Language of document : ECLI:EU:T:2023:365

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

28 de junho de 2023 (*)

«Marca da União Europeia — Processo de oposição — Pedido de marca tridimensional da União Europeia — Forma de uma canícula dentro de uma garrafa — Marcas nacionais anteriores — Motivo relativo de recusa — Artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento (CE) n.o 40/94 [atual artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento (UE) 2017/1001] — Conceito de “agente” ou de “representante” — Exigência de um acordo contratual direto»

No processo T‑145/22,

CEDC International sp. z o.o., com sede em Oborniki Wielkopolskie (Polónia), representada por M. Fijałkowski, avocat,

recorrente,

contra

Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), representado por D. Stoyanova‑Valchanova e V. Ruzek, na qualidade de agentes,

recorrido,

sendo a outra parte no processo na Câmara de Recurso do EUIPO, interveniente no Tribunal Geral

Underberg AG, com sede em Dietlikon (Suíça), representada por A. Renck e C. Stöber, avocats,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção),

composto por: M. J. Costeira, presidente, M. Kancheva (relatora) e U. Öberg, juízes,

secretário: R. Ūkelytė, administradora,

vistos os autos,

após a audiência de 19 de janeiro de 2023,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso baseado no artigo 263.o TFUE, a recorrente, CEDC International sp. z o.o., pede a anulação parcial da decisão da Quinta Câmara de Recurso do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO) de 22 de dezembro de 2021 (processo R 1954/2020‑5) (a seguir «decisão impugnada»).

 Antecedentes do litígio

2        Em 1 de abril de 1996, a interveniente, a Underberg AG, apresentou um pedido de registo de marca da União Europeia ao EUIPO, ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca da União Europeia (JO 2009, L 78, p. 1), conforme alterado, ele próprio substituído pelo Regulamento (UE) 2017/1001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, sobre a marca da União Europeia (JO 2017, L 154, p. 1)].

3        A marca cujo registo foi pedido é o sinal tridimensional representado da seguinte forma:

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4        Esta representação da marca pedida era acompanhada da descrição seguinte: «O objeto da marca é uma canícula de cor verde‑acastanhada, colocada dentro de uma garrafa e o comprimento da canícula corresponde a cerca de três quartos da altura da garrafa.»

5        A marca pedida designava os produtos da classe 33 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e que correspondem à descrição seguinte: «Bebidas espirituosas e licores».

6        Em 15 de setembro de 2003, a Przedsiębiorstwo Polmos Białystok (Spółka Akcyjna) (a seguir «Polmos»), a antecessora legal da recorrente, por esta substituída na sequência de uma fusão por absorção ocorrida em 27 de julho de 2011, deduziu oposição ao abrigo do artigo 42.o do Regulamento n.o 40/94 (que passou a artigo 41.o do Regulamento n.o 207/2009, e em seguida a artigo 46.o do Regulamento 2017/1001), ao registo da marca requerida para os produtos referidos no n.o 5, supra.

7        A oposição baseava‑se, nomeadamente, nas seguintes marcas nacionais anteriores:

—        a marca tridimensional francesa registada sob o número 95588457, depositada em 18 de setembro de 1995, registada em 18 de abril de 1997 em nome da Przedsiębiorstwo Przemyslu Spirytusowego Polmos (a seguir «PPS Polmos»), cedida à Polmos em 28 de agosto de 2001, transmitida à recorrente em 28 de outubro de 2011, renovada até 20 de novembro de 2025 para «bebidas alcoólicas» da classe 33 e representada do seguinte modo:

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—        a marca tridimensional alemã registada sob o número 39848553, depositada em 25 de agosto de 1998, registada em 28 de abril de 1999 para «bebidas alcoólicas, em especial vodkas» da classe 33 e representada do seguinte modo:

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—        a marca polaca registada sob o número 62018, apoiada por vários documentos do Urząd Patentowy Rzeczypospolitej Polskiej (Instituto de Patentes da República da Polónia), que não incluía representação;

—        a marca tridimensional polaca registada sob o número 62081, depositada em 30 de agosto de 1985, registada em 20 de novembro de 1987 e renovada até 30 de agosto de 2025 para «vodka (produtos alcoólicos)» da classe 33 — tendo esta marca sido cedida em 1987 à PPS Polmos, que, em 1999, a transferiu para a Polmos, antecessora da recorrente — e representada do seguinte modo:

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—        a marca tridimensional polaca registada sob o número 85811, depositada em 2 de agosto de 1993, registada em 3 de julho de 1995 em nome da Polmos, renovada até 2 de agosto de 2023 para «produtos alcoólicos» da classe 33 e representada do seguinte modo:

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—        a marca tridimensional japonesa registada sob o número 2092826, depositada em 17 de dezembro de 1985, registada em 30 de novembro de 1988, em nome da Przedsiębiorstwo Handlu Zagranicznego Agros (a seguir «PHZ Agros»), para «vodka» da classe 33 e representada da seguinte forma:

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—        a marca tridimensional francesa registada sob o número 98746752, depositada em 19 de agosto de 1998, em nome de Agros Holding S.A. (a seguir «Agros»), para «vodka» da classe 33 e representada do seguinte modo:

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—        a marca tridimensional alemã não registada, alegadamente utilizada na vida comercial na Alemanha para «bebidas alcoólicas, em especial vodkas» da classe 33, sob a seguinte forma:

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8        A oposição baseava‑se igualmente noutros sinais não registados reivindicados em diversos Estados‑Membros da União Europeia.

9        Os fundamentos invocados em apoio da oposição eram os referidos, em primeiro lugar, no artigo 8.o, n.o 1, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 40/94 [atual artigo 8.o, n.o 1, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 207/2009, e depois artigo 8.o, n.o 1, alíneas a) e b), do Regulamento 2017/1001] no que respeita à marca tridimensional francesa anterior n.o 95588457 acima reproduzida no n.o 7, em segundo lugar, no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 (atual artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 207/2009, em seguida artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento 2017/1001) no que dizia respeito às marcas acima mencionadas no n.o 7 e, em terceiro lugar, no artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 40/94 (atual artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009, depois artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento 2017/1001) no que respeita aos sinais não registados acima mencionados no n.o 7, in fine, e no n.o 8, supra.

10      Em 18 de outubro de 2010, a Divisão de Oposição rejeitou a oposição na íntegra.

11      Em 17 de dezembro de 2010, a recorrente interpôs no EUIPO um recurso da decisão da Divisão de Oposição, nos termos dos artigos 58.o a 64.o do Regulamento n.o 207/2009 (atuais artigos 66.o a 71.o do Regulamento n.o 2017/1001).

12      Por Decisão de 26 de março de 2012 (processo R 2506/2010‑4) (a seguir «primeira decisão»), a Quarta Câmara de Recurso do EUIPO negou provimento ao recurso.

13      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 29 de maio de 2012 e registada sob o número de processo T‑235/12, a recorrente interpôs um recurso de anulação da primeira decisão.

14      Através do Acórdão de 11 de dezembro de 2014, CEDC International/IHMI — Underberg (Forma de uma canícula dentro de uma garrafa) (T‑235/12; a seguir «primeiro acórdão de anulação», EU:T:2014:1058), o Tribunal Geral anulou integralmente a primeira decisão. A título preliminar, salientou que a recorrente contestava as constatações e apreciações do EUIPO relativas a todos os fundamentos da oposição, a saber, os enunciados no artigo 8.o, n.o 1, alínea a), e n.os 3 e 4, do Regulamento n.o 207/2009, mas que, no entanto, indicava que limitava a sua argumentação apenas às conclusões da Câmara de Recurso sobre a avaliação das provas de utilização apresentadas, uma vez que essas conclusões diziam respeito da mesma forma a todos os fundamentos da oposição. No que respeita ao fundamento de oposição enunciado no artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do mesmo regulamento, declarou que, ao abster‑se de exercer, de forma objetiva e fundamentada, o seu poder de apreciação quanto à tomada em conta dos elementos de prova da utilização da marca tridimensional francesa anterior n.o 95588457 apresentados pela primeira vez perante si, a Câmara de Recurso violou o artigo 76.o, n.o 2, do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 95.o, n.o 2, do Regulamento 2017/1001) e, tendo em conta a falta de fundamentação assim constatada, o artigo 75.o do Regulamento n.o 207/2009 (atual artigo 94.o do Regulamento 2017/1001). Por conseguinte, o Tribunal Geral deu provimento ao recurso (n.os 29, 69 e 103 do primeiro acórdão de anulação).

15      Por Decisão de 29 de agosto de 2016 (processo R 1248/2015‑4) (a seguir «segunda decisão»), a Quarta Câmara de Recurso do EUIPO negou provimento ao recurso. Considerou que, mesmo tendo em conta as provas que lhe foram apresentadas pela primeira vez, a recorrente não tinha demonstrado a natureza da utilização da marca tridimensional francesa anterior n.o 95588457 e daí deduziu que a oposição baseada nessa marca e nos fundamentos estabelecidos no artigo 8.o, n.o 1, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 207/2009 devia ser rejeitada. No que respeita aos outros fundamentos da oposição e aos outros direitos anteriores invocados, a Câmara de Recurso «remet[eu] expressamente para o raciocínio constante da sua Decisão de 26 de março de 2012 no processo R 2506/2010‑4». Concluiu que a oposição era rejeitada por todos os motivos e todos os direitos anteriores em que a oposição se baseava (n.os 46 a 49 da segunda decisão).

16      Por petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 11 de novembro de 2016 e registada sob o número de processo T‑796/16, a recorrente interpôs recurso de anulação da segunda decisão. Este processo foi suspenso, a pedido do EUIPO, de 29 de maio de 2017 a 12 de agosto de 2019.

