação da parcela B‑32 para a tornar passível de cessão.

75      O recorrente acrescenta que a exposição financeira do Município de Madrid, mesmo no caso de não ser considerado responsável pelo incumprimento do contrato (no caso de impossibilidade originária ou superveniente de cessão com efeito liberatório), não seria nula, mas claramente superior ao valor da parcela B‑32. O nível máximo de exposição financeira do referido município equivalia a 40 milhões de euros, no caso de o convénio de execução de 1998 ser considerado nulo, ou a 33 milhões de euros, se fosse decidida a resolução do convénio de execução por impossibilidade superveniente de cumprimento.

76      O recorrente acrescenta que a Comissão partiu de uma estimativa manifestamente errada do valor de mercado da parcela B‑32 e baseia‑se em três outras estimativas que atribuem a essa parcela um valor que oscila entre os 22 e os 25 milhões de euros.

77      Após ter indicado os diferentes cenários previstos no escritório de consulta imobiliária, ou seja, os cenários SE‑00, SE‑01, SE‑02 e SE‑03, o recorrente sustenta que o cenário SE‑03, de acordo com o qual a parcela B‑32 seria objeto de um direito de superfície, avaliado em 4 275 000 euros, que permitiria uma exploração durante 30 anos como equipamento desportivo, é destituído de valor probatório.

78      O cenário SE‑03 não permitiria determinar o valor de mercado da parcela B‑32, mas apenas um valor de investimento.

79      Aliás, a estimativa do valor de mercado efetuada pelo escritório de consulta imobiliária estaria viciada por erros metodológicos evidentes. Por um lado, só foi considerado um direito de superfície, o qual foi incorretamente avaliado. A estimativa não respeitaria as regras aplicáveis à avaliação dos direitos de superfície previstas na Orden Ministerial ECO/805/2003, de 27 de marzo, sobre normas de valoración de bienes inmuebles y de determinados derechos para ciertas finalidades financieras (Decreto Ministerial ECO/805/2003, de 27 de março de 2003, relativo às regras de avaliação de bens imóveis e de determinados direitos com finalidades financeiras). Segundo a estimativa do recorrente, o valor do direito de superfície oscilaria entre os 23 e os 24 milhões de euros, consoante a sua duração. Por outro lado, o projeto de investimento considerado no relatório do escritório de consulta imobiliária não teria respeitado o critério de utilização máxima e ótima e seria inadequado para maximizar o valor da parcela B‑32.

80      A pertinência das outras avaliações disponíveis além da do escritório de consulta imobiliária não terá sido suficientemente impugnada.

81      A Comissão contesta a argumentação do recorrente.

82      A título liminar, importa referir que, segundo o recorrente, a exposição financeira do Município de Madrid pelo incumprimento do convénio de execução de 1998 ultrapassava em qualquer caso, quer o Município fosse o não responsável por esse incumprimento, o valor de mercado da parcela B‑32. Assim, não seria necessário que o Tribunal Geral se pronuncie sobre esse valor.

83      A este respeito, importa referir, por um lado, que o Município de Madrid não fez prova de que tenha pedido um parecer jurídico antes de fazer o acordo de transação de 2011 para esclarecer quem devia suportar, face ao direito espanhol, a responsabilidade pela não transferência da parcela B‑32. Por outro lado, segundo o referido acordo de transação, foram o recorrente e o referido município que se basearam no valor da referida parcela, calculado pelos serviços técnicos desse município, para indemnizar o recorrente pela impossibilidade de lhe ceder a parcela como previsto no convénio de execução de 1998.

84      Nestas condições, não obstante a conclusão a que a Comissão possa ter chegado previamente, ou seja, que um operador prudente em economia de mercado não teria, nas condições do caso em apreço, assinado o acordo de transação de 2011 sem um parecer jurídico, não poderia censurar‑se aquela instituição, no tocante à apreciação da existência de uma vantagem económica e do seu montante, por se ter interessado pelo valor da parcela B‑32 depois de ter assumido a premissa da responsabilidade do Município de Madrid.

