Language of document : ECLI:EU:T:2021:143

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

17 de março de 2021 (*)

«Produtos fitofarmacêuticos — Substância ativa flupirsulfurão‑metilo — Não renovação da inscrição no anexo do Regulamento de Execução (UE) n.o 540/2011 — Procedimento de avaliação — Proposta de classificação de uma substância ativa — Princípio da precaução — Direitos da defesa — Segurança jurídica — Erro manifesto de apreciação — Proporcionalidade — Princípio da não discriminação — Princípio da boa administração — Confiança legítima»

No processo T‑719/17,

FMC Corporation, com sede em Filadélfia, Pensilvânia (Estados Unidos), representada por D. Waelbroeck, I. Antypas e A. Accarain, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por X. Lewis, G. Koleva e I. Naglis, na qualidade de agentes,

recorrida,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 263.o TFUE e destinado a obter a anulação do Regulamento de Execução (UE) 2017/1496 da Comissão, de 23 de agosto de 2017, relativo à não renovação da aprovação da substância ativa DPX KE 459 (flupirsulfurão‑metilo), em aplicação do Regulamento (CE) n.o 1107/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado, e que altera o Regulamento de Execução (UE) n.o 540/2011 da Comissão (JO 2017, L 218, p. 7),

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto por: D. Spielmann, presidente, O. Spineanu‑Matei e R. Mastroianni (relator), juízes,

secretário: M. J. Palacio González, administrador principal,

vistos os autos e após a audiência de 30 de junho de 2020,

profere o presente

Acórdão

I.      Antecedentes do litígio

1        A substância ativa DPX KE 459 (flupirsulfurão‑metilo) (a seguir «FPS») é utilizada como herbicida seletivo de largo espetro, registado para utilização em diversas culturas cerealíferas.

2        O FPS foi incluído no anexo I da Diretiva 91/414/CEE do Conselho, de 15 de julho de 1991, relativa à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado (JO 1991, L 230, p. 1), pela Diretiva 2001/49/CE da Comissão, de 28 de junho de 2001, que altera o anexo I da Diretiva 91/414, de modo a incluir a substância ativa DPX KE 459 (flupirsulfurão‑metilo) (JO 2001, L 176, p. 61).

3        As substâncias ativas constantes do anexo I da Diretiva 91/414 são consideradas aprovadas nos termos do Regulamento (CE) n.o 1107/2009 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, relativo à colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado e que revoga as Diretivas 79/117/CEE e 91/414 do Conselho (JO 2009, L 309, p. 1), e são enumeradas na parte A do anexo do Regulamento de Execução (UE) n.o 540/2011 da Comissão, de 25 de maio de 2011, que dá execução ao Regulamento n.o 1107/2009 no que diz respeito à lista de substâncias ativas aprovadas (JO 2011, L 153, p. 1). A aprovação do FPS, tal como resulta da sua inclusão no referido anexo, expirava em 30 de junho de 2018.

4        Em 25 de março de 2011, a DuPont de Nemours (Deutschland) GmbH, filial alemã do grupo DuPont de Nemours (a seguir «DuPont»), em conformidade com o artigo 14.o do Regulamento n.o 1107/2009, pediu a renovação da aprovação do FPS. Este pedido de renovação foi apresentado nos termos do artigo 4.o do Regulamento (UE) n.o 1141/2010 da Comissão, de 7 de dezembro de 2010, relativo ao procedimento de renovação da inclusão de um segundo grupo de substâncias ativas no anexo I da Diretiva 91/414 e à elaboração da lista dessas substâncias (JO 2010, L 322, p. 10), no prazo previsto por esse artigo.

5        A República Francesa e o Reino da Dinamarca foram designados, respetivamente, Estado‑Membro relator (a seguir «EMR») e Estado‑Membro correlator para efetuar em nome da União Europeia a avaliação dos riscos associados ao FPS no âmbito do procedimento de renovação da aprovação dessa substância.

6        Em setembro de 2013, o EMR concluiu a sua apreciação do processo de renovação apresentada pela DuPont em março de 2011, completada por um processo complementar em maio de 2012, e entregou um projeto de relatório de avaliação da renovação para o FPS (a seguir «relatório de avaliação da renovação»). Concluiu que o processo de renovação estava completo e recomendou a renovação da aprovação do FPS.

7        Em 27 de setembro de 2013, foi enviada uma cópia do relatório de avaliação da renovação à DuPont e à Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos (EFSA). Em 2 de outubro de 2013, a EFSA deu início à revisão pelos pares ao enviar o relatório de avaliação da renovação à DuPont e aos Estados‑Membros, para consulta, solicitando a estes últimos que apresentassem observações sobre o mesmo num prazo de dois meses.

8        Em 3 de dezembro de 2013, a DuPont apresentou à EFSA, no prazo concedido, as suas observações sobre o relatório de avaliação da renovação.

9        Analisadas as observações recebidas sobre o relatório de avaliação da renovação, a Comissão Europeia decidiu conferir mandato à EFSA para a consulta de peritos no domínio da toxicologia em mamíferos, do destino e do comportamento ambiental, bem como da ecotoxicologia.

10      Na reunião de revisão pelos pares que teve lugar em 16 de maio de 2014, os peritos da EFSA e do Estados‑Membros analisaram os estudos disponíveis sobre a toxicidade do FPS nos mamíferos. Com base em efeitos hepáticos ambíguos observados num estudo a longo prazo no rato, a maioria dos peritos encarregados da revisão pelos pares decidiu propor, relativamente aos perigos apresentados pelo FPS, classificá‑lo como substância cancerígena de categoria 2.

11      Posteriormente, na redação definitiva das suas conclusões científicas sobre a avaliação dos riscos do FPS (a seguir «conclusões da EFSA»), a EFSA propôs igualmente classificar o FPS como substância tóxica para a reprodução de categoria 2. Esta proposta baseava‑se em resultados ambíguos obtidos num estudo sobre o desenvolvimento do rato (atraso na ossificação do osso hioide).

12      Embora reconhecendo que a classificação dos perigos era formalmente decidida pela Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA) nos termos do Regulamento (CE) n.o 1272/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativo à classificação, rotulagem e embalagem de substâncias e misturas, que altera e revoga as Diretivas 67/548/CEE e 1999/45/CE e altera o Regulamento (CE) n.o 1907/2006 (JO 2008, L 353, p. 1), a EFSA identificou, com base na sua própria proposta de classificação do FPS, dois «domínios de preocupação essenciais»:

–        em primeiro lugar, a EFSA concluiu que o FPS cumpre os critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino previsto pelo Regulamento n.o 1107/2009 na medida em que seja objeto de uma proposta de classificação como substância cancerígena de categoria 2 e como substância tóxica para a reprodução de categoria 2; no entanto, a EFSA reconheceu igualmente que não tinha sido observado in vivo qualquer efeito desregulador do sistema endócrino e que, «por conseguinte, à luz dos atuais conhecimentos, [era] pouco provável que o flupirsulfurão‑metilo [fosse] um desregulador do sistema endócrino nos mamíferos»;

–        em segundo lugar, a EFSA concluiu que, «na sequência da classificação da substância parental», os três principais metabolitos do FPS presentes no solo (IN‑JV460, IN‑KC576 e IN‑KY374), cuja concentração espetável nas águas subterrâneas excedia o limiar de 0,1 μg/l, deviam ser considerados relevantes do ponto de vista toxicológico em conformidade com a presunção prevista nas Orientações da Comissão de 25 de fevereiro de 2003 sobre a avaliação da relevância dos metabolitos nas águas subterrâneas no âmbito da Diretiva 91/414 (Sanco/221/2000 — rev. 10. final) (a seguir «Orientações da Comissão sobre os metabolitos nas águas subterrâneas»).

13      A EFSA convidou os Estados‑Membros a apresentarem observações sobre a proposta de classificação do FPS como substância tóxica para a reprodução de categoria 2, bem como sobre as duas «preocupações essenciais» identificadas com base nela.

14      Nas suas observações, determinados Estados‑Membros expressaram dúvidas quanto à proposta da EFSA de classificar o FPS como substância tóxica para a reprodução de categoria 2, bem como quanto às consequências decorrentes da proposta de classificação da EFSA.

15      A EFSA publicou as suas conclusões científicas sobre o FPS em 6 de novembro de 2014. Manteve a sua proposta de classificação e considerou previsível que o FPS não cumprisse os critérios de aprovação enunciados no artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009. Em apoio dessa conclusão, a EFSA identificou quatro «domínios de preocupação essenciais»:

–        em primeiro lugar, não foi possível concluir que os lotes utilizados nos estudos de toxicidade fossem representativos das especificações técnicas propostas;

–        em segundo lugar, considerou‑se que o FPS cumpria os critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino, na medida em que tinha sido proposto classificá‑lo como substância cancerígena de categoria 2 e como substância tóxica para a reprodução de categoria 2;

–        em terceiro lugar, considerou‑se inaceitável o facto de o risco de exposição das águas subterrâneas exceder o limiar de concentração de 0,1 μg/l para os três principais metabolitos do FPS presentes no solo (IN‑JV460, IN‑KC576 e IN‑KY374), uma vez que se tinha presumido que esses três metabolitos eram relevantes do ponto de vista toxicológico com base na proposta de classificação para o FPS formulada pela EFSA;

–        em quarto lugar, identificou‑se um risco para as plantas aquáticas.

16      Além disso, a EFSA identificou uma «lacuna nos dados», uma vez que não se encontrava disponível qualquer avaliação da exposição das águas subterrâneas em relação a dois outros metabolitos do FPS (IN‑JE127 e IN‑KF311).

17      Em 2 de dezembro de 2014, a DuPont enviou uma carta à Comissão na qual expunha as suas observações quanto às conclusões da EFSA e, designadamente, se opunha à proposta da EFSA de classificação do FPS. Além disso, a DuPont manifestou a sua discordância com o facto de a EFSA, apesar de ter excluído expressamente uma ação sobre o sistema endócrino, ter, todavia, definido o FPS como um potencial desregulador do sistema endócrino com base nos critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino previstos pelo Regulamento n.o 1107/2009.

18      Com base nas conclusões da EFSA, a Comissão publicou um projeto de relatório de revisão do FPS em 18 de março de 2015, no qual propunha retirar a aprovação do FPS. A sua proposta baseava‑se em três preocupações principais, a saber:

–        os critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino, que eram respeitados devido à proposta da EFSA de classificar o FPS como substância cancerígena de categoria 2 e como substância tóxica para a reprodução de categoria 2;

–        as informações disponíveis, que não eram suficientes para avaliar o risco de exposição das águas subterrâneas aos metabolitos relevantes;

–        um risco para os organismos aquáticos.

19      No mesmo dia, a Comissão informou a DuPont que se mantinham as discussões internas a respeito da proposta de classificação da EFSA e, por conseguinte, no que respeitava aos critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino.

20      Em 8 de abril de 2015, a DuPont enviou uma carta à Comissão na qual expunha as suas observações quanto ao projeto de relatório de revisão do FPS e, nomeadamente, alegava que uma proposta da Comissão no sentido de renovar a aprovação do FPS teria sido cientificamente justificada e juridicamente fundamentada.

21      Por mensagem de correio eletrónico de 29 de maio de 2015, a Comissão solicitou à DuPont, com base na conclusão de que o FPS preenchia os critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino, que apresentasse elementos a considerar para uma eventual aprovação mediante derrogação ao abrigo do ponto 3.6.5 do anexo II e do artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1107/2009. A DuPont apresentou dois processos de derrogação em 26 de junho e 13 de julho de 2015.

22      Em 24 de junho de 2015, a Comissão solicitou à DuPont uma reunião para debater a avaliação da renovação da aprovação do FPS. Durante essa reunião, bem como numa carta de seguimento de 2 de julho de 2015, a DuPont pediu, nomeadamente, à Comissão que mandatasse a ECHA, enquanto autoridade competente em matéria de classificação, para rever a classificação dos perigos associados ao FPS e que adiasse a adoção da decisão até à decisão de classificação definitiva pela ECHA.

23      Numa carta de 9 de outubro de 2015, a DuPont informou o EMR da sua intenção de efetuar estudos suplementares relativos à questão da toxicidade do FPS para fundamentar a sua tese de que nem a classificação como substância cancerígena de categoria 2 nem a classificação como substância tóxica para a reprodução de categoria 2 eram tecnicamente justificadas.

24      Em janeiro de 2016, a Comissão mandatou a EFSA para analisar os dois processos de derrogação apresentados pela DuPont em 26 de junho e 13 de julho de 2015. Em seguida, a EFSA pediu informações adicionais à DuPont para completar o processo relativo ao caráter despiciendo da exposição, as quais foram fornecidas pela DuPont em 31 de maio de 2016. A EFSA constituiu então um grupo de trabalho encarregado de elaborar uma metodologia para a avaliação do caráter indispensável das substâncias herbicidas para a atividade agrícola. Após a publicação da metodologia acordada em julho de 2016, a EFSA pediu à DuPont que revisse o processo de derrogação ao abrigo do artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1107/2009 (relativo ao caráter indispensável para a atividade agrícola) com base nessa metodologia. Em 19 de setembro de 2016, a DuPont apresentou o processo relativo à derrogação revisto.

25      Em 3 de outubro de 2016, a EFSA apresentou uma versão revista das suas conclusões (a seguir «conclusões revistas da EFSA»). Nessas conclusões revistas, a EFSA mantinha a sua posição quanto aos quatro «domínios de preocupação essenciais» anteriormente identificados, mas acrescentou‑lhes uma «lacuna nos dados» adicional relativa ao perfil genotóxico de dois metabolitos do FPS (IN‑JE127 e IN‑KF311). Concluía, nomeadamente, que «a avaliação dos riscos que o metabolito IN‑JE127 [fazia] correr aos consumidores não [podia] ser finalizada devido à falta de informações sobre os perigos potenciais e de estimativas fiáveis da exposição dos consumidores a esse metabolito (cujo potencial genotóxico não se [podia] excluir)».

26      Por carta de 5 de outubro de 2016, a Comissão solicitou à DuPont que apresentasse observações quanto às conclusões revistas da EFSA. Em 18 de outubro de 2016, a DuPont enviou uma carta à Comissão, na qual contestava a «lacuna nos dados» adicional mencionada pela EFSA relativamente à genotoxicidade, e pedia à Comissão que a autorizasse a apresentar estudos suplementares sobre essa «lacuna nos dados», o mais tardar, no fim de novembro de 2016.

27      Na sequência da publicação das conclusões revistas da EFSA, a Comissão publicou, em 22 de dezembro de 2016, uma versão revista do seu projeto de relatório de revisão, na qual mantinha a proposta de retirar a aprovação do FPS. Contudo, a Comissão já não mencionava os critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino como sendo uma preocupação.

28      Em 13 de janeiro de 2017, a DuPont enviou uma carta à Comissão na qual expunha as suas observações quanto à versão revista do projeto de relatório de revisão.

29      Em 9 de fevereiro de 2017, a DuPont escreveu às autoridades reguladoras dos Estados‑Membros da União a fim de lhes transmitir as suas preocupações relativamente à proposta da Comissão de não renovar a aprovação do FPS.

