Language of document : ECLI:EU:T:2024:125

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção Alargada)

28 de fevereiro de 2024 (*)

«Auxílios de Estado — Financiamento público da ligação fixa rodoferroviária do Estreito de Fehmarn — Auxílio concedido pela Dinamarca à Femern — Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado interno — Recurso de anulação — Caráter destacável — Admissibilidade — Conceito de “empresa” — Conceito de “atividade económica” — Atividades de construção e exploração de uma ligação fixa rodoferroviária — Afetação das trocas comerciais entre os Estados‑Membros e distorção da concorrência»

No processo T‑364/20,

Reino da Dinamarca, representado por C. Maertens e M. Søndahl Wolff, na qualidade de agentes, assistidas por R. Holdgaard e J. Pinborg, advogados,

recorrente,

apoiado pelo

Reino da Bélgica, representado por L. Van den Broeck, na qualidade de agente, assistida por J. Vanden Eynde, advogado,

por

República Federal da Alemanha, representada por J. Möller e R. Kanitz, na qualidade de agentes,

e por

GrãoDucado do Luxemburgo, representado por A. Germeaux e T. Schell, na qualidade de agentes,

intervenientes,

contra

Comissão Europeia, representada por S. Noë, na qualidade de agente,

recorrida,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção Alargada),

composto, na deliberação, por: D. Spielmann, presidente, U. Öberg, R. Mastroianni, M. Brkan (relatora) e I. Gâlea, juízes,

secretária: H. Eriksson, administradora,

vistos os autos,

após a audiência de 8 de novembro de 2022,

profere o presente

Acórdão

1        Com o seu recurso baseado no artigo 263.o TFUE, o Reino da Dinamarca pede a anulação da Decisão C(2020) 1683 final da Comissão, de 20 de março de 2020, relativa ao auxílio estatal SA.39078 — 2019/C (ex 2014/N) concedido pela Dinamarca à Femern A/S (JO 2020, L 339, p. 1), porquanto, no primeiro período do seu artigo 2.o, qualificou de auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, as medidas que consistem em injeções de capital e numa combinação de empréstimos estatais e de garantias estatais a favor da Femern A/S (a seguir «decisão recorrida»).

I.      Antecedentes do litígio

A.      Projeto de ligação fixa do Estreito de Fehmarn

2        O projeto de ligação fixa do Estreito de Fehmarn entre a Dinamarca e a Alemanha (a seguir «projeto») foi aprovado pelo Tratado entre o Reino da Dinamarca e a República Federal da Alemanha relativo à ligação fixa do Estreito de Fehmarn, assinado em 3 de setembro de 2008 e ratificado em 2009 (a seguir «Tratado sobre o Estreito de Fehmarn»).

3        O projeto consiste, por um lado, num túnel ferroviário e rodoviário (a seguir «ligação fixa») e, por outro, em ligações rodoviárias com o interior na Dinamarca (a seguir «ligações rodoviárias») e em ligações ferroviárias com o interior na Dinamarca (a seguir «ligações ferroviárias») (a seguir, conjuntamente, «ligações rodoviárias e ferroviárias com o interior»).

4        A ligação fixa consiste num túnel submerso no mar Báltico entre Rødby, na ilha de LolLand, na Dinamarca, e Puttgarden, na Alemanha, com um comprimento de cerca de 19 km, que conterá uma via‑férrea eletrificada e uma autoestrada. As ligações ferroviárias incluirão o alargamento e a melhoria da ligação ferroviária existente entre Ringsted (Dinamarca) e Rødby, com cerca de 120 km de comprimento, pertencente à Banedanmark, o gestor público da infraestrutura ferroviária do Estado dinamarquês.

5        O projeto foi precedido de uma fase de planeamento. O financiamento desta fase, no que diz respeito à ligação fixa e às ligações rodoviárias e ferroviárias com o interior, foi notificado à Comissão Europeia. Com a sua Decisão de 13 de julho de 2009 no processo N 157/2009 — Financiamento da fase de planeamento da ligação fixa do Estreito de Fehmarn mencionada no Jornal Oficial da União Europeia de 27 de agosto de 2009 (JO 2009, C 202, p. 2), a Comissão concluiu, por um lado, que as medidas relacionadas com o financiamento do planeamento do projeto poderiam não constituir um auxílio estatal, uma vez que a Femern tinha agido na qualidade de autoridade pública e, por outro, que estas medidas seriam, em todo o caso, compatíveis com o mercado interno. Por conseguinte, decidiu não levantar objeções na aceção do artigo 4.o, n.os 2 e 3, do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho, de 22 de março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [108.o TFUE] (JO 1999, L 83, p. 1).

6        Na sequência de uma atualização a preços fixos de 2015 fornecida pelas autoridades dinamarquesas, o custo total do planeamento e da construção da ligação fixa foi estimado em 52,6 mil milhões de coroas dinamarquesas (DKK) (cerca de 7,1 mil milhões de euros) e os custos relacionados com o planeamento e a construção da melhoria das ligações rodoviárias e ferroviárias com o interior são estimados em 9,5 mil milhões de DKK (cerca de 1,3 mil milhões de euros), ou seja, um custo total do projeto estimado em 62,1 mil milhões de DKK (cerca de 8,4 mil milhões de euros).

7        Em conformidade com o artigo 6.o do Tratado sobre o Estreito de Fehmarn e com a lov n.o 575 om anlæg og drift af en fast forbindelse over Femern Bælt med tilhørende Landanlæg i Danmark (Lei n.o 575 relativa à Construção e à Exploração da Ligação Fixa do Estreito de Fehmarn e das Ligações com o Interior na Dinamarca), de 4 de maio de 2015 (a seguir «Lei relativa à Construção»), duas empresas públicas foram encarregadas da execução do projeto.

8        A primeira, a Femern, criada em 2005, está encarregada do financiamento, construção e exploração da ligação fixa. A segunda, a Femern Landanlæg A/S, criada em 2009, foi designada para gerir a construção e a exploração das ligações com o interior na Dinamarca. A Femern Landanlæg é uma filial da Sund & Bælt Holding A/S, pertencente ao Estado dinamarquês. A Femern tornou‑se a filial da Femern Landanlæg na sequência da constituição desta última.

9        As obras de construção da ligação fixa são efetuadas, por conta da Femern, no âmbito de contratos de construção sujeitos a processos relativos a contratos públicos.

10      A construção dos melhoramentos necessários das ligações rodoviárias é empreendida pela Direção dinamarquesa das Estradas por conta do Estado dinamarquês e é financiada pela Femern Landanlæg. As ligações rodoviárias farão parte da rede geral de infraestruturas rodoviárias dinamarquesa, financiada, explorada e mantida pela Direção‑Geral das Estradas da Dinamarca. A construção e a exploração das ligações ferroviárias são asseguradas pela Banedanmark por conta do Estado dinamarquês e financiadas pela Femern Landanlæg.

11      Segundo a notificação do Reino da Dinamarca de 22 de dezembro de 2014, dirigida à Comissão em aplicação do artigo 108.o, n.o 3, TFUE, o projeto é financiado pela Femern e pela Femern Landanlæg, graças a injeções de capital, a empréstimos garantidos pelo Estado e, em alternativa, a empréstimos concedidos pelas autoridades dinamarquesas. A partir da entrada em funcionamento da ligação fixa, a Femern cobrará as taxas aos utilizadores para reembolsar a sua dívida e pagará à Femern Landanlæg dividendos que esta utilizará para reembolsar a sua própria dívida. A Femern Landanlæg também receberá 80 % das taxas de utilização pagas pelos operadores ferroviários pela utilização das ligações ferroviárias, cobradas pela Banedanmark, devido à partilha da propriedade destas ligações ferroviárias entre a primeira e a segunda.

B.      Factos anteriores ao litígio

12      No decurso de 2014 e 2015, a Comissão recebeu cinco denúncias, a primeira das quais apresentada em 5 de junho de 2014, acusando o Reino da Dinamarca de ter concedido à Femern e à Femern Landanlæg auxílios estatais ilegais e incompatíveis com o mercado interno.

13      Durante o mesmo período, os serviços da Comissão enviaram vários pedidos de informações às autoridades dinamarquesas, que responderam e forneceram informações complementares em várias ocasiões.

14      Por carta de 22 de dezembro de 2014, em conformidade com o artigo 108.o, n.o 3, TFUE, as autoridades dinamarquesas notificaram à Comissão o modelo de financiamento do projeto.

15      Em 23 de julho de 2015, a Comissão adotou a Decisão C(2015) 5023 final, relativa ao auxílio estatal SA.39078 (2014/N) (Dinamarca), sobre o financiamento do projeto de ligação fixa do Estreito de Fehmarn, mencionada no Jornal Oficial de 2 de outubro de 2015 (JO 2015, C 325, p. 5; a seguir «Decisão relativa à Construção»). A parte dispositiva desta decisão divide‑se em duas partes.

16      Na primeira parte, a Comissão tinha concluído que as medidas concedidas à Femern Landanlæg para o planeamento, a construção e a exploração das ligações rodoviárias e ferroviárias com o interior não constituem auxílios estatais na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

17      Na segunda parte, a Comissão tinha concluído que as medidas concedidas à Femern para o planeamento, a construção e a exploração da ligação fixa, mesmo nos casos em que constituíssem auxílios estatais na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, eram compatíveis com o mercado interno ao abrigo do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE.

18      Assim, no termo da fase preliminar de investigação, a Comissão tinha decidido não levantar objeções relativamente às medidas notificadas pelas autoridades dinamarquesas.

19      Por Acórdãos de 13 de dezembro de 2018, Scandlines Danmark e Scandlines DeutschLand/Comissão (T‑630/15, não publicado, EU:T:2018:942), e de 13 de dezembro de 2018, Stena Line Scandinavia/Comissão (T‑631/15, não publicado, EU:T:2018:944), o Tribunal Geral anulou a Decisão relativa à Construção na parte em que a Comissão tinha decidido não levantar objeções em relação às medidas concedidas pelo Reino da Dinamarca à Femern para o planeamento, construção e exploração da ligação fixa e negou provimento ao recurso quanto ao restante.

20      Antes de mais, no que respeita aos financiamentos públicos concedidos à Femern Landanlæg para o financiamento do planeamento, da construção e da exploração das ligações ferroviárias, o Tribunal Geral julgou improcedentes os fundamentos segundo os quais a Comissão cometeu erros de facto e de direito ao considerar que estes financiamentos não constituíam auxílios estatais, uma vez que não eram suscetíveis de falsear a concorrência ou de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

21      Em seguida, no que respeita aos financiamentos públicos concedidos à Femern para a construção e exploração da ligação fixa, o Tribunal Geral deu provimento aos recursos com o fundamento de que a Comissão não tinha cumprido a obrigação que lhe incumbe por força do artigo 108.o, n.o 3, TFUE de dar início ao procedimento formal de investigação devido à existência de dificuldades sérias.

C.      Procedimento administrativo

22      Na sequência da prolação dos Acórdãos de 13 de dezembro de 2018, Scandlines Danmark e Scandlines DeutschLand/Comissão (T‑630/15, não publicado, EU:T:2018:942), e de 13 de dezembro de 2018, Stena Line Scandinavia/Comissão (T‑631/15, não publicado, EU:T:2018:944), confirmados pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 6 de outubro de 2021, Scandlines Danmark e Scandlines DeutschLand/Comissão (C‑174/19 P e C‑175/19 P, EU:C:2021:801), a Comissão, por carta de 14 de junho de 2019, informou as autoridades dinamarquesas da sua decisão de dar início a um procedimento formal de investigação, previsto no artigo 108.o, n.o 2, TFUE, das medidas autorizadas a favor da Femern para a parte do projeto relativa ao financiamento da ligação fixa (a seguir «decisão de início do procedimento»).

23      A decisão de início do procedimento foi publicada em 5 de julho de 2019 no Jornal Oficial (JO 2019, C 226, p. 5). Na referida decisão, com base nas informações disponíveis aquando do início do procedimento formal de investigação, a Comissão manifestou, nomeadamente, as suas dúvidas quanto à possibilidade de considerar que a Femern exerce uma atividade económica.

D.      Decisão recorrida

24      Em 20 de março de 2020, a Comissão adotou a decisão recorrida.

25      A decisão recorrida abrange as medidas concedidas à Femern para o planeamento, a construção e a exploração da ligação fixa. Em contrapartida, ao contrário da Decisão relativa à Construção, a decisão recorrida não diz respeito às medidas autorizadas a favor da Femern Landanlæg relativas ao financiamento das ligações rodoviárias e ferroviárias com o interior.

26      Segundo o artigo 1.o da decisão recorrida, as medidas que consistem na amortização dos ativos, no reporte de prejuízos fiscais, no regime de tributação conjunta, nas taxas ferroviárias, na utilização gratuita de propriedade estatal e nas garantias estatais sobre produtos derivados não constituem um auxílio estatal a favor da Femern na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

27      Em contrapartida, segundo o artigo 2.o da decisão recorrida, as medidas que consistem em injeções de capital e numa combinação de empréstimos estatais e garantias estatais a favor da Femern, que a Dinamarca, pelo menos em parte, aplicou ilegalmente, constituem um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Na sequência da alteração destas medidas tal como exposta na notificação revista que se seguiu à decisão de início do procedimento, estas são consideradas compatíveis com o mercado interno com base no artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE.

E.      Pedidos das partes

28      O Reino da Dinamarca, apoiado pelo Reino da Bélgica, pela República Federal da Alemanha e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular o artigo 2.o da decisão recorrida na parte em que as medidas que consistem em injeções de capital e numa combinação de empréstimos estatais e de garantias estatais a favor da Femern, em parte aplicadas ilegalmente, constituem um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE;

–        condenar a Comissão nas despesas.

29      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        julgar o recurso inadmissível ou, subsidiariamente, improcedente;

–        condenar o Reino da Dinamarca nas despesas.

II.    Questão de direito

A.      Quanto à admissibilidade

30      Sem arguir uma exceção de inadmissibilidade por requerimento separado com base no artigo 130.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a Comissão sustenta que o recurso é inadmissível. Segundo a Comissão, o pedido de anulação parcial relativo ao primeiro período do artigo 2.o da decisão recorrida, segundo o qual as medidas que consistem em injeções de capital e numa combinação de empréstimos estatais e garantias estatais a favor da Femern constituem um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, é inadmissível pelo facto de o segundo período do artigo 2.o da decisão recorrida, ou seja, a constatação de que as referidas medidas são compatíveis com o mercado interno, não ser destacável do primeiro período do referido artigo.

31      O Reino da Dinamarca, apoiado pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, contesta esta inadmissibilidade.

32      Importa recordar que o artigo 263.o TFUE estabelece uma nítida distinção entre o direito de recurso de anulação das instituições da União Europeia e dos Estados‑Membros, por um lado, e o das pessoas singulares ou coletivas, por outro, atribuindo o segundo parágrafo deste artigo, aos Estados‑Membros, entre outros, o direito de interpor recurso de anulação por ilegalidade das decisões da Comissão, sem fazer depender o exercício desse direito da prévia justificação de um interesse em agir. Contrariamente às pessoas singulares ou coletivas, um Estado‑Membro não tem, pois, de demonstrar que um ato da Comissão por ele impugnado produz efeitos na sua própria esfera jurídica para que o seu recurso seja admissível (v., neste sentido, Despacho de 27 de novembro de 2001, Portugal/Comissão, C‑208/99, EU:C:2001:638, n.os 22 e 23; Acórdão de 20 de setembro de 2019, Alemanha/ECHA, T‑755/17, EU:T:2019:647, n.o 334).

33      Contudo, para que um ato da Comissão possa ser objeto de recurso de anulação, é necessário que se destine à produção de efeitos jurídicos, mesmo se, no caso em que seja um Estado‑Membro a pretender interpor um tal recurso, estes efeitos não se produzam na sua esfera jurídica (v., neste sentido, Despacho de 27 de novembro de 2001, Portugal/Comissão, C‑208/99, EU:C:2001:638, n.o 24).

