Language of document : ECLI:EU:T:2001:280

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

6 de Dezembro de 2001 (1)

«Regime de associação dos países e territórios ultramarinos - Importações de açúcar - Recusa de certificado de importação - Recurso de anulação - Excepção de ilegalidade - Decisão 97/803/CE - Irreversibilidade dos resultados conseguidos - Princípio da proporcionalidade - Segurança jurídica - Regulamento (CE) n.° 2553/97»

No processo T-44/98,

Emesa Sugar (Free Zone) NV, com sede em Oranjestad (Aruba), representada por G. van der Wal, advogado, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por P. J. Kuijper e T. Van Rijn, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

recorrida,

apoiada por

Conselho da União Europeia, representado por J. Huber e G. Houttuin, na qualidade de agentes,

por

Reino de Espanha, representado por M. López-Monís Gallego e R. Silva de Lapuerta, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

por

República Francesa, representada por K. Rispal-Bellanger, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

e por

Reino Unido de Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, representado por R. Magrill, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

intervenientes,

que tem por objecto um pedido de anulação da decisão da Comissão, de 23 de Dezembro de 1997 (IV/51329), cujo destinatário é o Hoofdproductschap Akkerbouw, que indefere um pedido de emissão de certificados de importação para 3 010 toneladas de açúcar, apresentado ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 2553/97 da Comissão, de 17 de Dezembro de 1997, relativo às regras de emissão dos certificados de importação relativos a determinados produtos dos códigos NC 1701, 1702, 1703 e 1704 que acumulam a origem ACP/PTU (JO L 349, p. 26),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Terceira Secção),

composto por: J. Azizi, presidente, K. Lenaerts e M. Jaeger, juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 15 de Maio de 2001,

profere o presente

Acórdão

Enquadramento jurídico

1.
    Nos termos do artigo 3.°, alínea r), do Tratado CE [que passou, após alteração, a artigo 3.°, n.° 1, alínea s), CE], a acção da Comunidade implica a associação dos países e territórios ultramarinos (PTU), «tendo por objectivo incrementar as trocas comerciais e prosseguir em comum o esforço de desenvolvimento económico e social».

2.
    A Aruba faz parte dos PTU.

3.
    A associação destes últimos à Comunidade rege-se pela parte IV do Tratado CE.

4.
    Nos termos do artigo 131.°, segundo e terceiro parágrafos, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 182.°, segundo e terceiro parágrafos, CE):

«A finalidade da associação é promover o desenvolvimento económico e social dos países e territórios e estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a Comunidade no seu conjunto.

Em conformidade com os princípios enunciados no preâmbulo do presente Tratado, a associação deve servir, fundamentalmente, para favorecer os interesses dos habitantes desses países e territórios e para fomentar a sua prosperidade de modo a conduzi-los ao desenvolvimento económico, social e cultural a que aspiram.»

5.
    Para o efeito, o artigo 132.° do Tratado CE (actual artigo 183.° CE) enuncia um determinado número de objectivos, entre os quais figura a aplicação pelos Estados-Membros «às suas trocas comerciais com os países e territórios [do] mesmo regime que aplicam entre si por força do presente Tratado».

6.
    O artigo 133.°, n.° 1, do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 184.°, n.° 1, CE) prevê que as importações originárias dos PTU beneficiarão, ao entrarem nos Estados-Membros, da eliminação total dos direitos aduaneiros que progressivamente se verificou entre os Estados-Membros, em conformidade com as disposições do referido Tratado.

7.
    Nos termos do artigo 136.° do Tratado CE (que passou, após alteração, a artigo 187.° CE):

«Durante um período inicial de cinco anos a contar da data da entrada em vigor do presente Tratado, uma convenção de aplicação, anexa a este Tratado, fixará asmodalidades e o processo de associação entre os países e territórios e a Comunidade.

Antes do termo da vigência da convenção prevista no parágrafo anterior, o Conselho, deliberando por unanimidade, aprovará as disposições a prever para um novo período, com base nos resultados conseguidos e nos princípios enunciados no presente Tratado.»