17      Através do Acórdão de 23 de setembro de 2020, CEDC International/EUIPO — Underberg (Forma de uma canícula dentro de uma garrafa) (T‑796/16, a seguir «segundo acórdão de anulação», EU:T:2020:439), o Tribunal Geral anulou parcialmente a segunda decisão. Por um lado, confirmou a apreciação da Câmara de Recurso segundo a qual a utilização da marca tridimensional francesa anterior n.o 95588457, conforme representada e registada, não tinha sido provada, pelo que o motivo de oposição baseado no artigo 8.o, n.o 1, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 40/94 devia ser rejeitado. Por outro lado, constatou que, ao limitar‑se a «remeter explicitamente», no que respeita aos motivos de oposição enunciados no artigo 8.o, n.os 3 e 4, deste regulamento, para o raciocínio que figura na primeira decisão, que tinha sido integralmente anulada pelo Tribunal Geral, e ao basear em seguida o dispositivo de indeferimento do recurso que lhe foi submetido em parte nessa remissão, a Câmara de Recurso não tinha fundamentado de forma juridicamente bastante a decisão impugnada, em violação do artigo 75.o do Regulamento n.o 207/2009. Consequentemente, anulou a segunda decisão unicamente no que dizia respeito aos motivos de oposição enunciados no artigo 8.o, n.os 3 e 4, do Regulamento n.o 40/94 e negou provimento ao recurso quanto ao resto, ou seja, quanto a tudo o que dizia respeito ao motivo de oposição enunciado no artigo 8.o, n.o 1, alíneas a) e b), do mesmo regulamento (n.os 179, 204 e 209 do segundo acórdão de anulação).

18      Por recurso que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 26 de novembro de 2020 e foi registado sob o número de processo C‑639/20 P, a recorrente interpôs recurso de anulação parcial do segundo acórdão de anulação.

19      Por Despacho de 23 de março de 2021, CEDC International/EUIPO (C‑639/20 P, não publicado, EU:C:2021:227), o Tribunal de Justiça não admitiu o recurso.

20      Por decisão do Praesidium das Câmaras de Recurso comunicada às partes em 8 de outubro de 2020, o processo foi reatribuído à Quinta Câmara de Recurso, sob a referência R 1954/2020‑5, para que esta se pronunciasse de novo.

21      Na decisão controvertida, a Quinta Câmara de Recurso negou provimento ao recurso. Em primeiro lugar, quanto ao motivo de oposição enunciado no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, começou por constatar que certos direitos anteriores invocados não podiam ser tomados em conta para fundamentar a oposição. Em seguida, a Câmara de Recurso considerou que a recorrente, provavelmente devido à situação específica do regime comunista da República da Polónia à época, não tinha conseguido provar a existência de uma relação contratual entre ela própria e a interveniente ou entre ela própria e a PHZ Agros ou a Agros Trading Co. Ltd, quer no momento do depósito da marca pedida quer anteriormente. Daí concluiu que, no que dizia respeito à marca tridimensional francesa anterior n.o 95588457 e às marcas polacas anteriores n.os 62081 e 85811, não se podia considerar que a interveniente atuava na qualidade de agente ou de representante da recorrente, pelo que a oposição não podia ser acolhida à luz do segundo requisito enunciado no referido artigo. Por último, «por uma questão de exaustividade», constatou que nenhum dos acordos contratuais apresentados fazia expressamente referência às marcas anteriores acima referidas. Em segundo lugar, no que respeita ao motivo de oposição enunciado no artigo 8.o, n.o 4, do mesmo regulamento, a Câmara de Recurso considerou que a recorrente não tinha provado a utilização real da marca alemã não registada reivindicada, e ainda menos a sua utilização na vida comercial cujo alcance não era apenas local antes do depósito da marca pedida, na Alemanha, e que o mesmo se aplicava aos alegados direitos de marca não registados nos outros países da União, pelo que a oposição devia igualmente ser rejeitada por esse motivo.

 Pedidos das partes

22      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        anular parcialmente a decisão impugnada no que respeita ao motivo de oposição baseado no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94;

—        condenar o EUIPO e a interveniente nas despesas efetuadas no âmbito dos processos no Tribunal Geral e na Câmara de Recurso.

23      O EUIPO e a interveniente concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

—        negar provimento ao recurso;

—        condenar a recorrente nas despesas.

 Questão de direito

24      Atendendo à data da apresentação do pedido de registo em causa, ou seja, 1 de abril de 1996, que é determinante para efeitos da identificação do direito substantivo aplicável, os factos no presente processo regem‑se pelas disposições substantivas do Regulamento n.o 40/94 (v., neste sentido, Acórdãos de 8 de maio de 2014, Bimbo/IHMI, C‑591/12 P, EU:C:2014:305, n.o 12, e de 18 de junho de 2020, Primart/EUIPO, C‑702/18 P, EU:C:2020:489, n.o 2 e jurisprudência referida). Por conseguinte, no caso em apreço, no que respeita às regras substantivas, há que entender as referências feitas pelas partes nos seus articulados ao artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 207/2009 ou ao artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento 2017/1001 no sentido de que visam o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, de teor idêntico.

25      Além disso, uma vez que, segundo jurisprudência constante, as regras processuais são geralmente consideradas aplicáveis na data da sua entrada em vigor (v. Acórdão de 11 de dezembro de 2012, Comissão/Espanha, C‑610/10, EU:C:2012:781, n.o 45 e jurisprudência referida), o litígio é regido pelas disposições processuais do Regulamento 2017/1001.

26      Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca dois fundamentos, relativos, o primeiro, à violação de formalidades essenciais, em especial do artigo 95.o, n.o 1, e do artigo 94.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001, lidos em conjugação com o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, e, o segundo, à violação desta última disposição propriamente dita.

27      A título liminar, saliente‑se que a própria recorrente precisa, no n.o 35 do pedido, que o presente recurso só visa a decisão impugnada na parte que diz respeito ao motivo de oposição enunciado no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94. Por conseguinte, importa constatar que a recorrente não contesta a rejeição pelas instâncias do EUIPO da oposição com base no motivo enunciado no artigo 8.o, n.o 4, do mesmo regulamento e que essa rejeição é por isso definitiva.

 Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação de formalidades essenciais, em especial do artigo 95.o, n.o 1, e do artigo 94.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001, lidos em conjugação com o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94

28      Com o primeiro fundamento, a recorrente invoca a violação de formalidades essenciais, em especial do artigo 95.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001, por falta de exame correto dos factos, e do artigo 94.o, n.o 1, do mesmo regulamento, devido a falta de fundamentação, lidos em conjugação com o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94. Este fundamento articula‑se em três alegações. A primeira alegação é relativa ao facto de a Câmara de Recurso não ter examinado os motivos de oposição baseados no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 à luz do direito anterior invocado no ato de oposição enquanto «marca apresentada por um agente», a saber, a marca tridimensional alemã não registada com a forma de uma garrafa com uma canícula. A segunda alegação é relativa ao facto de a Câmara de Recurso não ter examinado se existia uma relação implícita de agente ou de representante entre as partes com base nos elementos de prova apresentados, que demonstravam uma obrigação de confiança e de lealdade a cargo da interveniente e da sua predecessora. A terceira alegação é relativa ao facto de a Câmara de Recurso ter procedido a um exame errado dos factos relativos ao alcance dos direitos de propriedade industrial abrangidos pela relação de agente ou de representante entre as partes, nomeadamente ao não reconhecer que os direitos de propriedade industrial sobre a marca tridimensional alemã não registada com a forma de uma garrafa com uma canícula estavam abrangidos pela obrigação de confiança e de lealdade imposta à interveniente e à sua predecessora.

29      O Tribunal Geral considera oportuno começar por examinar a segunda alegação.

30      Para o efeito, são utilizadas as seguintes abreviaturas:

—        «PPS Polmos» designa Przedsiębiorstwo Przemyslu Spirytusowego Polmos, uma empresa pública polaca, produtora de vodkas, antecessora da Przedsiębiorstwo Polmos Białystok (Spółka Akcyjna), ela própria antecessora da CEDC International sp. z o.o., a recorrente;

—        «Polmos» designa Przedsiębiorstwo Polmos Białystok (Spółka Akcyjna), sucessora da PPS Polmos e antecessora da recorrente;

—        «PHZ Agros» designa Przedsiębiorstwo Handlu Zagranicznego Agros, uma empresa pública polaca autorizada a exportar os vodkas polacos para o estrangeiro;

—        «Agros» designa Agros Holding S.A. e/ou a sua filial detida a 100 %, Agros Trading Sp. z o.o. (em inglês, Agros Trading Co. Ltd), sucessoras da PHZ Agros;

—        «Diversa» designa Diversa Specialitäten GmbH, antecessora da Underberg AG, interveniente.

31      Em apoio das suas alegações, a recorrente refere diversos acordos comerciais, cujos principais são:

—        o acordo de importação de 10 de maio de 1983, celebrado entre a Agros e a Diversa [K7‑K7a];

—        o acordo de importação de 8 de maio de 1987, celebrado entre a Agros e a Diversa [K8‑8a];

—        o acordo de 29 de outubro de 1993, celebrado entre a Agros e a interveniente, qualificada de «importadora» [K9];

—        o acordo de 24 de maio de 1999 [K11], celebrado entre a Agros e a interveniente, qualificada de «importadora».

