Language of document : ECLI:EU:T:2024:187

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Nona Secção Alargada)

20 de março de 2024 (*)

«Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas tomadas tendo em conta a situação na Bielorrússia e o envolvimento da Bielorrússia na agressão russa contra a Ucrânia — Congelamento de fundos — Listas das pessoas, entidades e organismos aos quais se aplica o congelamento de fundos e recursos económicos — Inscrição e manutenção do nome da recorrente nas listas — Apoio ao regime de Lukashenko — Apoio financeiro — Empresa pertencente ao Estado — Repressão da sociedade civil — Erro de apreciação»

No processo T‑115/22,

Belshyna AAT, com sede em Bobruisk (Bielorrússia), representada por N. Tuominen e L. Engelen, advogados,

recorrente,

contra

Conselho da União Europeia, representado por A. Boggio‑Tomasaz e A. Antoniadis, na qualidade de agentes,

recorrido,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção Alargada),

composto por: S. Papasavvas, presidente, L. Truchot, H. Kanninen (relator), R. Frendo e T. Perišin, juízes,

secretário: I. Kurme, administradora,

vistos os autos,

após a audiência de 21 de junho de 2023,

profere o presente

Acórdão (1)

1        Por meio do seu recurso interposto ao abrigo do artigo 263.o TFUE, a recorrente, Belshyna AAT, pede a anulação, primeiro, da Decisão de Execução (PESC) 2021/2125 do Conselho, de 2 de dezembro de 2021, que dá execução à Decisão 2012/642/PESC que impõe medidas restritivas tendo em conta a situação na Bielorrússia (JO 2021, L 430 I, p. 16), e do Regulamento de Execução (UE) 2021/2124 do Conselho, de 2 de dezembro de 2021, que dá execução ao artigo 8.o‑A, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 765/2006 que impõe medidas restritivas contra a Bielorrússia (JO 2021, L 430 I, p. 1) (a seguir «atos iniciais»), e, segundo, da Decisão (PESC) 2023/421 do Conselho, de 24 de fevereiro de 2023, que altera a Decisão 2012/642/PESC que impõe medidas restritivas tendo em conta a situação na Bielorrússia e o envolvimento da Bielorrússia na agressão russa contra a Ucrânia (JO 2023, L 61, p. 41), e do Regulamento de Execução (UE) 2023/419 do Conselho, de 24 de fevereiro de 2023, que dá execução ao artigo 8.o‑A do Regulamento (CE) n.o 765/2006 que impõe medidas restritivas tendo em conta a situação na Bielorrússia e o envolvimento da Bielorrússia na agressão russa contra a Ucrânia (JO 2023, L 61, p. 20) (a seguir «atos de manutenção»), na parte em que estes atos lhe dizem respeito.

 Antecedentes do litígio e factos posteriores à interposição do recurso

2        A recorrente é uma empresa que produz pneus, com sede em Bobruisk (Bielorrússia).

3        O presente processo inscreve‑se no âmbito das medidas restritivas adotadas pela União Europeia, desde 2004, tendo em conta a situação na Bielorrússia no que concerne à democracia, ao Estado de direito e aos direitos humanos.

4        O Conselho da União Europeia adotou, em 18 de maio de 2006, com fundamento nos artigos [75.o e 215.o TFUE], o Regulamento (CE) n.o 765/2006 que impõe medidas restritivas contra o presidente Lukashenko e alguns funcionários da Bielorrússia (JO 2006, L 134, p. 1), cujo título passou, nos termos do artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento (UE) n.o 588/2011 do Conselho, de 20 de junho de 2011 (JO 2011, L 161, p. 1), a ter a redação «Regulamento (CE) n.o 765/2006 do Conselho, de 18 de maio de 2006, que impõe medidas restritivas contra a Bielorrússia».

5        Em 15 de outubro de 2012, o Conselho adotou, com fundamento no artigo 29.o TUE, a Decisão 2012/642/PESC que impõe medidas restritivas contra a Bielorrússia (JO 2012, L 285, p. 1).

