Language of document : ECLI:EU:C:2018:395

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

6 de junho de 2018 (*)

«Reenvio prejudicial — Diretiva 2003/96/CE — Tributação dos produtos energéticos e da eletricidade — Artigo 21.o, n.o 3 — Facto gerador de imposto — Consumo de produtos energéticos produzidos nas instalações de um estabelecimento que produz produtos energéticos — Produtos energéticos utilizados para fins diferentes dos de carburantes ou combustíveis de aquecimento — Consumo de um solvente como combustível numa instalação de destilação de alcatrão»

No processo C‑49/17,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Østre Landsret (Tribunal de Recurso da Região Este, Dinamarca), por decisão de 27 de janeiro de 2017, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 1 de fevereiro de 2017, no processo

Koppers Denmark ApS

contra

Skatteministeriet,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: R. Silva de Lapuerta, presidente de secção, C. G. Fernlund, A. Arabadjiev, S. Rodin e E. Regan (relator), juízes,

advogado‑geral: M. Szpunar,

secretário: R. Schiano, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 10 de janeiro de 2018,

vistas as observações apresentadas:

–        em representação da Koppers Denmark ApS, por L. Kjær, advokat,

–        em representação do Governo dinamarquês, por C. Thorning, na qualidade de agente, assistido por B. Søes Petersen, advokat,

–        em representação da Comissão Europeia, por C. Perrin e R. Lyal, na qualidade de agentes, assistidos por C. Bachmann, advogado,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 22 de fevereiro de 2018,

profere o presente

Acórdão

1        O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 21.o, n.o 3, da Diretiva 2003/96/CE do Conselho, de 27 de outubro de 2003, que reestrutura o quadro comunitário de tributação dos produtos energéticos e da eletricidade (JO 2003, L 283, p. 51).

2        Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Koppers Denmark ApS (a seguir «Koppers») ao Skatteministeriet (Ministério das Contribuições e Impostos, Dinamarca), a propósito do indeferimento do pedido, apresentado pela Koppers a este último, de reembolso do imposto sobre a energia pago relativamente ao seu consumo de solvente como combustível entre 1 de outubro de 2005 e 31 de dezembro de 2007 (a seguir «período relevante»).

 Quadro jurídico

 Direito da União

3        Os considerandos 2 a 7, 11, 12, 22 e 24 da Diretiva 2003/96 enunciam:

«(2)      A ausência de disposições comunitárias que sujeitem a uma taxa mínima de tributação da eletricidade e dos produtos energéticos que não os óleos minerais poderá ser prejudicial ao bom funcionamento do mercado interno.

(3)      O bom funcionamento do mercado interno e a realização dos objetivos das outras políticas comunitárias exigem a fixação de níveis mínimos de tributação a nível comunitário para a maioria dos produtos energéticos, incluindo a eletricidade, o gás natural e o carvão.

(4)      A existência de importantes diferenças entre os níveis nacionais de tributação da energia aplicados pelos Estados‑Membros poderá ser prejudicial ao bom funcionamento do mercado interno.

(5)      A fixação a níveis adequados das taxas mínimas comunitárias pode permitir reduzir as atuais diferenças entre os níveis nacionais de tributação.

(6)      Em conformidade com o artigo 6.o do Tratado [CE], as exigências em matéria de proteção do ambiente devem ser integradas na definição e aplicação das outras políticas comunitárias.

(7)      Como parte signatária da Convenção‑Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas, a Comunidade ratificou o Protocolo de Quioto; a tributação dos produtos energéticos e, sendo o caso, da eletricidade constitui um dos instrumentos disponíveis para a consecução dos objetivos do Protocolo de Quioto.

[…]

(11)      Cada Estado‑Membro é livre de decidir que disposições fiscais aplicará para pôr em prática o quadro comunitário de tributação dos produtos energéticos e da eletricidade, bem como de decidir não aumentar para o efeito a sua carga fiscal global se considerar que a implementação deste princípio de neutralidade fiscal poderá contribuir para a reestruturação e modernização dos seus regimes fiscais, incentivando comportamentos conducentes a uma maior proteção do ambiente e a uma utilização acrescida do fator trabalho.

(12)      Os preços da energia constituem elementos fundamentais das políticas comunitárias nos domínios da energia, dos transportes e do ambiente.