8.
    Com base no artigo 136.°, segundo parágrafo, do Tratado, o Conselho adoptou, em 25 de Fevereiro de 1964, a Decisão 64/349/CEE, relativa à associação dos PTU à Comunidade Económica Europeia (JO 1964, 93, p. 1472). Esta decisão visava substituir, a partir de 1 de Junho de 1964, data da entrada em vigor do acordo interno relativo ao financiamento e à gestão dos auxílios da Comunidade, assinado em Iaundé em 20 de Julho de 1963, a convenção de aplicação relativa à associação dos PTU à Comunidade, anexada ao Tratado e celebrada por um período de cinco anos.

9.
    Na sequência de várias decisões com o mesmo objecto, o Conselho adoptou a Decisão 91/482/CEE, de 25 de Julho de 1991, relativa à associação dos PTU à Comunidade Económica Europeia (JO L 263, p. 1, a seguir «decisão PTU»), que, nos termos do seu artigo 240.°, n.° 1, é aplicável durante um período de dez anos a partir de 1 de Março de 1990. A mesma disposição, n.° 3, alíneas a) e b), prevê, todavia, que, antes do termo do primeiro período de cinco anos, o Conselho, deliberando por unanimidade sob proposta da Comissão, adoptará, se for caso disso, além das contribuições financeiras da Comunidade, para o segundo período de cinco anos, as eventuais alterações a introduzir à associação dos PTU à Comunidade. Foi assim que foi adoptada pelo Conselho a Decisão 97/803/CE, de 24 de Novembro de 1997, respeitante à revisão intercalar da decisão PTU (JO L 329, p. 50).

10.
    Na sua versão inicial, o artigo 101.°, n.° 1, da decisão PTU dispunha:

«Os produtos originários dos Estados PTU podem ser importados na Comunidade com isenção de direitos aduaneiros e de encargos de efeito equivalente.»

11.
    O artigo 102.° dessa mesma decisão previa:

«A Comunidade não aplicará à importação de produtos originários dos PTU nem restrições quantitativas nem medidas de efeito equivalente.»

12.
    O artigo 108.°, n.° 1, primeiro travessão, da decisão PTU remete para o seu anexo II (a seguir «anexo II») para a definição da noção de produtos originários e dos métodos de cooperação administrativa que a eles se referem. Nos termos do artigo 1.° desse anexo, um produto é considerado originário dos PTU, da Comunidade ou dos Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (a seguir«Estados ACP») quando tenha sido aí inteiramente obtido ou suficientemente transformado.

13.
    O artigo 3.°, n.° 3, do anexo II contém uma lista de complementos de fabrico ou transformações considerados insuficientes para conferir o carácter originário a um produto proveniente dos PTU.

14.
    Todavia, o artigo 6.°, n.° 2, do anexo II dispõe:

«Quando produtos inteiramente obtidos [...] nos Estados ACP sejam objecto de complementos de fabrico ou de transformações nos PTU, são considerados como tendo sido inteiramente obtidos nos PTU.»

15.
    Nos termos do artigo 6.°, n.° 4, do anexo II, a regra citada no número anterior, chamada «de cúmulo de origem ACP/PTU», é aplicável a «qualquer complemento de fabrico ou transformação efectuado nos PTU, incluindo as operações enumeradas no n.° 3 do artigo 3.°»

16.
    A Decisão 97/803 estabeleceu limites à aplicação da regra do cúmulo de origem ACP/PTU ao açúcar proveniente dos PTU.

17.
    No sétimo considerando da Decisão 97/803, o Conselho explica:

«Considerando que a instauração pela decisão [PTU] do livre acesso de todos os produtos originários dos PTU, e a manutenção da acumulação entre produtos originários dos Estados ACP e produtos originários dos PTU permitiu detectar o risco de conflito entre os objectivos de duas políticas comunitárias, isto é, o desenvolvimento dos PTU e a política agrícola comum; que, efectivamente, o surgimento de graves perturbações no mercado comunitário de certos produtos sujeitos a uma organização comum do mercado levaram, por várias vezes, à adopção de medidas de salvaguarda; que importa prevenir novas perturbações, através da adopção de medidas que definam um enquadramento favorável à regularização das trocas comerciais, simultaneamente compatíveis com a política agrícola comum.»

18.
    Para o efeito, a Decisão 97/803 aditou à decisão PTU, designadamente, o artigo 108.°-B, que admite a cúmulo de origem ACP/PTU para o açúcar para uma quantidade anual determinada. Este artigo 108.°-B, n.os 1 e 2, estabelece:

«1.    [...] é admitida a cumulação de origem ACP/PTU referida no artigo 6.° do anexo II para uma quantidade anual de 3 000 toneladas de açúcar.

