Language of document : ECLI:EU:T:2007:120

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção alargada)

3 de Maio de 2007 (*)

«Auxílios de Estado – Auxílios concedidos pelas autoridades do Land da Saxónia – Regime de auxílios a pequenas e médias empresas – Procedimento acelerado de autorização – Aplicação no tempo do enquadramento comunitário e do regulamento de isenção relativo aos auxílios a pequenas e médias empresas – Projecto de auxílios notificado antes da entrada em vigor do regulamento de isenção – Confiança legítima – Segurança jurídica – Notificação completa»

No processo T‑357/02,

Freistaat Sachsen, representado por T. Lübbig, advogado,

recorrente,

contra

Comissão das Comunidades Europeias, representada por V. Kreuschitz e J. Flett, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objecto a anulação do artigo 2.°, segundo parágrafo, e dos artigos 3.° e 4.° da Decisão 2003/226/CE da Comissão, de 24 de Setembro de 2002, relativa a um regime de auxílios que a Alemanha tenciona introduzir denominado – «Orientações relativas ao apoio às pequenas e médias empresas – Melhoramento do desempenho empresarial no Land da Saxónia» – Subprogramas 1 (Coaching), 4 (Participação em feiras), 5 (Cooperação) e 7 (Promoção do design de produtos) (JO 2003, L 91, p. 13),

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA DAS COMUNIDADES EUROPEIAS (Quinta Secção alargada),

composto por: M. Vilaras, presidente, E. Martins Ribeiro, F. Dehousse, D. Šváby e K. Jürimäe, juízes,

secretário: C. Kristensen, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 21 de Março de 2006,

profere o presente

Acórdão

 Quadro jurídico

1        O artigo 87.°, n.° 1, CE dispõe:

«Salvo disposição em contrário do presente Tratado, são incompatíveis com o mercado comum, na medida em que afectem as trocas comerciais entre os Estados‑Membros, os auxílios concedidos pelos Estados ou provenientes de recursos estatais, independentemente da forma que assumam, que falseiem ou ameacem falsear a concorrência, favorecendo certas empresas ou certas produções.»

2        Nos termos do artigo 87.°, n.° 3, CE:

«Podem ser considerados compatíveis com o mercado comum:

a)      Os auxílios destinados a promover o desenvolvimento económico de regiões em que o nível de vida seja anormalmente baixo ou em que exista grave situação de subemprego,

[…]

b)      Os auxílios destinados a facilitar o desenvolvimento de certas actividades ou regiões económicas, quando não alterem as condições das trocas comerciais de maneira que contrariem o interesse comum,

[…]»

3        A Comunicação da Comissão de 2 de Julho de 1992 sobre o procedimento acelerado relativo a regimes de auxílios às PME [pequenas e médias empresas] e a alterações de regimes de auxílios existentes (JO C 213, p. 10, a seguir «comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização»), dispõe:

«[…]

Em princípio, a Comissão não levantará objecções aos novos regimes de auxílios ou a alteração em regimes de auxílios existentes, notificados nos termos do n.° 3 do artigo [88.° CE], desde que preencham as seguintes condições:

1)      Novos regimes de auxílios, com exclusão dos sectores industriais abrangidos por disposições específicas de política comunitária e dos auxílios nos sectores da agricultura, das pescas, dos transportes e do carvão.

Os regimes devem circunscrever‑se a pequenas e médias empresas […]

Estes regimes de auxílios devem igualmente preencher uma das seguintes condições:

[…]

São excluídos deste processo quaisquer auxílios às exportações no comércio intracomunitário ou auxílios ao funcionamento;

2)      Alterações em regimes de auxílios existentes, que a Comissão tenha aprovado previamente, excepto nos projectos específicos em que a Comissão limitou rigorosamente a sua autorização ao período, orçamento e condições notificadas.

As alterações podem referir‑se a qualquer um dos seguintes aspectos:

–        prorrogação sem aumento de recursos orçamentais,

–        aumento do orçamento existente até 20% do montante inicial, mas sem prorrogação,

–        prorrogação com aumento do orçamento até 20% do montante inicial,

–        alterações que tornam mais estritos os critérios de aplicação.

[…]

A Comissão tomará uma decisão quanto às notificações no prazo 20 dias úteis.»

4        As orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional (JO 1998, C 74, p. 9, alteradas do modo referido no JO 2000, C 258, p. 5, a seguir «orientações relativas aos auxílios com finalidade regional») dispõem, no ponto 2, intitulado «Âmbito de aplicação», que a Comissão as aplica aos auxílios regionais concedidos em todos os sectores de actividade, à excepção da produção, transformação e comercialização dos produtos agrícolas constantes do anexo II do Tratado CE, das pescas e da indústria carbonífera.

5        Quanto aos auxílios ao funcionamento, as orientações relativas aos auxílios com finalidade regional dispõem, nomeadamente:

«4.15. Os auxílios regionais destinados a reduzir as despesas correntes da empresa (auxílios ao funcionamento) são, em princípio, proibidos.

Excepcionalmente, podem ser concedidos auxílios deste tipo nas regiões que beneficiam da derrogação prevista na alínea a) do n.° 3 do artigo 87.°, [CE] se se justificarem em função do seu contributo para o desenvolvimento regional, da sua natureza e se o seu nível for proporcional às deficiências que se destinam a atenuar. Compete ao Estado‑Membro demonstrar a existência de deficiências e avaliar a sua dimensão. Estes auxílios ao funcionamento devem ser limitados no tempo e degressivos.

[…]

4.17. Os auxílios ao funcionamento destinados a promover as exportações entre os Estados‑Membros ficam excluídos.»

6        O Regulamento (CE) n.° 659/1999 do Conselho de 22 de Março de 1999, que estabelece as regras de execução do artigo [88.°] do Tratado CE (JO L 83, p. 1, a seguir «regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado»), define os procedimentos aplicáveis ao exercício, pela Comissão, do poder que lhe é conferido pelo artigo 88.° CE para se pronunciar sobre a compatibilidade dos auxílios de Estado com o mercado comum.

7        O artigo 2, n.° 2, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, respeitante à notificação de novo auxílio, dispõe:

«Na notificação, o Estado‑Membro em causa deve fornecer todas as informações necessárias para que a Comissão possa tomar uma decisão nos termos dos artigos 4.° e 7.°, adiante designada ‘notificação completa’.»

8        O artigo 4.° do regulamento do procedimento aplicável aos auxílios de Estado dispõe que a Comissão procede à análise da notificação imediatamente após a sua recepção e, após análise preliminar, adopta uma decisão, quer no sentido de que a medida notificada não constitui um auxílio (artigo 4.°, n.° 2, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado), quer no sentido de que não há dúvidas quanto à compatibilidade da medida notificada com o mercado comum (artigo 4, n.° 3, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado), quer no sentido de dar início ao procedimento formal de investigação da medida notificada (artigo 4.°, n.° 4, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado). Essas decisões são «tomadas no prazo de dois meses. Esse prazo começa a correr no dia seguinte ao da recepção de uma notificação completa. A notificação considerar‑se‑á completa se, no prazo de dois meses a contar da sua recepção ou da recepção da qualquer informação adicional, a Comissão não solicitar mais nenhuma informação […]» (artigo 4.°, n.° 5, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado).

9        O artigo 4.°, n.° 6, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, dispõe:

«Quando a Comissão não tomar uma decisão nos termos dos n.os 2, 3 ou 4 [do artigo 4.° do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado] no prazo fixado no n.° 5 [do artigo 4.° do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado], considerar‑se‑á que o auxílio foi autorizado pela Comissão. O Estado‑Membro em causa pode então executar as medidas em questão após informação prévia à Comissão, excepto se esta tomar uma decisão nos termos do presente artigo no prazo de 15 dias úteis a contar da recepção da informação.»

10      O artigo 5.°, n.° 3, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado dispõe:

«Se as informações solicitadas não forem fornecidas no prazo fixado, considerar‑se‑á que a notificação foi retirada, salvo se esse prazo tiver sido alargado antes do seu termo por acordo entre a Comissão e o Estado‑Membro em causa ou se este informar a Comissão, antes do termo do prazo fixado e por uma declaração devidamente fundamentada, que considera a notificação completa pelo facto de as informações solicitadas não existirem ou já terem sido fornecidas. Neste caso, o prazo referido no n.° 5 do artigo 4.° começará a correr no dia seguinte à data de recepção da declaração […]»

11      O Regulamento (CE) n.° 994/98 do Conselho, de 7 de Maio de 1998, relativo à aplicação dos artigos [87.°] e [88.°] do Tratado que institui a Comunidade Europeia a determinadas categorias de auxílios estatais horizontais (JO L 142, p. 1, a seguir «regulamento de habilitação»), confere à Comissão, no artigo 1.°, n.° 1, alínea a), i), o poder de declarar, em conformidade com o artigo 87.° CE, que, em determinadas circunstâncias, os auxílios às pequenas e médias empresas são compatíveis com o mercado comum e não estão sujeitos à obrigação de notificação prevista no artigo 88.°, n.° 3, CE.

12      O Regulamento (CE) n.° 70/2001 da Comissão, de 12 de Janeiro de 2001, relativo à aplicação dos artigos 87.° e 88.° do Tratado CE aos auxílios estatais a favor das pequenas e médias empresas (JO L 10, p. 33, a seguir «regulamento de isenção PME»), define os requisitos que os auxílios individuais e os auxílios a pequenas e médias empresas devem preencher para serem compatíveis com o mercado comum, na acepção do artigo 87.°, n.° 3, CE, e isenta os que os preenchem da obrigação de notificação prevista no artigo 88.°, n.° 3, CE

13      O referido regulamento, no entanto, refere, no quarto considerando:

«O presente regulamento deve entender‑se sem prejuízo da possibilidade que assiste aos Estados‑Membros de notificarem os auxílios às pequenas e médias empresas. Tais notificações serão apreciadas pela Comissão, em especial à luz dos critérios fixados no presente regulamento. O enquadramento comunitário dos auxílios estatais às pequenas e médias empresas deve ser abolido a partir da data de entrada em vigor do presente regulamento, uma vez que as suas disposições são substituídas pelo presente regulamento.»

 Factos na origem do litígio

1.     Procedimento administrativo

14      No âmbito do programa do Ministério da Economia e do Trabalho do Freistaat Sachsen a favor das pequenas e médias empresas destinado ao melhoramento do desempenho empresarial (a seguir «programa»), adoptado pela primeira vez em 1992, o Freistaat Sachsen concedeu, mediante requerimento, aos profissionais liberais, bem como às pequenas e médias empresas de carácter industrial ou comercial que tivessem sede ou um estabelecimento no seu território, subvenções não reembolsáveis dos projectos que favorecessem o desenvolvimento da economia. O programa foi notificado pela primeira vez à Comissão, nos termos do artigo 93.°, n.° 3, do Tratado CE (que passou a artigo 88.°, n.° 3, CE), por ofício da representação permanente da República Federal da Alemanha de 3 de Julho de 1992. Foi autorizado por ofício da Comissão de 30 de Setembro de 1992.

15      A duração da validade do programa foi prolongada diversas vezes, tendo cada prorrogação originado a modificação e a actualização do programa. As modificações introduzidas foram notificadas no termo de cada período de validade, em conformidade com a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização. Assim, as notificações sucessivas de 26 de Fevereiro de 1996 e de 6 de Outubro de 1998 foram aprovadas pela Comissão, respectivamente, por ofícios de 3 de Abril de 1996 e de 12 de Novembro de 1998. A medida de auxílio notificada em 6 de Outubro de 1998 e aprovada em 12 de Novembro de 1998 expirou em 31 de Dezembro de 2000 (Jornal oficial do Freistaat Sachsen de 8 de Abril de 1999, n.° 14, p. 289).

16      Por ofício de 29 de Dezembro de 2000, recebido pela Comissão em 3 de Janeiro de 2001, a República Federal da Alemanha notificou, nos termos do artigo 88.°, n.° 3, CE, seis subprogramas que se inscreviam no quadro de uma nova versão do programa. A notificação destinava‑se a obter uma nova prorrogação da duração da validade do programa por um período de 5 anos, de 1 de Janeiro de 2001 a 31 de Dezembro de 2005. Foi efectuada através do formulário previsto pela Comissão para o procedimento acelerado, à semelhança das notificações anteriores.

17      Em 12 de Janeiro de 2001, a Comissão adoptou o regulamento de isenção PME, que tinha sido discutido, na fase do projecto, no Comité Consultivo em matéria de auxílios concedidos pelos Estados, composto por representantes dos Estados‑Membros e instituído nos termos do artigo 7.° do regulamento de habilitação. Em conformidade com o artigo 10.°, o regulamento de isenção PME entrou em vigor no vigésimo dia seguinte à sua publicação no Jornal Oficial, concretamente, em 2 de Fevereiro de 2001, ou seja, dois dias depois do termo do prazo de 20 dias úteis previsto pela comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização.