85      Isto dito, é útil referir que o comportamento do investidor privado, que deve ser comparado com o de um investidor público, não é necessariamente o de um investidor comum que coloca capitais com vista à sua rentabilização a mais ou menos curto termo. Esse comportamento deve ser, pelo menos, o de uma holding privada ou de um grupo privado de empresas que prossiga uma política estrutural, global ou setorial, orientado por perspetivas de rentabilidade a mais longo prazo (Acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de março de 1991, Itália/Comissão, C‑305/89, EU:C:1991:142, n.o 20).

86      Nestas condições, a aplicação do critério do investidor privado não visa determinar qual podia ser a rentabilidade máxima obtida por um investidor num setor particular ou no conjunto da economia, mas determinar se um investidor privado comparável podia ter procedido, nas circunstâncias do caso, ao investimento em causa. Trata‑se, portanto, de determinar se o investimento em causa revela uma certa racionalidade económica, pelo menos a longo prazo (Acórdão de 3 de julho de 2014, Espanha e o./Comissão, T‑319/12 e T‑321/12, não publicado, EU:T:2014:604, n.o 42).

87      Segundo esta jurisprudência, importa, portanto, apreciar se, tendo em conta a intenção inicial das partes do convénio de execução de 1998, mas também a lei aplicável à parcela B‑32 à data da celebração do referido convénio de execução e também à data da celebração do acordo de transação de 2011, é razoável pensar que um operador em economia de mercado teria aceitado assumir a totalidade da compensação pela não transferência da parcela em questão, que foi estimada no valor da parcela, 22 690 000 euros.

88      Acrescente‑se que, no que se refere ao âmbito da fiscalização do Tribunal Geral, de acordo com a jurisprudência, embora a fiscalização seja, em princípio, total no que se refere à questão de saber se uma medida entra no campo de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, o Tribunal de Justiça declarou que essa fiscalização jurisdicional é limitada quando as apreciações feitas pela Comissão tenham caráter técnico ou complexo [v. Acórdão de 22 de dezembro de 2008, British Aggregates/Comissão, C‑487/06 P, EU:C:2008:757, n.o 114 e jurisprudência aí referida; Acórdão de 28 de outubro de 2015, Hammar Nordic Plugg/Comissão, T‑253/12, EU:T:2015:811, n.o 30 (não publicado)].

89      A fiscalização que os órgãos jurisdicionais da União exercem sobre as apreciações económicas complexas feitas pela Comissão é uma fiscalização estrita, que se limita necessariamente à verificação do respeito das regras processuais e de fundamentação, da exatidão material dos factos, bem como da inexistência de erro manifesto de apreciação e de desvio de poder (v. Acórdão de 2 de setembro de 2010, Comissão/Scott, C‑290/07 P, EU:C:2010:480, n.o 66).

90      Como foi já declarado, para verificar se a venda de um terreno por uma autoridade pública a uma entidade privada constitui um auxílio de Estado, a Comissão deve aplicar o critério do investidor privado numa economia de mercado, a fim de verificar se o preço pago pelo presumível beneficiário do auxílio corresponde ao preço que um investidor privado, atuando em condições de concorrência normais, poderia ter fixado. Em geral, a utilização deste critério implica que a Comissão faça uma apreciação económica complexa (Acórdão de 2 de setembro de 2010, Comissão/Scott, C‑290/07 P, EU:C:2010:480, n.o 68).

91      Importa acrescentar que, não tendo a parcela B‑32 sido transferida, foi prevista uma compensação cuja avaliação se caracteriza pela ausência de um procedimento de proposta incondicional. Tal circunstância pode tornar igualmente complexa a tarefa da Comissão (v., por analogia, Acórdão de 2 de setembro de 2010, Comissão/Scott, C‑290/07 P, EU:C:2010:480, n.o 70).