6        Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alíneas a) e b), da Decisão 2012/642 e do artigo 2.o, n.os 4 e 5, do Regulamento n.o 765/2006, conforme alterado pelo Regulamento (UE) n.o 1014/2012 do Conselho, de 6 de novembro de 2012 (JO 2012, L 307, p. 1), remetendo a última disposição para a primeira, são congelados todos os fundos e recursos económicos que estejam na posse ou se encontrem à disposição ou sob controlo de, nomeadamente, pessoas, entidades ou organismos responsáveis por graves violações dos direitos humanos ou pela repressão da sociedade civil e da oposição democrática, ou cujas atividades de outro modo comprometam seriamente a democracia e o Estado de direito na Bielorrússia, bem como de pessoas singulares ou coletivas, entidades ou organismos que apoiam, nomeadamente, o regime de Lukashenko.

7        Em 2 de dezembro de 2021, o Conselho adotou os atos iniciais. Resulta dos considerandos 4 destes que, tendo em conta a gravidade da situação na Bielorrússia, deverão ser acrescentadas 17 pessoas e 11 entidades à lista de pessoas singulares e coletivas, entidades e organismos sujeitos a medidas restritivas.

8        Através dos atos iniciais, o nome da recorrente foi inserido na linha 26 do quadro B da lista das pessoas singulares e coletivas, entidades e organismos referidos no artigo 3.o, n.o 1, e no artigo 4.o, n.o 1, da Decisão 2012/642 que consta do anexo da referida decisão e na linha 26 do quadro B da lista das pessoas singulares e coletivas, entidades e organismos referidos no artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 765/2006 que consta do anexo I do referido regulamento (a seguir, em conjunto, «listas controvertidas»).

9        Nos atos iniciais, no que respeita à recorrente, o Conselho inscreveu os elementos de identificação «[n]omes: [s]ociedade por ações aberta Belshina», «[e]ndereço: 4, Minskoe Shosse St., Bobruisk, 213824 Belarus», «[d]ata de registo: 10.1.1994», «[n]úmero de registo: 700016217» e «[s]ítio Web: http://www.belshinajsc.by/», e justificou a adoção das medidas restritivas a seu respeito mencionando os seguintes fundamentos:

«A [recorrente] é uma das principais empresas públicas da Bielorrússia e grande fabricante de pneus para veículos. Como tal, [a recorrente] é uma importante fonte de receitas do regime de Lukashenk[o]. O Estado bielorrusso beneficia diretamente dos rendimentos obtidos pela [recorrente]. Por conseguinte, a [recorrente] é apoiante do regime de Lukashenk[o].

Foram dispensados funcionários da [recorrente] que protestaram e entraram em greve após as eleições presidenciais de 2020 na Bielorrússia. Por conseguinte, a [recorrente] é responsável por atos de repressão da sociedade civil.»

10      Por carta de 3 de dezembro de 2021, o Conselho informou a recorrente de que o seu nome estava inscrito nas listas controvertidas.

11      Por carta de 30 de dezembro de 2021, a recorrente pediu ao Conselho acesso às informações e às provas que sustentavam a inscrição do seu nome nas listas controvertidas, bem como a reapreciação dessa inscrição.

12      Por carta de 14 de janeiro de 2022, o Conselho comunicou à recorrente os documentos que continham as provas utilizadas para decidir da inscrição do nome desta nas listas controvertidas e declarou que a informaria posteriormente do seguimento dado ao pedido de reapreciação.

13      Em 24 de fevereiro de 2022, o Conselho adotou a Decisão (PESC) 2022/307, que altera a Decisão 2012/642 (JO 2022, L 46, p. 97), e o Regulamento de Execução (UE) 2022/300, que dá execução ao artigo 8.o‑A do Regulamento n.o 765/2006 (JO 2022, L 46, p. 3) (a seguir «atos de 24 de fevereiro de 2022»), através dos quais manteve o nome da recorrente nas listas controvertidas por motivos em substância idênticos aos adotados nos atos iniciais.

14      Por carta de 21 de dezembro de 2022, o Conselho notificou a recorrente da sua intenção de prorrogar as medidas restritivas a seu respeito, baseando‑se num documento junto à referida carta.

15      Por carta de 20 de janeiro de 2023, a recorrente respondeu que o documento comunicado pelo Conselho não justificava a manutenção da inscrição do seu nome nas listas controvertidas.