18      Por ofício de 5 de Fevereiro de 2001, a Comissão referiu que não podia autorizar o regime de auxílios no âmbito do processo acelerado de autorização. A Comissão pediu à República Federal da Alemanha que lhe indicasse «se as actividades assistidas ‘soft aid’ [eram] compatíveis com o [regulamento de isenção PME], isto é, se o montante do auxílio previsto na notificação em causa [podia] ser reduzido ao montante previsto pelo regulamento de isenção […]», e esclareceu que, «[n]o caso de tal não [ser] possível, [era] necessária uma fundamentação específica (necessidade e compatibilidade em termos de política económica)».

19      Por ofício de 12 de Março de 2001, a República Federal da Alemanha formulou observações em que expôs o que, segundo ela, justificava a autorização do regime de auxílios. A República Federal da Alemanha dirigiu‑se novamente à Comissão por ofício de 13 de Março de 2001.

20      Por ofício de 1 de Junho de 2001, o Ministério da Economia e do Trabalho do Freistaat Sachsen teve participação no procedimento, apresentando à Comissão observações em apoio dos argumentos invocados pela República Federal da Alemanha no procedimento de notificação.

21      Em 14 de Junho de 2001, em Berlim, houve uma reunião entre representantes da República Federal da Alemanha e da Comissão.

22      Por comunicação de 2 de Agosto de 2001, baseada no artigo 9.°, n.° 1, do regulamento de isenção PME, a República Federal da Alemanha informou a Comissão da sua decisão de implementar os seis subprogramas que constituíam o regime de auxílios notificado até 31 de Dezembro de 2008 ou até à data da decisão que autorizasse o projecto de auxílios tal como foi notificado, dentro dos limites da conformidade com as disposições do regulamento de isenção PME.

23      Em 5 de Setembro de 2001, a Comissão dirigiu um novo pedido de informações à República Federal da Alemanha, pretendendo saber se esta mantinha a notificação inicial. Por ofício de 9 de Outubro de 2001, a República Federal da Alemanha respondeu afirmativamente.

24      Por ofício de 16 de Novembro de 2001, a Comissão informou a República Federal da Alemanha de que a medida «grupos de vendas», objecto do processo distinto CP 92/01 – Alemanha, estava junta ao processo (C 89/01) relativo ao regime de auxílios em causa, enquanto elemento constitutivo do quarto subprograma, intitulado «cooperação».

25      Por ofício de 11 de Dezembro de 2001, a Comissão notificou à República Federal da Alemanha a sua decisão de dar início ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE (a seguir «decisão de dar início ao procedimento formal de investigação») relativamente aos subprogramas «coaching», «participação em feiras», «cooperação» e «promoção do design de produtos» (a seguir «regime de auxílios em causa»). Em contrapartida, a Comissão não levantou qualquer objecção aos subprogramas «consultadoria em comércio exterior» e «gestão do ambiente».

26      Na decisão de dar início ao procedimento formal de investigação, a Comissão recordou à República Federal da Alemanha que o artigo 88.°, n.° 3, CE tem efeito suspensivo e salientou que os auxílios individuais que preencham todos os requisitos do regulamento de isenção PME são compatíveis com o mercado comum, nos termos do artigo 3.°, n.° 1, do referido regulamento.

27      Por ofício de 21 de Janeiro de 2002, a República Federal da Alemanha tomou posição sobre a abertura do procedimento. Em seguida, realizaram‑se duas outras reuniões entre representantes da República Federal da Alemanha e da Comissão, em 19 de Fevereiro de 2002 em Bruxelas e em 10 de Junho de 2002 em Berlim.

28      Em 7 de Fevereiro de 2002, a decisão de dar início ao procedimento formal de investigação foi publicada no Jornal Oficial (JO C 34, p. 2). A Comissão convidou as partes interessadas a apresentarem as suas observações sobre o regime de auxílios em causa. Nenhuma das partes apresentou observações.

2.     Decisão impugnada

29      Em 24 de Setembro de 2002, a Comissão adoptou a Decisão 2003/226/CE relativa a um regime de auxílios que a Alemanha tenciona introduzir denominado – «Orientações relativas ao apoio às pequenas e médias empresas – Melhoramento do desempenho empresarial no Land da Saxónia» – Subprogramas 1 (Coaching), 4 (Participação em feiras), 5 (Cooperação) e 7 (Promoção do design de produtos) (JO 2003, L 91, p. 13, a seguir «decisão impugnada»).

30      O dispositivo da decisão impugnada tem a seguinte redacção:

«Artigo 1.°

«Os quatro subprogramas ‘Coaching’, ‘Participação em feiras’, ‘Cooperação’ e ‘Promoção do design de produtos’ das orientações relativas ao apoio às pequenas e médias empresas – melhoramento do desempenho empresarial […] constituem auxílios estatais na acepção do n.° 1 do artigo 87.° [CE].

Artigo 2.°

Os quatro subprogramas referidos no artigo 1.°, na medida em que não excedam o âmbito de aplicação e a intensidade dos auxílios previstos no Regulamento […] n.° 70/2001, podem ser considerados compatíveis com o mercado comum, nos termos do n.° 3, alínea c), do artigo 87.° [CE].

Os quatro subprogramas em causa, na medida em que prevejam auxílios que excedam o âmbito de aplicação e a intensidade dos auxílios previstos no Regulamento […] n.° 70/2001, não são compatíveis com o mercado comum.

Artigo 3.°

O subprograma ‘Cooperação’ referido no artigo 1.°, na medida em que prevê auxílios ao funcionamento, não é compatível com o mercado comum.

Artigo 4.°

A Alemanha só poderá executar os quatro subprogramas referidos no artigo 1.°, quando os tiver alterado de forma a torná‑los conformes com a presente decisão.

Artigo 5.°

A Alemanha informará a Comissão, no prazo de dois meses a contar da notificação da presente decisão, das medidas tomadas para lhe dar cumprimento.

Artigo 6.°

A República Federal da Alemanha é a destinatária da presente decisão.»

 Tramitação do processo e pedidos das partes

31      Através de petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Primeira Instância em 4 de Dezembro de 2002, o recorrente interpôs o presente recurso.

32      Com base no relatório do juiz‑relator, o Tribunal de Primeira Instância (Quinta Secção alargada) decidiu, por um lado, adoptar medidas de organização do processo, convidando as partes a responder por escrito a certas questões e a apresentar documentos e, por outro, dar início à fase oral. As partes deram cumprimento ao pedido do Tribunal no prazo fixado.

33      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às perguntas do Tribunal na audiência de 21 de Março de 2006.

34      O recorrente concluiu pedindo que o Tribunal se digne:

–        anular o artigo 2.°, segundo parágrafo, e os artigos 3.° e 4.° da decisão impugnada;

–        condenar a Comissão nas despesas.

35      A Comissão concluiu pedindo que o Tribunal se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar o recorrente nas despesas.

 Questão de direito

36      O recorrente invoca cinco fundamentos. O primeiro é relativo à ilegalidade formal da decisão impugnada resultante do facto de a Comissão não ter aplicado ao regime de auxílios em causa o procedimento acelerado de autorização. O segundo fundamento é relativo à ilegalidade material da decisão impugnada resultante do facto de o regulamento de isenção PME não ser aplicável no caso em apreço. O terceiro fundamento é relativo ao facto de o regime de auxílios em causa poder ser autorizado ao abrigo do enquadramento comunitário dos auxílios estatais às pequenas e médias empresas (JO 1996, C 213, p. 4, a seguir «enquadramento comunitário PME de 1996»). O quarto fundamento é relativo ao facto de a Comissão não ter exercido o seu poder de apreciação na análise do regime de auxílios em causa, bem como à violação do dever de fundamentação daí resultante. O quinto é relativo ao facto de a Comissão não ter demonstrado que a concorrência era efectivamente ou potencialmente falseada pelo regime de auxílios em causa, bem como à violação do dever de fundamentação daí resultante.

1.     Quanto ao fundamento relativo à ilegalidade formal da decisão impugnada resultante do facto de a Comissão não ter aplicado o procedimento acelerado de autorização

 Argumentos das partes

37      O recorrente alega, em primeiro lugar, que a República Federal da Alemanha notificou o regime de auxílios de acordo com a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização e que a Comissão, em vez de dar cumprimento à obrigação que lhe incumbia de se pronunciar no prazo de 20 dias úteis, esperou pela entrada em vigor do regulamento de isenção PME para se pronunciar.

38      Em resposta ao argumento da Comissão segundo o qual a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização, que data de 1992, não é vinculativa, uma vez que não foi adoptada em conformidade com as disposições do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, o recorrente alega que o referido regulamento entrou em vigor sete anos depois da adopção da referida comunicação e que este última não pode, por conseguinte, ser apreciada a luz daquele. Acresce que, apesar de o regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado ser posterior à comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização e não incluir nenhuma disposição relativa a este procedimento, a Comissão fez regularmente referência a este procedimento na sua prática posterior à entrada em vigor do referido regulamento.

39      Em segundo lugar, o recorrente contesta a conclusão da Comissão, na decisão impugnada, segundo a qual o procedimento acelerado de autorização não era aplicável uma vez que o regime de auxílios em causa não era um «regime existente». O ponto 2 da comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização dispõe, nomeadamente, que esse procedimento é aplicável no caso de serem introduzidas alterações aos regimes existentes autorizados pela Comissão desde que digam respeito a um «aumento do orçamento existente até 20% do montante inicial, mas sem prorrogação» ou se «torna[rem] mais estritos os critérios de aplicação».

40      Ora, não só os requisitos de aplicação do regime de auxílios se tornaram mais estritos em relação às medidas anteriores, como a Comissão já tinha autorizado o programa em duas ocasiões. Segundo o recorrente, uma ligeira alteração do conteúdo do regime de auxílios que vá além da simples prorrogação e de um aumento do orçamento não impede, por si só, o recurso ao procedimento acelerado de autorização, como aliás a Comissão tinha vindo a admitir até então ao autorizar, no âmbito desse procedimento, em 1996 e em 1998, os programas que prolongaram o programa inicialmente notificado em 1992. Esta circunstância devia ter, por si só, impedido a Comissão de recusar recorrer ao procedimento acelerado de autorização, por força do princípio segundo o qual são proibidas as actuações contraditórias em prejuízo de terceiros.

41      Em terceiro lugar, o recorrente alega que, ainda que o regime de auxílios em causa devesse ser considerado um novo regime, a Comissão devia ter procedido à sua análise e pronunciar‑se segundo o procedimento acelerado de autorização no prazo de 20 dias, uma vez que esse prazo se aplica tanto aos regimes existentes como às novas medidas. O recorrente considera, por outro lado, contrariamente à Comissão, que o regime de auxílios em causa não comporta um auxílio à exportação.

42      Em quarto lugar, o recorrente sustenta que, ainda que o regime de auxílios em causa comportasse auxílios à exportação, a Comissão teria podido analisar essa parte do regime fora do procedimento acelerado de autorização, ao passo que a parte restante do regime em causa, considerada, numa primeira abordagem, compatível com o mercado comum, devia ter sido examinada e autorizada de acordo com o referido procedimento.

43      A Comissão alega, em primeiro lugar, que a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização não confere um direito a que a mesma se pronuncie num prazo de 20 dias úteis. Esse prazo só é aplicável às decisões favoráveis em determinados casos simples que preencham os requisitos impostos.

44      Em segundo lugar, a Comissão alega que a observância da comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização não pode ser objecto de recurso, uma vez que essa comunicação foi adoptada antes da entrada em vigor do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, no qual foi definitivamente regulada a questão dos prazos aplicáveis. O objecto do pedido de que fosse seguido o procedimento acelerado foi suprimido pelo regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, uma vez que o respectivo artigo 4.° institui uma regra em matéria de prazos e não prevê a manutenção desse procedimento. Ora, por força do princípio segundo o qual uma norma posterior, hierarquicamente igual ou superior, anula ou revoga as disposições anteriores contrárias destinadas a regular os mesmos factos e com o mesmo objecto, o procedimento acelerado de autorização tornou‑se «obsoleto» e não é, por conseguinte, vinculativo. Embora a Comissão continue, de facto, a respeitar as orientações ou outras comunicações que já não estão em vigor ou que se tornaram «obsoletas», não está vinculada pelas mesmas.

45      Por último, a Comissão opõe‑se aos argumentos do recorrente segundo os quais o regime de auxílios em causa preenche os requisitos exigidos pela comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização para poder beneficiar da autorização concedida segundo esse procedimento.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

46      A comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização dispõe, respectivamente, nos seus segundo e último parágrafos, que a Comissão, em princípio, não levantará objecções aos novos regimes de auxílios ou à alteração em regimes de auxílios existentes, notificados nos termos do n.° 3 do artigo 88.° CE, desde que preencham determinados requisitos referidos na mesma comunicação, e que se pronunciará sobre as notificações no prazo de 20 dias úteis.

47      Na decisão impugnada, a Comissão referiu, no considerando 54 que, contrariamente ao sustentado pela República Federal da Alemanha, o regime de auxílios em causa não devia ser apreciado no âmbito do procedimento acelerado de autorização, uma vez que as disposições processuais aplicáveis eram, no caso concreto, as do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado.