92      Só um erro manifesto na determinação do valor da parcela B‑32 seria, portanto, apto a viciar de ilegalidade a decisão impugnada [v., neste sentido, Acórdão de 28 de outubro de 2015, Hammar Nordic Plugg/Comissão, T‑253/12, EU:T:2015:811, n.o 34 (não publicado)].

93      No caso em apreço, resulta da decisão impugnada e de outros elementos dos autos que as diferentes estimativas realizadas para determinar o valor da parcela B‑32 são fortemente divergentes.

94      Para o convénio de execução de 1998, o valor estimado da parcela B‑32 foi avaliado pelos funcionários da direção municipal de urbanismo em 595 194 euros. É afirmado que essa avaliação foi efetuada «de acordo com o método de avaliação previsto no direito espanhol», sem mais precisões.

95      Para o acordo de transação de 2011, os serviços do Município de Madrid basearam‑se no valor cadastral, que, segundo o recorrente, tem em conta fatores como o valor do terreno, o valor da construção, a localização e o mercado em causa. No relatório publicado em 27 de julho de 2011, os mesmos serviços avaliaram a parcela B‑32 em 22 693 054,44 euros. Os pormenores da avaliação estão expostos no n.o 36 da decisão impugnada e não foram contestados pelas partes. É este valor que foi considerado no acordo de transação de 2011.

96      Após a celebração do acordo de transação de 2011, os funcionários do registo cadastral espanhol, que dependem do Ministério da Economia e das Finanças espanhol, atualizaram o valor da parcela B‑32 e avaliaram‑no como não inferior a 25 776 296 euros. Segundo o recorrente, este tipo de atualização visa aproximar o valor cadastral do valor de mercado, não podendo este último ser excedido. O valor cadastral apoia‑se, por exemplo, nos dados relativos às transações reais do mercado. Os referidos funcionários são independentes do Município de Madrid.

97      O recorrente encomendou e juntou o relatório do escritório de consulta imobiliária no qual o valor de mercado da parcela B‑32 foi estimado, em 1998, em 574 000 euros, o que, portanto, difere em muito pouco do valor considerado no convénio de execução de 1998. No mesmo relatório, o valor de mercado da mesma parcela em 2011 foi estimado em 22 690 000 euros, o que corresponde também aproximadamente ao valor considerado no acordo de transação de 2011. O recorrente indica que o relatório do escritório de consulta imobiliária utilizou o método de avaliação residual estática, com base numa hipótese de venda de diversas unidades pouco depois da construção de uma infraestrutura desportiva no terreno em causa. Foi tida em conta a transmissão da propriedade plena sem restrições de revenda e o objetivo indemnizatório do acordo de transação.

98      No relatório do escritório de consulta imobiliária, encomendado pela Comissão, foram considerados quatro cenários: o cenário SE‑00, segundo o qual o terreno é propriedade pública e não tem valor de mercado, mas apenas um preço de custo, ou seja, 3 930 000 euros; o cenário SE‑01, segundo o qual o terreno se destina à construção de habitação social e é avaliado em 18 000 000 euros; o cenário SE‑02, segundo o qual o valor de mercado do terreno corresponde a 10 % do valor neste setor, ou seja 12 245 000 euros; o cenário SE‑03, segundo o qual a parcela B‑32 não pode ser alienada, podendo apenas ser objeto de direito de superfície que permite a sua exploração por 30 anos como equipamento desportivo, ficando excluída a revenda ulterior, o que leva a um valor de 4 275 000 euros.

99      A Comissão indicou ter considerado, no caso em apreço, o valor resultante do cenário SE‑03 do relatório do escritório de consulta imobiliária, tendo em conta que afetação urbanística do terreno determina a sua utilização e exclui a sua revenda.

100    Em primeiro lugar, importa considerar que a Comissão não cometeu um erro manifesto ao considerar o valor resultante desse cenário e que foi estimado tendo em conta o direito de superfície da parcela B‑32.