30      Em 31 de março de 2017, a E.I. du Pont de Nemours and Company, sociedade‑mãe da DuPont, e a FMC Corporation, uma sociedade de direito americano, celebraram um acordo de cessão quanto à transferência das atividades da DuPont relativas a determinados herbicidas, dos quais fazia parte o FPS (a seguir «acordo de cessão»). O acordo de cessão foi celebrado para dar cumprimento à Decisão C(2017) 1946 final da Comissão, de 27 de março de 2017, que declara compatível com o mercado interno e com o Acordo EEE a operação de concentração entre a The Dow Chemical Company e a E.I. du Pont de Nemours and Company (Processo COMP/M.7932 — Dow/DuPont).

31      O acordo de cessão previa que a FMC adquirisse todos os direitos, títulos e interesses da DuPont quanto a todos os ativos e todas as propriedades relacionadas com a «atividade FPS», incluindo todas as autorizações de colocação no mercado. O acordo de cessão foi celebrado sob a condição suspensiva da obtenção de todas as autorizações necessárias à operação por parte das autoridades da concorrência competentes. O encerramento da operação estava previsto para o dia 1 de novembro de 2017.

32      Em 4 de abril de 2017, a Comissão notificou o projeto de regulamento sobre a não renovação da aprovação do FPS aos restantes membros da Organização Mundial do Comércio (OMC), em conformidade com os termos do Acordo sobre os Obstáculos Técnicos ao Comércio (OTC) da OMC, de 15 de abril de 1994. Por carta de 25 de maio de 2017, as autoridades dos Estados Unidos da América apresentaram observações, em nome da DuPont, quanto à decisão proposta, nas quais sublinhavam a falta de base científica sólida que justificasse a não renovação e a existência de dados demonstrativos da inexistência de problemas para a saúde humana, para as águas subterrâneas e para o ambiente.

33      A Comissão respondeu a essas observações em 14 de julho de 2017. Na sua carta, referia que tinha «analisado cuidadosamente todas as observações recebidas durante o procedimento decisório», mas que, «tendo em conta as limitações relativas ao prazo e ao procedimento de apresentação de dados adicionais», não podia renovar a aprovação do FPS.

II.    Regulamento impugnado

34      Em 23 de agosto de 2017, a Comissão adotou o Regulamento de Execução (UE) 2017/1496, relativo à não renovação da aprovação da substância ativa DPX KE 459 (flupirsulfurão‑metilo), em conformidade com o Regulamento n.o 1107/2009, e que altera o Regulamento de Execução n.o 540/2011 (JO 2017, L 218, p. 7, a seguir «regulamento impugnado»). Em conformidade com o regulamento impugnado, a aprovação do FPS não foi renovada.

35      Os considerandos 8 a 14 do regulamento impugnado referem o seguinte:

«8      Em 30 de setembro de 2016, a [EFSA] transmitiu à Comissão as suas conclusões quanto à possibilidade de o [FPS] cumprir os critérios de aprovação estabelecidos no artigo 4.o do Regulamento (CE) n.o 1107/2009. Com base nos estudos analisados, a [EFSA] concluiu que a substância parental t[inha] determinadas propriedades toxicológicas intrínsecas, nomeadamente no que diz[ia] respeito à carcinogenicidade e à toxicidade reprodutiva. No entender da [EFSA], esta informação justifica mesmo a classificação como cancerígeno da categoria 2 e como tóxico para a reprodução da categoria 2, em conformidade com o Regulamento (CE) n.o 1272/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho. A [EFSA] concluiu que, atendendo às utilizações representativas avaliadas, existe um elevado potencial de estas resultarem numa exposição das águas subterrâneas a vários metabolitos do [FPS], acima do limite paramétrico de 0,1 μg/l, para a água potável em situações representadas por todos os cenários pertinentes relativos às águas subterrâneas.

9      Independentemente da classificação proposta pela [EFSA], dadas as propriedades toxicológicas intrínsecas da substância parental observadas nos estudos, nomeadamente no que diz respeito à carcinogenicidade e à toxicidade reprodutiva, a presença dos metabolitos nas águas subterrâneas é particularmente preocupante, na medida em que não foi demonstrado que estes não partilham as mesmas propriedades intrínsecas. Por conseguinte, não é possível estabelecer atualmente que a presença dos metabolitos nas águas subterrâneas não resulta em efeitos inaceitáveis para as mesmas e em efeitos nocivos na saúde humana.

10      Além disso, a [EFSA] concluiu que a avaliação da exposição das águas subterrâneas não pôde ser concluída com base nas informações disponíveis sobre o metabolito IN‑JE127, cujo potencial genotóxico não pode ser excluído.

11      Tendo em conta a incerteza quanto à presença desse metabolito nas águas subterrâneas, não é possível excluir atualmente efeitos inaceitáveis nas águas subterrâneas, nem efeitos nocivos na saúde humana.

12      Além disso, a [EFSA] concluiu que existe um elevado risco para os organismos aquáticos, em especial as algas e as plantas aquáticas, decorrente da exposição ao [FPS].

13      Com base nos riscos identificados nos considerandos 9, 11 e 12 não foi determinado, relativamente a uma ou mais utilizações representativas de, pelo menos, um produto fitofarmacêutico, que eram cumpridos os critérios de aprovação estabelecidos no artigo 4.o do Regulamento (CE) n.o 1107/2009. Não é, por conseguinte, adequado renovar a aprovação do [FPS], em conformidade com o artigo 20.o, n.o 1, alínea b), do referido regulamento.

14      Tendo em conta os riscos expostos nos considerandos 9, 11 e 12, a derrogação estabelecida no artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento (CE) n.o 1107/2009 não é aplicável. A aplicação desta derrogação está também excluída com o fundamento de que não foi demonstrado que não estava satisfeito nenhum dos critérios enunciados nos pontos 3.6.3, 3.6.4, 3.6.5 ou 3.8.2 do anexo II do Regulamento (CE) n.o 1107/2009.»

36      O regulamento impugnado refere, além disso, no considerando 19, que o mesmo «não prejudica a apresentação de um novo pedido relativo ao [FPS] em conformidade com o artigo 7.o do Regulamento (CE) n.o 1107/2009».

III. Tramitação processual e pedidos das partes

37      Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 23 de outubro de 2017, a DuPont de Nemours (Deutschland) e outras onze sociedades da DuPont (a seguir, em conjunto, «recorrentes DuPont»), bem como a FMC, interpuseram um recurso de anulação do regulamento impugnado.

38      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral no mesmo dia, a FMC apresentou um pedido de medidas provisórias, requerendo a suspensão da execução do regulamento impugnado e a adoção de qualquer medida provisória adequada.

39      Em 19 de fevereiro de 2018, a Comissão apresentou a sua contestação.

40      Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 14 de março de 2018, a FMC pediu para se substituir às recorrentes DuPont na qualidade de recorrente no presente processo.

41      Por requerimentos apresentados na Secretaria do Tribunal Geral respetivamente em 6 de abril e em 1 de junho de 2018, as recorrentes DuPont e a Comissão indicaram, em substância, não terem objeções a que fosse autorizada a substituição das recorrentes DuPont pela FMC.

42      A réplica foi apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de abril de 2018. A tréplica deu entrada na mesma Secretaria em 4 de julho de 2018.

43      Por Despacho de 22 de junho de 2018, FMC/Comissão (T‑719/17 R, EU:T:2018:408), o presidente do Tribunal Geral indeferiu o pedido de medidas provisórias e reservou para final a decisão quanto às despesas.

44      Por Despacho de 30 de novembro de 2018, FMC/Comissão (T‑719/17, não publicado, EU:T:2018:893), o Tribunal Geral autorizou a FMC a substituir‑se às recorrentes DuPont na qualidade de recorrente no presente processo e reservou para final a decisão quanto às despesas. Nessa mesma data, foi encerrada a fase escrita do processo.

45      Visto que a composição das Secções do Tribunal Geral foi alterada, em conformidade com o artigo 27.o, n.o 5, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, o processo foi atribuído à Quinta Secção, à qual foi afetado um novo juiz‑relator.

46      Sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Quinta Secção), no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo, colocou questões escritas às partes, tendo estas respondido dentro do prazo fixado.

47      Mediante proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral decidiu dar início à fase oral do processo.

48      Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões do Tribunal Geral na audiência de 30 de junho de 2020.

49      A recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        anular o regulamento impugnado;

–        condenar a Comissão nas despesas.

50      A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

–        negar provimento ao recurso;

–        condenar a recorrente nas despesas.

IV.    Questão de direito

51      A recorrente apresenta seis fundamentos de anulação.

52      O primeiro fundamento, subdividido em três partes, é relativo à violação, pela Comissão, do Regulamento n.o 1141/2010, do Regulamento n.o 1272/2008 e das regras sobre a experimentação animal constantes do Regulamento n.o 1107/2009 e da Diretiva 2010/63/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de setembro de 2010, relativa à proteção dos animais utilizados para fins científicos (JO 2010, L 276, p. 33).

53      O segundo fundamento é relativo ao facto de a Comissão se ter baseado, incorretamente, num documento de orientações novo, violando o princípio da segurança jurídica e do direito de defesa dos requerentes da renovação.

54      O terceiro fundamento é relativo à omissão de uma avaliação completa dos riscos, violando várias disposições do direito da União e os direitos de defesa do requerente da renovação.

55      O quarto fundamento é relativo à violação do princípio da proporcionalidade.

56      O quinto fundamento é relativo à violação do princípio da não discriminação.

57      O sexto fundamento é relativo à violação dos princípios da boa administração e de proteção da confiança legítima.

A.      Considerações preliminares

58      Nos termos do seu artigo 1.o, n.o 3, o Regulamento n.o 1107/2009 visa assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana e animal e do ambiente e melhorar o funcionamento do mercado interno através da harmonização das normas relativas à colocação no mercado dos produtos fitofarmacêuticos, melhorando simultaneamente a produção agrícola.

59      Ao impor a manutenção de um nível elevado de proteção do ambiente, o Regulamento n.o 1107/2009 aplica o artigo 11.o TFUE e o artigo 114.o, n.o 3, TFUE. O artigo 11.o TFUE prevê que as exigências em matéria de proteção do ambiente devem ser integradas na definição e execução das políticas e ações da União, em especial com o objetivo de promover um desenvolvimento sustentável. Concretizando essa obrigação, o artigo 114.o, n.o 3, TFUE dispõe que, nas suas propostas, nomeadamente em matéria de proteção do ambiente, feitas para aproximação das legislações que tenham por objeto a criação e o funcionamento do mercado interno, a Comissão basear‑se‑á num nível de proteção elevado, tendo nomeadamente em conta qualquer nova evolução baseada em dados científicos, e que, no âmbito das respetivas competências, o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia procurarão igualmente alcançar esse objetivo. Essa proteção do ambiente tem uma importância preponderante sobre as considerações económicas, pelo que pode justificar consequências económicas negativas, mesmo consideráveis, para certos operadores (v., por analogia, Acórdãos de 9 de setembro de 2011, Dow AgroSciences e o./Comissão, T‑475/07, EU:T:2011:445, n.o 143; de 6 de setembro de 2013, Sepro Europe/Comissão, T‑483/11, não publicado EU:T:2013:407, n.o 85; e de 12 de dezembro de 2014, Xeda International/Comissão, T‑269/11, não publicado, EU:T:2014:1069, n.o 138).

60      Por outro lado, o considerando 8 do Regulamento n.o 1107/2009 especifica que o princípio da precaução deverá ser aplicado e o referido regulamento deverá garantir que a indústria demonstre que as substâncias ou produtos produzidos ou colocados no mercado não têm quaisquer efeitos nocivos na saúde humana ou animal, nem qualquer efeito inaceitável no ambiente.

61      A este respeito, refira‑se que os procedimentos de autorização e de aprovação prévias instituídos pelo Regulamento n.o 1107/2009 (e, anteriormente, pela Diretiva 91/414) para os produtos fitofarmacêuticos e as suas substâncias ativas se inspiram no princípio da precaução [v., neste sentido, Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 133].

1.      Quanto ao princípio da precaução

a)      Definição

62      O princípio da precaução constitui um princípio geral do direito da União que impõe às autoridades em questão que tomem, no quadro preciso do exercício das competências que lhes são atribuídas pela legislação pertinente, medidas adequadas para evitar certos riscos potenciais para a saúde pública, a segurança e o ambiente, dando prevalência aos imperativos ligados à proteção destes interesses sobre os interesses económicos [v. Acórdãos de 21 de outubro de 2003, Solvay Pharmaceuticals/Conselho, T‑392/02, EU:T:2003:277, n.o 121 e jurisprudência referida, e de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 134 e jurisprudência referida; v., também, neste sentido, Acórdão de 26 de novembro de 2002, Artegodan e o./Comissão, T‑74/00, T‑76/00, T‑83/00 a T‑85/00, T‑132/00, T‑137/00 e T‑141/00, EU:T:2002:283, n.o 184].

63      O princípio da precaução permite às instituições, quando subsistam incertezas científicas quanto à existência ou ao alcance de riscos para a saúde humana ou para o ambiente, tomarem medidas de proteção sem ter que esperar que a realidade e a gravidade desses riscos estejam plenamente demonstradas ou que os efeitos adversos para a saúde se concretizem [v. Acórdão de 6 de setembro de 2013, Sepro Europe/Comissão, T‑483/11, não publicado, EU:T:2013:407, n.o 44 e jurisprudência referida; v., também, por analogia, Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 135 e jurisprudência referida].

64      No processo conducente à adoção de medidas adequadas por uma instituição para prevenir certos riscos potenciais para a saúde pública, para a segurança e para o ambiente por força do princípio da precaução, podem‑se distinguir três etapas sucessivas: primeiro, a identificação dos efeitos potencialmente negativos de um fenómeno, segundo, a avaliação dos riscos para a saúde pública, para a segurança e para o ambiente ligados a esse fenómeno e, terceiro, quando os riscos potenciais identificados excedam o limite do aceitável para a sociedade, a gestão do risco pela adoção de medidas de proteção adequadas. Embora a primeira dessas etapas não necessite de maiores explicações, as duas etapas seguintes merecem ser explicitadas [v., neste sentido, Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 136].

b)      Avaliação dos riscos

65      A avaliação dos riscos para a saúde pública, para a segurança e para o ambiente consiste em a instituição à qual cabe enfrentar os efeitos potencialmente negativos de um fenómeno apreciar de forma científica esses riscos e determinar se ultrapassam o nível de risco considerado aceitável pela sociedade. Assim, para que as instituições possam proceder a uma avaliação dos riscos, importa que, por um lado, disponham de uma avaliação científica dos mesmos e, por outro, determinem o nível de risco considerado inaceitável para a sociedade [v. Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 137 e jurisprudência referida].

1)      Quanto à avaliação científica

66      A avaliação científica dos riscos é um processo científico que consiste, tanto quanto possível, em identificar e caracterizar um perigo, avaliar a exposição a esse perigo e caracterizar o risco [v. Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 138 e jurisprudência referida].