34      No presente caso, importa constatar que o Reino da Dinamarca pede a anulação do artigo 2.o da decisão recorrida unicamente na parte em que as medidas que consistem em injeções de capital e numa combinação de empréstimos estatais e garantias estatais a favor da Femern, em parte aplicadas ilegalmente, constituem um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Daqui resulta que, como sublinha a Comissão, o presente recurso não visa o segundo período do artigo 2.o da decisão recorrida, ou seja, a constatação de que as referidas medidas são compatíveis com o mercado interno.

35      Ora, há que considerar que, no âmbito de um recurso de anulação de uma decisão que declara medidas de auxílio compatíveis com o mercado interno, por mais importante que seja a qualificação da medida como auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, a declaração de compatibilidade não deixa de ser destacável, a título provisório, pelo que uma anulação parcial é possível e justificada pela circunstância de a referida declaração ser favorável ao Estado‑Membro (v., neste sentido e por analogia, Acórdão de 23 de outubro de 1974, Transocean Marine Paint Association/Comissão, 17/74, EU:C:1974:106, n.o 21).

36      Com efeito, em caso de anulação que tenha por objeto, incluindo a compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno, não se pode excluir que a Comissão, numa nova decisão, conclua por um auxílio estatal incompatível. Por conseguinte, não se pode exigir a um Estado‑Membro que os seus pedidos destinados à anulação de uma decisão que declara um auxílio compatível com o mercado interno visem igualmente a parte do dispositivo de uma decisão através da qual as medidas são declaradas compatíveis com o mercado interno. Além disso, erros na qualificação de medidas como auxílios estatais na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE não implicam necessariamente que a declaração de compatibilidade enferme de um erro de apreciação e seja desprovida de efeitos jurídicos. Pode ser esse o caso, nomeadamente, quando só uma parte das medidas tenha sido erradamente qualificada de auxílio estatal, mas se verifique que a Comissão qualificou corretamente as outras medidas de auxílios estatais. Em tal hipótese, na expectativa de uma nova decisão da Comissão, a anulação parcial do ato impugnado permite ao Estado‑Membro prosseguir o pagamento dos financiamentos concedidos a título das medidas cuja qualificação como auxílio estatal não padece de erro e para os quais a declaração de compatibilidade continua, assim, a produzir os seus efeitos.

37      Por conseguinte, a qualificação de medidas nacionais como auxílios estatais na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e o exame da compatibilidade de medidas de auxílio com o mercado interno constituem apreciações de natureza diferente que, à luz da admissibilidade do presente recurso do Estado‑Membro em causa, devem ser consideradas apreciações jurídicas autónomas. Daqui resulta que, tendo em conta as circunstâncias do caso em apreço, a argumentação da Comissão relativa ao caráter não destacável dos dois períodos do artigo 2.o da decisão recorrida, pelo facto de a qualificação de auxílio estatal ser a premissa necessária e lógica da sua compatibilidade, deve ser rejeitada.

38      Por outro lado, o argumento da Comissão de que o recurso de anulação não teria nenhum efeito útil, a menos que o Tribunal Geral anulasse todo o artigo 2.o da decisão recorrida, o que, todavia, iria além dos pedidos do Reino da Dinamarca, deve ser rejeitado. Com efeito, em aplicação do artigo 266.o TFUE, a instituição de que emane o ato anulado, deve tomar as medidas necessárias à execução do acórdão de anulação. Por conseguinte, se o presente recurso fosse julgado procedente e conduzisse à anulação parcial do ato impugnado, incumbiria à Comissão assegurar a sua execução.

39      Resulta das considerações precedentes que o presente recurso deve ser julgado admissível.

B.      Quanto ao mérito

40      Em apoio do seu recurso, o Reino da Dinamarca invoca dois fundamentos, relativos, por um lado, ao facto de a Comissão ter concluído erradamente que o financiamento da Femern constitui um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE e, por outro, ao facto de a Comissão ter cometido um erro de apreciação ao declarar que a Femern exerce uma atividade económica em concorrência com terceiros antes da entrada em funcionamento da ligação fixa.

41      O primeiro fundamento subdivide‑se em quatro partes através das quais o Reino da Dinamarca considera que, na decisão recorrida, a Comissão concluiu erradamente, primeiro, que as atividades da Femern não estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público, segundo, que a Femern presta serviços de transporte num mercado em concorrência com outros operadores, terceiro, que a Femern é um operador económico que prossegue uma lógica comercial e, quarto, que o financiamento da Femern falseia a concorrência e afeta as trocas comerciais entre os Estados‑Membros. O segundo fundamento é relativo a uma argumentação pela qual o Reino da Dinamarca contesta, em substância, que as atividades da Femern possam ser consideradas de natureza económica antes de a ligação fixa estar operacional.

42      Uma vez que as três primeiras partes do primeiro fundamento e o segundo fundamento dizem respeito à qualificação das atividades da Femern como atividades de natureza económica, o Tribunal Geral considera oportuno examiná‑las antes de analisar a quarta parte do primeiro fundamento que diz respeito às condições relativas à distorção da concorrência e à afetação das trocas comerciais entre os Estados‑Membros, previstas no artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

1.      Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa à falta de ligação das atividades da Femern ao exercício de prerrogativas de poder público

43      Na primeira parte do primeiro fundamento, o Reino da Dinamarca invoca três acusações. Primeiro, a Comissão é acusada de ter interpretado restritivamente o conceito de «atividade abrangida pela autoridade pública ou que está ligada ao exercício de prerrogativas de poder público». Segundo, a Comissão atribuiu erradamente importância ao facto de um operador privado assegurar serviços suscetíveis de serem considerados uma alternativa às atividades da Femern. Terceiro, a Comissão não teve em conta informações disponíveis que atestam que determinadas atividades da Femern estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

a)      Quanto à primeira acusação, relativa a uma alegada interpretação demasiado restritiva do conceito de «atividade abrangida pela autoridade pública ou que está ligada ao exercício de prerrogativas de poder público»

44      O Reino da Dinamarca, apoiado pelo Reino da Bélgica e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, alega, em substância, que a Comissão adotou uma interpretação demasiado restritiva do conceito de «prerrogativas de poder público» ao limitá‑las às que estão ligadas às funções essenciais do Estado. Mais especificamente, o Reino da Dinamarca, apoiado pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, considera que resulta da jurisprudência que o exercício de prerrogativas de poder público não se limita apenas às funções essenciais do Estado, que apenas são um exemplo entre outras atividades que fazem tipicamente parte dessas prerrogativas.

45      Além disso, o Reino da Dinamarca considera que a Comissão não teve em conta o ponto 13 da sua Comunicação sobre a noção de auxílio estatal nos termos do artigo 107.o, n.o 1, [TFUE] (JO 2016, C 262, p. 1 a seguir «Comunicação sobre a noção de auxílio estatal»). Segundo o Reino da Dinamarca, daqui decorre que um Estado é livre de definir as atividades que se enquadram nas prerrogativas de poder público e as que não estão abrangidas por estas prerrogativas. Assim, o Reino da Dinamarca sustenta que o que é determinante para demonstrar a existência de tais prerrogativas é o facto de estarem abrangidas pelas prerrogativas das autoridades públicas tal como estão organizadas concretamente no Estado‑Membro em causa. No caso em apreço, o Reino da Dinamarca considera que as atividades de construção e de exploração das infraestruturas rodoviárias e ferroviárias, tal como estão organizadas na Dinamarca, implicam que se trate de atividades ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público, incluindo quando são exercidas na ligação fixa pertencente a uma entidade pública como a Femern.

46      Do mesmo modo, o Reino da Dinamarca alega, em substância, que, para determinar se as atividades da Femern implicavam prerrogativas de poder público, há que ter em conta a circunstância de serem confiadas a esta entidade missões de serviço público que não podem ser asseguradas por operadores privados. A este respeito, segundo o Reino da Bélgica, para determinar se o exercício de uma atividade implica o recurso a prerrogativas de poder público, há que ter em conta a prossecução de um objetivo de interesse geral que não visa apenas a rentabilidade da atividade.

47      Por outro lado, o Reino da Bélgica alega que o conceito de «funções essenciais do Estado», utilizado pela Comissão na decisão recorrida, não está claramente definido no direito da União, que a lista das funções enumeradas no artigo 4.o, n.o 2, TUE não é exaustiva e que a jurisprudência não preconiza uma interpretação restritiva do conceito de «prerrogativas de poder público».

48      A Comissão contesta esta argumentação.

49      A título preliminar, há que precisar que, no presente acórdão, os conceitos de «atividade abrangida pelo exercício da autoridade pública» e de «atividade ligada ao exercício de prerrogativas de poder público» se sobrepõem. Tal abordagem corresponde à adotada pela Comissão na decisão recorrida e nos n.os 17 e 18 da Comunicação sobre a noção de auxílio estatal. A este respeito, na sua resposta escrita a uma questão colocada pelo Tribunal Geral, a Comissão confirmou que não há diferença entre estas expressões, que constituem variantes lexicais do mesmo conceito jurídico.

50      Em primeiro lugar, no que respeita ao argumento de que a Comissão tinha considerado erradamente que as atividades abrangidas pela autoridade pública ou ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público são as que estão ligadas às funções essenciais do Estado, importa recordar que não têm caráter económico que justifique a aplicação das regras de concorrência previstas pelo Tratado FUE as atividades abrangidas pela autoridade pública (Acórdão de 4 de maio de 1988, Bodson, 30/87, EU:C:1988:225, n.o 18) ou que estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público (Acórdãos de 19 de janeiro de 1994, SAT Fluggesellschaft, C‑364/92, EU:C:1994:7, n.o 30, e de 24 de março de 2022, GVN/Comissão, C‑666/20 P, não publicado, EU:C:2022:225, n.o 70).

51      No caso em apreço, seguindo a abordagem preconizada no ponto 17 da Comunicação sobre a noção de auxílio estatal, nos considerandos 190 e 191 da decisão recorrida, a Comissão entendeu que se pode considerar que uma entidade age na qualidade de autoridade pública ou no exercício de prerrogativas de poder público quando a sua atividade faz parte das funções essenciais do Estado ou está ligada a essas funções pela sua natureza, pelo seu objeto e pelas regras a que está sujeita.

52      Por um lado, há que recordar que entre as atividades que implicam o exercício de prerrogativas de poder público figuram, nomeadamente, o controlo e o policiamento do espaço aéreo (Acórdão de 19 de janeiro de 1994, SAT Fluggesellschaft, C‑364/92, EU:C:1994:7, n.o 30), a manutenção, a melhoria e o desenvolvimento da segurança aérea (Acórdão de 26 de março de 2009, SELEX Sistemi Integrati/Comissão, C‑113/07 P, EU:C:2009:191, n.o 76), a vigilância antipoluição num porto petrolífero (Acórdão de 18 de março de 1997, Diego Calì & Figli, C‑343/95, EU:C:1997:160, n.o 22), bem como o controlo e a segurança do tráfego marítimo (Acórdão de 20 de setembro de 2019, Port autonome du Centre et de l’Ouest e o./Comissão, T‑673/17, não publicado, EU:T:2019:643, n.o 91). Além disso, foi declarado que uma atividade de recolha de dados relativos a empresas, que tem por fundamento uma obrigação legal de declaração imposta a estas e os poderes coercivos correspondentes, é abrangida pelo exercício de prerrogativas de poder público (Acórdão de 12 de julho de 2012, Compass‑Datenbank, C‑138/11, EU:C:2012:449, n.o 40). Além disso, o fornecimento, a título gratuito, de funcionalidades que asseguram a adjudicação eletrónica dos contratos públicos em todo o território de um Estado‑Membro em conformidade com as diretivas e a Lei relativa à adjudicação de contratos públicos e que foi instituído por um ministério para esse efeito foi considerado ligado ao exercício de prerrogativas de poder público (Acórdão de 28 de setembro de 2017, Aanbestedingskalender e o./Comissão, T‑138/15, não publicado, EU:T:2017:675, n.o 71). Do mesmo modo, as autoridades municipais, no seu papel de autoridade competente na aceção do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, relativo aos serviços públicos de transporte ferroviário e rodoviário de passageiros e que revoga os Regulamentos (CEE) n.o 1191/69 e (CEE) n.o 1107/70 do Conselho (JO 2007, L 315, p. 1), atuam na qualidade de autoridade pública quando fixam as modalidades de compensação financeira às empresas de transporte por força de uma obrigação legal, no quadro estabelecido por este regulamento (Acórdão de 24 de março de 2022, GVN/Comissão, C‑666/20 P, não publicado, EU:C:2022:225, n.o 73).

53      Assim, resulta da jurisprudência que o conceito de «atividade ligada ao exercício de prerrogativas de poder público» visa, nomeadamente, as atividades que implicam o recurso a prerrogativas que exorbitam do direito comum, como os poderes de regulamentação ou de coerção, ou os privilégios de poder público que se impõem aos cidadãos e às empresas, ou as atividades que têm por objeto assegurar o respeito da regulamentação em vigor.

54      Por outro lado, importa salientar que as funções essenciais do Estado não são definidas pelos Tratados. A este respeito, resulta do artigo 4.o, n.o 2, TUE que entre as funções essenciais do Estado figuram, nomeadamente, as que se destinam a garantir a integridade territorial, a manter a ordem pública e a salvaguardar a segurança nacional. Uma vez que a lista que figura nesta disposição não é exaustiva, as funções essenciais do Estado não se podem limitar à preservação da integridade territorial e da ordem pública nem à salvaguarda da segurança nacional.

55      Assim, em matéria de auxílios estatais, foi declarado que a vigilância antipoluição num porto petrolífero constitui uma missão de interesse geral que se enquadra em funções essenciais do Estado em matéria de proteção do ambiente no domínio marítimo e que essa atividade de vigilância, pela sua natureza, pelo seu objeto e pelo regime a que está sujeita, liga‑se ao exercício de prerrogativas de proteção do ambiente, que são tipicamente prerrogativas de poder público (Acórdão de 18 de março de 1997, Diego Calì & Figli, C‑343/95, EU:C:1997:160, n.os 22 e 23). Daqui resulta que, em certas circunstâncias, se pode considerar que as atividades de uma entidade estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público quando se enquadram em funções essenciais do Estado.

56      Além disso, no que respeita ao argumento do Reino da Dinamarca de que resulta do n.o 36 do Acórdão de 12 de julho de 2012, Compass‑Datenbank (C‑138/11, EU:C:2012:449), que o termo «prerrogativas» abrange mais genericamente as missões de serviço público ou de autoridade pública, há que salientar que, ao declarar que não têm caráter económico que justifique a aplicação das regras de concorrência do TFUE as atividades ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público, o Tribunal de Justiça recordou unicamente uma jurisprudência constante (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 1985, Comissão/Alemanha, 107/84, EU:C:1985:332, n.os 14 e 15; de 19 de janeiro de 1994, SAT Fluggesellschaft, C‑364/92, EU:C:1994:7, n.o 30, e de 1 de julho de 2008, MOTOE, C‑49/07, EU:C:2008:376, n.o 24), sem alterar o seu alcance. Daqui resulta que o Reino da Dinamarca não se pode basear no referido acórdão para alegar que o conceito de «prerrogativas» deve ser interpretado no sentido de que inclui mais amplamente as missões de serviço público. De resto, importa salientar, como resulta do n.o 40 do Acórdão de 12 de julho de 2012, Compass‑Datenbank (C‑138/11, EU:C:2012:449), que o Tribunal de Justiça considerou que a atividade em causa nesse processo estava ligada ao exercício de prerrogativas de poder público pelo facto de a recolha de dados assentar numa obrigação legal cujo respeito podia ser assegurado através do recurso a poderes coercitivos.

57      Daqui resulta que a Comissão não cometeu um erro de direito ao considerar que uma entidade atua como autoridade pública ou no exercício de prerrogativas de poder público quando a sua atividade está ligada às funções essenciais do Estado pela sua natureza, pelo seu objetivo e pelas regras a que está sujeita.