2.    Para a aplicação das regras de cumulação ACP/PTU referida no n.° 1, consideram-se suficientes para conferir o carácter de produtos originários dos PTUa moldagem do açúcar em cubos ou a adição de corantes» [sem que também se refira a trituração do açúcar («milling»)].

19.
    Em 17 de Dezembro de 1997, a Comissão adoptou o Regulamento (CE) n.° 2553/97, relativo às regras de emissão dos certificados de importação relativos a determinados produtos dos códigos NC 1701, 1702, 1703 e 1704 que acumulam a origem ACP/PTU (JO L 349, p. 26). Este regulamento estabelece que a importação de açúcar ao abrigo do cúmulo de origem ACP/PTU previsto no artigo 108.°-B da decisão PTU está sujeita à apresentação de um certificado de importação.

20.
    O Regulamento n.° 2553/97, nos termos do disposto no seu artigo 8.°, primeiro parágrafo, entrou em vigor em 19 de Dezembro de 1997. Em conformidade com o seu artigo 8.°, segundo parágrafo, tornou-se aplicável a partir de 1 de Janeiro de 1998. Todavia, o artigo 8.°, terceiro parágrafo, estabeleceu um regime provisório, prevendo:

«[...] os certificados de importação [para os produtos referidos no artigo 108.°-B da decisão PTU] em relação aos quais os pedidos tenham sido apresentados entre 10 e 31 de Dezembro de 1997 serão emitidos pelas autoridades dos Estados-Membros após autorização prévia dos serviços da Comissão de acordo com a ordem da sua apresentação e até ao limite da quantidade máxima de 3 000 toneladas para toda a Comunidade».

Matéria de facto, tramitação processual e pedidos das partes

21.
    Em Abril de 1997, a recorrente começou a explorar uma fábrica de açúcar, situada na ilha de Aruba, e a exportar açúcar para a Comunidade. A fábrica possui, segundo a recorrente, uma capacidade mínima de tratamento de 34 000 toneladas de açúcar por ano. Como o açúcar não é produzido em Aruba, a recorrente compra açúcar branco a refinarias de açúcar de cana estabelecidas nos Estados ACP. O açúcar comprado é transportado para Aruba onde é objecto de operações de complemento de fabrico e de transformação antes de ser exportado para a Comunidade.

22.
    Por requerimento de 19 de Dezembro de 1997, a recorrente apresentou à autoridade neerlandesa competente, o Hoofdproductschap voor Akkerbouwproducten (a seguir «HPA»), um pedido de certificados de importação para 3 010 toneladas de açúcar proveniente de Aruba. Tratava-se de açúcar importado de um Estado ACP e transformado na instalações da requerente em Aruba. Em 22 de Dezembro de 1997, o HPA comunicou este pedido à Comissão.

23.
    Por ofício de 23 de Dezembro de 1997 (VI/51329) (a seguir «decisão impugnada»), a Comissão informou o HPA de que, nos termos do artigo 8.° do Regulamento n.° 2553/97, o pedido da recorrente era «inadmissível, pois referia-se a uma quantidade superior à quantidade máxima».

24.
    Por ofício de 24 de Dezembro de 1997, o HPA informou a recorrente da sua decisão de declarar o seu pedido inadmissível, ao abrigo do artigo 8.° do Regulamento n.° 2553/97.

25.
    Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 10 de Março de 1998, a recorrente interpôs o presente recurso, que visa a anulação da decisão impugnada.

26.
    Por requerimento separado registado na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 10 de Abril de 1998, a recorrente apresentou igualmente, ao abrigo do artigo 185.° do Tratado CE (actual artigo 242.° CE), um pedido de suspensão da execução da decisão impugnada, até que o Tribunal decida quanto ao mérito, e, nos termos do artigo 186.° do Tratado CE (actual artigo 243.° CE), um pedido de medidas provisórias em que pede que seja proibido à Comissão aplicar, durante o mesmo período, as disposições do Regulamento n.° 2553/97 e/ou do artigo 108.°-B da decisão PTU, após alterações, na medida em que essas disposições têm por efeito limitar a importação para a Comunidade de açúcar originário dos PTU.