 Quanto à segunda alegação, relativa à falta de análise da existência de uma relação implícita de agente ou de representante entre a recorrente e a interveniente

32      Com a segunda alegação, a recorrente sustenta que a Câmara de Recurso não examinou os elementos de prova que, em seu entender, demonstram a existência de uma relação fiduciária implícita entre as partes por intermédio da PHZ Agros ou da Agros que atuam de facto na qualidade de agente ou representante da PPS Polmos ou da Polmos (titulares dos direitos de propriedade intelectual, entre os quais a marca tridimensional que representa uma garrafa com uma canícula). A recorrente baseia‑se, a este respeito, em diversos elementos de prova [anexos K1‑K11], incluindo os acordos enumerados no n.o 31, supra, e considera que todos estes factos examinados conjuntamente provam que existia um dever implícito de confiança e de lealdade imposto à Diversa ou à interveniente em relação à PPS Polmos ou à Polmos, representadas pelo agente de facto PHZ Agros ou Agros. Em especial, a Câmara de Recurso não reconheceu que a natureza fiduciária da relação entre as partes (ou as suas antecessoras) resultava claramente dos acordos de importação de 10 de maio de 1983 e de 8 de maio de 1987, bem como do acordo de 29 de outubro de 1993, tendo‑se «de facto limitado a verificar se existiam contratos». Além disso, resulta da jurisprudência que a proteção do titular da marca subsiste mesmo após a cessação da relação contratual da qual decorre uma obrigação de confiança. Por último, há que ter em conta o regime comunista na Polónia nos anos 70 e as «circunstâncias turbulentas» da privatização de empresas públicas nos anos 90. Conclui que a Câmara de Recurso não cumpriu as suas obrigações processuais de examinar os factos e de fundamentar a sua decisão relativamente a todos esses elementos de prova.

33      O EUIPO e a interveniente contestam os argumentos da recorrente.

34      Em conformidade com o artigo 95.o, n.o 1, primeiro período, do Regulamento 2017/1001, no decurso do processo, o EUIPO deve proceder ao exame oficioso dos factos, entendendo‑se que, num processo respeitante a motivos relativos de recusa do registo, o exame se limita aos fundamentos invocados e aos pedidos apresentados pelas partes.

35      Nos termos do artigo 94.o, n.o 1, primeiro período, do Regulamento 2017/1001, as decisões do EUIPO devem ser fundamentadas.

36      Resulta de jurisprudência constante que o dever de fundamentação constitui uma formalidade essencial que deve ser distinguida da questão do mérito da fundamentação, a qual faz parte da legalidade material do ato controvertido. Com efeito, a fundamentação de uma decisão consiste em exprimir formalmente os fundamentos em que essa decisão assenta. Se esses fundamentos contiverem erros, estes ferem a legalidade material da decisão, mas não a sua fundamentação, que pode ser suficiente ainda que contenha fundamentos errados. Logo, as objeções e os argumentos que visam contestar o mérito de um ato não são pertinentes no quadro de uma alegação baseada em falta ou insuficiência de fundamentação [v. segundo acórdão de anulação, n.o 187 (não publicado) e jurisprudência citada].

37      Nos termos do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 (não alterado pelos Regulamentos n.o 207/2009 e 2017/1001), em caso de oposição do titular da marca, será recusado o registo de uma marca que tenha sido pedido por um agente ou por um representante do titular da marca, em seu próprio nome e sem o consentimento do titular, a menos que esse agente ou representante justifique a sua atuação.

38      O artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 tem por objetivo evitar o desvio da marca anterior de um titular pelo seu agente ou pelo seu representante, uma vez que estes podem explorar os conhecimentos e a experiência adquiridos durante a relação comercial que os ligou a esse titular e, por conseguinte, tirar indevidamente proveito dos esforços e do investimento feitos por este último [Acórdãos de 11 de novembro de 2020, EUIPO/John Mills, C‑809/18 P, EU:C:2020:902, n.os 72 e 83; de 6 de setembro de 2006, DEF‑TEC Defense Technology/IHMI — Defense Technology (FIRST DEFENSE AEROSOL PEPPER PROJECTOR), T‑6/05, EU:T:2006:241, n.o 38, e de 14 de fevereiro de 2019, Mouldpro/EUIPO — Wenz Kunststoff (MOULDPRO), T‑796/17, não publicado, EU:T:2019:88, n.o 24]. Esta disposição tem, portanto, por objeto salvaguardar os interesses legítimos dos titulares de marcas e preservá‑los de qualquer usurpação arbitrária das suas marcas, concedendo‑lhes o direito de proibir os registos pedidos pelos seus agentes ou representantes sem o seu consentimento [Acórdão de 8 de setembro de 2021, Qx World/EUIPO — Mandelay (EDUCTOR), T‑84/20, não publicado, EU:T:2021:555, n.o 61].

39      Resulta da letra do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 que, para que uma oposição tenha êxito com base neste fundamento, é necessário, em primeiro lugar, que o oponente seja o titular da marca anterior, em segundo lugar, que o requerente da marca seja ou tenha sido o agente ou o representante do titular da marca, em terceiro lugar, que o pedido tenha sido depositado em nome do agente ou do representante sem o consentimento do titular e sem que haja razões legítimas que justifiquem a atuação do agente ou do representante e, em quarto lugar, que o depósito respeite essencialmente a sinais e a produtos idênticos ou semelhantes. Estas condições são cumulativas [Acórdão de 13 de abril de 2011, Safariland/IHMI — DEF‑TEC Defense Technology (FIRST DEFENSE AEROSOL PEPPER PROJECTOR), T‑262/09, EU:T:2011:171, n.o 61].

40      Importa por isso examinar se as condições exigidas pelo artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 estão preenchidas no caso em apreço.

–       Quanto à primeira condição, relativa à titularidade das marcas anteriores

41      Como a Câmara de Recurso salientou nos n.os 45 a 48 da decisão impugnada, o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 faz referência ao «titular da marca», sem precisar o tipo de marca anterior visada, a saber, apenas registada ou também não registada, nem se se faz referência unicamente a uma marca da União Europeia ou igualmente a uma marca de um Estado terceiro.

42      A este respeito, por um lado, no que toca ao tipo de marca anterior visado, há que considerar, à semelhança da Câmara de Recurso, que o conceito de «marca» na aceção do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 abrange, além das marcas registadas, igualmente as marcas não registadas, mas unicamente na medida em que a legislação do país de origem reconhece direitos desse tipo.

43      Por outro lado, no que concerne à origem da marca anterior, dado que a letra do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 não contém nenhuma referência a um «território» em causa, ao contrário do artigo 8.o, n.o 1, alínea b), do mesmo regulamento, há que considerar que é indiferente que os direitos relativos à marca anterior se apliquem ou não na União Europeia.

44      O Tribunal Geral adotou um princípio equivalente num acórdão relativo a dois pedidos de declaração de nulidade de duas marcas da União Europeia nos termos do artigo 53.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 207/2009 [atual artigo 60.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento 2017/1001], lido em conjugação com o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 207/2009, com base numa marca polaca anterior, quando a República da Polónia não era um Estado‑Membro da União. Em particular, o Tribunal Geral esclareceu que o artigo 8.o, n.o 3, do referido regulamento não limita o seu âmbito de aplicação às marcas registadas num Estado‑Membro ou que produzem efeitos nesse Estado e que, caso contrário, haveria uma sobreposição com o artigo 8.o, n.os 1 e 5, do mesmo regulamento [v., neste sentido, Acórdão de 29 de novembro de 2012, Adamowski/IHMI — Fagumit (FAGUMIT), T‑537/10 e T‑538/10, EU:T:2012:634, n.o 19].

45      Além disso, para interpretar o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, há que ter em conta o artigo 6.osepties da Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial, de 20 de março de 1883, conforme revista e alterada (Acórdão de 11 de novembro de 2020, EUIPO/John Mills, C‑809/18 P, EU:C:2020:902, n.o 65), dado que o primeiro visa implementar o segundo. O termo «titular» deve ser interpretado em conformidade, o que permite igualmente ao titular de uma marca que foi registada fora da União Europeia, mas num dos Estados partes na referida Convenção, invocar a sua proteção.

46      Daqui resulta, por outras palavras, que o titular de uma marca anterior em qualquer Estado contratante da Convenção de Paris pode invocar o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 se o seu agente ou o seu representante pedir o registo da marca na União Europeia sem o seu consentimento.

47      No caso em apreço, nos n.os 49 a 53 da decisão impugnada, antes de mais, a Câmara de Recurso notou que certos direitos anteriores invocados, a saber a marca alemã n.o 39848553 e a marca francesa n.o 98746752, não podiam ser tomados em consideração, dado que tinham sido depositados após a data de depósito da marca pedida, e não podiam por isso servir de fundamento a oposição a título do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94. Observou ainda que a recorrente não era a titular da marca japonesa n.o 2092826 no momento do depósito da oposição, dado que esta tinha sido registada em nome da PHZ Agros nessa data, e, por conseguinte, que essa marca japonesa já não satisfazia a exigência de titularidade no momento em que a oposição tinha sido apresentada em virtude deste artigo [K15a e K15d]. Por último, constatou que a marca polaca n.o 62018 não tinha sido renovada nos prazos legais e tinha, portanto, expirado. Dado que um direito anterior devia beneficiar de proteção no dia da adoção da decisão, esta marca polaca já não podia constituir uma base válida no presente processo ao abrigo do referido artigo.