58      Em segundo lugar, no que respeita ao argumento de que a Comissão não teve em conta o ponto 13 da Comunicação sobre a noção de auxílio estatal, do qual resulta que os Estados‑Membros são livres de definir as atividades que fazem parte das prerrogativas de poder público e as que não são abrangidas por estas prerrogativas, há que salientar, como alega acertadamente a Comissão, que o ponto 13 desta Comunicação não diz respeito aos critérios que permitem determinar se uma atividade está ligada ao exercício de prerrogativas de poder público, que figuram nos pontos 17 e 18 da referida Comunicação.

59      Com efeito, no n.o 13 da Comunicação sobre a noção de auxílio estatal, indica‑se que a questão de saber se existe um mercado para determinados serviços pode depender da forma como tais serviços se encontram organizados no Estado‑Membro em causa e, por conseguinte, pode variar entre Estados‑Membros. A este respeito, na nota de rodapé n.o 10 do ponto 13 da referida Comunicação, remete‑se para a jurisprudência relativa às atividades no domínio da segurança social, que são suscetíveis de serem qualificadas de atividades económicas ou de atividades não económicas em função das suas modalidades de organização. Assim, para efeitos da sua qualificação de atividades económicas exercidas num mercado ou de atividades não económicas, importa determinar se as referidas atividades relacionadas com a segurança social aplicam o princípio da solidariedade conforme interpretado pela jurisprudência, se são desprovidas de quaisquer fins lucrativos e são objeto de controlo pelo Estado (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de fevereiro de 1993, Poucet e Pistre, C‑159/91 e C‑160/91, EU:C:1993:63, n.os 7 a 12, 15 e 18, e de 11 de junho de 2020, Comissão e República Eslovaca/Dôvera zdravotná poist’ovňa, C‑262/18 P e C‑271/18 P, EU:C:2020:450, n.os 29 a 35).

60      Por outro lado, há que salientar que, para as atividades de ensino, o financiamento destas atividades por fundos públicos constitui, no âmbito da tomada em consideração das modalidades de organização de uma atividade num Estado‑Membro, um elemento pertinente para distinguir as atividades de natureza económica das atividades não económicas (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de setembro de 2007, Schwarz e Gootjes‑Schwarz, C‑76/05, EU:C:2007:492, n.o 39, e de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania, C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 50). Em tal hipótese, a natureza não económica das atividades de ensino dispensadas por certos estabelecimentos públicos que fazem parte de um sistema de ensino público decorre das suas modalidades de organização no Estado‑Membro, ou seja, a prossecução de um objetivo de interesse geral financiado inteira ou principalmente pelo orçamento público, sem que seja necessário verificar se estas atividades estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

61      Por conseguinte, há que concluir que a leitura feita pelo Reino da Dinamarca do ponto 13 da Comunicação sobre a noção de auxílio estatal deve ser rejeitada, uma vez que confunde, por um lado, as atividades que não são consideradas de natureza económica pelo facto de estarem ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público (Acórdãos de 19 de janeiro de 1994, SAT Fluggesellschaft, C‑364/92, EU:C:1994:7, n.o 30, e de 24 de março de 2022, GVN/Comissão, C‑666/20 P, não publicado, EU:C:2022:225, n.o 70) e, por outro, as atividades que não são de natureza económica pelo facto de não consistirem em fornecer bens ou serviços num determinado mercado em concorrência com as de outros operadores que prosseguem fins lucrativos (v., neste sentido, Acórdãos de 1 de julho de 2008, MOTOE, C‑49/07, EU:C:2008:376, n.o 27, e de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania, C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 46).

62      Além disso, no que respeita à afirmação do Reino da Dinamarca de que, em substância, um Estado‑Membro é livre de definir as atividades abrangidas pelas prerrogativas de poder público, importa recordar que os conceitos de «empresa» e de «atividade económica» são conceitos objetivos que decorrem diretamente do Tratado e que dependem de elementos de facto e não das opções ou apreciações subjetivas das autoridades nacionais [v., neste sentido, Acórdão de 30 de abril de 2019, Chambre de commerce et d’industrie métropolitaine Bretagne‑Ouest (port de Brest)/Comissão, T‑754/17, não publicado, EU:T:2019:270, n.o 75].

63      Por conseguinte, o argumento do Reino da Dinamarca baseado no ponto 13 da Comunicação sobre a noção de auxílio estatal procede de uma interpretação errada desta disposição e deve, por isso, ser rejeitado.

64      Em terceiro lugar, no que respeita à argumentação do Reino da Dinamarca e do Reino da Bélgica de que, em substância, para determinar a existência de uma prerrogativa de poder público, há que ter em conta a prossecução de um objetivo de interesse geral, há que recordar que resulta de jurisprudência constante que o facto de serem confiadas a uma entidade determinadas missões de interesse geral não impede que as atividades em causa sejam consideradas atividades económicas (Acórdãos de 23 de março de 2006, Enirisorse, C‑237/04, EU:C:2006:197, n.o 34, e de 16 de dezembro de 2010, Países Baixos e NOS/Comissão, T‑231/06 e T‑237/06, EU:T:2010:525, n.o 94).

65      Resulta das considerações precedentes que a acusação relativa a uma interpretação demasiado restritiva do conceito de «atividade abrangida pela autoridade pública ou que está ligada ao exercício de prerrogativas de poder público» deve ser rejeitada.

b)      Quanto à terceira acusação, relativa à não tomada em consideração de informações disponíveis que permitem relacionar certas atividades da Femern com o exercício de prerrogativas de poder público

66      O Reino da Dinamarca alega que a Comissão errou ao não ter em consideração certos elementos de informação disponíveis que demonstram que as atividades da Femern, consideradas em conjunto ou separadamente, estão relacionadas com o exercício de prerrogativas de poder público.

67      O Reino da Dinamarca, apoiado pelo Reino da Bélgica e pela República Federal da Alemanha, considera que, para determinar se as atividades estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público ou constituem atividades económicas, há que proceder a uma apreciação concreta de conjunto da natureza e do objeto das atividades, bem como das regras a que estão sujeitas. Segundo o Reino da Dinamarca, para determinar se as atividades estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público, a Comissão é obrigada a proceder a uma análise específica e detalhada de cada uma delas.

68      Primeiro, o Reino da Dinamarca sustenta que a construção e a exploração das vias públicas e da rede ferroviária pública são atividades abrangidas pelo exercício da autoridade pública que nenhum operador privado pode exercer. A este respeito, por um lado, o Reino da Dinamarca, apoiado pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, assinala que foram confiadas à Femern as missões de autoridade rodoviária e de gestor de infraestruturas ferroviárias normalmente assumidas por Administrações Públicas. Quanto à missão de autoridade rodoviária confiada à Femern no que respeita à ligação fixa, o Reino da Dinamarca assinala que esta implica, nomeadamente, um poder de decisão em aplicação da lov n.o 1520 af 27. december 2014 om offentlige veje (Lei n.o 1520, relativa às vias públicas), de 27 de dezembro de 2014 (a seguir «Lei relativa às Vias Públicas»). Por outro lado, o Reino da Dinamarca sustenta que, no âmbito da construção e da exploração da ligação fixa, foi confiada à Femern a preparação dos planos de segurança da ligação fixa.

69      Segundo, o Reino da Dinamarca, apoiado pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, considera que a Comissão não teve em consideração o facto de as atividades da Femern serem objeto de um rigoroso controlo administrativo e político quer do ministro dos Transportes dinamarquês quer do Parlamento, nem a circunstância de esta entidade estar sujeita a obrigações de direito público em vários domínios, em especial em matéria de acesso aos documentos ou de controlo público das contas, pelo que esta entidade se assemelha a uma Administração Pública.

70      Terceiro, o Reino da Dinamarca, apoiado pela República Federal da Alemanha, salienta que a Femern é uma entidade a quem a lei atribui a execução de obrigações internacionais.

71      Quarto, o Reino da Dinamarca acusa a Comissão de não ter tomado em consideração a circunstância de, ao contrário do setor aeroportuário, as infraestruturas ferroviárias e rodoviárias dinamarquesas não terem sido liberalizadas, pelo que as atividades da Femern se distinguem fundamentalmente das atividades das empresas comerciais.

72      Por outro lado, o Reino da Dinamarca considera que a Comissão inverteu indevidamente o ónus da prova na parte em que exigiu que este explicasse as razões pelas quais havia que considerar que as atividades da Femern implicavam o exercício de prerrogativas de poder público. A este respeito, o Reino da Bélgica alega que, uma vez que incumbe à Comissão provar a existência de auxílios estatais, não tendo em conta, no caso em apreço, todos os elementos pertinentes da operação controvertida, a Comissão não apresentou na sua decisão elementos suficientemente probatórios que permitissem demonstrar que as atividades da Femern não estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

73      A Comissão contesta esta argumentação.

74      Interrogado na audiência sobre o sentido e o alcance da acusação relativa ao facto de a Comissão não ter tido em conta as prerrogativas de poder público confiadas à Femern, o Reino da Dinamarca precisou que esta acusação se subdivide em duas subacusações. A título principal, a Comissão é acusada de ter considerado erradamente que as atividades da Femern, no seu conjunto, não estão ligadas a prerrogativas de poder público. A título subsidiário, na eventualidade de o Tribunal Geral não julgar procedente a primeira subacusação, o Reino da Dinamarca acusa a Comissão de ter cometido um erro na parte em que as funções delegadas à Femern na sua qualidade de autoridade rodoviária e na sua qualidade de gestor da infraestrutura ferroviária e a sua obrigação de preparação dos planos de segurança da ligação fixa não foram consideradas ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

1)      Quanto à primeira subacusação, relativa ao facto de a Comissão ter considerado erradamente que, enquanto tais, as atividades de construção e de exploração da ligação fixa não fazem parte do exercício da autoridade pública

75      Com a sua primeira subacusação, o Reino da Dinamarca sustenta, a título principal, que a Comissão concluiu erradamente que, enquanto tais, as atividades de construção e de exploração da ligação fixa não fazem parte do exercício da autoridade pública.

76      No caso em apreço, no considerando 191 da decisão recorrida, a Comissão considerou, no âmbito de uma apreciação global das atividades da Femern, que os argumentos das autoridades dinamarquesas sobre o objetivo, a natureza e as regras que regulam as referidas atividades, que são reproduzidos no considerando 190 da decisão recorrida, não eram suficientes para concluir que esta entidade atuava no âmbito do exercício da autoridade pública.

77      Para contestar esta conclusão, primeiro, o Reino da Dinamarca sustenta que a Comissão não teve em consideração o facto de a Femern se assemelhar a uma Administração Pública devido ao controlo rigoroso exercido pelos poderes públicos sobre si, bem como à obrigação imposta a esta entidade de respeitar as regras sobre o acesso aos documentos ou o controlo das contas.

78      A este respeito, há que recordar que a circunstância de uma entidade constituir um estabelecimento público colocado sob a tutela do ministro não pode excluir, só por si, que ela possa ser considerada uma empresa na aceção das disposições do Tratado FUE (v., neste sentido, Acórdão de 12 de dezembro de 2000, Aéroports de Paris/Comissão, T‑128/98, EU:T:2000:290, n.o 109). Além disso, uma vez que o próprio Estado ou uma entidade estatal podem atuar como empresa (Acórdãos de 12 de julho de 2012, Compass‑Datenbank, C‑138/11, EU:C:2012:449, n.o 35, e de 20 de setembro de 2019, Port autonome du Centre et de l’Ouest e o./Comissão, T‑673/17, não publicado, EU:T:2019:643, n.o 71), a circunstância de uma entidade poder, em certos aspetos, ser equiparada a uma Administração Pública em razão de um controlo rigoroso dos poderes públicos e do facto de ser obrigada a respeitar determinadas regras de direito público aplicáveis às Administrações Públicas, como as relativas ao acesso aos documentos ou ao controlo das contas, não obsta a que esta entidade exerça uma atividade económica.

79      Além disso, o facto de uma entidade estar sob o controlo rigoroso dos poderes públicos e sujeita ao respeito de certas obrigações de direito público aplicáveis às Administrações Públicas não implica, por si só, que as atividades desta entidade estejam ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

80      Daqui resulta que o facto de a Femern estar sujeita a um controlo rigoroso dos poderes públicos e de dever respeitar as regras sobre o acesso aos documentos ou o controlo das contas não basta para concluir que as suas atividades estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público. De resto, a circunstância de a Femern estar sujeita a um controlo rigoroso dos poderes públicos e de esta dever respeitar as regras sobre o acesso aos documentos ou o controlo das contas não permite, por si só, considerá‑la uma Administração Pública.

81      Segundo, quanto ao argumento de que a Femern é uma entidade a quem a lei atribui a execução de obrigações internacionais, há que considerar que não pode, enquanto tal, ser suficiente para concluir que as suas atividades estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

82      Com efeito, no caso em apreço, há que salientar que, durante o procedimento formal de investigação, o Reino da Dinamarca não invocou nenhuma disposição específica do Tratado sobre o Estreito de Fehmarn que permitisse à Comissão concluir que o referido Tratado confia à Femern atividades ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público. Assim, na secção 3.1.1.2. das suas observações de 26 de agosto de 2019, submetidas à Comissão na sequência do início do procedimento formal de investigação, as autoridades dinamarquesas indicaram unicamente que a criação da Femern e as suas atividades têm por objeto assegurar a execução, pelo Reino da Dinamarca, de um acordo internacional e de importantes decisões de planeamento adotadas pelo Estado dinamarquês. Na nota de rodapé n.o 9 das referidas observações, remete‑se para o artigo 6.o do Tratado sobre o Estreito de Fehmarn e precisa‑se que, no Acórdão de 19 de janeiro de 1994, SAT Fluggesellschaft (C‑364/92, EU:C:1994:7), se considerou que a Eurocontrol exercia uma atividade de autoridade pública com fundamento num acordo celebrado entre Estados‑Membros.

83      Ora, por um lado, há que constatar que as atividades de construção e de exploração da ligação fixa não são comparáveis às confiadas à Eurocontrol. Com efeito, há que recordar que as atividades da Eurocontrol tinham sido excluídas do âmbito de aplicação das regras do Tratado relativas à concorrência pelo facto de as atividades relativas ao controlo e ao policiamento do espaço aéreo, que implicam nomeadamente o recurso a prerrogativas e poderes de coerção derrogatórios do direito comum em relação aos utilizadores do espaço aéreo, serem tipicamente prerrogativas de poder público (v., neste sentido, Acórdão de 19 de janeiro de 1994, SAT Fluggesellschaft, C‑364/92, ECLI:EU:C:1994:7, n.os 24 e 30).

84      Por outro lado, no que respeita ao artigo 6.o do Tratado sobre o Estreito de Fehmarn, há que salientar que o n.o 1 desta disposição prevê que o Reino da Dinamarca deve constituir uma sociedade encarregada dos trabalhos preparatórios, do planeamento, da conceção, da obtenção das autorizações, da celebração dos contratos, do financiamento, da exploração e da manutenção da ligação fixa, sendo especificado que a referida sociedade será proprietária da ligação fixa. O n.o 2 desta disposição especifica que esta sociedade será uma sociedade de direito dinamarquês e que as suas atividades serão exercidas em conformidade com os princípios comerciais gerais e com as obrigações internacionais, nomeadamente as que decorrem do direito da União. O n.o 3 do artigo 6.o do Tratado sobre o Estreito de Fehmarn prevê que o Reino da Dinamarca receberá todos os lucros da sociedade e suportará as perdas causadas pelas suas atividades. O n.o 4, por seu turno, especifica que o Reino da Dinamarca tem o direito de alterar a organização da sociedade sem prejuízo das obrigações assumidas no âmbito do Tratado sobre o Estreito de Fehmarn e que é necessária uma aprovação prévia da República Federal da Alemanha em caso de venda de mais de 50 % das ações a entidades não controladas pelas autoridades dinamarquesas. O n.o 5 do artigo 6.o do Tratado sobre o Estreito de Fehmarn prevê que o Reino da Dinamarca assegurará que a sociedade cumpra as missões que lhe foram confiadas pelo Tratado.