48      Há que observar, em primeiro lugar, que, ao referir que eram aplicáveis as disposições do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, e não as da comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização, a Comissão alega implicitamente que a referida comunicação ficou sem objecto desde a entrada em vigor do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado. Esta posição é explícita nos seus articulados, em que sustenta nomeadamente que a referida comunicação se tornou «obsoleta» devido à sua incompatibilidade com o regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, uma vez que o artigo 4.° deste último regulamento institui uma regra em matéria de prazos e não prevê a manutenção do procedimento acelerado de autorização.

49      Em seguida, a Comissão procura, contudo, demonstrar, no considerando 54, n.° 1, da decisão impugnada, não que a comunicação sobre o procedimento acelerado se tinha tornado «obsoleta», mas que não era aplicável, uma vez que os requisitos que prevê não estavam preenchidos no caso concreto.

50      Por último, resulta dos autos que a Comissão não contesta a afirmação do recorrente segundo a qual continuou a tomar como referência o procedimento acelerado depois da entrada em vigor do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, limitando‑se a salientar que não está vinculada por comunicações ou orientações que já não estão em vigor, mesmo que, de facto, continue a observá‑las.

51      No que diz respeito, em primeiro lugar, à questão de saber se a adopção do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado tornou «obsoleta» a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização, há que referir que, para além do facto de esse regulamento não conter nenhuma indicação nessa matéria, só em 30 de Abril de 2004, ou seja, cinco anos depois da sua entrada em vigor, foi publicada uma comunicação no Jornal Oficial relativa à obsolescência de certos documentos relativos à política de auxílios estatais (JO 2004, C 115, p. 1, a seguir «comunicação relativa aos documentos obsoletos»), que inclui entre eles a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização. Com efeito, no terceiro parágrafo dessa comunicação, refere‑se que, «a partir da data de publicação da presente comunicação no Jornal Oficial da União Europeia, a Comissão deixa de aplicar, em relação a qualquer matéria, os seguintes documentos, independentemente do seu estatuto jurídico: […] 13) [comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização]».

52      Há que mencionar igualmente que a comunicação relativa aos documentos obsoletos esclarece, no segundo parágrafo, que foi na sequência da adopção do Regulamento (CE) n.° 794/2004 da Comissão, de 21 de Abril de 2004, relativo à aplicação do Regulamento (CE) n.° 659/1999 (JO L 140, p. 1, a seguir «regulamento de aplicação do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado»), adoptado com base no artigo 27.° do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, que vários diplomas relativos a questões processuais no domínio dos auxílios de Estado se tornaram obsoletos, «incluindo as notificações aceleradas». A comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização, segundo a própria fundamentação da comunicação relativa aos documentos obsoletos, só se tornou, por conseguinte, «obsoleta» por causa e na sequência da adopção do regulamento de aplicação do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado. Estas circunstâncias explicam‑se pelo facto de este último prever, no artigo 4.°, um procedimento simplificado de notificação para determinadas alterações aos auxílios existentes, procedimento este que reproduz, no essencial, os requisitos previstos no n.° 2 da comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização (aumentos de 20% do orçamento de um regime de auxílios autorizado, prorrogação do referido regime, com ou sem aumento de orçamento e reforço dos critérios de aplicação de regimes de auxílios autorizados) e que prevê igualmente um prazo mais curto do que o previsto no artigo 4.° do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, concretamente, um mês, dentro do qual a Comissão se esforça por se pronunciar no âmbito do referido procedimento.

53      Por outro lado, e contrariamente ao que a Comissão sustentou nos seus articulados, não há nenhuma incompatibilidade entre o regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, que fixa, em conformidade com a jurisprudência decorrente do acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de Dezembro de 1973, Lorenz (120/73, Colect., p. 553, n.° 4), um prazo máximo de dois meses para a fase preliminar de exame dos auxílios notificados no âmbito do procedimento normal de notificação, aplicável em geral, e a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização, que prevê um prazo de 20 dias unicamente no âmbito de um procedimento simplificado de notificação relativo a casos específicos.

54      Assim, não se pode deixar de concluir que a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização só deixou de ser aplicável a partir de 30 de Abril de 2004, data em que foram publicados a comunicação relativa aos documentos obsoletos e o regulamento de aplicação do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado.

55      Nestas circunstâncias, há que analisar, em segundo lugar, se assistiu razão à Comissão ao afirmar, no considerando 54 da decisão impugnada, que a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização não era aplicável ao caso em apreço, na medida em que o regime de auxílios em causa não era um novo regime nem uma alteração de um regime existente na acepção da referida comunicação.

56      Em primeiro lugar, como o Tribunal já declarou, resulta da redacção do segundo e do último parágrafo da comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização que, mesmo no caso de um projecto de regime de auxílio respeitar todos os requisitos aos quais o benefício do prazo de 20 dias úteis está sujeito, é unicamente «em princípio» que a Comissão se compromete a não levantar objecções depois de decorrido este prazo, preservando assim a plenitude do seu poder de se «pronunciar», ou seja, sendo caso disso, de adoptar uma decisão de dar início ao procedimento formal de investigação e, no fim desse procedimento, uma decisão final positiva, condicional ou negativa.

57      Em segundo lugar, há que referir que os requisitos que os regimes de auxílios notificados devem preencher para que a Comissão não levante, em princípio, objecções no prazo de 20 dias úteis devem ser objecto de interpretação estrita, uma vez que o procedimento acelerado de autorização tem carácter derrogatório em relação ao procedimento normal de análise das notificações.

58      Também há que recordar que, nos termos do n.° 2 da referida comunicação, a alteração de um regime existente admitida para efeitos do procedimento acelerado de autorização pode levar quer à prorrogação sem aumento de recursos orçamentais, quer ao aumento do orçamento existente até 20% do montante inicial, mas sem prorrogação, quer à prorrogação com aumento do orçamento até 20% do montante inicial, quer, por último, a alterações que tornam mais estritos os critérios de aplicação. Consequentemente, qualquer outra alteração de um regime de auxílios existente, nomeadamente na medida em que tenha por efeito flexibilizar os requisitos de concessão dos auxílios ou aumentar a sua intensidade, exclui que a respectiva notificação possa ser objecto de um procedimento acelerado de autorização.

59      No caso em apreço, há que observar que, em 29 de Dezembro de 2000, o regime de auxílios em causa foi objecto de uma notificação à Comissão, nos termos do artigo 88.°, n.° 3, CE e a título do procedimento acelerado de autorização, enquanto «alteração e prorrogação» de um regime de auxílios previamente aprovado, que ainda estava em vigor, mas cuja validade expirava em 31 de Dezembro de 2000. É, portanto, facto assente que a República Federal da Alemanha pretendia invocar o benefício do procedimento acelerado de autorização.

60      Ora, no que diz respeito, por um lado, ao subprograma «coaching», e especificamente às novas empresas, o montante máximo do auxílio por dia, em valor absoluto, era de 500 euros, ao passo que era de 800 marcos alemães (409,03 euros) no regime previamente aprovado.

61      No que diz respeito, por outro lado, aos subprogramas «participação em feiras», «cooperação» e «promoção do design de produtos», e em particular alguns projectos específicos, nomeadamente os executados em zonas definidas como «zonas confrontadas com problemas específicos», as intensidades máximas de auxílios previstas pelo regime de auxílios em causa foram aumentadas em relação às que caracterizam o regime de auxílios previamente aprovado.

62      Assim, quanto ao subprograma «participação em feiras», a taxa de auxílio máxima foi de 50% no regime de auxílios previamente aprovado a 60% no regime de auxílios em causa para as pequenas empresas localizadas em zonas confrontadas com problemas específicos.

63      Relativamente ao subprograma «cooperação», apesar de a intensidade máxima de auxílios aplicável de maneira geral ter baixado de 70% para 65%, as taxas máximas de auxílios previsíveis elevaram‑se a 80% para o financiamento de estudos de viabilidade e de projectos levados a cabo no âmbito da iniciativa comunitária Interreg III e envolveram pelo menos cinco pequenas e médias empresas, bem como para projectos de pequenas empresas.

64      Por último, relativamente ao subprograma «promoção do design de produtos», a taxa de auxílio máxima foi de 50% no regime de auxílios previamente aprovado a 70% no regime de auxílios em causa para as pequenas empresas localizadas em zonas confrontadas com problemas específicos.

65      Resulta das considerações precedentes que as alterações introduzidas no regime de auxílios existente ultrapassaram as que permitem a notificação de acordo com o procedimento acelerado de autorização. Com efeito, cada um dos subprogramas constitutivos do regime de auxílios em causa é caracterizado por um aumento, pelo menos no que diz respeito a alguns beneficiários, da taxa máxima de auxílio previsível. Ora, como resulta do n.° 58 supra, a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização apenas admite que este procedimento possa ser utilizado se as alterações em causa implicarem uma prorrogação do regime de auxílios ou um aumento dentro do limite de 20%, com ou sem prorrogação, da verba orçamental global em causa ou tornem mais estritos os critérios de aplicação. No caso em apreço, as alterações introduzidas, nomeadamente através do aumento da intensidade da taxa de auxílio, estão, por conseguinte, excluídas do benefício do referido procedimento, na medida em que constituem uma flexibilização do regime de auxílios em causa.

66      Relativamente ao argumento do recorrente segundo o qual, mesmo que o regime de auxílios devesse ser considerado um novo regime, a Comissão devia, ainda assim, ter procedido à sua análise no âmbito do procedimento, há que referir que a medida de auxílio contida no subprograma «cooperação» diz respeito à criação, por três pequenas e médias empresas no mínimo, de agrupamentos de venda com o objectivo de procurarem em comum mercados de escoamento no estrangeiro (gemeinsamen Erschliessung ausländischer Märkte). Ora, no n.° 1, último parágrafo, da comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização, é referido que «são excluídos deste processo quaisquer auxílios às exportações no comércio intracomunitário ou auxílios ao funcionamento».

67      Assim, a Comissão podia correctamente concluir, como referiu no n.° 1 do considerando 54 da decisão impugnada, que o regime em causa previa um auxílio à exportação no quadro do comércio intracomunitário e não podia ser objecto de autorização por meio do procedimento acelerado na medida em que não podia ser considerado, por essa razão, um novo regime de auxílios.

68      A este respeito, há que acrescentar que, ainda que resultasse de uma análise aprofundada que a medida em causa não constituía um «[auxílio] à exportação no quadro do comércio intracomunitário», a Comissão não deixaria de agir correctamente ao não recorrer ao procedimento acelerado de autorização uma vez que, à primeira vista, podia existir uma dúvida a esse respeito. Com efeito, como sustenta a Comissão nos seus articulados, esse procedimento tem o objectivo de permitir a autorização acelerada de regimes de auxílios que não suscitam qualquer dúvida quanto à sua compatibilidade com as normas aplicáveis em matéria de auxílios de Estado e que são, por conseguinte, susceptíveis, à primeira vista, de ser objecto de uma apreciação positiva. É assim tanto mais quanto, como foi acima recordado no n.° 56, a Comissão só «em princípio» se compromete a não levantar objecções decorrido o prazo de 20 dias úteis.

69      Quanto ao argumento do recorrente segundo o qual, na medida em que a Comissão considerou que o regime de auxílios notificado incluía auxílios à exportação, as medidas em causa podiam ter sido dissociadas do resto do regime de auxílios, que podia ter sido objecto de autorização nos termos do procedimento acelerado, não deve ser acolhido. Com efeito, não só a comunicação sobre o procedimento acelerado de autorização não previa a possibilidade de conceder uma autorização parcial, mas também resulta do exposto que, tendo em conta a natureza das alterações introduzidas, os requisitos exigidos para poder beneficiar do procedimento acelerado de autorização não estavam preenchidos.

70      Há que concluir, pois, que a Comissão, no considerando 54 da decisão impugnada, concluiu correctamente que a notificação do regime de auxílios em causa não podia ser objecto de um procedimento acelerado de autorização pelo facto de o regime de auxílios notificado não ser um novo regime nem a alteração de um regime existente na acepção da referida comunicação.

71      Consequentemente, o primeiro fundamento deve ser julgado improcedente.

2.     Quanto ao fundamento relativo à ilegalidade material da decisão impugnada resultante da não aplicabilidade do regulamento de isenção PME

 Argumentos das partes

72      O recorrente alega, em primeiro lugar, que a decisão impugnada é ilegal na medida em que a Comissão devia ter analisado o regime de auxílios em causa à luz das normas jurídicas em vigor no momento em que a Comissão recebeu a notificação, ou seja, à luz do enquadramento comunitário PME de 1996, aplicável em 3 de Janeiro de 2001, e não à luz do regulamento de isenção PME, que entrou em vigor em 2 de Fevereiro de 2001. A decisão impugnada, por conseguinte, não tem base jurídica, o que basta para justificar a sua anulação. Por outro lado, a análise da Comissão contida no considerando 55 da decisão impugnada, baseada na inexistência de medidas transitórias e na revogação do enquadramento comunitário PME de 1996 à data da entrada em vigor do regulamento de isenção PME, levou a uma substituição das condições de apreciação e, no caso vertente, ao respectivo reforço no decurso do procedimento, o que é ilícito.