101    Com efeito, não é contestado que fosse necessário colocar‑se à data do acordo de transação de 2011 para avaliar a parcela B‑32. Esta data corresponde à da compensação e da indemnização decididas no acordo de transação e que estão na origem do presente processo.

102    Ora, como resulta do regime jurídico aplicável à parcela B‑32 nessa data, ela integrava o domínio público e não podia ser alienada, apenas podendo ser constituído um direito de superfície.

103    Como salientou a Comissão corretamente no considerando 123 da decisão impugnada, no caso de ser pedida uma indemnização ao Município de Madrid, o valor da parcela B‑32 deveria corresponder ao valor que a mesmo tinha para o referido município e não ao valor hipotético que teria se fosse transmissível.

104    No que se refere ao direito de superfície, o recorrente sustenta que esse direito não foi avaliado de forma correta e que a sua avaliação não cumpre as regras aplicáveis à avaliação dos direitos de superfície em Espanha.

105    Ora, importa considerar sobre este ponto que a Comissão não incorreu em erro manifesto de apreciação ao aceitar o cenário SE‑03 do relatório do escritório de consulta imobiliária.

106    Com efeito, os outros cenários do relatório do escritório de consulta imobiliária e as outras estimativas em que se baseia o recorrente estão muito mais distantes da situação concreta pelo facto de não serem baseadas na hipótese de uma avaliação de um direito de superfície de uma parcela que faz parte do domínio público, mas no valor de um bem que podia ser vendido em plena propriedade.

107    O cenário SE‑03 do relatório do escritório de consulta imobiliária era a única possibilidade de que a Comissão dispunha para avaliar o direito de superfície da parcela B‑32.

108    O recorrente sustenta que a Comissão partiu da hipótese errada de que o direito de superfície não podia ser vendido.

109    É verdade que está indicado no considerando 111 da decisão impugnada que a afetação urbanística do terreno determina a sua utilização e exclui a sua revenda. Em resposta a uma questão do Tribunal Geral, a Comissão respondeu ter privilegiado a hipótese que considera o valor de investimento e a exploração do direito de superfície por 30 como equipamento desportivo.

110    Ora, tal hipótese é também a mais próxima daquilo que o recorrente tinha em mente em 1996 com a sua operação de permuta de terrenos com o Município de Madrid, uma vez que essa troca foi feita inicialmente para que o recorrente explorasse diretamente os terrenos que receberia desse Município.

111    Finalmente, no tocante à acusação baseada na violação do princípio de boa administração, importa salientar que a Comissão pediu um relatório elaborado com base em vários cenários e analisou esses diferentes cenários e outras avaliações realizadas e, pura e simplesmente, não aceitou as conclusões do relatório do escritório de consulta imobiliária.

112    Quanto ao argumento do recorrente baseado nas diferenças que existem entre a versão inicial e final do relatório do escritório de consulta imobiliária, basta salientar que os valores considerados nessas duas versões para o cenário SE‑03 são praticamente idênticos, como salientou com acerto a Comissão, ou seja 4 270 000 euros no caso do relatório inicial e 4 275 000 euros no caso do relatório final.

113    Resulta do que antecede que o primeiro e segundo fundamentos improcedem.

 Quanto ao terceiro fundamento

114    O recorrente sustenta que a Comissão infringiu o artigo 107.o, n.o 1, TFUE, o artigo 296.o TFUE, o dever de fundamentação e o princípio de boa administração consagrado no artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, uma vez que a Comissão contestou o valor da parcela B‑32 para determinar a existência de uma vantagem, reconhecendo que o valor das outras parcelas cedidas ao recorrente a título de indemnização no quadro do acordo de transação de 2011 era correto. Ora esse valor teria sido calculado com o mesmo método de avaliação utilizado pelo Município de Madrid para a parcela B‑32. Invocando outros processos, o recorrente sustenta que a Comissão tinha o ónus da prova da existência do auxílio de Estado e não podia limitar‑se a avaliar de maneira seletiva e isolada determinadas prestações da transação. Aliás, o recorrente sustenta que estava obrigado a aceitar a avaliação dos terrenos efetuada pelo referido município, a despeito da sua subavaliação. Em virtude do direito espanhol, não dispunha de nenhuma via de recurso que lhe permitisse contestar a avaliação para reclamar a diferença entre a avaliação contratual e o valor de mercado. Se a Comissão tivesse examinado se as prestações eram equilibradas teria concluído que o montante do auxílio alegadamente concedido não teria ultrapassado em nenhum caso 10 931 835 euros.