85      É forçoso constatar que o artigo 6.o do Tratado sobre o Estreito de Fehmarn, invocado pelas autoridades dinamarquesas no decurso do procedimento formal de investigação, não contém nenhuma disposição que permitisse à Comissão concluir que, enquanto tais, as atividades de construção e de exploração da ligação fixa estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

86      Terceiro, quanto ao argumento de que a Comissão não teve em conta o facto de, na Dinamarca, a construção e a exploração das infraestruturas ferroviárias e rodoviárias não estarem liberalizadas, há que considerar que a não liberalização de um setor de atividade não constitui um indício que permita concluir que, por princípio, uma atividade está ligada ao exercício de prerrogativas de poder público. Neste sentido, há que salientar que foi devido às modalidades da sua organização nos Estados‑Membros que determinadas atividades foram consideradas como não tendo natureza económica e não por estarem ligadas a prerrogativas de poder público. É o caso, nomeadamente, das atividades de ensino público inteira ou principalmente financiadas por fundos públicos (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de setembro de 2007, Schwarz e Gootjes‑Schwarz, C‑76/05, EU:C:2007:492, n.o 39, e de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania, C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 50), dos regimes de segurança social que aplicam o princípio da solidariedade (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de fevereiro de 1993, Poucet e Pistre, C‑159/91 e C‑160/91, EU:C:1993:63, n.os 7 a 12, 15 e 18, e de 11 de junho de 2020, Comissão e República Eslovaca/Dôvera zdravotná poist’ovňa, C‑262/18 P e C‑271/18 P, EU:C:2020:450, n.os 30 a 34) ou ainda de entidades encarregadas da gestão de um sistema nacional de saúde que presta serviços de cuidados de saúde a título gratuito (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 2006, FENIN/Comissão, C‑205/03 P, EU:C:2006:453, n.o 27, e de 4 de março de 2003, FENIN/Comissão, T‑319/99, EU:T:2003:50, n.os 39 e 49). Daqui resulta que a circunstância de as atividades de construção e de exploração da ligação fixa não estarem liberalizadas não implica, no entanto, que as referidas atividades estejam ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

87      Quarto, no que respeita ao argumento de que a Comissão não teve em conta as funções delegadas à Femern enquanto autoridade rodoviária e enquanto gestora da infraestrutura ferroviária nem o facto de lhe incumbir preparar os planos de segurança da ligação fixa, importa recordar que a circunstância de uma entidade, no exercício de uma parte das suas atividades, dispor de prerrogativas de poder público não obsta, só por si, à qualificação de empresa, na aceção das disposições do Tratado FUE relativas às regras de concorrência, para as suas outras atividades económicas (Acórdãos de 1 de julho de 2008, MOTOE, C‑49/07, EU:C:2008:376, n.o 25; de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão, T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117, n.os 98 e 99, e de 20 de setembro de 2019, Havenbedrijf Antwerpen e Maatschappij van de Brugse Zeehaven/Comissão, T‑696/17, EU:T:2019:652, n.o 85).

88      Segundo a jurisprudência, na medida em que uma entidade pública exerça uma atividade económica que possa ser dissociada do exercício das suas prerrogativas de poder público, esta entidade, em relação a esta atividade, atua como empresa, ao passo que, se a referida atividade económica for indissociável do exercício das suas prerrogativas de poder público, todas as atividades exercidas pela referida entidade continuarão a ser atividades associadas ao exercício destas prerrogativas (Acórdãos de 12 de julho de 2012, Compass‑Datenbank, C‑138/11, EU:C:2012:449, n.o 38, e de 30 de abril de 2019, UPF/Comissão, T‑747/17, EU:T:2019:271, n.o 82). Daqui resulta que não existe nenhum limiar abaixo do qual se deverá considerar que todas as atividades de uma entidade são atividades não económicas, mesmo na eventualidade de as atividades económicas serem minoritárias (v., neste sentido, Acórdãos de 30 de abril de 2019, UPF/Comissão, T‑747/17, EU:T:2019:271, n.o 83, e de 20 de setembro de 2019, Le Port de Bruxelles e Région de Bruxelles‑Capitale/Comissão, T‑674/17, não publicado, EU:T:2019:651, n.o 104).

89      No caso em apreço, não se pode deixar de observar que o Reino da Dinamarca não apresentou nenhum elemento para demonstrar que as funções de autoridade rodoviária e de gestor da infraestrutura ferroviária asseguradas pela Femern ou a obrigação de preparar planos de segurança são indissociáveis das atividades económicas identificadas pela Comissão, ou seja, a construção e a exploração da ligação fixa. Em todo o caso, como resulta da análise da segunda subacusação, nas circunstâncias do presente processo, a Comissão podia validamente considerar que, no exercício das referidas funções e para a preparação dos planos de segurança da ligação fixa, não tinha sido atribuída à Femern nenhuma prerrogativa de poder público específica (v. n.os 101 a 103, infra).

90      Resulta das considerações precedentes que as informações apresentadas à Comissão pelas autoridades dinamarquesas durante o procedimento formal de investigação não constituíam elementos que, considerados isoladamente ou no seu conjunto, fossem suscetíveis de levar à conclusão que todas as atividades em causa da Femern, ou seja, a construção e a exploração da ligação fixa, estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

91      Por conseguinte, a Comissão podia validamente considerar, no considerando 191 da decisão recorrida, que, tendo em conta a sua natureza, o seu objeto e as regras a que estão sujeitas, as atividades da Femern não constituem, enquanto tais, atividades relativas ao exercício do poder público.

2)      Quanto à segunda subacusação, relativa ao facto de a Comissão ter concluído erradamente que a Femern não recebeu nenhuma prerrogativa de poder público específica

92      Com a sua segunda subacusação, exposta a título subsidiário, o Reino da Dinamarca acusa a Comissão de ter considerado erradamente que as funções delegadas à Femern na sua qualidade de autoridade rodoviária e na sua qualidade de gestor da infraestrutura ferroviária, bem como a preparação dos planos de segurança da ligação fixa, não constituem atividades ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

93      A este respeito, na sua resposta escrita às questões do Tribunal Geral, a Comissão indicou não ter procedido a uma análise aprofundada das atividades específicas da Femern invocadas pelo Reino da Dinamarca no presente processo, com o fundamento de que, durante o procedimento formal de investigação, as autoridades dinamarquesas apenas se basearam no facto de todo o projeto de ligação fixa dever ser considerado ligado a prerrogativas de poder público e que não invocaram expressamente nem apresentaram argumentos suficientemente precisos relativamente a estas atividades.

94      Na audiência, o Reino da Dinamarca sustentou que, durante o procedimento administrativo, tinham sido fornecidos elementos relativos às funções delegadas à Femern na sua qualidade de autoridade rodoviária e na sua qualidade de gestora da infraestrutura ferroviária, bem como no que respeita à preparação dos planos de segurança da ligação fixa e que cabia à Comissão, a quem incumbe o ónus da prova de demonstrar a existência de um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, pedir informações complementares.

95      A este respeito, importa salientar que, embora incumba à Comissão provar que certa medida preenche os requisitos necessários para ser qualificada de auxílio estatal, cabe depois ao Estado‑Membro que concedeu ou pensa conceder este auxílio demonstrar que tal medida se subtrai a esta qualificação.

96      Daqui resulta que, quando a Comissão considera que uma entidade exerce atividades económicas, para lhe permitir verificar se certas atividades da referida entidade devem ser excluídas do âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE pelo facto de estarem ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público, incumbe ao Estado‑Membro em causa, no âmbito do dever de cooperação leal entre Estados‑Membros e instituições, conforme decorre do artigo 4.o, n.o 3, TUE, invocar expressamente a existência destas atividades e fornecer explicações circunstanciadas sobre a regulamentação aplicável a estas atividades, bem como todos os elementos suscetíveis de permitir à Comissão verificar que se trata efetivamente de atividades ligadas a prerrogativas de poder público (v., por analogia, Acórdão de 15 de novembro de 2011, Comissão e Espanha/Government of Gibraltar e Reino Unido, C‑106/09 P e C‑107/09 P, EU:C:2011:732, n.os 146 e 147).

97      Daqui resulta que a Comissão não pode ser criticada por não ter tido em conta eventuais elementos de informação que lhe poderiam ter sido apresentados durante o procedimento administrativo, mas que não o foram, uma vez que a Comissão não é obrigada a examinar oficiosamente e com base numa suposição os elementos que lhe poderiam ter sido fornecidos [v., por analogia, Acórdãos de 9 de setembro de 2009, HolLand Malt/Comissão, T‑369/06, EU:T:2009:319, n.o 152, e de 6 de abril de 2022, Mead Johnson Nutrition (Asia Pacific) e o./Comissão, T‑508/19, EU:T:2022:217, n.o 106].

98      No caso em apreço, refira‑se que, na carta enviada às autoridades dinamarquesas em 14 de junho de 2019, reproduzida na decisão de início do procedimento, a Comissão expôs, nos considerandos 84 a 89, as razões pelas quais, na sequência de uma análise prima facie, se devia considerar que a Femern exerce uma atividade económica. Mais precisamente, no considerando 85 da referida decisão, a Comissão indicou que a circunstância de o projeto de ligação fixa prosseguir objetivos de interesse geral não implica necessariamente que se trate de uma atividade abrangida pelo exercício da autoridade pública. Além disso, no considerando 86 da referida carta, a Comissão também considerou que a circunstância de a concessão, por dois Estados soberanos, de autorizações para a construção de uma infraestrutura de transporte transfronteiriça se enquadrar no exercício do poder público não implica necessariamente que os próprios serviços de transporte ou a construção da infraestrutura façam igualmente parte do exercício da autoridade pública.

99      É certo que, como salientou o Reino da Dinamarca na audiência, a Comissão, nos considerandos 84 a 89 da carta de 14 de junho de 2019, comunicou certas interrogações quanto à possibilidade de qualificar a atividade da Femern de atividade económica. Por conseguinte, a Comissão solicitou às autoridades dinamarquesas que lhe fornecessem todos os documentos e informações pertinentes atualizadas e completas que lhe permitissem prosseguir, nomeadamente, a avaliação da natureza económica ou não económica da atividade da Femern.

100    Em resposta ao referido convite, nas suas observações sobre o início do procedimento formal de investigação de 26 de agosto de 2019, as autoridades dinamarquesas desenvolveram uma argumentação destinada a alegar, a título principal, que se devia considerar que todas as atividades da Femern estavam ligadas a prerrogativas de poder público e, a título subsidiário, que só a atividade de exploração da ligação fixa devia ser considerada uma atividade de natureza económica.

101    Todavia, não se pode deixar de observar que, nas referidas observações, as autoridades dinamarquesas não se basearam expressamente no facto de que se devia considerar que as funções delegadas à Femern na sua qualidade de autoridade rodoviária e na sua qualidade de gestor da infraestrutura ferroviária, bem como no que respeita à preparação dos planos de segurança da ligação fixa, estavam ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público, pelo que os custos correspondentes deveriam escapar ao âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

102    Por um lado, quanto às funções delegadas à Femern na sua qualidade de gestor da infraestrutura ferroviária e no que respeita à preparação dos planos de segurança, há que observar que as autoridades dinamarquesas não as mencionaram nas suas observações sobre o início do procedimento formal de investigação de 26 de agosto de 2019 nem nas observações sobre os comentários das partes interessadas apresentadas durante o procedimento formal de investigação em 4 de outubro de 2019. Nestas condições, a Comissão não pode ser acusada de não ter examinado, durante o procedimento formal de investigação, se as funções de gestor da infraestrutura ferroviária e a preparação dos planos de segurança da ligação fixa deviam ser excluídas do âmbito de aplicação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE pelo facto de se dever considerar que essas atividades estavam relacionadas com o exercício de prerrogativas de poder público.

103    Por outro lado, no que respeita às funções delegadas à Femern na sua qualidade de autoridade rodoviária, há que salientar que estas apenas foram objeto de uma menção pontual nas observações das autoridades dinamarquesas de 26 de agosto de 2019. Mais precisamente, estas funções foram evocadas como ilustração de uma «responsabilidade pública» que incumbe à Femern, ilustração essa enunciada em apoio de uma argumentação mais geral destinada a alegar que, devido à sua natureza, se deveria considerar que todas as atividades da Femern estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público. Além disso, há que observar que os elementos transmitidos à Comissão pelas autoridades dinamarquesas durante o procedimento formal de investigação não lhe permitiam concluir que esta atividade estivesse relacionada com essas prerrogativas. Com efeito, o ponto 25 da Lei relativa à Construção, para o qual se remete na nota de rodapé n.o 12 das observações sobre dar início ao procedimento formal de investigação de 26 de agosto de 2019, limita‑se a enunciar, no seu n.o 1, que a ligação rodoviária das duas costas é uma estrada pública administrada em conformidade com a Lei relativa às Vias Públicas e que a Femern é a autoridade rodoviária. É certo que, nos trabalhos preparatórios correspondentes à Lei relativa à Construção, de que a Comissão dispunha durante o procedimento formal de investigação, é indicado que «é proposto que a Femern seja responsável pela administração das ligações rodoviárias associadas ao projeto de ligação das duas costas mencionadas no artigo 1.o, lido em conjugação com o artigo 38.o, da Lei relativa às Vias Públicas» e que, «[p]or conseguinte, a Femern será a autoridade rodoviária na aceção da regulamentação relativa às vias públicas e terá um poder de decisão em aplicação da Lei relativa às Vias Públicas e dos textos adotados com base na mesma». Todavia, não se pode deixar de observar que os elementos à disposição da Comissão aquando do procedimento formal de investigação não continham nenhuma precisão sobre as eventuais prerrogativas de que dispõem as autoridades rodoviárias em relação a terceiros, em especial no que respeita à natureza e ao alcance do «poder decisório» das referidas autoridades. Além disso, como o Reino da Dinamarca admitiu na audiência, não comunicou à Comissão a Lei relativa às Vias Públicas durante o procedimento formal de investigação. Por outro lado, há que salientar que, durante este procedimento, as autoridades dinamarquesas não invocaram expressamente que as funções delegadas à Femern na sua qualidade de autoridade rodoviária deviam estar ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público. Daqui resulta que a Comissão não pode ser criticada por não ter examinado de forma detalhada as referidas funções.

104    Resulta das considerações precedentes que, nas circunstâncias do presente processo, a Comissão não concluiu erradamente, no considerando 194 da decisão recorrida, que a Femern não recebeu prerrogativas de poder público específicas.

105    Por conseguinte, há que julgar improcedente a segunda subacusação invocada a título subsidiário pelo Reino da Dinamarca.

106    Por conseguinte, há que julgar improcedente na totalidade a acusação relativa à não tomada em consideração de informações disponíveis que permitem associar certas atividades da Femern ao exercício de prerrogativas de poder público.

c)      Quanto à segunda acusação, relativa ao facto de a Comissão ter erradamente tomado em consideração a existência de serviços substituíveis à ligação fixa

107    O Reino da Dinamarca alega que, na sua análise para efeitos de determinar se as atividades da Femern estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público, a Comissão cometeu um erro ao atribuir importância ao facto de um operador privado oferecer serviços de ferry considerados uma alternativa aos oferecidos pela referida entidade. Segundo o Reino da Dinamarca, a circunstância de um operador privado oferecer serviços substituíveis não deve influenciar a conclusão de que as atividades da Femern estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

108    O Reino da Dinamarca alega, em substância, que as atividades de construção e de exploração de infraestruturas rodoviárias e ferroviárias se enquadram no exercício de prerrogativas de poder público e que a existência de uma relação de substituição entre estas infraestruturas e os modos de transporte alternativos não deve pôr em causa esta conclusão. Uma vez que a disponibilização das redes rodoviárias e ferroviárias dinamarquesas não está abrangida pelo artigo 107.o, n.o 1, TFUE, o Reino da Dinamarca também considera que a Comissão não forneceu elementos suficientes para explicar as razões pelas quais as atividades da Femern se distinguem da disponibilização das referidas redes.