73      A jurisprudência invocada pela Comissão em apoio do seu argumento segundo o qual estava obrigada a aplicar o regulamento de isenção PME, tendo em conta que uma norma nova se aplica imediatamente aos efeitos futuros de uma situação nascida na vigência da norma anterior (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de Janeiro de 2002, Pokrzeptowicz‑Meyer, C‑162/00, Colect., p. I‑1049, n.os 49 a 55) não é pertinente. No caso em apreço, não estão em causa os efeitos futuros de medidas determinadas, mas o critério de apreciação aplicável num prazo claramente determinado. A Comissão não pode, portanto, invocar o facto de a medida de auxílio produzir os respectivos efeitos depois da entrada em vigor do regulamento de isenção PME, o que é, no caso concreto, uma característica de todos os outros auxílios existentes e autorizados.

74      Em segundo lugar, o recorrente observa que o princípio segundo o qual um regime de auxílios está sujeito à legislação em vigor no momento da notificação corresponde à prática decisória da Comissão, que ela própria utiliza esse critério, como resulta do n.° 6.1 das orientações relativas aos auxílios com finalidade regional, dos n.os 98 e 100 das orientações comunitárias dos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas em dificuldade (JO 1999, C 288, p. 2), do n.° 2.6 do enquadramento comunitário dos auxílios estatais no sector dos veículos automóveis (JO 1997, C 279, p. 1) e dos n.os 39 e seguintes do enquadramento multisectorial dos auxílios com finalidade regional para grandes projectos de investimento (JO 2002, C 70, p. 8).

75      Não podia, por conseguinte, alterar implicitamente o princípio acima referido através de decisão individual, como o Tribunal de justiça claramente declarou no acórdão de 24 de Março de 1993, CIRFS e o./Comissão (C‑313/90, Colect., p. I‑1125, n.° 44). No entanto, foi o que a Comissão fez no caso vertente, afastando‑se igualmente da jurisprudência segundo a qual se encontra juridicamente vinculada pela sua prática administrativa (acórdão CIRFS e o./Comissão, já referido, n.os 34 e 36; acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 12 de Dezembro de 1996, AIUFFASS e AKT/Comissão, T‑380/94, Colect., p. II‑2169, n.° 57), o que implica que é à luz das normas que a instituição se impôs a si mesma que a decisão impugnada deve ser fiscalizada (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 5 de Novembro de 1997, Ducros/Comissão, T‑149/95, Colect., p. II‑2031, n.° 61). Por conseguinte, a Comissão não pode sustentar, para contestar o princípio segundo o qual os auxílios devem ser apreciados em relação aos critérios aplicáveis no momento da notificação, que exemplos acima referidos no n.° 74 são relativos aos casos em que o legislador definiu expressamente uma regra diferente da regra jurisprudencial. Com efeito, para além do facto de a Comissão ser ela própria o legislador, essa argumentação permite‑lhe declinar qualquer obrigação de garantir a continuidade da sua prática decisória.

76      O argumento da Comissão segundo o qual estava obrigada a aplicar o regulamento de isenção PME devido ao facto de ter analisado vários programas de auxílios notificados antes da entrada em vigor do mencionado regulamento referindo‑se a este último também é irrelevante, tanto mais que estão em causa, no essencial, casos respeitantes a auxílios à formação e ao investimento. Além disso, os auxílios que os Estados‑Membros notificaram antes da entrada em vigor do regulamento de isenção PME e que estavam em conformidade com este também podiam, claramente, ser autorizados ao abrigo desse diploma.

77      O recorrente alega, além disso, que só a análise de um regime de auxílios à luz das normas jurídicas em vigor no momento da notificação permitiria aos Estados‑Membros apreciar de modo fiável a questão da sua compatibilidade com o mercado comum. A abordagem da Comissão, pelo contrário, obriga os Estados‑Membros a definir a aplicação de uma medida de auxílio em função de uma evolução futura incerta do direito, o que é incompatível com os princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança legítima. Os Estados‑Membros não podem ter antecipadamente conhecimento da data de entrada em vigor e do teor dos regulamentos, das orientações e dos enquadramentos comunitários ainda em fase de discussão. O convite a apresentar observações relativas ao projecto de regulamento de isenção PME foi publicado quase dois anos antes da sua entrada em vigor, o que demonstra que era impossível prever a data de entrada em vigor do novo regulamento, ou mesmo se esta aconteceria.

78      Em terceiro lugar, a abordagem adoptada pela Comissão leva a resultado absurdos. Assim, de acordo com jurisprudência assente, a Comissão só pode exigir a recuperação de um auxílio concedido apesar de a sua execução ter sido proibida se o regime de auxílios for igual e materialmente incompatível com o mercado comum (acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de Fevereiro de 1990, França/Comissão, C‑301/87, Colect., p. I‑307, n.os 20 e segs.). A compatibilidade com o mercado comum devia ser apreciada no momento da execução, formalmente irregular, do regime, o que a Comissão previu expressamente, aliás, no n.° 82 do enquadramento comunitário dos auxílios estatais a favor do ambiente (JO 2001, C 37, p. 3, a seguir «enquadramento comunitário dos auxílios estatais a favor do ambiente»). Daqui decorre, segundo o recorrente, que, se tivesse executado o regime de auxílios em causa em vez de o notificar à Comissão em conformidade com o direito comunitário, o enquadramento comunitário PME de 1996 teria sido aplicável. Estaria, portanto, impedido de executar o referido regime por ter cumprido a lei.

79      Em quarto lugar, o recorrente alega igualmente que a notificação inicial estava completa. A Comissão não tem razão ao afirmar que o regulamento de isenção PME era aplicável devido ao facto de as informações que tinha pedido só lhe terem sido transmitidas depois da entrada em vigor do referido regulamento, uma vez que uma notificação não se pode considerar incompleta pelo simples facto de a Comissão pedir informações complementares. A questão de saber se uma notificação está completa de modo algum é abrangida pela livre apreciação da Comissão, uma vez que, se assim não fosse, esta poderia prolongar o prazo de apreciação arbitrária e indefinidamente.

80      O recorrente recorda que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, uma notificação está completa se contiver, desde o início ou na sequência das respostas do Estado‑Membro às questões colocadas pela Comissão, as informações necessárias para permitir que esta forme uma primeira opinião sobre a compatibilidade do auxílio com o Tratado (acórdãos do Tribunal de Justiça Lorenz, já referido no n.° 53 supra, e de 15 de Fevereiro de 2001, Áustria/Comissão, C‑99/98, Colect., p. I‑1101, n.os 54 e 56). Um Estado‑Membro pode invocar o facto de uma notificação estar completa, mesmo que opte por não executar o auxílio e consequentemente não invocar, nos termos do artigo 4.°, n.° 6, e do artigo 5.°, n.° 3, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, o carácter inicialmente completo da notificação. A este respeito, o recorrente acrescenta que a colaboração de um Estado‑Membro com a Comissão no âmbito de um procedimento preliminar de investigação, não pode ser interpretada como uma renúncia a qualquer objecção posterior.

81      Os pedidos contidos no ofício da Comissão à administração alemã de 5 de Fevereiro de 2001, relativos, por um lado, à apreciação da compatibilidade do auxílio com o mercado comum e, por outro, à questão de saber se o regime de auxílios em causa podia, através de uma alteração, passar a estar em conformidade com o regulamento de isenção PME, que entrou em vigor apenas dois dias antes, comprovam o facto de a Comissão já ter formado uma primeira opinião sobre o regime de auxílios em causa, o que está em contradição com a afirmação de que não podia analisar a notificação sem dispor das informações pedidas. A Comissão também não pode alegar que determinados aspectos do subprograma «cooperação» não tinham sido expressamente expostos na notificação e que era necessário pedir informações a respeito deles no âmbito do procedimento CP 92/01, relacionado com o presente procedimento de notificação (v. n.° 24, supra). Essas questões são relativas a um aspecto acessório da notificação, pelo que a Comissão não necessitava de dispor das respostas a essas questões para poder formar a sua opinião.

82      Ao actuar como actuou no caso em apreço, a Comissão infringiu, portanto, os princípios em que se baseia a sua prática administrativa. Depois de ter, com conhecimento de causa, deixado expirar o prazo de apreciação de 20 dias fixado no âmbito do procedimento acelerado de autorização e depois de ter esperado pela entrada em vigor do regulamento de isenção PME, tentou sugerir, dirigindo um pedido à República Federal da Alemanha, que a notificação estava incompleta. Este modo de actuação viola a obrigação prevista no artigo 4.°, n.° 1, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, de analisar a notificação «imediatamente após a sua recepção».

83      A Comissão alega, a título preliminar, que os regulamentos de isenção têm todos a dupla função de, por um lado, isentar determinados auxílios da obrigação de notificação e do procedimento de aprovação pela Comissão e, por outro, de substituírem as antigas orientações ou enquadramentos comunitários. Entram em vigor numa data escolhida pela Comissão, são geralmente aplicáveis durante cinco anos e prevêem que, no termo da respectiva validade, os regimes de auxílios isentos aos abrigo das suas disposições se mantenham isentos durante um período de adaptação de seis meses.

84      Em primeiro lugar, quanto ao argumento do recorrente respeitante à aplicação das disposições legais no tempo, a Comissão remete para a jurisprudência do Tribunal de Justiça segundo a qual a aplicabilidade imediata de uma norma material aos efeitos futuros de uma situação nascida na vigência da norma anterior é um princípio de direito comunitário aplicável sem restrições (acórdãos do Tribunal de Justiça de 10 de Julho de 1986, Licata/CES, 270/84, Colect., p. 2305, n.° 31; de 2 de Outubro de 1997, Saldanha e MTS, C‑122/96, Colect., p. I‑5325, n.os 12 a 14, e Pokrzeptowicz‑Meyer, referido no n.° 73, supra, n.os 49 a 55). A Comissão estava obrigada, assim, a aplicar o regulamento de isenção PME no caso em apreço, uma vez que, embora a notificação tenha efectivamente sido efectuada na vigência das disposições anteriores, não é menos verdade que havia que apreciar os efeitos futuros das medidas notificadas durante o seu período de validade.

85      Em segundo lugar, a Comissão alega que os exemplos invocados pelo recorrente para demonstrar a continuidade da sua prática decisória (v. n.° 74, supra) são todos relativos a casos em que o legislador previu expressamente a aplicabilidade da legislação em vigor no momento da notificação (acórdão Saldanha e MTS, referido no n.° 84, supra, n.° 14), ao passo que o regulamento de isenção PME não contém nenhuma disposição a esse respeito. Por outro lado, o argumento de que a Comissão não se pode afastar da sua prática teria como consequência absurda conferir a uma prática determinada valor superior ao de uma disposição legal vinculativa e devidamente publicada, o que equivaleria à negação completa da capacidade da Comissão para estabelecer regras.

86      Segundo a Comissão, o regime de auxílios em causa, deliberadamente notificado imediatamente antes do termo do prazo de vigência do enquadramento comunitário PME de 1996, não corresponde à sua nova política em matéria de auxílios às PME. Além disso, invoca a coerência da sua prática em matéria de autorização citando numerosos exemplos em que regimes de auxílios notificados antes da entrada em vigor do regulamento de isenção PME foram analisados à sua luz. Acrescenta que o regime de auxílios em causa, no caso de a autorização se basear no enquadramento comunitário PME de 1996, se teria mantido em vigor durante todo o período de validade do regulamento de isenção PME.

87      Relativamente, em terceiro lugar, ao argumento do recorrente segundo o qual teria sido mais vantajoso para ele executar o programa sem o notificar, a Comissão alega que, nesse caso, devia ter dado início ao procedimento formal de investigação e aplicar a legislação em vigor à data da decisão, ou seja, o regulamento de isenção PME, pelo menos quanto ao período que se seguiu à sua entrada em vigor, o que teria o resultado que se sabe. A referência do recorrente ao enquadramento comunitário dos auxílios estatais a favor do ambiente é completamente irrelevante, tendo em conta, por um lado, que a disposição do referido enquadramento diz respeito a auxílios não notificados, ao passo que, no caso em apreço, o regime de auxílios foi notificado e, por outro, que a Comissão não pode, quanto ao âmbito de aplicação do regulamento de isenção PME, estar vinculada pelo enquadramento comunitário dos auxílios estatais a favor do ambiente.

88      Em quarto lugar, relativamente ao argumento do recorrente segundo o qual a notificação estava completa, a Comissão alega que as informações pedidas eram necessárias e que é inexacto que a República Federal da Alemanha não tenha apresentado outros factos novos. Com efeito, na comunicação junta ao ofício de 12 de Março de 2001, só indicou as intensidades dos auxílios para a parte relativa aos «serviços de consultadoria intensiva/coaching», a respeito dos quais não constava nenhuma indicação na notificação. Além disso, só na referida comunicação é que a questão das «zonas confrontadas com problemas específicos» foi exposta mais pormenorizadamente. Por outro lado, o ofício acima mencionado e respectivos anexos, transmitidos posteriormente em 20 de Março de 2001, contêm um número elevado de informações novas relativas aos factos e ao seu contexto.

89      Segundo a Comissão, o recorrente infringe assim o disposto no artigo 4.°, n.° 6, e no artigo 5.°, n.° 3, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, que derrogam a jurisprudência do acórdão Lorenz, referido no n.° 53, supra (n.° 4), ou mesmo também do acórdão Áustria/Comissão, referido no n.° 80, supra, n.° 29, e as conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs nesse processo (Colect., p. I‑1105, n.os 24 a 28). Com efeito, resulta dessas disposições que a inobservância dos prazos previstos no artigo 4.° do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado não é pura e simplesmente proibida, embora o facto de esses prazos serem ultrapassados possa ter consequências graves do ponto de vista da Comissão.