[…]

(22)      Quando utilizados como carburante ou combustível de aquecimento, os produtos energéticos deverão essencialmente estar sujeitos a um quadro comunitário. Nessa medida, decorre da própria natureza do sistema fiscal que se excluam do âmbito de aplicação desse quadro a dupla utilização dos produtos energéticos e a sua utilização para outros fins que não sejam o uso como carburante ou combustível, bem como os processos mineralógicos. Quando utilizada de forma semelhante, a eletricidade deverá ser tratada do mesmo modo.

[…]

(24)      Convém permitir aos Estados‑Membros a aplicação de determinadas outras isenções, ou de níveis reduzidos de tributação, sempre que tal não prejudique o bom funcionamento do mercado interno nem implique distorções da concorrência.»

4        O artigo 1.o desta diretiva dispõe:

«Os Estados‑Membros devem tributar os produtos energéticos e a eletricidade de acordo com o disposto na presente diretiva.»

5        O artigo 2.o da referida diretiva prevê:

«1.      Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por "produtos energéticos" os produtos adiante especificados:

[…]

b)      Os produtos abrangidos pelos códigos NC 2701, 2702 e 2704 a 2715;

[…]

4.      A presente diretiva não é aplicável:

[…]

b)      [À]s seguintes utilizações de produtos energéticos e eletricidade:

–        produtos energéticos utilizados para fins que não o de carburantes ou combustíveis de aquecimento.

[…]

Todavia, as disposições do artigo 20.o serão aplicáveis a estes produtos energéticos.»

6        Nos termos do artigo 21.o, n.o 3, desta diretiva:

«O consumo de produtos energéticos nas instalações de um estabelecimento que produz produtos energéticos não é considerado como facto gerador de imposto se disser respeito a produtos energéticos produzidos nas instalações do estabelecimento. Os Estados‑Membros podem também considerar como não sendo um facto gerador o consumo de eletricidade e de outros produtos energéticos não produzidos nas instalações desse estabelecimento, bem como o consumo de produtos energéticos e de eletricidade nas instalações de um estabelecimento que produz combustíveis destinados a serem utilizados na produção de eletricidade. […]»

 Direito dinamarquês

7        O solvente utilizado como combustível era, durante o período relevante, tributável na Dinamarca, nos termos do § 1, n.o 3, da mineralolieafgiftsloven (Lei relativa ao imposto sobre os óleos minerais), do § 1, n.o 1, ponto 1, da kuldioxidafgiftsloven (Lei relativa ao imposto sobre o dióxido de carbono) e do § 1, n.o 1, da svovlafgiftsloven (Lei relativa ao imposto sobre o enxofre).

8        O artigo 21.o, n.o 3, da Diretiva 2003/96 foi transposto para o direito dinamarquês pelo § 7, n.o 3, da Lei relativa ao imposto sobre o dióxido de carbono e pelo § 8, n.o 4, da Lei relativa ao imposto sobre o enxofre.

9        No período relevante, o § 7, n.o 3, da Lei relativa ao imposto sobre o dióxido de carbono tinha a seguinte redação:

«Os produtos energéticos abrangidos pelo âmbito de aplicação do § 2, n.o 1, quando sejam utilizados diretamente na produção de um produto energético equivalente, estão isentos do imposto sobre o dióxido de carbono. Esta disposição não é aplicável, contudo, aos produtos energéticos que são utilizados como carburante.»

10      No mesmo período, o § 8, n.o 4, da Lei relativa ao imposto sobre o enxofre previa:

«Os produtos energéticos abrangidos pelo âmbito de aplicação do § 1, quando sejam utilizados diretamente na produção de um produto energético equivalente, estão isentos do imposto sobre o enxofre. Esta disposição não é aplicável, contudo, aos produtos energéticos que são utilizados como carburante.»

 Litígio no processo principal e questões prejudiciais

11      Nas suas instalações em Nyborg (Dinamarca), a Koppers produz, por refinação e destilação de alcatrão de hulha, os seguintes produtos: breu (ânodos) de alcatrão de carvão, negro de carbono para refinação, creosoto, naftaleno, resíduos de destilação de naftaleno (NSR) e solventes. O produto principal da Koppers é o alcatrão de carvão, que representa cerca de 45% dos seus produtos acabados. A produção de solventes da Koppers representa cerca de 3% a 4% da sua produção total.

12      A Koppers exerce as suas atividades em duas unidades interconectadas e codependentes de uma mesma fonte de abastecimento de calor comum, sendo uma de destilação de alcatrão de hulha e a outra de produção de naftaleno. Os resíduos da unidade de destilação de alcatrão de hulha são reprocessados na unidade de produção de naftaleno e o solvente, produzido de forma acessória nesta última, é usado como combustível na unidade de destilação de alcatrão de hulha. O solvente é também utilizado como combustível auxiliar na combustão de gás de destilação tanto da unidade de destilação de alcatrão de hulha como da unidade de produção de naftaleno. O calor produzido no processo de combustão é reutilizado nessas unidades.