67      Na sua Comunicação COM(2000) 1 final relativa ao princípio da precaução, de 2 de fevereiro de 2000, a Comissão definiu da seguinte forma esses quatro elementos constitutivos de uma avaliação científica dos riscos (v. anexo III da referida comunicação):

«A “identificação do perigo” significa identificar os agentes biológicos, químicos ou físicos que podem ter efeitos nocivos […]

A “caracterização do perigo” consiste na determinação, em termos quantitativos e/ou qualitativos, da natureza e gravidade dos efeitos nocivos associados aos agentes ou atividade causal […]

A “avaliação da exposição” consiste na avaliação quantitativa ou qualitativa da probabilidade da exposição ao agente sob análise […]

A “caracterização do risco” corresponde à estimação qualitativa e/ou quantitativa, tendo em consideração as incertezas inerentes, da probabilidade, da frequência e da gravidade do efeito nocivo, potencial ou conhecido, sobre o ambiente ou a saúde suscetível de ocorrer. É estabelecida com base nos três parâmetros anteriores e depende muito das incertezas, das variações, das hipóteses de trabalho e das conjeturas feitas em cada fase do processo. Quando os dados disponíveis são inadequados ou inconclusivos, uma abordagem prudente e cautelosa relativamente à proteção ambiental, à saúde ou à segurança poderia ser optar pela hipótese do caso mais desfavorável. Quando essas hipóteses forem acumuladas, isto conduzirá a um exagero do risco real, mas dá uma certa segurança de que não estará subestimado.»

68      Enquanto processo científico, a avaliação científica dos riscos deve ser confiada pela instituição a peritos científicos (Acórdãos de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 157; de 11 de setembro de 2002, Alpharma/Conselho, T‑70/99, EU:T:2002:210, n.o 170; e de 9 de setembro de 2011, França/Comissão, T‑257/07, EU:T:2011:444, n.o 73).

69      A avaliação científica dos riscos não tem que fornecer obrigatoriamente às instituições provas científicas concludentes da realidade do risco e da gravidade dos potenciais efeitos adversos em caso de concretização desse risco. Com efeito, o contexto da aplicação do princípio da precaução corresponde por hipótese a um contexto de incerteza científica. Além disso, a adoção de uma medida preventiva ou, pelo contrário, a sua revogação ou flexibilização não podem estar sujeitas à prova da inexistência de qualquer risco, na medida em que tal prova é, regra geral, impossível de produzir do ponto de vista científico, uma vez que um nível de risco zero não existe na prática [Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 140; v., também, neste sentido, Acórdão de 21 de outubro de 2003, Solvay Pharmaceuticals/Conselho, T‑392/02, EU:T:2003:277, n.o 130]. Todavia, uma medida preventiva não pode ser validamente fundamentada por uma abordagem puramente hipotética do risco, assente em meras suposições ainda não cientificamente verificadas [Acórdãos de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 143, e de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 140; v., também, neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2007, Suécia/Comissão, T‑229/04, EU:T:2007:217, n.o 161].

70      Com efeito, a avaliação científica dos riscos deve basear‑se nos melhores dados científicos disponíveis e deve ser levada a cabo de modo independente, objetivo e transparente [v. Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 141 e jurisprudência referida].

71      Além disso, cabe indicar que a realização de uma avaliação científica completa dos riscos pode ser impossível em razão da insuficiência dos dados científicos disponíveis. Porém, tal não pode impedir que a autoridade pública competente tome medidas preventivas em aplicação do princípio da precaução. Importa, nesta hipótese, que peritos científicos procedam a uma avaliação científica dos riscos que, apesar da incerteza científica subsistente, coloquem à disposição da autoridade pública competente uma informação suficientemente fiável e sólida que lhe permita apreender todo o alcance da questão científica que se coloca e determinar a sua política com pleno conhecimento de causa (Acórdão de 9 de setembro de 2011, França/Comissão, T‑257/07, EU:T:2011:444, n.o 77; v., também, neste sentido, Acórdãos de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.os 160 a 163, e de 11 de setembro de 2002, Alpharma/Conselho, T‑70/99, EU:T:2002:210, n.os 173 a 176).

72      Quando se revele impossível determinar com certeza a existência ou o alcance do alegado risco em razão da natureza insuficiente, inconclusiva ou imprecisa dos resultados dos estudos levados a cabo, mas persista a probabilidade de um dano real no caso de o risco se concretizar, o princípio da precaução justifica a adoção de medidas restritivas, desde que sejam não discriminatórias e objetivas [v. Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 142 e jurisprudência referida; Acórdão do Tribunal da EFTA de 5 de abril de 2001, Órgão de Fiscalização da EFTA/Noruega, E‑3/00, EFTA Court Report 2000‑2001, p. 73, n.os 31 e 32].

73      Daí resulta que uma medida preventiva só pode ser tomada se o risco, sem que a sua existência e alcance tenham sido plenamente demonstrados por dados científicos conclusivos, se revelar ainda assim suficientemente documentado com base em dados científicos disponíveis no momento em que é tomada a medida [v. Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 143 e jurisprudência referida].

74      Nesse contexto, o conceito de «risco» corresponde, portanto, ao grau de probabilidade dos efeitos adversos para o bem protegido pelo ordenamento jurídico devido à aceitação de certas medidas ou de certas práticas. O conceito de «perigo» é, por seu lado, utilizado habitualmente num sentido mais amplo e descreve qualquer produto ou procedimento que possa ter um efeito adverso para a saúde humana ou para qualquer outro bem protegido pelo ordenamento jurídico [Acórdãos de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 144; de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 147; e de 9 de setembro de 2011, Dow AgroSciences e o./Comissão, T‑475/07, EU:T:2011:445, n.o 147].

2)      Quanto à determinação do nível do risco considerado inaceitável

75      A determinação do nível de risco considerado inaceitável para a sociedade cabe, no respeito das normas aplicáveis, às instituições encarregadas da opção política que é a fixação de um nível de proteção adequado para essa sociedade. É a essas instituições que cabe determinar o limiar crítico de probabilidade dos efeitos adversos para a saúde pública, para a segurança e para o ambiente e o grau desses efeitos potenciais que deixou de lhes parecer aceitável para essa sociedade e que, uma vez ultrapassado, exige, no interesse da proteção da saúde pública, da segurança e do ambiente, o recurso a medidas preventivas, apesar da incerteza científica subsistente [Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 145; v., também, neste sentido, Acórdãos de 11 de julho de 2000, Toolex, C‑473/98, EU:C:2000:379, n.o 45, e de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.os 150 e 151].

76      Na determinação do nível de risco considerado inaceitável para a sociedade, as instituições estão sujeitas às suas obrigações de assegurar um nível de proteção elevado da saúde pública, da segurança e do ambiente. Esse nível de proteção elevado, para ser compatível com o artigo 114.o, n.o 3, TFUE, não tem que ser necessariamente o mais elevado possível do ponto de vista técnico [Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 146; v., também, por analogia, Acórdão de 14 de julho de 1998, Safety Hi‑Tech, C‑284/95, EU:C:1998:352, n.o 49]. Por outro lado, essas instituições não podem adotar uma abordagem puramente hipotética do risco e orientar as suas decisões por um nível de «risco zero» [Acórdãos de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 152, e de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 146].

77      A determinação do nível de risco considerado inaceitável para a sociedade depende da apreciação feita pela autoridade pública competente sobre as circunstâncias específicas de cada caso concreto. A esse respeito, essa autoridade pode ter em conta, nomeadamente, a gravidade do impacto de superveniência desse risco para a saúde pública, para a segurança e para o ambiente, incluindo a extensão dos efeitos adversos possíveis, a persistência, a reversibilidade ou os possíveis efeitos posteriores desses danos e a perceção mais ou menos concreta do risco com base no estado dos conhecimentos científicos disponíveis [Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 147; v., também, por analogia, Acórdão de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 153].

c)      Gestão do risco

78      A gestão do risco corresponde a todas as ações levadas a cabo por uma instituição que tem que enfrentar um risco para o reduzir a um nível considerado aceitável para a sociedade, tendo em conta a sua obrigação, decorrente do princípio da precaução, de assegurar um nível elevado de proteção da saúde pública, da segurança e do ambiente [Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 148].

79      Essas ações incluem a adoção de medidas provisórias que devem ser proporcionadas, não discriminatórias, transparentes e coerentes face a medidas semelhantes já adotadas [Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 149; v., também, neste sentido, Acórdão de 1 de abril de 2004, Bellio F.lli, C‑286/02, EU:C:2004:212, n.o 59].

2.      Quanto à renovação de uma substância ativa inscrita na parte A do anexo do Regulamento de Execução n.o 540/2011

80      Conforme se expõe no n.o 2 supra, a substância visada pelo regulamento impugnado foi aprovada ao abrigo do regime previsto pela Diretiva 91/414, de acordo com os requisitos então aplicáveis.

81      Dado que a renovação da sua aprovação pela Comissão foi efetuada nos termos do Regulamento n.o 1107/2009, cumpre observar, a esse respeito, que os requisitos específicos para a aprovação das substâncias ativas evoluíram com a adoção desse regulamento.

a)      Quanto aos requisitos de inscrição iniciais nos termos da Diretiva 91/414

82      O artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/414 dispunha que, para uma substância ativa ser incluída no anexo I dessa mesma diretiva, tinha de se poder presumir, à luz dos conhecimentos científicos e técnicos existentes, que a utilização e os resíduos dos produtos fitofarmacêuticos que contivessem a substância ativa em causa, resultantes de uma aplicação conforme com as boas práticas fitossanitárias, não tinham efeitos prejudiciais para a saúde humana ou animal ou uma influência inaceitável sobre o ambiente.

83      Considerou‑se que o artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/414, interpretado à luz do princípio da precaução, implicava que, tratando‑se da saúde humana, a existência de indícios sérios que, sem afastar a incerteza científica, permitiam razoavelmente duvidar da inocuidade de uma substância se opunha, em princípio, à inscrição dessa substância no anexo I da referida diretiva (Acórdão de 11 de julho de 2007, Suécia/Comissão, T‑229/04, EU:T:2007:217, n.o 161). Estas considerações são aplicáveis, por analogia, quanto aos outros interesses protegidos pelo artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009, idênticos aos protegidos pelo artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/414, a saber, nomeadamente, a saúde animal e o ambiente.

84      Por último, considerou‑se que, no regime instituído pela Diretiva 91/414, é ao autor da notificação que cabe fazer prova de que, com base nas informações fornecidas sobre uma ou mais preparações correspondentes a uma série limitada de usos representativos, são respeitados os requisitos de aprovação [Acórdão de 12 de abril de 2013, Du Pont de Nemours (France) e o./Comissão, T‑31/07, não publicado, EU:T:2013:167, n.o 154].

b)      Quanto à alteração dos critérios de aprovação pelo Regulamento n.o 1107/2009

85      Resulta de uma comparação do artigo 5.o da Diretiva 91/414 com o artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009 que, no âmbito da substituição da Diretiva 91/414 pelo Regulamento n.o 1107/2009, os critérios e condições gerais de aprovação foram reformulados de modo mais detalhado, sem que, contudo, isso tenha levado necessariamente a um reforço de substância desses critérios e condições (Acórdão de 17 de maio de 2018, BASF Agro e o./Comissão, T‑584/13, EU:T:2018:279, n.o 82). As considerações enunciadas no n.o 84 supra no que respeita à saúde humana são aplicáveis, por analogia, quanto aos outros interesses protegidos pelo artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009, idênticos aos protegidos pelo artigo 5.o, n.o 1, da Diretiva 91/414, a saber, nomeadamente, a saúde animal e o ambiente.

86      Além disso, os princípios uniformes de avaliação e de autorização dos produtos fitofarmacêuticos, visto definirem nomeadamente os níveis de limiar dos quocientes de perigo para a exposição por via oral e por contacto, não mudaram substancialmente com a entrada em vigor do Regulamento n.o 1107/2009 (Acórdão de 17 de maio de 2018, BASF Agro e o./Comissão, T‑584/13, EU:T:2018:279, n.o 83).

87      O considerando 10 do Regulamento n.o 1107/2009 prevê que, para as substâncias ativas já aprovadas antes da sua entrada em vigor, os critérios harmonizados por esse regulamento são aplicados no momento da renovação ou da revisão da respetiva aprovação. Daí resulta que, no caso em apreço, a renovação da aprovação da substância controvertida, aprovada segundo a Diretiva 91/414, deve ser feita de acordo com os critérios e requisitos enunciados pelo Regulamento n.o 1107/2009.

3.      Quanto ao ónus da prova

88      Resulta da formulação e da sistemática das disposições aplicáveis do Regulamento n.o 1107/2009 que, em princípio, é sobre o autor do pedido de aprovação que recai o ónus da prova do preenchimento dos requisitos de aprovação do artigo 4.o do Regulamento n.o 1107/2009, como se previa expressamente na Diretiva 91/414 (v. n.o 84 supra).

89      Nomeadamente, o considerando 8 do Regulamento n.o 1107/2009 refere que este último «deverá garantir que a indústria demonstre que as substâncias ou produtos produzidos ou colocados no mercado não têm […] qualquer efeito inaceitável no ambiente». Do mesmo modo, o considerando 10 prevê que as substâncias só poderão entrar na composição de produtos fitofarmacêuticos «se se tiver provado», nomeadamente, que não terão qualquer efeito inaceitável no ambiente.

90      Além disso, o artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009, que enuncia os requisitos de aprovação das substâncias ativas, exige que seja previsível que os produtos fitofarmacêuticos que contêm uma substância ativa preencham os requisitos previstos nos n.os 2 e 3 do mesmo artigo, os quais, por sua vez, exigem que esses produtos e os respetivos resíduos cumpram os requisitos que indica. De acordo com o princípio de que cabe à parte que invoca uma disposição legal provar o preenchimento dos pressupostos da sua aplicação, resulta destas formulações que é o requerente que tem de fazer prova do preenchimento dos requisitos de aprovação, a fim de obter a aprovação, e não a Comissão que tem de fazer prova do não preenchimento dos requisitos de aprovação, a fim de poder recusá‑la.

4.      Quanto ao alcance da fiscalização jurisdicional

91      Para poder prosseguir de forma eficaz os objetivos que lhe são confiados pelo Regulamento n.o 1107/2009 (v. n.os 58 a 60 supra), e tendo em consideração as avaliações técnicas complexas que deve efetuar, deve ser reconhecido à Comissão um amplo poder de apreciação (v., neste sentido, Acórdãos de 18 de julho de 2007, Industrias Químicas del Vallés/Comissão, C‑326/05 P, EU:C:2007:443, n.os 74 e 75, e de 6 de setembro de 2013, Sepro Europe/Comissão, T‑483/11, não publicado, EU:T:2013:407, n.o 38). Isto vale, nomeadamente, para as decisões em matéria de gestão do risco que tem que tomar nos termos desse regulamento.

92      O exercício desse poder não está, todavia, subtraído à fiscalização jurisdicional. Com efeito, resulta de jurisprudência constante que, no âmbito dessa fiscalização, o juiz da União deve verificar o respeito das regras processuais, a exatidão material dos factos considerados pela Comissão, a inexistência de erro manifesto na apreciação desses factos ou a inexistência de desvio de poder (Acórdãos de 25 de janeiro de 1979, Racke, 98/78, EU:C:1979:14, n.o 5; de 22 de outubro de 1991, Nölle, C‑16/90, EU:C:1991:402, n.o 12; e de 9 de setembro de 2008, Bayer CropScience e o./Comissão, T‑75/06, EU:T:2008:317, n.o 83).