90      A este respeito, a Comissão acrescenta que um Estado‑Membro deve colaborar o melhor que pode com a Comissão, mantendo a possibilidade, se esta última não cumprir as suas obrigações, de salvaguardar imediatamente os seus direitos. No caso em apreço, a República Federal da Alemanha devia ter informado a Comissão, através de uma declaração devidamente fundamentada, de que considerava a notificação completa nos termos do artigo 5.°, n.° 3, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado. Em seguida, o Freistaat Sachsen podia, depois de ter informado a Comissão e na falta de reacção da sua parte no prazo de quinze dias úteis, ter executado as medidas notificadas, nos termos do artigo 4.°, n.° 6, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado.

91      Não tendo feito uso dessa faculdade, que lhe era dada pelo regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, a República Federal da Alemanha renunciou à protecção jurídica correspondente. De qualquer forma, a República Federal da Alemanha e o Freistaat Sachsen não se opuseram à abertura do procedimento formal de investigação, admitindo assim a legalidade do referido procedimento e a necessidade de recolher informações complementares (acórdãos do Tribunal de Justiça Áustria/Comissão, referido no n.° 80, supra, e de 18 de Junho de 2002, Espanha/Comissão, C‑398/00, Colect., p. I‑5643).

92      Por outro lado, tendo em conta as disposições do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, pouco importa saber se as informações exigidas por ofício de 5 de Fevereiro de 2001 eram realmente necessárias. Mesmo que o Tribunal respondesse negativamente a essa questão, isso não seria causa de nulidade da decisão impugnada, uma vez que a República Federal da Alemanha teve a possibilidade de se opor à abertura ou ao prosseguimento do procedimento formal de investigação. O recorrente não pode invocar a posteriori, no termo do procedimento formal de investigação e depois da adopção da decisão final, reservas que devia ter emitido numa fase anterior do procedimento. Por essa razão, o fundamento relativo à exaustividade da notificação inicial é inadmissível.

 Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

93      Há que determinar se, como sustenta o recorrente, a Comissão devia ter analisado o regime de auxílios em causa à luz do enquadramento comunitário PME de 1996, em vigor à data da notificação, ou se a Comissão teve razão ao analisar o referido regime, como fez, à luz do regulamento de isenção PME, que entrou em vigor depois da data da notificação, na medida em que importa apreciar os efeitos futuros das medidas notificadas durante o respectivo o período de validade. Para este efeito, há que verificar, consequentemente, se o referido regulamento era aplicável às notificações pendentes à data da sua entrada em vigor.

 Quanto à aplicabilidade do regulamento de isenção PME às notificações pendentes à data da sua entrada em vigor

94      De acordo com jurisprudência assente, embora as normas processuais devam em geral aplicar‑se também a situações jurídicas nascidas anteriormente à sua entrada em vigor (acórdão do Tribunal de Justiça de 12 de Novembro de 1981, Salumi e o., 212/80 a 217/80, Recueil, p. 2735, n.° 9, e acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 28 de Janeiro de 2004, OPTUC/Comissão, T‑142/01 e T‑283/01, Colect., p. II‑329, n.° 60), o mesmo não acontece com as normas substantivas. Com efeito, de acordo com jurisprudência igualmente assente, as normas comunitárias de direito material devem ser interpretadas, de modo a garantir o respeito pelos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança legítima, no sentido de que só são aplicáveis a situações ocorridas anteriormente à sua entrada em vigor se resultar claramente dos seus termos, da sua finalidade ou da sua sistemática que lhes deve ser atribuído esse efeito (acórdãos do Tribunal de Justiça Salumi e o., já referido, n.° 9; de 10 de Fevereiro de 1982, Bout, 21/81, Recueil, p. 381, n.° 13; de 15 de Julho de 1993, GruSa Fleisch, C‑34/92, Colect., p. I‑4147, n.° 22, e de 24 de Setembro de 2002, Falck e Acciaierie di Bolzano/Comissão, C‑74/00 P e C‑75/00 P, Colect., p. I‑7869, n.° 119; acórdãos do Tribunal de Primeira Instância de 19 de Fevereiro de 1998, Eyckeler & Malt/Comissão, T‑42/96, Colect., p. II‑401, n.° 55, e de 28 de Janeiro de 2004, Euroagri/Comissão, T‑180/01, Colect., p. II‑369, n.° 36).

95      De acordo com esta abordagem, o Tribunal de Justiça salientou que embora, regra geral, o princípio da segurança jurídica se oponha a que o alcance temporal de um acto comunitário tenha o seu início em data anterior à sua publicação, pode assim não ser, a título excepcional, quando uma finalidade de interesse geral o exija e a confiança legítima dos interessados seja devidamente respeitada (acórdãos do Tribunal de Justiça de 25 de Janeiro de 1979, Racke, 98/78, Colect., p. 53, n.° 20, e Salumi e o., referido no n.° 94, supra, n.° 10). Essa jurisprudência, como o Tribunal de Justiça esclareceu, também é aplicável no caso de a retroactividade não estar expressamente prevista no próprio acto, antes resultando do seu conteúdo (acórdãos do Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 1991, Crispoltoni, C‑368/89, Colect., p. I‑3695, n.° 17; de 29 de Abril de 2004, Gemeente Leusden e Holin Groep, C‑487/01 e C‑7/02, Colect., p. I‑5337, n.° 59, e de 26 de Abril de 2005, Goed Wonen, C‑376/02, Colect., p. I‑3445, n.° 33).

96      A Comissão sustenta todavia que essa jurisprudência não é aplicável ao caso em apreço, dado que a aplicação imediata de uma norma substantiva aos efeitos futuros de uma situação nascida na vigência da norma anterior é um princípio de direito comunitário aplicável sem restrições.

97      Com efeito, de acordo com jurisprudência assente, uma norma nova é imediatamente aplicável aos efeitos futuros de uma situação nascida na vigência da norma anterior (acórdãos Licata/CES, referido no n.° 84, supra, n.° 31; Saldanha e MTS, referido no n.° 84, supra, n.° 14, e Pokrzeptowicz‑Meyer, referido no n.° 73, supra, n.° 50). A este respeito, o Tribunal de Justiça esclareceu ainda que o âmbito de aplicação do princípio da protecção da confiança legítima não pode ser alargado a ponto de impedir, de uma forma genérica, a aplicação da nova norma (acórdãos do Tribunal de Justiça de 20 de Setembro de 1988, Espanha/Comissão, 203/86, Colect., p. 4563, n.° 19; de 29 de Junho de 1999, Butterfly Music, C‑60/98, Colect., p. I‑3939, n.° 25, e Pokrzeptowicz‑Meyer, referido no n.° 73, supra, n.° 55).

98      Há que mencionar que resulta da jurisprudência acima referida, por um lado, que as disposições comunitárias não têm efeito retroactivo salvo, a título excepcional, quando resulta claramente dos seus termos ou da sua sistemática que era essa a intenção do legislador, que o objectivo a atingir o exige e que a confiança legítima dos interessados é devidamente respeitada (v. jurisprudência acima referida nos n.os 94 e 95). Nesse caso, a excepção é constituída pela aplicação retroactiva da nova legislação. Por outro, a legislação comunitária aplica‑se habitualmente aos efeitos futuros das situações nascidas na vigência de lei anterior, salvo se a aplicação imediata de uma disposição específica for contrária à protecção da confiança legítima dos interessados (v. jurisprudência acima referida no n.° 97). Nesse caso, a excepção é constituída pela não aplicação da nova legislação a uma relação jurídica em curso. A jurisprudência relativa a este segundo caso não envolve uma aplicação retroactiva da lei, uma vez que a nova legislação em causa se aplica a partir da sua entrada em vigor à parte ainda em curso de um contrato (acórdãos Saldanha e MTS, referido no n.° 84, supra, e Pokrzeptowicz‑Meyer, referido no n.° 73, supra, n.° 52), de um mandato (acórdão Licata/CES, n.° 84, supra, n.° 31), ou de outra relação jurídica (acórdão Butterfly Music, referido no n.° 97, supra), que continua a produzir efeitos, portanto, apenas para o futuro.

99      À luz dessa jurisprudência, há que demonstrar, em primeiro lugar, se a apreciação da compatibilidade do regime de auxílios em causa efectuada de acordo com os critérios estabelecidos pelo regulamento de isenção PME, e que entrou em vigor posteriormente à notificação do referido regime, resulta de uma aplicação retroactiva do referido regulamento ou se, ao invés, como alega a Comissão, se trata simplesmente da aplicação imediata de uma nova legislação, no caso concreto o regulamento de isenção PME, aos efeitos futuros de uma situação nascida na vigência do enquadramento comunitário PME de 1996, mas ainda em curso à data da entrada em vigor do referido regulamento.

100    A este respeito, há que observar que, em relação à decisão final da Comissão, que autoriza o auxílio notificado ou o declara incompatível, a situação em que se encontram o Estado‑Membro e o beneficiário do auxílio está evidentemente em curso e é provisória, no sentido de que a notificação não confere nenhum direito à autorização. Todavia, relativamente à determinação dos critérios à luz dos quais deve ser efectuada a apreciação da compatibilidade desse auxílio, há que levar em conta o momento da notificação, dada a importância do seu papel e dos seus efeitos jurídicos no âmbito do procedimento de exame dos auxílios de Estado.

101    Com efeito, em conformidade com o artigo 4.°, n.° 1, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, compete à Comissão proceder à análise da notificação «imediatamente após a sua recepção», portanto à luz da legislação em vigor nessa data. Além disso, é a partir desse momento que começa a contar o prazo de dois meses dentro do qual deve terminar a fase preliminar de exame e cujo incumprimento pode trazer consequências jurídicas significativas para a Comissão e para o Estado‑Membro em causa, como a possibilidade de este último executar o auxílio notificado e de o transformar assim em auxílio existente em conformidade com o disposto no artigo 4.°, n.° 6, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado.

102    A aplicação, para efeitos da apreciação da compatibilidade de um auxílio, dos critérios estabelecidos por uma legislação entrada em vigor posteriormente à notificação do auxílio em questão, por conseguinte, conduz necessariamente a que essa regulamentação tenha efeitos retroactivos. Nesse caso, com efeito, o ponto de partida do alcance da nova regulamentação é necessariamente fixado numa data anterior à sua entrada em vigor, ou seja, a da recepção da notificação pela Comissão. Se se considerasse que a análise da compatibilidade de um auxílio podia ser efectuada à luz da regulamentação entrada em vigor posteriormente à notificação do auxílio, isso equivaleria a admitir que a Comissão pode determinar a lei aplicável em função do momento por ela escolhido para levar a cabo essa análise. Ora, essa posição seria não só dificilmente conciliável com o facto de o artigo 4.°, n.° 1, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado prever imperativamente que a Comissão deve proceder à análise da notificação «imediatamente após a sua recepção», mas também com as exigências de transparência e de previsibilidade dos critérios de acordo com os quais a Comissão aprecia a compatibilidade dos auxílios, que, como ela própria salientou no decurso do processo, constituem a razão de ser dos diplomas que publica em matéria de auxílios de Estado.

103    A alteração dos critérios de apreciação da compatibilidade de um auxílio notificado objecto de um processo em curso devido à entrada em vigor de uma nova regulamentação não pode, por conseguinte, ser considerada uma aplicação da jurisprudência segundo a qual a norma nova é imediatamente aplicável aos efeitos futuros de uma situação nascida na vigência da norma anterior. Com efeito, essa jurisprudência impõe a aplicação da nova norma apenas para o futuro, ao passo que, no caso de um auxílio notificado antes da sua entrada em vigor, a aplicação da nova norma consiste em fazê‑la retroagir ao momento da notificação, efectuando‑se a apreciação da compatibilidade no âmbito de um exame único, apesar de a decisão final constituir um acto elaborado em várias fases.

104    Há que observar, além disso, que, relativamente a auxílios abrangidos pelo âmbito de aplicação do Tratado CA e pagos sem terem sido previamente notificados, o Tribunal de Justiça considerou que aplicar as regras do código em vigor na data em que a Comissão toma uma decisão relativa à compatibilidade de auxílios pagos na vigência de um código precedente resulta, de facto, na aplicação retroactiva de uma regulamentação comunitária (acórdão Falck e Acciaierie di Bolzano/Comissão, referido no n.° 94, supra, n.° 118). O Tribunal de Justiça considerou que nenhuma disposição do código em vigor na data da adopção da decisão da Comissão estabelecia que o mesmo podia ser retroactivamente aplicado e que decorria da sistemática e das finalidades dos sucessivos códigos de auxílios que cada um deles tinham sido adoptado em função das necessidades existentes num dado período, posterior àquele no decurso do qual os auxílios tinham sido pagos (acórdão Falck e Acciaierie di Bolzano/Comissão, referido no n.° 94, supra, n.° 120).