115    A Comissão salienta que o objeto do inquérito do presente processo consistia em examinar a eventual existência de um auxílio de Estado decorrente da indemnização paga pelo Município de Madrid na sequência do incumprimento, pela sua parte, do convénio de execução de 1998 e em determinar se um operador prudente em economia de mercado teria aceitado plenamente as suas responsabilidades sem pareceres jurídicos prévios, tendo em conta as inúmeras incertezas jurídicas, assim como verificar se a dívida contraída pelo referido município correspondia à exposição financeira que esse operador aceitaria pelo valor específico da parcela B‑32 em 2011. A decisão de abertura do processo e a decisão impugnada foram claras a este respeito. Segundo a Comissão, é também necessário apreciar a fundamentação da decisão relativamente ao seu contexto, sendo que ela não era obrigada a responder a todos os argumentos invocados no decurso do processo administrativo por uma parte interessada. A Comissão sustenta que fundamentou suficientemente a sua decisão, em conformidade com a jurisprudência, e acrescenta que o objeto do inquérito não consistia em determinar se a recorrente recebera um auxílio ilegal do ponto de vista da totalidade dos compromissos assumidos no quadro do acordo de transação de 2011. Os processos invocados pelo recorrente seriam assim destituídos de pertinência e se o recorrente tivesse recebido uma prestação inferior à acordada teria podido exigir o valor fixado no acordo de transação de 2011, o que não terá feito.

116    A este respeito, resulta da jurisprudência que, para apreciar se a vantagem podia ter sido obtida em condições normais de mercado, a Comissão é obrigada a fazer uma análise completa de todos os elementos pertinentes da operação litigiosa e do seu contexto (v. Acórdão de 30 de junho de 2015, Países Baixos e o./Comissão, T‑186/13, T‑190/13 e T‑193/13, não publicado, EU:T:2015:447, n.o 88 e jurisprudência aí referida).

117    Foi igualmente declarado na jurisprudência que, tratando‑se da apreciação do valor de um auxílio sob a forma de venda de um terreno por uma entidade pública a um particular por a um preço alegadamente preferencial, o princípio do investido privado em economia de mercado era aplicável e o valor do auxílio seria igual à diferença entre o que o beneficiário pagou efetivamente e aquilo que deveria ter pagado à época em condições normais de mercado para comprar um terreno equivalente a um vendedor do setor privado (v. Acórdão de 30 de junho de 2015, Países Baixos e o./Comissão, T‑186/13, T‑190/13 e T‑193/13, não publicado, EU:T:2015:447, n.o 77 e jurisprudência referida).

118    Importa precisar que, segundo a jurisprudência, para apreciar a legalidade da decisão impugnada é necessário ter em conta a informação de que a Comissão dispunha ou podia dispor na data em que tomou a sua decisão. A este respeito, caso se verificasse que a apreciação da Comissão é desmentida ou posta em causa por informação de que ela não tivera conhecimento ao longo do procedimento administrativo, haveria que verificar se tais elementos podiam ser conhecidos e tomados em consideração por ela em tempo útil e, sendo esse o caso, se esses elementos de informação deviam normalmente ter sido tomados em consideração pela Comissão, pelo menos como dados pertinentes para aplicar o critério do investidor privado (v. Acórdão de 30 de junho de 2015, Países Baixos e o./Comissão, T‑186/13, T‑190/13 e T‑193/13, não publicado, EU:T:2015:447, n.o 90 e jurisprudência aí referida).