27.
    Por despacho de 14 de Agosto de 1998, Emesa Sugar/Comissão (T-44/98 R, Colect., p. II-3079), o presidente do Tribunal de Primeira Instância indeferiu estes pedidos.

28.
    O Conselho e o Reino de Espanha, por despachos de 7 de Julho de 1998, a República Francesa, por despacho de 9 de Julho de 1998, e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, por despacho de 21 de Outubro de 1998, foram autorizadas a intervir em apoio do pedido da Comissão, em conformidade com o pedido que apresentaram nos termos do artigo 115.° do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância.

29.
    Com excepção da República Francesa, as intervenientes apresentaram alegações de intervenção a respeito das quais as partes principais foram convidadas a apresentar as suas observações.

30.
    Na sequência do recurso que a recorrente interpôs, o despacho Emesa Sugar/Comissão, referido no n.° 27 supra, foi anulado por despacho do presidente do Tribunal de Justiça de 17 de Dezembro de 1998, Emesa Sugar/Comissão [C-364/98 P(R), Colect., p. I-8815], e o processo foi devolvido ao Tribunal de Primeira Instância.

31.
    Por despacho de 30 de Abril de 1999, Emesa Sugar/Comissão (T-44/98 R II, Colect., p. II-1427), o presidente do Tribunal de Primeira Instância autorizou a recorrente a importar, durante um período de seis meses a contar da data do despacho, 7 500 toneladas de açúcar moído ao abrigo do regime do cúmulo de origem ACP/PTU, desde que, todavia, a recorrente constitua uma caução sob a forma de garantia bancária no montante de 28 dólares (USD) por tonelada deaçúcar importado. A medida foi prorrogada até 29 de Fevereiro de 2000 por despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Setembro de 1999, Emesa Sugar/Comissão (T-44/98 R II, Colect., p. II-2815). Por despacho do presidente do Tribunal de Primeira Instância de 6 de Abril de 2000, Emesa Sugar/Comissão (T-44/98 R II, Colect., p. II-1941), o presidente recusou-se a autorizar uma prorrogação suplementar e ordenou que a garantia que a recorrente constituíra fosse liberada em proveito da Comunidade.

32.
    A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    anular a decisão impugnada;

-    condenar a Comissão nas despesas.

33.
    A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    negar provimento ao recurso de anulação;

-    condenar a recorrente nas despesas.

34.
    O Conselho e o Reino de Espanha concluem pedindo que o Tribunal se digne:

-    negar provimento ao recurso de anulação;

-    condenar a recorrente nas despesas.

35.
    O Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte conclui pedindo que o Tribunal se digne:

-    negar provimento ao recurso.

36.
    Nos termos do artigo 177.° do Tratado CE (actual artigo 234.° CE), o presidente do Arrondissementsrechtbank te 's-Gravenhage (Países Baixos) solicitou ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a validade da Decisão 97/803 (processo C-17/98).

37.
    Por despacho de 11 de Fevereiro de 1999, o Tribunal de Primeira Instância suspendeu o processo T-44/98 até à prolação da decisão que ponha termo à instância no processo C-17/98.

38.
    No seu acórdão de 8 de Fevereiro de 2000, Emesa Sugar (C-17/98, Colect., p. I-675), o Tribunal de Justiça considerou que o exame das questões submetidas não tinha revelado elementos susceptíveis de afectar a validade da Decisão 97/803.

39.
    Por ofício de 29 de Fevereiro de 2000, as partes foram convidadas a apresentar observações sobre a prossecução do presente processo.

40.
    A recorrente sustentou, na sua carta de 31 de Março de 2000, que a apreciação que o Tribunal de Justiça fez no acórdão Emesa Sugar, referido no n.° 38 supra, sobre a validade da Decisão 97/803 se fundava em erros de facto. Além disso, esse acórdão fora proferido com violação do artigo 6.° da Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais pois, durante o processo que correu os seu trâmites no Tribunal de Justiça, a recorrente não pôde formular observações sobre as conclusões do advogado-geral. De qualquer modo, o processo no Tribunal de Justiça apenas se referia à Decisão 97/803 e não ao Regulamento n.° 2553/97. A recorrente solicitou ao Tribunal de Primeira Instância que prosseguisse com a fase escrita no presente processo e que convidasse as partes a apresentar observações sobre o mérito do acórdão Emesa Sugar, já referido.