93      Quanto ao exame pelo juiz da União da existência de um manifesto erro de apreciação, há que esclarecer que, para demonstrar que a Comissão cometeu um erro manifesto na apreciação de factos complexos capaz de justificar a anulação do ato recorrido, as provas apresentadas pelo recorrente devem ser suficientes para retirar plausibilidade às apreciações dos factos tidos em conta nesse ato (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de dezembro de 1996, AIUFFASS e AKT/Comissão, T‑380/94, EU:T:1996:195, n.o 59, e de 1 de julho de 2004, Salzgitter/Comissão, T‑308/00, EU:T:2004:199, n.o 138). Sem prejuízo dessa análise de plausibilidade, não cabe ao Tribunal Geral substituir pela sua a apreciação de factos complexos feita pelo autor do ato [Acórdão de 9 de setembro de 2011, Dow AgroSciences e o./Comissão, T‑475/07, EU:T:2011:445, n.o 152; v., também, neste sentido, Acórdão de 15 de outubro de 2009, Enviro Tech (Europe), C‑425/08, EU:C:2009:635, n.o 47].

94      Além disso, há que recordar que, nos casos em que uma instituição dispõe de um amplo poder de apreciação, a fiscalização do respeito das garantias conferidas pelo ordenamento jurídico da União nos procedimentos administrativos tem importância fundamental. O Tribunal de Justiça teve ocasião de precisar que, entre essas garantias, figuram nomeadamente o dever de a instituição competente examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos pertinentes do caso concreto e o de fundamentar a sua decisão de forma suficiente (Acórdãos de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, EU:C:1991:438, n.o 14; de 7 de maio de 1992, Pesquerias De Bermeo e Naviera Laida/Comissão, C‑258/90 e C‑259/90, EU:C:1992:199, n.o 26; e de 6 de novembro de 2008, Países Baixos/Comissão, C‑405/07 P, EU:C:2008:613, n.o 56).

95      Com efeito, já se decidiu que a realização de uma avaliação científica dos riscos tão exaustiva quanto possível com base em pareceres científicos assentes nos princípios da excelência, da transparência e da independência constitui uma garantia processual importante a fim de assegurar a objetividade científica das medidas e evitar a adoção de medidas arbitrárias (Acórdão de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 172).

96      É à luz destas considerações de princípio que deve ser apreciada a procedência do presente recurso.

B.      Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do Regulamento n.o 1141/2010, do Regulamento n.o 1272/2008 e das regras relativas à experimentação animal constantes do Regulamento n.o 1107/2009 e da Diretiva 2010/63

97      Este fundamento subdivide‑se em três partes. A primeira parte é relativa à violação do Regulamento n.o 1141/2010 e das Orientações da Comissão de 12 de dezembro de 2014 sobre a renovação da aprovação de substâncias ativas que devem ser objeto de uma avaliação em conformidade com o Regulamento (UE) n.o 844/2012 (regulamento relativo à renovação das substâncias designadas «AIR‑3», SANCO/2012/11251 rev. 4) (a seguir «Orientações sobre a renovação das substâncias AIR‑3»), a segunda é relativa à violação dos Regulamentos n.os 1107/2009 e 1272/2008 e das Orientações da Comissão sobre os metabolitos nas águas subterrâneas, e a terceira é relativa à violação das regras em matéria de experimentação animal constantes do Regulamento n.o 1107/2009 e da Diretiva 2010/63.

1.      Quanto à violação do Regulamento n.o 1141/2010 e das Orientações sobre a renovação das substâncias AIR3

98      No âmbito desta parte do fundamento, a recorrente alega não ter havido nenhuma alteração do estado de conhecimento científico e afirma que, por conseguinte, a EFSA não tinha o direito de reavaliar os dados sobre a toxicidade já aceites.

99      Segundo a recorrente, em conformidade com o artigo 10.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 1141/2010, a EFSA e os Estados‑Membros devem limitar a sua avaliação aos dados e às informações novas apresentadas no processo complementar, como expressamente referido nas Orientações sobre a renovação das substâncias AIR‑3, segundo as quais «só devem ser avaliados os novos dados e, portanto, os dados apresentados e aceites anteriormente não devem ser revistos, a não ser que essa revisão se afigure necessária atendendo aos atuais conhecimentos científicos e técnicos, que podem exigir que se proceda a uma nova avaliação dos dados anteriores».

100    Não tendo havido nenhuma alteração do estado de conhecimento científico ou dos requisitos em matéria de dados em vigor após a primeira aprovação do FPS, a recorrente não estava obrigada a apresentar, e não apresentou, novos dados sobre a toxicidade quando requereu a renovação da aprovação do FPS em 2011. Por conseguinte, não há circunstâncias que justifiquem que a EFSA reveja os estudos toxicológicos anteriormente aceites e proponha, contra o parecer dos peritos da revisão pelos pares e do EMR, uma classificação como cancerígeno da categoria 2 ou como tóxico para a reprodução da categoria 2.

101    A recorrente considera, assim, que o processo de renovação continuava a basear‑se exatamente no mesmo conjunto de dados sobre a toxicidade que tinha sido avaliado pelo Gabinete Europeu de Produtos Químicos (ECB) em 1998 e em face do qual a Comissão tinha reconhecido estar demonstrada a inocuidade do FPS, o que levou à primeira aprovação da substância em 2001. A recorrente não compreende a que se refere a Comissão quando alega na sua contestação que a reavaliação do perfil de risco do FPS era necessária para se assegurar de que os «novos critérios» eram respeitados. Os critérios aplicáveis à classificação toxicológica das substâncias previstos pelo Regulamento n.o 1107/2009 continuam a ser os mesmos desde a primeira aprovação do FPS.

102    Por conseguinte, segundo a recorrente, a nova avaliação do perfil de perigosidade do FPS efetuada pela EFSA é contrária aos Regulamentos n.os 1107/2009 e 1141/2010.

103    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

104    No caso em apreço, quanto à avaliação do processo que deve ser levada a efeito no âmbito da análise de um pedido de renovação da aprovação de uma substância ativa, importa referir desde logo que, segundo o considerando 15 do Regulamento n.o 1107/2009, «[a] experiência adquirida com a utilização efetiva dos produtos fitofarmacêuticos que contêm as substâncias em causa e a evolução científica e tecnológica deverão ser tidas em conta em qualquer decisão que diga respeito à renovação de uma aprovação».

105    Além disso, o considerando 8 do Regulamento n.o 1141/2010 refere que «[o]s processos apresentados para renovação devem incluir novos dados pertinentes para a substância ativa e novas avaliações dos riscos, a fim de ter em conta eventuais alterações dos requisitos aplicáveis aos dados e quaisquer alterações dos conhecimentos científicos ou técnicos ocorridas desde a primeira inclusão da substância ativa em causa no anexo I da Diretiva 91/414/CEE, como indicado em documentos de orientação publicados pela Comissão e em pareceres pertinentes do Comité Científico das Plantas ou da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos».

106    Por outro lado, o ponto 2.1 das Orientações de 28 de outubro de 2010 sobre a renovação das substâncias ativas inscritas no anexo I da Diretiva 91/414 que devem ser objeto de uma avaliação em conformidade com o Regulamento n.o 1141/2010 (SANCO/10387/2010 rev.8) refere, em substância, que os requerentes identificam nos seus pedidos, nomeadamente, os novos dados que têm intenção de apresentar desde essa primeira fase, uma vez que qualquer novo dado apresentado deve ser justificado em termos da alteração dos requisitos em matéria de dados, de evolução dos conhecimentos científicos e técnicos, de elaboração de orientações e de necessidade de alterar ou de alargar as restrições de inclusão ou as alterações da gama das utilizações representativas.

107    Nestas condições, refira‑se que, apesar de, no âmbito da avaliação de um pedido de renovação, dever ser reservada uma especial atenção aos novos dados relativos à substância ativa e às novas avaliações dos riscos, não resulta de forma alguma dos textos supramencionados, contrariamente ao que defende a recorrente, que o requerente não deva apresentar um processo completo nem que o EMR e a EFSA não devam avaliar todos os dados disponíveis para determinar se os critérios de aprovação são ou não respeitados. Com efeito, como sublinha a Comissão, uma avaliação científica sólida deve ter em conta todas as informações disponíveis, incluindo os dados apresentados aquando do pedido de aprovação.

108    Há que salientar, à semelhança da Comissão, que, uma vez que os critérios de aprovação enunciados no Regulamento n.o 1107/2009 devem ser tomados em consideração, importa proceder à análise completa da segurança da substância. Esta análise pode igualmente pressupor estudar os domínios que já tenham sido avaliados aquando da primeira análise, a fim de os avaliar à luz dos conhecimentos científicos mais recentes. A avaliação científica deve ter em conta o peso dos elementos de prova disponíveis. Esse princípio não seria respeitado se apenas fossem considerados os novos estudos.

109    Quanto ao artigo 10.o do Regulamento n.o 1141/2010, relativo ao conteúdo do processo complementar, refira‑se, à semelhança da Comissão, que este não limita a avaliação da EFSA aos novos estudos constantes do referido processo. Com efeito, esta disposição trata apenas do conteúdo desse processo complementar, e não do alcance da avaliação, e o seu objetivo consiste em atualizar o pedido, nele incluindo os processos apresentados para a primeira inscrição da substância ativa, como prevê o artigo 9.o, n.o 1, daquele regulamento, nos termos do qual os processos complementares são acrescentados aos processos apresentados para a primeira inclusão, com as suas atualizações subsequentes.

110    Por último, quanto às Orientações sobre a renovação das substâncias AIR‑3, segundo as quais «só devem ser avaliados os novos dados e, portanto, os dados apresentados e aceites anteriormente não devem [em princípio] ser revistos, a não ser que essa revisão se afigure necessária atendendo aos atuais conhecimento científicos e técnicos, que podem exigir que se proceda a uma nova avaliação dos dados anteriores», basta salientar que este documento não é aplicável no caso em apreço uma vez que se refere às substâncias AIR‑3, das quais o FPS não faz parte.

111    Tendo em conta o que precede, há que julgar improcedente esta parte do primeiro fundamento.

2.      Quanto à violação dos Regulamentos n.o 1107/2009 e 1272/2008, bem como das Orientações da Comissão sobre os metabolitos nas águas subterrâneas

112    A recorrente alega que o regulamento impugnado viola os Regulamentos n.os 1107/2009 e 1272/2008, na medida em que acolhe a conclusão da EFSA segundo a qual os três metabolitos do FPS (IN‑JV460, IN‑KC576 e IN‑KY374) devem presumir‑se relevantes do ponto de vista toxicológico para a exposição das águas subterrâneas na ausência de classificação formal do FPS no âmbito do Regulamento n.o 1272/2008, apenas com base na proposta da EFSA de classificar o FPS como substância suspeita de ser cancerígena e tóxica para a reprodução (substância cancerígena de categoria 2 e tóxica para a reprodução de categoria 2) (v. n.o 12 supra).

113    A recorrente alega que o procedimento de classificação dos perigos associados às substâncias químicas, incluindo as incorporadas nos produtos fitofarmacêuticos, é completamente diferente do procedimento de aprovação da substância e de renovação dessa aprovação e é regido por outras disposições do direito da União, a saber, o Regulamento n.o 1272/2008.

114    A recorrente acrescenta que os Regulamentos n.os 1107/2009 e 1272/2008 dispõem que a relevância dos metabolitos nas águas subterrâneas só pode ser presumida se a substância parental já tiver sido objeto de uma classificação pela ECHA quanto aos perigos para a saúde humana que lhe são associados no âmbito do Regulamento n.o 1272/2008 ou, pelo menos, se o Comité de Avaliação dos Riscos da ECHA tiver adotado um parecer no âmbito do Regulamento n.o 1272/2008 propondo uma classificação dos perigos para a saúde humana associados à substância parental. Nos termos do Regulamento n.o 1272/2008, só a ECHA tem competência para aplicar os critérios de classificação dos perigos previstos por esse regulamento e para decidir da classificação dos perigos associados às substâncias incorporadas nos produtos fitofarmacêuticos. É insuficiente uma simples proposta de classificação pela EFSA. Segundo a recorrente, a EFSA não possui a perícia técnica nem a competência jurídica para aplicar os critérios de classificação de Regulamento n.o 1272/2008, e ela própria o reconheceu expressamente nas suas conclusões sobre o FPS.

115    A recorrente alega que, na falta de classificação formal do FPS em conformidade com o Regulamento n.o 1272/2008, a EFSA não se podia basear na sua própria classificação para presumir a relevância, do ponto de vista toxicológico, dos três metabolitos do FPS nas águas subterrâneas. Considera que é claro que a EFSA e a Comissão presumiram essa relevância com base na própria proposta de classificação da EFSA e na sua avaliação subjacente das propriedades intrínsecas do FPS.

116    A recorrente acrescenta que essa interpretação é confirmada pelas Orientações da Comissão sobre os metabolitos nas águas subterrâneas, que dispõem que «a classificação da toxicidade da substância ativa parental, resultante da aplicação do [atual Regulamento n.o 1272/2008], é utilizada, por razões práticas, como ponto de partida para orientar a atividade de análise».

117    A recorrente sublinha igualmente que, durante o procedimento de revisão pelos pares, vários Estados‑Membros se opuseram, acertadamente, ao facto de a EFSA se ter indevidamente baseado na sua própria proposta de classificação para presumir a relevância dos metabolitos do FPS nas águas subterrâneas.

118    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

119    A este respeito, importa observar desde logo, à semelhança da recorrente, que a EFSA não é competente para propor ou decidir a classificação dos perigos associados às substâncias incorporadas nos produtos fitofarmacêuticos. Com efeito, por força das disposições do Regulamento n.o 1272/2008, a EFSA não tem nenhuma intervenção, seja no âmbito da autoclassificação, reservada a qualquer fabricante, importador, utilizador a jusante da substância em causa, ou no âmbito da classificação harmonizada, que pode ser proposta pelos supramencionados sujeitos ou pela autoridade competente de um Estado‑Membro e está dependente de um parecer da ECHA. Estas considerações não são contestadas, em substância, pela Comissão.

120    Daqui resulta que uma proposta da EFSA de classificação de uma substância nos termos do disposto no Regulamento n.o 1272/2008 não pode ter, por si só, qualquer consequência jurídica. É, aliás, falacioso fazer referência a uma «proposta de classificação», uma vez que a EFSA não tem qualquer competência para propor essa classificação.

121    Todavia, importa considerar que, em conformidade com o princípio da precaução, cabe à Comissão tomar medidas de proteção se subsistirem incertezas científicas quanto à existência ou ao alcance de riscos para a saúde humana ou para o ambiente.

122    Ora, resulta do regulamento impugnado que as preocupações da Comissão decorriam das «propriedades toxicológicas intrínsecas» no que dizia respeito à carcinogenicidade e à toxicidade reprodutiva da substância parental e não estavam diretamente relacionadas com a classificação considerada apropriada pela EFSA.