109    Segundo o Reino da Dinamarca, a instituição de um regime de pagamento pela utilização de uma infraestrutura rodoviária pelos utilizadores não pode ser um elemento determinante para qualificar a disponibilização da referida infraestrutura como atividade económica em concorrência com operadores privados que propõem soluções alternativas à rede rodoviária.

110    O Reino da Dinamarca alega que, na decisão relativa à construção, a Comissão considerou que, uma vez que a rede ferroviária nacional era gerida e explorada num mercado fechado em que não existe nenhuma concorrência, os financiamentos públicos concedidos à Femern Landanlaeg não eram suscetíveis de afetar as trocas comerciais entre Estados‑Membros, e isto apesar de algumas ligações aéreas ou por ferries poderem constituir alternativas a certas ligações ferroviárias. Por conseguinte, o Reino da Dinamarca considera que o critério de substituibilidade aplicado pela Comissão aquando da análise dos serviços de transporte ferroviário da Femern é diferente e mais estrito do que o utilizado no seu exame global da rede ferroviária pública dinamarquesa.

111    A Comissão contesta esta argumentação.

112    Resulta da análise da terceira acusação acima efetuada nos n.os 74 a 106 que a Comissão podia validamente considerar que não resultava dos elementos dos autos que as atividades da Femern, enquanto tais, estavam abrangidas pelo exercício da autoridade pública e que tinham sido confiadas a esta entidade prerrogativas de poder público. Daqui resulta que a argumentação do Reino da Dinamarca no âmbito da presente acusação assenta na premissa errada de que as atividades de construção e de exploração da ligação fixa estão ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

113    Por outro lado, contrariamente ao que alega o Reino da Dinamarca, não se pode criticar a Comissão por ter examinado se, no âmbito da exploração da ligação fixa, os serviços que serão oferecidos pela Femern podem substituir os serviços oferecidos por operadores que prosseguem fins lucrativos num determinado mercado. Com efeito, ao fazê‑lo, a Comissão aplica um critério que lhe permite determinar se a referida atividade de exploração constitui uma atividade económica (v., neste sentido, Acórdãos de 1 de julho de 2008, MOTOE, C‑49/07, EU:C:2008:376, n.o 27, e de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania, C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 46).

114    Quanto ao argumento de que, em substância, a Comissão deveria ter procedido a uma análise aprofundada das características das redes rodoviárias e ferroviárias dinamarquesas para determinar se as atividades de construção e de exploração da ligação fixa estavam ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público, há que salientar que o Reino da Dinamarca não juntou aos autos elementos que permitam considerar que, no seu conjunto, as atividades de construção ou de exploração das redes rodoviárias e ferroviárias estão efetivamente ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público. Além disso, como acertadamente refere a Comissão, a decisão recorrida tem unicamente por objeto o financiamento da ligação fixa e não o financiamento de todas as redes rodoviárias e ferroviárias dinamarquesas, pelo que as características destas últimas não são pertinentes para determinar se as atividades da Femern em causa no caso em apreço são de natureza económica. Daqui resulta que este argumento do Reino da Dinamarca não pode ser acolhido.

115    No que respeita ao argumento pelo qual a Comissão é acusada de ter utilizado, na decisão recorrida, um critério de substituibilidade mais estrito do que o utilizado na decisão relativa à construção, pelo que a apreciação efetuada no caso em apreço é insuficiente e contraditória, basta salientar que a existência de serviços de transporte substituíveis não constitui um elemento pertinente para efeitos da determinação da existência de atividades ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público. Em todo o caso, contrariamente ao que alega o Reino da Dinamarca, importa observar que na Decisão relativa à Construção e nos Acórdãos de 13 de dezembro de 2018, Scandlines Danmark e Scandlines DeutschLand/Comissão (T‑630/15, não publicado, EU:T:2018:942), e de 13 de dezembro de 2018, Stena Line Scandinavia/Comissão (T‑631/15, não publicado, EU:T:2018:944), não se tratou de modo algum de uma eventual concorrência entre as ligações ferroviárias e os operadores de ferries ou de ligações aéreas, pelo que a argumentação do Reino da Dinamarca não pode ser acolhida.

116    Quanto ao argumento de que a instituição de um regime de pagamento para a utilização de uma infraestrutura rodoviária pelos utilizadores não é um critério determinante para qualificar a disponibilização da referida infraestrutura como atividade económica devido à existência de uma relação de substituição num mercado com operadores que prosseguem fins lucrativos que propõem soluções alternativas à rede rodoviária, deve ser rejeitado. Com efeito, como será precisado no âmbito da terceira parte do presente fundamento, nos n.os 148 a 153, infra, o pagamento de taxas constitui um elemento que, embora não seja determinante, é pelo menos pertinente para qualificar a disponibilização da infraestrutura de atividade económica, pelo que podia, portanto, ser validamente tido em conta pela Comissão.

117    Além disso, uma vez que a Comissão podia validamente concluir que a Femern não tinha recebido nenhuma prerrogativa de poder público específica, a argumentação destinada a comparar uma relação de substituição entre as infraestruturas de transporte e os modos de transporte alternativos com a relação de substituição que existe entre, por um lado, as atividades da polícia e da justiça e, por outro, as atividades de sociedades de segurança privadas e a arbitragem não pode ser acolhida. A este respeito, há que salientar que as atividades da polícia e da justiça estão abrangidas, por natureza, pela autoridade pública, visto que implicam o recurso a prerrogativas que exorbitam do direito comum e aos privilégios de poder público que se impõem aos cidadãos e às empresas. Não é este o caso das atividades das empresas de segurança privada nem da atividade de arbitragem. A mesma conclusão impõe‑se no que respeita às atividades de construção e de exploração de uma infraestrutura de transporte como a ligação fixa.

118    Por conseguinte, há que julgar improcedente a acusação relativa a um alegado erro decorrente da tomada em consideração da existência de serviços substituíveis à ligação fixa.

119    Resulta das considerações precedentes que a primeira parte do primeiro fundamento, relativa ao facto de a Comissão ter considerado erradamente que as atividades da Femern não implicam o exercício de prerrogativas de poder público, deve ser julgada improcedente na totalidade.

2.      Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa à constatação alegadamente errada de que a Femern oferece serviços de transporte num mercado em concorrência com outros operadores

120    O Reino da Dinamarca, apoiado pelo Reino da Bélgica, alega que a ligação fixa não está em concorrência com os operadores de ferries do mesmo modo que uma infraestrutura ferroviária não se encontra em concorrência direta com a estrada, os autocarros ou os aeroportos.

121    Segundo o Reino da Dinamarca, os eventuais efeitos sobre a concorrência são o resultado da decisão de realizar a ligação fixa que está abrangida pelo exercício da autoridade pública. Por conseguinte, a coexistência de atividades comerciais com atividades que implicam o exercício de prerrogativas de poder público não significa automaticamente que estas constituam atividades económicas.

122    Além disso, o Reino da Dinamarca alega que, mesmo que as atividades da Femern não fossem consideradas ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público, esta entidade não estaria em concorrência com os operadores de ferries. Neste sentido, o Reino da Dinamarca sublinha que a Femern tem por missões a construção e a exploração da ligação fixa de uma forma que permita otimizar as vantagens macroeconómicas. Assim, a circunstância de as atividades desta entidade terem incidência na economia nacional e nos mercados próximos, nomeadamente o dos serviços oferecidos pelos operadores de ferries, não significa que se possa considerar que a construção e a exploração da ligação fixa estão em concorrência com operadores privados num mercado de fornecimento de serviços de transporte.

123    O Reino da Dinamarca sustenta que, em todo o caso, a Femern não pode concorrer num mercado de serviços de transporte na fase do planeamento e da construção da ligação fixa.

124    O Reino da Bélgica considera que não existe concorrência com os ferries privados, visto que a intervenção pública se limita a suprir as carências da iniciativa privada.

125    A Comissão contesta esta argumentação.

126    A este respeito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, para efeitos da aplicação das disposições do direito da União em matéria de concorrência, constitui uma empresa qualquer entidade que exerça uma atividade económica e constitui uma atividade económica qualquer atividade que consista em oferecer bens ou serviços num determinado mercado (Acórdãos de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão, C‑288/11 P, EU:C:2012:821, n.o 50, e de 24 de março de 2022, GVN/Comissão, C‑666/20 P, não publicado, EU:C:2022:225, n.o 69).

127    No caso em apreço, no considerando 193 da decisão recorrida, a Comissão declarou que existe um mercado de serviços de transporte para a travessia do Estreito de Fehmarn, no qual já opera um operador de ferries, que é uma empresa que opera em condições de mercado. Por conseguinte, a Comissão considerou que os serviços de transporte prestados pela Femern estão em concorrência com os serviços de transporte oferecidos por este operador de ferries.

128    Por um lado, não se pode deixar de observar que o Reino da Dinamarca não contesta a existência de um mercado de serviços para a travessia do Estreito de Fehmarn entre Rødby e Puttgarden que sejam prestados por um operador de ferries e reconhece que a entrada em funcionamento da ligação fixa terá igualmente um efeito sobre vários tipos de empresas, como os operadores de ferries, as empresas de transporte por autocarro ou ainda as empresas de transporte rodoviário de mercadorias.

129    Por outro lado, enquanto o Reino da Dinamarca contesta a existência de uma relação de concorrência entre os serviços oferecidos pela Femern e os prestados pelo operador de ferries, há que salientar que, como resulta da análise financeira da Femern para o ano de 2016, o nível dos preços constitui um elemento tido em conta pelo consumidor na escolha de utilizar, para efetuar a travessia do Estreito de Fehmarn, a ligação fixa ou os ferries.

130    Por conseguinte, há que concluir que existe uma relação de substituição entre os serviços que serão oferecidos pela Femern e os oferecidos pelo operador de ferries. Por conseguinte, como acertadamente alega a Comissão, embora a Femern e o operador de ferries ofereçam serviços cujas características são diferentes em certos aspetos, há que considerar que operam no mesmo mercado, ou seja, o de serviços de transporte para a travessia do Estreito de Fehmarn, no qual os consumidores terão a possibilidade de escolher, na hipótese da manutenção dos serviços oferecidos pelo operador de ferries após a entrada em funcionamento da ligação fixa, entre os serviços oferecidos por este operador e os oferecidos pela Femern no âmbito da exploração da ligação fixa.

131    Além disso, há que salientar que o Reino da Dinamarca não contesta a outra hipótese prevista, evocada nos considerandos 237 e 360 da decisão recorrida, de que a entrada em funcionamento da ligação fixa é suscetível de conduzir ao desaparecimento dos serviços de ferry na ligação entre Rødby e Puttgarden. Ora, tal hipótese corrobora a existência de uma relação de substituição entre os serviços oferecidos pelo operador de ferries que asseguram esta ligação e os que serão oferecidos pela Femern.

132    Assim, nas circunstâncias do presente processo, contrariamente ao que alega o Reino da Dinamarca, há que considerar que os serviços oferecidos pela Femern no âmbito da exploração da ligação fixa estarão em concorrência direta com os oferecidos, para a travessia do Estreito de Fehmarn, por outro prestador de transporte, ou seja, o operador de ferries que assegura a ligação entre Rødby e Puttgarden, o qual constitui, sem que isto seja contestado pelo Reino da Dinamarca, uma empresa que prossegue fins lucrativos.

133    Por outro lado, há que salientar que a Comissão também identificou um mercado de serviços de transporte mais alargado, ou seja, o das ligações de transporte que constituem uma alternativa para a travessia do Estreito de Fehmarn. Neste sentido, decorre de uma leitura conjugada dos considerandos 193 e 237 da decisão recorrida que a Comissão também teve em conta o mercado dos serviços de transporte para assegurar a travessia do mar Báltico ocidental, ou seja, as ligações entre a Dinamarca, a Alemanha e a Suécia, nas quais operam igualmente operadores de ferries, dos quais, como resulta da análise financeira da Femern para o ano de 2016, uma parte do tráfego poderia ser absorvida pela ligação fixa.

134    Quanto à argumentação de que, em substância, a Femern não pode estar em concorrência com outros prestadores de transporte devido a considerações relativas ao exercício de prerrogativas de poder público, deve ser rejeitada.

135    Por um lado, uma vez que, com esta argumentação, o Reino da Dinamarca sustenta que não existe concorrência entre a ligação fixa e os operadores de ferries pelo facto de os efeitos da entrada em funcionamento da referida ligação na concorrência resultarem de uma decisão dos poderes públicos adotada no exercício das suas prerrogativas de poder público, esta não pode ser acolhida. Com efeito, há que salientar que o facto de um Estado‑Membro fazer uso destas prerrogativas para constituir uma entidade encarregada de construir e explorar uma infraestrutura não implica necessariamente que as atividades desta entidade também estejam ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público.

136    Por outro lado, uma vez que o Reino da Dinamarca sustenta que os eventuais efeitos das atividades da Femern na concorrência são irrelevantes devido ao facto de as referidas atividades estarem relacionadas com o exercício de prerrogativas de poder público, tal argumentação deve ser rejeitada. Com efeito, como já foi declarado anteriormente (v. n.os 74 a 106, supra), a Comissão podia, nas circunstâncias do presente processo, concluir validamente que as atividades da Femern, enquanto tais, não estão abrangidas pelo exercício da autoridade pública e que, à luz dos elementos dos autos, não tinham sido atribuídas a esta entidade prerrogativas de poder público.

137    No que respeita ao argumento de que os efeitos das atividades da Femern na economia nacional e nos mercados próximos são irrelevantes para estabelecer uma relação de concorrência entre esta entidade e os operadores de ferries pelo facto de as referidas atividades visarem otimizar as vantagens macroeconómicas da Dinamarca, importa salientar que o referido argumento equivale, em substância, a alegar que a constatação de que uma entidade exerce atividades prosseguindo um objetivo de interesse geral se opõe a que se possa considerar que a referida entidade está em concorrência com operadores que prosseguem fins lucrativos. Ora, como foi recordado no n.o 64, supra, a circunstância de serem confiadas a uma entidade determinadas missões de interesse geral não impede que as atividades em causa sejam consideradas atividades económicas. Com efeito, importa recordar que resulta de jurisprudência constante que o artigo 107.o, n.o 1, TFUE não distingue consoante as causas ou os objetivos das intervenções estatais, mas defini‑os em função dos seus efeitos [Acórdãos de 2 de julho de 1974, Itália/Comissão, 173/73, EU:C:1974:71, n.o 27, e de 6 de abril de 2022, Mead Johnson Nutrition (Asia Pacific) e o./Comissão, T‑508/19, EU:T:2022:217, n.o 80].

138    Quanto ao argumento de que não existe concorrência entre a Femern e os operadores de ferries pelo facto de a intervenção pública se limitar a suprir as carências da iniciativa privada, deve ser rejeitado. Com efeito, como resulta do n.o 126, supra, para determinar se uma entidade exerce uma atividade económica, a Comissão deve demonstrar que a referida entidade oferece bens ou serviços num mercado em concorrência com operadores que prosseguem fins lucrativos. Ora, no caso em apreço, como resulta do considerando 193 da decisão recorrida, já existe um operador privado que presta serviços para assegurar a travessia do Estreito de Fehmarn. Do mesmo modo, existem também empresas privadas que prestam serviços de transporte noutras ligações que constituem uma alternativa à travessia do referido Estreito.

139    Quanto ao argumento de que a Femern não pode estar em concorrência no mercado dos serviços de transporte na fase de construção da ligação fixa, deve igualmente ser rejeitado. Com efeito, como será precisado no âmbito do exame do segundo fundamento nos n.os 185 a 207, infra, nas circunstâncias do presente processo, a Comissão podia, sem cometer um erro de apreciação, concluir que as atividades de construção e de exploração da ligação fixa eram indissociáveis.