105    De igual modo, relativamente aos auxílios regularmente notificados anteriormente à entrada em vigor de uma nova regulamentação, o Tribunal considerou que a Comissão tinha analisado correctamente um regime de auxílios à luz das regras decorrentes da sua prática anterior e não da nova regulamentação entretanto entrada em vigor, uma vez que esta última só se aplica aos auxílios que entraram ou se mantiveram em vigor depois de determinada data, posterior ao período relativos aos auxílios em causa (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 27 de Novembro de 2003, Regione Siciliana/Comissão, T‑190/00, Colect., p. II‑5015, n.os 94 a 96).

106    Em contrapartida, tendo em conta o facto de o novo enquadramento em matéria de protecção do ambiente, que entrou em vigor posteriormente à notificação do auxílio em causa, prever expressamente, no seu n.° 82, que a Comissão devia aplicar as respectivas disposições «a todos os projectos de auxílios notificados sobre os quais deliberar[ia] após a sua publicação no Jornal Oficial, mesmo se estes projectos tive[ssem] sido objecto de uma notificação antes da referida publicação», o Tribunal considerou que a Comissão tinha aplicado correctamente este último e não o que estava em vigor no momento da notificação (acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 18 de Novembro de 2004, Ferriere Nord/Comissão, T‑176/01, Colect., p. II‑3931, n.° 137).

107    Os referidos acórdãos confirmam que a aplicação dos critérios estabelecidos numa regulamentação entrada em vigor posteriormente à data em que os auxílios em causa tenham sido pagos ou notificados para efeitos da apreciação da sua compatibilidade com o mercado comum conduz a que essa regulamentação tenha efeito retroactivo. Em conformidade com a jurisprudência acima referida nos n.os 94 e 95, tal aplicação só é admissível se resultar dos termos, da finalidade ou da sistemática da nova regulamentação em causa que a mesma se destina a ser aplicada retroactivamente.

108    Face à conclusão precedente, há, por conseguinte, que verificar, em segundo lugar, se o regulamento de isenção PME se destinava a ser aplicado retroactivamente. Para esse efeito, há que levar em conta não só o seu teor, mas também o seu conteúdo, nomeadamente o objectivo que prossegue, e verificar, sendo caso disso, se a confiança legítima dos interessados foi devidamente respeitada.

109    No caso vertente, não se pode deixar de observar, em primeiro lugar, que o regulamento de isenção PME não contém nenhuma disposição transitória relativa à questão da sua eventual aplicação a regimes de auxílios notificados anteriormente à sua entrada em vigor.

110    A inexistência de disposições transitórias, contrariamente ao que sustenta a Comissão, não pode ser interpretada no sentido de que o regulamento de isenção PME era aplicável às notificações que estavam a ser analisadas no momento da sua entrada em vigor. Com efeito, a circunstância de a apreciação de um regime de auxílios à luz da legislação em vigor à data da notificação estar expressamente prevista nas disposições de determinados diplomas, como as do ponto 6.1 das orientações relativas aos auxílios com finalidade regional, dos n.os 98 e 100 das orientações comunitárias dos auxílios estatais de emergência e à reestruturação concedidos a empresas em dificuldade, do ponto 2.6 do enquadramento comunitário dos auxílios estatais no sector dos veículos automóveis, dos n.os 39 e 49 do enquadramento multisectorial dos auxílios com finalidade regional para grandes projectos de investimento e do artigo 9.°‑A do Regulamento de isenção, na redacção dada pelo Regulamento (CE) n.° 364/2004 da Comissão, de 25 de Fevereiro de 2004, que altera o Regulamento [de isenção PME] no que respeita à extensão do seu âmbito de aplicação por forma a incluir os auxílios à investigação e desenvolvimento (JO L 63, p. 22), não permite de modo algum concluir que a regulamentação em vigor à data da notificação só é aplicável quando essas disposições estiverem expressamente previstas na regulamentação posterior.

111    A este respeito, há que referir, por um lado, que a Comissão, noutros diplomas, inseriu disposições que prevêem expressamente a aplicação de novos critérios aos auxílios notificados antes da sua entrada em vigor, como as disposições do n.° 82 do enquadramento comunitário dos auxílios estatais a favor do ambiente e do artigo 11.°, n.° 2, do Regulamento (CE) n.° 2204/2002 da Comissão, de 12 de Dezembro de 2002, relativo à aplicação dos artigos 87.° e 88.° do Tratado CE aos auxílios estatais ao emprego (JO L 337, p. 3). Por outro, embora nada impeça a Comissão de prever, nos diplomas que especificam os critérios que tenciona utilizar para analisar a compatibilidade de um auxílio ou de um regime de auxílios, medidas que regulem especificamente a aplicação no tempo das disposições que contêm esse critérios, essa possibilidade não pode pôr em causa o princípio decorrente da jurisprudência acima referida nos n.os 94 e 95 segundo a qual, na falta dessas medidas, as disposições que contêm os novos critérios não são aplicáveis aos auxílios notificados anteriormente à sua entrada em vigor.

112    Em segundo lugar, o regulamento de isenção PME não contém quaisquer indicações, nem sequer implicitamente, que permitam considerar que o mesmo era retroactivamente aplicável.

113    Com efeito, a finalidade do regulamento de isenção PME consiste, por um lado, em dar execução ao regulamento de habilitação, prevendo, para a categoria de auxílios às pequenas e médias empresas, os requisitos que esses auxílios devem preencher para que os Estados‑Membros sejam isentos da obrigação de os notificar, para, nomeadamente, simplificar a gestão administrativa sem descurar o controlo e aumentar a transparência e a segurança jurídica. É óbvio que, à luz de tal objectivo, designadamente de permitir que os próprios Estados‑Membros verifiquem se um projecto de auxílio está em conformidade com os critérios estabelecidos pelo regulamento de isenção PME e, portanto, não está sujeito à obrigação de notificação prevista no artigo 88.°, n.° 3, CE, o referido regulamento só podia ser aplicável para o futuro e, por conseguinte, não podia ser aplicável às notificações já efectuadas.

114    Por outro, a Comissão explicou que o regulamento de isenção também tem o objectivo de substituir os critérios estabelecidos pelo enquadramento comunitário PME de 1996, como resulta da formulação do seu quarto considerando, que indica que o referido enquadramento «deve ser abolido a partir da data de entrada em vigor do presente regulamento, uma vez que as suas disposições são substituídas pelo presente regulamento». Sendo a questão em causa a de saber se os novos critérios se aplicavam às notificações pendentes, há todavia de recordar que, no mesmo considerando, se afirma que o regulamento não prejudica a «possibilidade que assiste aos Estados‑Membros de notificarem os auxílios às pequenas e médias empresas» e que, nesse caso, «[t]ais notificações serão apreciadas pela Comissão, em especial à luz dos critérios fixados no presente regulamento». O teor do referido considerando, ao prever que os Estados‑Membros mantêm a possibilidade de notificar auxílios abrangidos pela categoria prevista no regulamento de isenção PME, só pode, portanto, referir‑se a notificações – efectuadas a título excepcional – posteriores à entrada em vigor do referido regulamento.

115    É verdade que a substituição do enquadramento comunitário PME de 1996 pelo regulamento de isenção PME, conforme anunciado pelo referido quarto considerando, podia indicar implicitamente que a Comissão tinha intenção de adoptar uma política mais estrita em matéria de auxílios de Estado às pequenas e médias empresas também relativamente aos auxílios notificados. Todavia, esse simples facto não pode ser considerado suficiente para chegar à conclusão de que o regulamento de isenção PME era retroactivamente aplicável, tanto mais que o mesmo considerando dispõe que os auxílios a notificar no futuro serão apreciados, «em especial», ou seja, não exclusivamente, à luz dos critérios fixados pelo referido regulamento. Ora, se um regime de auxílios regularmente notificado posteriormente à entrada em vigor do regulamento de isenção PME não tem que ser apreciado unicamente à luz dos critérios por ele fixados, não se pode sustentar que o objectivo prosseguido por esse mesmo regulamento exige que lhe seja atribuído, a título excepcional, efeito retroactivo.

116    Além disso, só se podia admitir uma aplicação retroactiva do regulamento de isenção PME se a confiança legítima dos interessados fosse devidamente respeitada. Nesta matéria, há que salientar que a circunstância invocada pela Comissão de a República Federal da Alemanha ter conhecimento da evolução futura dos critérios de apreciação do regime de auxílios em causa à data da notificação do referido regime em nada altera essa conclusão. Com efeito, embora seja verdade que os Estados‑Membros tomaram parte no processo legislativo que levou à adopção do regulamento de isenção PME, não é menos verdade, por um lado, que os Estados‑Membros não podem prever nem o teor definitivo do diploma que virá a ser adoptado a final nem a data da sua entrada em vigor e, por outro, que o referido regulamento tem por finalidade estabelecer os requisitos de que depende a isenção da obrigação de notificação prevista no artigo 88.°, n.° 3, CE, e não a autorização de um auxílio notificado. Por outro lado, o projecto de regulamento de isenção, na versão que foi publicada no Jornal Oficial em 28 de Março de 2000 (JO C 89, p. 15), não continha o considerando acima referido no n.° 114 nem outras indicações relativas ao facto de o enquadramento comunitário PME de 1996 ser revogado e substituído pelo referido regulamento. Nessas condições, uma aplicação retroactiva do referido regulamento não preencheria nem o requisito do respeito pela confiança legítima dos interessados nem o da observância do princípio da segurança jurídica.

117    Por outro lado, o facto de os diplomas que a Comissão publica em matéria de auxílios de Estado, como ela própria salientou, terem por finalidade garantir a transparência e a previsibilidade da sua prática em matéria de autorização opõe‑se, em princípio, a que a Comissão aprecie a compatibilidade de um auxílio baseando‑se numa regulamentação que entrou em vigor quando a notificação já foi feita e a análise da compatibilidade do auxílio já se iniciou. Claramente, tal modo de proceder tem por consequência a redução, ou mesmo a eliminação, da previsibilidade da prática de autorização da Comissão e não pode senão colocar os Estados‑Membros numa situação de insegurança jurídica, no sentido de que não podem adquirir qualquer confiança no facto de um projecto de auxílios por si redigido à luz dos critérios fixados pela regulamentação em vigor no momento da notificação ser analisado pela Comissão à luz desses mesmos critérios.

118    A este respeito, há que observar que, através de uma Comunicação relativa à determinação das regras aplicáveis à apreciação dos auxílios estatais concedidos ilegalmente (JO 2002, C 119, p. 22), a Comissão, numa preocupação de transparência e de segurança jurídica, informou os Estados‑Membros e os terceiros de que apreciaria sempre a compatibilidade dos auxílios de Estado não notificados com o mercado comum de acordo com os critérios materiais estabelecidos por qualquer instrumento legal em vigor na data da respectiva concessão. Ora, não é admissível que, para efeitos de determinação da regulamentação aplicável para apreciar a compatibilidade de um auxílio com o mercado comum, uma situação se deva considerar «adquirida» quando estão em causa auxílios concedidos tendo sido violada a obrigação de notificação, no sentido de que esses auxílios devem ser analisados à luz dos critérios em vigor no momento em que foram pagos, em conformidade com a referida comunicação e com o acórdão Falck e Acciaierie di Bolzano/Comissão, referido n.° 94, supra (n.° 118), e «provisória» quando estão em causa auxílios regularmente notificados, relativamente aos quais os critérios de análise poderiam legitimamente mudar até à véspera da decisão final e quando todo o procedimento foi conduzido tendo em conta os critérios estabelecidos pela regulamentação anteriormente em vigor.

119    A aplicação prática de tal tese seria uma fonte de insegurança jurídica para os Estados‑Membros e poderia ter efeitos negativos uma vez que, prevendo a evolução da regulamentação aplicável num sentido mais estrito, os Estados‑Membros poderiam ser levado a executar um auxílio em vez de o notificarem à Comissão. Por outro lado, tal resultado contrariaria a jurisprudência segundo a qual é de evitar qualquer interpretação que resulte no favorecimento da infracção, pelo Estado‑Membro em causa, do artigo 88.°, n.° 3, CE (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 21 de Novembro de 1991, Fédération nationale du commerce extérieur, C‑354/90, Colect., p. I‑5505, n.° 16, e de 21 de Outubro de 2003, Van Calster e o., C‑261/01 e C‑262/01, Colect., p. I‑12249, n.° 63). Com efeito, se, no âmbito de um projecto de auxílio, compatível ou não com o mercado comum, o facto de não respeitar o artigo 88.°, n.° 3, CE não originasse mais riscos ou não aumentasse a possibilidade de aplicação de sanções em relação a uma situação de observância dessa mesma disposição, o incentivo dos Estados‑Membros para procederem à notificação e esperarem por uma decisão relativa à compatibilidade seria consideravelmente reduzido [conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs no processo Transalpine Ölleitung in Österreich e o., ainda não publicadas na Colectânea, n.° 50 (acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de Outubro de 2006, C‑368/04)].

120    Em conclusão, resulta tanto dos termos como da finalidade do regulamento de isenção PME, bem como das exigências decorrentes da observância dos princípios da protecção da confiança legítima e da segurança jurídica, que esse regulamento não era retroactivamente aplicável.