41.
    A Comissão e o Conselho alegaram, em cartas datadas respectivamente de 24 e 29 de Março de 2000, que a excepção de ilegalidade suscitada a propósito da Decisão 97/803 ficara sem objecto, atento o facto de o Tribunal de Justiça ter confirmado, no seu acórdão Emesa Sugar, referido no n.° 38 supra, a validade dessa decisão. O processo devia, portanto, prosseguir para que o Tribunal de Primeira Instância se pronuncie sobre a validade do Regulamento n.° 2553/97.

42.
    Por ofício de 24 de Maio de 2000, a recorrente foi convidada a apresentar alegações complementares sobre o mérito do acórdão Emesa Sugar, referido no n.° 38 supra. Em 9 de Outubro de 2000, a recorrente apresentou essas alegações, tendo a Comissão e o Conselho apresentado observações sobre estas em alegações datadas de 21 de Fevereiro de 2001.

43.
    Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal (Terceira Secção) decidiu dar início à fase oral. A título das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.° do Regulamento de Processo, foram apresentadas por escrito algumas questões às partes, que responderam dentro do prazo estabelecido.

44.
    As partes foram ouvidas nas suas alegações e nas suas respostas às questões do Tribunal na audiência de 15 de Maio de 2001.

Questão de direito

45.
    A recorrente sustenta que a decisão impugnada é destituída de fundamento jurídico, na medida em que assenta em dois actos ilegais da Comunidade, ou seja, a Decisão 97/803 e o Regulamento n.° 2553/97, a respeito dos quais suscita questões prévias de ilegalidade.

Quanto à alegada ilegalidade da Decisão 97/803

46.
    A recorrente invoca cinco fundamentos em apoio da sua excepção de ilegalidade. O primeiro decorre de uma violação do «mecanismo de bloqueio» segundo o qualas vantagens já atribuídas aos PTU no quadro da realização faseada da sua associação à Comunidade já não podiam ser postas em causa por esta. O segundo decorre de uma violação do princípio da proporcionalidade, o terceiro de uma violação do artigo 240.° da decisão PTU e o quarto de uma violação do princípio da segurança jurídica. O quinto fundamento, por último, baseia-se numa violação do artigo 190.° do Tratado CE (actual artigo 253.° CE).

47.
    Deve observar-se que, no quadro dos primeiro, segundo e quarto fundamentos, a recorrente retoma os argumentos que já invocara no processo T-43/98, Emesa Sugar/Conselho. Estes fundamentos não podem ser acolhidos pelas razões expostas no acórdão do Tribunal de Primeira Instância, deste mesmo dia, no já referido processo.

48.
    Todavia, há que examinar os fundamentos decorrentes da violação do artigo 240.° da decisão PTU e da violação do artigo 190.° do Tratado.

Quanto ao fundamento decorrente da violação do artigo 240.° da decisão PTU

49.
    A recorrente recorda que a Decisão 97/803 foi adoptada em 24 de Novembro de 1997. O Conselho não podia utilizar o poder que o artigo 240.°, n.° 3, da decisão PTU lhe confere para proceder à revisão da referida decisão em Novembro de 1997. Com efeito, esse artigo não permitia ao Conselho rever essa decisão após 1 de Março de 1995. A recorrente sustenta que o período de validade de dez anos da decisão PTU, em vez dos cinco anos de validade das decisões PTU precedentes, se explica, por um lado, pelo enorme progresso que a decisão PTU realizou na prossecução dos objectivos enunciados nos artigos 131.° e 132.° do Tratado e, por outro, pela preocupação de garantir aos investidores que as regras de direito que lhes são aplicáveis o serão durante um período de tempo suficiente para poderem desenvolver determinadas actividades comerciais ou industriais. Antes do termo do prazo de validade da decisão PTU, esta só podia, portanto, ser revista nos momentos expressamente previstos nas suas disposições.