48      Por conseguinte, a Câmara de Recurso constatou que as três marcas anteriores (v. n.o 7, supra) para as quais a recorrente tinha conseguido demonstrar que era a titular no sentido do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 e que podiam por isso ser tomadas em conta eram a marca francesa anterior n.o 95588457, a marca polaca anterior n.o 85811 e a marca polaca anterior n.o 62081. No que respeita a esta última, a Câmara de Recurso teve isso em conta «por razões de exaustividade», dado que se tratava do «cenário mais favorável» à recorrente, embora essa marca tivesse sido demonstrada por uma tradução em inglês de um extrato do registo das marcas do Instituto de Patentes da República da Polónia e o certificado de registo e de renovação original em polaco tivesse sido apresentado pela recorrente em 3 de julho de 2008 [K31 e K32], ou seja, três anos após o termo do prazo fixado para fundamentar a oposição, em conformidade com a regra 19, n.o 1, e n.o 2, alínea e), do Regulamento (CE) n.o 2868/95 da Comissão, de 13 de dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento n.o 40/94 (JO 1995, L 303, p. 1) [atual artigo 7.o, n.o 1, e n.o 2, alínea c), do Regulamento Delegado (UE) 2018/625 da Comissão, de 5 de março de 2018, que complementa o Regulamento 2017/1001 e que revoga o Regulamento Delegado (UE) 2017/1430 (JO 2018, L 104, p. 1)], prazo que tinha expirado em 7 de julho de 2005.

49      A recorrente não contesta estas apreciações, com exceção da relativa à marca alemã n.o 39848553. A este respeito, basta observar que esta marca foi depositada em 25 de agosto de 1998, mais de dois anos após o depósito da marca pedida, pelo que não pode ser de modo algum anterior a esta.

50      À luz das circunstâncias do caso em apreço, no interesse de uma boa administração da justiça, o Tribunal Geral considera oportuno, à semelhança da Câmara de Recurso, examinar quanto ao mérito o segundo requisito, relativo à existência de um acordo contratual de agência ou de representação, à luz da marca francesa anterior n.o 95588457 e das marcas polacas anteriores n.os 62081 e 85811, sem se pronunciar sobre o facto de essas marcas serem invocadas e fundamentadas no ato de oposição.

–       Quanto à segunda condição, relativa à existência de um acordo contratual de agente ou de representante

51      Há que recordar que a realização do objetivo de evitar o desvio da marca anterior pelo agente ou pelo representante do titular desta (v. n.o 38, supra) requer uma interpretação extensiva dos conceitos de «agente» e de «representante», na aceção do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94. Estes conceitos devem ser objeto de interpretação extensiva, de modo a cobrir todas as formas de relações baseadas num acordo contratual, nos termos do qual uma das partes representa os interesses da outra, e isto independentemente da qualificação jurídica da relação contratual estabelecida entre o titular ou o mandante e o requerente da marca da União Europeia. Assim, para efeitos da aplicação dessa disposição, basta que exista entre as partes um acordo de cooperação comercial suscetível de criar uma relação de confiança, dita «fiduciária», impondo ao requerente, expressa ou implicitamente, uma obrigação geral de confiança e de lealdade face aos interesses do titular da marca anterior [Acórdãos de 13 de abril de 2011, FIRST DEFENSE AEROSOL PEPPER PROJECTOR, T‑262/09, EU:T:2011:171, n.o 64, e de 9 de julho de 2014, Moonich Produktkonzepte & Realisierung/IHMI — Thermofilm Australia (HEATSTRIP), T‑184/12, não publicado, EU:T:2014:621, n.os 58 e 59; ver igualmente, neste sentido, Acórdão de 11 de novembro de 2020, EUIPO/John Mills, C‑809/18 P, EU:C:2020:902, n.os 84 e 85].

52      No entanto, é necessário que exista um acordo contratual, escrito ou não, de cooperação comercial entre as partes. Se o requerente age com total independência, sem que nenhuma relação tenha sido estabelecida com o titular, não pode ser considerado um «agente» na aceção do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94. Logo, um simples comprador ou cliente do titular não pode ser considerado um «agente» ou um «representante» para os fins deste artigo, dado que essas pessoas não têm qualquer obrigação particular de confiança face ao titular da marca (ver, neste sentido, Acórdãos de 13 de abril de 2011, FIRST DEFENSE AEROSOL PEPPER PROJECTOR, T‑262/09, EU:T:2011:171, n.o 64; de 9 de julho de 2014, HEATSTRIP, T‑184/12, não publicado, EU:T:2014:621, n.o 59, e de 14 de fevereiro de 2019, MOULDPRO, T‑796/17, não publicado, EU:T:2019:88, n.o 23). Resulta desta jurisprudência que o acordo contratual de agência ou de representação deve ser celebrado diretamente entre as partes, e não por intermédio de terceiros.

53      Por conseguinte, como bem salienta o EUIPO, o facto de uma relação «implícita» poder bastar para a aplicação do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 significa apenas que o critério decisivo é a existência e a natureza de um acordo contratual de cooperação comercial instaurado em substância, e não a sua qualificação formal. Assim, uma relação contratual fiduciária e vinculativa pode ser estabelecida através de uma simples correspondência comercial entre as partes, incluindo por correio eletrónico (v., neste sentido, Acórdão de 9 de julho de 2014, HEATSTRIP, T‑184/12, não publicado, EU:T:2014:621, n.os 66 e 67). Recorde‑se, a este respeito, que o oponente é, em princípio, livre de escolher a forma da prova que considera útil apresentar ao EUIPO no âmbito de uma oposição baseada num direito anterior (v., por analogia, Acórdão de 28 de junho de 2018, EUIPO/Puma, C‑564/16 P, EU:C:2018:509, n.o 58). No entanto, a existência de uma tal relação contratual não pode ser demonstrada por probabilidades ou presunções, mas deve basear‑se em elementos concretos e objetivos [v., por analogia, Acórdão de 12 de dezembro de 2002, Kabushiki Kaisha Fernandes/IHMI — Harrison (HIWATT), T‑39/01, EU:T:2002:316, n.o 47].

54      Quanto à incidência da cessação da relação contratual no momento do depósito do pedido de marca, não é necessário que o acordo celebrado entre as partes esteja ainda em vigor no momento desse depósito. O artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 aplica‑se igualmente aos acordos que tenham expirado antes da data do referido depósito, desde que o prazo decorrido seja tal que se possa legitimamente supor que a obrigação de confiança e de confidencialidade ainda existia no momento desse depósito. Esta interpretação extensiva desta disposição visa proteger o titular das marcas anteriores, mesmo após a cessação da relação contratual, da qual decorria uma obrigação de confiança (Acórdão de 13 de abril de 2011, FIRST DEFENSE AEROSOL PEPPER PROJECTOR, T‑262/09, EU:T:2011:171, n.o 65). Por outras palavras, segundo a referida interpretação, a proteção conferida por essa disposição subsiste mesmo após a cessação da relação contratual da qual decorre uma obrigação de confiança, na condição acima referida.

55      Do ponto de vista processual, o ónus da prova da existência de uma relação contratual de agência ou de representação incumbe ao oponente (v., neste sentido, Acórdãos de 13 de abril de 2011, FIRST DEFENSE AEROSOL PEPPER PROJECTOR, T‑262/09, EU:T:2011:171, n.o 67, e de 14 de fevereiro de 2019, MOULDPRO, T‑796/17, não publicado, EU:T:2019:88, n.o 30), a saber, o titular da marca anterior.

56      Resulta desta jurisprudência que, mesmo que os termos «agente» e «representante» referidos no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 devam ser interpretados em sentido amplo, deve, no entanto, existir entre as partes um acordo contratual de cooperação comercial suscetível de criar uma relação de confiança ao impor ao requerente, expressa ou implicitamente, uma obrigação geral de confiança e de lealdade face aos interesses do titular da marca anterior (Acórdão de 14 de fevereiro de 2019, MOULDPRO, T‑796/17, não publicado, EU:T:2019:88, n.o 33).

57      No caso em apreço, incumbia, portanto, à recorrente provar perante o EUIPO que esse acordo contratual de cooperação comercial existia diretamente entre as partes, isto é, a interveniente e ela própria, à data do depósito da marca pedida.

58      A título liminar, resulta dos n.os 51 a 56, supra, que foi a justo título que, no n.o 56 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso considerou que essa relação de confiança podia também surgir implicitamente, com base numa relação de facto, sem que as partes tivessem assinado um contrato de distribuição nem um contrato de agência formal.

59      Nos n.os 63 a 68 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso observou que, antes de apreciar a natureza das relações entre as partes, estava obrigada a reconstituir a história das partes e das suas relações por ordem cronológica. A recorrente tem a sua origem histórica numa primeira unidade de produção pública fundada em 1973 para o fabrico de vodka, a PPS Polmos. Esta sociedade e as suas sucessoras eram responsáveis pelo fabrico do produto vendido no estrangeiro por outra sociedade pública, a PHZ Agros, bem como pela sua venda e distribuição na Polónia. A Câmara de Recurso constatou que a PHZ Agros era, na altura, a única sociedade autorizada a exportar vodka do fabricante PPS Polmos. Desde 1975, existiam acordos de distribuição, primeiro entre a PHZ Agros e a Diversa, antecessora da interveniente, de 1975 a 1992, e depois entre a Agros e a interveniente. Em virtude desses acordos, que existiam ainda no momento do depósito da marca pedida, a PHZ Agros e a Agros detinham o direito exclusivo de distribuir vodka polaca na Alemanha, inicialmente para várias marcas, bem como vodka com a etiqueta «Grasovka».

60      Nos n.os 69 a 75 da decisão impugnada, quanto aos anexos K1 a K11 apresentados pela recorrente, é certo que a Câmara de Recurso salientou que, antes do depósito da marca pedida (a saber, 1 de abril de 1996), estava em vigor o acordo de 29 de outubro de 1993 [K9] entre a Agros e a interveniente, no qual esta última era mencionada como importadora exclusiva para a Alemanha das vodkas com as denominações «Wyborowa» e «Grasovka». Todavia, sublinhou que a oposição tinha sido deduzida por uma sociedade diferente, a Polmos, que era a titular da marca francesa anterior n.o 95588457 e das marcas polacas anteriores n.os 62081 e 85811 e que, segundo os elementos de prova apresentados, a recorrente ou a PPS Polmos nunca tinham tido contacto direto com a interveniente. Além disso, constatou que a recorrente não tinha de modo algum provado que a Agros era a licenciada ou distribuidora exclusiva de vodkas da Polmos para a Alemanha, uma vez que a Agros não estava expressamente designada como atuando nessa qualidade em nenhuma parte do acordo acima referido. Concluiu que os elementos de prova e os argumentos apresentados pela recorrente não provavam nem explicavam a existência de uma relação contratual entre as partes, a saber, a interveniente atuando na qualidade de agente ou de representante da Polmos, sucessora da PPS Polmos e antecessora da recorrente.