140    Resulta das considerações precedentes que a segunda parte do primeiro fundamento, relativa ao facto de ter sido erradamente declarado que a Femern oferece serviços de transporte num mercado em concorrência com outros operadores, deve ser julgada improcedente na totalidade.

3.      Quanto à terceira parte do primeiro fundamento, relativa à constatação alegadamente errada de que a Femern é um operador que prossegue uma lógica comercial

141    O Reino da Dinamarca alega que a Femern não pode explorar a ligação fixa como um operador numa economia de mercado que funciona numa lógica de economia de mercado e não pode, por conseguinte, dedicar‑se a uma exploração comercial da ligação fixa. Neste sentido, o Reino da Dinamarca indica que a Femern atua, em relação aos elementos essenciais, sob instruções do ministro dos Transportes dinamarquês, que será igualmente responsável pela fixação do montante das portagens tendo em conta considerações macroeconómicas e políticas, e precisa que os seus lucros serão afetados ao financiamento de infraestruturas no território dinamarquês. A este respeito, o Grão‑Ducado do Luxemburgo alega que, uma vez que a Femern não está sujeita à regra da maximização dos lucros, que os seus lucros contribuem para o financiamento da infraestrutura terrestre pública e que não dispõe de nenhuma autonomia decisória, não se pode considerar que esta exerce uma atividade económica.

142    Além disso, segundo o Reino da Dinamarca, apoiado pela República Federal da Alemanha e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, a circunstância de as atividades da Femern serem financiadas por taxas cobradas aos utilizadores não basta para considerar que esta entidade opera numa lógica de mercado. A este respeito, o Grão‑Ducado do Luxemburgo sustenta que o modo de financiamento da ligação fixa pelo imposto ou pelos utilizadores não constitui um elemento pertinente para distinguir as atividades não económicas das atividades económicas. Além disso, o Reino da Dinamarca considera que a Comissão não teve suficientemente em conta a falta de liberdade em matéria tarifária que seria um indício pertinente para demonstrar que a Femern não constituía uma empresa.

143    Por outro lado, segundo o Reino da Dinamarca, a circunstância de a Femern cobrar taxas quando a ligação fixa entrar em funcionamento não deve ter por consequência que as suas atividades ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público se tornem atividades de natureza económica.

144    A Comissão contesta esta argumentação.

145    Em primeiro lugar, quanto aos argumentos através dos quais se alega que a ligação fixa não será objeto de exploração comercial, importa recordar que, segundo a jurisprudência aplicável em matéria de auxílios estatais, constituem serviços suscetíveis de ser qualificados de atividades económicas as prestações geralmente fornecidas contra remuneração, precisando‑se que a característica essencial da remuneração reside no facto de esta constituir a contrapartida económica da prestação em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 27 de junho de 2017, Congregación de Escuelas Pías Provincia Betania, C‑74/16, EU:C:2017:496, n.o 47, e de 20 de setembro de 2019, Havenbedrijf Antwerpen e Maatschappij van de Brugse Zeehaven/Comissão, T‑696/17, EU:T:2019:652, n.o 75).

146    Além disso, em matéria de auxílios estatais, o facto de uma atividade não ser assegurada por operadores privados ou o facto de não ser rentável não constituem critérios pertinentes para a qualificar ou não de atividade económica. Com efeito, é jurisprudência constante que, por um lado, o conceito de «empresa», no contexto do direito da concorrência, abrange qualquer entidade que exerça uma atividade económica, independentemente do seu estatuto jurídico e do seu modo de financiamento, e que, por outro, constitui uma atividade económica qualquer atividade que consista em oferecer bens ou serviços num determinado mercado (Acórdãos de 25 de outubro de 2001, Ambulanz Glöckner, C‑475/99, EU:C:2001:577, n.o 19, e de 20 de setembro de 2019, Havenbedrijf Antwerpen e Maatschappij van de Brugse Zeehaven/Comissão, T‑696/17, EU:T:2019:652, n.o 46). Daqui decorre que o caráter económico ou não de uma atividade não depende do estatuto privado ou público da entidade que a exerce nem da rentabilidade desta atividade (Acórdãos de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão, C‑288/11 P, EU:C:2012:821, n.o 50, e de 15 de dezembro de 2016, Espanha/Comissão, T‑808/14, não publicado, EU:T:2016:734, n.o 55).

147    É à luz destes princípios que há que examinar os argumentos invocados pelo Reino da Dinamarca, pela República Federal da Alemanha e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo.

148    Contrariamente ao que sustentam, em substância, o Reino da Dinamarca e o Grão‑Ducado do Luxemburgo, o facto de subordinar o acesso à ligação fixa ao pagamento de taxas constitui um elemento pertinente para qualificar a exploração da referida ligação como atividade económica.

149    A este respeito, importa precisar que as disposições do Tratado FUE relativas à concorrência e, mais especificamente, as regras em matéria de auxílios estatais não exigem que os Estados‑Membros exijam um pagamento para o acesso às infraestruturas de transporte, mas deixam à sua discrição a questão de saber se o acesso deve ser gratuito ou condicionado ao pagamento de uma contrapartida económica.

150    Assim, quando o Estado‑Membro decide, no âmbito da execução da sua política de transportes, que a disponibilização de uma infraestrutura se efetua a título gratuito no interesse comum, isto pode constituir um indício para concluir que a referida infraestrutura não é objeto de exploração económica. Em contrapartida, quando o Estado‑Membro decide, como no caso em apreço, condicionar o acesso à infraestrutura ao pagamento de uma taxa a fim de gerar receitas afetadas, como resulta do considerando 192 da decisão recorrida, nomeadamente ao reembolso da dívida contraída para financiar o planeamento e a construção da ligação fixa, há que considerar que a infraestrutura é objeto de uma exploração económica (v., neste sentido, Acórdão de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão, T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117, n.os 93 e 94).

151    No caso em apreço, há que observar que, no considerando 192 da decisão recorrida, a Comissão salientou que a Femern presta um serviço de transporte aos cidadãos e às empresas que dependeria do pagamento de uma taxa pela utilização do troço rodoviário e da infraestrutura ferroviária.

152    Daqui resulta que, no considerando 194 da decisão recorrida, a Comissão podia, sem cometer um erro de apreciação, considerar que a exploração da ligação fixa se rege por uma lógica económica, tendo em conta que seria financiada pelas taxas de utilização.

153    Por conseguinte, visto que a Comissão concluiu, por um lado, no considerando 193 da decisão recorrida, que a Femern oferecerá nomeadamente serviços no mercado de serviços de transporte para a travessia do Estreito de Fehmarn no qual opera um operador que prossegue fins lucrativos e, por outro, nos considerandos 192 e 194 da decisão recorrida, que o acesso à ligação fixa dependerá do pagamento de taxas a esta entidade, que constitui a contrapartida da prestação de serviços, podia legitimamente concluir que a atividade de exploração da ligação fixa constituía uma atividade económica.

154    Os argumentos invocados pelo Reino da Dinamarca, pela República Federal da Alemanha e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, relativos ao facto de as regras a que a Femern está sujeita não lhe permitirem fazer uma exploração comercial da ligação fixa, não podem pôr em causa esta conclusão.

155    A este respeito, há que recordar que, para excluir o caráter económico de uma atividade que consiste em oferecer bens ou serviços num mercado, não basta alegar que o operador da infraestrutura não atua numa base puramente comercial de maximização dos lucros, que coloca o interesse geral antes do retorno do investimento, que tem fins lucrativos e que reinveste sistematicamente os seus lucros [v., neste sentido, Acórdão de 30 de abril de 2019, Chambre de commerce et d’industrie métropolitaine Bretagne‑Ouest (port de Brest)/Comissão, T‑754/17, não publicado, EU:T:2019:270, n.o 80].

156    Além disso, uma vez que o caráter económico, ou não, de uma atividade não depende do estatuto privado ou público da entidade que a exerce nem da rentabilidade desta atividade, daí resulta que, mesmo que as receitas de uma atividade devam obrigatoriamente ser reinvestidas em atividades não económicas, as atividades remuneradas constituem uma participação no mercado suscetível de pôr em causa os objetivos do direito da concorrência, pelo que uma obrigação de reinvestimento das receitas não obsta ao caráter económico de uma atividade (v., neste sentido, Acórdão de 12 de setembro de 2013, Alemanha/Comissão, T‑347/09, não publicado, EU:T:2013:418, n.o 50).

157    Assim, os argumentos relativos a que a Femern não prossegue um objetivo de maximização dos lucros e deve reinvestir os seus lucros para o financiamento das infraestruturas não podem ser acolhidos. Além disso, a circunstância invocada pelo Reino da Dinamarca de que o montante das taxas pela utilização da ligação fixa não está estabelecido com base numa lógica de mercado, no sentido de que a estrutura dos preços é afastada da praticada no mercado pelos operadores privados, não pode obstar à conclusão de que a exploração da ligação fixa constitui uma atividade económica.

158    Além disso, há também que rejeitar o argumento de que a Femern atua, em relação aos elementos essenciais, como a data de início dos trabalhos, por instrução do ministro dos Transportes dinamarquês. Com efeito, a questão de saber se as atividades em causa exercidas por uma entidade têm caráter económico não depende do facto de um investidor privado não estar em condições de as exercer nas mesmas condições (v., por analogia, Acórdão de 16 de julho de 2014, Zweckverband Tierkörperbeseitigung/Comissão, T‑309/12, não publicado, EU:T:2014:676, n.o 76).

159    Além disso, no que respeita ao argumento de que a Comissão não teve suficientemente em conta a falta de liberdade da Femern na fixação do montante das taxas pela utilização da ligação, há que salientar que é certo que, como resulta do ponto 42, n.o 2, da Lei relativa à Construção, os princípios que regem o montante das taxas são adotados pelo ministro dos Transportes dinamarquês. Todavia, na sua petição, o Reino da Dinamarca reconhece que, com base no artigo 42.o, n.o 3, da referida lei, a Femern pode alterar os regimes gerais de descontos e instituir novos regimes, desde que o nível global das receitas não seja sensivelmente afetado. Por conseguinte, no considerando 197 da decisão recorrida, a Comissão não cometeu um erro de apreciação ao considerar que a Femern tem uma certa margem de manobra para decidir sobre os seus próprios preços.

160    Ora, o simples facto de o ministro dos Transportes dinamarquês regular o montante das taxas com base em considerações macroeconómicas e ligadas à política dos transportes não basta para concluir que a atividade de exploração da ligação fixa não constitui uma atividade económica.

161    Por outro lado, não pode ser tomada em consideração a circunstância, posterior à decisão recorrida, de a Femern já não dispor da faculdade de modular o montante das taxas na sequência da adoção, durante o processo judicial, de uma nova lei, pelo que só o ministro dos Transportes dinamarquês está habilitado a determinar o montante das referidas taxas. Com efeito, a legalidade do ato da União deve ser apreciada em função dos elementos de facto e de direito existentes na data em que o ato foi adotado (Acórdãos de 7 de fevereiro de 1979, França/Comissão, 15/76 e 16/76, EU:C:1979:29, n.os 7 e 8, e de 12 de dezembro de 1996, Altmann e o./Comissão, T‑177/94 e T‑377/94, EU:T:1996:193, n.o 119). Daqui resulta que está excluída a tomada em consideração, no momento da apreciação da legalidade deste ato, de elementos posteriores à data em que o ato da União foi adotado (Acórdãos de 27 de setembro de 2006, Roquette Frères/Comissão, T‑322/01, EU:T:2006:267, n.o 325, e de 11 de fevereiro de 2015, Espanha/Comissão, T‑204/11, EU:T:2015:91, n.o 123). Assim, aquando da adoção da decisão recorrida, a Comissão podia validamente tomar em consideração a circunstância de que, em certa medida, a Femern podia influenciar o montante de certas taxas para o acesso à infraestrutura.

162    Resulta do exposto que os argumentos invocados pelo Reino da Dinamarca, pela República Federal da Alemanha e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo destinados a alegar que as regras a que a Femern está sujeita não lhe permitem fazer uma exploração comercial da ligação fixa, considerados isoladamente ou no seu conjunto, não põem em causa a conclusão de que a exploração da ligação fixa constitui uma atividade económica.

163    Em segundo lugar, quanto à argumentação de que, em substância, as atividades da Femern ligadas a prerrogativas de poder público não se podem tornar atividades económicas devido à cobrança de taxas pela utilização da ligação fixa, basta observar que assenta na premissa errada de que a Comissão deveria ter considerado que certas atividades da Femern estavam ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público (v. n.os 75 a 106, supra). Portanto, esta argumentação não pode ser acolhida.

164    Por conseguinte, a primeira parte do primeiro fundamento deve ser julgada improcedente na totalidade.

4.      Quanto ao segundo fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter erradamente concluído que as atividades de construção e de exploração da ligação fixa são indissociáveis

165    Com o seu segundo fundamento, o Reino da Dinamarca contesta não só o mérito da conclusão de que as atividades de construção e de exploração da ligação fixa são indissociáveis, mas também a fundamentação da decisão recorrida a este respeito.

a)      Quanto à fundamentação da decisão recorrida no que respeita ao caráter indissociável das atividades de construção e de exploração da ligação fixa

166    O Reino da Dinamarca considera que a decisão recorrida está insuficientemente fundamentada no que respeita à conclusão de que a Femern exerce uma atividade económica desde a fase de construção.

167    Além disso, o Reino da Dinamarca também considera que, no considerando 201 da decisão recorrida, a Comissão não expôs as razões pelas quais concluiu que as atividades de promoção, de marketing ou de informação da Femern constituem atividades económicas.

168    A Comissão contesta esta argumentação.

169    Segundo jurisprudência constante, a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar clara e inequivocamente o raciocínio da instituição, autora do ato, de modo a permitir aos interessados conhecerem as justificações da medida tomada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização. A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso em apreço, designadamente, do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas direta e individualmente afetadas pelo ato podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada tendo em conta não só o seu teor mas também o seu contexto e o conjunto das regras jurídicas que regulam a matéria em causa (v. Acórdão de 10 de julho de 2008, Bertelsmann e Sony Corporation of America/Impala, C‑413/06 P, EU:C:2008:392, n.o 166 e jurisprudência referida; Acórdão de 27 de janeiro de 2021, KPN/Comissão, T‑691/18, não publicado, EU:T:2021:43, n.o 161). Em particular, a Comissão não tem de tomar posição sobre todos os argumentos invocados perante ela pelos interessados. Basta‑lhe expor os factos e as considerações jurídicas que revestem uma importância essencial na sistemática da decisão (Acórdãos de 11 de janeiro de 2007, Technische Glaswerke Ilmenau/Comissão, C‑404/04 P, não publicado, EU:C:2007:6, n.o 30, e de 24 de setembro de 2019, Fortischem/Comissão, T‑121/15, EU:T:2019:684, n.o 41).

170    No caso em apreço, quanto à fundamentação do caráter indissociável das atividades de construção e de exploração da ligação fixa, há que salientar que, no considerando 189 da decisão recorrida, a Comissão recordou, antes de mais, a jurisprudência segundo a qual a exploração de um aeroporto foi considerada uma atividade económica e que o mesmo acontecia com a construção de uma pista de um aeroporto comercial. Embora precise que esta jurisprudência dizia especificamente respeito aos aeroportos, a Comissão indicou que os princípios desenvolvidos pelo Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Geral são igualmente aplicáveis à construção de outras infraestruturas. A este respeito, a nota de rodapé n.o 89, no considerando 189 da decisão recorrida, remete para o n.o 202 da Comunicação sobre a noção de auxílio estatal, que indica que estes princípios estabelecidos pelos tribunais da União são aplicáveis à construção de outras infraestruturas indissociavelmente ligadas a uma atividade económica. Além disso, no considerando 189 da decisão recorrida, a Comissão evoca igualmente a jurisprudência recente do Tribunal Geral relativa às infraestruturas portuárias, mencionando, na nota de rodapé n.o 90, o Acórdão de 20 de setembro de 2019, Havenbedrijf Antwerpen e Maatschappij van de Brugse Zeehaven/Comissão (T‑696/17, EU:T:2019:652).