50.
    O Tribunal observa que esta argumentação já fora rejeitada pelo Tribunal de Justiça no seu acórdão Emesa Sugar, já referido no n.° 38.° supra. Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou que, «[e]mbora o artigo 240.°, n.° 3, da decisão PTU preveja que, antes do termo do primeiro período de cinco anos, o Conselho adoptará, se for caso disso, as eventuais alterações a aplicar à associação dos PTU à Comunidade, não pode [...] privar o Conselho da competência, que retira directamente do Tratado, de alterar os actos que adoptou nos termos do artigo 136.° a fim de alcançar o conjunto dos objectivos enunciados no artigo 132.° do referido Tratado» (n.° 33 do acórdão).

51.
    Como a recorrente não formulou observações sobre este aspecto do acórdão Emesa Sugar, referido no n.° 38 supra, nas suas alegações suplementares de 9 de Outubro de 2000, há que, portanto, rejeitar o presente fundamento.

Quanto ao fundamento decorrente da violação do artigo 190.° do Tratado

52.
    A recorrente alega que o preâmbulo da Decisão 97/803 que altera o regime comercial das trocas entre os PTU e a Comunidade é incompreensível, insuficiente e manifestamente incorrecto. Assim, a Decisão 97/803 não respeitava as exigências do artigo 190.° do Tratado.

53.
    O Tribunal recorda que a fundamentação exigida pelo artigo 190.° do Tratado deve deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio seguido pela autoridade comunitária, autora do acto impugnado, de forma a permitir que os interessados conheçam as razões da medida adoptada, a fim de poderem defender os seus direitos, e que o Tribunal exerça o seu controlo (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 29 de Setembro de 2000, International Potash Company/Conselho, T-87/98, Colect., p. II-3179, n.° 65).

54.
    Ora, a fundamentação da Decisão 97/803 cumpre estas exigências. Com efeito, as razões que justificaram a limitação do cúmulo de origem ACP/PTU no que respeita ao açúcar foram expostas de forma clara no sétimo considerando da Decisão 97/803.

55.
    Segue-se que o fundamento decorrente da violação do artigo 190.° do Tratado também não pode ser acolhido.

56.
    De tudo o que precede resulta que a excepção de ilegalidade suscitada a propósito da Decisão 97/803 não pode ser acolhida.

Quanto à alegada ilegalidade do Regulamento n.° 2553/97

57.
    Na sua petição, a recorrente invocou cinco fundamentos em apoio da sua excepção de ilegalidade. No seu primeiro fundamento, alegou que o Regulamento n.° 2553/97 era ilegal porque executava a Decisão 97/803, que também era ilegal. No seu segundo fundamento, sustentou que, nas relações entre a Comunidade e os PTU, a exigência de certificados de importação era ilegal. O terceiro fundamento decorre do carácter desproporcionado das condições impostas pelo Regulamento n.° 2553/97. O quarto fundamento assenta na ilegalidade do artigo 8.°, terceiro parágrafo, do Regulamento n.° 2553/97. Por último, no seu quinto fundamento, a recorrente sustentou que as restrições à importação impostas pelo Regulamento n.° 2553/97 contrariavam disposições dos acordos celebrados no quadro da Organização Mundial do Comércio.

58.
    Na audiência, a recorrente renunciou aos fundamentos acabados de referir, com excepção do primeiro.

59.
    Na medida em que, relativamente ao primeiro fundamento, a recorrente apenas se refere à argumentação examinada nos n.os 46 a 56 supra, a excepção deilegalidade suscitada a propósito do Regulamento n.° 2553/97 também não pode ser acolhida.

60.
    Como as duas excepções de ilegalidade foram julgadas improcedentes, o presente recurso não pode ser acolhido.

Quanto às despesas

61.
    Nos termos do artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená-la nas despesas, incluindo nas que respeitam aos processos de medidas provisórias, em conformidade com o pedido da Comissão.

62.
    Nos termos do n.° 4 do artigo 87.° do Regulamento de Processo, o Conselho, a República Francesa, o Reino de Espanha e o Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte, que intervieram em apoio da posição da Comissão, suportarão as suas despesas.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Terceira Secção)

decide:

1)    O recurso é julgado improcedente.

2)    A recorrente suportará, para além das suas próprias despesas, as despesas suportadas pela Comissão, incluindo as relativas aos processos de medidas provisórias.

3)    Os intervenientes suportarão as suas próprias despesas.

Azizi
Lenaerts
Jaeger

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 6 de Dezembro de 2001.

O secretário

O presidente

H. Jung

M. Jaeger


1: Língua do processo: neerlandês.