61      Nos n.os 76 a 81 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso observou igualmente que, no caso em apreço, nenhum elemento de prova demonstrava que a Polmos mantinha uma relação comercial com a PHZ Agros ou a Agros. Considerou que as simples alegações da recorrente relativas a um sistema de organização das exportações na «antiga Polónia comunista» não eram pertinentes, uma vez que essas regras já não eram aplicáveis em 1996, no momento do depósito da marca pedida, e que nenhuma prova em apoio dessa alegação tinha sido fornecida em momento algum do processo. Constatou que, embora a interveniente tenha mantido uma relação com a Agros, nunca teve essa relação com a alegada titular da marca, a Polmos, nem com a sua antecessora. Salientou que pode ser verdade que, à época, as duas entidades (a saber, a PHZ Agros e a PPS Polmos) eram entidades públicas e que não era possível implementar qualquer regime de licença entre elas, dado que, nos termos da lei, uma entidade pública (neste caso, a Agros) tinha sido designada para representar os interesses da outra entidade pública (neste caso, a Polmos) no estrangeiro e que a beneficiária final era a República Popular da Polónia, que se tornou, após a alteração do sistema em 1989, a República da Polónia. Segundo a recorrente que, para o efeito, remeteu para os anexos K17 e K31 a K36, após privatização de empresas públicas, a sua antecessora, a Polmos, adquiriu todos os direitos sobre a marca Żubrówka (vendida na Alemanha sob o nome Grasovka), incluindo os direitos anteriores invocados no presente processo de oposição. Todavia, a Câmara de Recurso recordou que o registo da marca alemã anterior n.o 39848553 não podia ser tomado em consideração, uma vez que a sua data de depósito era posterior à da marca pedida. Além disso, confirmou a decisão da Divisão de Oposição segundo a qual o único acordo celebrado entre a Agros e a Polmos que tinha sido apresentado pela recorrente, a saber, o acordo de cessão de marca datado de 28 de agosto de 2001 [K17], era posterior ao depósito da marca pedida (ou seja, 1 de abril de 1996) e tinha natureza jurídica diferente da de um acordo de distribuição. Salientou que os anexos K31 a K36 eram igualmente posteriores ao depósito da marca pedida.

62      Nos n.os 82 a 86 da decisão impugnada, a Câmara de Recurso considerou que, mesmo se a recorrente lhe tivesse pedido ter em conta a situação muito complexa na «antiga Polónia comunista» e a história da estrutura das empresas e das marcas relativas à canícula, ela se devia contudo limitar aos elementos de prova apresentados pela recorrente para provar que a interveniente era ou tinha sido agente ou representante da titular dos direitos anteriores no sentido do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94. A Câmara de Recurso entendeu que, no caso em apreço, a recorrente, provavelmente devido à situação específica da «Polónia comunista» à época, não tinha conseguido provar a existência de uma relação contratual entre ela própria e a interveniente nem entre ela própria e a PHZ Agros ou Agros, quer no momento do depósito da marca pedida quer anteriormente. Tendo em conta as circunstâncias objetivas, como o sistema político e a estrutura da propriedade antes de 1989 na Polónia, a Câmara de Recurso declarou ter apreciado todos os elementos de prova e dever concluir que, no que dizia respeito à marca francesa anterior n.o 95588457 e às marcas polacas anteriores n.os 85811 e 62081, não se podia considerar que a interveniente atuava na qualidade de agente ou de representante da recorrente. Concluiu igualmente que, para essas marcas anteriores, a oposição não podia ser acolhida, tendo em conta a segunda condição enunciada no referido artigo.

63      A este respeito, há que salientar, desde logo, que, contrariamente às alegações da recorrente, resulta dos n.os 63 a 86 da decisão impugnada (v. n.os 59 a 62, supra) que a Câmara de Recurso examinou conjuntamente os elementos de prova apresentados pela recorrente ao longo do processo administrativo perante o EUIPO e não «limitou o seu exame à verificação da existência de contratos». Além disso, nos referidos números da sua decisão, a Câmara de Recurso fundamentou amplamente a sua apreciação. A este respeito, importa recordar que o dever de fundamentação constitui uma formalidade essencial, que deve ser distinguida da questão da procedência da fundamentação, a qual faz parte da legalidade material do ato controvertido (v. n.o 36, supra).

64      Feitas estas constatações, há que examinar o mérito da apreciação da Câmara de Recurso à luz do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94.

65      É pacífico que não existia nenhum acordo contratual formalmente celebrado entre a recorrente (ou a sua antecessora) e a interveniente (ou a sua antecessora).

66      Acresce que um acordo contratual de agência ou de representação deve ser celebrado diretamente entre as partes, e não por intermédio de terceiros (v. n.o 52, supra). Assim, a existência de relações comerciais entre a interveniente e uma terceira sociedade não é suscetível de demonstrar que a interveniente era o agente ou o representante da recorrente (v., neste sentido, Acórdão de 14 de fevereiro de 2019, MOULDPRO, T‑796/17, não publicado, EU:T:2019:88, n.o 32), uma vez que essa sociedade terceira, no caso em apreço a PHZ Agros ou Agros, e a recorrente eram pessoas coletivas distintas.

67      A recorrente invoca antes a existência de uma relação comercial «implícita» com a interveniente (ou com a sua antecessora) no âmbito da qual ela própria (ou a sua antecessora) foi representada pelo agente ou pelo representante «de facto» PHZ Agros ou Agros.

68      Deve notar‑se, no entanto, que a existência de tal relação comercial «implícita» ou «de facto» entre a recorrente (ou a sua antecessora) e a interveniente (ou a sua antecessora), por intermédio da PHZ Agros ou da Agros, não é sustentada pelos elementos de prova juntos aos autos pela recorrente, sobre a qual recai o ónus da prova (v. n.o 55, supra).

69      Em primeiro lugar, no que respeita ao acordo de 29 de outubro de 1993 [K9], que regia as relações entre a Agros e a interveniente no momento do depósito da marca pedida (e durante quase três anos antes dessa data), há que salientar que, nesse acordo, não é feita qualquer referência, explícita ou implícita, à Agros atuando como agente (ou licenciada, distribuidora ou revendedora) ou representante, seja a que título for, de terceiros, em particular da recorrente ou da sua antecessora.

70      Embora seja verdade que o preâmbulo do acordo de 29 de outubro de 1993 menciona o acordo de 8 de maio de 1987 [K8] celebrado entre a Agros e a Diversa, precisa igualmente que a cooperação prosseguirá segundo as condições enunciadas no novo acordo e que, em conformidade com o seu artigo 22.o, alínea a), esse acordo representa a totalidade das convenções das partes. Por conseguinte, contrariamente ao que alega a recorrente, uma referência tão genérica ao acordo de 1987, que expirou e foi substituído pelo acordo de 1993, não pode implicar a incorporação de uma obrigação implícita de confiança e lealdade para com um terceiro não especificado, como era a recorrente ou a sua antecessora em relação às partes do acordo de 1993.

71      Em segundo lugar, quanto aos acordos de importação de 10 de maio de 1983 [K7] e de 8 de maio de 1987 celebrados entre a Agros e a Diversa, as referências da recorrente a certas disposições desses acordos, em especial ao aditamento manuscrito da «Polmos» no artigo 7.o, primeiro, terceiro e sétimo parágrafos, do acordo de 8 de maio de 1987 relativo à titularidade dos direitos de propriedade industrial, não podem pôr em causa a conclusão de que não foi provado nenhum acordo contratual direto entre a recorrente e a interveniente.

72      Antes de mais, há que constatar que os acordos de importação de 10 de maio de 1983 e de 8 de maio de 1987 já não estavam em vigor no momento do depósito da marca pedida. A este respeito, a recorrente invoca a jurisprudência segundo a qual a proteção do titular da marca subsiste mesmo após a cessação da relação contratual da qual decorre uma obrigação de confiança, desde que o prazo decorrido seja tal que se possa legitimamente supor que a obrigação de confiança e de confidencialidade ainda existia no momento do depósito da marca pedida (v. n.o 54, supra).

73      No entanto, mesmo admitindo que os acordos de importação de 10 de maio de 1983 e de 8 de maio de 1987 tivessem estabelecido uma relação de confiança entre a recorrente e a interveniente (quod non, v. n.os 74 a 78, infra), há que considerar que as obrigações de confiança e de lealdade pós‑contratuais não se aplicam durante um período indeterminado, mas apenas durante um período de transição razoável após a rescisão do acordo, durante o qual as partes podem redefinir as suas estratégias comerciais. Ora, no caso em apreço, esses acordos expirados foram celebrados, respetivamente, cerca de treze e nove anos antes da data de depósito da marca pedida. Por conseguinte, qualquer relação pós‑contratual entre as partes resultante dos referidos acordos, se for caso disso, devia ter sido progressivamente erodida e depois extinta antes do depósito da marca pedida. A condição referida no n.o 72, supra, não está, portanto, preenchida no caso em apreço.

74      De qualquer modo, há que salientar que os acordos de importação de 10 de maio de 1983 e de 8 de maio de 1987 não contêm qualquer indicação em apoio das alegações da recorrente relativas à existência de uma obrigação «implícita» de confiança e de lealdade da interveniente para com a recorrente. Pelo contrário, resulta desses acordos que só foram celebrados entre a interveniente (ou a sua antecessora Diversa) e a Agros.