123    Com efeito, os considerandos 8 e 9 do regulamento impugnado fazem referência ao facto de que, com base nos estudos analisados, a substância parental ter propriedades toxicológicas intrínsecas, nomeadamente no que diz respeito à carcinogenicidade e à toxicidade.

124    Mais precisamente, a Comissão considerou que, atendendo aos efeitos constatados nos estudos, era legítimo ter receios quanto aos três metabolitos do FPS (IN‑JV460, IN‑KC576 e IN‑KY374) e à sua presença nas águas subterrâneas, uma vez que não tinha sido possível demonstrar que esses metabolitos não possuíam as mesmas propriedades intrínsecas que a substância parental.

125    A este respeito, importa referir que o artigo 3.o, n.o 32, do Regulamento n.o 1107/2009 define as circunstâncias em que o metabolito é considerado «relevante» para a avaliação dos riscos que representa a respetiva substância parental nos seguintes termos:

«Considera‑se que determinado metabolito é relevante caso existam motivos para presumir que possui propriedades intrínsecas comparáveis às da substância original em termos de atividade biológica‑alvo, apresenta para os organismos um risco superior ou comparável ao da substância original ou possui determinadas propriedades toxicológicas consideradas inaceitáveis. Tal metabolito é relevante para a decisão global de aprovação ou para a definição das medidas de redução dos riscos.»

126    É certo que, em conformidade com as Orientações da Comissão sobre os metabolitos nas águas subterrâneas, se a substância parental foi objeto de uma classificação específica, por exemplo, como cancerígeno da categoria 2 (C2) ou como tóxico para a reprodução da categoria 2 (R2), considera‑se que os metabolitos partilham as mesmas propriedades que a substância parental e são considerados relevantes, a não ser que o requerente apresente elementos de prova convincentes atestando que os metabolitos não respeitam os critérios para lhes ser atribuída a mesma classificação que a respetiva substância parental.

127    Todavia, segundo as Orientações acima mencionadas no n.o 126, se a relevância decorre frequentemente da classificação formal da substância parental, esta não é a única consideração suscetível de determinar a relevância dos metabolitos. A mesma pode ser igualmente determinada independentemente da referida classificação. Com efeito, as referidas Orientações referem que «a classificação da toxicidade da substância ativa parental […] é utilizada, por razões práticas, como ponto de partida para orientar a atividade de análise».

128    Além disso, as Orientações da Comissão sobre os metabolitos nas águas subterrâneas referem expressamente que, «independentemente da classificação da substância ativa parental, se houver fundadas suspeitas de um determinado produto de degradação ser tóxico ou altamente tóxico, pode ser necessário um teste específico».

129    No caso em apreço, como refere o considerando 9 do regulamento impugnado, são as propriedades intrínsecas da substância parental reveladas pelos estudos, nomeadamente no que diz respeito à carcinogenicidade nos mamíferos e à toxicidade reprodutiva, que levaram a Comissão a considerar «relevantes» os metabolitos.

130    Nestas condições, tendo em conta os efeitos observados nos estudos sobre o FPS e a necessidade específica de assegurar a proteção das águas subterrâneas como refere expressamente o Regulamento n.o 1107/2009, a Comissão, em conformidade com o princípio da precaução e na sua qualidade de gestora dos riscos, sem cometer qualquer erro manifesto de apreciação, considerou que a presença dos três metabolitos do FPS nas águas subterrâneas suscitava preocupação, uma vez que não tinha sido demonstrado que esses metabolitos não possuíam as mesmas propriedade intrínsecas que a substância parental. Concluiu, assim, que era impossível demonstrar que a presença dos metabolitos nas águas subterrâneas, alguns excedendo o limiar de 0,1 μg/l em todos os cenários, não tinha efeitos inaceitáveis para essas águas e efeitos nocivos para a saúde humana.

131    Tendo em conta as considerações anteriores, há que concluir que, contrariamente ao que alega a recorrente, a Comissão não violou o Regulamento n.o 1107/2009, nem o Regulamento n.o 1272/2008, nem as suas Orientações sobre os metabolitos nas águas subterrâneas.

132    Por conseguinte, há que julgar improcedente a presente parte do primeiro fundamento.

3.      Quanto à violação das regras em matéria de experimentação animal constantes do Regulamento n.o 1107/2009 e da Diretiva 2010/63

133    Nesta parte do seu primeiro fundamento, a recorrente alega que o regulamento impugnado viola as regras relativas à experimentação animal na medida em que a EFSA e a Comissão não previram soluções adequadas para substituir o recurso a ensaios em animais vertebrados antes de exigir a realização de novos estudos in vivo com vista a excluir o potencial genotóxico do metabolito IN‑JE127.

134    Em particular, alega que, no procedimento de renovação da aprovação do FPS, a EFSA e a Comissão não tiveram em conta o princípio do «último recurso», ao identificarem uma «lacuna nos dados» respeitantes a um estudo in vivo adicional que considerou provada a exposição da medula óssea ao metabolito IN‑JE127, sem tomar devidamente em consideração os métodos alternativos sem a utilização de animais, sem analisar o valor probatório dos elementos apresentados e sem ter em conta, por um lado, o novo estudo in vitro de genotoxicidade (mutação genética em células de mamíferos) apresentado pela DuPont, que evidenciava claramente resultados negativos, e, por outro, os dados adicionais provenientes de modelizações produzidos pela DuPont, que mostravam que o metabolito IN‑JE127 não se infiltrava nas águas subterrâneas em concentrações superiores a 0,1 μg/l, o que provava que o novo ensaio in vivo pedido pela EFSA seria inútil e, por conseguinte, injustificado.

135    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

136    No caso em apreço, importa referir desde logo que as alegações da recorrente são baseadas na premissa errada segundo a qual a EFSA e a Comissão exigiram a realização de novos estudos in vivo para excluir o potencial genotóxico do metabolito IN‑JE127.

137    Com efeito, importa salientar que a EFSA, nas suas conclusões revistas de outubro de 2016, referiu uma lacuna nos dados relativos ao perfil genotóxico do metabolito IN‑JE127, indicando que um estudo in vivo realizado em mamíferos tinha dado resultados negativos e não tinha permitido confirmar uma exposição da medula óssea. Todavia, como sublinha a Comissão, a EFSA não pediu um novo estudo in vivo tendo em vista excluir o potencial genotóxico do metabolito IN‑JE127, contrariamente ao que afirma a recorrente.

138    Nestas condições, há que julgar improcedente esta parte do primeiro fundamento e, portanto, o primeiro fundamento na sua totalidade.

C.      Quanto ao segundo fundamento, relativo ao facto de a Comissão se ter baseado incorretamente em documentos de orientação novos ou ter utilizado de forma incoerente os documentos de orientação, violando o princípio da segurança jurídica e dos direitos de defesa dos requerentes da renovação

139    Este fundamento divide‑se em duas partes. Por um lado, quanto à avaliação da genotoxicidade do metabolito IN‑JE127, a recorrente alega que a EFSA se baseou em documentos de orientação que não tinham sido aceites ou que não eram aplicáveis à data da apresentação do processo de renovação do FPS. Por outro lado, quanto à avaliação dos riscos relativos às algas, a recorrente alega que a EFSA utilizou de forma incoerente os documentos de orientação e aprovou uma avaliação dos riscos que contradizia o documento de orientação disponível.

1.      Quanto à avaliação da genotoxicidade do metabolito INJE127

140    A recorrente alega que a avaliação da genotoxicidade do metabolito IN‑JE127 foi efetuada com base em documentos de orientação que não tinham sido aprovados e que não era aplicáveis à data da apresentação do processo de renovação do FPS.

141    A este título, refere a recorrente que o regulamento impugnado viola o princípio da segurança jurídica, bem como o artigo 12.o, n.o 2, e o anexo II, ponto 3.8.3, do Regulamento n.o 1107/2009, que exigem expressamente que a avaliação dos riscos seja efetuada pela EFSA «com base em documentos de orientação disponíveis na altura do pedido [de aprovação ou de renovação]» e «com base nas orientações para a realização de testes, acordadas a nível [da União] ou a nível internacional». O artigo 16.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1141/2010 confirma a aplicação desta regra já consolidada no âmbito do programa de revisão das substâncias AIR‑2, entre as quais figura o FPS.

142    Segundo a recorrente, mesmo que a Comissão tenha entendido rever a aprovação do FPS com base nas prescrições formuladas num novo «documento de orientação», como o parecer científico da EFSA, de 3 de outubro de 2012, relativo às estratégias de ensaios de genotoxicidade aplicáveis à avaliação de segurança dos géneros alimentícios e alimentos para animais (a seguir «parecer científico de 2012»), estava manifestamente obrigada a dar ao requerente da renovação a possibilidade de responder aos novos requisitos em matéria de dados decorrentes do referido parecer científico.

143    No caso do FPS, a DuPont só teve conhecimento da «lacuna nos dados» quanto à genotoxicidade do metabolito IN‑JE127 quando a EFSA publicou as suas conclusões revistas, em outubro de 2016, muito depois do termo do procedimento inicial de «revisão pelos pares» do FPS. Para responder a esse novo requisito em matéria de dados, a DuPont efetuou imediatamente dois outros estudos que confirmaram o perfil não genotóxico do metabolito IN‑JE127. Informou a Comissão dos resultados desses estudos em 18 de outubro de 2016 e em 13 de janeiro de 2017. Todavia, a Comissão recusou tomar em consideração esses resultados antes da adoção do regulamento impugnado, o que constitui uma violação do princípio da segurança jurídica e dos direitos de defesa dos requerentes da renovação.

144    A recorrente acrescenta que, ainda que o parecer científico de 2012 tenha sido publicado antes da data da apresentação do processo do FPS, tal não responde, no entanto, ao argumento de que a EFSA se baseou num parecer científico que ainda hoje é objeto de análise em conformidade com o próprio mandato da Comissão e, portanto, não constitui uma metodologia estabelecida e acordada de avaliação dos riscos em vigor à data da apresentação do processo. Segundo a recorrente, enquanto aguardava o resultado da análise iniciada pela EFSA, a Comissão suspendeu a adoção de qualquer decisão de natureza regulamentar sobre a eventual renovação das substâncias em relação às quais só tinham sido identificadas preocupações relacionadas com a genotoxicidade.

145    Além disso, segundo a recorrente, o parecer científico de 2012 só foi publicado após a data da entrada em vigor do Regulamento n.o 1141/2010, em 28 de dezembro de 2010. Pelo facto de o artigo 16.o, n.o 2, do mesmo regulamento obrigar à utilização dos «documentos de orientação disponíveis na altura da entrada em vigor do presente regulamento», a EFSA e a Comissão, com esse fundamento, não se deviam ter baseado no parecer científico de 2012 para a avaliação do FPS.

146    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

147    No que respeita a esta parte do segundo fundamento, importa desde logo constatar que é inoperante.

148    Com efeito, uma eventual violação do Regulamento n.o 1107/2009, do Regulamento n.o 1141/2010, do princípio da segurança jurídica ou dos direitos de defesa relativamente a esse aspeto do procedimento não podia ter como consequência a anulação do regulamento impugnado. Há que salientar, a este respeito, que, como alega a Comissão, sem a constatação relativa à falta de dados sobre o potencial genotóxico do metabolito IN‑JE127, mencionada no considerando 10 do regulamento impugnado, esta teria, apesar de tudo, chegado à mesma conclusão, tendo em conta a existência de um elevado risco de exposição das águas subterrâneas a vários outros metabolitos do FPS e de um elevado risco para os organismos aquáticos. Com efeito, este fundamento é apresentado no regulamento impugnado como sendo um fundamento adicional ou mesmo subsidiário.

149    De qualquer modo, quanto ao argumento da recorrente relativo ao facto de a EFSA se ter baseado no parecer científico de 2012 violando a regra segundo a qual as avaliações dos riscos devem ser efetuadas utilizando documentos de orientação aplicáveis à data de apresentação do processo, refira‑se, à semelhança da Comissão, que a primeira versão do referido parecer foi publicada em 30 de setembro de 2011, tal como indicado na primeira página.

150    Por conseguinte, não se pode defender que as avaliações dos riscos tenham sido efetuadas com base num documento de orientação publicado após a apresentação integral do processo de renovação, que data de maio de 2012.

151    Além disso, importa constatar, como se refere na resposta da Comissão às questões do Tribunal Geral, que o parecer científico de 2012 não foi formalmente aprovado pela Comissão como documento de orientação nos termos do artigo 77.o do Regulamento n.o 1107/2009. Trata‑se antes de um parecer científico que a EFSA utiliza para avaliar os aspetos em matéria de genotoxicidade no contexto da legislação relativa aos géneros alimentícios e alimentos para animais.

152    Segundo a Comissão, os pareceres científicos da EFSA representam os conhecimentos científicos mais recentes num determinado domínio, neste caso no domínio da genotoxicidade, no que respeita às avaliações da segurança dos géneros alimentícios e alimentos para animais.

153    A este respeito, importa salientar que o artigo 12.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1107/2009 refere expressamente que a EFSA aprova as suas conclusões sobre a previsibilidade de a substância ativa satisfazer os critérios previstos no artigo 4.o do mesmo regulamento, «à luz dos conhecimentos científicos e técnicos atuais».

154    Nestas condições, a EFSA não pode ser criticada por ter efetuado uma avaliação do risco com base no parecer científico de 2012, que se limita a resumir os conhecimentos científicos mais recentes no domínio da genotoxicidade e cuja primeira versão foi, por outro lado, publicada antes da apresentação integral do processo de renovação.

155    Quanto ao argumento da recorrente segundo o qual o parecer científico de 2012 não podia ser utilizado, uma vez que foi publicado após a data de entrada em vigor do Regulamento n.o 1141/2010, em 28 de dezembro de 2010, basta referir, como se concluiu acima no n.o 151, que aquele parecer científico não foi formalmente aprovado pela Comissão como documento de orientação nos termos do artigo 77.o do Regulamento n.o 1107/2009. Por conseguinte, o artigo 16.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1141/2010 não é aplicável no caso em apreço. Este argumento deve, consequentemente, ser igualmente julgado improcedente.

156    Por último, quanto ao argumento segundo o qual, ainda que a Comissão tenha entendido rever a aprovação do FPS com base nas prescrições formuladas num novo «documento de orientação», estava manifestamente obrigada a dar ao requerente da renovação a possibilidade de responder aos novos requisitos em matéria de dados decorrentes desse novo «documento de orientação», há que considerar que também não pode proceder.

157    Com efeito, é efetivamente lamentável que a «lacuna nos dados» quanto à genotoxicidade do metabolito IN‑JE127 só tenha sido levada ao conhecimento do requerente da renovação quando a EFSA publicou as suas conclusões revistas, em outubro de 2016, muito depois do termo do procedimento inicial de «revisão pelos pares» do FPS. Todavia, como se referiu acima, contrariamente ao que alega a recorrente, essa «lacuna nos dados» não se baseia num novo requisito em matéria de dados decorrente de um novo «documento de orientação». Pelo contrário, baseia‑se num parecer científico que se limita a resumir os conhecimentos científicos mais recentes no domínio da genotoxicidade e cuja primeira versão foi publicada antes da apresentação do processo de renovação.