16      Em 24 de fevereiro de 2023, o Conselho adotou os atos de manutenção pelos quais manteve o nome da recorrente nas listas controvertidas por motivos idênticos aos adotados nos atos de 24 de fevereiro de 2022.

17      Por carta de 27 de fevereiro de 2023, o Conselho indicou que as observações constantes da carta de 20 de janeiro de 2023 não punham em causa a sua apreciação segundo a qual se devia manter a inscrição do nome da recorrente nas listas controvertidas.

 Pedidos das partes

18      Na sequência da adaptação da petição com fundamento no artigo 86.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular os atos iniciais, na parte em que lhe dizem respeito;

–        condenar o Conselho nas despesas;

–        julgar improcedente o pedido subsidiário do Conselho de que os efeitos da Decisão de Execução 2021/2125 sejam mantidos no que lhe dizem respeito até que a anulação parcial do Regulamento de Execução 2021/2124 produza efeitos.

19      O Conselho conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas;

–        a título subsidiário, na hipótese de o Tribunal Geral anular as medidas restritivas adotadas contra a recorrente, ordenar que os efeitos da Decisão 2021/2125 sejam mantidos no que a esta dizem respeito até que a anulação parcial do Regulamento de Execução 2021/2124 produza efeitos.

 Questão de direito

[omissis]

 Quanto ao pedido de anulação parcial dos atos de manutenção

84      Por meio de articulado de adaptação, a recorrente pede a anulação dos atos de manutenção no que lhe dizem respeito.

85      Nas suas observações sobre o articulado de adaptação, o Conselho sustenta que o pedido de anulação parcial dos atos de manutenção é admissível e que deve ser julgado improcedente.

 Quanto à admissibilidade da adaptação da petição

86      Considerando que a apreciação da admissibilidade dos recursos era uma questão de ordem pública e que cumpria, portanto, em caso de adaptação da petição, verificar se estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 86.o, n.o 1, do Regulamento de Processo (v., neste sentido, Acórdão de 14 de dezembro de 2018, Hamas/Conselho, T‑400/10 RENV, EU:T:2018:966, n.os 139 a 145 e jurisprudência referida), o Tribunal Geral interrogou as partes a este respeito durante a audiência.

87      Em resposta às questões do Tribunal Geral, tanto a recorrente como o Conselho sustentaram que o facto de a recorrente não ter, no âmbito do presente processo, adaptado os seus pedidos para pedir a anulação dos atos de 24 de fevereiro de 2022, na parte em que estes atos lhe diziam respeito, não devia ter incidência na admissibilidade da adaptação da petição para pedir igualmente a anulação parcial dos atos de manutenção.

88      Em apoio da sua tese, as partes alegam que os ensinamentos resultantes dos n.os 141 e 142 do Acórdão de 14 de dezembro de 2018, Hamas/Conselho (T‑400/10 RENV, EU:T:2018:966), e dos n.os 90 e 96 do Acórdão de 24 de novembro de 2021, LTTE/Conselho (T‑160/19, não publicado, EU:T:2021:817), não podem ser transpostos para o presente caso. Afirmam que os processos que deram origem a esses acórdãos diziam respeito às medidas restritivas tomadas pela União ao abrigo da Posição Comum 2001/931/PESC do Conselho, de 27 de dezembro de 2001, relativa à aplicação de medidas específicas de combate ao terrorismo (JO 2001, L 344, p. 93), no âmbito da qual os atos jurídicos que estabelecem a lista das pessoas e entidades a que as medidas restritivas dizem respeito são revogados e substituídos por novos atos aquando da reapreciação periódica efetuada pelo Conselho, ao passo que, no âmbito das medidas restritivas respeitantes à Bielorrússia, a reapreciação periódica das listas controvertidas assume a forma de atos jurídicos que alteram o período de aplicação ou os anexos da Decisão 2012/642 e do Regulamento n.o 765/2006. O Conselho também sustentou que julgar admissível o pedido de anulação dos atos de manutenção era conforme com o objetivo de economia processual.