13      Resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que todos os produtos produzidos pela Koppers nas suas instalações de Nyborg estão classificados com os códigos 2707 ou 2708 da Nomenclatura Combinada que consta do Anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (JO 1987, L 256, p. 1, a seguir «NC»), e podem ser utilizados como combustível. No entanto, o solvente é o único produto produzido nas instalações da Koppers que esta utiliza como combustível e que, por conseguinte, pode ser sujeito a impostos sobre a energia.

14      A Koppers declarou inicialmente o seu consumo de solvente como sujeito a tributação, mas pediu, por cartas de 13 de novembro de 2008 e de 22 de dezembro de 2008, o reembolso do imposto relativo ao período relevante, alegando que tal consumo estava isento.

15      Em 24 de setembro de 2010, a SKAT (Administração Fiscal, Dinamarca) adotou uma decisão nos termos da qual o consumo de solvente como combustível na unidade de destilação de alcatrão de hulha não beneficiava de isenção de imposto, dado que o solvente não era utilizado para fabricar uma energia equivalente, uma vez que os produtos produzidos não eram tributáveis.

16      A Koppers reclamou desta decisão no Landsskatteret (Comissão Tributária Nacional, Dinamarca), que, em 8 de junho de 2015, confirmou a decisão da Administração Fiscal com o fundamento, nomeadamente, de que o consumo do solvente como combustível pela Koppers não estava abrangido pelo artigo 21.o, n.o 3, da Diretiva 2003/96, uma vez que o solvente não era utilizado na produção de produtos energéticos incluídos no âmbito de aplicação desta diretiva.

17      Em 7 de setembro de 2015, a Koppers interpôs recurso da decisão do Landsskatteret (Comissão Tributária Nacional) para o Retten i Svendborg (Tribunal de Comarca de Svendborg, Dinamarca), o qual decidiu, tendo em conta as questões de princípio suscitadas pelo litígio, remeter o processo ao Østre Landsret (Tribunal de Recurso da Região Este, Dinamarca), que decide em primeira instância.

18      Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a solução do litígio que lhe foi submetido depende da interpretação do artigo 21.o, n.o 3, desta diretiva, que suscita dúvidas razoáveis.

19      Nestas circunstâncias, o Østre Landsret (Tribunal de Recurso da Região Este) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)      Deve o artigo 21.o, n.o 3, da Diretiva 2003/96 […] ser interpretado no sentido de que o consumo de produtos energéticos de produção própria para a produção de outros produtos energéticos está isento de imposto numa situação como a do processo principal, em que os produtos energéticos produzidos não são utilizados como [carburantes ou combustíveis de aquecimento]?

2)      Deve o artigo 21.o, n.o 3, da Diretiva 2003/96 […] ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros podem restringir o âmbito da isenção, de modo a abranger apenas o consumo de um produto energético utilizado na produção de um produto energético equivalente ([isto é], um produto energético que, à semelhança do produto energético consumido, esteja [também] sujeito a imposto)?»

 Quanto às questões prejudiciais

 Quanto à primeira questão

20      Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 21.o, n.o 3, da Diretiva 2003/96 deve ser interpretado no sentido de que o consumo de produtos energéticos, nas instalações de um estabelecimento que os produziu, para a produção de outros produtos energéticos está abrangido pela exceção relativa ao facto gerador do imposto prevista nesta disposição, quando, numa situação como a que está em causa no processo principal, os produtos produzidos para a atividade principal do estabelecimento em causa são utilizados para fins diferentes da utilização como carburante ou combustível de aquecimento.

21      Importa observar que, embora a redação do artigo 21.o, n.o 3, primeira frase, da referida diretiva vise o consumo de produtos energéticos nas instalações de um estabelecimento que produz produtos energéticos, não acrescenta nenhuma precisão quanto às utilizações a que se destinam os produtos finais produzidos para a atividade principal desse estabelecimento.

22      Ora, em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, quando a interpretação literal de uma disposição de direito da União não permite apreciar o seu alcance exato, há que interpretá‑la em função da economia geral e da finalidade da regulamentação em que se insere (v., designadamente, Acórdão de 7 de setembro de 2017, Austria Asphalt, C‑248/16, EU:C:2017:643, n.o 20 e jurisprudência referida).