158    Tendo em conta o que precede, há que julgar improcedente a presente parte do segundo fundamento.

2.      Quanto à avaliação dos riscos relativos às algas

159    No que respeita à avaliação dos riscos relativos às algas, a recorrente alega, em substância, que o modo como a EFSA procedeu à avaliação dos riscos associados ao FPS para as algas é, por um lado, incoerente, em comparação com a abordagem adotada na avaliação dos riscos para as plantas aquáticas, e, por outro, manifestamente errado, na medida em que a EFSA se afastou das suas Orientações sobre a avaliação dos riscos para os organismos aquáticos, bem como das orientações aplicáveis da Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE).

160    A recorrente alega que a EFSA efetuou uma avaliação global de nível elevado para as plantas aquáticas verificando utilizações seguras, mas apenas uma avaliação de nível 1 para as algas que conduz inevitavelmente à identificação de um «risco elevado». Segundo a recorrente, se a EFSA tivesse adotado uma abordagem coerente tanto para as algas como para as plantas aquáticas, ou seja, reduzindo o valor do fator de avaliação e tomando em consideração o valor de referência relativo à taxa de crescimento, teriam sido identificadas utilizações seguras também para as algas.

161    Em todo o caso, segundo a recorrente, a partir do momento em que lhe foi dado conhecimento da abordagem imprevista da EFSA, o requerente da renovação levou a efeito um estudo adicional sobre as algas tendo em vista a sua inclusão na análise da distribuição da sensibilidade das espécies que permitia, com o conjunto de dados disponíveis, identificar utilizações seguras para as algas. No entanto, mais uma vez a Comissão recusou analisar este estudo, por ter sido efetuado posteriormente ao termo da revisão pelos pares, violando os princípios gerais do direito da União invocados pela recorrente.

162    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

163    No caso em apreço, refira‑se que, com base nos elementos constantes do processo e na resposta apresentada pela Comissão, sobre este aspeto, às questões do Tribunal Geral, pode constatar‑se a existência de alguma diferença na abordagem adotada pela EFSA na avaliação efetuada para as algas e na efetuada para as plantas aquáticas. Em particular, a EFSA aceitou reduzir o valor do fator de avaliação para as plantas aquáticas, constatando a existência de utilizações seguras, mas recusou reduzir o valor do fator de avaliação para as algas, o que leva à identificação de um risco elevado. Além disso, a EFSA utilizou, como critério na avaliação dos riscos para as algas, a biomassa, em vez da taxa de crescimento, que, segundo a recorrente, lhe teria permitido demonstrar a existência de utilizações sem risco nos vários cenários ambientais relevantes designados «FOCUS», medindo a vulnerabilidade das águas subterrâneas à contaminação resultante da utilização de uma substância ativa, ao passo que utilizou o valor da taxa de crescimento para a avaliação dos riscos para as plantas aquáticas.

164    Todavia, importa referir que a avaliação dos riscos para todos os organismos aquáticos se baseou principalmente nas Orientações da EFSA sobre a avaliação dos riscos para os organismos aquáticos de 2002, que era o documento oficialmente aplicável à data em que o processo de renovação do FPS foi apresentado, em maio de 2012. Em contrapartida, as novas Orientações da EFSA, a saber, as Orientações da EFSA sobre a avaliação por nível dos riscos associados aos produtos fitofarmacêuticos para os organismos aquáticos existentes nas águas de superfície nas orlas dos campos, de 5 de agosto de 2013, mencionadas pela recorrente, são aplicáveis aos pedidos apresentados a partir de 1 de janeiro de 2015, ou seja, posteriores à revisão do FPS.

165    Quanto a este último documento, a Comissão explica que, durante o período de transição para a aplicação desse novo documento, foram realizadas avaliações casuísticas e a EFSA organizou reuniões de peritos sempre que surgia uma discordância a respeito da abordagem utilizada durante a fase de observações sobre as avaliações. Com efeito, os requerentes já antes de 1 de janeiro de 2015 apresentavam dados e avaliações dos riscos que seguiam algumas recomendações dessas Orientações, em conformidade com o parecer científico publicado em 2013 que serviu de base a essas Orientações.

166    Segundo a jurisprudência, para apurar se a Comissão cometeu na apreciação dos factos um erro manifesto suscetível de justificar a anulação da decisão impugnada, os elementos de prova fornecidos pelas recorrentes devem ser suficientes para retirar plausibilidade às apreciações dos factos considerados na decisão (v., neste sentido, Acórdãos de 12 de dezembro de 1996, AIUFFASS e AKT/Comissão, T‑380/94, EU:T:1996:195, n.o 59, e de 1 de julho de 2004, Salzgitter/Comissão, T‑308/00, EU:T:2004:199, n.o 138). Sem prejuízo dessa análise de plausibilidade, não cabe ao Tribunal Geral substituir pela sua a apreciação de factos complexos feita pelo autor da decisão (Acórdão de 9 de setembro de 2011, Dow AgroSciences e o./Comissão, T‑475/07, EU:T:2011:445, n.o 152).

167    Ora, por um lado, a EFSA e os peritos justificaram detalhadamente, do ponto de vista técnico, as eventuais diferenças entre as abordagens seguidas para as algas e para as plantas aquáticas, e as explicações da Comissão a este respeito são suficientemente credíveis. Com efeito, a Comissão explicou, nomeadamente, que a redução do fator de avaliação para as plantas aquáticas, associado à utilização do valor de referência da taxa de crescimento, foi sugerida pelos peritos como solução alternativa pelo facto de a espécie lemna gibba se ter revelado extremamente mais sensível do que todas as outras espécies utilizadas no ensaio. Em contrapartida, a diferença de sensibilidade das espécies utilizadas no ensaio das algas não era tão vincada e, por conseguinte, não pôde ser efetuada a mesma redução do fator de avaliação.

168    Por outro lado, os elementos de prova fornecidos pela recorrente não são suficientes para retirar plausibilidade ao regulamento impugnado, que se baseia, nomeadamente, nas apreciações da EFSA. Nestas condições, há que considerar que não cabe ao Tribunal Geral substituir pela sua a apreciação de factos complexos feita pelo autor da decisão.

169    Por outro lado, quanto ao estudo adicional fornecido pela recorrente, que, segundo esta, permitiu, com o conjunto dos dados disponíveis, identificar utilizações seguras para as algas, mas não foi tido em consideração pela Comissão, basta referir que foi apresentado em 13 de janeiro de 2017, ou seja, após o termo das conclusões científicas da EFSA e quase no fim do procedimento de renovação. Nestas condições e na falta de disposições no Regulamento n.o 1141/2010 que permitam a transmissão dos dados adicionais numa fase tão avançada da avaliação, importa considerar que a Comissão recusou acertadamente tomar em consideração o referido estudo.

170    Tendo em conta o que precede, há que julgar improcedente a presente parte do segundo fundamento e, portanto, o fundamento na sua totalidade.

D.      Quanto ao terceiro fundamento, relativo ao facto de que a Comissão não ter efetuado uma avaliação completa dos riscos, violando várias disposições do direito da União e os direitos de defesa do requerente da renovação

171    A recorrente alega que a Comissão não efetuou uma avaliação completa dos riscos, violando o artigo 13, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009 e o artigo 17, n.o 1, do Regulamento n.o 1141/2010.

172    A recorrente afirma que, quando se pronuncia sobre a renovação de uma substância, a Comissão não pode basear a sua decisão apenas nas conclusões da EFSA, mas, pelo contrário, está obrigada a ter igualmente em consideração as conclusões do EMR, as observações formuladas pelo requerente da renovação e pelos outros Estados‑Membros quanto à avaliação dos riscos pelo EMR, bem como qualquer outra prova científica relevante de que disponha. Isto abrange, nomeadamente, todos os dados, estudos ou tomadas de posição adicionais apresentados por um requerente, mesmo após a publicação das conclusões da EFSA, com vista a responder a «lacunas nos dados» ou a «preocupações» concretas que o requerente não pudesse razoavelmente prever à data da apresentação do processo, apesar de o seu processo ser inteiramente conforme aos requisitos em matéria de dados em vigor e aos documentos de orientação aplicáveis à data da apresentação.

173    No caso em apreço, a Comissão baseou o regulamento impugnado unicamente nas conclusões da EFSA e não teve em consideração qualquer outra prova científica apresentada pelo requerente da renovação e que confirmasse a segurança do FPS.

174    A recorrente alega que nenhuma disposição do Regulamento n.o 1107/2009 proíbe a Comissão de analisar dados adicionais apresentados após o termo da revisão pelos pares. Pelo contrário, como confirmou o Tribunal de Justiça, a Comissão estava obrigada a assegurar a realização de uma avaliação global dos riscos e, portanto, se for caso disso, a solicitar e a analisar dados adicionais antes de tomar uma decisão sobre a aprovação ou a renovação. A própria Comissão reconheceu, no âmbito de processos anteriores perante o Provedor de Justiça Europeu, que o Regulamento n.o 1107/2009 lhe permitia solicitar e analisar dados adicionais durante o procedimento de revisão.

175    Segundo a recorrente, a mera possibilidade de «transmitir observações» não é manifestamente suficiente para garantir que seja levada a efeito uma análise global e que os direitos de defesa do requerente sejam devidamente respeitados. Limitar o requerente à apresentação de meras observações, por exemplo ao avaliar as conclusões da EFSA, não lhe permite apresentar novos estudos e dados que possam verdadeiramente solucionar preocupações ou suprir lacunas nos dados.

176    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

177    A este respeito, importa desde logo referir que, em conformidade com jurisprudência constante, nos casos em que uma instituição dispõe de um amplo poder de apreciação, o respeito das garantias conferidas pela ordem jurídica da União nos procedimentos administrativos assume uma importância ainda mais fundamental. Entre estas garantias figura, nomeadamente, a obrigação de a instituição competente examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos pertinentes do caso concreto (v. Acórdão de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 171 e jurisprudência referida).

178    Daqui resulta que a realização de uma avaliação científica dos riscos tão exaustiva quanto possível com base em pareceres científicos assentes nos princípios da excelência, da transparência e da independência constitui uma garantia processual importante a fim de assegurar a objetividade científica das medidas e evitar a adoção de medidas arbitrárias (Acórdão de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 172).

179    À luz dos elementos acima referidos, importa salientar que o procedimento de renovação do FPS durou de maio de 2012 a julho de 2017, ou seja, mais de cinco anos.

180    Em primeiro lugar, quanto à pretensa violação do artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009 e do artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1141/2010, basta constatar que estas disposições, por um lado, se limitam a referir que a Comissão deve elaborar um relatório de revisão e um projeto de regulamento tendo em conta o projeto de relatório de avaliação elaborado pelo EMR e as conclusões da EFSA e, por outro, dão ao requerente da renovação a possibilidade de apresentar as suas observações. Não se pode defender que essas disposições tenham sido violadas.

181    Em particular quanto ao relatório do EMR, apesar de este ter concluído que o processo de renovação estava completo e ser ter mostrado favorável à renovação da aprovação do FPS, não deixa de ser verdade que identificou vários problemas relativos, nomeadamente, aos metabolitos nas águas subterrâneas e ao risco para os organismos aquáticos. No que respeita mais especificamente aos riscos para os organismos aquáticos, o EMR recomendou que o tema fosse discutido entre peritos, como resulta da secção 3.1.8 do volume 1 do seu relatório.

182    Quanto à possibilidade de o requerente da renovação apresentar as suas observações, importa observar que a gestão do processo por parte da Comissão não constitui uma violação dos direitos de defesa ou do direito de ser ouvida da recorrente.

183    A este respeito, há que referir que, segundo jurisprudência constante, o respeito dos direitos de defesa, em qualquer processo iniciado contra alguém e suscetível de culminar num ato que lhe cause prejuízo, constitui um princípio fundamental de direito da União que deve ser garantido, mesmo na falta de regulamentação específica relativa à tramitação processual. Esse princípio exige que os destinatários de decisões que afetem de modo sensível os seus interesses sejam colocados em condições de dar utilmente a conhecer o seu ponto de vista (v., neste sentido, Acórdãos de 15 de junho de 2006, Dokter e o., C‑28/05, EU:C:2006:408, n.o 74, e de 9 de setembro de 2008, Bayer CropScience e o./Comissão, T‑75/06, EU:T:2008:317, n.o 130). O direito de ser ouvido num procedimento administrativo que visa uma determinada pessoa constitui um corolário do direito de defesa que deve ser respeitado mesmo na ausência de qualquer regulamentação relativa ao procedimento (v., neste sentido, Acórdão de 11 de setembro de 2002, Alpharma/Conselho, T‑70/99, EU:T:2002:210, n.o 388 e jurisprudência referida).

184    No caso em apreço, importa salientar que a recorrente teve a possibilidade de formular as suas observações em tempo útil. Com efeito, como se recordou nos n.os 4 a 33 supra, resulta dos autos que a Comissão registou as suas observações tanto sobre o relatório de avaliação do EMR como sobre as conclusões da EFSA e o seu relatório de revisão. Por outro lado, a recorrente foi ouvida pela Comissão na reunião de 24 de junho de 2015, na qual foi discutida a avaliação da renovação do FPS.

185    Daqui resulta que a recorrente foi convidada a apresentar observações e que esta o fez quer por escrito quer numa audição com os serviços da Comissão. Nestas condições, há que constatar que a recorrente exerceu efetivamente os seus direitos de defesa.

186    Em segundo lugar, no que respeita ao argumento da recorrente de que a Comissão não tomou em consideração qualquer outra prova científica apresentada pelo requerente da renovação e que confirmava a segurança do FPS, importa constatar, à semelhança da Comissão, que, nos termos do artigo 16.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1141/2010, não podem ser tomados em consideração pela Comissão novos dados apresentados sem terem sido solicitados ou apresentados no final do procedimento de aprovação e após a revisão pelos pares.

187    Embora seja verdade que nenhuma disposição do Regulamento n.o 1107/2009 proíbe expressamente a Comissão de analisar os dados adicionais apresentados após o termo da revisão pelos pares, há que referir que, segundo o considerando 14 do referido regulamento, «[p]ara tornar mais rápida a aprovação das substâncias ativas, deverão ser fixados prazos estritos para as diferentes fases processuais». O Regulamento n.o 1107/2009 prevê, na verdade, prazos bastante estritos para as diferentes fases do procedimento de aprovação. A este respeito, importa observar que o Regulamento n.o 1141/2010 utiliza a mesma abordagem para regular o procedimento de renovação.

188    Além disso, importa considerar que uma prorrogação indefinida do prazo de avaliação de uma substância ativa seria contrária ao objetivo prosseguido pelo Regulamento n.o 1107/2009 que consiste em assegurar um elevado nível de proteção da saúde humana e animal e do ambiente.

189    Nestas condições, a Comissão não pode ser criticada por ter recusado analisar dados adicionais apresentados após o termo da revisão pelos pares.

190    Por outro lado, há que salientar que, como refere o considerando 19 do regulamento impugnado, a recorrente tem a possibilidade de apresentar um novo pedido de aprovação, no qual podem ser incluídos quaisquer dados novos ou um estudo científico destinado a responder às preocupações manifestadas no âmbito do procedimento de renovação em causa.