121    Esta conclusão não é infirmada pelo facto de, como foi acima referido no n.° 86, a Comissão ter autorizado numerosos regimes de auxílios notificados antes da entrada em vigor do regulamento de isenção PME com base neste, uma vez que não se tinha pronunciado sobre esses regimes antes da entrada em vigor do referido regulamento. A este respeito, basta referir que uma prática da Comissão contrária aos princípios decorrentes da jurisprudência não pode prevalecer. Além disso, como afirmou o recorrente, não tendo a Comissão contestado esse ponto, estavam em causa medidas de auxílios ao investimento ou à formação, relativamente às quais os critérios de apreciação, nomeadamente o da intensidade de auxílio admitida, se tinham mantido inalterados em relação aos da regulamentação anterior (v. n.° 76, supra), de modo que a confiança legítima dos interessados não podia, de qualquer forma, ser afectada.

122    Há, no entanto, que observar que, embora a Comissão deva iniciar a apreciação da compatibilidade de um auxílio imediatamente após a recepção da notificação, portanto, à luz dos critérios estabelecidos pela regulamentação em vigor nessa data, tal apreciação só pode ser verdadeiramente empreendida depois de todas as informações necessárias terem sido comunicadas, ou seja, a partir do momento em que a notificação esteja completa. Nesta perspectiva, mas também para evitar que seja efectuada uma notificação numa fase em que não contenha todos os elementos necessários à sua análise e em que a data da notificação possa ser escolhida em função e prevendo uma alteração dos critérios à luz dos quais deve ser apreciada a compatibilidade do auxílio, há que considerar que a regulamentação aplicável é a que está em vigor no momento em que a notificação estiver completa.

123    Consequentemente, há que verificar se, no caso em apreço, como alega o recorrente, a notificação inicial estava completa, de modo a que a Comissão não pudesse invocar, como fez no n.° 56 da decisão impugnada, que a notificação só tinha ficado completa posteriormente à entrada em vigor do regulamento de isenção PME para considerar que este era aplicável.

 Quanto ao fundamento relativo à exaustividade da notificação inicial

–       Quanto à admissibilidade do fundamento

124    A Comissão invoca a inadmissibilidade do fundamento do recorrente relativo ao carácter completo da notificação inicial, por um lado, porque não foi invocado no procedimento formal de investigação e, por outro, porque a República Federal da Alemanha e o recorrente não se opuseram à abertura nem ao prosseguimento do procedimento formal de investigação, reconhecendo assim a legalidade do referido procedimento e a necessidade das informações pedidas. O recorrente não podia, portanto, contestar a decisão final invocando reservas que deveria ter feito numa fase anterior do procedimento. Na tréplica, a Comissão esclareceu que a inadmissibilidade desse fundamento se encontrava estreitamente ligada ao facto de a República Federal da Alemanha não ter feito uso da faculdade que lhe é conferida pelo artigo 4.°, n.° 6, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado e que o recorrente, por conseguinte, não tinha qualquer interesse jurídico em interpor um recurso sobre esse ponto.

125    A alegação de inadmissibilidade do presente fundamento não pode ser acolhida.

126    Em primeiro lugar, há que observar que o recorrente, ao sustentar que a notificação inicial estava completa, pretendia demonstrar que o regime de auxílios em causa não deveria ter sido apreciado à luz do regulamento de isenção PME, que entrou em vigor posteriormente à referida notificação. Contrariamente às afirmações da Comissão a este respeito, trata‑se de uma posição que a República Federal da Alemanha expressou, nomeadamente, nas observações que apresentou relativamente à abertura do procedimento formal de investigação, em que afirmou que «[a]s autoridades alemãs não partilham da opinião da Comissão segundo a qual a análise do regime de auxílios não podia ser efectuada com base nos documentos transmitidos em 3 de Janeiro de 2001 e consequentemente mantêm a sua opinião segundo a qual o regime de auxílios deve ser analisado com base no [enquadramento comunitário PME de 1996], que estava em vigor no momento da notificação».

127    Em segundo lugar, há que salientar que, como resulta da jurisprudência, a possibilidade de impugnar uma decisão de abertura de um procedimento não pode ter a consequência de reduzir os direitos processuais das partes interessadas, impedindo‑as de impugnar a decisão final e de arguir, em apoio do seu pedido, vícios relativos a todas as etapas do procedimento que levou a essa decisão. Com efeito, é incontestável que a decisão de dar início ao procedimento formal de investigação, apesar de ter efeitos jurídicos próprios e autónomos, tem um carácter preparatório em relação à decisão final que definirá definitivamente a posição da Comissão e em que esta última pode recuar relativamente às apreciações feitas na decisão de abertura. Por outro lado, admitir a tese da Comissão teria a consequência de antecipar os debates sobre o mérito e de confundir as diferentes fases dos processos administrativo e judicial, esvaziando de sentido o objectivo essencial do procedimento formal de investigação, que é o de permitir às partes interessadas apresentarem as suas observações sobre todos os aspectos controversos do processo e à Comissão tomar a decisão final tendo em conta essas observações (v., neste sentido, acórdão Regione Siciliana/Comissão, referido no n.° 105, supra, n.os 47, 48 e 51).

128    No caso em apreço, basta referir que a decisão impugnada é a decisão final que encerrou o procedimento e que produziu efeitos jurídicos vinculativos e definitivos para as partes interessadas, incluindo no que diz respeito à determinação da regulamentação aplicável. Assim, o recorrente tem que dispor de um meio processual para reagir contra a decisão no seu todo, incluindo na parte em que afirma que a notificação inicial só ficou completa numa data posterior à entrada em vigor do regulamento de isenção PME (v., neste sentido, acórdão Regione Siciliana/Comissão, referido no n.° 105, supra, n.° 49).

129    Quanto ao argumento da Comissão segundo o qual o recorrente não tem qualquer interesse jurídico em interpor um recurso relativamente à alegada exaustividade da notificação inicial porque não fez uso da faculdade que lhe é conferida pelo artigo 4.°, n.° 6, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, de executar o regime de auxílios em causa depois de o ter previamente comunicado à Comissão, há que mencionar que a única consequência que se pode daí extrair é a de o projecto notificado não ter adquirido o estatuto de regime de auxílios existente. Tendo o regime de auxílios em causa, por conseguinte mantido o seu estatuto de auxílio novo, a Comissão podia, com razão, decidir proceder à abertura do procedimento formal de investigação (v., neste sentido, acórdão Regione autonoma della Sardegna/Comissão, referido no n.° 56, supra, n.° 49), o que não foi impugnado pelo recorrente.

130    Decorre do exposto que não se pode validamente sustentar que, pelo facto de não ter interposto recurso no prazo legal da decisão de dar início ao procedimento formal de investigação e de não ter feito uso do artigo 4.°, n.° 6, do Regulamento de Processo, o recorrente já não pode invocar, no âmbito do presente recurso interposto da decisão final, que a Comissão considerou erradamente que a notificação não estava completa e que, por essa razão, protelou indevidamente a análise da notificação.

131    O fundamento relativo à exaustividade da notificação inicial é, portanto, admissível.

–       Quanto ao mérito

132    Há que recordar que, por força do disposto no artigo 4.° do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, que define os prazos a que está sujeita a apreciação dos auxílios notificados, a Comissão dispõe do prazo de dois meses para declarar, após análise preliminar, quer que a medida notificado não é um auxílio quer que não há dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum, quer ainda que a medida notificada suscita dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum, caso em que deverá dar início ao procedimento previsto no artigo 88.°, n.° 2, CE. O prazo de dois meses começa a correr no dia seguinte ao da recepção de uma notificação completa (artigo 4.°, n.° 5, segundo período, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado).

133    Há que recordar igualmente que, de acordo com a jurisprudência assente que consagrou os princípios aplicáveis anteriormente à entrada em vigor do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, para que uma notificação esteja completa, basta que a Comissão disponha, na fase preliminar de investigação, de todas as informações que lhe permitam concluir, sem que seja necessário um exame aprofundado, se as medidas estatais são compatíveis com o Tratado e distingui‑las das que suscitam dúvidas quanto a tal compatibilidade (acórdão Áustria/Comissão, referido no n.° 80, supra, n.° 54). Basta, por conseguinte, para efeitos da fase preliminar, que a notificação contenha, desde o início ou na sequência das respostas do Estado‑Membro às questões colocadas pela Comissão, as informações necessárias para permitir que esta forme uma primeira opinião sobre a compatibilidade do auxílio com o Tratado (acórdãos Lorenz, referido no n.° 53, supra, n.° 3; Áustria/Comissão, referido no n.° 80, supra, n.° 56, e Regione autonoma della Sardegna/Comissão, referido no n.° 56, supra, n.° 40).

134    Quanto ao regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, o artigo 2.°, n.° 2, dispõe que uma notificação está completa quando o «Estado‑Membro em causa […] fornecer todas as informações necessárias para que a Comissão possa tomar uma decisão nos termos dos artigos 4.° e 7.° [‘notificação completa’]». O mesmo regulamento prevê, no artigo 4.°, n.° 5, terceiro período, e no artigo 5.°, n.° 3, através de uma segunda definição («[a] notificação considerar‑se‑á completa» ou «[o Estado‑Membro] considera a notificação completa»), o momento a partir do qual se deve que considerar que a Comissão dispõe de todas as informações necessárias, concretamente, quando a Comissão não solicitar mais informações ou na sequência de uma declaração devidamente fundamentada nesse sentido por parte do Estado‑Membro em causa. Esta segunda definição tem, portanto, por finalidade essencial, fixar o dia em que começa a correr o prazo de dois meses previsto no artigo 4.°, n.° 5, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, o que tem consequências significativas não apenas para os Estados‑Membros, mas também para a Comissão.

135    A definição de notificação completa contida no artigo 4.°, n.° 5, terceiro período, bem como a que resulta indirectamente do artigo 5.°, n.° 3, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, devem ser conjugados com, e em função da finalidade do artigo 4.°, n.° 6, do mesmo regulamento, que dispõe que, quando a Comissão, perante uma notificação completa na acepção das disposições acima referidas, não tomar uma decisão no prazo de dois meses, «considerar‑se‑á que o auxílio foi autorizado pela Comissão» e «[o] Estado‑Membro em causa pode então executar as medidas em questão após informação prévia à Comissão». Tal disposição confere, portanto, aos Estados‑Membros, a possibilidade de evitar que a Comissão prolongue artificialmente a duração da fase preliminar de investigação, deixando‑os assim numa situação de insegurança jurídica quanto ao destino do auxílio projectado.

136    Decorre do exposto que o facto de o Estado‑Membro em causa não se opor, com base no artigo 5.°, n.° 3, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado, a uma eventual utilização dos pedidos de informações complementares com intuito dilatório não pode, como foi acima salientado no n.° 129, ter outro efeito negativo para além do expressamente previsto pelo sistema em causa, ou seja, a impossibilidade de se prevalecer da faculdade prevista no artigo 4.°, n.° 6, desse mesmo regulamento, que consiste em executar o regime de auxílios projectado e no facto de o ver assim transformado em regime de auxílios existente.

137    Daqui decorre que esse mesmo facto de modo algum permite concluir que a notificação não estava completa, sendo o critério determinante, nesta matéria, em conformidade com a jurisprudência acima referida no n.° 133, que a notificação contenha todas as informações necessárias para permitir que a Comissão forme uma primeira opinião sobre a compatibilidade do auxílio com o Tratado.

138    Esta conclusão não é infirmada pelo facto de o artigo 2, n.° 2, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado exigir, para que a notificação esteja completa, a comunicação de todas as informações de que a Comissão necessita quer para efeito da decisão que deve adoptar no termo da investigação preliminar quer para efeitos da adopção da decisão final sobre a compatibilidade do auxílio e não limitar, portanto, todas as informações pedidas na notificação às que são necessárias para permitir à Comissão tomar a decisão que deve ser tomada no termo da fase preliminar de investigação. Com efeito, o artigo 2.°, n.° 2, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado deve ser interpretado tendo em conta o facto de a Comissão ser obrigada a dar início ao procedimento formal de investigação quando a medida notificada suscite dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado comum e dever, por conseguinte, conhecer todos os elementos de facto necessários para esse efeito. No que diz respeito a todas as outras informações que possam revelar‑se necessárias para efeitos da adopção da decisão final sobre a compatibilidade do auxílio, basta referir que nem o Estado‑Membro em causa nem a Comissão conhecem antecipadamente as informações que virão a ser necessárias para a adopção da decisão final, sendo certo que a necessidade de obter tais informações só pode fazer‑se sentir no decurso do procedimento formal de investigação, nomeadamente quando a Comissão toma conhecimento das observações apresentadas por terceiros interessados (v., neste sentido, conclusões do advogado‑geral F. G. Jacobs no processo Áustria/Comissão, referido no n.° 89, supra, n.os 90 e 91).

139    Consequentemente, há que considerar que, como resulta do artigo 2.°, n.° 2, do regulamento relativo ao procedimento aplicável aos auxílios de Estado e em conformidade com a jurisprudência acima referida no n.° 133, para que uma notificação esteja completa, para efeitos da fase preliminar de investigação, basta que contenha as informações necessárias para permitir que a Comissão forme uma primeira opinião sobre a compatibilidade da medida notificada com o mercado comum e decida, havendo dúvidas a esse respeito, dar início ao procedimento formal de investigação.