119    No caso em apreço, importa sublinhar que a Comissão reconheceu ter analisado a eventual existência de um auxílio de Estado decorrente da indemnização paga pelo Município de Madrid no quadro do acordo de transação de 2011.

120    É importante salientar que, segundo o acordo de transação de 2011, as partes acordaram em que a indemnização seria feita por substituição da cessão da parcela B‑32 pela cessão de outras parcelas pelo Município de Madrid e ainda pela compensação das dívidas recíprocas. O resultado foi um crédito líquido remanescente de 8,04 euros do Real Madrid devido pelo Município de Madrid.

121    O acordo de transação de 2011 não visava, portanto, unicamente o reconhecimento de dívida decorrente da não transferência da parcela B‑32, mas visava também indemnizar o recorrente por essa não transferência, transferindo‑lhe outras parcelas e compensando dívidas recíprocas.

122    Ora, é facto assente que as parcelas cedidas em lugar da parcela B‑32 não foram objeto de avaliação pela Comissão, tendo a Comissão utilizado os valores constantes do acordo de transação de 2011.

123    Em resposta às questões escritas colocadas pelo Tribunal Geral, o recorrente confirmou, sem contestação por parte da Comissão, que, no decurso do processo administrativo, tinha informado da existência de uma diferença entre o valor das parcelas transferidas nos termos do acordo de transação de 2011 e o valor dessas parcelas indicado no relatório do escritório de consulta imobiliária e, portanto, da possível sobreavaliação dessas parcelas.

124    Além disso, o recorrente salientara, no decurso do procedimento administrativo, que o relatório do escritório de consulta imobiliária não tinha nenhuma avaliação das parcelas transferidas em virtude do acordo de transação de 2011.

125    Ao examinar unicamente o valor da parcela B‑32, a Comissão não tomou em consideração todos os elementos da operação litigiosa e o seu contexto. A Comissão não procedeu, como devia, a uma análise completa de todos os elementos pertinentes para demonstrar não apenas a questão da avaliação do montante do auxílio, mas também e sobretudo a da existência de uma vantagem decorrente da medida em causa, considerada em todos os seus elementos.

126    Importa precisar que, em resposta às questões colocadas pelo Tribunal Geral, a Comissão invocou o facto de não ser obrigada a considerar os factos posteriores aos que foram objeto do processo de análise assim como vantagens sem relação com a medida examinada.

127    Contudo, basta referir que a estimativa das parcelas transferidas nos termos do acordo de transação de 2011 constava do relatório do escritório de consulta imobiliária comunicado no decurso do procedimento administrativo. Além disso, a medida examinada não se limitava ao simples reconhecimento da dívida resultante da não transferência da parcela B‑32, mas à eventual existência de um auxílio de Estado decorrente da indemnização concedida pelo Município de Madrid no quadro do acordo de transação de 2011.

128    A Comissão não demonstrou por isso suficientemente que a medida em causa conferia uma vantagem ao recorrente. Não estando preenchida uma das condições cumulativas referidas no n.o 37, supra, a Comissão não podia qualificar a media em causa de auxílio de Estado, no sentido do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

129    Resulta do exposto que há que julgar improcedente o terceiro fundamento. Portanto, a decisão impugnada deve ser anulada.

 Quanto às despesas

130    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la a suportar, além das suas próprias despesas, as efetuadas pela recorrente, em conformidade com o pedido desta.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quarta Secção)

declara e decide:

1)      A Decisão (UE) 2016/2393 da Comissão, de 4 de julho de 2016, relativa ao auxílio estatal SA.33754 (2013/C) (ex 2013/NN) concedido por Espanha ao Real Madrid CF, é anulada.

2)      A Comissão Europeia suportará as suas próprias despesas e as despesas efetuadas pelo Real Madrid Club de Fútbol.

Kanninen

Schwarcz

Iliopoulos

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 22 de maio de 2019.

Assinaturas


*      Língua do processo: espanhol.