75      Por um lado, no que respeita ao acordo de importação de 10 de maio de 1983, embora exista efetivamente uma disposição que faz referência à Diversa como «importadora/agente» das vodkas e «representante do produtor que é titular da marca» (artigo 6.o, sexto parágrafo), há que constatar que nada nesse acordo justifica que se conclua que o titular das marcas era suposto ser um terceiro exterior ao contrato e uma parte não especificada (a saber, a recorrente ou as suas antecessoras), em vez da parte contratante Agros. Pelo contrário, na disposição que se segue imediatamente a esta referência (artigo 6.o, sétimo parágrafo), esclarece‑se que «a Agros protegerá as suas marcas e/ou os seus direitos de apresentação».

76      Por outro lado, no que respeita ao acordo de importação de 8 de maio de 1987 e, em especial, ao aditamento manuscrito de «Polmos» à menção «Agros/Polmos» relacionada com a titularidade dos direitos de propriedade industrial no artigo 7.o, primeiro, terceiro e sexto parágrafos, desse acordo, a interpretação da recorrente não pode pôr em causa a análise da Câmara de Recurso.

77      A este respeito, há que salientar que, apesar da alegação da recorrente segundo a qual, em janeiro de 1987, «a marca polaca» que consiste numa garrafa com uma canícula foi cedida pela Agros à Polmos (v. cronologia apresentada pela recorrente no anexo K20), os acordos posteriores celebrados entre a Agros e a interveniente em 29 de outubro de 1993 e 24 de maio de 1999 não fazem referência à Polmos. Assim, há que constatar que a simples menção da Polmos no acordo de importação de 8 de maio de 1987, do qual não era parte, através de um aditamento manuscrito — cuja data é, além disso, incerta e que não está assinado nem contra‑assinado por nenhuma das partes — não pode bastar, nem mesmo contribuir para provar um acordo contratual de agente ou de representante entre a recorrente (ou, mais precisamente, a sua antecessora Polmos) e a interveniente (ou a sua antecessora Diversa).

78      Importa igualmente recordar, como fez o EUIPO, que toda a argumentação da recorrente assenta na premissa hipotética de que é titular da marca tridimensional com a forma de uma garrafa com uma canícula, utilizada conjuntamente com a marca nominativa Żubrówka no mundo inteiro e com a marca nominativa Grasovka na Alemanha. Todavia, no artigo 7.o, segundo parágrafo, do acordo de importação de 8 de maio de 1987, precisa‑se expressamente que «[a] propriedade da marca nominativa e figurativa GRASOVKA é regida por um acordo distinto entre a AGROS e a DIVERSA» e que «[o] referido acordo faz parte integrante do presente acordo». Por conseguinte, embora possa ser difícil determinar com exatidão a que direitos ou marcas se deve aplicar a menção manuscrita «Agros/Polmos» ou a que vodka da Polmos diz respeito, é claro, em todo o caso, que esta menção não pode dizer respeito a vodka vendida sob a marca Grasovka. Isto é confirmado pelo acordo de 24 de maio de 1999 [K11] celebrado entre a Agros e a interveniente, no qual está expressamente estabelecido no artigo 12.o que a denominação «Grasovka» é uma marca registada da importadora, a saber, a interveniente.

79      Em terceiro lugar, quanto aos elementos de prova posteriores à data de depósito da marca pedida (1 de abril de 1996), estes também não contêm indicações relativas a um acordo contratual entre as partes à data desse depósito, contrariamente ao que alega a recorrente, militando antes em sentido contrário.

80      A este respeito, importa recordar que a própria recorrente indicou, durante o procedimento administrativo e na audiência, que tinha adquirido os direitos sobre as marcas anteriores invocados em 1999 e que, antes de 1999, existia um litígio entre a Agros a uma entidade da Polmos (Warszawa) nos órgãos jurisdicionais de Varsóvia (Polónia) quanto ao registo e à utilização das marcas que consistem numa garrafa com uma canícula (v. a cronologia apresentada pela recorrente no anexo K20). Sem que seja necessário que o Tribunal Geral se pronuncie sobre o mérito deste litígio regulado pelo direito nacional, basta, para efeitos do presente processo, salientar que o facto de, segundo a própria recorrente, um litígio ter oposto a Agros a uma entidade da Polmos a propósito dessas marcas mostra que a Agros e a Polmos eram duas sociedades distintas, cujos interesses comerciais podiam divergir fortemente, ou mesmo opor‑se frontalmente. Por conseguinte, é improvável que a Agros possa ter atuado como agente ou representante implícito ou de facto da recorrente (ou da sua antecessora) para com a interveniente (ou a sua antecessora).

81      Além disso, como observou com razão a Câmara de Recurso, o único acordo celebrado entre a Agros e a Polmos que foi apresentado pela recorrente, a saber, o acordo de cessão de marca datado de 28 de agosto de 2001 [K17], é posterior ao depósito da marca requerida e reveste uma natureza jurídica diferente da de um acordo de distribuição, dado que não implica relações contínuas nem uma obrigação geral de confiança e de lealdade.

82      Em quarto lugar, no que respeita aos outros elementos de prova, como a carta de notificação de 30 de janeiro de 2002 e os documentos que provam que a vodka dita «Żubrówka» foi comercializada na Alemanha sob a marca Grasovka, entre os quais uma declaração de um empregado e um excerto da enciclopédia em linha Wikipédia, há que constatar que a recorrente não precisou em que consistem os erros de apreciação da Câmara de Recurso a este respeito.

83      No que respeita à carta de notificação de 30 de janeiro de 2002, enviada pela Polmos à interveniente [K19‑19a], embora seja exato que se referia à existência de acordos de comercialização segundo os quais a Agros era o mediador exclusivo da Polmos para a exportação de bebidas alcoólicas à base de vodka «Żubrówka» e «Grasovka»», há que constatar que esta carta é posterior em cerca de seis anos ao depósito da marca pedida e, além disso, que uma simples carta unilateral não tem, de todo, o mesmo valor probatório que um acordo contratual entre as partes, que não existe no caso em apreço.

84      Além disso, no que respeita à declaração de 16 de fevereiro de 2011, redigida em polaco e traduzida para inglês, proveniente de um especialista tecnológico responsável pela rotulagem no seio da Polmos e da recorrente desde 1992, na qual este confirma, nomeadamente, que, desde o início dos anos 70, a Polmos produzia a vodka «Żubrówka», da qual cada garrafa, independentemente das modificações dos rótulos, continha sistematicamente uma canícula (n.os 50 e 51 do primeiro acórdão de anulação), há que recordar que, quando uma declaração tenha sido prestada, na aceção do artigo 78.o, n.o 1, alínea f), do Regulamento n.o 207/2009 [atual artigo 97.o, n.o 1, alínea f), do Regulamento 2017/1001], por um dos quadros da parte interessada, só pode ser atribuído valor probatório à referida declaração se for corroborada por outros elementos de prova. Com efeito, uma declaração prestada no interesse do seu autor tem apenas um valor probatório limitado e necessita de ser sustentada por elementos de prova suplementares, ainda que isso não autorize, todavia, as instâncias do EUIPO a considerar, por princípio, que tal declaração é, em si mesma, desprovida de qualquer credibilidade. O valor probatório a atribuir a tal declaração, considerada isolada ou conjuntamente com outros elementos de prova, depende, nomeadamente, das circunstâncias do caso concreto (v. Acórdão de 22 de junho de 2022, Puma/EUIPO — V. Fraas (FRAAS), T‑329/21, não publicado, EU:T:2022:379, n.os 41 e 47 e jurisprudência referida]. No caso em apreço, esta declaração, posterior em cerca de quinze anos à data do depósito da marca pedida, não contém nenhum indício da existência de um acordo contratual entre a recorrente (ou a sua antecessora Polmos) e a interveniente (ou a sua antecessora Diversa) nessa data. O mesmo se diga do excerto da enciclopédia em linha Wikipédia, datado de 9 de abril de 2009 e posterior de treze anos ao depósito da marca pedida.

85      Em quinto lugar, no que respeita à transformação fundamental do sistema político e económico na Polónia durante o período compreendido entre 1970 e 1990, há que salientar, como a Câmara de Recurso nos n.os 76 e 83 da decisão impugnada, que esta situação já não se verificava em 1996, no momento do depósito da marca pedida e que, em todo o caso, a Câmara de Recurso estava obrigada a limitar‑se aos elementos de prova apresentados pela recorrente, uma vez que a existência de uma relação contratual fiduciária de agente ou de representante não pode ser demonstrada por probabilidades ou presunções (v. n.o 53, supra).

86      À luz do que precede, há que concluir que não foi provado nenhum acordo contratual direto, mesmo implícito ou de facto, de cooperação comercial entre a recorrente (ou a sua antecessora) e a interveniente (ou a sua antecessora), pelo que não foi demonstrada nenhuma obrigação de confiança e de lealdade a cargo da interveniente (ou da sua antecessora) para com a recorrente (ou a sua antecessora).

87      Por conseguinte, a Câmara de Recurso não cometeu um erro de apreciação ao concluir, em substância, que a recorrente não conseguiu provar a existência de uma relação contratual fiduciária entre ela própria e a interveniente, quer no momento do depósito da marca pedida quer antes, que não cumpriu o ónus da prova que lhe incumbia para demonstrar a existência de um acordo contratual direto de agente ou de representante e que, portanto, não provou que um dos requisitos cumulativos previstos no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 estava preenchido no que respeita à marca francesa anterior n.o 95588457 e às marcas polacas anteriores n.os 62081 e 85811.