23      No que diz respeito, em primeiro lugar, à economia da Diretiva 2003/96, o artigo 2.o, n.o 1, desta diretiva define o que se deve entender por «produtos energéticos», na aceção da mesma. A este respeito, como decorre do pedido de decisão prejudicial, o conjunto dos produtos produzidos pela Koppers podem ser qualificados, em conformidade com esta disposição, de «produtos energéticos» e esta sociedade poderia, por isso, beneficiar da exceção relativa ao facto gerador de imposto prevista no artigo 21.o, n.o 3, da referida diretiva.

24      Contudo, há que observar que, como resulta do considerando 22 desta mesma diretiva, o legislador da União considerou que os produtos energéticos devem essencialmente estar sujeitos a um quadro regulamentar comum aos Estados‑Membros, quando utilizados como carburante ou combustível de aquecimento, e que é, por conseguinte, inerente à natureza e à lógica do sistema fiscal excluir do âmbito de aplicação desse quadro, nomeadamente, os produtos energéticos utilizados para fins diferentes do da utilização como carburante ou combustível de aquecimento. Assim, mesmo que estejam abrangidos pelo conceito de «produtos energéticos», na aceção do artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2003/96, esses produtos estão excluídos do âmbito de aplicação desta diretiva pelo n.o 4, alínea b), primeiro travessão, do referido artigo, quando utilizados para fins diferentes do da utilização como carburante ou combustível de aquecimento (v., neste sentido, Acórdão de 5 de julho de 2007, Fendt Italiana, C‑145/06 e C‑146/06, EU:C:2007:411, n.os 35 e 43).

25      Por conseguinte, como alegam o Governo dinamarquês e a Comissão Europeia, resulta da leitura conjugada dos n.os 1 e 4 do artigo 2.o da Diretiva 2003/96 que as disposições desta diretiva se aplicam aos produtos que, simultaneamente, são definidos como produtos energéticos e que estão abrangidos pelo seu âmbito de aplicação.

26      Como exceção, ao abrigo do artigo 2.o, n.o 4, alínea b), última frase, da Diretiva 2003/96, o legislador da União previu que, no entanto, as disposições do artigo 20.o desta diretiva são aplicáveis aos produtos energéticos excluídos do seu âmbito de aplicação por força das outras disposições do seu artigo 2.o, n.o 4. Ora, há que constatar que não foi prevista uma exceção semelhante em relação ao artigo 21.o, n.o 3, da referida diretiva.

27      Conforme resulta das informações fornecidas pelo órgão jurisdicional de reenvio, os produtos produzidos pela Koppers para a sua atividade principal, na medida em que não se destinam, nomeadamente devido às suas propriedades respetivas, a ser utilizados como carburante ou como combustível de aquecimento, estão excluídos do âmbito de aplicação da Diretiva 2003/96. Por conseguinte, o consumo de solvente para a sua produção não pode ser abrangido pela exceção relativa ao facto gerador de imposto prevista no artigo 21.o, n.o 3, primeira frase, desta diretiva.

28      Em segundo lugar, esta interpretação é confirmada pelos objetivos prosseguidos pela referida diretiva. A este respeito, há que recordar que, ao prever um regime de tributação harmonizado dos produtos energéticos e da eletricidade, a Diretiva 2003/96 pretende, conforme resulta dos seus considerandos 2 a 7, 11, 12 e 24, atingir um duplo objetivo, a saber, por um lado, promover o bom funcionamento do mercado interno no setor da energia, evitando, nomeadamente, as distorções de concorrência, e, por outro, encorajar objetivos de política ambiental (v., neste sentido, designadamente, Acórdãos de 7 de setembro de 2017, Hüttenwerke Krupp Mannesmann, C‑465/15, EU:C:2017:640, n.o 26, e de 7 de março de 2018, Cristal Union, C‑31/17, EU:C:2018:168, n.os 29, 34 e jurisprudência referida).

29      Como alega o Governo dinamarquês nas suas observações escritas e como salientou o advogado‑geral no n.o 52 das suas conclusões, a aplicação do artigo 21.o, n.o 3, desta diretiva à produção de «produtos energéticos», apenas na aceção do seu artigo 2.o, n.o 1, quando são utilizados para fins que não o de carburante ou combustível de aquecimento, teria por efeito criar uma lacuna no regime de tributação harmonizado instituído pela referida diretiva, excluindo de tributação, numa situação como a que está em causa no processo principal, produtos energéticos que estão, em princípio, sujeitos à mesma.