171    Em seguida, no considerando 192 da decisão recorrida, a Comissão constatou que as receitas da Femern provenientes da exploração das atividades rodoviárias e ferroviárias se destinam, nomeadamente, a financiar o custo total do planeamento, da construção e da exploração da ligação fixa.

172    Por último, no considerando 198 da decisão recorrida, após ter concluído que a exploração da ligação fixa constitui uma atividade económica, a Comissão considerou que a construção da infraestrutura explorada pela Femern constitui igualmente uma atividade económica com base nos Acórdãos de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão (C‑288/11 P, EU:C:2012:821), e de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão (T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117).

173    Há que constatar que a Comissão fez referência aos acórdãos do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral relativos às infraestruturas aeroportuárias, aos recentes processos do Tribunal Geral relativos às infraestruturas portuárias e à Comunicação sobre a noção de auxílio estatal. Por conseguinte, há que considerar que a Comissão pretendeu aplicar um princípio segundo o qual, perante uma infraestrutura que é objeto de uma exploração económica, a atividade de construção é igualmente de natureza económica quando as duas atividades estão indissociavelmente ligadas. No caso em apreço, a Comissão constatou a existência de uma relação económica entre as duas atividades através da utilização das receitas de exploração para reembolsar, nomeadamente, a dívida contraída para o planeamento e a construção da ligação fixa.

174    Daqui resulta que a Comissão fundamentou com prova bastante a indissociabilidade das atividades de construção e de exploração da ligação fixa.

175    No que respeita ao argumento de que, em substância, a Comissão fundamentou de modo insuficiente a conclusão de que as atividades de promoção, de marketing ou de informação da Femern constituem atividades económicas, há que salientar que, no considerando 201 da decisão recorrida, a Comissão indicou, em substância, que estas atividades contribuíram para o planeamento, a construção e a exploração da ligação fixa e que, mesmo na eventualidade de estas atividades de promoção, de marketing ou de informação serem consideradas atividades de informação, não é menos verdade que contribuem para a atividade económica da Femern. A este respeito, a Comissão salientou que não é invulgar que as empresas sejam obrigadas a informar o público das suas atividades. Além disso, considerou que, em princípio, as obrigações de informação não implicam o exercício de prerrogativas de poder público. Assim, resulta claramente do considerando 201 da decisão recorrida que a Comissão considerou que as atividades de promoção, de marketing ou de informação constituem atividades económicas, uma vez que estão relacionadas com as atividades principais da Femern, ou seja, a construção e a exploração da ligação fixa. Por conseguinte, há que considerar que a Comissão fundamentou de modo suficiente a decisão recorrida no que respeita ao caráter económico das atividades de promoção, de marketing ou de informação.

b)      Quanto ao mérito da decisão recorrida no que respeita ao caráter indissociável das atividades de construção e de exploração da ligação fixa

176    O Reino da Dinamarca alega que a Comissão cometeu um erro de apreciação ao declarar que a atividade de construção não é dissociável da atividade de exploração da ligação fixa.

177    A este respeito, primeiro, o Reino da Dinamarca, apoiado pela República Federal da Alemanha e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, alega que a Comissão considera erradamente que resulta dos Acórdãos de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão (C‑288/11 P, EU:C:2012:821), e de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão (T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117), que uma atividade de construção, isto é, uma atividade a montante, é necessariamente uma atividade económica, uma vez que a atividade de exploração, isto é, a jusante, é uma atividade económica. Só em determinadas circunstâncias é que uma futura exploração comercial de uma infraestrutura pode ter por efeito que a sua construção constitua igualmente uma atividade económica, nomeadamente quando uma pista de aeroporto faça parte da atividade económica existente do referido aeroporto. Segundo o Reino da Dinamarca, a República Federal da Alemanha e o Grão‑Ducado do Luxemburgo, o caso em apreço distingue‑se dos processos anteriores, visto que se trata de um caso de construção inicial de uma infraestrutura cuja exploração terá lugar no futuro.

178    Segundo, o Reino da Dinamarca sustenta que há que ter em conta a circunstância de a Femern não exercer uma atividade económica antes da entrada em funcionamento da ligação fixa, pelo que, na fase de construção, a entidade não está ativa em nenhum mercado em concorrência com outros operadores. A este respeito, o Reino da Dinamarca alega que só se a Femern estiver em condições de penetrar rapidamente no mercado em causa é que poderá ser considerada concorrente das empresas que já operam no referido mercado.

179    Terceiro, o Reino da Dinamarca alega, em substância, que, uma vez que a Femern não opera num mercado liberalizado, não se pode considerar que esta entidade exerce uma atividade económica.

180    Quarto, segundo o Reino da Dinamarca, resulta do n.o 84 do Acórdão de 30 de abril de 2019, UPF/Comissão (T‑747/17, EU:T:2019:271), que a existência de uma relação económica entre duas atividades não basta para declarar o caráter indissociável destas atividades, pelo que o financiamento do planeamento e da construção da ligação fixa através da cobrança de portagens no âmbito da exploração da referida ligação não significa necessariamente que as atividades sejam indissociáveis.

181    Quinto, o Reino da Dinamarca considera que a conclusão da Comissão sobre o caráter indissociável das atividades de construção e de exploração não tem em conta que as circunstâncias podem evoluir até à entrada em funcionamento da ligação fixa, em especial as autoridades dinamarquesas poderem decidir alterar as condições de exploração da ligação fixa.

182    Sexto, o Reino da Dinamarca alega que a qualificação de empresa deve ser objeto de uma interpretação restritiva visto que o facto de qualificar a Femern de empresa antes da entrada em funcionamento da ligação fixa ter consequências prejudiciais uma vez que esta entidade seria obrigada a pagar os juros devidos a título do período de ilegalidade. Além disso, segundo o Reino da Dinamarca, uma interpretação restritiva do conceito de «empresa» harmonizar‑se‑ia melhor com matérias próximas, designadamente com a regulamentação nacional relativa às práticas comerciais.

183    A Comissão contesta estes argumentos.

184    A título preliminar, há que constatar que o Reino da Dinamarca não invocou nenhum argumento fundamentado para contestar o mérito da qualificação das atividades de promoção, de marketing ou de informação como atividades de natureza económica.

185    Quanto aos argumentos de que a Comissão considerou erradamente que as atividades de construção e de exploração da ligação fixa são indissociáveis, há que recordar que a jurisprudência reconheceu que a exploração comercial e a construção de infraestruturas de transporte com vista a essa exploração comercial são suscetíveis de constituir atividades económicas (v., neste sentido, Acórdãos de 30 de abril de 2019, UPF/Comissão, T‑747/17, EU:T:2019:271, n.o 65, e de 20 de setembro de 2019, Havenbedrijf Antwerpen e Maatschappij van de Brugse Zeehaven/Comissão, T‑696/17, EU:T:2019:652, n.o 47). Esta jurisprudência decorre do Acórdão de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão (T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117), a que a Comissão se refere no considerando 198 da decisão recorrida, no qual o Tribunal Geral declarou que a Comissão podia validamente concluir pelo caráter indissociável da atividade de exploração de um aeroporto e da atividade de construção de uma nova pista de um aeroporto, uma vez que as taxas aeroportuárias constituíam a principal fonte de receitas para o financiamento dessa nova pista e que a exploração dessa nova pista faria parte da atividade económica do aeroporto (Acórdão de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão, T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117, n.o 94). Além disso, nesse acórdão, o Tribunal Geral também declarou que não havia que dissociar a atividade de construção da nova pista de aeroporto da utilização posterior que dela seria feita pelo facto de, tendo em conta a sua natureza e o seu objeto, a construção da referida pista não estar abrangida, enquanto tal, por prerrogativas de poder público (Acórdão de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão, T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117, n.o 99). Nesse processo, o Tribunal de Justiça declarou que o Tribunal Geral não tinha cometido um erro de direito quando declarou que a Comissão tinha de modo juridicamente correto considerado que a construção da nova pista aeroportuária constituía uma atividade económica, pelo que a injeção de capital controvertida, com exceção dos custos ligados à realização de missões públicas a deduzir do seu montante, constituía um auxílio de Estado (Acórdão de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão, C‑288/11 P, EU:C:2012:821, n.o 43).

186    Assim, quando a exploração de uma infraestrutura é objeto de exploração económica e as taxas de utilização constituem a principal fonte de financiamento da sua construção, há que considerar que as atividades de construção e de exploração desta infraestrutura constituem atividades económicas, com exclusão, quando o Estado‑Membro as invoca expressamente durante o procedimento administrativo, de eventuais missões que impliquem o recurso a prerrogativas de poder público.

187    É à luz destas considerações que há que examinar os argumentos invocados pelo Reino da Dinamarca, pela República Federal da Alemanha e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo.

188    Primeiro, contrariamente ao que alegam, em substância, o Reino da Dinamarca, a República Federal da Alemanha e o Grão‑Ducado do Luxemburgo, os princípios e critérios relativos à indissociabilidade das atividades de construção e da exploração de uma infraestrutura de transporte, estabelecidos nos Acórdãos de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão (C‑288/11 P, EU:C:2012:821), e de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão (T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117), e recordados no n.o 185, supra, não podem ser apenas limitados à hipótese da extensão de uma infraestrutura existente.

189    É certo que, no processo que deu origem aos Acórdãos de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão (C‑288/11 P, EU:C:2012:821), e de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão (T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117), estava em causa a extensão de uma pista de um aeroporto preexistente.

190    Todavia, quando, como no caso em apreço, existe um mercado de serviços de transporte no qual já atuam operadores que prosseguem fins lucrativos, a construção de uma nova infraestrutura de transporte destinada a ser objeto de uma exploração económica é suscetível de perturbar tanto a concorrência nesse mercado como a ampliação de uma infraestrutura preexistente. Por conseguinte, há que considerar que, para efeitos da apreciação do caráter indissociável das atividades de construção e de exploração de uma infraestrutura, o caso de uma construção de uma nova infraestrutura destinada a ser objeto de uma exploração económica futura é comparável ao de uma construção de uma ampliação de uma infraestrutura de transporte preexistente que é objeto de uma exploração económica.

191    Daqui resulta que há que rejeitar o argumento de que, em substância, os princípios e critérios relativos à indissociabilidade das atividades de construção e de exploração de uma infraestrutura de transporte, enunciados nos Acórdãos de 19 de dezembro de 2012, Mitteldeutsche Flughafen e Flughafen Leipzig‑Halle/Comissão (C‑288/11 P, EU:C:2012:821), e de 24 de março de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão (T‑443/08 e T‑455/08, EU:T:2011:117), não são transponíveis para o caso em apreço.

192    Segundo, quanto ao argumento de que, em substância, a Femern não está presente em nenhum mercado durante a fase de construção, importa salientar que é pacífico entre as partes que esta entidade está simultaneamente encarregada da construção e da exploração da ligação fixa.

193    A este respeito, como resulta da análise da segunda e terceira partes do primeiro fundamento, uma vez que a exploração pela Femern da ligação fixa consistirá em oferecer serviços num mercado no qual atua um operador que prossegue fins lucrativos em contrapartida de uma remuneração, a Comissão não cometeu um erro de direito ao declarar que a exploração da ligação fixa constitui uma atividade económica.

194    Além disso, há que salientar que, no considerando 192 da decisão recorrida, a Comissão estabeleceu, sem que tal seja contestado pelo Reino da Dinamarca, que as receitas de exploração da infraestrutura serão utilizadas, nomeadamente, para reembolsar os empréstimos contraídos para o planeamento e a construção da ligação fixa. Ao fazê‑lo, contrariamente ao que alegam, em substância, o Reino da Dinamarca, a República Federal da Alemanha e o Grão‑Ducado do Luxemburgo, a Comissão não presumiu, mas estabeleceu, tendo em conta as circunstâncias concretas do caso em apreço, que a construção da ligação fixa não pode ser dissociada da sua exploração económica futura. Do mesmo modo, como reconhece o Reino da Dinamarca, a exploração económica da ligação fixa tem igualmente por objetivo financiar a sua construção na perspetiva de alcançar um equilíbrio financeiro para todo o projeto. A este respeito, na audiência, o Tribunal Geral interrogou a Comissão sobre a articulação entre, por um lado, a constatação efetuada no considerando 192 da decisão recorrida de que, em substância, as receitas da Femern provenientes das atividades rodoviárias e ferroviárias se destinam, nomeadamente, a financiar o custo total do planeamento, da construção e da exploração da ligação fixa e, por outro, a afirmação do considerando 323 da referida decisão de que, caso fosse possível fixar os preços a um nível que compensasse todos os custos de construção e de exploração, não existiria um défice de financiamento nem seria necessário um auxílio estatal. A Comissão respondeu que, ao contrário do considerando 323 da decisão recorrida, o considerando 192 diz respeito aos custos de planeamento e de construção deduzidos do montante do auxílio, pelo que não pode haver contradição entre estes dois considerandos.

195    Assim, uma vez que a exploração económica da ligação fixa tem por objetivo reembolsar a dívida contraída para a sua construção e visto que a mesma entidade está encarregada das atividades de construção e de exploração da ligação fixa, para preservar o efeito útil das regras relativas aos auxílios estatais, não se pode admitir que as atividades de construção e de exploração da ligação fixa sejam dissociadas pelo facto de a entrada em funcionamento da ligação fixa só ocorrer quando a sua construção estiver concluída.

196    Caso contrário, uma vez que a Femern é simultaneamente responsável pela construção e pela exploração da ligação fixa, se, como sustenta o Reino da Dinamarca, a atividade de construção fosse considerada dissociável da exploração e, portanto, não económica, os financiamentos preferenciais obtidos para a construção da ligação fixa não poderiam ser qualificados de auxílios estatais. Daqui resulta que, nas circunstâncias do presente processo, na fase da exploração da ligação fixa, a Femern beneficiaria da possibilidade de explorar uma infraestrutura objeto de auxílio, o que lhe proporcionaria uma vantagem económica que não teria obtido em condições normais de mercado (v., neste sentido e por analogia, Acórdãos de 11 de julho de 1996, SAFEI e o., C‑39/94, EU:C:1996:285, n.o 62, e de 15 de março de 2018, Naviera Armas/Comissão, T‑108/16, EU:T:2018:145, n.os 119 e 120). Com efeito, como resulta do ponto 223 da Comunicação sobre a noção de auxílio estatal, presume‑se que um operador de uma infraestrutura beneficia de uma vantagem económica quando o montante pago para dispor do direito de explorar a infraestrutura for inferior ao montante que deveria ter pago para explorar uma infraestrutura comparável em condições normais de mercado.

197    Daqui resulta que a Comissão pôde validamente concluir que a construção da ligação fixa era indissociável da sua exploração económica futura. Por conseguinte, teve razão ao considerar que a Femern constitui uma empresa, e isto quer para a atividade de exploração da ligação fixa quer para a atividade de construção desta.

198    Por conseguinte, a argumentação do Reino da Dinamarca, de que a Femern não pode ser considerada como estando em concorrência com empresas que operam no mercado de serviços de transporte para a travessia do Estreito de Fehmarn na fase da construção da ligação fixa ou pelo facto de não estar vocacionada para penetrar rapidamente no referido mercado, deve ser rejeitada.

199    Terceiro, é verdade, como alega o Reino da Dinamarca, que, enquanto tais, as atividades de construção e de exploração da ligação fixa não estão liberalizadas no sentido de que a Lei relativa à Construção atribui exclusivamente o exercício destas atividades à Femern.