88      A este respeito, importa sublinhar que o facto de o segundo requisito relativo à existência de um acordo contratual de agente ou de representante não ser preenchido bastava para rejeitar a oposição, nos termos do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, quanto às marcas anteriores examinadas pela Câmara de Recurso no âmbito deste fundamento.

89      Daqui decorre que a Câmara de Recurso não violou o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 e, em especial, que não cometeu nenhum erro de apreciação na aplicação desta disposição.

90      Resulta igualmente do exposto, nomeadamente do n.o 63, supra, que a Câmara de Recurso examinou corretamente os factos e fundamentou amplamente a sua apreciação, pelo que não cometeu nenhuma violação de formalidades essenciais, em especial do artigo 95.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001 e do artigo 94.o, n.o 1, do mesmo regulamento.

91      A segunda alegação tem assim de ser afastada por ser improcedente.

92      Por conseguinte, não é necessário examinar a argumentação da interveniente segundo a qual, em substância e por diversas razões, nenhum dos direitos anteriores alegadamente invocados pela recorrente no ato de oposição, ao abrigo do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, foi adequadamente invocado e fundamentado, pelo que a oposição devia ter sido julgada inadmissível e o recurso no EUIPO devia ter sido logo julgado improcedente.

 Quanto à primeira alegação, relativa à omissão de exame da marca alemã não registada

93      Com a primeira alegação, a recorrente acusa a Câmara de Recurso de não ter examinado a marca alemã não registada com a forma de uma garrafa com uma canícula no âmbito do motivo de oposição previsto no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 e de não ter fundamentado a sua decisão a este respeito.

94      O EUIPO e a interveniente contestam os argumentos da recorrente.

95      No n.o 46 da decisão impugnada, no âmbito da sua apreciação do motivo de oposição enunciado no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, a Câmara de Recurso sublinhou que mesmo as marcas não registadas estavam abrangidas pelo conceito de «marca» na aceção desta disposição. Todavia, não fez expressamente referência a nenhuma marca alemã não registada.

96      Nos n.os 101 e 105 da decisão impugnada, no quadro da sua apreciação do motivo de oposição enunciado no artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 40/94, a Câmara de Recurso salientou que, no ato de oposição, a recorrente tinha identificado a marca alemã com a forma de uma garrafa com uma canícula (v. n.o 7, in fine, supra) como uma marca não registada no sentido deste artigo e que, nos motivos de oposição, tinha igualmente invocado que detinha direitos de marca não registados para a mesma marca em vários outros países europeus. No entanto, observou que, mesmo que os documentos apresentados mostrassem um comércio importante de vodka na Alemanha e na Polónia, nenhum elemento fazia especificamente referência ao direito anterior não registado, mas apenas a vodkas designadas por elementos nominativos.

97      Nos n.os 112 a 115 da decisão impugnada, ainda no âmbito do mesmo motivo, a Câmara de Recurso observou, à semelhança da Divisão de Oposição, que os elementos de prova apresentados não demonstravam de modo algum que a marca alemã não registada reivindicada tivesse efetivamente sido utilizada enquanto tal, nem que era reconhecida pelo público alemão como uma indicação clara da origem comercial dos produtos. Concluiu, portanto, que a oponente não tinha provado a utilização real dessa marca não registada, e ainda menos a utilização dessa marca, com alcance não apenas local, na vida comercial, antes do depósito da marca pedida, na Alemanha. Considerou que o mesmo se aplicava aos alegados direitos de marca não registados nos outros países europeus, relativamente aos quais a utilização efetiva da marca não registada reivindicada não tinha sido provada e o direito nacional aplicável não tinha sido mencionado. Dado que os requisitos necessários referidos no artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 40/94 não estavam preenchidos em relação a nenhum dos direitos de marca não registados que eram reivindicados, rejeitou igualmente a oposição por esse motivo.

98      A este respeito, antes de mais, há que salientar que a recorrente não explica em que medida a alegada omissão da Câmara de Recurso tem incidência no exame da existência de um acordo contratual de agente ou de representante. Em particular, a recorrente não afirmou nem demonstrou que o quadro jurídico e factual aplicável a esse direito anterior alegado seria diferente do relativo aos outros direitos anteriores examinados na segunda alegação do presente fundamento, pelo que o resultado do litígio no que respeita a este direito não pode ser diferente. A presente alegação é, portanto, inoperante.

99      Em todo o caso, esta alegação é igualmente destituída de fundamento.

100    É certo que importa ter em conta, tal como a Câmara de Recurso e a recorrente, que as marcas não registadas estão igualmente abrangidas pelo conceito de «marca» na aceção do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, na medida em que a lei do país de origem reconhece direitos deste tipo (v. n.o 42, supra). Além disso, segundo a recorrente, a proteção das marcas não registadas na Alemanha decorre da utilização de um sinal na vida comercial, desde que o sinal tenha adquirido reconhecimento como marca nos meios profissionais em causa [artigo 4.o, n.o 2, da Gesetz über den Schutz von Marken und sonstigen Kennzeichen (Markengesetz) (Lei sobre a proteção das marcas e outros sinais distintivos), de 25 de outubro de 1994 (BGBl. 1994 I, p. 3082), junta à petição como anexo K21].

101    No entanto, deve notar‑se que a recorrente não contesta as apreciações da Câmara de Recurso nos n.os 112 a 115 da decisão impugnada (v. n.o 97, supra), efetuadas a título do artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 40/94, as quais são definitivas (v. n.o 27, supra).

102    De resto, nenhum elemento dos autos põe em causa estas apreciações, na medida em que não foi demonstrado que as condições enunciadas no direito alemão para a proteção da marca não registada alegada pela recorrente estavam preenchidas, pelo que a existência desta marca alegada não foi provada.

103    Estas apreciações, não contestadas e não postas em causa, implicam necessariamente a rejeição da oposição, nos termos tanto do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 como do artigo 8.o, n.o 4, do mesmo regulamento no que respeita à marca alemã não registada reivindicada.

104    Daqui resulta que a Câmara de Recurso não violou o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 a este respeito.

105    Além disso, embora seja verdade que teria sido desejável que a Câmara de Recurso, no âmbito do seu exame do motivo de oposição enunciado no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, tivesse feito expressamente referência às suas apreciações relativas à inexistência da marca alemã não registada alegada pela recorrente, conforme formuladas nos n.os 112 a 115 da decisão impugnada à luz do artigo 8.o, n.o 4, do mesmo regulamento, não é menos verdade que essa omissão redacional não tem qualquer incidência na legalidade da referida decisão nem no resultado do presente litígio, uma vez que está demonstrado, e não foi contestado pela recorrente, que a existência da marca alemã não registada alegada pela recorrente não foi fundamentada e que essa alegação não fundamentada de um direito não pode servir de base a uma oposição, nos termos do artigo 8.o, n.o 3, do referido regulamento.

106    Por conseguinte, a Câmara de Recurso não pode ser criticada por não ter examinado o motivo de oposição enunciado no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 no que respeita à marca alemã não registada com a forma de uma garrafa com uma canícula.

107    Além disso, a fundamentação expressamente formulada pela Câmara de Recurso nos n.os 112 a 115 da decisão impugnada relativamente à inexistência da marca alemã não registada alegada pela recorrente permitiu a esta última conhecer os fundamentos da decisão impugnada, a fim de poder defender os seus direitos. De resto, a Câmara de Recurso examinou devidamente os factos apresentados a este respeito pela recorrente.

108    Daqui resulta que a Câmara de Recurso examinou corretamente os factos e fundamentou suficientemente a sua apreciação, pelo que não cometeu nenhuma violação de formalidades essenciais, em especial do artigo 95.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001 e do artigo 94.o, n.o 1, do mesmo regulamento.

109    A primeira alegação deve, portanto, ser rejeitada.

 Quanto à terceira alegação, relativa a um erro de apreciação do alcance dos direitos de propriedade industrial abrangidos pelos acordos de importação

110    Com a terceira alegação, a recorrente critica a Câmara de Recurso por ter examinado os factos de maneira errada no que respeita ao alcance dos direitos de propriedade industrial abrangidos pela relação de agente ou de representante entre as partes, em particular os direitos relativos à marca tridimensional com a forma de uma garrafa com uma canícula, e não ter fundamentado a sua conclusão de que o teor dos acordos de importação (v. n.o 31, supra) excluía a marca em causa. Em particular, sustenta que a Câmara de Recurso não teve em conta a redação do artigo 7.o, primeiro parágrafo, do acordo de importação de 8 de maio de 1987 [K8‑K8a], no qual a utilização dos termos «incluindo» deveria ser entendida como indicativa de uma lista não exaustiva.

111    O EUIPO e a interveniente contestam os argumentos da recorrente.

112    Nos n.os 87 a 91 da decisão impugnada, «por uma questão de exaustividade», a Câmara de Recurso declarou proceder a um exame aprofundado dos elementos de prova e concluiu que nenhum dos acordos contratuais apresentados fazia expressamente referência às marcas anteriores em causa, a saber, às marcas polacas anteriores n.os 62081 e 85811 e à marca francesa anterior n.o 95588457. Salientou que o primeiro acordo [K4] celebrado para o período compreendido entre 1975 e 1979 consistia num «acordo de importação» (sendo a Diversa a importadora) para as marcas de vodka Wyborowa, Krakus e Żubrówka, indicando que a «Agros proteger[ia] as suas marcas e/ou os seus direitos de apresentação», mas sem nenhuma especificação dessas marcas e desses direitos. Os acordos de importação posteriores, de 10 de maio de 1983, de 8 de maio de 1987 e de 29 de outubro de 1993 [K5 a K11], celebrados pela Diversa ou pela interveniente, já não faziam referência à marca Żubrówka, mas a outras marcas de vodka como Wyborowa e Grasovka, depois, a partir de 1987, a «outros elementos de propriedade industrial, entre os quais etiquetas, emblemas e elementos de embalagem relativos a essas vodkas», sem, mais uma vez, precisar esses «outros elementos de propriedade industrial». Considerou que era difícil determinar se esta formulação devia estar ligada às marcas da recorrente, mas que, todavia, os termos «desenhos ou modelos, emblemas, rótulos e embalagens», pelo seu significado literal, faziam todos referência aos elementos exteriores de um produto, e não ao posicionamento de uma canícula numa garrafa, pelo que já esta simples redação não abrangia a marca em causa. Sublinhou que teria sido desejável que os acordos apresentados pela recorrente fizessem expressamente referência aos registos das marcas polacas ou francesas supramencionadas, ou, pelo menos, à representação dessas marcas (v. n.o 7, supra), mas que isso não se verificou.