30      Com efeito, nessas circunstâncias, por um lado, o consumo de produtos energéticos, como o solvente em causa no processo principal, que deve ser objeto de tributação nos termos do artigo 1.o da Diretiva 2003/96, beneficia da exceção relativa ao facto gerador de imposto prevista no artigo 21.o, n.o 3, desta diretiva. Por outro lado, a não tributação desses produtos não seria compensada pela tributação posterior dos produtos energéticos produzidos, uma vez que estes últimos não se destinam a ser utilizados como carburante ou como combustível de aquecimento.

31      Por conseguinte, considerar que o artigo 21.o, n.o 3, da referida diretiva é aplicável a uma situação como a que está em causa no processo principal seria suscetível de afetar o bom funcionamento do mercado interno no setor da energia que, como recordado no n.o 28 do presente acórdão, é uma das finalidades prosseguidas pela instituição desse regime.

32      A integridade do regime de tributação harmonizado dos produtos energéticos estabelecido pela Diretiva 2003/96 exige, por conseguinte, que o consumo desses produtos só seja considerado abrangido pela exceção relativa ao facto gerador de imposto, nos termos do artigo 21.o, n.o 3, primeira frase, desta diretiva, se for efetuado para produção dos próprios produtos abrangidos por esta tributação devido à sua utilização como carburante ou como combustível de aquecimento.

33      Esta interpretação não pode ser posta em causa pelo argumento invocado pela Koppers segundo o qual, por razões de proteção do ambiente e de exploração dos recursos, seria desejável interpretar o conceito de «produtos energéticos», que consta do artigo 21.o, n.o 3, da Diretiva 2003/96, apenas com base na definição deste conceito prevista no artigo 2.o, n.o 1, desta diretiva, na medida em que incitaria as empresas a utilizarem os produtos energéticos que elas próprias produziram.

34      Conforme recordado no n.o 28 do presente acórdão, a Diretiva 2003/96, além de promover o bom funcionamento do mercado interno no setor da energia, tem como objetivo encorajar objetivos de política ambiental. No entanto, não se pode alegar que o requisito relativo à utilização como carburante ou como combustível de aquecimento dos produtos produzidos para efeitos da aplicação do artigo 21.o, n.o 3, desta diretiva viola esta finalidade. Pelo contrário, resulta que, com esta disposição, o legislador da União conciliou os dois objetivos prosseguidos pela referida diretiva.

35      Com efeito, há que observar que o artigo 21.o, n.o 3, segunda frase, da Diretiva 2003/96 prevê apenas uma faculdade concedida aos Estados‑Membros de considerar, nomeadamente, que o consumo de eletricidade e de outros produtos energéticos para a produção de produtos energéticos não constitui um facto gerador de imposto, quando os próprios produtos consumidos não são produzidos nas instalações do estabelecimento.

36      Em contrapartida, nos termos do artigo 21.o, n.o 3, primeira frase, desta diretiva, a exceção relativa ao facto gerador de imposto impõe‑se quando os próprios produtos energéticos consumidos são produzidos nas instalações do estabelecimento. Daqui resulta que, através dessa obrigação que recai sobre os Estados‑Membros, o legislador da União pretendeu incentivar as condições de produção para a eficiência energética.

37      Atendendo às considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 21.o, n.o 3, da Diretiva 2003/96 deve ser interpretado no sentido de que o consumo de produtos energéticos, nas instalações de um estabelecimento que os produziu, para efeitos da produção de outros produtos energéticos, não está abrangido pela exceção relativa ao facto gerador do imposto prevista nesta disposição, quando, numa situação como a que está em causa no processo principal, os produtos energéticos produzidos para a atividade principal desse estabelecimento são utilizados para fins diferentes da utilização como carburante ou combustível de aquecimento.

 Quanto à segunda questão

38      Tendo em conta a resposta à primeira questão, não há que responder à segunda questão.

 Quanto às despesas

39      Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

O artigo 21.o, n.o 3, da Diretiva 2003/96/CE do Conselho, de 27 de outubro de 2003, que reestrutura o quadro comunitário de tributação dos produtos energéticos e da eletricidade, deve ser interpretado no sentido de que o consumo de produtos energéticos, nas instalações de um estabelecimento que os produziu, para efeitos da produção de outros produtos energéticos, não está abrangido pela exceção relativa ao facto gerador do imposto prevista nesta disposição, quando, numa situação como a que está em causa no processo principal, os produtos energéticos produzidos para a atividade principal desse estabelecimento são utilizados para fins diferentes da utilização como carburante ou combustível de aquecimento.

Assinaturas


*      Língua do processo: dinamarquês.