191    Tendo em conta o que precede, há que concluir que o regulamento impugnado não viola o artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1107/2009, nem o artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1141/2010, nem os direitos de defesa ou o direito de ser ouvido da recorrente. Por conseguinte, o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente.

E.      Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade

192    A recorrente alega que o regulamento impugnado viola o princípio geral da proporcionalidade consagrado pelo artigo 5.o, n.o 4, TUE na medida em que é desproporcionado face ao objetivo do Regulamento n.o 1107/2009 que consiste em assegurar que todas as substâncias contidas nos produtos fitofarmacêuticos sejam objeto de um processo de avaliação dos riscos para garantir que só possam circular livremente no mercado único as substâncias inofensivas para a saúde humana ou animal ou para o ambiente.

193    Antes de mais, a recorrente insiste na falta de elementos de prova da nocividade do FPS.

194    Em primeiro lugar, quanto à alegada toxicidade dos metabolitos nas águas subterrâneas, a recorrente sublinha que não existe atualmente qualquer fundamento jurídico ou científico que permita presumir a relevância dos três metabolitos do FPS (IN‑JV460, IN‑KC576 e IN‑KY374) cuja presença espetável nas águas subterrâneas exceda o limiar de 0,1 μg/l. Além disso, os estudos suplementares realizados pela DuPont demonstram que o metabolito IN‑JE127 não é genotóxico e não se encontra nas águas subterrâneas em concentrações superiores a 0,1 μg/l.

195    Em segundo lugar, quanto ao risco para os organismos aquáticos, designadamente as algas e as plantas aquáticas, refere a recorrente que vários estudos de nível superior disponíveis comprovam que são possíveis utilizações do FPS isentas de risco para aqueles através de melhorias adequadas, em conformidade com as Orientações da EFSA sobre a avaliação dos riscos para os organismos aquáticos e com as orientações aplicáveis da OCDE.

196    A recorrente considera que o caráter desproporcionado do regulamento impugnado resulta sobretudo do facto de o FPS apresentar um dos perfis regulamentares mais seguros entre os herbicidas existentes e pretende igualmente que seja prestada especial atenção às consequências do regulamento impugnado e, mais precisamente, à perda que para si representa, bem como para os agricultores, devido à privação de uma substância importante para combater as ervas daninhas nas culturas, sabendo que a EFSA identificou um determinado número de utilizações para as quais os substitutos dos produtos à base de FPS atualmente não existem ou são insuficientes.

197    Em todo o caso, a recorrente alega que a Comissão poderia ter optado por outras abordagens com consequências menos graves, em vez de adotar uma decisão de não renovação da aprovação do FPS.

198    A recorrente pretendia poder beneficiar do procedimento relativo aos dados confirmatórios (a seguir «PDC»), previsto no artigo 6.o, alínea f), do Regulamento n.o 1107/2009, que permite à Comissão aprovar uma substância incorporada nos produtos fitofarmacêuticos ou renovar a sua aprovação sob reserva da obrigação de apresentar dados confirmatórios para suprir as «lacunas nos dados». A recorrente contesta a posição da Comissão que considera que o PDC apenas deve ser utilizado para suprir imprevisíveis «lacunas nos dados» decorrentes de orientações novas ou alteradas. Assim, segundo a recorrente, o PDC deve igualmente permitir a apresentação de informações que «são consideradas de natureza confirmatória e exigidas para reforçar a confiança na decisão». A recorrente considera que seria adequado beneficiar do referido procedimento, nomeadamente para permitir demonstrar a exposição da medula óssea ao metabolito IN‑JE127 no estudo de genotoxicidade no rato, uma vez que esse novo requisito em matéria de dados resultava de um novo parecer científico que não estava disponível à data da apresentação do processo, ou ainda para aceder, se fosse caso disso, atendendo à decisão da ECHA sobre a classificação dos perigos, ao perfil de toxicidade dos três metabolitos do FPS alegadamente «relevantes».

199    A este respeito, a recorrente alega que a Comissão, no passado, renovou substâncias apesar da presença de um número bem mais significativo de metabolitos que suscitavam preocupação. Por exemplo, o thifensulfurão‑metilo (AIR‑2) foi renovado embora contasse com pelo menos seis metabolitos que suscitavam preocupação. Além disso, no âmbito de um programa de controlo geral de pesticidas realizado na Dinamarca entre 2013 e 2016, não foi detetado nas águas subterrâneas nenhum dos três principais metabolitos do solo do FPS.

200    Quanto ao metabolito IN‑JE127, a própria Comissão admitiu no relatório de avaliação revisto sobre o FPS que a exposição humana a esse metabolito é considerada «muito despicienda».

201    Segundo a recorrente, as «duas classificações sugeridas (C2 e R2)» não se equivalem para distinguir o caso do FPS do de outras substâncias no que respeita à utilização do PDC. A Comissão utiliza frequentemente o PDC para solicitar dados confirmatórios sobre os metabolitos, inclusivamente quando a EFSA propõe classificar a substância parental para determinados riscos. No caso do FPS, a Comissão ainda referiu que a ECHA devia estar autorizada a analisar os estudos de toxicidade adicionais apresentados pelo requerente da renovação.

202    A recorrente sublinha que a utilização do PDC também foi consideravelmente preconizada por vários Estados‑Membros.

203    Por último, mesmo admitindo que existe um risco real para as plantas aquáticas, a recorrente contesta o «risco elevado» para «todas as utilizações» e considera preferível abordar as questões relacionadas com a ecotoxicologia a nível dos Estados‑Membros no momento da avaliação dos produtos fitofarmacêuticos, podendo estes adotar medidas de restrição específicas, que seriam menos restritivas do que uma proibição pura e simples da utilização do FPS, como zonas tampão sem pulverização ao redor das zonas aquáticas. A este respeito, salienta que essa opinião é partilhada pelo EMR, que referiu expressamente que os estudos complementares de nível superior apresentados pela DuPont após a publicação do relatório de avaliação da renovação (incluindo o estudo sobre o repovoamento das algas), que não teve em conta na avaliação dos riscos, «podem ser analisados mais amplamente a nível dos Estados‑Membros».

204    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

205    No caso em apreço, importa referir, antes de mais, que os argumentos relativos à alegada falta de elementos de prova da nocividade do FPS e a obrigação da EFSA e da Comissão de tomar em consideração os novos estudos apresentados pelo requerente da renovação já foram excluídos no âmbito dos segundo e terceiro fundamentos e, por conseguinte, não são abordados no âmbito do presente fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade.

206    Em seguida, refira‑se que, segundo jurisprudência constante, o princípio da proporcionalidade, que constitui um dos princípios gerais do direito da União, exige que os atos das instituições não ultrapassem os limites do adequado e necessário à realização dos objetivos legítimos prosseguidos pela regulamentação em causa, entendendo‑se que, quando exista uma escolha entre várias medidas adequadas, se deve recorrer à menos rígida, e que os inconvenientes causados não devem ser desproporcionados relativamente aos objetivos pretendidos (Acórdãos de 11 de setembro de 2002, Pfizer Animal Health/Conselho, T‑13/99, EU:T:2002:209, n.o 411, e de 7 de março de 2013, Acino/Comissão, T‑539/10, não publicado, EU:T:2013:110, n.o 85; v., também, neste sentido, Acórdão de 18 de novembro de 1987, Maizena e o., 137/85, EU:C:1987:493, n.o 15).

207    Todavia, importa observar que, em matéria agrícola, a fiscalização jurisdicional do princípio da proporcionalidade é especial, na medida em que o Tribunal de Justiça e o Tribunal Geral reconhecem ao legislador da União um poder discricionário que corresponde às responsabilidades políticas que os artigos 40.o a 43.o TFUE lhe atribuem nesse domínio. No presente processo, o regulamento impugnado baseia‑se no Regulamento n.o 1107/2009, que tem por base jurídica, nomeadamente, os artigos 43.o e 114.o TFUE. Por conseguinte, só o caráter manifestamente inadequado de uma medida adotada neste domínio, em relação ao objetivo que a instituição competente pretende prosseguir, pode afetar a legalidade de tal medida (Acórdãos de 5 de maio de 1998, National Farmers’ Union e o., C‑157/96, EU:C:1998:191, n.o 61, e de 3 de setembro de 2009, Cheminova e o./Comissão, T‑326/07, EU:T:2009:299, n.o 195).

208    A recorrente alega que a Comissão poderia ter optado por outras abordagens com consequências menos graves, como recorrer ao PDC, em vez de adotar uma decisão de não renovação da aprovação do FPS.

209    A este respeito, refira‑se que o artigo 6.o, alínea f), do Regulamento n.o 1107/2009 prevê efetivamente que a aprovação pode ser sujeita a condições e a restrições como a apresentação de informações confirmatórias complementares aos Estados‑Membros, à Comissão e à EFSA, sempre que sejam fixados novos requisitos durante o processo de avaliação ou na sequência de novos conhecimentos científicos e técnicos. O ponto 2.2 do anexo II do Regulamento n.o 1107/2009 prevê a possibilidade de, em casos excecionais, uma substância ativa poder ser aprovada, apesar de certas informações ainda não terem sido apresentadas, se «[o]s requisitos em matéria de dados tiverem sido alterados ou atualizados após a apresentação do processo» ou «[a]s informações forem consideradas de natureza confirmatória, tal como exigido para aumentar a confiança na decisão».

210    Nos termos dessas disposições, não é possível recorrer ao PDC, uma vez que os dados deviam constar do processo de renovação à data da respetiva apresentação e estavam disponíveis orientações adequadas para efetuar a avaliação exigida. Com efeito, essas disposições não podem ser utilizadas para suprir lacunas nos dados, detetadas durante o procedimento de aprovação. Além disso, essas disposições não autorizam a aprovação de substâncias ativas em relação às quais não tenha sido demonstrada a ausência de efeitos nocivos para a saúde humana ou animal ou de efeitos inaceitáveis para o ambiente ou as águas subterrâneas.

211    Ora, em primeiro lugar, no que respeita ao risco para as águas subterrâneas, já se referiu no âmbito da análise do primeiro fundamento que, tendo em conta os efeitos observados nos estudos levados a cabo sobre o FPS, em que determinadas propriedades relacionadas com a carcinogenicidade e com a toxicidade reprodutiva suscitavam preocupação, a Comissão, em conformidade com o princípio da precaução e na sua qualidade de gestora dos riscos, sem cometer qualquer erro manifesto de apreciação, considerou que a presença dos três metabolitos do FPS (IN‑JV460, IN‑KC576 e IN‑KY374) nas águas subterrâneas suscitava preocupação.

212    Em segundo lugar, quanto ao risco para os organismos aquáticos, os peritos da EFSA e dos Estados‑Membros, depois de terem analisado todos os dados disponíveis e os eventuais progressos a apresentar para a avaliação dos riscos, concluíram pela existência de um risco elevado. Nas conclusões da EFSA, na secção 9.2, refere‑se o seguinte:

«[F]oi identificado um risco elevado para os organismos aquáticos mediante a utilização de um critério do efeito baseado na biomassa em todos os nove cenários na fase FOCUS 3, devido à exposição aos sais de [FPS] em todas as utilizações representativas (a avaliação dos riscos foi realizada com base nas algas). Não se encontra atualmente disponível um progresso adequado.»

213    Além disso, quanto ao argumento da recorrente de que seria preferível abordar as questões relacionadas com a ecotoxicologia a nível dos Estados‑Membros no momento da avaliação dos produtos fitofarmacêuticos, podendo estes adotar medidas de restrição específicas, há que considerar, à semelhança da Comissão, que essa solução teria sido aceitável em casos nos quais pelo menos algumas informações concretas tivessem demonstrado a existência, no mínimo, de um cenário seguro numa utilização representativa, tendo em conta medidas de mitigação admissíveis. No entanto, a referida solução não é concebível num caso como o presente, em que a existência de um risco elevado é constatada em todas as utilizações, atendendo aos resultados de uma avaliação global efetuada pelos peritos.

214    Por conseguinte, a Comissão agiu acertadamente ao não recorrer ao PDC.

215    Nestas condições, tendo em conta o amplo poder de apreciação que deve ser reconhecido à Comissão para lhe permitir prosseguir eficazmente o objetivo que lhe é atribuído pelo Regulamento n.o 1107/2009 e considerando as avaliações técnicas complexas que deve efetuar, impõe‑se constatar que o regulamento impugnado não se mostra manifestamente desproporcionado tanto no que respeita ao risco para as águas subterrâneas como no que respeita ao risco para os organismos aquáticos.

216    Por conseguinte, há que julgar improcedente o quarto fundamento do recurso.

F.      Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do princípio da não discriminação

217    A recorrente alega que o regulamento impugnado viola o princípio da não discriminação, uma vez que a Comissão tratou de forma distinta casos similares. A Comissão não seguiu uma abordagem coerente e não aplicou as mesmas regras ao FPS e às outras substâncias incorporadas nos produtos fitofarmacêuticos no que respeita, em primeiro lugar, à avaliação da genotoxicidade das substâncias incorporadas nos produtos fitofarmacêuticos e dos seus metabolitos, em segundo lugar, à questão da contaminação das águas subterrâneas por substâncias incorporadas nos produtos fitofarmacêuticos e dos seus metabolitos e, em terceiro lugar, ao tratamento das questões relacionadas com a ecotoxicologia.

218    Em particular, a recorrente afirma que, no que respeita à genotoxicidade, a Comissão suspendeu a adoção de qualquer decisão respeitante à aprovação ou à renovação das substâncias, em relação às quais só tinham sido identificadas preocupações relacionadas com a genotoxicidade, até que a EFSA reveja a sua prática atual relativa à avaliação da genotoxicidade e, por outro lado, o PDC foi utilizado noutros casos e poderia ter sido igualmente utilizado para o metabolito IN‑JE127, o que não aconteceu. Além disso, quanto à contaminação das águas subterrâneas, a Comissão aprovou substâncias cujas concentrações espetáveis eram superiores a 0,1 μg/l, mas não o fez no caso do FPS. No que respeita ao risco para as plantas aquáticas, alega que a Comissão aprovou substâncias que apresentavam um risco elevado para os organismos aquáticos. Na sua opinião, quase todas as decisões de renovação de substâncias AIR‑2 adotadas até à presente data obrigam os Estados‑Membros a proceder a uma avaliação dos riscos em ambiente aquático.

219    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

220    A este respeito, há que recordar que o ponto 6.3.2 da Comunicação da Comissão relativa ao recurso ao princípio da precaução, de 2 de fevereiro de 2000, sob a epígrafe «Não discriminação», tem a seguinte redação:

«O princípio da não discriminação determina que situações comparáveis não devem ser tratadas de forma diversa e que situações diferentes não devem ser tratadas da mesma maneira, a menos que haja fundamentos objetivos para o fazer.

As medidas tomadas a título da precaução deveriam ser aplicadas de forma a atingir um nível de proteção equivalente sem que a origem geográfica ou a natureza de uma produção possam ser invocadas para aplicar de forma arbitrária tratamentos diferentes.