89      Cumpre recordar que o artigo 86.o, n.o 1, do Regulamento de Processo dispõe que, quando um ato cuja anulação é pedida é substituído ou alterado por outro com o mesmo objeto, o recorrente pode, antes do encerramento da fase oral do processo ou antes da decisão do Tribunal Geral de decidir sem fase oral, adaptar a petição para ter em conta este elemento novo.

90      No presente processo, cumpre observar, primeiro, que tanto os atos iniciais como os atos de manutenção, na parte em que dizem respeito à recorrente, têm por objeto impor‑lhe medidas restritivas individuais que consistem no congelamento de todos os seus fundos e recursos económicos, em aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alíneas a) e b), da Decisão 2012/642 e do artigo 2.o, n.os 4 e 5, do Regulamento n.o 765/2006.

91      Segundo, como salientaram acertadamente as partes, no âmbito do regime que institui medidas restritivas contra a Bielorrússia, as medidas restritivas individuais assumem a forma de uma inscrição do nome das pessoas, entidades ou organismos visados nas listas controvertidas que constam dos anexos da Decisão 2012/642 e do Regulamento n.o 765/2006.

92      Neste contexto, os atos iniciais alteraram os anexos da Decisão 2012/642 e do Regulamento n.o 765/2006 para inscrever, designadamente, o nome da recorrente nas listas controvertidas. Quanto aos atos de manutenção, impõe‑se constatar, por um lado, que a Decisão 2023/421 prorrogou até 28 de fevereiro de 2024 a aplicabilidade da Decisão 2012/642, cujo anexo I, conforme alterado pela Decisão de Execução 2021/2125, menciona o nome da recorrente e, por outro, que o Regulamento de Execução 2023/419 alterou o anexo I do Regulamento n.o 765/2006, mantendo, pelo menos implicitamente, a inscrição do nome da recorrente no referido anexo. Por conseguinte, deve considerar‑se que os atos de manutenção alteraram os atos iniciais na aceção do artigo 86.o, n.o 1, do Regulamento de Processo.

93      Daqui resulta que, em conformidade com o objetivo de economia processual subjacente ao artigo 86.o do Regulamento de Processo (v., neste sentido, Acórdão de 13 de setembro de 2018, Almaz‑Antey/Conselho, T‑515/15, não publicado, EU:T:2018:545, n.os 43 e 44), tendo a recorrente pedido a anulação dos atos iniciais na petição, tinha o direito, no âmbito do presente processo, de adaptar a petição para pedir, igualmente, a anulação dos atos de manutenção, mesmo não tendo previamente adaptado a petição para pedir a anulação dos atos de 24 de fevereiro de 2022.

94      Por conseguinte, há que julgar admissível o pedido de adaptação da petição.

[omissis]

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção Alargada)

decide:

1)      A Decisão de Execução (PESC) 2021/2125 do Conselho, de 2 de dezembro de 2021, que dá execução à Decisão 2012/642/PESC que impõe medidas restritivas tendo em conta a situação na Bielorrússia, o Regulamento de Execução (UE) 2021/2124 do Conselho, de 2 de dezembro de 2021, que dá execução ao artigo 8.oA, n.o 1, do Regulamento (CE) n.o 765/2006 que impõe medidas restritivas contra a Bielorrússia, a Decisão (PESC) 2023/421 do Conselho, de 24 de fevereiro de 2023, que altera a Decisão 2012/642/PESC que impõe medidas restritivas tendo em conta a situação na Bielorrússia e o envolvimento da Bielorrússia na agressão russa contra a Ucrânia, e o Regulamento de Execução (UE) 2023/419 do Conselho, de 24 de fevereiro de 2023, que dá execução ao artigo 8.oA do Regulamento (CE) n.o 765/2006 que impõe medidas restritivas tendo em conta a situação na Bielorrússia e o envolvimento da Bielorrússia na agressão russa contra a Ucrânia, são anulados na parte em que dizem respeito à Belshyna AAT.

2)      O Conselho da União Europeia é condenado nas despesas.

Papasavvas

Truchot

Kanninen

Frendo

 

      Perišin

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 20 de março de 2024.

Assinaturas


*      Língua do processo: inglês.


1      Apenas são reproduzidos os números do presente acórdão cuja publicação o Tribunal Geral considera útil.