113    A este respeito, antes de mais, há que salientar que a presente alegação é dirigida contra uma apreciação superabundante exposta pela Câmara de Recurso «por uma questão de exaustividade». Por conseguinte, a alegação que contesta essa apreciação não é suscetível de afetar o dispositivo da decisão impugnada e deve ser rejeitada como inoperante [v., neste sentido, Acórdãos de 30 de abril de 2013, Boehringer Ingelheim International/IHMI (RELY‑ABLE), T‑640/11, não publicado, EU:T:2013:225, n.os 27 e 28, e de 7 de setembro de 2022, Peace United/EUIPO — 1906 Collins (MY BOYFRIEND IS OUT OF TOWN), T‑699/21, não publicado, EU:T:2022:528, n.os 46 e 47].

114    Além disso, a presente alegação deve igualmente ser julgada inoperante, na medida em que a rejeição da segunda alegação do primeiro fundamento é suficiente para rejeitar a oposição nos termos do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 no que respeita às marcas anteriores examinadas pela Câmara de Recurso no âmbito deste fundamento (v. n.o 88, supra).

115    Em todo o caso, esta alegação é igualmente destituída de fundamento, uma vez que assenta numa leitura errada da decisão impugnada.

116    Embora seja exato que a Câmara de Recurso declarou que teria sido desejável uma referência a registos de marcas, nem por isso se limitou a demonstrar que não havia referência expressa e específica às marcas nos acordos apresentados. Saliente‑se que, nos n.os 87 a 91 da decisão impugnada (v. n.o 112, supra), baseou igualmente as suas conclusões numa avaliação aprofundada do conjunto dos acordos apresentados, explicando por que razão as marcas, direitos ou elementos de direitos de propriedade industrial respetivos não estavam especificados e por que razão o teor desses acordos não permitia identificar claramente aquilo a que faziam referência.

117    De resto, a própria recorrente expõe que, para serem protegidos, os «interesses» dos titulares de marcas devem ser suficientemente identificáveis, pelo menos através de uma referência geral, para as partes em causa. Ora, não é o que ocorre no caso em apreço.

118    Por outro lado, pouco importa determinar se o termo «indem», na versão original em alemão do artigo 7.o, n.o 1, do acordo de importação de 8 de maio de 1987, significa «incluindo», como alega a recorrente, ou antes «correspondente a» ou «sob a forma de», como alega a interveniente, e, logo, se a lista dos «outros elementos de propriedade industrial[,] incluindo [/sob a forma] de rótulos, emblemas e elementos de embalagem ligados a essas vodkas» é indicativa, e, portanto, não exaustiva, ou exclusiva.

119    Note‑se, em todo o caso, que nenhuma marca com a forma de uma garrafa com uma canícula é claramente identificável na redação dessa cláusula. Como observou corretamente a Câmara de Recurso no n.o 90 da decisão impugnada, os termos «etiquetas, emblemas e elementos de embalagem», pelo seu significado literal, fazem todos referência aos elementos exteriores de um produto, e não ao posicionamento de uma canícula numa garrafa, pelo que essa redação não pode abranger tal marca.

120    Foi, portanto, com razão que a Câmara de Recurso concluiu que nenhum dos acordos contratuais apresentados fazia expressamente referência a marcas anteriores com a forma de uma garrafa com uma canícula, nomeadamente às marcas polacas anteriores n.os 62081 e 85811 e à marca francesa anterior n.o 95588457.

121    Daqui resulta que a Câmara de Recurso não violou o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 e, em especial, que não cometeu nenhum erro de apreciação na aplicação desta disposição.

122    Decorre igualmente do que precede, em especial dos n.os 87 a 91 da decisão impugnada (v. n.os 112 e 116, supra), que a Câmara de Recurso examinou corretamente os factos e fundamentou a sua apreciação, em conformidade com o artigo 95.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001 e o artigo 94.o, n.o 1, do mesmo regulamento.

123    A terceira alegação deve, portanto, ser julgada improcedente.

124    Resulta de tudo o que precede que a Câmara de Recurso não violou formalidades essenciais, em particular o artigo 95.o, n.o 1, e o artigo 94.o, n.o 1, do Regulamento 2017/1001, lidos em conjugação com o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94.

125    Portanto, o primeiro fundamento deve ser julgado integralmente improcedente.

 Quanto ao segundo fundamento, baseado em violação do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94

126    Com o segundo fundamento, a recorrente acusa, em substância, a Câmara de Recurso de ter cometido um erro de direito na sua interpretação das condições da relação de agente ou de representante previstas no artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, ao limitar a aplicação deste artigo apenas aos casos em que os direitos anteriores foram explícita e especificamente identificados num contrato escrito que forma essa relação. Segundo ela, a Câmara de Recurso aplicou assim um nível de prova inapropriado, pois esta disposição devia ser objeto de interpretação extensiva, no sentido de que abrange todos os tipos de relações, independentemente da questão de saber se uma obrigação geral de confiança e de lealdade face aos interesses do titular da marca foi imposta expressa ou implicitamente, e no sentido de que abrange todos os tipos de «interesses» deste titular respeitantes à relação entre as partes. A obrigação geral de confiança e de lealdade não deve, portanto, ser limitada pela exigência de uma especificação explícita de todos os elementos abrangidos.

127    O EUIPO e a interveniente contestam os argumentos da recorrente.

128    Antes de mais, importa recordar que os elementos de prova juntos aos autos não demonstram que a recorrente (ou as suas antecessoras) tenha alguma vez tido um acordo contratual direto com a interveniente (ou com a sua antecessora) (v. n.os 63 a 92, supra). Assim, na falta de qualquer prova da existência de um acordo contratual direto (expresso ou tácito, escrito ou oral) entre a recorrente e a interveniente, contrariamente ao que alega a primeira, não existe nenhum fundamento, nos termos do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, para impor uma obrigação geral de confiança e de lealdade entre elas, enquanto «produtora» e «importadora», no âmbito da qual se poderia colocar a questão do caráter explícito ou implícito da determinação dos elementos abrangidos. O presente fundamento é, portanto, inoperante.

129    Em todo o caso, há que salientar, à semelhança da interveniente, que este fundamento assenta numa leitura errada da decisão impugnada e carece de base factual.

130    Com efeito, a Câmara de Recurso não afirmou de modo algum que a aplicação do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 exigia que o acordo contratual entre o titular e o agente fizesse referência explícita e especificamente a todas as marcas abrangidas pela sua relação comercial, o que, de resto, correria o risco de ser rejeitado pelo Tribunal Geral.

131    Acresce que, sendo certo que qualquer relação contratual entre duas partes relativa à distribuição de produtos pode, em princípio, ser suficiente para a aplicação do artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94, é necessário, todavia, que essas partes saibam clara e precisamente quais são as marcas para as quais o titular alega que beneficia de proteção. Embora este ponto seja habitualmente claro no caso de marcas nominativas e figurativas utilizadas para o produto distribuído, é‑o menos para outros tipos de marcas não tradicionais, tais como marcas tridimensionais ou de posição, como as invocadas pela recorrente. Para que tais marcas não tradicionais estejam cobertas pela relação contratual, é desejável que o titular indique clara e precisamente ao agente que reivindica e detém direitos sobre essas marcas para que estes sejam conhecidos do agente. Uma menção específica num acordo escrito constitui a forma mais idónea de o assegurar.

132    Ora, no caso em apreço, verifica‑se que nenhum elemento dos autos prova que a recorrente (ou uma das suas antecessoras) tenha informado a interveniente da proteção especial que reivindicava para uma marca tridimensional que representa uma garrafa com uma canícula ou para uma marca de posição que consiste numa canícula dentro de uma garrafa, conforme abrangida pela marca pedida.

133    Por conseguinte, mesmo que a Câmara de Recurso tivesse pretendido afirmar que os acordos que estabelecem a relação contratual não faziam claramente menção ou referência às marcas sobre as quais o titular reivindicava direitos, tal afirmação teria sido exata no caso em apreço, uma vez que não resulta dos autos que a recorrente (ou as suas antecessoras) tenha reivindicado clara e precisamente direitos sobre uma marca que representa uma garrafa com uma canícula no âmbito de uma relação contratual com a interveniente (ou a sua antecessora), embora isso fosse desejável para tal marca não tradicional.

134    Daqui resulta que a Câmara de Recurso não violou o artigo 8.o, n.o 3, do Regulamento n.o 40/94 a este respeito.

135    Por conseguinte, há que julgar o segundo fundamento inoperante e, em todo o caso, improcedente.

136    Atendendo a todas as considerações que precedem, há que rejeitar o recurso na íntegra.

 Quanto às despesas

137    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

138    Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas, em conformidade com os pedidos do EUIPO e da interveniente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A CEDC International sp. z o.o. é condenada nas despesas.

Costeira

Kancheva

Öberg

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 28 de junho de 2023.

Assinaturas


Índice




*      Língua do processo: inglês.