A aplicação das medidas não deveria causar uma discriminação.»

221    No caso em apreço, antes de mais, deve referir‑se que a recorrente não consegue demonstrar que a Comissão suspendeu a adoção de qualquer decisão respeitante à aprovação ou à renovação das substâncias em relação às quais só tinham sido identificadas preocupações relacionadas com a genotoxicidade. Com efeito, a ata da reunião do Comité Permanente dos Vegetais, Animais e Alimentos para Consumo Humano e Animal, de 6 e 7 de outubro de 2016, relativa à substância ativa picoxistrobina, referida pela recorrente, não confirma de modo algum esse facto.

222    Quanto ao argumento de que a Comissão tratou de forma distinta situações comparáveis, há que constatar que a recorrente não consegue demonstrar que os casos que menciona podem ser considerados comparáveis com o FPS. Com efeito, importa referir, como decorre da resposta da Comissão às questões do Tribunal Geral, que as características identificadas no âmbito do procedimento de revisão científica das outras substâncias mencionadas são, em todos os casos, pelo menos parcialmente diferentes do FPS. Note‑se, por exemplo, que, contrariamente às outras substâncias mencionadas, em relação ao FPS foi referido um risco elevado para as algas em todos os cenários e em todas as utilizações.

223    Além disso, importa observar que, tendo em conta, nomeadamente, a especificidade de cada procedimento de exame, que torna extremamente difíceis as comparações, bem como a margem de apreciação da Comissão quanto à forma como conduz investigações de uma natureza tão técnica e complexa, a recorrente não demonstrou que as diferenças na tramitação dos procedimentos de avaliação objeto da comparação não eram objetivamente justificadas (v., neste sentido, Acórdão de 19 de janeiro de 2012, Xeda International e Pace International/Comissão, T‑71/10, não publicado, EU:T:2012:18, n.o 139 e jurisprudência referida).

224    Por conseguinte, as substâncias ativas referidas pela recorrente não podem ser comparadas com a avaliação do FPS, mesmo que os problemas suscitados apresentem semelhanças com o presente processo.

225    Por último, quanto ao argumento de que o PDC foi utilizado em outros casos e poderia ter sido igualmente utilizado para o metabolito IN‑JE127, basta constatar, como se referiu nos n.os 208 a 214 supra, que a Comissão agiu acertadamente ao não recorrer ao PDC no caso do FPS. Com efeito, não é possível, de acordo com as disposições aplicáveis, recorrer a este procedimento, uma vez que os dados deviam constar do processo de renovação à data da respetiva apresentação e estavam disponíveis as orientações adequadas para efetuar a avaliação exigida. Além disso, as mesmas disposições não autorizam a aprovação de substâncias ativas em relação às quais não tenha sido demonstrada a inexistência de efeitos nocivos para a saúde humana ou animal ou de efeitos inaceitáveis para o ambiente ou as águas subterrâneas.

226    Tendo em conta o que precede, há que julgar improcedente o quinto fundamento.

G.      Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação dos princípios da boa administração e da proteção da confiança legítima

227    A recorrente alega que a Comissão violou o dever geral de boa administração, que obriga a garantir que a revisão e o procedimento de decisão decorrem de forma transparente e em conformidade com as disposições em vigor.

228    Com efeito, a Comissão inicialmente considerou que ao FPS eram aplicáveis critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino e solicitou à DuPont que pedisse imediatamente uma eventual aprovação por derrogação nos termos do artigo 4.o, n.o 7, e do ponto 3.6.5 do anexo II do Regulamento n.o 1107/2009. Todavia, a Comissão alterou a sua posição no segundo projeto de relatório de avaliação ao decidir que, no caso do FPS, não havia lugar à aplicação dos critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino.

229    Segundo a recorrente, este facto levou a DuPont a investir tempo e recursos consideráveis na preparação de dois processos de derrogação que, posteriormente, se revelaram completamente inúteis devido à inesperada alteração da posição da Comissão.

230    Com efeito, se a Comissão considerava que as duas outras preocupações identificadas no relatório de revisão de março de 2015 fundamentavam de forma suficiente uma decisão de não renovação, poderia simplesmente ter invocado essas preocupações, sem se referir aos critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino, e sem afirmar que a substância podia ser aprovada por derrogação.

231    A alteração da apreciação da Comissão teria tido consequências significativas, uma vez que os requerentes da renovação viram efetivamente ser‑lhe recusada a possibilidade de aprovação por derrogação. Esse comportamento constituiria uma violação dos princípios da boa administração e de proteção da confiança legítima do requerente da renovação, que foi levado a acreditar que podia obter, pelo menos, uma forma limitada de aprovação baseada nas derrogações aos critérios provisórios de identificação previstos no Regulamento n.o 1107/2009.

232    A recorrente alega também que o FPS faz parte das cessões que a própria Comissão impôs no âmbito da concentração Dow/DuPont com vista a criar um concorrente efetivo à Dow/DuPont no Espaço Económico Europeu (EEE) no mercado dos herbicidas anti‑dicotiledóneas para cereais. Assim, ao adotar o regulamento impugnado, que retira o FPS do mercado, a Comissão foi, na prática, contra os objetivos da política de concorrência nos quais se baseia a cessão que ela própria impôs à Dow/DuPont. Com efeito, o regulamento impugnado teria como consequência o desaparecimento da FMC como concorrente efetiva da Dow/DuPont e, por conseguinte, o reforço da posição dominante da Dow/DuPont no mercado dos herbicidas anti‑dicotiledóneas para cereais no EEE, em detrimento dos concorrentes da Dow/DuPont e dos agricultores da União. É precisamente a situação que a Comissão procurava evitar ao exigir da DuPont a cessão do FPS à FMC. Segundo a recorrente, esta incoerência na política da Comissão constitui igualmente uma violação do princípio da boa administração.

233    A Comissão contesta os argumentos da recorrente.

234    A este respeito, refira‑se que, segundo a jurisprudência relativa ao princípio da boa administração, nos casos em que as instituições da União dispõem de um tal poder de apreciação, o respeito das garantias atribuídas pela ordem jurídica da União nos processos administrativos assume uma importância ainda mais fundamental. De entre essas garantias, constam, nomeadamente, a obrigação para a instituição competente de examinar, com cuidado e imparcialidade, todos os elementos relevantes do caso em apreço (Acórdãos de 21 de novembro de 1991, Technische Universität München, C‑269/90, EU:C:1991:438, n.o 14; de 27 de setembro de 2012, Applied Microengineering/Comissão, T‑387/09, EU:T:2012:501, n.o 76; e de 16 de setembro de 2013, ATC e o./Comissão, T‑333/10, EU:T:2013:451, n.o 84).

235    Declarou‑se igualmente que, para que o incumprimento do dever de diligência possa ser qualificado de violação manifesta e grave dos limites do poder de apreciação de uma instituição, o referido dever deve ter sido totalmente desrespeitado, não bastando uma simples apreciação errada do alcance das obrigações decorrentes do mesmo (Acórdão de 23 de setembro de 2015, Hüpeden/Conselho e Comissão, T‑206/14, não publicado, EU:T:2015:672, n.o 48).

236    No caso em apreço, importa referir que, com base nas conclusões da EFSA, a Comissão publicou um projeto de relatório de revisão sobre o FPS em 18 de março de 2015, no qual propunha retirar a aprovação do FPS. A proposta da Comissão baseava‑se em três domínios de preocupação principais, a saber:

–        os critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino, que eram respeitados devido à proposta da EFSA de classificar o FPS como substância cancerígena de categoria 2 e como substância tóxica para a reprodução de categoria 2;

–        o risco de exposição das águas subterrâneas a um nível que excede o limiar de concentração máxima de 0,1 μg/l nos três metabolitos do FPS (IN‑JV460, IN‑KC576 e IN‑KY374);

–        um risco para os organismos aquáticos.

237    No mesmo dia, a Comissão comunicou à DuPont que continuava a manter discussões internas relativamente à utilização das propostas de classificação da EFSA na tomada de decisões regulamentares, designadamente no que respeitava aos critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino, pelo que a possibilidade de uma reapreciação do relatório de revisão dependia do resultado dessas discussões.

238    Algum tempo após a publicação do projeto de relatório de revisão do FPS, a Comissão solicitou à DuPont, por mensagem de correio eletrónico de 29 de maio de 2015, com base na conclusão de que o FPS preenchia os critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino, que apresentasse elementos a considerar para uma eventual aprovação por derrogação ao abrigo do ponto 3.6.5 do anexo II e do artigo 4.o, n.o 7, do Regulamento n.o 1107/2009.

239    Em 26 de junho e 13 de julho de 2015, a DuPont apresentou dois processos complementares de derrogação que atestavam o caráter indispensável do FPS para a atividade agrícola, bem como a exposição despicienda a esta substância de todas as categorias de utilizadores de produtos à base de FPS. Em de janeiro de 2016, a Comissão mandatou a EFSA para analisar os dois processos de derrogação apresentados pela DuPont.

240    Em 3 de outubro de 2016, a EFSA retomou a sua avaliação do processo principal de renovação e apresentou uma versão revista das suas conclusões.

241    Na sequência da publicação das conclusões revistas da EFSA, a Comissão publicou, em 22 de dezembro de 2016, uma versão revista do seu projeto de relatório de revisão, na qual mantinha a sua proposta de retirada da aprovação do FPS. Todavia, a Comissão alterava a fundamentação que justificava a não renovação proposta, já não afirmando que havia lugar à aplicação dos critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino.

242    À luz destas circunstâncias, importa referir que a recorrente não consegue demonstrar que a Comissão não analisou, com cuidado e imparcialidade, de um modo equitativo e num prazo razoável, os elementos respeitantes aos critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino. Pelo contrário, a Comissão, por um lado, identificou como uma preocupação os critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino e, por outro, referiu que continuava a manter discussões internas e que era possível uma reapreciação do relatório de revisão em função do resultado dessas discussões. Por outro lado, a Comissão, após uma análise mais aprofundada do processo, decidiu apresentar uma versão revista do seu projeto de relatório de avaliação, na qual, embora mantendo a sua proposta de retirada da aprovação do FPS, renunciou à aplicação dos critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino.

243    Além disso, foi a pedido da própria recorrente que a Comissão procedeu à alteração do projeto de relatório de avaliação e, nesse âmbito, chegou à conclusão de que a sua proposta de retirada da aprovação do FPS continuava válida com base em alguns dos fundamentos inicialmente apresentados.

244    Nestas condições, o argumento da recorrente de que a Comissão violou o princípio da boa administração no que respeita aos critérios provisórios de identificação dos desreguladores do sistema endócrino deve, em todo o caso, ser julgado improcedente.

245    Quanto à pretensa violação do princípio da proteção da confiança legítima, é jurisprudência constante que pode invocar esse princípio qualquer particular ao qual uma instituição da União criou expectativas fundadas ao dar‑lhe garantias precisas [Acórdão de 11 de março de 1987, Van den Bergh en Jurgens e Van Dijk Food Products (Lopik)/CEE, 265/85, EU:C:1987:121, n.o 44; v., também, Acórdão de 8 de setembro de 2010, Deltafina/Comissão, T‑29/05, EU:T:2010:355, n.o 427 e jurisprudência referida].

246    A este respeito, basta referir que a recorrente não alega qualquer garantia que lhe tenha sido dada pela Comissão quanto à obtenção de uma forma limitada de aprovação com base nas derrogações dos critérios provisórios de identificação previstos no Regulamento n.o 1107/2009. Nestas condições, há que julgar improcedente a acusação relativa à violação do princípio de proteção da confiança legítima.

247    Por outro lado, quanto à alegação da recorrente de que o regulamento impugnado era incompatível com o direito da concorrência da União, basta referir, à semelhança da Comissão, que o regulamento impugnado não tem em conta a posição concorrencial dos produtores reais ou potenciais de produtos fitofarmacêuticos que contenham FPS. Com efeito, o regulamento impugnado tem por efeito suprimir do mercado da União produtos fitofarmacêuticos que contenham FPS e não alterar a posição concorrencial aí detida pelas empresas.

248    Por conseguinte, a Comissão não violou de forma grave e manifesta os limites impostos ao seu poder de apreciação à luz do princípio da boa administração no que respeita ao dever de diligência.

249    Tendo em conta o que precede, o sexto fundamento deve ser julgado improcedente e deve ser negado provimento ao recurso na sua totalidade.

V.      Quanto às despesas

250    Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão, em conformidade com o pedido desta, incluindo as respeitantes ao procedimento de substituição e ao processo de medidas provisórias.

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

1)      É negado provimento ao recurso.

2)      A FMC Corporation suportará as suas próprias despesas, bem como as despesas efetuadas pela Comissão Europeia, incluindo as respeitantes ao procedimento de substituição e ao processo de medidas provisórias.

Spielmann

Spineanu‑Matei

Mastroianni

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 17 de março de 2021.

Assinaturas


Índice


I. Antecedentes do litígio

II. Regulamento impugnado

III. Tramitação processual e pedidos das partes

IV. Questão de direito

A. Considerações preliminares

1. Quanto ao princípio da precaução

a) Definição

b) Avaliação dos riscos

1) Quanto à avaliação científica

2) Quanto à determinação do nível do risco considerado inaceitável

c) Gestão do risco

2. Quanto à renovação de uma substância ativa inscrita na parte A do anexo do Regulamento de Execução n.o 540/2011

a) Quanto aos requisitos de inscrição iniciais nos termos da Diretiva 91/414

b) Quanto à alteração dos critérios de aprovação pelo Regulamento n.o 1107/2009

3. Quanto ao ónus da prova

4. Quanto ao alcance da fiscalização jurisdicional

B. Quanto ao primeiro fundamento, relativo à violação do Regulamento n.o 1141/2010, do Regulamento n.o 1272/2008 e das regras relativas à experimentação animal constantes do Regulamento n.o 1107/2009 e da Diretiva 2010/63

1. Quanto à violação do Regulamento n.o 1141/2010 e das Orientações sobre a renovação das substâncias AIR3

2. Quanto à violação dos Regulamentos n.o 1107/2009 e 1272/2008, bem como das Orientações da Comissão sobre os metabolitos nas águas subterrâneas

3. Quanto à violação das regras em matéria de experimentação animal constantes do Regulamento n.o 1107/2009 e da Diretiva 2010/63

C. Quanto ao segundo fundamento, relativo ao facto de a Comissão se ter baseado incorretamente em documentos de orientação novos ou ter utilizado de forma incoerente os documentos de orientação, violando o princípio da segurança jurídica e dos direitos de defesa dos requerentes da renovação

1. Quanto à avaliação da genotoxicidade do metabolito INJE127

2. Quanto à avaliação dos riscos relativos às algas

D. Quanto ao terceiro fundamento, relativo ao facto de que a Comissão não ter efetuado uma avaliação completa dos riscos, violando várias disposições do direito da União e os direitos de defesa do requerente da renovação

E. Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do princípio da proporcionalidade

F. Quanto ao quinto fundamento, relativo à violação do princípio da não discriminação

G. Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação dos princípios da boa administração e da proteção da confiança legítima

V. Quanto às despesas


*      Língua do processo: inglês.