140    É à luz das considerações precedentes que há que analisar o conteúdo da correspondência trocada entre a Comissão e a República Federal da Alemanha e determinar se, como alega o recorrente, a notificação inicial estava completa.

141    A este respeito, há que recordar que, na sequência da notificação inicial de 29 de Dezembro de 2000, a Comissão pediu informações complementares à República Federal da Alemanha em duas ocasiões, ou seja, em 5 de Fevereiro e 5 de Setembro de 2001. A República Federal da Alemanha respondeu por ofícios de 12 de Março e 9 de Outubro de 2001, respectivamente.

142    Relativamente ao primeiro pedido de informações, transmitido por ofício de 5 de Fevereiro de 2001, a Comissão limitou‑se a perguntar à República Federal da Alemanha «se as actividades assistidas ‘Soft Aides’ [eram] compatíveis com o regulamento de isenção […] [PME] […], isto é, se o montante do auxílio previsto na notificação em causa [podia] ser reduzido ao montante previsto pelo regulamento de isenção PME», e esclareceu que, «[n]o caso de tal não [ser] possível, [era] necessária uma fundamentação específica (necessidade e compatibilidade em termos de política económica)».

143    Como correctamente salienta o recorrente, a Comissão, no seu ofício de 5 de Fevereiro de 2001, pediu à República Federal da Alemanha, por um lado, um parecer quanto à compatibilidade dos auxílios relativos aos serviços de consultadoria com o regulamento de isenção PME e, por outro, perguntou‑lhe se estava disposta a reduzir o montante dos auxílios em causa para os tornar compatíveis com o referido regulamento. Ora, não se pode considerar que esse pedido se destinava a obter informações de facto necessárias para apreciar a compatibilidade do regime de auxílios notificado, devendo antes considerar‑se, juntamente com o pedido de parecer, uma sugestão à República Federal da Alemanha no sentido de introduzir as alterações necessárias para tornar o regime de auxílios em causa conforme às disposições do regulamento de isenção PME, que entrou em vigor três dias antes.

144    Quanto ao segundo pedido de informações da Comissão, dirigido à República Federal da Alemanha por ofício de 5 de Setembro de 2001, destinava‑se, como a própria Comissão esclareceu quando respondeu por escrito a uma pergunta colocada pelo Tribunal, a determinar se, tendo em conta a entrada em vigor do regulamento de isenção PME, a República Federal da Alemanha mantinha a notificação em relação a todos os subprogramas inicialmente notificados. Também as informações desse tipo, que aliás já tinham sido prestadas no âmbito da comunicação da República Federal da Alemanha de 2 de Agosto de 2001, em nada diziam respeito a elementos factuais necessários para proceder à apreciação da compatibilidade do regime de auxílios notificado.

145    Face ao exposto, há que concluir que nem o pedido de 5 de Fevereiro de 2001 nem o de 5 de Setembro de 2001 podem ser qualificados como pedidos de informações de facto necessárias para completar a notificação inicial e permitir à Comissão proceder à análise da compatibilidade do regime de auxílios notificado pela República Federal da Alemanha. Com efeito, o próprio teor dos dois pedidos formulados pela Comissão indica que a mesma já tinha uma opinião formada quanto à incompatibilidade do regime de auxílios em causa com o mercado comum devido à sua desconformidade com o regulamento de isenção PME.

146    Esta conclusão não é posta em causa pelo teor das respostas da República Federal da Alemanha aos ofícios da Comissão de 5 de Fevereiro e 5 de Setembro de 2001.

147    Assim, na sua resposta de 12 de Março de 2001 ao ofício da Comissão de 5 de Fevereiro de 2001, a República Federal da Alemanha, no n.° I da comunicação junta a essa resposta, expôs claramente a sua posição no que diz respeito à questão de saber se «as rubricas de auxílios relativas à ‘soft aid’ [deviam] ser compatibilizadas com os requisitos do regulamento de isenção». Sobre essa questão, a República Federal da Alemanha teceu as seguintes considerações:

«[…] no momento da notificação do regime de auxílios, o regulamento de isenção [PME] ainda não tinha entrado em vigor. Em consequência, as autoridades alemãs não podiam basear‑se nos critérios do regulamento de isenção [PME] no momento da notificação […] É a situação jurídica existente no momento da notificação que e pertinente para efeitos da análise de um auxílio de Estado […] As autoridades alemãs consideram, por conseguinte, que o presente regime de auxílio continua a dever ser apreciado com base nos critérios do enquadramento comunitário [PME de 1996]».

148    No n.° II dessa mesma comunicação, a República Federal da Alemanha afirmou que, de qualquer forma, a seu ver, o regime de auxílios notificado também deveria ser autorizado com base nos critérios do regulamento de isenção PME. Com efeito, apesar de esse regime não estar em conformidade com o referido regulamento em todos os aspectos, a Comissão podia analisá‑lo directamente à luz do Tratado CE, fazendo uso do seu amplo poder de apreciação.

149    Foi no contexto dessa tomada de posição relativamente à manutenção da notificação inicial que a República Federal da Alemanha fez um esclarecimento a respeito do subprograma «serviços de consultadoria intensiva/coaching» quanto à intensidade do auxílio. Com efeito, na comunicação junta à resposta de 12 de Março de 2001, refere‑se que:

«Para completar a orientações actualmente notificadas, é previsto um limite máximo geral dos auxílios de 50% em conformidade com o disposto no regulamento de isenção […] PME a acrescer ao limite máximo absoluto dos auxílios. É prevista uma intensidade dos auxílios superior em 65% ao limite máximo para as pequenas empresas (de acordo com a definição da UE), desde que não ultrapasse os referidos limites absolutos.»

150    Face ao exposto, não se pode deixar de concluir, por um lado, que a única questão concreta que consta do ofício da Comissão de 5 de Fevereiro de 2001 apenas diz respeito a um aspecto, concretamente, a intensidade do auxílio de um só dos seis subprogramas que constituem o regime de auxílios notificado, ou seja, o que respeita aos «serviços de consultadoria intensiva/coaching». Por outro, o esclarecimento prestado pela República Federal da Alemanha relativamente a essa questão, que contém, é certo, um elemento novo, não pode ser qualificado como informação necessária para apreciar a compatibilidade do auxílio, uma vez que a Comissão podia deduzir da notificação que o facto de ter previsto unicamente um limite máximo em valor absoluto originaria necessariamente intensidades de auxílio superiores a 50%.

151    Com efeito, como o recorrente salientou na sua resposta às questões colocadas pelo Tribunal e como podia deduzir‑se fazendo um simples cálculo, o limite máximo fixado em valor absoluto implicava que a empresa em causa pudesse beneficiar, na melhor das hipóteses, de um auxílio de 72,73%, e de 83,3% se fosse uma empresa nova. Através da introdução de um limite máximo em percentagem, a República Federal da Alemanha levou a taxa de auxílio a 50%, e a 65% para as novas empresas, mantendo, portanto, para estas últimas, uma intensidade de auxílio máxima que ultrapassava a de 50% prevista pelo regulamento de isenção PME. A este respeito, há que acrescentar que também está prevista uma taxa de auxílio que ultrapassa 50% no que diz respeito ao subprograma «participação em feiras» (taxa de 60% para as pequenas empresas localizadas nas zonas confrontadas com problemas específicos), ao subprograma «cooperação» (taxa geral de 65% e até 80% para determinados projectos específicos) e ao subprograma «promoção do design de produtos» (taxa de 70% para as pequenas empresas localizadas nas zonas confrontadas com problemas específicos).

152    Consequentemente, o impacto sobre a apreciação da compatibilidade do regime de auxílios em causa da introdução de um limite máximo em percentagem também no que diz respeito ao subprograma «serviços de consultadoria intensiva/coaching», a acrescer ao limite máximo em valor absoluto dos auxílios projectados, tem um carácter marginal, baseando‑se as dúvidas da Comissão relativas à incompatibilidade da totalidade do regime com o mercado comum no facto de se ultrapassar a taxa de 50% de intensidade do auxílio, tal como fixada no regulamento de isenção PME. De qualquer forma, a resposta à questão formulada no ofício da Comissão de 5 de Fevereiro de 2001 não era necessária, devido ao seu limitado alcance, para que a Comissão pudesse formar uma primeira opinião sobre a compatibilidade da totalidade do projecto de auxílios notificado com o mercado comum.

153    Relativamente à resposta de 9 de Outubro de 2001 ao ofício da Comissão de 5 de Setembro de 2001, a República Federal da Alemanha, para além de ter prestado informações acessórias na sequência de uma reunião de 14 de Junho de 2001 entre a Comissão e as autoridades alemãs, limitou‑se a reiterar que mantinha a notificação inicial, nomeadamente pelo facto de o regime notificado estar em conformidade com o enquadramento comunitário PME de 1996 e de o referido regime dever ser apreciado à luz desse enquadramento, em vigor à data da sua notificação. No mesmo ofício, a República Federal da Alemanha, além disso, recordou que, em conformidade com a sua comunicação de 2 de Agosto de 2001, o regime de auxílios em causa tinha entretanto sido implementado, com base no artigo 9.°, n.° 1, do regulamento de isenção PME, até à data de autorização do regime de auxílios tal como foi notificado.

154    O próprio facto de, como resulta da comunicação de 2 de Agosto de 2001, já referida, a República Federal da Alemanha ter executado o regime de auxílios em causa dentro dos limites da sua conformidade com o regulamento de isenção PME, fixando o termo da respectiva validade em 31 de Dezembro de 2008 ou na data de autorização do regime tal como foi notificado, confirma que nunca alterou a sua notificação inicial para a tornar conforme ao regulamento de isenção PME. Com efeito, a República Federal da Alemanha utilizou a faculdade conferida pelo referido regulamento de executar um regime de auxílios sem o notificar e comunicou‑o à Comissão, nos termos do artigo 9.°, n.° 1, desse mesmo regulamento, ao mesmo tempo que manteve a sua notificação inicial, precisamente pelo facto de a notificação ter sido efectuada antes da entrada em vigor do referido regulamento.

155    Por último não se pode admitir que a notificação inicial não seja considerada completa devido ao facto de não preencher todos os requisitos, nomeadamente no que diz respeito à intensidade do auxílio, impostos pela regulamentação que entrou em vigor posteriormente à notificação inicial, ou seja, o regulamento de isenção PME. Com efeito, não só o recorrente contestou a aplicabilidade do referido regulamento precisamente pelo facto de ter entrado em vigor posteriormente à data da recepção da notificação inicial pela Comissão, mas também declarou expressamente manter a notificação inicial, fazendo simultaneamente uso da possibilidade de implementar o seu regime de auxílios, sem notificação prévia, como previsto no referido regulamento.

156    Resulta das considerações precedentes que a notificação inicial estava completa, na medida em que continha todos os elementos necessários para permitir que a Comissão apreciasse a sua compatibilidade com o mercado comum à luz dos critérios estabelecidos pela regulamentação em vigor à data da recepção da notificação inicial.

157    Por conseguinte, o segundo fundamento invocado pelo recorrente deve ser julgado procedente.

158    Consequentemente, face ao exposto e sem necessidade de analisar os restantes fundamentos invocados pelo recorrente, há que conceder provimento ao recurso e anular o artigo 2.°, segundo parágrafo, e os artigos 3.° e 4.° da decisão impugnada.

 Quanto às despesas

159    Por força do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão sido vencida, há que condená‑la nas despesas, de acordo com o pedido do recorrente.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA (Quinta Secção alargada)

decide:

1)      O artigo 2.°, segundo parágrafo, e os artigos 3.° e 4.° da Decisão 2003/226/CE da Comissão, de 24 de Setembro de 2002, relativa a um regime de auxílios que a Alemanha tenciona introduzir denominado «Orientações relativas ao apoio às pequenas e médias empresas – Melhoramento do desempenho empresarial no Land da Saxónia» – Subprogramas 1 (Coaching), 4 (Participação em feiras), 5 (Cooperação) e 7 (Promoção do design de produtos), são anulados.

2)      A Comissão das Comunidades Europeias é condenada nas despesas.

Vilaras

Martins Ribeiro

Dehousse

Šváby

 

      Jürimäe

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 3 de Maio de 2007.

O secretário

 

      O presidente

E. Coulon

 

      M. Vilaras

Índice

Quadro jurídico

Factos na origem do litígio

1.  Procedimento administrativo

2.  Decisão impugnada

Tramitação do processo e pedidos das partes

Questão de direito

1.  Quanto ao fundamento relativo à ilegalidade formal da decisão impugnada resultante do facto de a Comissão não ter aplicado o procedimento acelerado de autorização

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

2.  Quanto ao fundamento relativo à ilegalidade material da decisão impugnada resultante da não aplicabilidade do regulamento de isenção PME

Argumentos das partes

Apreciação do Tribunal de Primeira Instância

Quanto à aplicabilidade do regulamento de isenção PME às notificações pendentes à data da sua entrada em vigor

Quanto ao fundamento relativo à exaustividade da notificação inicial

–  Quanto à admissibilidade do fundamento

–  Quanto ao mérito

Quanto às despesas


* Língua do processo: alemão.