200    Todavia, não se pode deixar de observar que a atividade de exploração da ligação fixa consistirá em oferecer serviços para assegurar a travessia do Estreito de Fehmarn que é, sem que isso seja contestado pelo Reino da Dinamarca, um mercado liberalizado no qual já opera um operador privado. Por outro lado, como resulta do n.o 133, supra, a Comissão também identificou um mercado mais amplo, ou seja, o dos serviços de transporte para ligações que constituem uma alternativa à travessia do Estreito de Fehmarn e nos quais também atuam operadores de ferries.

201    Nestas circunstâncias, contrariamente ao que alega, em substância, o Reino da Dinamarca, o facto de as atividades de construção e de exploração da ligação fixa não estarem liberalizadas não tem por efeito excluir a qualificação das referidas atividades como atividades económicas. Caso contrário, para contornar a aplicação das regras do Tratado FUE relativas à concorrência num mercado liberalizado e aberto à concorrência, bastaria que um Estado‑Membro concedesse direitos exclusivos a uma entidade chamada a oferecer serviços no referido mercado.

202    Daqui resulta que o argumento relativo a que a Comissão não teve em conta o facto de as atividades da Femern não estarem liberalizadas deve ser rejeitado.

203    Quarto, quanto ao argumento do Reino da Dinamarca baseado no n.o 84 do Acórdão de 30 de abril de 2019, UPF/Comissão (T‑747/17, EU:T:2019:271), de que as atividades de construção e de exploração são dissociáveis, há que salientar que o referido número dizia respeito a uma problemática diferente que estava ligada ao caráter dissociável das atividades económicas das relacionadas com o exercício de prerrogativas de poder público. Em particular, nesse processo, para rejeitar um argumento relativo ao facto de a Comissão não ter determinado as atividades principais e acessórias dos portos, o Tribunal Geral tinha considerado, no n.o 83 do referido acórdão, que havia que distinguir as atividades económicas dos portos das atividades ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público precisando que não existe nenhum limiar abaixo do qual todas as atividades económicas são atividades não económicas, quando as atividades económicas são minoritárias. Em seguida, no n.o 84 do acórdão acima referido, o Tribunal Geral recordou que só na hipótese de se demonstrar que as atividades económicas dos portos são indissociáveis das atividades ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público é que todas as atividades podem ser consideradas de natureza não económica, precisando‑se que a circunstância de as atividades económicas financiarem as atividades ligadas ao exercício de prerrogativas de poder público não basta para estabelecer uma relação indissociável entre estas atividades.

204    Ora, como resulta do exame acima efetuado nos n.os 74 a 106, a Comissão podia, nas circunstâncias do presente processo, concluir validamente que as atividades da Femern, enquanto tais, não estavam abrangidas pelo exercício da autoridade pública e que não tinham sido confiadas a esta entidade prerrogativas de poder público específicas. Em todo o caso, como acima referido no n.o 89, o Reino da Dinamarca não apresentou nenhum elemento destinado a demonstrar que as funções de autoridade rodoviária e de gestor da infraestrutura ferroviária asseguradas pela Femern ou a preparação dos planos de segurança da ligação fixa, que alega estarem abrangidas pelo exercício de prerrogativas de poder público, são indissociáveis da construção e da exploração da ligação fixa. Por conseguinte, nas circunstâncias do presente processo, o n.o 84 do Acórdão de 30 de abril de 2019, UPF/Comissão (T‑747/17, EU:T:2019:271), não é pertinente para demonstrar que as atividades de construção e de exploração da ligação fixa são dissociáveis.

205    Quinto, no que respeita ao argumento de que, em substância, o Reino da Dinamarca pode introduzir, até à entrada em funcionamento da ligação fixa, alterações às modalidades da sua exploração que tenham por efeito que a referida atividade deixe de ser de natureza económica, tornando, por exemplo, gratuito o acesso à infraestrutura para todos os utilizadores, basta recordar que, como indicado no n.o 161, supra, é jurisprudência constante que a legalidade de uma decisão em matéria de auxílios estatais deve ser apreciada em função das informações de que a Comissão dispunha no momento em que a tomou. Por conseguinte, os cenários hipotéticos evocados pelo Reino da Dinamarca não podem ser pertinentes para apreciar a legalidade da decisão recorrida.

206    Sexto, quanto ao argumento relativo a que o conceito de «empresa» deve ser interpretado de forma restritiva pelo facto de a constatação de que as atividades da Femern são de natureza económica lhe ser prejudicial, uma vez que é devedora de juros relativos ao período de duração da ilegalidade na aceção do n.o 52 do Acórdão de 12 de fevereiro de 2008, CELF e ministre de la Culture et de la Communication (C‑199/06, EU:C:2008:79), este não pode ser acolhido. Com efeito, segundo jurisprudência constante, o conceito de «auxílio de Estado», tal como definido no Tratado FUE, tem caráter jurídico e deve ser interpretado com base em elementos objetivos (Acórdãos de 16 de maio de 2000, França/Ladbroke Racing e Comissão, C‑83/98 P, EU:C:2000:248, n.o 25, e de 24 de setembro de 2019, Fortischem/Comissão, T‑121/15, EU:T:2019:684, n.o 62). Por conseguinte, o conceito de «atividade económica» não pode ser objeto de uma interpretação restritiva pelo facto de uma empresa estar obrigada ao pagamento de juros relativos ao período de duração da ilegalidade devido ao incumprimento, por um Estado‑Membro, da obrigação, prevista no artigo 108.o, n.o 3, TFUE, de não pôr em execução uma medida suscetível de constituir um auxílio na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, enquanto a Comissão não tiver adotado uma decisão final sobre esta medida.

207    Além disso, deve igualmente ser afastado o argumento relativo ao facto de o conceito de «empresa» dever ser objeto de uma interpretação restritiva à semelhança do que está previsto na regulamentação dinamarquesa sobre as práticas comerciais. Com efeito, importa recordar que as qualificações nacionais não podem ser determinantes para apreciar a natureza económica de uma atividade à luz de uma disposição de direito da União (v., por analogia, Acórdãos de 12 de dezembro de 2000, Aéroports de Paris/Comissão, T‑128/98, EU:T:2000:290, n.o 128, e de 3 de abril de 2003, BaByliss/Comissão, T‑114/02, EU:T:2003:100, n.o 114).

208    Resulta das considerações precedentes que o segundo fundamento deve ser julgado improcedente na totalidade.

5.      Quanto à quarta parte do primeiro fundamento, relativa à constatação alegadamente errada de que os financiamentos concedidos à Femern falseiam a concorrência e afetam as trocas comerciais entre EstadosMembros na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE

209    O Reino da Dinamarca considera que a circunstância de a ligação fixa vir a perturbar os eixos de deslocação ao reduzir o tempo e as distâncias dos trajetos em todas as redes rodoviárias e ferroviárias dinamarquesas, escandinavas e da Alemanha setentrional não basta para afirmar que os financiamentos concedidos à Femern falseiam a concorrência e afetam as trocas comerciais entre os Estados‑Membros na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

210    Segundo o Reino da Dinamarca, a Comissão deveria ter efetuado uma apreciação concreta para saber se existe uma relação real de concorrência entre a infraestrutura pública de transporte e as ligações alternativas. Em especial, o Reino da Dinamarca acusa a Comissão de não ter tido em conta o facto de a Femern não estar em concorrência com os operadores de ferries.

211    Além disso, segundo o Reino da Dinamarca, para apreciar se os financiamentos concedidos à Femern falseiam a concorrência, não é pertinente ter em conta o facto de a ligação fixa captar uma parte do tráfego de outra ligação pública, ou seja, a ponte do Grand Belt que faz parte da mesma estrutura jurídica que a Femern.

212    A Comissão contesta estes argumentos.

213    Importa recordar que, segundo a jurisprudência, no que respeita aos requisitos de distorção da concorrência e de afetação das trocas comerciais, para efeitos da qualificação de uma medida nacional de auxílio de Estado, não é necessário demonstrar uma incidência real do auxílio em causa nas trocas comerciais entre os Estados‑Membros nem uma distorção efetiva da concorrência, mas apenas examinar se este auxílio é suscetível de afetar estas trocas e de falsear a concorrência (Acórdãos de 14 de janeiro de 2015, Eventech, C‑518/13, EU:C:2015:9, n.o 65, e de 30 de abril de 2019, UPF/Comissão, T‑747/17, EU:T:2019:271, n.o 91).

214    Quanto ao requisito relativo à distorção da concorrência na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, há que recordar que os auxílios que visam libertar uma empresa dos custos que devia normalmente suportar no âmbito da sua gestão corrente ou das suas atividades normais falseiam, em princípio, as condições de concorrência (Acórdãos de 30 de abril de 2009, Comissão/Itália e Wam, C‑494/06 P, EU:C:2009:272, n.o 54, e de 30 de abril de 2019, UPF/Comissão, T‑747/17, EU:T:2019:271, n.o 96).

215    No caso em apreço, há que salientar que, no considerando 234 da decisão recorrida, a Comissão concluiu que a Femern é uma empresa ativa no mercado de serviços de transporte para a travessia do Estreito de Fehmarn, pelo que a vantagem seletiva de que beneficia é suscetível de reforçar a sua posição em comparação com outras empresas ativas no mercado, em especial o operador de ferries e os operadores portuários.

216    Assim, os financiamentos concedidos à Femern em condições preferenciais têm por efeito reduzir os custos de financiamento da construção da ligação fixa e permitem a exploração sem contrapartida de uma infraestrutura objeto de auxílio. Daqui resulta que a referida entidade é assim eximida de custos que deveria normalmente suportar no âmbito da sua gestão corrente ou das suas atividades normais. Por conseguinte, a Comissão podia validamente considerar que os financiamentos em causa concedidos à Femern são suscetíveis de falsear a concorrência.

217    Quanto à afetação das trocas comerciais entre os Estados‑Membros, o prejuízo causado às referidas trocas comerciais não pode ser puramente hipotético ou presumido. Assim, há que determinar a razão pela qual a medida considerada é suscetível de afetar, pelos seus efeitos previsíveis, as trocas comerciais entre os Estados‑Membros (Acórdãos de 18 de maio de 2017, Fondul Proprietatea, C‑150/16, EU:C:2017:388, n.o 30, e de 15 de maio de 2019, Achema e o., C‑706/17, EU:C:2019:407, n.o 90). Em especial, quando um auxílio concedido por um Estado‑Membro reforça a posição de uma empresa relativamente às demais empresas concorrentes nas trocas comerciais entre os Estados‑Membros, deve entender‑se que tais trocas comerciais são influenciadas pelo auxílio (Acórdãos de 14 de janeiro de 2015, Eventech, C‑518/13, EU:C:2015:9, n.o 66, e de 30 de abril de 2019, UPF/Comissão, T‑747/17, EU:T:2019:271, n.o 92).

218    A este respeito, há que salientar que a Comissão concluiu que a vantagem seletiva concedida à Femern reforça a sua posição no mercado de serviços de transporte para a travessia do Estreito de Fehmarn entre Rødby e Puttgarden em relação às empresas que já operavam neste mercado nessa ligação entre a Dinamarca e a Alemanha, em especial em relação ao operador de ferries que oferece serviços de transporte neste mercado. Por conseguinte, a Comissão podia validamente considerar que os financiamentos concedidos à Femern afetam as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, tanto mais que a satisfação deste requisito não pode depender da natureza local ou regional dos serviços de transporte prestados (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de janeiro de 2015, Eventech, C‑518/13, EU:C:2015:9, n.o 69, e de 29 de julho de 2019, Azienda Napoletana Mobilità, C‑659/17, EU:C:2019:633, n.o 31).

219    Daqui resulta que, contrariamente ao que alega o Reino da Dinamarca, a Comissão podia, sem cometer um erro de apreciação, concluir que os financiamentos concedidos à Femern falseiam a concorrência e afetam as trocas comerciais entre Estados‑Membros na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

220    Quanto ao argumento de que, em substância, a Femern não está em concorrência com os operadores de ferries, este já foi rejeitado no âmbito do exame da terceira parte do primeiro fundamento (v. n.os 129 a 132, supra).

221    Por último, o Reino da Dinamarca sustenta que a Comissão cometeu um erro de apreciação ao considerar que a ligação fixa concorre com outras infraestruturas que permitem atravessar o mar Báltico ocidental pelo facto de serem geridas por empresas públicas. Uma vez que constitui um argumento autónomo, este argumento deve ser julgado inoperante. Com efeito, bastava à Comissão observar que, no mercado de serviços de transporte para a travessia do Estreito de Fehmarn, em causa no presente processo, os financiamentos concedidos à Femern em condições preferenciais eram suscetíveis de falsear a concorrência e de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, o que fez no considerando 234 da decisão recorrida, no qual declara que os referidos financiamentos ofereciam à Femern uma vantagem seletiva que reforçava a sua posição em comparação com as empresas presentes no mercado em causa, ou seja, o de serviços de transporte para a travessia do Estreito de Fehmarn.

222    Por conseguinte, há que julgar improcedente a quarta parte do primeiro fundamento na totalidade.

223    Atendendo a todas as considerações precedentes, há que negar provimento ao recurso.

III. Quanto às despesas

224    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo o Reino da Dinamarca sido vencido, há que condená‑lo nas despesas da Comissão, em conformidade com o requerido por esta.

225    Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. Consequentemente, o Reino da Bélgica, a República Federal da Alemanha e o Grão‑Ducado do Luxemburgo suportarão as suas próprias despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção Alargada)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      O Reino de Dinamarca suportará as suas próprias despesas, bem como as despesas efetuadas pela Comissão Europeia.

3)      O Reino da Bélgica, a República Federal da Alemanha e o GrãoDucado do Luxemburgo suportarão as suas próprias despesas.

Spielmann

Öberg

Mastroianni

Brkan

 

      Gâlea

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 28 de fevereiro de 2024.

Assinaturas


Índice


I. Antecedentes do litígio

A. Projeto de ligação fixa do Estreito de Fehmarn

B. Factos anteriores ao litígio

C. Procedimento administrativo

D. Decisão recorrida

E. Pedidos das partes

II. Questão de direito

A. Quanto à admissibilidade

B. Quanto ao mérito

1. Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa à falta de ligação das atividades da Femern ao exercício de prerrogativas de poder público

a) Quanto à primeira acusação, relativa a uma alegada interpretação demasiado restritiva do conceito de «atividade abrangida pela autoridade pública ou que está ligada ao exercício de prerrogativas de poder público»

b) Quanto à terceira acusação, relativa à não tomada em consideração de informações disponíveis que permitem relacionar certas atividades da Femern com o exercício de prerrogativas de poder público

1) Quanto à primeira subacusação, relativa ao facto de a Comissão ter considerado erradamente que, enquanto tais, as atividades de construção e de exploração da ligação fixa não fazem parte do exercício da autoridade pública

2) Quanto à segunda subacusação, relativa ao facto de a Comissão ter concluído erradamente que a Femern não recebeu nenhuma prerrogativa de poder público específica

c) Quanto à segunda acusação, relativa ao facto de a Comissão ter erradamente tomado em consideração a existência de serviços substituíveis à ligação fixa

2. Quanto à segunda parte do primeiro fundamento, relativa à constatação alegadamente errada de que a Femern oferece serviços de transporte num mercado em concorrência com outros operadores

3. Quanto à terceira parte do primeiro fundamento, relativa à constatação alegadamente errada de que a Femern é um operador que prossegue uma lógica comercial

4. Quanto ao segundo fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter erradamente concluído que as atividades de construção e de exploração da ligação fixa são indissociáveis

a) Quanto à fundamentação da decisão recorrida no que respeita ao caráter indissociável das atividades de construção e de exploração da ligação fixa

b) Quanto ao mérito da decisão recorrida no que respeita ao caráter indissociável das atividades de construção e de exploração da ligação fixa

5. Quanto à quarta parte do primeiro fundamento, relativa à constatação alegadamente errada de que os financiamentos concedidos à Femern falseiam a concorrência e afetam as trocas comerciais entre EstadosMembros na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE

III. Quanto às despesas


*      Língua do processo: dinamarquês.